Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
INTRODUÇÃO
1
O nível de arbitrariedade e de bizarrice chegava ao cúmulo de ficar na dependência das vontades dos
imperadores ou reis da época. Grotesca foi a instituição da unidade de volume denominada de galão
imperial. O rei George III da Inglaterra decidiu que o galão deveria ser igual ao volume do seu urinol.
Todavia, enviou para as colônias inglesas o urinol de sua esposa para servir de padrão. Explica-se, assim, a
atual diferença existente entre as medidas de volume do galão imperial e do galão americano.
por base algo natural. Criou-se então o que é conhecido até hoje como o primeiro Sistema
Métrico Decimal, que normatizava em uma base única as mensurações de comprimento,
massa e volume. O que os cientistas franceses fizeram foi dividir o comprimento do
meridiano terrestre por 4.000.000, ao resultado chamou-se ‘metro’ (que é, portanto, a
décima milionésima parte da distância entre o Pólo Norte e Equador, medida pelo
meridiano que passa pela cidade francesa de Paris), considerado desde então como a
unidade básica para se medir comprimento2. As demais unidades foram estabelecidas em
função dos submúltiplos do metro. O litro, unidade para se medir volume, é entendida
como sendo o volume comportado por um decímetro cúbico (decímetro é a décima parte
de um metro); e o kilograma, unidade usada para medição massa, foi definido como a
massa correspondente a um decímetro cúbico de água. Curioso ainda é o fato de que a
música parece mesmo andar nas vanguardas científicas. Além de constituir-se como objeto
de estudo da primeira experiência científica relatada da história, a saber: o experimento de
Pitágoras com o monocórdio, adiantou-se em relação a essa preocupação de padronização
de unidades de medidas com a invenção do diapasão, instrumento que conferia uma norma
comum no âmbito da freqüência sonora. Consta que o diapasão de forquilha foi inventado
em 1711 por John Shore (1662-1752) trompetista da corte inglesa que teve partes
especificamente escritas para ele por Handel e Purcell.
Em música, o metro é uma ordenação temporal mensurável. A música é
configurada metricamente em razão das durações e ocorrências sonoras relacionarem-se
por meio de alguma unidade temporal. O metro estabelece, então, um padrão de unidades
temporais fixas chamadas pulsos [beats como dito em língua inglesa] por meio do qual um
lapso de tempo de uma peça ou secção musical é medida. Há músicas em que controle e
percepção do metro são fatores importantes para a compreensão da obra (funcionando
como elementos formatadores de expectativas), diferindo de certos repertórios, como as
peças aleatórias, nos quais a estruturação métrica não influencia em sua compreensão.
Todavia, “na música mensurável, o metro é o sistema global dentro do qual todas as
proporções e os valores temporais funcionam. Os níveis típicos desta medição são o
compasso, a unidade métrica básica e as divisões desta unidade métrica básica”
(SHERMAN, p.35). Surgem assim, novos termos a serem discutidos: compasso, unidade
de tempo e ritmo.
2
Desde 1960 o metro padrão é baseado no espaço percorrido pela luz, no vácuo, em um período de tempo de
1/299792458 segundos.
Ao consultar um dicionário etimológico lê-se que compasso refere-se àquilo que é
dividido em intervalos iguais. Por isso, inclusive, o instrumento para desenhar círculos
chama-se compasso, posto que o intervalo medido entre o centro da circunferência até seu
ponto mais distante (ou seja, seu raio) é igual em todas as direções. Por conta dessa
característica, alguns livros definem compasso como “a divisão musical em partes iguais”
(MONTMORENCY, 1955, p.19) ou como “a divisão de um trecho musical em séries
regulares de tempos (MED, 1996, p.114). Porém, notando que a divisão métrica poderia
variar no decorrer do discurso musical, outros preferiram definições do tipo “compasso é a
divisão da música em pequenas partes de duração igual ou variável” (LACERDA, 1966,
p.17). Outros preferem uma afirmação menos específica como: “compasso é uma das
partes em que está dividido um trecho musical (CARDOSO & MASCARENHAS, 1996,
P.14). Há as que fazem pensar: “compasso é uma seqüência de pulsações ordenadas de
diversas durações, que se inicia com um apoio preponderante” (SCLIAR, p.34). Sobre esta
última assertiva, perguntar-se-ia se o compasso é uma reunião de durações ou de unidades
tempo? De pulsos ou de pulsações? Todavia, fica constatado que a música permite ser
notada em compasso se tiver um metro discernível.
Dissonâncias rítmica e métrica
Níveis hierárquicos são criados pela própria estruturação rítmica musical. Pulsos
agrupam-se formando metros, resultando em compassos. A possibilidade de se discernir
compassos vem de uma proeminência adquirida pelo primeiro destes pulsos, também
chamado de tempo forte. A essa proeminência dá-se o nome de acento métrico, que
permite constatar a ciclicidade do agrupamento em questão, formando um padrão reiterado
de tempos forte e fraco. Pulsos também podem ser divididos, dando origem a pulsações.
Pulsação refere-se, então, ao menor valor de duração envolvido no padrão métrico
utilizado pela música em questão. Por vezes também é possível, principalmente em
andamentos rápidos, que compassos sejam considerados conjuntamente, formando
agrupamentos maiores passíveis de serem interpretados como um padrão, formando assim
hipermetros. Exemplo disso são as valsas, cujos compassos são regidos pelo maestro em
uma única batida, sendo percebidas como se fora um único tempo, ao invés de três.
Entretanto, como a fraseologia melódico-harmônica estrutura-se geralmente em frases de
quatro compassos, percebem-se esses quatros compassos como o padrão recorrente,
engendrando assim um hipermetro de quatro compassos (com 12 pulsos), porém,
percebidos como um único padrão. Em sua Sinfonia n. 9 (Dm) Beethoven usa os termos
ritmos de tre ou quattro battute para indicar a formação desses hipermetros. Desse
apanhado tem-se, portanto, uma hierarquia métrica que vai da pulsação ao hipermetro,
referindo-se às estruturas temporais micro e macroscópicas respectivamente.
No decurso musical, certas estruturas rítmicas podem contrastar entre si ou com
outros elementos hierárquicos. Para marcar certos tipos de contrastes o teórico norte
americano Robert Gauldin, em analogia com o conceito de dissonância harmônica, sugere
o uso dos termos dissonância rítmica e dissonância métrica. A palavra consonância tem
origem latina, significando soar com, soar conjuntamente. O correlato grego para
consonância é sinfonia. Desse modo, dissonância seria aquilo que não soa em harmonia ou
mesmo conflita com o contexto estabelecido.
Na dissonância rítmica, elementos rítmicos podem conflitar momentaneamente com
o pulso normal ou subdivisão do pulso, porém sem interromper o sentido de regularidade
métrica (número de pulsos por compasso, ou posição de acento métrico). A sobreposição
de uma divisão rítmica impondo a ocorrência simultânea de tempos simples e composto é
um exemplo deste tipo de dissonância (ver Exemplo 1).
Exemplo 4: Richard Strauss: Till Eulenspiegel`s Merry Pranks, op. 28 – solo de trompa.
Referências Bibliográficas