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O EMPREGO DO CAVALO NAS FORÇAS ARMADAS,

ALIMENTAÇÃO E CUIDADOS

Bruna Machado Amaral Rosa, Jerusa Palauro Spasiani1

Resumo. A partir do momento em que a cavalaria se modernizou e passou a


fazer uso de carros de combate, o emprego do cavalo tornou-se mais direcionado
ao ensino militar, visando à formação do combatente, o desenvolvimento do
cidadão, o cerimonial militar previsto nos regulamentos do exército, às missões
de garantia da lei e da ordem e à preservação das tradições da cavalaria. No
presente trabalho, as mais diversas formas de emprego do cavalo nas Forças
Armadas, ao longo da história, foram decritas através de revisão bibliográfica.
Também foram destacados os cuidados necessários para manter a sanidade
da tropa hipomóvel. A observação dos dados referentes às baixas das três
unidades de cavalaria de guarda existentes no Brasil procurou verificar quais
são os tipos de afecções que ocorrem com maior frequência no cavalo militar,
por grupo nosológico. Foi observado que as principais causas de atendimentos
veterinários nos Regimentos de Cavalaria de Guarda (RCG) são decorrentes de
lesões e traumas na pele e no aparelho locomotor, cólicas e necrose de ranilha.
Ainda, a alimentação e o manejo adequado são fundamentais para que o cavalo
continue sendo utilizado e apresente resultados satisfatórios, com o mínimo de
gastos possível. Nos RCG, as dietas devem ser corrigidas a fim de incrementar
a oferta calórica e de proteínas, balanceando o consumo; além de manter ativa
a profilaxia recomendada em relação às doenças infecto-contagiosas. Assim,
considerando todos os dados e histórico, apesar dos problemas e dificuldades,
é possível concluir que o cavalo foi, é e continuará sendo utilizado no Exército
Brasileiro devido à sua versatilidade e utilidade nas diversas missões.

Palavras-Chave: Cavalaria. Dietas. Equinos militares. Clínica de equinos.

Abstract. From the moment the cavalry was modernized and started to make
use of tanks, horse’s utility became more directed to military education, aiming
the formation of combatant, development of the citizen, military ceremonial
prescribed in regulations, ensuring law and order missions and the preservation of
cavalry’s traditions. However, through literature review, this study also described

1 Médicas Veterinárias. Alunas do Curso de Formação de Oficiais da Escola de Formação Complementar do


Exército (EsFCEx) da turma de 2014
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several forms of horses use in the army over history. Also, the necessary care
was highlighted to maintain sanity of equine troop. Veterinary treatment data
derived from three units of cavalry in Brazil (RCG) were analyzed to know what
types of diseases more frequently occur in the military horse, divided in groups of
diseases. It was observed that most cases of veterinary treatments in the RCG
are due to injuries and traumas at skin and limbs, acute abdomen and necrosis
of frog. Also, feeding and correct management are essential to keep the horse
working and getting good results, spending the least money as possible. At RCG,
diets should be corrected to increase the caloric and protein supply and should
keep active prophylaxis to avoid infectious diseases. So, considering all data and
historical, despite the problems, it is possible to conclude that the horse was, is
and will be used by the Brazilian Army because its versatility and utility in several
missions.

Keywords: Cavalry. Diets. Military horses. Equine clinic.

