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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – UnB


INSTITUTO DE LETRAS
DEPARTAMENTO DE LINGUÍSTICA, PORTUGUÊS E LÍNGUAS CLÁSSICAS – LIP

Produção textual na universidade

Professora Juliana Dias


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SUMÁRIO EM TÓPICOS

UNIDADE 1: LEITURA

1- Texto: concepções de texto


2- Gêneros discursivos
3- Leitura ativa: tipos e objetivos; a qualidade da leitura
4- Leitura analítica: Condições de textualidade: coerência e coesão,
intencionalidade, condições sociais, contexto, intertextualidade.
5- Leitura crítica: Variação Linguística e preconceito linguístico. Discurso e ideologia.

UNIDADE 2: PRÁTICA DE TEXTOS- ESCREVENDO GÊNEROS ACADÊMICOS

1- Texto argumentativo
2- Técnica do esquema e da sublinha
3- Paráfrase e parágrafo
4- Resumo e resenha
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Produção textual na universidade

Apresentando nossa tarefa

Paulo Freire (1981) trata em seu texto “A importância do ato de ler” sobre
como a leitura da ‘palavramundo’ envolveu sua experiência existencial. Em suas
palavras, “retomo a infância distante, buscando a compreensão do meu ato de ler, em
um mundo particular (...) absolutamente significativo. Neste esforço, a que vou me
entregando, recrio e revivo, no texto em que escrevo, a experiência vivida”.
Ler, compreender o que se lê e escrever bons textos são objetivos comumente
traçados elos professores e estudantes no meio universitário. O desafio que propomos
nesse livro vai um pouco além: ler e interagir com o texto, escrever e marcar a
identidade dessa autoria, eis o que se pretende explorar nesse guia didático.
E para realizar nossa tarefa é preciso começar esclarecendo três conceitos
fundamentais:
1- Leitura Ativa;
2- Leitura analítica;
3- Leitura Crítica
Após refletirmos sobre esses três aspectos relacionados à leitura, na UNIDADE 1, é
que vamos adentrar na prática da escrita dos gêneros acadêmicos, na UNIDADE 2.
Esboçaremos possíveis caminhos para relacionar essas concepções com a nossa prática
de sala de aula universitária.
O que acontece é que nos vemos, diversas vezes, diante de um abismo entre o que
está escrito nas referências curriculares e o que acontece no nosso dia-a-dia. Para
concretizarmos na sala de aula o que se encontra nos currículos, ainda mais no
contexto atual em que vivenciamos uma expansão da vida universitária, precisamos
lançar mão de ferramentas mais concretas de trabalho.
Esta é nossa proposta aqui. Trazer reflexões e atividades para um trabalho
pedagógico mais significativo e prático. E, poderíamos até dizer: ousado no sentido de
estar assentado nas concepções mais modernas de texto e de textualidade: as
concepções discursivas críticas e sociointeracionais da linguagem.
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Antes de iniciarmos nossa tarefa vamos falar um pouco sobre os textos escolhidos para
nosso trabalho. Falar de texto será falar de interação. Cada vez mais falamos ou
ouvimos a palavra “interação”, tanto na escola como na rua. A televisão, o
computador e as novidades tecnológicas modificam nosso modo de agir e interagir no
mundo e nos colocam para pensar sobre isso.
Ora, se interagimos por meio da linguagem, podemos entender que não há
como escapar de uma noção de língua como interação - seja nas modalidades escrita
ou falada, ou nos registros formal ou informal. Qualquer interação pressupõe regras,
como em um jogo em que os participantes agem e sabem ou esperam certos
resultados.
Nesse sentido, saber usar os textos que circulam na vida e saber produzir textos
próprios são objetivos a serem trabalhados em nossas aulas de língua, não é mesmo?
Por tudo isso, o trabalho com diferentes gêneros textuais será a base do nosso
projeto de ação, sobretudo no que concerne aos diferentes gêneros acadêmicos os
quais o estudante universitário precisa dominar: resumos científicos, resenhas críticas,
artigo acadêmico, projeto de pesquisa, entre outros.
Os gêneros textuais são formas padronizadas de linguagem que, por meio do
uso repetido, desenvolvem claramente características reconhecíveis, quer sejam em
nível de questão de tema/assunto, estrutura do discurso, ou formas linguísticas.

***

COMO ORGANIZAREMOS ESSE VOLUME?

Iniciaremos cada unidade com o título: PRÁTICA DE PESQUISADOR- DIÁLOGOS


TEÓRICOS; depois teremos nossas FOTOGRAFIAS DE SALA DE AULA; e, por fim,
EXERCITANDO A UNIDADE.

Vamos entender cada parte?

1- Prática de Pesquisador- diálogos teóricos


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O aluno é mais, muito mais do que um receptor e reprodutor de conhecimentos.


Todo aprendente é acima de tudo um pesquisador. Nosso ensino na atualidade toma,
sobretudo, o texto como unidade de ensino-aprendizagem. Para se desenvolver as
competências e as habilidades no uso da língua, o trabalho com texto no bojo de um
enfoque interacional é fundamental. Diante dessa nova realidade nosso objetivo será
mostrar como o aluno pode desenvolver esse lado de pesquisador.

Como vamos fazer isso?

Esse trabalho pode ser feito a partir dos textos coletados por você mesmo,
como pesquisador na sua cidade, na internet e na sua área específica de formação! É o
que vamos fazer ao longo de todo esse caderno. Que tal colocarmos as mãos na massa
agora mesmo? Então, pegue sua lente de pesquisador e coloque os óculos da intuição...
Sinta-se convidado para entrar em diferentes espaços acadêmicos da Universidade de
Brasília.

2- Fotografias de sala de aula

Vamos por diversas vezes visitar diferentes espaços de uma universidade. São
salas de aula, corredores dos pavilhões ou do Minhocão, espaço de leitura como a
biblioteca, enfim, espaços múltiplos, visitados por vocês diariamente onde acontecem
situações interessantes para nossa reflexão conjunta. Além disso, vamos comentar
notícias de jornais, propagandas, discursos políticos e outros ‘textos’ que circulam na
nossa vida cotidiana fora da universidade.

3-Exercitando a unidade em foco


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Aqui teremos a oportunidade de dialogar por meio de exercícios práticos e


reflexões conjuntas. Utilizaremos o’ feedback’ do professor para ancorar as discussões
depois de vocês terem ‘colocado a mão na massa’ exercitando seu pensamento crítico
e sua leitura e escrita ativas.
Será comum nessa parte do seu livro aparecerem propostas de produções
textuais intituladas LABORATÓRIO DE PRODUÇÃO DE TEXTO. São propostas autorais de
escrita criativa (na maioria delas) e não é necessário entregar (postar) para o/a
professor/a. A ideia é você se desafiar a escrever esses textos e dar-lhes o tempo de
‘descanso’, um tempo necessário para seu amadurecimento como leitor/a e escritor/a

antes de reler e reescrever suas produções. Seu ícone será assim:


Importante também, vocês identificarem os significados dos ícones que
aparecem ao longo do livro:
Ícones Significados
Questionamentos, dúvidas, reflexões.

Atenção!

Reflexões importantes para saber mais sobre o assunto.

E, para finalizar, apresentamos as principais maneiras que utilizaremos para avaliar


as leituras realizadas por vocês ao longo do semestre. São as chamadas ATIVIDADES DE
LEITURA exigidas em todas as unidades do livro, as quais compreenderão
a) PROTOCOLO DE LEITURA, uma espécie de diálogo com o texto lido;
b) FICHAMENTO TEXTUAL, uma técnica muito solicitada no meio acadêmico;
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c) ANÁLISE DE TEXTO, uma investigação minuciosa das características da


linguagem acadêmica.
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PROTOCOLO DE LEITURA
Os protocolos verbais ou protocolos de leitura são utilizados como metodologia
de pesquisa na área de leitura, e, principalmente, como metodologia de investigação
de aprendizado de diferentes formas de leitura, exposição teórica do professor e
também para descrever o contexto de aprendizado, considerando, conforme Paulo
Freire, que a leitura envolve o conhecimento de mundo. Portanto, vários professores,
de diferentes níveis de escolarização, estão utilizando os protocolos de leitura1 (ou
verbais) para avaliar seu trabalho e averiguar o aprendizado de seus alunos. Esse
gênero discursivo constitui um recurso em que o aluno verbaliza por escrito os
seguintes tópicos:
1- O que aprendeu sobre a temática do texto lido (conceitos teóricos);
2- Qual parte do texto teve mais dificuldade em interpretar e o motivo dessa
dificuldade;
3- Quais foram as dificuldades apresentadas durante a leitura (dificuldade na
interpretação do texto e na identificação de ideias centrais, o desconhecimento de itens
lexicais (palavras), falta de familiaridade com o gênero discursivo ou estilo do autor.
Dificuldade em relacionar as intertextualidades);
4- Qual é a relação temática do texto com seus conhecimentos e suas experiências
5- Avaliação do texto (ou de outros contextos, levantando pontos positivos e
negativos);
6- Sugestões metodológicas para melhorar o contexto de aprendizado.

1
Referências: CAVALCANTI, Marilda do Coutro. Interação leitor-texto. Campinas: Editora da
Unicamp, 1989.
BORTONI-RICARDO, Stella; MACHADO, Veruska Ribeiro; CASTANHEIRA, Salete Flores.
Formação do professor como agente letrador. São Paulo: Contexto, 2010.
SOUSA, Rosineide. Protocolos Verbais na Avaliação de Leitura. Brasília. Universidade de Brasília.
Impresso não publicado
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FICHAMENTO ACADÊMICO
O que é um fichamento2?
É um conjunto dos dados relevantes de alguma coisa, geralmente anotados, arrolados
em fichas, folhas avulsas etc. O fichamento constitui um valioso recurso de estudo, de
que lançam mão pesquisadores, para a realização de uma obra didática, científica ou
de outra natureza e sua função primordial é registrar informações que poderão serem
utilizadas futuramente. Os fichamentos na esfera acadêmica podem ser feitos em
folha de papel almaço em sua forma manuscrita (nunca em folhas de caderno) ou
folhas brancas em meio digital. É importante seguir um formato padrão para que o
estudo do texto aconteça de modo organizado e metódico em sua mente.
Primeiramente, vocês devem ler o texto no mínimo duas vezes, sublinhando as partes
mais importantes (verificar a técnica da sublinha nesse livro) ou fazendo esquemas
pessoais para compreensão em seu caderno. Em seguida, é preciso registrar o título do
texto estudado (as informações bibliográficas completas segundo as normas da ABNT);
resumo do texto; anotações sobre tópicos da obra; citações diretas; e comentários.
Ademais, é importante inserir algumas referências bibliográficas que se destacaram no
texto. Vejam o exemplo a seguir:

FICHAMENTO ACADÊMICO
Referência Bibliográfica: TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo
no Brasil. São Paulo: brasiliense, 1993.

2 Referências: GARCEZ, Lucília H. Do C. Técnica de redação. O que é preciso saber para escrever bem. São
Paulo: Martins fontes. 2a edição, 2004.
MEDEIROS, J. Bosco. Redação científica. A prática de fichamentos, resumos e resenhas. São Paulo: atlas. 6a
edição, 2004.
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Autora
Maria Amélia de Almeida Teles é uma das idealizadoras do projeto Promotoras Legais
Populares e ainda integrante do Conselho Consultivo do Centro Dandara. É militante
feminista histórica, diretora da União de Mulheres de São Paulo, autora de inúmeros
artigos sobre e livro sobre o assunto.
Resumo:
O trabalho da autora baseia-se em análise de textos e na sua própria vivência nos
movimentos feministas, como um relato de uma prática. A autora divide seu texto em
fases históricas compreendidas entre Brasil Colônia (1500-1822), Império (1822-1889),
República (1889-1930), Segunda República (1930-1964), Terceira República e o Golpe
(1964-1985), o ano de 1968, Ano Internacional da Mulher (1975), além de analisar a
influência externa nos movimentos feministas no Brasil. Em cada um desses períodos é
lembrado os nomes das mulheres que mais se sobressaíram e suas atuações nas lutas
pela libertação da mulher. A autora trabalha ainda assuntos como as mulheres da
periferia de São Paulo, a participação das mulheres na luta armada, a luta por creches,
violência, participação das mulheres na vida sindical e greves, o trabalho rural, saúde,
sexualidade e encontros feministas. Depois de suas conclusões onde, entre outros
assuntos tratados, faz uma crítica ao pós-feminismo defendido por Camile Paglia,
indica alguns livros para leitura.
Citações:
“uma das primeiras feministas do Brasil, Nísia Floresta Augusta, defendeu a abolição da escravatura, a
como educação e a emancipação da mulher e a instauração da República” (p.30)
“a mulher buscou com todas forças sua conquista no mundo totalmente masculino” (p.43)
“na justiça brasileira, é comum os assassinos de mulheres serem absolvidos sob a defesa de honra” 132)
Comentários:
A obra traz a reflexão de que houve muita omissão sobre o passado das mulheres e sua luta
pela conquista do seu espaço. Isso pode ocorrer devido ao fato de o homem querer sempre
ser superior, competir e deixa sempre explicito, sua força e seus méritos um tanto
contestáveis.
A obra é recomendável para análises do papel da mulher na sociedade, pois contém fatos
reais e um grande número de exemplos.
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ANÁLISE TEXTUAL: trata-se de um exercício que deverá ser feito apenas ao final das
duas unidades desse curso, pois, você estará habilitado/a como o/a leitor/a ativo e
crítico a identificar um texto científico e as especificidades da linguagem acadêmica:
utilização de paráfrases, presença de intertextualidade (citações diretas e indiretas),
aspectos estilísticos (primeira ou terceira pessoal, linguagem formal ou informal), bem
como a observação minuciosa das escolhas lexicais e das substituições das palavras
para garantia da coesão textual e para a criação da tessitura do texto.
Vocês devem seguir os seguintes passos antes de escreverem a análise textual: (1) ler o
texto duas vezes no mínimo; (2) destacar com uma caneta colorida todas as citações
do texto; (3) destacar de outra cor o verbo ou a expressão que introduz a citação, por
exemplo, “afirmou, asseverou, disse, conforme Freire, para Souza, segundo Beltrão”;
(4) observar se o autor usa a primeira pessoa do singular, a primeira do plural ou a
terceira do singular; (5) observar as escolhas das palavras e a construção dos períodos
(há muito termos técnicos da área; existem expressões ou ideias partes do senso
comum; os períodos predominantes são os compostos? Em quais momentos do texto
aparecem períodos simples?); (6) como é o estilo do/a autor/a: autoritário? Crítico?
Aberto para discussão? Ele/a se coloca ou tenta se esconder nas outras vozes?-
comprove com citações do texto suas impressões.

Após esse contato inicial com o texto, você deverá escrever um texto de uma a duas
páginas, de forma subjetiva (sem listar tópicos de observação) sobre o texto e o uso da
linguagem acadêmica. Nessa análise você deve contemplar todos os tópicos
apresentados, estabelecendo conexões e fazendo descobertas (por exemplo, será que
na introdução e na conclusão, a utilização de períodos simples é mais recorrente do
que na parte teórica do artigo científico. Por que será que isso ocorre?).
Tópicos para observação3:
TÓPICOS DA DIMENSÃO GLOBAL DO TEXTO
1- Qual é o campo discursivo de origem e de circulação do texto (campo
científico, didático, jurídico, religioso, político etc.)

3
Referência: ANTUNES, Irandé. Análise de textos: fundamentos e prática. SP: Parábola, 2010.
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2- Qual é o tema do texto? De que trata o texto fundamentalmente?


3- Qual é a função comunicativa do texto e a intenção do/a autor/a?
4- Quais são as representações, as visões de mundo, as crenças e as concepções
que o texto deixa passar implícita ou explicitamente?
5- Como acontece o encadeamento das ideias no texto e a divisão dos
parágrafos? Qual o critério semântico para divisão dos parágrafos?
6- Como o/a autor/a apresenta a síntese global de suas ideias e informações?
7- Como se dá a relação desse texto com outros textos , ou seja, como são
inseridas citações, remissões e como são feitas as paráfrases no texto? O que
predomina?

TÓPICOS ESPECÍFICOS: observe como aparecem no texto os seguintes pontos e faça


um comentário geral
1- Repetições de palavras e substituições lexicais;
2- Retomadas de expressões que asseguram a continuidade do texto no mesmo
parágrafo e entre os parágrafos;
3- O caráter polissêmico de algumas palavras ou expressões que podem estar a
serviço de crenças de valores particularizados;
4- A ocorrência das paráfrases e suas marcas indicativas;
5- A presença de estruturas sintáticas paralelas;
6- As inversões de ordem sintática e os efeitos de sentido provocados por elas;
7- Marcas de ironia, humor, estilo próprio, escolhas de palavras peculiares e que
chamam a atenção;
8- O nível maior ou menor de formalidade na linguagem usada;
9- A forma direta ou indireta de como o/a autor/a se posiciona no texto;

_________________________________________________________________
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UNIDADE 1

LEITURA

• Texto: Concepções teóricas


• Gêneros textuais
• Leitura ativa, leitura analítica e leitura crítica
PARA ESSA UNIDADE VOCÊ DEVERÁ
1) LER E FAZER UM PROTOCOLO DE LEITURA DO TEXTO “A IMPORTÂNCIA DO ATO
DE LER-PARTE 1” DE PAULO FREIRE (até a página 14. Disponível em <
https://educacaointegral.org.br/wp-
content/uploads/2014/10/importancia_ato_ler.pdf>);
2) LER COM ATENÇÃO O MATERIAL DIDÁTICO QUA ACOMPANHA A UNIDADE;
3) ASSITIR AO VÍDEO INDICADO NA UNIDADE;
4) PRODUZIR OS TEXTOS DOS LABORATÓRIOS 1, 2, 3 e 4 CONFORME AS
PROPOSTAS DESTA UNIDADE (atividades opcionais).
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TÓPICO 1: TEXTO E AS CONCEPÇÕES TEÓRICAS

PRÁTICA DE PESQUISADOR: DIÁLOGOS TEÓRICOS ___________

Entendendo as diferentes concepções de texto

Ao nos perguntarmos o que entendemos por TEXTO vamos nos deparar com
respostas como: “é um todo repleto de sentido”, “é algo escrito que tem coesão e
coerência”, “é uma mensagem e uma comunicação”. A partir destas ideias
preliminares, percebemos quais são as noções mais tradicionais de TEXTO que
circulam na mente das pessoas:

1º) TEXTO só é texto se for escrito;


2º) TEXTO precisa ser coeso E coerente;
3º) TEXTO serve para comunicar algo para alguém.

