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Aula 2

Jornalismo científico:
noções fundamentais
Jornalismo Especializado
Prof. Fernando Cesarotti
Data: 23 e 30/08/2021
Jornalismo científico
• O jornalismo cientifico é aquele que tem o objetivo de divulgar as
pesquisas e descobertas feitos pelos diferentes ramos da ciência
• O objetivo é traduzir tal conhecimento de forma que ele possa ser
compreendido por todos
• Também é preciso abordar a pesquisa do ponto de vista do impacto que
ela vai causar na vida das pessoas e na construção de uma sociedade
melhor
Mas...
• O que é ciência, afinal?
• No dicionário: “corpo de conhecimentos sistematizados adquiridos via
observação, identificação, pesquisa e explicação de determinadas
categorias de fenômenos e fatos, e formulados metódica e
racionalmente”
• Todas as pesquisas podem ser consideradas científicas?
• O que cabe no jornalismo científico?
Resposta:
• Sim, todas as áreas do conhecimento humano podem ser chamadas de
ciência e, sim, todas elas podem caber no jornalismo científico.
Mas... (de novo)
• Vivemos num momento de baixa credibilidade entre as instituições,
inclusive entre os cientistas
• Vivemos ainda num momento em que teóricos da conspiração por todos
os lados se dispõem a questionar o conhecimento científico
• No Brasil, por causa da crise fiscal, o governo vem contingenciando
(cortando) verbas dos institutos de pesquisa e reduzindo o investimento
em ciência
Distinção de conceitos
• Divulgação científica é todo material que é produzido para divulgar
pesquisas e descobertas científicas, a partir principalmente dos relatos do
próprio autor. Dá para dizer que está próximo de uma assessoria de
comunicação da pesquisa, destacando principalmente as vantagens.
• O jornalismo científico também tem o objetivo de divulgar as
descobertas, mas precisa fazê-lo com todo o rigor jornalístico possível, ou
seja, apurar inconsistências, verificar falhas, enfim, acompanhar todo o
processo sem enxergar no cientista um Deus coberto de razão.
O caso “boimate”
• Jornalistas da revista New Scientist
publicaram em 1º de abril de 1983
em forma de piada, mas muita gente
caiu, inclusive a revista Veja.
Formatos
• Revistas científicas especializadas
• Revistas de ciência “traduzida” – Super Interessante, Galileu
• TV aberta – reportagens esporádicas dentro dos grandes programas
jornalísticos gerais
• TV fechada – canais com conteúdo interessante, porém de péssimo
acabamento e alguns programas com ar sensacionalista
• Internet – seções nos grandes portais; sites especializados; podcasts;
canais no YouTube
Revistas científicas especializadas
• Periódicos editados com o intuito de disseminar o conhecimento
científico, bem como os avanços e pesquisas que estão sendo conduzidas
internacionalmente com o objetivo de promoção do progresso da ciência.
Em geral, são segmentadas de acordo com a área de pesquisa a
instituição.
• No Brasil, a maioria delas é ligada a universidades ou a grupos de
pesquisa. Os textos publicados são artigos científicos, submetidos por
acadêmicos, que muitas vezes são obrigados a cumprir metas de
publicação.
• O artigo é submetido a um comitê, que faz a chamada “revisão por
pares”: verifica eventuais inconsistências na pesquisa, sugere alterações e
depois dá aval à publicação.
Revistas científicas especializadas
• A maioria dessas revistas hoje circula apenas em formato eletrônico.
• Jornalistas participam em geral dando sugestões na redação do texto, de
forma a torná-lo um pouco menos árido.
• Pauta: o impacto da pesquisa, processo de criação etc. podem interessar
mais ao leitores “comuns”
Revistas científicas especializadas
• Há enormes discussões envolvendo essas revistas:
– Corporativismo
– “Máfia de citações”
– Financiamento – este especialmente nos EUA e na Europa, onde a
edição de revistas científicas é parte de uma indústria milionária, que
por sua vez cobra pequenas fortunas pelo acesso a um conhecimento
que, em tese, deveria ser público
Revistas de ciência “traduzida”
• Publicações periódicas de viés comercial que tentam trazer reportagens
de fundo científico por um olhar mais simples
• Mercado já esteve mais aquecido; hoje, limita-se basicamente a duas
publicações:
– Galileu, da editora Globo
– Super Interessante, da Abril
Revistas de ciência “traduzida”
• Edição mensal focada em reportagens mais extensas, com seções de
notinhas que abrem espaço para todo e qualquer tipo de ciência, inclusive
as humanas
• Site com atualização diário buscando dar informações factuais sempre
pelo viés da ciência – concorrência com os jornais diários e portais
Pesquisa Fapesp: “traduzida”
• Publicação bancada pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São
Paulo que apresenta pautas parecidas com as revistas comerciais, mas
serve também como assessoria, visto que muitas das pautas são sobre
pesquisas bancadas pela instituição.
• Site com atualizações diárias e canal de vídeos no Youtube.
Jornais e portais
• Seções com atualização diária das principais notícias – mas em geral
voltados muito mais para a questão da tecnologia e das descobertas na
área da saúde, com menos espaço para ciências humanas.
• No atual cenário da pandemia, destaque muito maior para as notícias
relacionadas a descobertas envolvendo o coronavírus e o tratamento de
Covid-19, com risco de catastrofismo e de excesso de “boas notícias”
• Noticiário homogeneizado, muitas vezes alimentado pelas agências
internacionais.