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1 INTRODUÇÃO proporciona ao combatente um maior
campo de visão, grande mobilidade e
flexibilidade, resultando em menor
No Brasil, o cavalo tem sido
efetivo a ser empregado.
utilizado no âmbito das Forças
Armadas desde os tempos do império. No entanto, na mesma
Seu importante papel no combate proporção em que se impõe, o cavalo
se verificou por proporcionar agrada à população por ser um
mobilidade e ação de choque às animal de grande beleza e submissão,
tropas. Com o desenvolvimento da aumentando a confiança nas tropas
cavalaria e a chegada dos carros que o empregam (SOEIRO, 2003).
de combate o cavalo continuou Com o passar do tempo,
presente no cenário, porém, agora, mesmo perdendo espaço nas Forças
como coadjuvante na formação do Armadas, o cavalo foi deixando sua
combatente, meio de integração das marca na sociedade civil. A prática
Forças Armadas com o cidadão, da equitação se difundiu e o esporte
alternativa terapêutica, preservação popularizou-se em muitos países, com
das tradições militares, atividades diversas modalidades e variações,
de desportos e, eventualmente, em movimentando incontáveis cifras e
operações de controle de distúrbios empregando muitas pessoas, direta
(EVANGELHO, 2011). ou indiretamente. A representação
Com o crescimento do EB em competições civis, em
desordenado da sociedade, o todo o Brasil, aproxima o militar
aumento da violência e a necessidade desse cenário e melhora a imagem
de Preservação da Ordem Pública, da força frente a uma importante
o Exército Brasileiro (EB) vem parcela da sociedade.
sendo requisitado pelo Governo Além disso, o convívio com o
Federal para atuar conjuntamente cavalo e a montaria trazem benefícios
com as Forças Auxiliares nas ruas. A para o corpo e mente, pelos atributos
presença do cavalo junto à tropa tem da área afetiva desenvolvidos e
efeito psicológico sobre as pessoas. resistência física exigida.
Com alto poder repressivo, devido A existência dos cavalos
ao seu grande porte, e por conduzir dentro das Organizações Militares
sobre seu dorso um elemento exige conhecimento das formas de
fardado, favorece o êxito nas manejo para manutenção da saúde
ações e diminui a possibilidade de e alta performance. O fornecimento
confronto direto. Também, o cavalo de uma alimentação controlada
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e adaptada ao equino, além da 2 DESENVOLVIMENTO
aplicação de medidas profiláticas
adequadas, possibilitam que os 2.1 Metodologia
animais exerçam suas funções sem
que necessitem demasiadamente de
De acordo com teorias
atendimentos veterinários. Ainda,
publicadas em diversas fontes
manter uma rotina para os equinos
bibliográficas, a pesquisa
é imprescindível, pois são muito
bibliográfica é uma forma de
sensíveis às alterações de manejo
analisar informações das principais
(LARANJEIRA e ALMEIDA,
contribuições científicas sobre um
2008).
determinado assunto (GIL, 2002),
O estudo do emprego do cavalo e procura identificar a influência
nas Forças Armadas, alimentação do passado sobre o tema (CERVO
e cuidados, tem como objetivos: e BERVIAN, 2002). O presente
conhecer as diversas atividades em estudo foi realizado utilizando o
que o cavalo é empregado pelas método histórico de investigação
Forças Armadas; descrever de (RODRIGUES, 2005) e análise
que forma o emprego do cavalo documental, em sua maioria,
contribuiu e contribui até hoje produção científica de escolas
para a garantia da lei e da ordem e de ensino superior do Exército
formação do combatente; verificar a Brasileiro, bibliografia técnica
importância da presença do cavalo veterinária de entidades parceiras,
nas Forças Armadas como meio de regulamentos, instruções gerais e
instrução e inclusão social; descrever dados cedidos pela Seção de Gestão
as dietas dos equinos, as principais e Logístíca de Remonta e Veterinária
causas de atendimentos veterinários do Exército Brasileiro (SGLRV).
nos RCG e as medidas profiláticas A análise dos dados da SGLRV,
adotadas; sugerir possíveis alterações obtidos em 2013, dos relatórios
no manejo dessas OM. anuais enviados pelas Seções de
O estudo do emprego do cavalo Veterinária dos três Regimentos de
nas Forças Armadas, alimentação Cavalaria de Guarda, foi relevante no
e cuidados, está inserido na área de esclarecimento das principais causas
concentração de estudos de Educação de baixas dos efetivos cavalares dos
e Cultura Militar, nas linhas de RCG, direcionando os cuidados para
pesquisa de Educação e inclusão que o cavalo militar cumpra suas
social no sistema Colégio Militar. diversas atividades.
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2.2 Revisão de literatura Confundiu-se, portanto, a forma
de combater com o instrumento de
2.2.1 Histórico do emprego do combate. Todos os idiomas latinos
cavalo no Brasil e no mundo herdaram essa distorção, chamando
de “cavalaria” a forma de combater
em vantagem de posição (BRASIL,
A domesticação do cavalo
C2-1, 1999).
transformou o estilo de vida do
homem. Ao encurtar distâncias, Os exércitos organizavam
contribuiu para o desenvolvimento suas forças a cavalo em unidades
agrícola e trouxe transformações na leves (do grego sarissóforos) e
arte da guerra (GOMES, 2011). Os pesadas (catafratas). As unidades
primeiros registros do emprego do leves buscavam informações,
cavalo montado em combate datam perseguiam o inimigo batido ou
do Século X A.C. Sua utilização cobriam a retirada da maior parte do
na guerra se deu com o objetivo exército, no caso de um insucesso. Já
de proporcionar, ao homem em as unidades pesadas eram colocadas
combate, a vantagem de posição. Essa nas alas da força de infantaria, para
vantagem era obtida anteriormente atuarem sobre os flancos e retaguarda
através das plataformas conduzidas do inimigo ou contra a sua cavalaria.
por soldados, que foram substituídas Grandes líderes da antiguidade
por carros tracionados por cavalos se fizeram valer do cavalo para obter
e, finalmente, por montarias. Até o vantagem de dominância, potência
Século I D.C., os carros de guerra de choque e velocidade, tais como
foram totalmente substituídos Alexandre, Anibal, Gengis-Khan e
pelos guerreiros montados a cavalo Átila. Foram os cavaleiros asiáticos
(BRASIL, C2-1, 1999). que aperfeiçoaram a técnica de
A profunda ligação do cavalo equitação e combate, introduzindo
com a arte da guerra se faz verificar o estribo nos arreamentos,
pela distorção etimológica das proporcionando, assim, maior
palavras. O termo akva do original equilíbrio e autonomia ao cavaleiro
sânscrito, que significava “combater (BRASIL, C2-1, 1999).
em vantagem de posição”, se O combatente a cavalo foi
misturou ao longo do tempo com a predominante nos conflitos da Idade
palavra usada pelos romanos para Média, entretanto, nesse período,
definir o animal empregado para a cavalaria tornou-se pesada e
esse fim, denominado caballus. couraçada, com menor velocidade
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e flexibilidade. Napoleão empregou Batalhas de Guararapes em 1648 e
um grande efetivo de cavaleiros 1649, respectivamente, contribuindo
em missões de reconhecimento e para a expulsão dos holandeses
segurança. O surgimento e evolução (BRASIL, C2-1, 1999).
das armas de fogo fizeram com que No século XVIII, com a
a cavalaria passasse a combater exploração do ouro na região das
também a pé. Mesmo reconhecendo Minas Gerais, ocorre a criação das
a necessidade de maior segurança, unidades de Dragões e da Cavalaria
houve resistência por parte de alguns Auxiliar. Os Dragões eram uma tropa
militares em admitir a fragilidade regular, disciplinada, encarregada
de sua tropa montada. Na I Guerra dos serviços de guarda, registros,
Mundial surge o carro de combate, patrulhas, destacamentos; faziam
com maior potência de fogo e ação cumprir as leis e a autoridade do
de choque. Entretanto, o cavalo governo, devendo estar à disposição
ainda foi utilizado pela Polônia em caso de guerra.
e pela Rússia durante a II Guerra A partir de 1775 são criados
Mundial. A partir deste momento regimentos de cavalaria no Rio
verificou-se a predominância de Grande do Sul (RS), São Paulo (SP),