De fato, tradicionalmente, entende-se por texto um conjunto de enunciados


inter-relacionados formando um todo significativo, que depende da coerência
conceitual, da coesão sequencial entre seus constituintes e da adequação às
circunstâncias e condições de uso da língua.

Todavia, o conceito de texto, sob o ponto de vista das modernas teorias


linguísticas, pode ser entendido de maneira mais abrangente. Ao ampliar esta noção,
incluímos a noção de comunicação, de acordo com a qual o TEXTO só faz sentido
porque foi escrito com um propósito comunicativo por alguém e remetido para outro
alguém por meio de um canal específico. Para ilustrar essa segunda concepção de
TEXTO- como unidade comunicativa -apresentamos o quadro de Roman Jakobson,
linguista russo, que elencou os elementos importantes para caracterização de um
texto:

CÓDIGO

EMISSOR  MENSAGEM  RECEPTOR

CANAL
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Essa visão ainda não contempla um trabalho crítico com os textos, uma vez que
parte do pressuposto que a função básica do texto é a comunicação e que o papel do
leitor é de receptor de mensagens. Ao restringir o papel do leitor, essa concepção não
é capaz de desvelar mecanismos textuais que escondem ou revelam as relações de
poder, a visão crítica, o papel ativo de quem lê o texto e de quem o produz também.
Segundo Ingedore Koch, o texto é uma manifestação verbal constituída de
elementos linguísticos intencionalmente selecionados e ordenados em sequência,
durante a atividade verbal, de modo a permitir a interação (ou atuação) de acordo
com práticas socioculturais. Essa é a base para a concepção pós-moderna de texto.

o significado
global do texto
não é o resultado o significado de
de uma mera uma parte não é
Texto como
Essa unidade de soma de suas autônomo, mas
unidade de
sentido pressupõe: partes, mas de depende das
sentido
uma certa outras partes com
combinação que se relaciona;
geradora de
sentidos.

Encarar o texto como um produto histórico-social, relacioná-lo a outros textos


armazenados na memória textual coletiva, admitir a multiplicidade de leituras por ele
ensejadas são desafios permanentes para um ensino consequente da Língua
Portuguesa.

Daí podermos falar de texto verbal, texto visual, texto verbal e visual, texto
musical, texto cinematográfico, texto pictórico, entre outros.

Não se trata, contudo, de rejeitar as concepções anteriormente firmadas e


exploradas no trabalho pedagógico com texto. Nossa proposta é apresentar uma
triangulação dessas três concepções para ancorar nossa prática em uma visão teórica
mais dinâmica e enriquecedora.
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O que é texto, então?


Texto é uma unidade significativa, uma unidade interativa e uma unidade
comunicativa em constante movimentação.

UNIDADE
COMUNICATIVA

UNIDADE UNIDADE
INTERATIVA SIGNIFICATIVA

Nessa perspectiva discursiva, damos ênfase ao papel do sujeito leitor que


atuará investido de um papel ativo de leitura, daí o termo LEITURA ATIVA. E é por isso
que tratamos o texto ‘dentro’ de um contexto social mais amplo, com base no que
chamamos de GÊNERO TEXTUAL.
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TÓPICO 2: GÊNEROS TEXTUAIS

PRÁTICA DE PESQUISADOR: DIÁLOGOS TEÓRICOS ________________


Gêneros discursivos

Como expõe Brandão (2001:18-9), a noção de gênero vem sendo desde Platão e
Aristóteles uma preocupação insistente. O estudo dos gêneros tem sido uma
constante temática, que interessou os antigos e que, atravessando os tempos, ainda é
objeto de preocupações de estudiosos/as da linguagem.
Na trajetória percorrida por teóricos da Análise de Gêneros, pode-se perceber uma
crescente preocupação e consideração das questões de gênero como imbricadas em
redes de relações sociais, no marco ideológico de períodos históricos e culturais
específicos.
O trabalho com gêneros na prática escolar estabelece um diálogo com os preceitos
dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1998, p.70) que elegem como unidade básica
de ensino o texto e como unidade de ensino-aprendizagem os gêneros. De acordo
com essa concepção, produzir linguagem é produzir discursos, o que significa “dizer
alguma coisa a alguém, de uma determinada forma, em um determinado contexto
histórico e em determinadas condições de produção.” (PCN:1998, p.8).
Desse modo, podemos perceber que para entender como se dá a comunicação em
uma esfera social é preciso investigar os gêneros discursivos presentes na interação
entre os participantes dessa esfera. Por isso vamos refletis criticamente sobre gêneros
diversificados: narrativas, diálogo, texto publicitário, artigo de opinião, poema, notícia,
discurso político, campanhas governamentais, gráficos de pesquisas, charges,
curiosidades, diários íntimos, resenha, resumo científico e artigo científico, entre
outros.

O que é GÊNERO TEXTUAL?


19

São formas padronizadas de linguagem que, por meio de uso repetido,


desenvolvem claramente características reconhecíveis, quer sejam em
nível de questão de tema/assunto, estrutura do discurso ou formas
linguísticas e estruturas. (BAKTHIN, 1997)

Gêneros são, em primeiro lugar, fatos sociais e não apenas fatos


linguísticos. Os gêneros não preexistem como formas prontas e acabadas,
mas são instrumentos globais de ação social e cognitiva. Por isso, eles
são tão dinâmicos. (MARCUSCHI, 2005)

EXEMPLOS: anúncio publicitário, reportagem, ensaio acadêmico, resenha


crítica, história em quadrinhos, manual de instruções, bula de remédio,
postagens de redes sociais virtuais etc.

Podemos nos perguntar: por que é importante estudar a nossa língua


considerando os gêneros textuais e não apenas os textos isolados?

Porque é por meio da exploração de diferentes gêneros que vamos desenvolver


habilidades para viver no mundo social, para interagir, se comunicar e dar sentido
às coisas ao seu redor. Porque a universidade não está divorciada da vida. E porque
nós todos somos também produtores de textos.

Podemos ampliar esta resposta, trazendo 3 pontos destacados pelo professor


Marcuschi no início deste século que nos diz o seguinte:
• A circulação dos gêneros na sociedade mostra como a própria se organiza
em todos os aspectos.
• Eles são a manifestação visível desse funcionamento (...) envolvendo
linguagem, atividades enunciativas, intenções e outros aspectos.
• Basta tomar um setor da atividade humana para observar o que ocorre ali.
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Em outras palavras, se queremos compreender e refletir sobre processos sociais


mais amplos é preciso nos dedicarmos a observação, compreensão e produção de
gêneros textuais.

Quem é Marcuschi?

Luiz Antônio Marcuschi foi professor pesquisador na Universidade Federal


de Pernambuco durante muitos anos e ficou conhecido internacionalmente
por suas pesquisas sobre gênero textual e análise da conversação.
Seu livro “Da fala para escrita” (2010) está disponível em:
<file:///C:/Users/Juliana/Downloads/Marcuschi%20(2010)%20Da%20fala%2
0para%20a%20escrita.pdf>

O QUE NOS DIZEM OS AUTORES RENOMADOS NA ÁREA?

Michael Bakthin (1997):


As limitações para a constituição dos gêneros discursivos são históricas e sociais
e, como categorias históricas, eles são sujeitos a um processo de transformação
contínua e sua estabilidade relativa é constantemente ameaçada por forças que
atuam sobre as coerções genéricas. Essa visão de Bakhtin é básica ao estudo dos
gêneros discursivos.
(ponto forte na visão bakhtiniana de gênero é que ela nos permite considerar
tanto as restrições/limitações nas práticas sociais pelas convenções quanto ‘a
potencialidade para mudança e criatividade’. )
21

Meurer e Motta-Roth (2002):


Sobre o que se fala, quem fala e como se fala são três aspectos básicos
definidores do contexto, ao mesmo tempo que dependem do contexto em que
uma determinada atividade humana se desenvolve mediada pela linguagem. A
consciência desses três aspectos, conforme esses dois autores afirmam,
possibilita-nos ser mais ou menos articulados no uso da linguagem para alcançar
determinados objetivos e nos apropriarmos e expandirmos o repertório de
gêneros discursivos disponíveis em nossa cultura.
Segundo os dois pesquisadores, ao servir de materialidade textual a uma
determinada interação humana recorrente em um dado tempo e espaço, a
linguagem se constitui como gênero.

Norman Fairclough (2003:65):


Os “gêneros são os aspectos especificamente discursivos de modos de agir e
interagir no curso de eventos sociais: nós poderíamos dizer que (inter)agir nunca
é apenas discurso, mas é em geral principalmente discurso. Assim, quando
analisamos um texto ou interação em termos de gênero, nós estamos
perguntando como ele figura dentro e contribui para a ação social e interação
em eventos sociais.”
O autor destaca dois pontos preliminares sobre gênero: primeiro, gêneros
variam muito consideravelmente em termos de seu grau de estabilização, fixidez
e homogeneização. Alguns são bem definidos quase ao ponto de serem
ritualizados, como o artigo de pesquisa em certas áreas da ciência (Swales,
1990). Outros, ao contrário, são muito variáveis e em fluxo, como anúncios
publicitários. Fairclough salienta que neste período de rápida e profunda
transformação social, há uma tensão entre pressões em relação à estabilização,
parte da consolidação da nova ordem social (p.ex., os novos gêneros de
telemarketing), e pressões em relação a fluxo e mudança.
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Fotografias de sala de
aula__________________________________________
Observemos um trecho do caderno de esportes de um jornal de circulação nacional em
que o jornalista entrevista um jogador de futebol famoso:

Entrevista de Ronaldo para a Folha de S. Paulo


(Fragmento)

Em sua extensa entrevista no evento da Folha de S. Paulo, Ronaldo deixou claro todos
os efeitos da transformação pessoal em 15 anos morando na Europa. O traço de
sofisticação “gringa” em sua personalidade ficou estampado nas declarações sobre a
preferência de criação do filho na Espanha e na convivência com os jogadores nos
vestiários do Brasil.

“Prefiro que o Ronald (filho do atacante) seja criado na Espanha. A mãe dele também
prefere. Aqui no Brasil, as crianças da idade dele, de 9 anos, já tem um palavreado
malandro. Lá, ele não fala nenhum palavrão. É um doce de menino, praticamente um
europeu. É uma decisão que envolve segurança também”, disse.

www.futebolgratis.com.br

Questões para reflexão:


 De qual assunto geral o texto fala?
 De qual assunto específico o jogador fala?
 Qual é o fato apresentado pelo jornalista?
 Qual é a opinião expressa pelo jogador?
 Qual é a SUA opinião sobre o que o jogador disse?
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DISCUSSÃO EM GRUPO: Todo texto tem um propósito comunicativo e


interacional, de modo que a subjetividade do autor fica, muitas vezes, implícita nas
teias linguísticas do texto. Os pontos de vista expressos ou subjacentes podem estar
servindo para defender, argumentar ou criticar algum fato ou a postura de alguém. No
trecho apresentado, destacamos os seguintes excertos que apresentam opiniões do
jogador:

Prefiro que o Ronald (filho do atacante) seja criado na Espanha


Aqui no Brasil, as crianças da idade dele, de 9 anos, já tem um palavreado malandro.
É um doce de menino, praticamente um europeu.

Vamos observar então: QUE MARCAS LINGUÍSTICAS SÃO RESPONSÁVEIS PELO TOM
OPINATIVO DO TEXTO? DE QUE MANEIRA ISSO É CONSTRUÍDO NA INTERAÇÃO COM O
LEITOR ATIVO?

PESQUISA NA VIDA SOCIAL


Realizar uma coleta de textos de jornal ou em redes sociais cuja opinião do/a
produtor/a esteja subjacente nos mecanismos linguísticos discutidos acima.
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TÓPICO 3- LEITURA ATIVA, ANALÍTICA E CRÍTICA

PRÁTICA DE PESQUISADOR: DIÁLOGOS TEÓRICOS


___________________________
Leitura e leituras

● O que é a leitura?

A leitura é uma prática social que remete a outros textos e a outras leituras. O
momento da leitura é quando “colocamos em ação todo o nosso sistema de
valores, crenças, atitudes que refletem o grupo social em que se deu nossa
sociabilização primária, isto é, o grupo social em que fomos criados” (Ângela
Kleiman, 2000:10).

Vamos ver o que Lucília Garcez nos fala sobre LEITURA? _________

A leitura é um processo complexo e abrangente de decodificação de signos e de


compreensão e intelecção do mundo que faz rigorosas exigências ao cérebro, à
memória e à emoção. Lida com a capacidade simbólica e com a habilidade de
interação mediada pela palavra. É um trabalho que envolve signos, frases, sentenças,
argumentos, provas formais e informais, objetivos, intenções, ações e motivações.
Envolve especificamente elementos da linguagem, mas também os da experiência de
vida dos indivíduos. (GARCEZ, 2004, p. 19)

Para Lucília Garcez, a leitura e a escrita são processos vinculados, pois nossa
25

maneira de ler e nosso convívio com os/as autores/as de textos influenciam nosso
modo de escrever, incluindo nosso estilo de escrita. Ao convivermos socialmente em
diferentes experiências, relações e trocas sociais, é possível observar a relação entre os
textos que circulam na sociedade e o que chamamos de GÊNERO TEXTUAL ou os
GÊNEROS TEXTUAIS presentes e atuantes em cada situação.
Essa é uma importante observação para compreendermos nossa vida social e
também para praticarmos uma postura crítica diante dos gêneros que circulam,
trabalhando para mudança social a fim de vivermos em uma sociedade mais justa e
solidária. Por exemplo, podemos observar o crescimento de cartazes e outdoors
espalhados pelas grandes metrópoles com diversas propagandas de escolas
particulares de ensino médio que priorizam um modo de encarar o mundo como uma
grande arena de competição com foco apenas na entrada na universidade, perdendo o
foco no ensino-aprendizagem e na formação cidadã. Como exemplo, podemos listar
frases do tipo: “Com nossa equipe, você chega em primeiro lugar”, “Da escola direto
para a universidade”, “Você: convocado para seu futuro”. Essa forma de ver a vida
social é expressa por meio da linguagem, o que nos convida, como especialistas da
área, a olhar de modo mais profundo para essa leitura. É necessário LER como esse
gênero textual ‘propaganda’ está na atualidade, cada vez mais, a serviço de discursos
que marcam relações sociais com valores baseados em desigualdade e divisão entre
quem está ‘dentro’ e quem está ‘fora’, gerando uma série de consequências para
nossa vida social. Dessa forma, podemos ‘ler’ esse texto muito além do que apenas as
palavras coerentes e sintaticamente coesas representam. Podemos observar que a
publicidade dessa época atual da sociedade valoriza determinadas ideologias antes
não imaginadas, como competição no meio escolar, exclusão, separação etc. É a esse
tipo de leitura trimembrada que chamamos de LEITURA ATIVA, LEITURA ANALÍTICA E
LEITURA CRÍTICA.

Quem é Lucília Garcez?


Lucília Helena do Carmo Garcez foi professora da nossa Universidade de Brasília, é
doutora em Linguística Aplicada e pesquisadora da área de leitura e escrita. É
escritora e conta com inúmeras obras publicadas entre romances, crônicas, biografias,
26

livros de literatura infanto-juvenil e obras didáticas. Para compartilhar com vocês,


escolhemos a obra “Técnica de redação: o que é preciso para bem escrever”. O
capítulo específico sobre a LEITURA está disponível em sua forma completa em
<https://pt.scribd.com/document/283134965/06-Capitulo-3-A-Qualidade-Da-
Leitura>.

Fotografia de sala de aula____________________________________

Propaganda do cartão de crédito VISA (com adaptações):

PODE DAR ÁGUA NA BOCA.


PODE DAR BRILHO NOS OLHOS.
VISA. TUDO QUE VOCÊ PRECISA.

A compreensão de texto é um processo complexo em que interagem diversos


fatores como conhecimentos linguísticos, conhecimento prévio a respeito do
assunto do texto, conhecimento geral a respeito do mundo, motivação e interesse
27

pela leitura, entre outros. Nessa propaganda do cartão de crédito Visa, por
exemplo, as imagens despertam na imaginação do leitor evocações da infância
orientadas para época de Natal, o que nos diz em que contexto temporal essa
propaganda circulou, qual foi seu público alvo e em que tipo de revista ela foi
veiculada. Vamos discutir sobre isso? E as cores das frases? São as mesmas cores
do cartão. Como nada no meio publicitário é por acaso (nem em outras esferas,
como na política e até na educação), podemos visualizar como o poder da
linguagem em interação com as imagens é capaz de, primeiramente, estabelecer
um diálogo com o interlocutor (observe que as frases usadas são do senso
comum); e, posteriormente, esse poder é capaz de interagir com o leitor,
convencendo, persuadindo, ditando normas etc.

A leitura é, pois, um instrumento de luta e de conscientização, que pode ser usado


ou não.