TV
• Reportagens esporádicas nos telejornais diários
• Reportagens especiais nos programas dominicais
• Canais especializados nas TVs por assinatura
Podcasts e YouTube
• Tradução – tentativa de popularização
• Segmentação – por idade e área de interesse, principalmente
• Multiplicidade de assuntos
• Participação dos próprios cientistas
• Mais divulgação que jornalismo
“Tradução”
• É claro que o jornalismo científico requer, no mínimo,
além de bom conhecimento de técnicas de redação,
considerável familiaridade com os procedimentos da
pesquisa científica, conhecimentos de história da
ciência, de política científica e tecnológica, atualização
constante e contato permanente com a comunidade
científica.”
OLIVEIRA, F. “Jornalismo científico”
Jornalismo tradutor
• Entende-se, assim, que o jornalista precisa buscar
aproximar a linguagem científica da linguagem
cotidiana das pessoas, com uso de expressões
conhecidas, eventos famosos, uso de personagens
humanizados e outras possibilidades de redação
previstas em outras especialidades.
(Pesquisa Fapesp, 2002)
Diferentes linguagens
• A produção textual do cientista e do jornalista detêm
aparentemente enormes diferenças de linguagem e de
finalidade:
• Público-alvo: O cientista produz trabalhos dirigidos para um
grupo de leitores, específico, restrito e especializado; o
jornalista almeja atingir o grande público.
• Redação: o texto científico segue normas rígidas de
padronização e normatização universais, além de ser mais
árida, desprovida de atrativos; a escrita jornalística deve ser
coloquial, amena, atraente, objetiva e simples.
Diferentes linguagens
• Investigação/apuração: a produção de um trabalho científico é
resultado, eventualmente, de meses ou anos de investigação; a
apuração jornalística é rápida e efêmera.
• Publicação: o trabalho científico normalmente encontra
amplos espaços para publicação nas revistas especializadas,
permitindo uma linguagem mais prolixa; o texto jornalístico
esbarra em espaços cada vez mais restritos, e portanto deve ser
sintético.
“Tradução”
• “O casamento maior da ciência e do jornalismo se
realiza quando a primeira, que busca conhecer a
realidade por meio do entendimento da natureza das
coisas, encontra no segundo fiel tradutor, isto é, o
jornalismo que usa a informação científica para
interpretar o conhecimento da realidade...
Método científico no jornalismo?
• Em alguns casos, o jornalismo pode se aproveitar do rigor
do método científico na apuração em busca de um
resultado de melhor qualidade:
• Definir tema (pauta)
• Elaborar hipóteses (aprofundar pauta)
• Coletar dados (pesquisa e entrevistas)
• Testar as hipóteses (apuração e checagem)
• Priorizar dados (definir lide e manchete)
• Escrever e publicar (de acordo com os padrões da publicação
e o público-alvo)
Assuntos
• A informação científica permitirá ao jornalista uma
visão mais sistêmica e contextualizada dos fatos, ao
contrário da visão mais fragmentada geralmente usada
pelo jornalista.
• Com isso, o jornalismo científico pode aparecer nas
mais diversas editorias:
Assuntos
• Ciência e Tecnologia
• Saúde:
• Empresas e negócios
• Meteorologia e clima
• Fenômenos sociais
• Esporte
• Variedades
Relacionamento com fontes
• O jornalista precisa estar ciente de que o cientista é uma
pessoa normal, como qualquer outra, passível de erros e
vaidades. Ou seja, não pode ter com ele qualquer sensação de
subserviência ou inferioridade, como se o cientista fosse um
Deus dono de todo o conhecimento
• Essa postura de temor pode atrapalhar uma pauta, por
exemplo, porque o jornalista corre o risco de se sentir burro ao
pedir uma explicação para um termo complexo – e então
desistir da pergunta.
Relacionamento com fontes
• Essa postura muitas vezes pode fazer com que o jornalista
aceite qualquer coisa dita pelo cientista sem a devida visão
crítica. Por isso é importante que uma reportagem seja feita
sem pressa, para existir a possibilidade de uma checagem mais
rígida.
• Muitos cientistas têm consciência de que ser fonte jornalística
é uma retribuição à sociedade pelo investimento (em geral
público) feito em sua formação. Então, geralmente estão
dispostos a dar entrevistas, até pela chance de expor seu
trabalho.
Relacionamento com fontes
• Cientista Torre de Marfim: aquele que sabe tudo e vê a
imprensa como um bando de ignorantes
• Cientista São Tomé: aceita falar, mas acha que vamos fazer tudo
errado e quer ver a matéria publicada antes
• Cientista socialite: mais fala e dá entrevista do que
efetivamente pesquisa
• Cientista bom samaritano: aquele que precisamos, pois tem a
consciência da importância do jornalismo para a divulgação de
seu trabalho
Relacionamento com fontes
• Como garantia extra, nos Estados Unidos notícias sobre
pesquisas e descobertas só são publicadas pela imprensa
“comum” depois de validadas por revistas científicas, que
possuem uma outra lógica – inclusive a validação por pares, ou
seja, o fato de algo só poder ser publicado depois de avaliado e
analisado por outros profissionais.
• Frequentar congresso e ler pesquisas é importante, mas nada
substitui as entrevistas com os pesquisadores e a criação de
contatos com fontes secundárias.
Relacionamento com fontes
• Outra falha comum é a aceitação como verdade quase religiosa
das informações oferecidas pelos institutos governamentais de
pesquisa, visto que, embora cientistas, os dirigentes desses
órgãos cumpram também um papel político. Isso quando não
são os próprios governos que tentam se impor como
autoridade passando por cima da ciência como argumento.
• Por fim, é preciso ter a consciência de que a publicação de
Ciência é, como tudo no jornalismo, um ato político, que
envolve interesses, inclusive econômicos, e tudo isso precisa
ser levado em consideração.

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