carros de combate em substituição Rio de Janeiro (RJ), Goiás (GO),
à tropa hipomóvel (BRASIL, C2-1, Mato Grosso (MT), Piauí (PI) e
1999). Pernambuco (PE). Em 1808, quando
A partir do século XVI, a corte portuguesa se instala no
são lançados os fundamentos das Brasil, é criado o 1º Regimento de
instituições militares nacionais. Os Cavalaria do Exército. No período
colonos combatiam a pé pois os do Brasil Colônia e Brasil Reino,
cavalos eram escassos e muito caros. os Dragões do Rio Grande (depois
Os primeiros registros do Rio Pardo), a Legião de Tropas
emprego do cavalo em combate, no Ligeiras e a Cavalaria Auxiliar
Brasil, fazem referência às guerras tiveram sua história fundida com a
lideradas pelos Governadores Gerais das campanhas realizadas na Bacia
contra as nações indígenas na Bahia do Prata (BRASIL, C2-1, 1999).
e Espírito Santo, no século XVI. Os regimentos que
Milicianos a cavalo lutavam contra empregavam cavalos tiveram
a resistência dos nativos ao longo participação ativa nas lutas de
das áreas ocupadas. Um esquadrão independência do país. Após a
de cavalaria foi empregado na 1ª e 2ª Independência, toda a Cavalaria foi
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classificada como Ligeira, armada margens do Avai, na Vila do Pilar,
de sabre, clavina e pistola. Os no Estabelecimento, em Lomas
regimentos no Rio Grande do Sul Valentinas, no Arroio Hondo, em
foram classificados como Lanceiros São Solano, Campo Grande e tantos
por usarem a lança, arma adotada outros combates (BRASIL, C2-1,
somente naquela província a partir 1999).
da Regência. As tropas gaúchas A partir de 1908, a cavalaria
de cavalaria eram consideradas brasileira passa por transformações
as melhores por estarem seus
estruturais, acompanhando a
militares acostumados a cavalgar
evolução mundial com o surgimento
desde crianças. Promoviam cargas
dos carros de combate (BRASIL, C2-
utilizando lanças e sabres como
1, 1999). Até então, os encarregados
armas principais (CUNHA, 2013).
de material dos esquadrões de
Na metade do século XIX, a cavalaria dispunham de três carroças
doutrina de emprego da Cavalaria, puxadas por seis cavalos cada uma,
vigente na época, previa o combate
sendo uma destinada ao transporte
sempre a cavalo. Durante o Império
de gêneros, outra funcionava como
do Brasil, os conflitos de maior
cozinha e a terceira conduzia o
importância foram na região platina.
material de encilhagem. A tropa,
O cavalo foi amplamente usado na
toda a cavalo, dispunha em
Guerra da Cisplatina em 1826-1828,
suas selas de todo material de
na Campanha contra Oribe e Rosas
em 1851-1852 e na Guerra contra acampamento. Havia também uma
o Uruguai em 1864-1865. Entre carroça-pipa. No lugar da viatura de
1865 e 1870 ocorreu a Guerra do dia, uma carroça ficava à disposição
Paraguai, conhecida como a maior do pessoal de serviço e outra ficava
e mais cruenta guerra do Exército exclusivamente à disposição dos
Brasileiro. Nesta campanha trabalhos de faxina. Existia o “Curso
destacam-se os lendários chefes da de Condutor” que ensinava o ofício
Arma, como o Marechal Manoel de conduzir carroças. O período da
Luis Osório – Marquês do Herval manhã nos regimentos era dedicado
e Patrono da Cavalaria Brasileira, o à instrução ministrada pelos oficiais
Brigadeiro José Joaquim de Andrade e sargentos. Havia um horário
Neves – Barão do Triunfo, entre dedicado à limpeza da cavalhada,
outros. A “Cavalaria dos Doidos”, prática que se verifica até os dias
como ficou conhecida a Cavalaria atuais na cavalaria hipomóvel
de Andrade Neves, galopou nas (CUNHA, 2013).
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No ano de 1921 foi organizada, Cavalariças Imperiais (BRASIL, 2º
no Rio de Janeiro, a primeira tropa RCG, 2001).
blindada do EB. A partir da sua O Marechal Hermes Rodrigues
modernização pós II Guerra, o da Fonseca, após realizar cursos
emprego da tropa hipomóvel ficou militares na Alemanha, enviou
restrito à missão de guarda, ou seja, oficiais do Exército à Escola de
à defesa de pontos sensíveis e de Cavalaria, proporcionando a difusão
instalações, à segurança de áreas de no Brasil da doutrina alemã. Com
retaguarda, ao controle de populações o término da I Guerra Mundial,
e ao apoio às operações de assuntos a Missão Militar Francesa trouxe
civis. instrutores de equitação. Em 1922,
Com o avanço tecnológico, foi criado o Centro de Formação de
o cavalo foi sendo substituído por Oficiais Instrutores de Equitação,
tratores e carros. No campo de com objetivo de formar instrutores
batalha, foi trocado pelas viaturas, que de equitação, capazes de transmitir
proporcionavam maior velocidade, nas escolas e corpos de tropa, regras
poder de choque e proteção blindada. uniformes de equitação (GOMES,
Entretanto, o cavalo nunca deixou de 2011).
ter a sua importância. Surgiram em A história da medicina
diversos países do mundo escolas veterinária no Brasil se funde à
destinadas a estudar e difundir a arte do emprego do cavalo nas Forças
equina (GOMES, 2011). Armadas. A necessidade de se
As doutrinas acerca da criar um serviço de veterinária
equitação foram inicialmente no exército surgiu da presença da
introduzidas por D. Pedro II, que tropa hipomóvel em suas fileiras.
após a Guerra da Tríplice Aliança As numerosas mortes de cavalos
trouxe o Cap Luís de Jácome de produzidas pela pneumonia de
Portugal, cuja missão foi difundir Mormo nas Organizações Militares
a doutrina equestre de Baucher hipomóveis levaram o Capitão
(doutrina francesa) e definir as bases Médico João Muniz Barreto de
para criação das coudelarias do Aragão para a França a fim de
Exército. Luiz Jácome, especialista observar a organização da veterinária
em hipologia, criação e corridas militar daquele país. Em 4 de janeiro
de cavalos, em 1911, funda o de 1908 foi criado o Quadro de
Club Sportivo de Equitação, no Veterinária do Exército. Dois anos
mesmo local em que funcionava as mais tarde, foi inaugurado o “Curso
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Prático de Veterinária” e, em 17 Em 1952, o estabelecimento
de julho de 1914, foi inaugurada a General Gustavo Cordeiro de Farias
Escola de Veterinária do Exército (Gráfica do Exército) publicou
(CML, 2009). o Manual C 25-5 (Manual do
O Serviço de Veterinária do Cavaleiro), que tinha a finalidade
Exército iniciou suas atividades de apresentar as regras e princípios
em 1914, com a criação equina nos gerais necessários a qualquer homem
campos de Saican (Rosário do Sul / montado que utilizasse o animal como
RS), doados ao Império pelo Capitão meio de transporte. Muitas destas
Francisco Borja de Almeida Corte informações ainda são utilizadas nos
Real. Esses campos são conhecidos dias atuais (BRASIL, C25-5, 1952).
atualmente como Campo de Instrução
Barão de São Borja. A partir do As instalações do Parque
Exército, a medicina veterinária se Equestre Gen Eloy Menezes,
difundiu para o meio civil dando localizado na vila militar de
origem às várias escolas que formam Deodoro, no Rio de Janeiro, tiveram
profissionais da área (BRASIL, por base as antigas instalações do
CML, 2009). Derby e das pistas do Regimento
Também a equitação militar foi Andrade Neves, a fim de atender aos
a grande difusora da equitação para requisitos técnicos das provas hípicas
o meio civil em todo país. Através internacionais, como os XV Jogos
da Escola de Equitação do Exército Panamericanos do Rio de Janeiro em
(nova denominação a partir de 2007. Sua denominação faz referência
1954), originada do então Centro de ao General Eloy Menezes, que,
Formação de Oficiais Instrutores de como Capitão, tornou-se o primeiro
Equitação, o Exército contribuiu para cavaleiro brasileiro a conquistar
a criação, sem exceção, de todos os uma medalha em olimpíadas, em
clubes e sociedades hípicas do Brasil; Helsing no ano de 1956 (BRASIL,
apoiou a todos os eventos hípicos 2º RCG, 2001). Em 1967, o Cel
civis, colaborou com a Confederação
Renyldo sagrou-se campeão de salto
Brasileira de Hipismo e federações de
montando Shannon Shamrock nos
todos os estados, além de incentivar
o ensino da equitação em todos os Jogos Pan-americanos de Winnipeg
clubes hípicos e Polícias Militares (BRASIL, EsEqEx, 2013).
(GOMES, 2011).