O que é preciso para ler de forma eficiente? Como interagimos com o texto a
partir da leitura?
Alguns FATORES DE TEXTUALIDADE são fundamentais para que o/a leitor/a possa
assumir o papel analítico da leitura. São eles:
1- Conhecimento linguístico: é preciso saber a língua e as normas linguísticas
básicas como vocabulário, relação entre as frases e os parágrafos (coesão),
organização sintática e semântica do texto e o gênero textual. Para essa etapa,
o uso do dicionário e da gramática pode ajudar bastante.
2- Conhecimento prévio: para desenvolver sua competência de leitura, você deve
estar atento/a ao/à autor/a do texto, investigando quem é essa pessoa, qual é
sua área ou sua linha de pesquisa e procurar uma breve biografia. Essa simples
tarefa contribui muito para sua aproximação com o texto.
3- Conhecimento partilhado: aqui é importante você se lembrar de que vivemos
em sociedade, partilhando valores, crenças e maneiras de ver o mundo.
Perguntas que podem ajudar são: Esse texto é de que época da sociedade?
Quais eram os valores dessa época? O que mudou após esse tempo da escrita
desse texto? Qual é a minha posição social e política diante desse tema? Ou
28

ainda, quais são as outras posições ou outras abordagens para tratar desse
tema?
4- Intertextualidade: os textos sempre trazem marcas de outros textos, pois no
processo de produção textual estão presentes os pressupostos, as inferências,
as referências explícitas e implícitas (como as citações) e há também as vozes
que se inserem nos textos (um/a autor/a se refere a outros/as autores/as). A
intertextualidade evidencia o diálogo entre textos e está relacionada com os
conhecimentos partilhados e os conhecimentos linguísticos. Ou seja, é preciso
considerar no texto o que é textual e o que é contextual. Esse conhecimento
será mais explorado adiante, pois é muito útil para a leitura e escrita de
gêneros acadêmicos.

INTERTEXTUALIDADE E PLÁGIO:
É possível manter a integridade e a originalidade de nossos textos acadêmicos,
respeitar a autoria da fonte dos textos-base, recorrer a intertextos como
argumentos de autoridade, indicar o que está sendo discutido sobre o tema por
outros sujeitos autores sem incorrer em plágio (KROKOSCZ, 2012). Para isso,
fazemos uso das operações de intertextualidade explícita, ou seja, “dialogamos”
com textos alheios citando devidamente a fonte das relações intertextuais
realizadas. (VIEIRA & RESENDE, 2019, p. 35)

Nessa experiência, podemos constatar que a leitura não é um procedimento


simples. Ao contrário, é uma atividade extremamente complexa, pois não podemos
considerar apenas o que está escrito.
Como a leitura faz inúmeras solicitações simultâneas ao cérebro, é necessário
desenvolver, consolidar e automatizar habilidades muito sofisticadas para pertencer
ao mundo dos que lêem com naturalidade e rapidez. Trata-se de um longo e
acidentado percurso para a compreensão efetiva e responsiva, que envolve:
29

 decodificação de signos;
 interpretação de itens lexicais e gramaticais; agrupamento de palavras em
blocos conceituais;
 identificação de palavras-chave;
 seleção e hierarquização de ideias;
 associação com informações anteriores;
 antecipação de informações;
 elaboração de hipóteses;
 construção de inferências;
 compreensão de pressupostos;
 controle de velocidade;
 focalização da atenção;
 avaliação do processo realizado;
 reorientação dos próprios procedimentos mentais.

Vamos analisar algumas dessas habilidades.

Quais são os recursos para realização de uma leitura ATIVA?

Um leitor ativo considera os recursos técnicos e cognitivos que podem ser


desenvolvidos para uma leitura produtiva. A leitura não se esgota no momento em
que se lê. Expande-se por todo o processo de compreensão que antecede o texto,
explora-lhe as possibilidades e prolonga-lhe o funcionamento além do contato com o
texto propriamente dito, produzindo efeitos na vida e no convívio com as outras
pessoas.
Há procedimentos específicos de seleção e hierarquização da informação como:
 observar títulos e subtítulos;
 analisar ilustrações;
 reconhecer elementos paratextuais importantes (parágrafos, negritos,
30

sublinhados, deslocamentos, enumerações, quadros, legendas etc.);


 reconhecer e sublinhar palavras-chave;
 identificar e sublinhar ou marcar na margem fragmentos significativos;
 relacionar e integrar, sempre que possível, esses fragmentos a outros;
 decidir se deve consultar o glossário ou o dicionário ou adiar temporariamente
a dúvida para esclarecimento no contexto;
 tomar notas sintéticas de acordo com os objetivos.

Há também procedimentos de clarificação e simplificação das ideias do texto como:


. construir paráfrases mentais ou orais de fragmentos
complexos;
. substituir itens lexicais complexos por sinônimos familiares;
. reconhecer relações lexicais / morfológicas / sintáticas.

Utilizamos ainda procedimentos de detecção de coerência textual, tais como:


. identificar o gênero ou a macro-estrutura do texto;
. ativar e usar conhecimentos prévios sobre o tema;
. usar conhecimentos prévios extratextuais, pragmáticos e da estrutura do gênero.

Um leitor maduro usa também, frequentemente, procedimentos de controle e


monitoramento da cognição:
. planejar objetivos pessoais significativos para a leitura; controlar a atenção
voluntária sobre o objetivo;
. controlar a consciência constante sobre a atividade mental; . controlar o
trajeto, o ritmo e a velocidade de leitura de acordo com os objetivos
estabelecidos;
. detectar erros no processo de decodificação e interpretação;
. segmentar as unidades de significado;
. associar as unidades menores de significado a unidades maiores;
. auto-avaliar continuamente o desempenho da atividade; . aceitar e tolerar
temporariamente uma compreensão desfocada até que a própria leitura desfaça
a sensação de desconforto.
31

Alguns desses procedimentos são utilizados pelo leitor na primeira leitura, outros
na releitura. Há ainda aqueles que são concomitantes a outros, constituindo uma
atividade cognitiva complexa que não obedece a uma sequência rígida de passos. É
guiada tanto pela construção do próprio texto como pelos interesses, objetivos e
intenções do leitor.
Como são interiorizados e automatizados pelo uso consciente e frequente, e são
apenas meios e não fins em si mesmos, nem sempre esses procedimentos estão muito
claros ou conscientes para quem os utiliza na leitura cotidiana.

Vamos aprofundar nosso conhecimento acerca de alguns desses procedimentos.

Os tipos de leitura e seus objetivos


O objetivo da leitura determina de que forma lemos um texto. Lemos:
 por prazer, em busca de diversão, de emoção estética ou de evasão;
 para obter informações gerais, esclarecimentos, em busca de atualização;
 para obter informações precisas e exatas, analisá-Ias e escrever um texto
relativo ao tema;
 para estudar, desenvolver o intelecto, em busca de qualificação profissional;
 para seguir instruções;
 para comunicar um texto a um auditório;
 para revisar um texto etc.

Lucília Garcez (p. 30) nos orienta do seguinte modo sobre os tipos de leitura:
“Se lemos um jornal, por exemplo, apenas para saber se há alguma novidade
interessante, empreendemos uma leitura do geral para o particular (descendente):
olhamos as manchetes, fixamos alguns parágrafos iniciais, passamos os olhos pela
página, procurando um ponto de atração, e quando o encontramos fazemos um outro
32

tipo de leitura: do particular para o geral (ascendente).


No primeiro tipo somos superficiais, velozes, elaboramos rápidas hipóteses que
não testamos, fazemos algumas adivinhações. No segundo tipo de leitura somos mais
detalhistas, queremos saber tudo, procuramos garantir a compreensão precisa, exata.
Um leitor maduro distingue qual é o momento de fazer uma leitura superficial e
rápida (descendente) daquele em que é necessária uma leitura detalhada,
desacelerada (ascendente), mesmo quando está trabalhando ou estudando. Pois,
mesmo quando estuda, há momentos em que você pode dispensar certos textos, ou
partes de textos, que já são conhecidos.”

PRÁTICA DE PESQUISADOR: DIÁLOGOS TEÓRICOS _________________

A qualidade da leitura

● O que é a leitura?
√A leitura não é um procedimento simples, uma vez que não se pode
considerar apenas o que está escrito. O que não está dito pode falar muito mais
alto do que aquilo que está registrado.
√A compreensão de texto é, assim, um processo complexo em que interagem
diversos fatores como conhecimentos linguísticos, conhecimento prévio a
respeito do assunto do texto, conhecimento geral a respeito do mundo,
motivação e interesse pela leitura, entre outros.

● pos de leituras
1) leitura descendente: leitura do tipo geral para o particular. Um exemplo
seria o ‘passar os olhos’ pelo capítulo do livro ou pelo artigo acadêmico,
quando prestamos atenção ao título e subtítulos, por exemplos e nos
33

parágrafos inicias e finais. Não lemos efetivamente e com a acuidade


necessária o texto. É uma leitura mais geral, menos pormenorizada. Espécie de
‘varredura’ do texto. É uma leitura fluente e veloz. Não obstante, tenta
excessivamente adivinhar ideias sem confirmá-las. Há uma valorização dos
conhecimentos prévios do leitor em detrimento dos conhecimentos oferecidos
pelo texto.
2) leitura ascendente: leitura do tipo particular para o geral. Um exemplo seria,
ao ler esse mesmo texto, o momento em que se pára e se lê, minuciosamente,
um determinado artigo. Aqui se é mais detalhista. Busca-se a compreensão
exata (se é que esse tipo de ‘exatidão’ existe, quando se fala em leitura!)
daquilo que se leu. Para auxiliar nesse tipo de leitura, podemos contar com
técnicas como sublinhar o texto e fazer esquemas, como veremos adiante.
OBSERVAÇÕES:
- Um leitor maduro sabe quando sua leitura deve ser ascendente ou
descendente, de acordo com seus objetivos. O bom leitor sabe, na verdade,
quando e como mesclar essas duas formas de leituras, uma vez que se pode
fazer uma primeira leitura, descendente, de um texto e, em seguida, uma
leitura ascendente do mesmo texto.

● Níveis de leitura:
√Textual: é o nível linguístico por excelência. Consiste no domínio da língua,
isto é, do vocabulário, da estrutura sintática e da semântica do texto.
√Contextual: consiste na apreensão ideológica, para onde o/a autor/a conduz
os/as leitores/as, o que ele/a quer enfatizar, quem é ele/a socialmente, em que
contexto está inserido.
√ Intertextual: reflete o lastro cultural de quem escreve e de quem lê. Ele é
resultado de leituras e vivências variadas e ricas. Sem esse domínio, corre-se o
risco de se fazer uma leitura superficial do texto.

ROTEIRO DE LEITURA: aqui você tem orientações claras e precisas sobre


como ler um texto de forma mais eficiente
34

● Antes da leitura
√Contextualização da leitura.
√Identificação do vocabulário, da organização das frases, do tipo de texto e
do gênero textual (poema, texto jornalístico, científico, bulas,
entretenimento, etc.).
√Definição dos objetivos da leitura (leitura-busca-de-informações, Leitura-
estudo-do-texto, leitura-do-texto-pretexto, leitura-fruição-do-texto, leitura
pública, coletiva, etc.).
√Pergunte-se: quem é o/a autor/a? Por que vou ler o texto? Sobre o que fala
o texto? A quem se destina? Onde é veiculado? O que eu já sei sobre o
tema?
√Observação de títulos e subtítulos, ilustrações, capa, contracapa,
‘orelhas’, índice, ficha bibliográfica etc.
√Reconhecimento de elementos paratextuais (parágrafos, negritos,
sublinhados, quadros, legendas, enumerações, etc.)
√Busca de divisões do texto: Em primeiro lugar..., Inicialmente/a seguir...,
por um lado/por outro lado, a primeira questão é..., etc. Em suma, é
fundamental observar a hierarquização das informações no texto.
√Note que toda leitura demanda uma postura: ler sentado, em pé, deitado,
em silêncio, em voz alta, ouvindo música baixa, mais relaxado, com mais
atenção, etc. Essa postura é determinante do modo como você vai interagir
com o texto.

● Durante a leitura
√Decodificação dos signos; interpretação; identificação de palavras-chave;
seleção e hierarquização de ideias; associações/intertextualidade;
elaboração de hipóteses; construção de inferências; compreensão de
pressupostos; controle de velocidade; focalização da atenção; reorientação
35

dos procedimentos mentais.


√Reconheça e sublinhe4 palavras-chave, as quais ajudarão a elaborar um
esquema e consequentemente uma síntese das principais ideias do texto.
√Identifique e marque na margem fragmentos interessantes.
√Auto-avalie continuamente o desempenho da atividade.
√Aceite e tolere temporariamente uma compreensão desfocada até que a
própria leitura desfaça a sensação de desconforto.
√Investigue: Onde e de que maneira a subjetividade do/a autor/a está
presente (observe as adjetivações)? Há ‘verdades’ naturalizadas no texto
(observe as afirmações categóricas)? Que outras vozes, além da voz do/a
autor/a, ajudam a construir o texto? Como são tratadas ideias contrárias?

● Depois da (primeira) leitura


√Pergunte-se: que opinião/enredo se mostra ali? Quais informações novas o
texto traz? O que é fundamental ali? É um bom texto? Merece ser relido
para ser melhor compreendido?
√Faça conexões com outras leituras – intertextualidade.
√A intertextualidade pode se dar por meio da alusão (referência rápida) e
pela citação textual.
√As citações podem ser textuais (transcrições), contextuais ou livres
(paráfrase ou resumo de um trecho anterior, com indicação de fonte, mas
sem uso de aspas), epígrafes (citações especiais no começo de uma
obra/artigo, etc.), paráfrases (reprodução de ideias de um texto por meio de
outro texto).
√Decida se vai consultar o dicionário naquele momento; é importante
observar que nem sempre é necessário recorrer a ele, pois os significados de
alguns vocábulos podem ser inferidos no contexto em que se encontram.
Observe sempre prefixos, sufixos, radicais, parentesco das palavras como
forma de auxílio na decodificação de um signo.
√ Construa paráfrases mentais.

4
É claro que você não vai riscar um livro que não lhe pertence! E, mesmo que seja seu, nunca o risque
a caneta.
36

√Atente para os implícitos, as ironias e as relações que se podem estabelecer


com o mundo real.
√O bom leitor, ao final da leitura do texto, será capaz de avaliar-sintetizar-
aplicar o que leu com atenção-intenção-reflexão.

● Consequências da leitura ativa


√Internalização de estruturas linguísticas e suas infinitas possibilidades
estilísticas.
√Consolidação e compreensão dos gêneros textuais.
√Enriquecimento da memória.
√Desenvolvimento do senso crítico.
√Ampliação da bagagem cultural.

Preste atenção!
√A leitura não se esgota no momento em que se está examinando o texto.
Expande-se, isto sim, por todo o processo de compreensão que
antecede/sucede o texto. Sugerimos que você faça a leitura do texto e só
depois de alguns dias você faça a tarefa solicitada por seu/sua professor/a. É
importante “carregar”, “amadurecer” o conteúdo desse texto com você por
algum tempo.
√Uma boa leitura depende de muitas leituras anteriores.
√Por meio das palavras-chave, notas, pode-se, com mais facilidade, elaborar
um resumo/paráfrase do texto lido.
√Uma única leitura nem sempre é suficiente! Você é quem definirá quantas
leituras deverão ser feitas do texto.
√A leitura não é um processo passivo, a leitura é ativa, a partir dela você
entra em interação com o texto.
√Só será possível fazer uma crítica do texto se ele tiver sido bem
37

compreendido por você.

No exemplo a seguir, trazemos um trecho de um texto acadêmico. Trata-se de um


capítulo de livro. Observe atentamente as partes que compõe este resumo: veja o
que a autora traz de informação na introdução, no desenvolvimento e na finalização
do seu resumo. Anote.

O USO DO DICIONÁRIO PARA COMPREENSÃO E PRODUÇÃO TEXTUAL


Michelle Machado de Oliveira Vilarinho5
Resumo
O nosso objeto de estudo neste capítulo é o dicionário como uma ferramenta útil
para auxiliar a compreensão e a produção textual. A motivação deste estudo surgiu
diante da percepção do desconhecimento dos discentes das disciplinas Leitura e
Produção de Texto e Português Instrumental 1 da UnB acerca das possibilidades de
consulta ao dicionário. Apresentamos as noções de léxico, signo linguístico, língua,
linguagem, Lexicografia, Lexicologia e Terminologia, relacionando-as. Além disso,
definimos dicionário, enumeramos as características e as funcionalidades que
possuem; diferenciamos dicionário, gramática e enciclopédia; e postulamos nosso
entendimento sobre propriedade vocabular. O método utilizado foi o descritivo.
Como resultado, percebemos que o consulente, ao aprender a ler o dicionário,
torna-se capaz de aproveitar cada recurso linguístico disponível na obra, de modo
que pode produzir texto com propriedade vocabular e pode compreender melhor

5
Professora do Departamento de Linguística, Português e Línguas Clássicas (LIP) da Universidade de Brasília
(UnB), doutora em Linguística pelo Programa de Pós-Graduação em Linguística da UnB (PPGL).
38

os significados dos signos linguísticos.


Palavras-chave: Dicionário. Propriedade vocabular. Produção e compreensão de
texto.
1 Introdução
O nosso objeto de estudo neste capítulo é o dicionário como uma
ferramenta útil para auxiliar a compreensão e a produção textual. Ao ministrarmos
as disciplinas Leitura e Produção de Textos, Português Instrumental 1 da UnB,
percebemos que o dicionário é uma ferramenta indispensável para o processo de
compreensão e produção textual. Essa percepção motivou a reflexão presente
neste capítulo, o qual está dividido em 4 seções. A primeira introduz brevemente a
pesquisa. A segunda apresenta as noções de léxico, signo linguístico, língua,
linguagem, Lexicografia, Lexicologia e Terminologia, relacionando-as. A terceira
define dicionário; enumera as características e as funcionalidades que possuem;
diferenciamos dicionário, gramática e enciclopédia; e postula nosso entendimento
acerca da propriedade vocabular. A quarta conclui as ideias discutidas nas seções
anteriores.

PRÁTICA DE PESQUISADOR: DIÁLOGOS TEÓRICOS __________________

LEITURA ANALÍTICA
TEXTUALIDADE: COESÃO E COERÊNCIA

Fatores de textualidade: o que faz um texto ser um TEXTO?

