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Escola Superior de Jornalismo

Delegação Académica De Manica


Licenciatura em Relações Públicas

Tema:

Correntes antropológicas clássicas

Discente:

- Sílvia João Fernando Sozinho

Trabalho da disciplina de
Antropologia Cultural, por apresentar
no curso de Relações Públicas 1o ano,
2º semestre, com objectivo avaliativo
orientado pelo dr.

Chimoio, Dezembro de 2021


1. Correntes antropológicas clássicas
1.1. Evolucionismo

A antropologia emergiu como ciência na segunda metade do século XIX, foi marcada pelo
triunfo das ideias evolucionistas saídas dos escritos de Herbert Spencer, Charles Darwin,
Alfred Wallace (1823-1913) e outros. Na antropologia, as teorias evolucionistas estão
associadas a nomes pioneiros, como o britânico Edward Burnett Tylor (1832-1917) e o
americano Lewis Henry Morgan (1818-1889).

A principal ideia do evolucionismo consistia em defender que a cultura e as sociedades


evoluem, tal como as espécies e os organismos, a partir de formas mais simples até chegarem
a outras mais complexas. Tanto Tylor como Morgan afirmavam que as sociedades passam por
estádios de evolução até chegarem às formas mais complexas da vida social. Acreditavam
também que era possível encontrar ainda no século XIX sociedades em diferentes estádios e
graus de evolução. As sociedades de caçadores-recolectores eram vistas como o início de todo
o processo evolutivo que, nalguns casos, acabou por levar ao aparecimento das grandes
civilizações clássicas e posteriormente à própria sociedade industrial.

Tylor acreditava na “unidade psíquica” da espécie humana, o que segundo ele explicava a
“evolução paralela” das civilizações em diferentes pontos do globo. Ele dava também
importância ao papel da “difusão cultural” na propagação das formas culturais. As sociedades
podiam importar elementos culturais umas das outras através de um processo de difusão. As
teorias evolucionistas não explicam satisfatoriamente toda a diversidade cultural. Porque é
que umas sociedades “evoluíram” para a “civilização” enquanto outras se mantiveram na
“selvajaria”? Se existe uma unidade psíquica da humanidade, então como se explica toda a
diversidade cultural existente? Mais, existe hoje evidência etnográfica e histórica de que nem
todas as sociedades passaram pelas mesmas fases na sua marcha evolutiva para a
“civilização”.

1.2. Difusionismo

O difusionismo tornou-se popular, nos finais do século XIX, quando o evolucionismo era
ainda uma teoria influente, e constituiu um domínio das teorias evolucionistas. Existiram duas
escolas principais: uma na Alemanha-Áustria e outra na Grã-Bretanha. Quanto ao
difusionismo britânico, as suas principais figuras foram Grafton Elliot Smith (1871-1937),
William J. Perry (1887-1949) e W. H. R. Rivers (1864-1922).

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A sua ideia central era a de que as civilizações mais “avançadas”, das quais a Europa
representava o expoente máximo, tinham a sua origem no velho Egipto, considerado uma
civilização avançada devido ao facto de nela se ter desenvolvido a prática da agricultura
muito cedo e de esta ter levado ao desenvolvimento de formas de religião, arquitectura e arte
muito “avançadas”. Para os difusionistas britânicos, a evolução independente e paralela
parecia de menor importância, senão mesmo uma concepção errada. Para eles, a difusão a
partir do Egipto explicava o desenvolvimento de todas as outras civilizações. A espécie
humana não era particularmente inventiva, pelo que não fazia sentido que soluções
extremamente engenhosas e requerendo grandes capacidades tivessem sido inventadas várias
vezes em sítios diferentes. A humanidade era sobretudo imitadora e não inventora.

Nos EUA, o difusionismo deu origem ao conceito de áreas culturais, chegando a formar-se
uma pequena escola sustentada pelos trabalhos de Wissler e Kroeber, mas as suas ambições
teóricas eram bem menores do que as dos difusionistas europeus. Segundo os difusionistas a
semelhança de características culturais numa determinada área era explicada pela difusão a
partir de um centro. Quanto mais nos afastássemos desse centro menor seria a relação entre os
elementos culturais originais existentes nesse centro e os elementos encontrados na sua
periferia. O conceito de área cultural teve a sua origem nas exigências práticas da pesquisa
etnográfica norte-americana, tendo sido usado como artifício heurístico no mapeamento e
classificação dos grupos tribais das Américas do Norte e do Sul.