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2.2.2 O emprego do cavalo pelas O cerimonial militar e a
Forças Armadas nos dias atuais prática desportiva a cavalo são
meios de preservação das tradições
Face à evolução dos meios militares. A cavalaria de guarda é
de combates, o emprego do cavalo uma força composta por elementos
pelas Forças Armadas ficou restrito motorizados e hipomóveis,
à cavalaria de guarda. Na atual empregada, prioritariamente, em
conjuntura nacional, o Exército operações de Defesa Interna, Ações
Brasileiro tem valorizado o preparo de Defesa Territorial, Cerimonial
e o emprego da Força Terrestre em Militar e missões de representação
Operações de Garantia da Lei e da da Força Terrestre. Na guerra, pode
Ordem (EBRE, 2009). A tropa de ser aplicada na segurança de áreas
choque a cavalo esteve envolvida de retaguarda de grandes comandos
na região do Complexo do Alemão operacionais ou administrativos
no Rio de Janeiro-RJ, reforçando localizados na zona de combate (ZC)
a Força Conjunta de Pacificação, ou zona de administração (Z Adm) e
durante a Operação Arcanjo IV no na defesa de instalações (BRASIL,
ano de 2008. Fez parte do efetivo C2-1, 1999).
preparado para atuar na Copa das O Exército Brasileiro possui
Confederações em 2013 e na Copa três Unidades Hipomóveis: o 1º
do Mundo em 2014. Regimento de Cavalaria de Guardas
O cavalo continua sendo (Brasília-DF), o 2º Regimento de
empregado como ferramenta Cavalaria de Guarda (Rio de Janeiro-
importante de instrução e RJ) e o 3º Regimento de Cavalaria
desenvolvimento de atributos da de Guarda (Porto Alegre-RS). As
área afetiva. A equitação pode unidades da cavalaria de guarda
trazer benefícios psicopedagógicos podem realizar a defesa de pontos
e, em longo prazo, favorecer sensíveis, instalar e operar postos de
o desenvolvimento físico e segurança estáticos, instalar e operar
psicológico. Contribui para o postos de bloqueio, controle de
desenvolvimento afetivo, cognitivo e estradas e de vias urbanas; realizar a
psicomotor; destacando os atributos escolta de comboios utilizando meios
indispensáveis ao combatente como: motorizados e realizar o controle
autoconfiança, coragem, equilíbrio de distúrbios civis empregando
emocional, iniciativa, persistência, elementos a pé e hipomóveis; realizar
liderança e disciplina (SILVA, 2004). patrulhamentos, participar das ações
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de segurança de áreas de retaguarda, prontamente responsivos às ações do
realizar a segurança de autoridades cavaleiro.
militares e civis, apoiar as operações O treinamento dos animais
de assuntos civis, participar das é contínuo e realizado por
operações contra forças irregulares, meio de instruções em terreno
realizar operações de Defesa Interna variado, procurando desenvolver
e ações de Defesa Territorial; a musculatura e o equilíbrio
participar, como tropa de choque, no indispensáveis aos cavalos. A ordem
restabelecimento da ordem pública; unida a cavalo é realizada para que
participar de Operações Psicológicas os animais aprendam a permanecer
e de Ação Cívico-sociais, cumprir unidos sem apresentar reações, para
missões de escolta e guarda de que obtenham confiança mútua
prisioneiros e enquadrar até duas e tranquilidade nas situações em
companhias de guarda (BRASIL, que estiverem sendo empregados.
C2-1, 1999). A Pista de Combate Simulado de
A tropa montada apresenta Choque Hipomóvel possui uma
como fator limitante a permanência sequência de 59 obstáculos dispostos
prolongada no combate. O tempo em corredores, que podem ser
máximo de emprego ininterrupto do percorridos em qualquer sentido.
cavalo é de 6 horas, sendo necessário Procura-se reproduzir as variações
igual período de recuperação, dos ambientes operacionais urbano e
alimentação e consumo de água em rural com a finalidade de desenvolver
abundância para evitar problemas a franqueza e a coragem dos animais
digestivos e locomotores. Outra e familiarizá-los às situações
vulnerabilidade são os arremessos imprevistas e incomuns. Podem ser
de objetos e agressões aos animais representados sons característicos
quando não há interposição de tropa dos ambientes de atuação, como
a pé (EBRE, 2009). disparos, sirenes, gritos e outros.
Os cavalos são encilhados com Além disso, podem ser utilizados
material de proteção para prevenir agentes químicos, fumígenos e
lesões durante o combate, tais como explosivos não fragmentáveis para
viseira anti-choque, caneleiras, simulação do ambiente de operações
protetor de chanfro, peitoral e (EBRE, 2009).
manta de proteção, pois podem ser A escolta, que pode ser de
intimidados e agredidos durante honra ou de segurança, é a ação
as operações, devendo se manter unificada da tropa hipomóvel em
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movimento, executada sobre o de valores na sua conduta cotidiana,
controle centralizado, com a missão aumento da destreza psicomotora,
de garantir a segurança e guarda de entre outros. Pilotos de caça de forças
pessoas ou bens em deslocamento aéreas, como a australiana, praticam
(EBRE, 2009). No cerimonial militar a equitação como forma de apurar
a cavalo, existe a linha de bandeiras seus reflexos e sua rapidez na tomada
históricas, da bandeira nacional de decisões (RIGUEIRA, 2003).
e estandarte e o carrossel militar Analisando ainda os efeitos da
(BRASIL, C25-5, 1952). equitação sobre o praticante, observa-
Como prática esportiva, a se que a coragem e determinação, no
equitação propicia ao corpo do contexto do inesperado, são atributos
praticante uma atividade física global, também desenvolvidos. Por exemplo,
desenvolvendo a destreza, a robustez durante o salto de obstáculos, a zona
muscular, as qualidades morais e, com na qual o cavalo pode iniciar seu
muito mais abrangência e equilíbrio, movimento ascendente é conhecida
a coordenação motora. Proporciona como “zona de incerteza”. Para
também a evolução fisiológica do que o cavaleiro acerte o momento,
praticante, com desenvolvimento de conhecido como “batida”, e possa
força e flexibilidade, bem como dos indicá-lo ao cavalo, é necessário
aspectos psicológicos e morais, faz que tenha um sentido de distância
nascer a autoconfiança, o espírito extremamente acurado, comumente
de decisão, a iniciativa e a resolução chamado “olho do cavaleiro”, um
(CIRILLO, 2010). “golpe de vista” que manifesta a
Segundo Candiota (1999), inteligência reflexa. Também é ponto
o contato com o cavalo estabelece pacífico a coragem necessária para
uma relação de amizade e confiança, avançar em direção ao obstáculo e
que favorece a superação de medos transpô-lo. Desta forma, um percurso
e da insegurança, fortalecendo de salto torna-se a simulação da
sentimentos de controle e aumentando batalha (RIGUEIRA, 2003).
a autoestima. O desenvolvimento A carência do Exército
desses atributos, por meio da Brasileiro por experiências de
equitação, pode ser evidenciado pela combate real pode ser suprimida
melhora da capacidade cognitiva do pela prática dos desportos equestres,
praticante na resolução de problemas, pois as reações do cavalo, como
comportamentos bem adaptados às ser emocional, não são previsíveis
situações de estresse, externalização (RIGUEIRA,2003).
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O homem sabe intuitivamente, há duas classes principais: os volumosos
milhares de anos, que o cavalo e a (pastos e forragens conservadas) e os
equitação estão ligados à liderança.
Eles não são apenas símbolos de concentrados (alimentos com alto
liderança, mas contribuem com conteúdo energético e/ou protéico)
a própria capacidade de liderar. (DITTRICH e MELO, 2010). Nessas
Os esportes equestres provocam classes de ingredientes estão presentes
a plena atividade do cérebro
humano. A mente torna-se vivaz e os nutrientes: carboidratos solúveis,
o corpo flexível. Sendo o cérebro o celulose, pectinas, hemiceluloses,
órgão responsável pela posição do gorduras e proteínas, que são fontes
indivíduo na hierarquia do gênero
de energia e substratos para o
Homo, a equitação, por causa da
sua capacidade única de mobilizar a desenvolvimento e manutenção dos
totalidade da fisiologia humana, pode animais (GALVÃO e ALMEIDA,
tornar-se o próprio agente catalisador 2004).
da liderança (RINK, s.d.).