Todo texto precisa ser coeso e coerente para ter unidade, não é verdade?
39

Um texto que não gira coerentemente em torno de um tema é como um carro


desalinhado. Sentimos isso quando lemos um texto e temos dificuldade de identificar
sua temática.
A coesão e a coerência em um texto são fatores muito importantes de textualidade.
Ou seja, é o que faz de um texto que ele, de fato, seja um texto, que ele faça sentido.
Podemos comparar esses mecanismos com uma rede de pescador de modo que todos
os fios são tecidos e são interligados para que a rede seja eficaz na sua tarefa de pescar
peixe.

Sobre a habilidade de relacionar as partes de um texto, chamamos a atenção


para as substituições, repetições, apagamentos que contribuem para que o texto não
fique mal construído, para que tenha fluência e sentido. Essa é a habilidade de
estabelecer relações entre as partes de um texto, identificando repetições ou
substituições que contribuem para a continuidade de um texto.

É O QUE CHAMAMOS DE COESÃO REFERENCIAL

Verificamos também a necessidade de juntar orações, parágrafos por meio de


ligações adequadas. Em um texto, acrescentamos ideias (conjunção “e” é muito usada
para isso), apresentamos oposições (“mas”, “porém”, “contudo”, “todavia”,
“entretanto”), explicamos algumas coisas (“porque”, “pois”), concluímos pensamentos
(“então”, “portanto”, “desse modo”) e assim por diante. Cada uma dessas expressões
possui seu valor semântico. Imaginemos uma cidade, sem as estradas, os cruzamentos,
os semáforos, as esquinas e tudo mais que faz com que os locais se cruzem e se
comuniquem. Seria um caos, não seria? Como a Dona Regina iria à igreja, sem
atravessar a rua e “dobrar” duas esquinas à direita? Enfim, (“enfim” está introduzindo
uma conclusão), todos nós precisamos desses conectores para nos comunicar melhor e
para produzir textos mais sofisticados a fim de atender à demanda da vida acadêmica.
40

Essa é a habilidade de estabelecer relações sócio-discursivas presentes no texto,


marcadas por conjunções, advérbios, etc.

É O QUE CHAMAMOS DE COESÃO SEQUENCIAL

Falando sobre coesão:


√ A coesão textual representa os laços de citações entre os elementos constituintes de
um texto, os quais ajudam a tecer um texto harmonioso, uma rede bem urdida de
relações gramaticais e de significado.
√ Representa as relações de sentido existentes no interior de um texto que o definem
como tal. (Halliday & Hasan – 1976)
√ A coesão ocorre quando a interpretação de algum elemento do discurso é
dependente da de um outro. (Halliday & Hasan – 1976)
√ A coesão é uma qualidade do texto escrito, intimamente ligada à estruturação da
frase.
√ Um texto coeso é aquele que permite leitura fluente, porque as relações de sentido
formuladas na frase, entre as palavras, estão sempre evidentes ao leitor. Em frases
curtas geralmente as relações de sentido são claras, mas, em construções frasais mais
complexas (de que necessitamos para argumentar), essa imediaticidade passa a ser
mais difícil.
Podemos falar em algumas estratégias de coesão. No entanto, cada autor trata o tema
de uma forma. Não há unanimidade na seara da nomenclatura. Os nomes abaixo,
portanto, darão uma boa ideia do que se discute acerca do tema:
1) Coesão referencial: citação de outros elementos dentro do próprio texto –
pronomes pessoais, possessivos, demonstrativos, advérbios. Podem se dar por
antecipação ou por elementos que serão citados na sequência do texto.
Exemplos: A mulher criticava duramente todas as suas decisões. Isso o aborrecia
profundamente. / Ontem fui conhecer a nova casa de Alice. A minha é novinha em
folha. / O homem subiu correndo os três lances de escadas. Lá em cima, ele parou
diante de uma porta e bateu furiosamente.
41

2) Coesão lexical: reutilização intencional de palavras pelo uso de sinônimos ou,


ainda, pelo emprego de expressões equivalentes para substituir elementos já
conhecidos pelo leitor.
Exemplos: O avião ia levantar vôo. A aeronave fazia um ruído ensurdecedor. / O
desembargador viajou para o exterior. O magistrado levou consigo os documentos que
o auxiliarão no processo.

3) Coesão por elipse: omissão de elementos facilmente identificáveis ou que já foram


citados anteriormente. Essa omissão pode vir marcada por uma vírgula. Pronomes,
verbos, nomes e frases inteiras podem estar implícitos.
Exemplos: Os convidados chegaram atrasados. Ø Tinham errado o caminho e custaram
a encontrar alguém que os orientasse. / Asse esse frango até ficar dourado. Coloque
(Ø) em uma travessa enfeitada com pêssegos e rodelas de abacaxi. / Fernando Collor
não cumpriu o mandato estabelecido. Ø Tomou dinheiro público emprestado e não
devolveu.

4) Coesão por substituição: substantivos, verbos, períodos podem ser substituídos


por conectivos ou expressões que resumem ou retomam o que já foi dito.
Exemplos: Pedro comprou um carro novo. José também. / O professor acha que os
alunos não estão preparados, mas eu não penso assim. / Minha prima comprou um
Gurgel. Eu também quero um.

Fotografias de sala de aula_______________________________________

Ao observarmos uma partida de futebol narrada pelo rádio, nos deparamos


com a ausência de elementos coesivos no texto em foco. Se reescrevermos um trecho
utilizando diferentes estratégias de coesão ficaria mais ou menos assim:
Transcrição da narração:
“Diego chutou a bola muito forte... Fora. Tales recomeça, Diego, Ricardo, Tales, aí a
42

torcida se mexe, Tales corre com a bola, aí ta bonito, então chega perto, aí Kakinho
derruba e aí o juiz apita e dá falta”.

Texto reescrito:
“Diego chutou a bola muito forte e ela foi para fora do campo. Tales recomeça, mas
passa a bola para Diego que chuta para Ricardo. O capitão lança finalmente para
Tales. Nesse momento, a torcida se mexe. Tales corre com a bola, corre bonito,
quando vai se aproximando do gol, Kakinho o derruba. O juiz, então, apita e dá a
falta”.

AGORA É COM VOCÊS:


Observem a transcrição de um trecho de uma PARTIDA DE FUTEBOL apresentada no
rádio referente à final da Copa do Mundo de 1958. Reescrevam utilizando as
estratégias de coesão estudadas:
Jogo: Final da Copa do Mundo de 1958
Brasil 5 x 2 Suécia
Narração Edson Leite
Tempo: 00:56
No meu crônometro faltam 10 segundos, bola longa para a área brasileira fica na
esquerda agora com Orlando, Orlando para Pelé, Pelé domina no peito de
calcanhar para Zagallo, Zagallo prepara-se tem Pelé, levantou a Pelé entrou de
cabeça para o arco é GOOOOLLLLLLLLLL (4 segundos) Pelé com uma cabeçada
extraordinária marca o 5º gol do Brasil, Brasil campeão mundial de futebol, 2 gols
de Vavá, 2 gols de Pelé, 1 gol de Zagallo, vitória de marca no escrete brasileiro,
Brasil pela 1º vez se pode dizer, CAMPEÃO REALMENTE DO MUNDO em 1958.

ATENÇÃO: Pode haver textos destituídos de elementos de coesão, mas cuja


textualidade se dá no nível da coerência, como em:
43

“Triste poema para uma mulher criança. Ugo Giorgetti, uma festa de humor bandido.
Premiação. ‘Flores’, única unanimidade. O arraso de Magic Slim. Tite de Lemos. Diana
Pequeno em nova fase canta autores inéditos. “Matogrosso”, a ecoópera de Philip
Glass. Duplas feitas e desfeitas. Retratos de Chet quando jovem. Ney Matogrosso, a
aguda inteligência trabalha ao vivo. Quando o bem sempre triunfava sobre o mal.
Romances do tempo em que se perdia a cabeça. Autor que inspirou Machado. Reflexos
de São Paulo em Amsterdã. Veja no Caderno 2 de “O Estado de São Paulo”, hoje.”

O texto parece um conjunto aleatório de referências até que a última sequência


possibilita estabelecer uma relação entre todos os enunciados anteriores, unificando-
os num só sentido.

Falando sobre coerência:


REFLEXÃO EM GRUPO: afinal o que significa “dar sentido” aos textos? Significa
entender o que o/a autor/a do texto está querendo dizer ao escrever determinadas
palavras, certo? Não é bem por aí... Digamos que seja muito mais do que isso...
Entender o que o autor do texto diz está ligado apenas à habilidade de ler um texto de
forma a entender as informações explícitas. Para ler um texto para entender as
inferências e para compreender sobre o que se fala, como se fala e quais são as
opiniões e os fatos ali propostos, significa construir um sentido junto com o autor para
aquele texto. Ou seja, é o/a leitor/a que dá sentido às palavras do autor, a coerência
não está presente apenas no texto em si, mas está sim, no contexto e na interação
entre que produziu e quem leu o texto.

Quantos diálogos entre os/as alunos/as e professor/a dentro da sala de aula não são
textos representativos das habilidades de interpretação necessárias para a interação?
44

Quando o professor fala “Como está quente hoje, não?” e um aluno se


levanta e abra a porta, por exemplo, é preciso que o aluno faça uma inferência de
uma informação implícita na fala do professor. Em outras palavras, a coerência deste
texto está no contexto extra-textual e no não dito também.

Compreender textos é construir sentidos em conjunto. Trata-se de habilidades


que vamos adquirindo em nossa vida como um todo e não na nossa vida escolar. É a
isso que chamamos de COMPETÊNCIA LINGUÍSTICA: a capacidade de o sujeito agir e
interagir linguisticamente de modo adequado em diferentes situações.

COESÃO: Vamos refletir mais?

O que você vê no texto abaixo?

A partir das estratégias de coesão, vamos explicitar alguns recursos por meio dos quais
se pode construir a coesão de um texto:
45

● Epítetos: constituem a palavra ou frase que qualifica pessoa ou coisa. Ex.: Fernanda
Montenegro participou do Festival de Cinema de Brasília. Na ocasião, a grande dama
do teatro brasileiro fez severas críticas à ação do governo na área cultural.
● Nominalizações: ocorrem quando se emprega um substantivo que remete a um
verbo enunciado anteriormente. Ex.: Cientistas americanos descobriram a origem do
vírus ebola. Tal descoberta facilitará os trabalhos das autoridades governamentais.
● Palavras ou expressões (quase) sinônimas. Ex.: O trabalhador tem dificuldade para
exercitar a realidade digital do computador. Por isso, ensinar computação,
especialmente para esses assalariados, é ensinar a mexer na máquina, mas sobretudo
a entender o que ela pode fazer.
OBS.: é importante, durante a revisão do texto, substituir termos repetidos. Utilize um
bom dicionário nesta missão!
● Pronomes: Ex.: O Presidente falou acerca do pacote econômico que entrará em vigor
no próximo mês. / O certo é que o artista e o burocrata são inseparáveis. Este
determina aquele. / Esteróides trazem prejuízos incalculáveis à saúde. Por isso, os
esportistas não devem ingeri-los sem critérios.
● Numerais: Ex.: É preciso combater a situação de desigualdade em que vive a
população brasileira. Mais de dois terços se encontram na miséria absoluta.
● Advérbios pronominais (aqui, lá, aí, etc.): Ex.: Visite o Templo da Boa Vontade. Lá,
pessoas de diversas orientações religiosas pedem pela paz no mundo.
● Articuladores lógicos – [Veremos melhor essas relações em aula específica sobre o
tema.]
OBS.: há outras formas de se estabelecer a coesão textual. Vimos apenas alguns
recursos para que tomemos consciência da importância desses elementos no texto,
mesmo quando estão elípticos!

√ As estratégias vistas acima se situam, no geral, no grupo da COESÃO REFERENCIAL


ou aquela em que um componente da superfície do texto faz remissão a outro/s
elemento/s do universo textual, isto é, dentro do texto - endoforicamente.
√ A remissão para frente chama-se CATÁFORA e é realizada principalmente por meio
de demonstrativos ou nomes genéricos e enunciam ideia que serão desenvolvidas no
46

texto (Ex.: ‘Isto ela sabia: que o exame a reprovaria’ – O demonstrativo ‘isto’ é
elemento catafórico naquele contexto).
√ Já a referência para trás se chama ANÁFORA, uma vez que se refere ao que já foi dito
no texto (Ex. ‘João e Maria são personagens de histórias infantis. Eles em geral
apresentam comportamento humilde.’ – O pronome ‘eles’ faz uma referência
anafórica ali).

√ No entanto, há, ainda, a coesão chamada de COESÃO SEQUENCIAL ou aquela que


estabelece diversos tipos de relações semânticas durante a progressão do texto. Sua
função é fazer progredir o discurso. É também um meio de articular a informação nova
à velha. Vejamos alguns exemplos para que possamos entender como se dá esse
segundo tipo de coesão:
Exemplos: João é, sem dúvida, o melhor candidato. Tem boa formação e apresenta um
consistente programa administrativo. Além disso, revela pleno conhecimento dos
problemas da população. Ressalte-se, ainda, que não faz promessas demagógicas. / A
aluna está atrasada. [Aliás/Também/É verdade que], ela nunca chega na hora.

ATENÇÃO: Pode haver textos destituídos de elementos de coesão, mas cuja


textualidade se dá no nível da coerência, como em:
Luiz Paulo estuda na faculdade de Direito. Fernanda vai todas as tardes
ao fórum, porque ela é estagiária de Direito. Maria fez 75 pontos na
faculdade de Direito. Todos os meus filhos querem ser advogados.

Por outro lado, podem ocorrer sequenciamentos coesivos de enunciados que, porém,
não chegam a constituir textos, por faltar-lhes coerência. É o caso de:

Aquele advogado foi ao fórum, porque haverá audiência de instrução


e julgamento. O fórum possui uma excelente sala de espera. O fórum
foi inaugurado recentemente.
47

Preste atenção: na revisão do seu texto, procure focalizar sua


atenção sobre os itens responsáveis pela coesão textual, para que o seu texto fique
bem urdido e consistente, sem repetições enfadonhas ou omissões que possam tornar
o texto lacunoso.

ALGUNS ELEMENTOS DE COESÃO


realce/inclusão/adição Além disso, ainda, demais, ademais, também, vale lembrar, pois,
outrossim, agora, de modo geral, por iguais razões, em rápidas
pinceladas, inclusive, até, é certo, é porque, é inegável, em outras
palavras, além desse fator
negação/oposição Embora, não obstante isso, de outra face, entretanto, no
entanto, ao contrário disso, por outro lado, por outro enfoque,
diferente disso, de outro lado, de outra parte, contudo,
diversamente disso
afeto/ Felizmente, infelizmente, ainda bem, obviamente, em verdade,
afirmação/igualdade realmente, em realidade, de igual forma, do mesmo modo que,
da mesma sorte, de igual forma, no mesmo sentido,
semelhantemente, bom é, interessante se faz
exclusão só, somente, sequer, exceto, senão, apenas, tão-somente
enumeração/distribuiç em primeiro plano/lugar/momento, a princípio, em seguida,
ão/ depois (depois de), finalmente, em linhas gerais, neste passo, no
continuação geral, aqui, neste momento, desde logo, de resto, em análise
última, por sua vez, a par disso, outrossim, nesta esteira, nessa
vereda, por seu turno, no caso presente, antes de tudo
retificação/exemplific isto é, por exemplo, a saber, de fato, em verdade, aliás, ou antes,
ação ou melhor, melhor ainda, como se nota, como se viu, como se
observa, com efeito, como vimos, a nosso ver, de feito portanto,
(é óbvio, pois)
fecho/conclusão Destarte, em suma, em remate, por conseguinte, em análise
48

última, concluindo, em derradeiro, por fim, por conseguinte,


finalmente, por tais razões, do exposto, pelo exposto, por tudo
isso, em razão disso, em síntese, enfim, posto isso, assim,
consequentemente
Expressões de é de verificar-se que..., não se pode olvidar..., não há olvidar-se...,
transição como se há de verificar..., como se pode notar..., é de ser
relevado..., é bem verdade que..., não há falar-se..., vale ratificar
(cumpre)..., indubitável é..., não se pode perder de vista...,
convém ressaltar..., (posta assim a questão, é de se dizer...),
(registre-se, ainda...), bom é dizer que..., cumpre-nos assinalar
que..., oportuno se torna dizer..., mister se faz ressaltar..., neste
sentido deve-se dizer que..., tenha-se presente que...,
(inadequado seria esquecer, também...), (assinale, ainda, que...),
é preciso insistir no fato de que..., (não é mansa e pacífica a
questão, conforme se verá...), é de opinião unívoca..., (cumpre
observar, preliminarmente, que...), como se depreende..., em
virtude dessas considerações..., (não quer isto dizer, entretanto,
que...), é sobremodo importante assinalar que..., à guisa de
exemplos podemos citar..., no dizer sempre expressivo de..., em
consonância com o acatado, (cumpre obtemperar, todavia...),
(convém ponderar, ao demais que...)

Mais diálogos: coerência

Os textos abaixo parecem claros? Identifique os problemas de coerência:


49

AVISOS AOS PAROQUIANOS


1) Para todos os que tenham filhos e não o saibam, temos na paróquia uma área
especial para crianças.
2) Quinta-feira que vem, às cinco da tarde, haverá uma reunião do grupo de mães.
Todas as senhoras que desejam tornar-se mães, devem dirigir-se ao escritório do
pároco.
3) As reuniões do grupo de recuperação da auto-confiança são às sextas-feiras, às
oito da noite. Por favor, entrem pela porta dos fundos.
4) Na sexta-feira às sete, os meninos do Oratório farão uma representação da obra
“Hamlet” de Shakespeare, no salão da igreja.
Toda a comunidade está convidada para participar desta tragédia.
5) Prezadas senhoras, não esqueçam a próxima venda para beneficência. É uma boa
ocasião para se livrar das coisas inúteis que existem na sua casa. Tragam os seus
maridos!
6) O coro dos maiores de sessenta anos vai ser suspenso durante o verão, com o
agradecimento de toda a paróquia.
7) O mês de novembro finalizará com uma missa cantada, por todos os defuntos da
paróquia.
8) O preço do curso sobre
9) “Oração e Jejum” inclui a alimentação.