O difusionismo contribuiu para que as colecções dos museus passassem a ser organizadas
com base em categorias geográficas em vez de dispostas segundo um modelo evolucionista. O
princípio da difusão não está errado em si mesmo. De facto, as sociedades trocam entre si
elementos das suas culturas. Mas o que o difusionismo não explica é porque é que uns
elementos se difundem enquanto outros não. Por exemplo, porque é que a “cultura” da Coca-
Cola se difunde tão facilmente, tornando-se praticamente universal, enquanto a monogamia
não? E a mesma questão se pode colocar em relação a muitas outras coisas.

1.3. O funcionalismo e o estrutural-funcionalismo

Estes dois paradigmas marcaram a antropologia social europeia, sobretudo britânica, até pelo
menos ao início da década de 1950. O funcionalismo interpreta a sociedade como se ela fosse
um organismo; cada parte do sistema desempenha uma determinada função. O trabalho do
antropólogo seria explicar as funções das diferentes partes do sistema social. As teorias

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funcionalistas na antropologia estão associadas a duas escolas britânicas: o funcionalismo de
Bronislaw Malinowski e o estrutural- funcionalismo de Alfred R. Radcliffe-Brown.

As correntes funcionalista e estrutural-funcionalista desenvolveram-se no âmbito de uma


abordagem mais sociológica, que lidava sobretudo com o desenvolvimento e funcionamento
das “instituições sociais”, e que se opunha à abordagem mais tradicional, geográfica,
preocupada sobretudo com a difusão cultural, classificação dos povos e suas migrações. Nesse
sentido, e apesar do seu esquema conceptual simples, tanto o funcionalismo como o
estrutural-funcionalismo representavam uma certa revolução teórica face ao carácter
meramente particularístico e descritivo da abordagem tradicional (Kuper 1996:2).

Segundo Malinowski (1929) a designação “antropologia funcionalista” deve-se a ele próprio e


ao seu sentido de irresponsabilidade. De acordo com a teoria funcionalista os elementos
culturais serviam para satisfazer as necessidades dos indivíduos em sociedade, estas, por sua
vez, eram determinadas pela própria biologia humana. Um elemento ou traço cultural tinha
como função satisfazer uma qualquer necessidade básica resultante da natureza biológica dos
indivíduos. A nossa espécie não era, nesse aspecto, diferente das outras. Essas necessidades
básicas eram a nutrição, reprodução, conforto corporal, segurança, relaxamento (e outras do
mesmo género).

A cultura estava ao serviço da satisfação dessas necessidades. Por outro lado, a satisfação das
necessidades básicas daria origem a outro tipo de necessidades, e, assim, as coisas ter-se-iam
tornado mais complexas em termos de organização social. Por exemplo, para Malinowski, a
religião e a magia serviam para apaziguar as ansiedades originadas pela incerteza em que
vivemos quanto à satisfação das nossas necessidades.

Um exemplo clássico de aplicação da teoria estrutural-funcionalista é a análise da maneira


como as diferentes sociedades lidam com as tensões sociais que resultam dos laços de
casamento. Estas tensões caracterizam a forma como os parentes consanguíneos da noiva se
relacionam com os parentes consanguíneos do noivo.

A relação entre genro e sogra, por exemplo, pode ir desde a total falta de contacto entre eles
até à existência de relações de grande informalidade, dependendo da sociedade em questão.
Noutros casos, a relação pode ser mesmo de desrespeito, recíproco ou de apenas uma das
partes. A descrição e análise das relações sociais constituíam o objecto central da escola
estrutural-funcionalista.

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Radcliffe-Brown entendia que o evitar de contactos é mais frequente quando os parentes
pertencem a gerações diferentes, enquanto as relações entre parentes da mesma geração
tendem a ser mais informais e de brincadeira. Contudo, qualquer uma das formas tem como
resultado aliviar as tensões entre indivíduos pertencentes a grupos diferentes ligados através
do casamento.

Tal como o funcionalismo, também o estrutural-funcionalismo não explicava porque razão as


sociedades satisfazem as suas necessidades funcionais de maneiras tão diferentes. Por
exemplo, porque é que numas sociedades o pai desempenha o papel de “irmão mais velho”
com quem se pode ter uma relação de brincadeira, enquanto noutras é uma figura autoritária
que se teme e respeita? O principal mérito do funcionalismo e do estrutural-funcionalismo foi
a sua preocupação central com o trabalho de campo e a recolha etnográfica. À semelhança do
que se passou com o culturalismo de Franz Boas, nos EUA, tanto Radcliffe-Brown como
Malinowski achavam que recolher informação etnográfica era mais importante do que teorizar
amplamente.