Figura 1: Principais nutrientes da


2.2.3 Alimentação e cuidados
dieta de equinos estabulados

A domesticação e utilização
pelo homem resultou em mudanças
nos hábitos alimentares dos cavalos,
principalmente no que diz respeito
ao tamanho das áreas disponíveis
para o pastejo, diversidade dos
ingredientes da alimentação e tempo
destinado à alimentação (DITTRICH
e MELO, 2010). Em condições Fonte: Frape, 2007.
naturais, os cavalos dedicam muito
tempo ao longo do dia e da noite São considerados volumosos
para pastejo (FRAPE, 2007). Ao os alimentos que fornecem a maior
confiná-lo, mesmo que somente proporção de fibras vegetais,
durante o período noturno, o homem representadas por carboidratos
restringiu o período de alimentação estruturais (basicamente celulose
e introduziu alimentos incomuns na e hemicelulose) e lignina,
dieta (FRAPE, 2007). indispensáveis aos equinos. As
Os ingredientes da alimentação fibras formam a base da dieta
equina podem ser simplificados em de equinos e outros herbívoros,
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havendo evidências de seus efeitos forrageiras (WRIGHT, 1999), ou em
na prevenção de acidoses, cólicas, proporção de, no mínimo, 50 % da
laminite, úlceras gástricas e alterações dieta total em MS. A quantidade ideal
comportamentais (DITTRICH e de feno é estimada na literatura em
MELO, 2010). cerca de 1,5% PV por dia (FRAPE,
Os carboidratos estruturais, 2007).
somados aos não estruturais, Os fenos são os principais
constituem a fonte energética dos alimentos volumosos utilizados em
volumosos. Amido e açúcares Organizações Militares, servindo
simples são exemplos de carboidratos também como complemento
não estruturais digeridos por enzimas volumoso em locais onde a pastagem
endógenas, principalmente no se torna insuficiente. Gramíneas e
intestino delgado dos cavalos. No forrageiras leguminosas são cortadas
entanto, os carboidratos estruturais e secas para a produção de feno. O
e as frutanas não são digeridos por estágio de maturidade do vegetal no
estas enzimas, mas pela microbiota momento do corte, as condições do
do intestino grosso através da clima, cuidados com a secagem,
fermentação, produzindo ácidos enfardamento e estocagem são fatores
graxos voláteis (AGV) como fonte de que influenciam mais a qualidade
energia. A lignina será excretada nas nutricional do feno que a própria
fezes sem aproveitamento (BRANDI espécie da forrageira (FRAPE, 2007).
e FURTADO, 2009). Concentrados são formulações
Existem diferentes formas de ricas em energia e densas em nutrientes,
quantificar as fibras de um vegetal, geralmente industrializadas,
sendo utilizada atualmente a Fibra compostas basicamente por grãos.
em Detergente Neutro (FDN), São a principal fonte energética da
constituída por celulose, parte da dieta dos equinos atletas por conterem
hemicelulose e lignina. Uma dieta grande proporção de amido e outros
com menos de 6% de fibra aumenta os carboidratos hidrolisáveis. Quando
riscos de cólicas e outros distúrbios, comparados ao feno, os grãos de
quando comparada a dietas com 12 a cereais fornecem o dobro da energia
14% (BRANDI e FURTADO, 2009). digestível (ED) por quilo (Kg) de
Como regra geral, a exigência de MS. Quanto maior a intensidade
fibras pode ser atingida fornecendo e velocidade da atividade física
cerca de 1 % do Peso Vivo (PV) do desempenhada pelo cavalo, maior
animal em Matéria Seca (MS) de a proporção de grãos necessários
112 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
para composição da dieta (FRAPE, e minerais, além da adição de
2007). Entretanto, cabe ressaltar que palatabilizantes. A peletização
a utilização excessiva de concentrado diminui o desperdício, reduz o espaço
pode causar problemas digestivos necessário à estocagem, a tosse nos
e metabólicos aos equinos devido à animais com problemas respiratórios,
limitada ação enzimática no intestino facilita a mastigação dos animais com
delgado e consequente fermentação dentição ruim e impede a seleção
de parte dos carboidratos hidrolisáveis de partículas (FRAPE, 2007). Para
no intestino grosso, alterando o pH aumentar a digestão pré-cecal do
do lúmen. Verifica-se também que, amido e evitar sua fermentação
após o consumo, há um aquecimento no intestino grosso, é realizado o
causado por sua rápida assimilação processo de cocção: laminação ou
e fermentação, podendo prejudicar extrusão. A extrusão se caracteriza
a performance de animais em climas pela cocção através da injeção de
quentes ou daqueles mais agitados vapor de água superaquecido e queda
(FRAPE, 2007). abrupta na pressão. Esse processo
De acordo com a literatura, a aumenta a estabilidade do produto,
quantidade máxima de concentrado eleva a palatabilidade e destrói
que pode ser fornecida em uma toxinas e fatores antinutricionais
única refeição a um animal adulto (FRAPE, 2007).
é 1,6 a 2,0 kg (WRIGHT, 1999), ou Outra fonte importante de
ainda até 0,2% do PV por refeição energia dos concentrados são os
(BRANDI e FURTADO, 2010). lipídeos, que compõem cerca de 4%
Qualquer que seja a quantidade do alimento comercial. Há também
final, os concentrados devem ser a possibilidade de suplementação na
introduzidas gradativamente, de forma de óleos e gorduras visando
forma que permita a adaptação da a aumentar seus benefícios. As
microbiota intestinal e o máximo gorduras de alta qualidade podem
aproveitamento (WRIGHT, 1999). reduzir a velocidade de fluxo
Alguns métodos de da ingesta, diminuindo o índice
processamento e beneficiamento glicêmico, entretanto disponibilizam
da indústria melhoram e agregam o dobro de energia digestível que
qualidade à matéria prima dos o amido (fornecem cerca de 9.100
alimentos concentrados. Permitem Kcal/ Kg de ED). Justamente por
a inclusão de antioxidantes, seu efeito contrário aos carboidratos
balanceamento de vitaminas de rápida absorção, os óleos sendo
Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015 113
mais lentamente assimilados, podem Para os equinos atletas, o
colaborar com efeito calmante. consumo adequado de energia é o
As proteínas vegetais possuem aspecto mais difícil de ser controlado.
papel importante no crescimento e As exigências aumentam de acordo
composição muscular podendo ser com a intensidade e duração do
fontes de energia para os atletas. trabalho, variando conforme a
Proteínas de alta qualidade são modalidade exercida, velocidade,
encontradas na alfafa, sementes tipo de terreno, peso do ginete e do
de soja e linhaça, ingredientes próprio cavalo; condicionamento
comuns na dieta de equinos. A idade físico e composição muscular do
e a atividade são considerações animal; idade e temperatura ambiente
importantes na determinação das (GALVÃO e ALMEIDA, 2004). A
exigências protéicas (GALVÃO e quantidade calórica ingerida deve ser
ALMEIDA, 2004). Nos equinos suficiente para mantença e atividade
adultos a quantidade de proteína física, considerando como referência
exigida é pequena em comparação a ED, ou seja, a energia bruta do
aos animais em crescimento. Assim, alimento subtraída daquela perdida
níveis de 11 a 12% de proteína bruta nas fezes (NRC, 2007).
nas dietas para atletas são suficientes No cálculo do gasto energético,
(SANTOS et al, 2012). a intensidade do exercício é estimada
através da classificação em: leve,
2.2.4 Exigências nutricionais moderada ou intensa, calculando como
25%, 50% e 100%, respectivamente, o
A atividade atlética é a principal incremento de energia necessário além
função do cavalo exigida pelo homem da manutenção (NRC, 2007). Porém,
na atualidade, sendo fundamental somente a avaliação da intensidade
o manejo nutricional correto para do exercício não é suficiente para