Inocência, ingenuidade ou criatividade?


São avisos afixados em portas de igrejas, escritos com boa vontade, porém mal
elaborados.

Entende-se por coerência textual a relação de harmonia que se estabelece


entre as partes de um texto jurídico, constituindo uma unidade significativa. Em outras
50

palavras, um texto coerente é aquele que contém lógica na exposição sequencial dos
fatos, ou seja, apresenta uma introdução, um desenvolvimento e uma conclusão.
Nunca se esqueça de que o texto não é um amontoado de palavras
lançadas sobre o papel. As ideias apresentadas ao receptor devem ter sempre uma
lógica sequencial e progressiva, trazendo ideias novas a cada novo parágrafo de forma
a conduzir corretamente tanto a leitura quanto a reflexão do receptor.

Em resumo, o que é coerência?

Estabelece sentido para um texto.


√ Distingue o texto de um aglomerado de frases.
√ Liga-se à inteligibilidade do texto.

√ É global, e não meramente pontual.


√ Dá unidade/harmonia ao texto.
√ Dá continuidade às ideias de um texto.

Tipos de coerência:
a) Coerência semântica: se refere à relação entre significados dos elementos das
frases em seqüência em um texto (local) ou entre os elementos do texto como um
todo.
Problema de coerência: Roberto tem um belo veículo. É um cavalo árabe puro sangue.
(1ª e 2ª partes são contraditórias)
b) Coerência sintática: se refere aos meios sintáticos para expressar a coerência
semântica como, por exemplo, os conectivos, o uso de pronomes etc. É um
aspecto da coesão que pode auxiliar no estabelecimento da coerência.
Problema de coerência: A felicidade, onde não existem técnicas científicas, faz-se de
pequenos fragmentos... (A coerência poderia ser recuperada construindo-se “A
felicidade, para cuja obtenção não existem técnicas científicas...)
51

c) Coerência estilística: o uso de elementos linguísticos (léxico, tipos de estruturas,


frases etc.) pertencentes ou constitutivos do mesmo estilo ou registro linguistico.
Problema: Prezado Antônio, neste momento quero expressar meus profundos
sentimentos por sua mãe ter batido as botas.

COERÊNCIA versus COESÃO


Coerência Coesão
É subjacente ao texto. Explicita-se por meio de marcas linguísticas.
É fundamental em qualquer texto, pois Não é obrigatória no texto, embora a maior
permite estabelecer relações sintático- parte dos textos tragam elementos coesivos
gramaticais, semânticas e pragmáticas – em sua composição. É apenas um dos fatores
textualidade. de coerência dos textos.
52

Pode haver textos coerentes, mas sem Auxilia no estabelecimento da coerência,


coesão: mas não é garantia de se obter um texto
coerente:
Triste poema para uma mulher criança. Ugo
Giorgetti, uma festa de humor bandido. O Título do livro é uma pergunta que todos
Premiação. ‘Flores’, única unanimidade. O nós devíamos fazer, e a resposta, ou a
arraso de Magic Slim. Tite de Lemos. Diana inexistência de uma, devia estar na ponta da
Pequeno em nova fase canta autores língua de todos os juristas. (Texto de aluno –
inéditos. “Matogrosso”, a ecoópera de Philip trecho de resenha)
Glass. Duplas feitas e desfeitas. Retratos de
Chet quando jovem. Ney Matogrosso, a João vai à padaria. A padaria é feita de
aguda inteligência trabalha ao vivo. Quando tijolos. Os tijolos são caríssimos. Também os
o bem sempre triunfava sobre o mal. mísseis são caríssimos. Os mísseis são
Romances do tempo em que se perdia a lançados no espaço. Segundo a teoria da
cabeça. Autor que inspirou Machado. Relatividade o espaço é curvo. A geometria
Reflexos de São Paulo em Amsterdã. Veja no Ramaniana dá conta desse fenômeno.
Caderno 2 de “O Estado de São Paulo”, hoje, (Marcuschi – 1983)
20/6/89.
A sequência é coesiva, mas não é vista como
O texto parece um conjunto aleatório de coerente, porque não é possível estabelecer
referências até que a última sequência para ela uma continuidade/unidade de
possibilita estabelecer uma relação entre sentido.
todos os enunciados anteriores, unificando-
os num só sentido.

Atenção: ao dizermos que um texto é incoerente, devemos especificar as condições de


incoerência desse texto. Deste modo, o texto será incoerente se seu produtor não
souber adequá-lo à situação, levando em conta intenção comunicativa, objetivos,
destinatário, regras socioculturais, outros elementos de situação, uso dos recursos
linguisticos, etc.
53

ALGUNS FATORES DE COERÊNCIA DE UM TEXTO:


a) Conhecimento de mundo: É a partir dos conhecimentos que temos que vamos
construir um modelo do mundo representado em cada texto – é o mundo textual.
Exemplo: O morcego entrou pela janela e voejou sobre a sala. De repente, o mamífero
enroscou-se nos cabelos da professora.
b) Conhecimento partilhado: A necessidade de, em uma interlocução, produtor e
receptor de um texto terem uma parcela de conhecimentos comuns.
Exemplo: Depois do tango, chegou a vez do fado. Na Arábia. [manchete de caderno de
esportes].
c) Inferências: é a operação pela qual, utilizando seu conhecimento de mundo, o
receptor (leitor/ouvinte) de um texto estabelece uma relação não explícita entre
dois elementos (normalmente frases ou trechos) do texto que ele busca
compreender e interpretar. Às vezes o texto assemelha-se a um iceberg – o que
fica à tona, isto é, o que é explicitado no texto é apenas uma pequena parte
daquilo que fica submerso.
Exemplo: A campainha! / Estou de camisola.
d) Fatores de contextualização: são aqueles que ‘ancoram’ o texto em uma situação
comunicativa determinada. Exemplos: data, local, elementos gráficos, título etc.
e) Situacionalidade: Refere-se tão-somente à adequação do texto ao contexto no
qual ele esteja inserido. A adequação inclui, por exemplo, grau de formalidade,
variedade dialetal, tratamento a ser dado ao tema etc. Um texto que é coerente
em dada situação pode não sê-lo em outra.
f) Intertextualidade: é a presença (implícita ou explícita) de um texto em outro.
Quando um texto repete expressões, trechos, estilo etc. de outro texto.
Exemplo: Minha terra tem macieiras da Califórnia / onde cantam gaturamos de
Veneza. (Murilo Mendes – Canção do Exílio)
g) Consistência: exige que cada enunciado de um texto seja consistente com os
enunciados anteriores, isto é, que todos os enunciados do texto possam ser
verdadeiros ( não contraditórios) dentro de um mesmo mundo ou dentro dos
54

mundos representados no texto. Um caso de inconsistência é Maria tinha lavado a


roupa quando chegamos, mas ainda estava lavando a roupa.
h) Relevância: exige que o conjunto de enunciados que compõem o texto seja
relevante para um mesmo tópico discursivo subjacente, isto é, que os enunciados
sejam interpretáveis como falando sobre um mesmo tema. Caso contrário, pode
ocorrer a famosa ‘fuga ao tema’.

Coerência da não-contradição: Um texto não pode se contradizer. Ele não pode


registrar fatos que refutem exatamente o que se afirmara anteriormente. O texto
contraditório destrói a si mesmo e a sua própria fundamentação, porque toma como
verdadeiro aquilo que considerou falso e vice-versa. Observe-se como um excerto
jurídico contraditório é incoerente e não possui argumentação sustentável. O texto
jurídico que segue é um fragmento de uma petição inicial. O autor propôs ação de
indenização por danos materiais em virtude de um acidente automobilístico:

O autor é proprietário do veículo marca X, cor branca, ano de


fabricação 1994/1995, placa XXX0000, ocorre que no dia 17.7.2000
transitava pela Avenida Rangel Pestana, sentido centro bairro, faixa da
esquerda, ao atingir a altura do n. 1048, foi atingido pelo veículo da ré,
da marca X, cor verde, ano de fabricação 1994, placa XXX0000, o qual
estava na faixa do meio, que minutos antes foi atingido pelo veículo
Mercedes Bens de placa XXX0000, categoria passageiro/ônibus/C.
Fechada, na sua parte traseira, com o impacto perdeu o controle e
cruzou a via para a esquerda, vale dizer, ficou atravessado no meio da
via, momento em que o veículo do autor estava na faixa da esquerda
vindo a atingir a lateral da frente do lado esquerdo do veículo
conduzido pela ré.

Apesar da árdua tentativa de compreensão do texto acima, percebe-


se que o autor ajuizou uma ação indenizatória de danos materiais, responsabilizando a
ré pela causa do acidente, quando, na verdade, foi o autor quem colidiu com o carro
daquela! Certamente esse texto pode ser reelaborado, com o fim de que o emissor
obtenha êxito em sua demanda.
55

Coesão
sequencial
em texto
acadêmico
ideias

Na mesma
Com base
De acordo Com esta Sob essa linha de Além
Segundo o Consoante nos
com o compreen- perspectiva pensamen- disso, o
autor... o autor... são... estudos de to, o autor
autor... ... autor...
xxxx...
xxxx...

Prática de Pesquisador: mais diálogos teóricos


___________________________
INTERTEXTUALIDADE

Considerada por alguns autores como uma das condições para a existência de
um texto, a intertextualidade se destaca por relacionar "um texto concreto com a
memória textual coletiva, a memória de um grupo ou de um indivíduo específico"
(Mira Mateus et alii, 1983)

Trata-se da possibilidade de os textos serem criados a partir de outros textos. As


obras de caráter científico remetem explicitamente a autores reconhecidos,
garantindo, assim, a veracidade das afirmações. Nossas conversas são entrelaçadas de
alusões a inúmeras considerações armazenadas em nossas mentes. O jornal está
repleto de referências já supostamente conhecidas pelo leitor. A leitura de um
romance, de um conto, novela, enfim, de qualquer obra literária, nos aponta para
outras obras, muitas vezes de forma implícita.
56

A nossa compreensão de textos (considerados aqui da forma mais abrangente)


muito dependerá da nossa experiência de vida, das nossas vivências, das nossas
leituras. Determinadas obras só se revelam através do conhecimento de outras. Ao
visitar um museu, por exemplo, o nosso conhecimento prévio muito nos auxilia ao
nos depararmos com certas obras.

A noção de intertextualidade, da presença contínua de outros textos em


determinado texto, nos leva a refletir a respeito da individualidade e da coletividade
em termos de criação. Neste sentido, Fiorin e Savioli (1996) afirmam:

"Todo texto é produto de criação coletiva: a voz do seu produtor se


manifesta ao lado de um coro de outras vozes que já trataram do mesmo
tema e com as quais se põe em acordo ou desacordo."

Já vimos anteriormente que a citação de outros textos se faz de forma implícita


ou explícita. Mas, com que objetivo?

Um texto remete a outro para defender as ideias nele contidas ou para


contestar tais ideias. Assim, para se definir diante de determinado assunto, o autor do
texto leva em consideração o que os outros "autores" dizem e com eles dialoga no seu
texto.

Intertextualidade na escrita acadêmica

Como escrever o que os outros pensam - CITAÇÃO


• Citação é a “menção”, no texto, de uma informação extraída de outra fonte” (NBR
10520:2001)
• As citações podem ser diretas ou indiretas. As primeiras são transpostas para o texto
tal como se apresentam na fonte; as segundas mantêm o conteúdo do texto original,
mas são escritas com outras palavras, são parafraseadas.
• Transmitir as palavras de alguém é também marcar uma opinião sobre as palavras
que transmitimos.
• O verbo dicendi é tão importante que, ao trocá-lo, você pode virar uma declaração
pelo avesso.
57

Por exemplo: “Sou inocente”, disse.


“Sou inocente”, esclareceu.
“Sou inocente”, insistiu.
“Sou inocente”, alegou.
“Sou inocente”, mentiu.
• A transcrição vai depender de nossa intenção (e até nossa honestidade intelectual!)
diante da voz transcrita.
• A língua padrão escrita estabeleceu um código convencional de sinais para marcar
graficamente as citações. É importante dominá-lo, porque dele depende a clareza do
texto, quanto à separação entre o que dizemos e o que o outro diz.

ATENÇÃO: Ver texto complementar sobre CITAÇÕES em: MEDEIROS, págs.: 186 a 207.

Fotografias de sala de
aula______________________________________________

Na aula de Estilística da Língua Portuguesa da Universidade de Brasília, a


professora levou o seguinte poema para sala de aula e pergunou aos/às estudantes
sobre os intertextos presentes. Que tal seguirmos essa proposta e refletirmos
também? Além desse texto, observe com atenção os diversos gêneros textuais a sua
volta no seu cotidiano e reflita sobre os intertextos presentes.
58

Poema de Amor(trecho)
Claudio Murilo Leal

Quando meu pai foi expulso do Paraíso


viajei no ventre de minha mãe
pelos desertos de um sofrimento sem horizontes.
A morte e o trabalho não me atemorizavam,
pois imaginei obter lugar num escritório
de contabilidade, ou em qualquer firma idônea
que me pagasse um salário razoável.
Imaginei uma vida decente, minha mulher em seus afazeres domésticos,
meus filhos crescendo sadios, estudando num bom colégio.
A morte viria naturalmente, ao fim de uma vida
honrada, quando eu pudesse dizer: dever cumprido.
Meus sonhos não se realizaram.
O meu primeiro irmão assassinou-me
e os demais, um dia, venderam-me como escravo.
Novamente atravessei o deserto
não mais solitário, mas com meu povo.
Buscávamos a terra prometida do Nordeste,
do Amazonas, de Goiás e Canaã.
Eu e meu povo, eu e os cristãos das catacumbas,
das arenas onde leões selavam a nossa sorte.
Eu fellah, pária, negro, bonzo,
eu lázaro, judeu,
morto nos fornos de Auschwitz,
eu crucificado em chamas pelas ruas de Hiroshima e Nagasaki,
eu vietnamita, nordestino, verminado.
Quantas vezes fui morto?
59

REFELEXÃO: Observe a propaganda da Bombril e comente com seus


colegas sobre os intertextos presentes.

Fotografias de sala de aula___________________________________

Vejam os três trechos a seguir que tratam da temática da identidade na pós-


modernidade e faça a seguinte análise com atenção ao elementos destacados no
texto:
1) Como a intertextualidade é tecida ao longo de cada trecho?
2) Quais são os principais verbos ou expressões que introduzem as falas dos
autores?
3) Compare essa maneira de inserir as vozes dos autores e parafrasear seus
escritos com o formato do gênero jornalístico que também articula vozes externas.

HALL, Stuart. A identidade cultural na pós modernidade, 2000.


A questão da identidade tem sido recorrentemente discutida a partir do
reconhecimento de uma mudança nas velhas identidades em declínio e,
60

consequentemente, do reconhecimento de um sujeito moderno fragmentado, não


unificado como até então se analisava.
Essa mudança na concepção de identidades está inserida em um amplo
processo de mudanças centrais nas sociedades modernas. A tese fundamental é a
descentralização das identidades modernas, o que acarreta questões contraditórias,
abordadas por Hall (2000).
O conceito de identidade é bastante complexo e, vem, pouco a pouco, sendo
desenvolvido pela ciência social contemporânea. As três concepções de identidade
propostas por Hall (2000) são as seguintes: (i) sujeito do Iluminismo; (ii) sujeito
sociológico e (iii) sujeito pós-moderno. A primeira concepção baseava-se em um
sujeito centrado e unificado, cujas capacidades racionais emergiam no nascimento do
indivíduo e com ele desenvolviam-se durante toda a sua existência. A identidade da
pessoa era o centro essencial do eu, o que demonstra uma visão individualista do
sujeito e da identidade.
Sob a perspectiva não essencialista de identidade, Hall (2001) destaca que os
indivíduos constroem o mundo e a si próprios por meio de uma identidade
relacional e instável. Sob esta ótica, a resposta à questão “Quem nós somos”
depende dos eventos discursivos dos quais participamos. O autor compreende a
identidade como um ato performativo, entendendo os indivíduos não com base em
alguma essência, mas como sujeitos que se constituem nos discursos e as
identidades como construídas nos eventos discursivos. Assim, a identidade é
sempre um “sujeito-em-processo”, uma constituição que nunca cessa, sendo, por
isso, permeada pela ideia de resistência, de ruptura e de mudança nas
representações discursivas que a configuram.

GIDDENS, Anthony. Modernidade e identidade,2002.


Também Giddens (2002) aborda, em sua obra Modernidade e Identidade,
alguns aspectos norteadores da reflexão que proponho neste trabalho. Segundo ele,
a modernidade é uma cultura do risco em que as certezas da tradição e do hábito
foram substituídas pela dúvida e pela transformação do conhecimento em
hipóteses. Neste contexto, as noções de confiança e risco são particularmente
importantes. A confiança básica está relacionada com um senso precoce de
segurança ontológica, precoce no sentido de ser desenvolvido nos seres humanos em
sua mais tenra infância a partir do relacionamento mais primitivo do homem, qual
seja, o vínculo maternal, ou o vínculo com aquela pessoa que assume o papel
“maternal” de proteção contra ameaças e perigos externos. Quando Giddens se
refere ao risco da vida moderna, não quer com isso dizer que a vida na modernidade
é mais arriscada que em tempos pré-modernos. Para ele, o risco se liga à contínua
construção reflexiva do eu e do conhecimento; isto é, o futuro é constantemente
trazido para o presente por meio da reflexividade, acompanhado da incerteza e da
dúvida.
Desse modo, na ordem da modernidade tardia, a auto-identidade torna-se
reflexivamente organizada, no sentido de que “cada um de nós não apenas ‘tem’,
mas vive uma biografia reflexivamente organizada em termos de fluxo de
informações sociais e psicológicas sobre possíveis modos de vida” (Giddens, 2001:
20). A pergunta “como devo viver” faz parte do projeto reflexivo do eu baseado em
61

narrativas biográficas coerentes, que são continuamente revisadas.