1.4. O estruturalismo

O responsável pela adaptação do modelo estruturalista à antropologia foi o antropólogo


francês Claude Lévi-Strauss (1908- ), inspirado pelo trabalho de alguns dos linguistas do
chamado Círculo de Praga, como Nicolai S. Trubetzkoy (1890-1938) e Roman Jacobson
(1896-1982). À influência do Círculo de Praga Lévi-Strauss juntou as ideias de Émile
Durkheim e Marcel Mauss (1872-1950), introduzindo na antropologia o modelo linguístico da
oposição binária ou das categorias contrastantes, como também é por vezes designado.

Enquanto o estrutural-funcionalismo de Radcliffe-Brown se preocupava acima de tudo com o


funcionamento do sistema social, o estruturalismo de Lévi-Strauss procurava descobrir a
origem desse mesmo sistema, assim como provar a universalidade dessa origem, a qual
segundo ele se ancorava na estrutura profunda da mente humana, que ele via como única e
universal, ao contrário de Lucien Lévi-Bruhl (1857-1939), que defendia a existência de uma
“mentalidade primitiva” diferente da mentalidade do “europeu civilizado”. (Lévi-Bruhl 1922)

Segundo Lévi-Strauss, a cultura, expressa através dos rituais, da arte e do quotidiano, não é
mais do que a manifestação de uma estrutura mental profunda inerente à espécie humana. Por
exemplo, o facto de as populações “primitivas” organizarem os casamentos através de um
sistema de moitiés (metades), que trocam entre si os indivíduos para fugir à endogamia, é um

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exemplo de organização binária. A estrutura binária da mente humana reflectir-se-ia assim na
linguagem e nas instituições culturais humanas.

O caso das metades e do sistema de casamentos nas estruturas de parentesco é um exemplo de


organização e estrutura binárias. A sociedade estabelece regras de troca que obrigam os
indivíduos a circular entre metades através do sistema de casamento. O mundo à nossa volta é
organizado em categorias que se opõem umas às outras; por exemplo, alto-baixo, cozido-cru,
norte-sul, mau-bom, terra-ar, cá-lá, cultura-natureza, etc. De acordo com a teoria
estruturalista, toda a construção cultural do mundo se faz com base num sistema de oposições.

Segundo Lévi-Strauss, esta organização do mundo em categorias opostas não decorre somente
de uma necessidade prática, mas essencialmente de uma necessidade intrínseca da mente
humana. A cultura é uma manifestação da nossa estrutura mental. A natureza profunda da
mente força-nos a organizar o mundo à nossa volta através de um sistema de contrastes
binários que obedece aos mesmos princípios que a linguagem falada humana, o produto
cultural por excelência. O estruturalismo exerceu uma extraordinária influência na
antropologia um pouco por toda a parte, mas particularmente na Europa e, um pouco mais
tarde, nos EUA.

Os princípios universalistas do estruturalismo nunca foram bem digeridos pela antropologia


social britânica. Uma das maiores críticas refere a frequente falta de uma base etnográfica
sólida que demonstre a existência dessa estrutura profunda da mente humana, que
supostamente determina a forma como os sistemas culturais se organizam. As interpretações
de Lévi-Strauss são, nalguns casos, completamente arbitrárias, não havendo a possibilidade de
as testar por serem consideradas à partida fora de qualquer possibilidade de teste. Mas a sua
maior falha é não explicar porque é que havendo uma só estrutura universal existe uma
diversidade tão grande de padrões e sistemas culturais à escala mundial. Ou, porque razão a
mesma estrutura mental se exprime de formas tão diversas? Veja-se, por exemplo, o caso dos
milhares de línguas diferentes existentes no mundo. Como pode uma só estrutura produzir
tanta diversidade? Esta é uma questão a que os linguistas estruturais tentam responder em
relação à língua.

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Referência bibliográfica

 Batalha, Luís (2004). ANTROPOLOGIA: Uma perspectiva holística; “Principais


correntes na antropologia”. pp 31-46
 Kuper, Adam (1996). Anthropology and Anthropologists: The Modern British School,
London: Routledge (3.ª ed).
 Lévy-bruhl, Lucien (1922). La Mentalité Primitive, Paris: Félix Alcan.
 Malinowski, Bronislaw (1929). The Sexual Life of Savages in North-western
Melanesia, London: G. Routledge and Sons.

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