obtenção da máxima performance. estimar os gastos energéticos de um
Alguns fatores mínimos devem ser animal. Diversos fatores também
considerados para a nutrição adequada influenciam nesses gastos, tais
de um indivíduo ou um grupo de como: individualidade, idade, clima,
equinos: o consumo diário em MS e treinamento, arreamento, superfície
o conteúdo de energia do alimento, de trabalho, genética, nutrição, etc.
além das necessidades energéticas Uma observação importante é que, em
diárias para manutenção e atividade ambientes quentes, os equinos gastam
funcional (FRAPE, 2007). cerca de 10 a 20% a mais de energia no
114 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
trabalho que em temperaturas amenas jogar-se ao chão, rolar, dar coices
(NRC, 2007). no próprio abdôme, caminhar com
dificuldade, etc; que auxiliam no
Quadro 1: Demandas de ED de reconhecimento de um episódio. A
manutenção e trabalho em pista plana cólica não é uma entidade nosológica
específica, mas sim um conjunto de
PESO CORPÓREO (KG) 400 múltiplas consequências de disfunções
Capacidade aproximada de de vísceras intra-abdominais, sendo
alimentação por dia (Kcal de 23.800 responsável por grandes perdas
ED) econômicas relativas a tratamentos e
Exigências para manutenção óbitos (LARANJEIRA e ALMEIDA,
13.370
por dia (Kcal de ED) 2009 a).
Exigência aproximada Os distúrbios podem ser
para o trabalho, acima da gástricos ou intestinais, obstrutivos
12.000
manutenção: Meio galope,
ou não, com ou sem estrangulamento
galope e saltos (1 hora)
vascular. O intestino do equino
Fonte: NRC, 2007 – adaptado. é anatomicamente predisposto a
deslocamentos e torções devido ao seu
2.2.5 Cólica e fatores de risco longo comprimento e pouca fixação.
relacionados O estômago, sendo pequeno, com
piloro forte e contraído, colabora para
a síndrome. A maioria dos autores
Estudos de incidência de descrevem a distensão gástrica como
síndrome cólica e suas causas, sendo a causa mais comum de cólica
relacionando as características dos na prática clínica, porém as obstruções
equinos, dos alimentos oferecidos e do intestino grosso por compactação
do manejo, constituem ferramentas da ingesta também figuram como
importantes no planejamento da saúde importantes causas. Há ainda casos
e na adoção de medidas de prevenção que ocorrem devido à alta infestação
(LARANJEIRA e ALMEIDA, 2009 por parasitas (LARANJEIRA e
a). ALMEIDA, 2008).
A síndrome cólica é uma das O risco de cólica pode ser
principais causas de atendimento maior quando altas proporções de
veterinário de equinos. Caracteriza-se alimento concentrado são ingeridas,
por manifestações de dor abdominal: ou quando ocorrem mudanças
deitar e levantar constantemente, bruscas na quantidade ou no tipo do
Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015 115
alimento. Outro fator de ocorrência casos e o alto índice de insucesso nos
para a síndrome relaciona-se com tratamentos, principalmente daqueles
a ingestão de água. A redução no que demandam procedimentos
consumo contribui com a formação de cirúrgicos, são os motivos que
compactações de digesta no intestino justificam amplas medidas de
grosso, sendo importante garantir a prevenção. (LARANJEIRA e
quantidade, qualidade e temperatura ALMEIDA, 2009 a).
adequada da água que está sendo
oferecida aos animais (LARANJEIRA 2.2.6 Manejo adequado
e ALMEIDA, 2008).
Mesmo a forragem, que traz O fornecimento de uma
inúmeros benefícios, se possuir alimentação controlada e balanceada
baixa digestibilidade, pode figurar ao equino, aliado à possibilidade de
como fator de risco na ocorrência o animal exercitar-se diariamente,
de compactações. A probabilididade são medidas que visam a minimizar
também aumenta com a presença de o risco de ocorrência da síndrome
cestóides no Trato Gastro-Intestinal cólica e de outras alterações
(TGI) ou com a utilização rotineira, metabólicas. Também é importante
esporádica ou acidental de algumas manter a rotina dos animais, pois
drogas, como os antiinflamatórios, são muito sensíveis às alterações
parassimpatomiméticos ou de manejo (LARANJEIRA e
organofosforados e amitraz ALMEIDA, 2009 b).
(LARANJEIRA e ALMEIDA, 2008). No manejo alimentar, o
A idade dos equinos também volumoso deve ser oferecido antes do
foi identificada como um fator de concentrado para melhor eficiência
risco para a ocorrência de síndrome de absorção e diminuição da
cólica. Os equinos com idade superior proporção de amido que fermenta no
a 16 anos possuem maiores chances intestino grosso. As refeições devem
de ter cólica em relação àqueles com ser distribuídas sempre nos mesmos
até quatro anos. Assim, o risco de horários, evitando que passem longos
cólica aumenta com o aumento da períodos em jejum ou aguardando o
idade do equino, provavelmente, pela alimento (SANTOS et al, 2012).
queda na frequência de exercícios, Para cada modalidade, existe
alterações na dentição ou recorrência uma adaptação nos horários e
por lesões prévias. A multiplicidade fracionamento das refeições. Pode ser
das causas, a complexidade dos necessária a mudança da formulação
116 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
para determinado indivíduo ou grupo, de exercício, devido às diversas
devido às atividades diferenciadas. modalidades e atividades que
Por exemplo, se a alimentação desempenham. Então, para facilitar o
do equino exigir uma quantidade entendimento do assunto e simplificar
maior de concentrado, por estar a proposta de manejo alimentar, será
submetido à atividade intensa, os considerado neste trabalho o nível de
cuidados e a vigilância devem ser exercício moderado.
redobrados. Devem ser fornecidas A estabulação, restrição de
pequenas porções de concentrado, volumoso, grande quantidade de grãos
aumentando o número de refeições ingeridos por dia, idade dos animais e
diárias e utilizando apenas produtos o transporte foram apontados como
de alta qualidade (LARANJEIRA e alguns fatores de risco para a síndrome
ALMEIDA, 2009 b). cólica presentes em Organizações
Militares (LARANJEIRA e
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO ALMEIDA, 2008).
A alimentação deve suprir as
3.1 Manejo dos RCG variadas necessidades nutricionais
sem causar transtornos digestivos e
metabólicos (FRAPE, 2007). Tanto os
Foram analisados os dados excessos quanto as deficiências podem
dos relatórios anuais das Seções causar prejuízos ao organismo, sendo
Veterinárias dos 1°, 2° e 3° RCG, a análise da alimentação ofertada a
enviados à SGLRV referentes ao melhor forma de identificar e corrigir
ano de 2013. Neles são encontrados desequilíbrios (LEWIS, 2000).
dados relativos à alimentação e A alimentação dos animais nos
condições físicas dos animais, RCG seguem os padrões definidos
manejo profilático, manejo sanitário
pela Seção de Gestão de Logística
e casuística no atendimento
e Remonta Veterinária. A ração
veterinário. Esses dados compõem
total diária é composta por 5 kg de
as informações e direcionam as
concentrado comercial balanceado
sugestões a seguir.
(marca Pró Cavalo Especial),
somados à mesma quantidade, em
3.1.1 Manejo alimentar quilos, de feno de capim (coast
cross ou tifton 85), e sal mineral nas
Os animais de uso militar se quantidades necessárias para cada
enquadram em diferentes categorias cavalo. O concentrado total fornecido
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Quadro 2: Composição da dieta dos equinos nos RCG: teores de energia
digestível (ED), percentuais de matéria seca (MS), proteína bruta (PB),
extrato etéreo (EE), fibra bruta e fibra em detergente neutro (FDN).
ED PB EE FB FDN
MS (%)
(Kcal/Kg) (%) (%) (%) (%)
Concentrado 2.700 88 12 4 15 24
Feno de capim coastcross 1.500 85-92 7,4 2,7 33 75
Fonte: as autoras.