SILVA, Tomás Tadeu, Identidade e diferença, 2000.


A questão da identidade e da diferença está, hoje, no centro da teoria social e
da prática política, e encontra-se “na tensão entre perspectivas essencialistas e
perspectivas não-essencialistas sobre identidade” (Woodward, apud Silva, 2000:
12). Uma visão essencialista busca identificar o que existe de universal (a essência)
nos grupos sociais; ou seja, procura aquilo que não se altera durante o tempo e que é
utilizado para distinguir um grupo de outro. Por outro lado, uma perspectiva não-
essencialista de identidade inclui uma reflexão sobre a diferença, enfatizando o
caráter flexível e fluido das identidades. A identidade é considerada, então, como
construção, como um efeito, instável, fluida, contraditória, inacabada e
fragmentada (Silva,2000).

Neste sentido, é importante destacar que tanto a identidade quanto a diferença


são produtos culturais e sociais; são criações discursivas e são constituídas por meio
da linguagem. A natureza da linguagem que usamos, consequentemente, exerce
implicações nos modos como as subjetividades são construídas e produzidas,
acarretando novas formas de se perceber e de perceber o outro. Segundo Silva
(2000:82):

a afirmação da identidade e a marcação da diferença implicam, sempre, as


operações de incluir e de excluir. Dizer ‘o que somos’ significa também dizer ‘o
que não somos’. A identidade e a diferença se traduzem, assim, em
declarações sobre quem pertence e sobre quem não pertence, sobre quem
está incluído e sobre quem está excluído. Afirmar a identidade significa
demarcar fornteiras, significa fazer distinções (...) está sempre ligada a uma
forte separação entre ‘nós’ e ‘eles’.

Lista de verbos dicendi para produção de textos acadêmicos (ver Paráfrase


adiante):
62

ressalta

define enfatiza

observa destaca

discute assevera
O
autor

sugere afirma

salienta considera

argumenta aponta

Leia o texto a seguir e fique atento à parte de


intertextualidade: Referências Bibliográficas, Citações, Notas, aspas etc. (final do
texto).
***
63

PRÁTICA DE PESQUISADOR: DIÁLOGOS TEÓRICOS _________________

LEITURA CRÍTICA

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E PRECONCEITO LINGUÍSTICO

Esse tópico refere-se às inúmeras manifestações e possibilidades da fala. No


domínio do lar, as pessoas exercem papéis sociais de pai, mãe, filho, avó, tio. Quando
observamos um diálogo entre mãe e filho, por exemplo, verificamos características
linguisticas que marcam ambos os papéis. As diferenças mais marcantes são
intergeracionais (geração mais velha/geração mais nova).

Segundo Bortoni-Ricardo, quando usamos a linguagem para nos comunicar,


estamos reforçando os papéis sociais, construídos pela própria interação humana,
definidos por normas socioculturais.

Da mesma forma que encontramos variações linguísticas no domínio do lar,


também encontramos em qualquer outro domínio social, como na sala de aula, em
um tribunal de júri, ou em um culto religioso, por exemplo. O grau de variação
sempre existirá, apenas será maior ou menor dependendo da distância entre esses
domínios, como por exemplo, área rural e a área urbana.

O estudo da variação linguística é, também, essencial para a conscientização


linguística do/a leitor/a, permitindo que ele/a construa uma postura não
preconceituosa em relação a usos linguísticos distintos das suas vivências.

É muito importante identificarmos as razões dos diferentes usos; quando é


utilizada a linguagem formal, a informal, a técnica ou as linguagens relacionadas aos
falantes, como por exemplo, a linguagem dos adolescentes, das pessoas mais velhas.

É necessário estarmos atentos à noção do valor social que é atribuído a essas


variações, sem, no entanto, desvalorizarmos as diferentes realidades e/ou situações
de fala. Essa discussão é fundamental nesse contexto.
64

Fotografias de sala de aula______________________________________


Em uma chamada “Comunidade” de rede social do início dos aos 2000,
podemos observar o preconceito linguístico abertamente construído e divulgado.
Todavia, pedimos para que você observe, com atenção, o recado dado por um
participante que atuou nesse gênero textual de forma crítica. Seu tópico na conversa
inicia-se com a seguinte expressão: “Preconconceito linguístico: já ouviram falar?”. O
participante e usuário dessa rede social traz citações do livro do famoso linguista
Marcos Bagno, intitulado: “Preconceito Linguístico: o que é; como se faz”. Leia
criticamente os comentários dessa comunidade e reflita sobre os pontos elencados
pelo usuário destacado. Faça suas reflexões pessoais de forma crítica e observe sua
realidade, relcaionando-a com os tópicos do livro de Bagno.
Falar errado, que decepção!!!
Início > Comunidades > Pessoas > Falar errado, que decepção!!!

descrição:
Se você conhece uma pessoa que tem tudo para ser muito legal, que fisicamente é
tudo de bom, sendo ele ou ela, você chega conversar e ela (pessoa)começa a falar tudo
errado, não é uma decepção???
Então você que se decepciona com esse tipo de pessoa, entre nessa comunidade.

Falar errado, que decepção!!!


(411 membros)

"Pérolas" da Língua Portuguesa

Até a teacher!
A gota d'água foi ouvir, no mês passado, uma professora universitária dizer:
- Esta palavra tem menas letras!Esta doeu na turma inteira.
65

***

Ning merece...
O pior é o MIM conjugando verbo: pra mim fazer, pra mim trabalhar... MUito tosco e
sem noção!
***
O pior foi qdo eu entrei no msn veio um menino e falou :pq vc nao quis comversar
comigo oge?
aff ¬¬' eu qse morri !

Preconceito linguístico. Já ouviram falar?

Preconceito linguístico. Já ouviram falar?


I
Conscientizar-se de que todo falante nativo de uma língua é um usuário competente
dessa língua, por isso ele SABE essa língua. Entre os 3 e 4 anos de idade, uma criança já
domina integralmente a gramática de sua língua. Sendo assim,
II
aceitar a ideia de que não existe erro de português. Existem diferenças de uso ou
alternativas de uso em relação à regra única proposta pela gramática normativa.
III
Não confundir erro de português (que, afinal, não existe) com simples erro de
ortografia. A ortografia é artificial, ao contrário da língua, que é natural. A ortografia é
uma decisão política, é imposta por decreto, por isso ela pode mudar, e muda, de uma
época para outra. Em 1899 as pessoas estudavam psychologia e história do Egypto; em
1999 elas estudam psicologia e história do Egito. Línguas que não têm escrita nem por
isso deixam de ter sua gramática.
IV
Reconhecer que tudo o que a Gramática Tradicional chama de erro é na verdade um
fenômeno que tem uma explicação científica perfeitamente demonstrável. Se milhões
de pessoas (cultas inclusive) estão optando por um uso que difere da regra prescrita
nas gramáticas normativas é porque há alguma regra nova sobrepondo-se à antiga.
66

Assim, o problema está com a regra tradicional, e não com as pessoas, que são falantes
nativos e perfeitamente competente de suas línguas. Nada é por acaso.
V
Conscientizar-se e que toda língua muda e varia. O que hoje é visto como "certo" já foi
"erro" no passado. O que hoje é considerado "erro" pode vir a ser perfeitamente
aceito como "certo" no futuro da língua. Um exemplo: no português medieval existia
um verbo leixar (que aparece até na Carta de Pero Vaz de Caminha ao rei D. Manuel I).
Com o tempo, esse verbo foi sendo pronunciado deixar, porque [d] e [l] são
consoantes aparentadas, o que permitiu a troca de uma pela outra. Hoje quem
pronunciar leixar vai estar cometendo um "erro" (vai ser acusado de desleixo), muito
embora essa forma seja mais próxima da origem latina, laxare (compare-se, por
exemplo, o francês laisser e o italiano lasciare. Por isso é bom evitar classificar algum
fenômeno gramatical de "erro": ele pode ser, na verdade, um indício do que será a
língua no futuro.
VI
Dar-se conta de que a língua portuguesa não vai nem bem, nem mal. Ela simplesmente
VAI, isto é, segue seu rumo, prossegue em sua evolução, em sua transformação, que
não pode ser detida (a não ser com a eliminação física de todos os seus falantes).
VII
Respeitar a variedade linguística de toda e qualquer pessoa, pois isso equivale a
respeitar a integridade física e espiritual dessa pessoa como ser humano, porque

VIII
a língua permeia tudo, ela nos constitui enquanto seres humanos. Nós somos a língua
que falamos. A língua que falamos molda nosso modo de ver o mundo e nosso modo
de ver o mundo molda a língua que falamos. Para os falantes de português, por
exemplo, a diferença entre ser e estar é fundamental: eu estou feliz é radicalmente
diferente, para nós, de eu sou feliz. Ora, línguas como o inglês, o francês e o alemão
têm um único verbo para exprimir as duas coisas. Outras, como o russo, não têm verbo
nenhum, dizendo algo assim como: Eu – feliz (o russo, na escrita, usa mesmo um
travessão onde nós inserimos um verbo de ligação). Assim,
67

IX
uma vez que a língua está em tudo e tudo está na língua, o professor de português é
professor de TUDO. (Alguém já me disse que talvez por isso o professor de português
devesse receber um salário igual à soma dos salários de todos os outros professores!)

X
Ensinar bem é ensinar para o bem. Ensinar para o bem significa respeitar o
conhecimento intuitivo do aluno, valorizar o que ele já sabe do mundo, da vida,
reconhecer na língua que ele fala a sua própria identidade como ser humano. Ensinar
para o bem é acrescentar e não suprimir, é elevar e não rebaixar a auto-estima do
indivíduo. Somente assim, no início de cada ano letivo este indivíduo poderá
comemorar a volta às aulas, em vez de lamentar a volta às jaulas!

***

Eu não li! Mais quem se importa, é de 2006 msmo!!


***

Sei que preconceito linguistico é horrível... ainda + eu que faço letras... Não me
importo mt com as variações linguisticas, mas alguns "erros" são d+! Confesso q tenho
alguns preconceitos linguisticos rsrs...
***

Às favas o preconceito linguistico...


Nos dias de hoje, com tantos meios de comunicação acessíveis, acho um absurdo
'neguinho' que parece ter estudado, acessa internet, vai a baladas, alguns até se dizem
proficionais da educação (oh! Deus!) pronunciando "pobrema", adevogado",
"alembrar", "a gente vamos" e outras pérolas...
Se o cara vem lá do meio do mato, não teve estudo e mal ouve um radinho AM, vá lá...
Do contrário é comodismo, BURRICE mesmo!
***

E quando a pessoa escreve profissionais com " c " !? kkkkkk


68

***

kkkkkkkkkkk
Foi um lapso! Valeu a correção, foi a pressa (ou preça??? rsrsrs)!!!

Quem é Marcos Bagno?

É professor do Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução da Universidade de


Brasília, doutor em filologia e língua portuguesa pela Universidade de São Paulo,
tradutor, escritor com diversos prêmios e mais de 30 títulos publicados, entre
literatura e obras técnico-didáticas. Atua mais especificamente na área de
sociolinguística e literatura infanto-juvenil, bem como questões pedagógicas sobre o
ensino de português no Brasil. Em 2012 sua obra As memórias de Eugênia recebeu o
Prêmio Jabuti.

Biografia Retirada do site do próprio professor. Disponível em <


https://marcosbagno.wordpress.com/sobre/>

SAIBA MAIS: ler uma entrevista de Bagno em que ele aborda do tema do
PRECONCEITO LINGUÍSTICO. Disponível em <
https://marcosbagno.files.wordpress.com/2013/08/preconceito-linguistico.pdf>
69

PRÁTICA DE PESQUISADOR: MAIS DIÁLOGOS TEÓRICOS ____________

LEITURA CRÍTICA
DISCURSO E IDEOLOGIA

LINGUAGEM COMO DISCURSO

• A palavra discurso relaciona-se etimologicamente com a ideia de curso,


percurso, movimento. É a LINGUAGEM em ação.
• A Teoria Social do Discurso e Análise de Discurso Crítica desenvolvidas pela
escola britânica, especialmente por Norman Fairclough, foram influenciadas
pelos pensamentos de Michel Foucault e de Antonio Gramsci.

• Podemos dizer que o discurso é socialmente constitutivo em três aspectos


fundamentais:

a) o discurso constrói as diversas posições de sujeito;


b) o discurso constitui também as diferentes relações sociais;
c) o discurso colabora para a construção dos sistemas de conhecimentos e
crenças do mundo.

A concepção da linguagem no âmbito da Análise do Discurso assume uma


perspectiva interacional e crítica entre a linguagem e a sociedade, de modo a superar
70

um olhar neutro sobre as trocas linguísticas e a superar uma visão estanque da


estrutura da língua, de um lado, e dos sujeitos sociais, de outro. Essa perspectiva
interacional se apóia em uma troca dialética entre esses dois polos, de modo que o
discurso configura uma prática em articulação com outras práticas. É importante
ressaltar que todos os elementos que compõem tais práticas sociais se
retroalimentam, se interpelam, se interrogam. Segundo L. Iñiguez (2004:94):

os discursos não emanam do interior de sujeitos, nem


tampouco são uma inoculação ideológica que determine
o pensamento desses mesmos sujeitos. Os discursos
articulam o conjunto de condições que permitem as
práticas: constituem cenários que passam a facilitar ou
a dificultar as possibilidades que fazem surgir regras e
mantêm relações.

Desse modo, tanto a linguagem como a realidade social possuem seus


mecanismos específicos de estruturação e de realização. Todavia, as influências
recíprocas de constituição que entrelaçam essas duas dimensões são aspectos
fundamentais na tessitura da prática. A ADC propõe-se a estudar a linguagem como
prática social e, para tal, considera o papel crucial do contexto. Esse tipo de análise se
interessa pela relação que há entre a linguagem e o poder. É possível defini-la como
uma disciplina que se ocupa, fundamentalmente, de análises que dão conta das
relações de dominação, discriminação, poder e controle, na forma como elas se
manifestam através da linguagem (WODAK, 2003). Nessa perspectiva, a linguagem é
um meio de dominação e de força social, servindo para legitimar as relações de poder
estabelecidas institucionalmente.

Para a ADC são necessárias as descrições e teorizações dos processos e das


estruturas sociais responsáveis pela produção de um texto “como uma descrição das
estruturas sociais e os processos nos quais os grupos ou indivíduos, como sujeitos
históricos, criam sentidos em sua interação com textos” (WODAK, 2003: 19, tradução
71

nossa). Não obstante, a relação entre o texto e o social não é vista de maneira
determinista. Sob esta perspectiva, o discurso é uma forma de prática social que não
apenas reflete ou representa entidades e relações sociais, como também as constrói
(RELAÇÃO DIALÉTICA).

EFEITOS DA GLOBALIZAÇÃO: Vivemos hoje transformações


profundas não só concernentes ao nosso próprio sentido do ‘eu’, que se encontra
sustentado pelo reconhecimento da fragmentação do sujeito, como também
concernentes ao nosso sentido de tempo e lugar, em que a fugacidade e a
efemeridade configuram a ordem do dia.

REFLEXÃO EM GRUPO: Ditados populares

Os provérbios são inseridos em discursos mais amplos tendo em vista vários


objetivos: atenuação, validação, exemplificação, etc. Além da cadeia intertextual
em que atuam, os ditos populares veiculam crenças e valores de mundo, o que
caracteriza a presença da interdiscursividade. A voz do enunciador (senso comum)
pode remeter a diversos conjuntos de crenças, vejamos alguns deles:

1- A voz da moral : “Quem tudo quer, tudo perde”; “A união faz a força”; “Mais vale
um pássaro na mão do que dois voando”; “Quem semeia vento colhe tempestade”;
2- A voz dos valores de uma sociedade: “Ruim com ele, pior sem ele”; “Mulher
envelhece, homem amadurece”; “Enquanto descansa, carrega pedras.”
3- A voz da verdade: “Diga-me com quem andas, que direi quem tu és”; “Antes tarde
do que nunca”; “Deus escreve certo por linhas tortas”.
4- Voz da mitigação: “Casa de ferreiro, espeto de pau”; “Santo de casa não faz
milagre”; “Rio de piranha, jacaré nada de costas”
72

5- Voz da justificativa (sentido jurídico): “A ocasião faz o ladrão.”; “Ladrão que rouba
ladrão tem 100 anos de perdão.”
6- Voz do preconceito: “Deus soube desenhar mas não soube colorir”; “ ‘Nego’
quando pinta três vezes trinta.”
*Reflita sobre estes provérbios e as respectivas crenças subjacentes.

PARA SABER MAIS:


Sugerimos a leitura do livro ANÁLISE DE DISCURSO CRÍTICA, das professoras da
Universidade de Brasília Viviane Ramalho e Viviane Resende.

Disponível em
<https://www.academia.edu/16380216/An%C3%A1lise_de_discurso_cr%C3%ADtica>

Prática de Pesquisador: mais diálogos teóricos __________________

IDEOLOGIA

Thompson (1995) distingue dois tipos de concepção de ideologia: as concepções


neutras em que as ideologias são consideradas aspectos da vida social sem relações
necessariamente ilusórias e enganadoras; e também as concepções críticas que trazem
um sentido negativo. A análise da ideologia proposta pelo autor interessa-se por esse
73

último, ou seja, pelos modos como as formas simbólicas se relacionam com o poder,
ou nas palavras do autor, pela “maneira como sentido serve para estabelecer e
sustentar relações de dominação” (Thompson, 1995: 76).

Há, dessa forma, três pontos essenciais nessa concepção de ideologia: a noção de
sentido, a definição de dominação e as formas pelas quais o sentido pode estabelecer
e perpetuar as relações de dominação. As formas simbólicas podem ser linguisticas ou
não-linguisticas e compreendem todas as ações produzidas e reconhecidas por
sujeitos nos diversos contextos sociais. Os sujeitos, ao assumir os diferentes papéis nas
várias ordens de discurso, estão assumindo determinadas posições que são
qualificadas no campo social por diversos graus de poder. Assim, de acordo com os
contextos socialmente estruturados, os indivíduos mantêm relações de diferentes
status e a dominação ocorre quando essas relações são estabelecidas
sistematicamente de forma assimétrica.

Há, pois, inúmeros modos pelos quais o sentido pode estabelecer e sustentar
relações de dominação. Thompson classificou cinco modos (legitimação, dissimulação,
unificação, reificação e fragmentação) e em cada um deles especificou as estratégias
típicas de construção simbólica. Descrevo a seguir sucintamente estes modos e seus
mecanismos.

A legitimação apresenta as relações de poder e as assimetrias sociais como


legítimas e justas, dignas do apoio geral. As estratégias desse modo de operação são a
racionalização caracterizada por uma lógica de raciocínio para persuadir os sujeitos; a
universalização em que certos acordos particulares são apresentados como se fossem
em benefício de todos; e, por fim, a narrativização que destaca a tradição histórica de
um dado momento do presente.

Na dissimulação, as causas reais dos fenômenos são ocultadas e obscurecidas. As


formas simbólicas estão marcadas pelas seguintes estratégias: deslocamento que
consiste na transferência estratégica das causas e dos sentidos para outros focos que
não são verdadeiros; a eufemização que é uma estratégia de sutileza na descrição de
relações ou ações sociais; e tropo que engloba a sinédoque, a metonímia e a metáfora
– todas dissimulam relações de dominação.
74

A unificação é uma forma de unidade que relaciona os sujeitos numa identificação


coletiva ignorando as suas diferenças individuais. As estratégias são a padronização e a
simbolização. A primeira é uma maneira de adaptar todas as formas simbólicas a um
único padrão, um exemplo está no estabelecimento de uma linguagem nacional
criando uma identidade coletiva padronizada. A segunda estratégia diz respeito à
construção de símbolos de identidade e de unidade como referência a uma história
compartilhada.

Na fragmentação, a ideologia opera na segmentação de indivíduos que são


considerados como um desafio aos grupos dominantes. A diferenciação e o expurgo do
outro são duas estratégias que desunem alguns sujeitos da coletividade sendo
apresentados como uma ameaça ou um inimigo do bem-estar geral.

O último modo de operação da ideologia é a reificação em que as relações de


dominação são sustentadas como uma situação permanente e natural. As estratégias
compreendem a naturalização pela qual um estado de convenções sociais e históricas
é considerado como algo natural e atemporal; a eternalização é o ocultamento do
caráter histórico dos fenômenos sociais; e, finalmente, a nominalização e passivização
que são recursos de nível gramatical e sintático os quais marcam o apagamento da
ação e do agente na retratação discursiva dos acontecimentos sociais.

Dessa forma, a partir da identificação dos diversos modos de operação da ideologia


e das estratégias específicas podemos refletir sobre a interação de sentido e poder na
vida social. Thompson (1995:89) conclui considerando que “ as construções simbólicas
são os instrumentos com os quais as formas simbólicas, capazes de criar e sustentar
relações de dominação, podem ser produzidas.”

As ideologias, enfim, marcam as práticas discursivas das sociedades cujas relações


de dominação são estruturadas compreendendo sujeitos capazes de agir e transcender
as próprias ideologias. A ideologia está, pois, nas estruturas e nos eventos capazes de
reproduzi-los ou transformá-los.
75

Mas como funcionam os mecanismos de ideologia nos


textos?

Modos de operação da ideologia

MODOS ESTRATÉGIAS

Legitimação: relações de Racionalização – cadeia de raciocínios para persuadir. “O que eu


dominação são gosto às vezes de fazer é uma compressão de linha do fundo do útero
apresentadas como leve, só um apoio, um suporte, por que tem mãe que fica muito
legítimas, justas e dignas cansada no final, que não consegue.” (M3)
de apoio. Universalização – acordos individuais como se fossem em benefício
geral (“Amigos da escola”);

Narrativização – apelo para uma tradição, como se o presente fosse,


inevitavelmente, parte dela.
Dissimulação: relações de Deslocamento – um Termo é deslocado de seu referente inicial.
dominação são escondidas (Roberto Carlos é o ‘rei’ / “Adote um analfabeto”); “Pela L (G18), ela
e negadas. teria operado há mais tempo”. (M15)

Eufemização – ações de dominação descritas com um sentido positivo


(repressão em protesto público = ‘restauração da ordem’);

Tropo – uso figurativo da língua (metáforas: a guerra no PT).


Unificação: criação de Padronização – um padrão social que é inquestionável (língua
uma falsa identidade padrão/ norma culta); “Ela (a médica) disse que não tem problema em
coletiva, de união ilusória. tentar, mas ela disse que eles (os médicos) dão um tempo pra ver se
nasce (...) se não nascer, eles não dão mais chance.” (G7)

Símbolos de unidade – construção de símbolos de unidade e de


76

identificação coletiva (bandeiras, hinos).


Fragmentação: separação Diferenciação – ênfase dada às diferenças, apoiando característica
de indivíduos que são uma que desunem um grupo “Doula? Destesto. Nem sei se tem alguma
ameaça ao poder formação. Elas fazem a cabeça das pacientes que ficam exigentes,
dominante. trazem plano de parto, contrato de como elas querem o parto..” (M 5)

Expurgo do outro – construção de um inimigo público (líder do MST).


Reificação: aborda uma Naturalização – algo que é uma criação social é apresentado como
situação passageira como um acontecimento natural (escravidão / uso da palmatória / currículo
se ela fosse permanente e escolar); “a mulher européia tem um períneo enorme, elas são altas,
natural. tem mais espaço para ganhar o bebê. Já as brasileiras são pequenas,
precisam da episio” (M5).

Eternalização – fenômenos são apresentados como atemporais


(costumes, tradições: submissão da mulher ao marido); “Ela tem um
aborto, ela é Rh negativo, fez Kogan depois da curetagem, aborto
espontâneo.” (M15)

Nominalização e passivização: recurso gramatical e sintático que


concentram a atenção do ouvinte no que interessa informar (“cinco
manifestantes foram presos”, ao invés de “a polícia prendeu cinco
manifestantes.”).

Fotografias de sala de aula____________________________________

Veja um exemplo de análise de ideologia sobre o discurso do médico e da gestante no


contexto do parto.
A legitimação apresenta as relações de poder e as assimetrias sociais como
legítimas e justas, dignas do apoio geral. As estratégias desse modo de operação são a
racionalização caracterizada por uma lógica de raciocínio para persuadir os sujeitos; a
77

universalização em que certos acordos particulares são apresentados como se fossem


em benefício de todos; e, por fim, a narrativização que se baseia em histórias que
narram o passado como parte de uma tradição eterna e aceitável. No exemplo a seguir,
por meio da racionalização, a médica constrói uma cadeia de argumentações favoráveis
para o uso da manobra de kristeller (procedimento de parto agressivo e condenado pela
Organização Mundial de Saúde).

Exemplo de legitimação – racionalização , na argumentação da médica:

“O que eu gosto às vezes de fazer é uma compressão de linha do fundo do útero


leve, só um apoio, um suporte, por que tem mãe que fica muito cansada no final,
que não consegue.” (M3)

Na dissimulação, as causas reais dos fenômenos são ocultadas e obscurecidas. As


formas simbólicas estão marcadas pelas seguintes estratégias: deslocamento que
consiste na transferência estratégica das causas e dos sentidos para outros focos que
não são verdadeiros; eufemização que é uma estratégia de enfraquecimento na
descrição de relações ou ações sociais; e tropo que engloba a sinédoque, a metonímia e
a metáfora – todas dissimulando relações de dominação.

Observamos claramente a atuação desse modo de operação da ideologia no


momento em que a médica afirma que a gestante queria ter feito o parto cirúrgico (a
cesárea) há mais tempo, quando, na realidade, a paciente não o desejava (de acordo
com o relato da própria mulher). A construção verbal desse trecho é particularmente
interessante, pois, por meio da estratégia ideológica do ‘deslocamento’, a médica trata
a operação cirúrgica como algo que independesse de sua participação enquanto
profissional da saúde; a responsabilidade de uma decisão como a do parto cesárea é
deslocada para a paciente, como se a gestante tivesse a onipotência de decidir operar
ou não, e mais, como se a paciente pudesse operar a si própria.

Exemplo de dissimulação – deslocamento, no texto da médica:


“Pela Luciana (G18), ela teria operado há mais tempo”. (M15)

A unificação é uma forma de unidade que relaciona os sujeitos numa identificação


78

coletiva, ignorando as suas diferenças individuais. As estratégias são a padronização e a


simbolização. A primeira é uma maneira de adaptar todas as formas simbólicas a um
único padrão; um exemplo está no estabelecimento de uma linguagem nacional criando
uma identidade coletiva padronizada. A segunda estratégia – a simbolização da unidade
– compreende a criação de símbolos de unidade e de identificação coletiva, tais como
bandeiras, hinos, emblemas, entre outros.

Exemplo de unificação – padronização, nas palavras da gestante para se referir a ‘eles’,


os médicos operando como uma unidade de autoridade:
“Ela (a médica) disse que não tem problema em tentar, mas ela disse que eles (os
médicos) dão um tempo pra ver se nasce (...) se não nascer, eles não dão mais chance.”
(G7)

Na fragmentação, a ideologia opera na segmentação de indivíduos que são


considerados como um desafio aos grupos dominantes. A diferenciação e o expurgo do
outro são duas estratégias que desunem alguns sujeitos da coletividade, apresentados
como uma ameaça ou um inimigo do bem-estar geral.

Exemplo de Fragmentação – expurgo/banimento da ‘doula’, nas palavras de uma


médica:

“Doula? Destesto. Nem sei se tem alguma formação. Elas fazem a cabeça das
pacientes que ficam exigentes, trazem plano de parto, contrato de como elas
querem o parto..” (M 5)

O último modo de operação da ideologia é a reificação, em que as relações de


dominação são estabelecidas e sustentadas por meio da retratação de uma situação
transitória como se fosse permanente e atemporal. As estratégias compreendem a
naturalização, a eternalização, a nominalização e a passivização. Na primeira delas, um
estado de coisas é considerado como algo natural ou como resultante inevitável de
características naturais. Um exemplo claro da naturalização está na divisão do trabalho
entre homens e mulheres baseada em suas características fisiológicas. No universo da
parturição, percebemos esta estratégia sendo utilizada para convencer as mulheres a
79

ganharem bebê deitadas como se esta fosse a posição ‘natural’ para se parir uma criança;
ou ainda, argumenta-se que a episiotomia (corte na entrada da vagina) é uma
necessidade no Brasil em decorrência da estatura das mulheres, o que é uma enganação,
pois não há evidências científicas sobre essa afirmação. No discurso de uma médica:

Exemplo de reificação (naturalização), nas palavras da médica:

“a mulher européia tem um períneo enorme, elas são altas, tem mais espaço para
ganhar o bebê. Já as brasileiras são pequenas, precisam da episio” (M5).

Com relação à segunda estratégia – a eternalização – os fenômenos sociais são esvaziados


do seu caráter histórico e são apresentados como permanentes, imutáveis e recorrentes,
assim, costumes e tradições ligados a um passado são inquestionáveis.

No exemplo a seguir, uma médica foi interrogada por um pesquisador sobre o motivo
da cesariana em uma paciente. A médica resgata uma informação antiga (sobre um aborto
que a paciente sofreu, antes dessa gravidez) e a coloca juntamente com o fato de a
gestante ter o fator ‘rh’ sanguíneo negativo (que requer uma atenção maior no parto
normal). Por meio da eternalização, o discurso da médica, ao explicar sobre o motivo de
uma cesárea, obscurece o caráter histórico do fenômeno do aborto na vida da gestante,
apresentando-o como se ele fosse uma característica permanente (observa-se o uso do
tempo verbal no presente do indicativo).

Exemplo de reificação (eternalização), ainda nas palavras da médica:


“Ela tem um aborto, ela é Rh negativo, fez Kogan depois da curetagem, aborto
espontâneo.” (M15)

A ideologia marca, enfim, as práticas discursivas das sociedades cujas relações de


dominação são estruturadas por sujeitos sociais capazes de agir e transcender as
próprias ideologias. A ideologia está, pois, tanto nas estruturas, como nos eventos,
operando de forma a reproduzi-los ou a transformá-los.
80

Para descontrair:

Decálogo do Leitor
Artigo de Alberto Mussa*

Para começar: há que descobrir os livros.

1º Mandamento: Nunca leia por hábito: um livro não é uma escova de dentes.
Leia por vício, leia por dependência química. A literatura é a possibilidade de
viver vidas múltiplas, em algumas horas. E tem até finalidades práticas: amplia
a compreensão do mundo, permite a aquisição de conhecimentos objetivos,
aprimora a capacidade de expressão, reduz os batimentos cardíacos, diminui a
ansiedade, aumenta a libido. Mas é essencialmente lúdica, é essencialmente
inútil, como devem ser as coisas que nos dão prazer.

2º Mandamento: Comece a ler desde cedo, se puder. Ou pelo menos comece.


E pelos clássicos, pelos consensuais. Serão cinqüenta, serão cem. Não devem
faltar As mil e uma noites, Dostoiévski, Thomas Mann, Balzac, Adonias, Conrad,
Jorge de Lima, Poe, García Márquez, Cervantes, Alencar, Camões, Dumas,
Dante, Shakespeare, Wassermann, Melville, Flaubert, Graciliano, Borges,
Tchekhov, Sófocles, Machado, Schnitzler, Carpentier, Calvino, Rosa, Eça, Perec,
Roa Bastos, Onetti, Boccaccio, Jorge Amado, Benedetti, Pessoa, Kafka, Bioy
Casares, Asturias, Callado, Rulfo, Nelson Rodrigues, Lorca, Homero, Lima
Barreto, Cortázar, Goethe, Voltaire, Emily Brontë, Sade, Arregui, Verissimo,
Bowles, Faulkner, Maupassant, Tolstói, Proust, Autran Dourado, Hugo, Zweig,
Saer, Kadaré, Márai, Henry James, Castro Alves.

3º Mandamento: Nunca leia sem um dicionário. Se estiver lendo deitado, ou


num ônibus, ou na praia, ou em qualquer outra situação imprópria, anote as
81

palavras que você não conhece, para consultar depois. Elas nunca são escritas
por acaso.

4º Mandamento:Perca menos tempo diante do computador, da televisão, dos


jornais e crie um sistema de leitura, estabeleça metas. Se puder ler um livro por
mês, dos 16 aos 75 anos, terá lido 720 livros. Se, no mês das férias, em vez de
um, puder ler quatro, chegará nos 900. Com dois por mês, serão 1440. À razão
de um por semana, alcançará 3.120. Com a média ideal de três por semana,
serão 9.360. Serão apenas 9.360. É importante escolher bem o que você vai ler.

5º Mandamento: Faça do livro um objeto pessoal, um objeto íntimo. Escreva


nele; assinale as frases marcantes, as passagens que o emocionam. Também é
importante criticar o autor, apontar falhas e inverossimilhanças. Anote
telefones e endereços de pessoas proibidas, faça cálculos nas inúteis páginas
finais. O livro é o mais interativo dos objetos. Você pode avançar e recuar,
folheando, com mais comodidade e rapidez que mexendo em teclados ou
cursores de tela. O livro vai com você ao banheiro e à cama. Vai com você de
metrô, de ônibus, e de táxi. Vai com você para outros países. Há apenas duas
regras básicas: use lápis; e não empreste.

6º Mandamento: Não se deixe dominar pelo complexo de vira-lata. Leia muito,


leia sempre a literatura brasileira. Ela está entre as grandes. Temos o maior
escritor do século XIX, que foi Machado de Assis; e um dos cinco maiores do
século XX, que foram Borges, Perec, Kafka, Bioy Casares e Guimarães Rosa.
Temos um dos quatro maiores épicos ocidentais, que foram Homero, Dante,
Camões e Jorge de Lima. E temos um dos três maiores dramaturgos de todos os
tempos, que foram Sófocles, Shakespeare e Nelson Rodrigues.

7º Mandamento: Na natureza, são as espécies muito adaptadas ao próprio


hábitat que tendem mais rapidamente à extinção. Prefira a literatura brasileira,
mas faça viagens regulares. Das letras européias e da América do Norte vem a
maioria dos nossos grandes mestres. A literatura hispano-americana é
simplesmente indispensável. Particularmente os argentinos. Mas busque
82

também o diferente: há grandezas literárias na África e na Ásia. Impossível


desconhecer Angola, Moçambique e Cabo Verde. Volte também ao passado: à
Idade Média, ao mundo árabe, aos clássicos gregos e latinos. E não esqueça o
Oriente; não esqueça que literatura nenhuma se compara às da Índia e às da
China. E chegue, finalmente às mitologias dos povos ágrafos, mergulhe na
poesia selvagem. São eles que estão na origem disso tudo, é por causa deles
que estamos aqui.

8º Mandamento: Tente evitar a repetição dos mesmos gêneros, dos mesmos


temas, dos mesmos estilos, dos mesmos autores. A grande literatura está
espalhada por romances, contos, crônicas, poemas e peças de teatro. Nenhum
gênero é, em tese, superior a outro. Não se preocupe, aliás, com o conceito de
gênero: história, filosofia, etnologia, memórias, viagens, reportagem,
divulgação científica, auto-ajuda ─ tudo isso pode ser literatura. Um bom livro
tem de ser inteligente, bem escrito e capaz de provocar algum espécie de
emoção.