é fracionado em duas ou três porções, requisito no balanceamento da dieta


administradas com 1 hora de de um equino atleta é atender às
antecedência do início do exercício, necessidades energéticas do animal.
para cada quilo de alimento ingerido. Sendo assim, ainda é preciso fornecer
Essas frações são alternadas com as cerca de 6.500 Kcal por dia para
porções de feno. Em OM em que os cada animal. A forma mais segura
equinos recebiam 6 Kg de grãos por seria complementar a dieta com
dia, verificou-se maior incidência maior quantidade de volumoso. Para
de cólica quando comparada às que atingir a quantidade adequada de
ofereciam 4 Kg (LARANJEIRA e 1,5% do PV de volumoso por dia,
ALMEIDA, 2009 b). deveriam ser fornecidos 6 Kg de feno,
Os valores de energia acrescentando-se 3.000 Kcal na dieta.
consumidos em 5 Kg de concentrado, Ainda, o débito restante pode ser
por exemplo, como ocorre na dieta suprido com óleo de soja, na forma
dos RCG, resultam em 13.500 Kcal, de suplementação, adicionado ao
somados aos 6.000 Kcal oferecidos, concentrado comercial no momento
suprindo cerca de 18.500 Kcal por da refeição. Como já descrito, a adição
dia. No entanto, baseado nos valores de óleo, dentro de limites estimados,
da literatura e no quadro 1, para um pode trazer benefícios além da
equino adulto de 400 kg em atividade energia. Cerca de 300 g de óleo por
moderada, pode ser considerado o dia, adicionados na dieta, concluiriam
requerimento de 25.000 Kcal/dia o balanceamento energético.
de ED (WRIGHT, 1999). Portanto, Na análise dos níveis de
concluiu-se que a dieta ofertada não proteína bruta da dieta citada acima,
supre adequadamente às demandas em total de MS, não são atingidos
energéticas dos animais. Como os níveis mínimos aconselhados. A
descrito anteriormente, o principal alimentação dos cavalos nos RCG
118 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
contém aproximadamente 9% de PB. provavelmente os outros nutrientes
Também podem ser dadas alternativas estarão adequados às demandas dos
para complementar esse déficit, sendo animais. Níveis minerais podem
apenas necessário buscar a que possua ser suplementados por compostos
melhor custo benefício para a OM. comerciais de minerais dependendo
A suplementação com concentrados das necessidades individuais dos
protêicos ou compostos comerciais de atletas.
aminoácidos, a troca do concentrado
comercial por outro que contenha
3.1.2 Clínica
maiores níveis de PB, a adição de
farelo de soja na dieta, substituição de
parte do volumoso por feno de alfafa, Os gráficos a seguir sintetisam
etc, são alguns exemplos dessas os atendimentos realizados pela seção
alternativas. veterinária dos três RCG, no ano de
Atingidos os níveis calóricos 2013.
mínimos e de proteína bruta,
Gráficos 1,2 e 3: Representam as baixas por grupo nosológico dos três
RCG.