9º Mandamento: A vida tem outras coisas muito boas. Por isso, não tenha
pena de abandonar pelo meio os livros desinteressantes. O leitor experiente
desenvolve a capacidade de perceber logo, em no máximo 30 páginas, se um
livro será bom ou mau. Só não diga que um livro é ruim antes de ler pelo menos
algumas linhas: nada pode ser tão estúpido quanto o preconceito.

10º Mandamento: Forme seu próprio cânone. Se não gostar de um clássico,


não se sinta menos inteligente. Não se intimide quando um especialista diz que
determinado autor é um gênio, e que o livro do gênio é historicamente
fundamental. O fato de uma obra ser ou não importante é problema que tange
a críticos, talvez a escritores. Não leve a vida a sério. E faça o seu próprio
decálogo: neste momento, você será um leitor.

*Revista Entrelivros – Julho de 2007, N.27


83

LABORATÓRIO DE TEXTOS 1 (atividade opcional)

Produzir seu memorial de leitura após as seguintes leituras:


1) A importância do ato de ler de Paulo Freire (até a página 14) disponível em <
https://educacaointegral.org.br/wp-
content/uploads/2014/10/importancia_ato_ler.pdf>
2) O memorial de leitura da professora Juliana Dias, intitulado “Tatuagens de
minha leitura da palavramundo”, disponível em <
http://revistas.unisinos.br/index.php/entrelinhas/article/view/2445>

Paulo Freire (1981) trata em seu texto “A importância do ato de ler” sobre como a
leitura da ‘palavramundo’ envolveu sua experiência existencial. Em suas palavras,
“retomo a infância distante, buscando a compreensão do meu ato de ler, em um
mundo particular (...) absolutamente significativo. Neste esforço, a que vou me
entregando, recrio e revivo, no texto em que escrevo, a experiência vivida”. Conte-nos
sua jornada como leitor não só da palavra escrita, mas da ‘palavramundo’ e
compartilhe com as pessoas esse texto autobiográfico.
84

LABORATÓRIO DE TEXTOS 2 (opcional)

Carta "de algum lugar do futuro": para trabalhar o papel ativo do sujeito leitor

Imagine-se em ‘algum lugar do futuro’. Você ganha a oportunidade de viajar no


tempo-espaço. Então, você se propõe a redigir uma carta.

Mas não é uma carta qualquer, nela, o ‘eu do futuro’ escreve para o ‘eu do passado’ -
jovem estudante que acabara de ingressar no curso de ....(??) na UnB, um período
importante da história do ensino superior no Brasil.

Então, entre muitas coisas que você deseja tratar (recordações, recados, dicas,
conselhos), nessa carta, você necessariamente rememorará momentos importantes da
sua trajetória acadêmica:

1) O fim do ensino médio (Em que escola você cursou o último ano do EM? Como era
sua turma? Uma figura importante da escola e/ou um fato marcante...)
2) A escolha do curso universitário (dúvidas, certezas, acontecimentos decisivos...)
3) A inscrição para concorrer a uma vaga da universidade:
a) Como se deu?? ENEM, vestibular tradicional, PAS...??
b) Você concorreu pelo sistema de cotas ou pela ampla concorrência?
4) A notícia da aprovação: Para qual curso da UnB mesmo? Como foi?? Com quem
partilhou a notícia primeiro?)
5) A chegada à UnB (Em que mês e ano foi?? Como foi?? O que sentiu??
Expectativas, medos, projetos...)
6) O que acha de fazer ou ter feito parte desse momento do ensino superior
brasileiro (Tem implicações para o ‘eu do futuro’, não tem...)
8) Recados, dicas, conselhos do ‘eu do futuro’ ao ‘eu do passado’ sobre a vida
acadêmica, profissional, pessoal, amorosa...
Boa viagem!
85

LABORATÓRIO DE TEXTOS 3 (atividade opcional)

ORÁCULO ROMANO: para trabalhar fatores de textualidade: coesão, coerência e


intertextualidade.

O oráculo é a resposta dada pela Divindade a uma questão pessoal através de artes
divinatórias. Por extensão, o termo oráculo, por vezes, também designa o
intermediário humano consultado, que transmite a resposta e até mesmo, no
Mundo Antigo, o local que ganhava reputação por distribuir a sabedoria oracular,
onde era notada a presença Divina sempre que chamada, que passava a ser
considerado solo sagrado e previamente preparado para tal prática.6 Para o povo,
de um modo geral, o acesso aos oráculos e aos iniciados nessa arte era muito
limitado. Desse modo, o povo comum utilizava um sistema muito simples de
consulta à divindade: se recolhiam em um ambiente fechado, faziam as perguntas
desejadas e saíam às ruas para ouvir as respostas a partir das ‘falas’ das outras
pessoas comuns.

Você deve sair pela Universidade de Brasília durante algum tempo, estipulado por
seu/a sua professor/a, para coletar frases, conversas, palavras que chamarem sua
atenção. Em seguida, você deve escrever um texto, em qualquer gênero (carta,
narrativa, poesia, entrevista, reportagem, relatório, argumentação), juntando pelo
menos cinco ‘pedaços de textos’ coletados na sua caminhada. Os trechos de textos
devem, preferencialmente, terem seu formato original mantido. Não pode fazer
apenas um diálogo.

6
Referência: http://pt.wikipedia.org/wiki/Oraculo
86

LABORATÓRIO DE TEXTOS 4-

Assista ao vídeo do linguista Marcos Bagno (disponível em


<https://www.youtube.com/watch?v=UbdSNWv9XDQ>) e escreva sobre suas experiências
de vida (familiar, escolar, pessoal e social) e reflexões associando aos aspectos
trabalhados nesta unidade: variação linguística e preconceito linguístico. É
importante considerar as relações estabelecidas com as práticas socioculturais; e
sobre os mecanismos explícitos e implícitos do exercício de poder e de dominação
entre grupos ou pessoas engajados/as em uma relação assimétrica. Faça anotações,
registre reflexões, mesclando com histórias de vida de sua família e pessoais sobre
o tema.
87

E X E R C I T A N D O A L E I T U R A
A T I V A _____________________

EXERCÍCIO : GÊNERO TEXTUAL


a) Agora é a sua vez: leia o texto a seguir e escreva uma reflexão sobre como o estilo
do texto auxilia a criar no leitor uma sensação de realidade, como se tivesse o poder
de nos colocar dentro do contexto do texto.

b) Reescreva o texto usando outro gênero (notícia de jornal, entrevista, dissertação


sobre o tema violência nas ruas mencionando o fato narrado no texto como exemplo)
etc. Fique atento(a) aos elementos estilísticos característicos de cada gênero.

Domingo no Parque (Gilberto Gil)

O rei da brincadeira - ê, José Oi, dançando no peito - ô, José


O rei da confusão - ê, João Do José brincalhão - ô, José
Um trabalhava na feira - ê, José O sorvete e a rosa - ô, José
Outro na construção - ê, João A rosa e o sorvete - ô, José
A semana passada, no fim da semana Oi, girando na mente - ô, José
João resolveu não brigar Do José brincalhão - ô, José
No domingo de tarde saiu apressado Juliana girando - oi, girando
E não foi pra Ribeira jogar Oi, na roda gigante - oi, girando
Capoeira Oi, na roda gigante - oi, girando
Não foi pra lá pra Ribeira O amigo João - João
88

Foi namorar O sorvete é morango - é vermelho


O José como sempre no fim da semana Oi, girando, e a rosa - é vermelha
Guardou a barraca e sumiu Oi, girando, girando - é vermelha
Foi fazer no domingo um passeio no Oi, girando, girando - olha a faca!
parque Olha o sangue na mão - ê, José
Lá perto da Boca do Rio Juliana no chão - ê, José
Foi no parque que ele avistou Outro corpo caído - ê, José
Juliana Seu amigo, João - ê, José
Foi que ele viu Amanhã não tem feira - ê, José
Juliana na roda com João Não tem mais construção - ê, João
Uma rosa e um sorvete na mão Não tem mais brincadeira - ê, José
Juliana, seu sonho, uma ilusão Não tem mais confusão - ê, João
Juliana e o amigo João
O espinho da rosa feriu Zé
E o sorvete gelou seu coração
O sorvete e a rosa - ô, José
A rosa e o sorvete - ô, José
89

E X E R C I T A N D O A L E I T U R A A N A L Í T I C A

EXERCÍCIO: COESÃO

1) Substitua os termos sublinhados por outros elementos coesivos.

Enfiar-se debaixo de um carro e tentar consertar um carro em movimento é uma


sensação que mecânico nenhum experimentou. Mas enfiar-se debaixo de um carro e
tentar consertar um carro em movimento é a tarefa de uma doutora em Física. Uma
doutora em Física, com mais cinco astronautas, vai tentar consertar o telescópio
Hubble a 540 quilômetros de altura. Consertado, o telescópio Hubble vai gerar
imagens do espaço ainda mais revolucionárias. As imagens revolucionárias geradas
pelo telescópio Hubble poderão ajudar a redesenhar o mapa do universo.

2) Leia o texto seguinte, que aparece como legenda de uma fotografia do planeta
Marte na revista National Geographic Brasil (vol. 1, n. 10):

Quanto mais os cientistas descobrem sobre Marte, mais fascinados ficam com as
poderosas forças que moldaram a superfície do planeta. Imagens enviadas pela sonda
Mars Global Surveyor acirram os debates sobre a existência de vida ali. As fotos
também exibem beleza – como esta vista magnífica do gelado polo norte americano.

Assinale agora quais as referências das palavras destacadas:


que = planeta = ali = fotos = esta
=
90

3)Os dois trechos que seguem foram extraídos da letra da música ‘Último desejo’, de
Noel Rosa.

I) Perto de você me calo / Tudo penso e nada falo / Tenho medo de chorar. /
Nunca mais quero o seu beijo / Mas meu último desejo / Você não pode negar
II) Às pessoas que eu detesto / Diga sempre que eu não presto / Que meu lar é o
botequim...

Na biografia de Noel Rosa, consta que a cantora Aracy de Almeida andou


alterando a letra do ilustre compositor.
Um amigo de Noel deu-lhe a notícia nestes termos: “... em vez de ‘Mas meu último
desejo’, ela canta ‘Pois meu último desejo’ e em lugar de ‘Que meu lar é o
botequim’ ela diz ‘que meu lar é um botequim’. Diante da informação, Noel reagiu:
“Juro que nunca mais dou música minha pra ela gravar”.

O que a resposta de Noel tem a ver com os fatores de coesão de um texto vistos
acima?

4) A organização sintática dada a certos trechos exige do leitor um esforço


desnecessário de interpretação. Abaixo você tem um exemplo disso.

“Ao chegar ao ancoradouro, recebeu Alzira Alves um colar indígena


feito de escamas de pirarucu e frutos do mar, que estava acompanhada
de um grupo de adeptos do Movimento Evangélico Unido” – Folha de S.
Paulo, 12.2.92.

a) Reescreva o trecho, apenas alterando a ordem, de forma a tornar a leitura mais


simples.
b) Com base na solução que você propôs, explique por que, do ponto de vista da
estrutura sintática do português, o trecho acima oferece dificuldade desnecessária
para a compreensão.
91

5) Os trechos abaixo foram retirados de resenhas produzidas por alunos de outro


semestre. Analise-os, tomando por base o que se discutiu acerca da coesão textual. Se
necessário, reestruture-os.

a) O autor mostrou com grande maestria que a lei é apenas um dos mecanismos
de direito e contribui para que este conquiste seu objetivo principal, a justiça.

b) Outra peculiaridade da obra é a crítica feita sobre a dificuldade dos sem tetos
de acessarem a justiça, que aborda exatamente o que é relatado por José
Renato, juiz de São Paulo, no seu texto ‘Justiça e Cidadania’.
c) Outro de seus raciocínios mais curiosos é o de que para se conquistar ou se
manter no poder tudo é válido e que mais tarde foi generalizado como ‘os fins
justificam os meios’.

d) Já no final do livro encontramos explicações sobre as pessoas que se


encontram próximos ao príncipe sendo esses bons ou maus.

7) Analise a função dos elementos coesivos destacados no texto abaixo:


Um argumento cínico

Certamente nunca terá faltado aos sonegadores de todos os tempos e


lugares o confortável pretexto de que o seu dinheiro não deve ir parar nas
mãos de administradores incompetentes e desonestos. Como pretexto, a
invocação é insuperável e tem mesmo a cor e os traços do mais acendrado
civismo. Como argumento, no entanto (1), é cínica e improcedente. Cínica
porque (2) a sonegação, que nesse caso se pratica não é compensada por
qualquer sacrifício ou contribuição que atenda à necessidade de recursos
imanente a todos os erários, sejam eles bem ou mal administrados. Ora (3),
sem recursos obtidos da comunidade não há policiamento, não há
transportes, não há escolas ou hospitais. E (4) sem serviços públicos
essenciais, não há Estado e não pode haver sociedade política.
Improcedente porque (5) a sonegação, longe de fazer melhores os maus
governos, estimula-os à prepotência e ao arbítrio, além de (6) agravar a
carga tributária dos que não querem e dos que, mesmo querendo, não têm
como dela fugir - os que vivem de salário, por exemplo. Antes (7), é preciso
92

pagar, até mesmo (8) para que não faltem legitimidade e força moral às
denúncias de malversação. É muito cômodo, mas (9) não deixa de ser, no
fundo, uma hipocrisia, reclamar contra o mau uso dos dinheiros públicos
para cuja formação não tenhamos colaborado. Ou (10) não tenhamos
colaborado na proporção da nossa renda.
VILLELA, João Baptista. Veja, 25 set. 1985.
Análise crítica:

1) no entanto:
2) porque:
3) ora:
4) e:
5) porque:
6) além de:
7) antes:
8) até mesmo:
9) mas:
10) ou:
.................................................................................................................................
........................
EXERCÍCIO : COERÊNCIA

1) Observe as imagens abaixo e discuta os fatores de (in)coerência presentes nas


imagens/textos:

Imagem 1:
93

Imagem 2:

O beijo, 1969, (26-10-1969) -130x97 cm, óleo sobre tela, Museu Picasso, Paris

Imagem 3:

Imagem 4:
94

2) Nesta questão ocorre um caso de incoerência argumentativa. Procure identificá-la.

Embora existam políticos competentes e honestos, preocupados com as


legítimas causas populares, os jornais, na semana passada, noticiaram
casos de corrupção comprovada, praticados por um político eleito pelo
povo. Isso demonstra que o povo não sabe escolher seus governantes.

3) Os seguintes parágrafos são incoerentes, ou porque os conectivos de transição são


inadequados às relações que se pretendia estabelecer, ou porque o que se diz no
desenvolvimento não se concilia com o que está expresso no tópico frasal; assinale
a causa da incoerência e procure reestruturar os parágrafos de maneira mais
satisfatória.

1. Na verdade, a televisão é um passatempo mortificante, pois além de


proporcionar às famílias alguns momentos de distração, reduz-lhes o tempo que
poderiam dedicar à conversa, que cada vez se torna mais rara entre pais e filhos.
(Redação de aluno).

2. Imenso tem sido o progresso no século XX. A técnica, posta a serviço do homem,
fornece-lhe meios eficazes para enfrentar e amenizar-lhe as asperezas. Somos
95

forçados a reconhecer que uma série de males passaram a afligir a humanidade.


(Idem).

E X E R C I T A N D O A L E I T U R A C R Í T I C A

EXERCÍCIO : PRECONCEITO LINGUÍSTICO- atividade opcional para quem


quiser/puder adquirir a obra

Leitura dos mitos do livro: PRECONCEITO LINGUÍSTICO, Marcos


Bagno: ler os mitos expostos no livro e discutir o seguinte roteiro:
Reflexão
Com base nas ideias do texto PRECONCEITO LINGUISTICO, debatidas em sala, e
considerando a divisão da classe em grupos, responda ao que se pede:
Tópico 1
1) Apresente 3 argumentos - utilizados pelo autor - que combatem o mito do
‘português é muito difícil’ - 35
2) O que o seu grupo acha dos argumentos utilizados pelo autor? São convincentes?
3) Em que momento a língua se torna o ‘arame farpado mais poderoso para bloquear
o acesso ao poder’? Justifique essa assertiva – 39
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Tópico 2
1) Apresente 3 argumentos - utilizados pelo autor - que combatem o mito segundo o
qual ‘é preciso saber gramática para falar e escrever bem’ - 62
2) O que o seu grupo acha dos argumentos utilizados pelo autor? São convincentes?
3) Segundo o autor é a língua que se subordina à gramática normativa ou é o
contrário? Que metáfora o autor utiliza para diferenciar língua de gramática
normativa? – 64/67

Tópico 3
1) Apresente 3 argumentos - utilizados pelo autor - que justificam a assertiva segundo
a qual a norma culta é algo reservado a poucas pessoas no Brasil - 105/108
2) O que o seu grupo acha dos argumentos utilizados pelo autor? São convincentes?
3) Por que ‘a locução pedir para é um dos melhores exemplos do abismo existente
entre a linguagem coloquial e a norma culta do idioma’? – 111/112

Tópico 4
1) Qual a diferença entre norma culta e norma cultuada? Vocês acham essa
dicotomia razoável? – 114
2) Qual é a primeira forma sugerida pelo autor para se vencer o preconceito
linguistico? Vocês concordam com ele? - 115
3) Por que o autor se utiliza da imagem da fênix para metaforizar a língua? Justifique
– 117

Tópico 5
1) Como será possível, segundo o autor, subverter o preconceito linguístico?
Apresente 3 ‘pequenos atos de sabotagem’ arrolados pelo autor – 140
2) O que o seu grupo acha desses ‘pequenos’ atos? São convincentes?
3) Das 10 cisões apresentadas para um ensino não (ou menos) preconceituoso da
língua, quais vocês acharam mais relevantes? Por quê?
97

PARA SABER MAIS SOBRE LEITURA E ESCRITA NA


UNIVERSIDADE
SUGESTÕES PARA VOCÊ COMPOR SUA BIBLIOTECA
PESSOAL:
98

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