Fonte: as autoras.
Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015 119
Fonte: as autoras.

Fonte: as autoras.

120 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
Com a observação dos dados membros. As luxações são resultantes
dos gráficos, é possível verificar dos mesmos mecanismos do entorse,
que a proporção das causas no entanto, possuem gravidade
mais comuns de atendimentos é maior, com perda da relação entre
semelhante entre os Regimentos. as superfícies articulares, possível
Porém a análise comparativa dos ruptura de ligamentos e de cápsula
dados não foi possível pela diferença articular (THOMASSIAN, 2005).
nas classificações das afecções nas Definiu-se como caso de
Seções Veterinárias. cólica todo episódio em que o equino
Grande parte da casuística apresentou sinais de dores abdominais
é atribuída a ferimentos e traumas e tenha sido atendido pelo serviço
na pele e no aparelho locomotor, veterinário das unidades militares.
muitos provenientes de acidentes na Os casos de cólica nas diferentes
própria baia do animal. Geralmente, OM resultam de diversos fatores,
o problema está relacionado ao como a quantidade e os horários de
fato do animal precisar se levantar fornecimento do alimento, o manejo
num espaço restrito, ou em pisos diferenciado, dependendo do militar
escorregadios (LAROUSSE, 2006). “proprietário”, graus diferentes de
Porém, as principais lesões e traumas atividade a que eram submetidos, e
são decorrentes da atividade fisica a presença ou não de outras afecções
desempenhada. Dentre as mais (LARANJEIRA e ALMEIDA,
comuns, as fraturas, entorses e 2009 b).
luxações são as que causam maiores
danos à função atlética dos animais. 3.1.3 Profilaxia e controle sanitário
Fratura é a denominação de qualquer
solução de continuidade sofrida por
Em unidades militares, ocorre
ossos e, devido ao grande porte dos
a vacinação e vermifugação dos
cavalos, pode ter consequências
animais, seguido o calendário pré
drásticas até mesmo para a vida do
definido pela SGLRV. A profilaxia
animal. O entorse é a perda repentina
alterna vacinas compostas contra
e momentânea da relação anatômica
Influenza, Tétano, Encefalomielite
e estrutural de uma articulação.
e Rinopneumonite, com vacinas
Ocorre mais frequentemente
simples para Leptospirose, Adenite
naqueles animais que desempenham
e Raiva. A vermifugação é realizada
modalidades que causam
a cada três meses, sem a realização
instabilidade durante o apoio dos
de exames coproparasitológicos para
Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015 121
levantamento de níveis de infestação robustus, Habronema muscae e
ou tipificação dos parasitas. Trichostrongylus axei. Mesmo
O quadro a seguir traz as quando os animais são submetidos ao
medidas profiláticas necessárias à manejo adequado como atletas de alto
manutenção da saúde dos equinos de nível, podem apresentar infestação
acordo com a SGLRV. devido à resistência ao antiparasitário
utilizado. Geralmente a infestação
Quadro 3: Medidas profiláticas para ocorre de forma subclínica,
equinos, de acordo com as diretrizes diminuindo o rendimento no esporte
da SGLRV para o ano de 2014. e podendo ocasionar cólicas,
gastrites, enterites, nefrites, hepatite
ENTIDADES
MÓRBIDAS
Periodicidade Medida e broncopneumonia, principalmente
devido aos ciclos migratórios no
Endoparasitoses Trimestral Vermifugação
organismo animal (URQUHART,
Leptospirose Semestral Vacinação
1998). Assim, é feito o rodízio e
Adenite Equina Semestral Vacinação associação de compostos de amplo
Anemia espectro, higiene e limpeza de baias
Infecciosa Semestral Exame e piquetes, além do fornecimento de
Equina
feno e capim de boa procedência, afim
Mormo Semestral Exame de manter a eficácia dos tratamentos
Rinopneumonite Semestral Vacinação e os animais livres de reinfecções
Encefalomielite Anual Vacinação (THOMASSIAN, 2005).
Influenza Anual Vacinação A leptospirose é uma
enfermidade infecto-contagiosa
Tétano Anual Vacinação
aguda, decorrente da infecção
Raiva Anual Vacinação
pelo microorganismo do gênero
Fonte: as autoras. Leptospira interrogans e seus
diversos sorovares. Nos equinos
As endoparasitoses que pode causar abortos, disfunção
ocorrem com maior frequência nos renal, disfunção hepática e uveíte
equinos são: Parascaris equorum recorrente (THOMASSIAN, 2005).
(potros), Cyathostomum, Oxyuris É reconhecida pela Organização
equi, Strongylus vulgaris, Strongylus Mundial de Saúde como a zoonose
edentatus, Strongylus equinus, de maior difusão mundial e como
Triodontophorus, Gyalocephalus importante doença ocupacional,
capitatus, Oesophagodontus acometendo médicos veterinários,
122 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
trabalhadores de saneamento e ameniza a gravidade da manifestação
profissionais que estejam em contato (MORAES et al, 2009).
constante com os animais (RIBEIRO, A Anemia Infecciosa Equina
2013). Embora os equinos (AIE) é uma doença exclusiva dos
dificilmente apresentem sintomas equinos, crônica, incurável, causada
clínicos da doença, na maioria dos por um retrovírus transmissível por
locais de estabulagem há grande fômites e insetos hematófagos. A
prevalência sorológica. A profilaxia doença é de notificação obrigatória
pode ser feita através da imunização e, segundo as normas do Ministério
vacinal associada à prevenção da da Agricultura, Pecuária e
contaminação, principalmente pela Abastecimento (MAPA), todos os
urina de roedores, da água e alimentos animais devem ser examinados
que serão consumidos pelos cavalos periodicamente. Caso ocorra o
(THOMASSIAN, 2005). diagnóstico positivo, o animal deve
A adenite equina é uma ser eutanasiado e a OM deve passar
infecção contagiosa frequente do por um período de quaretena até
aparelho respiratório anterior dos que exames sucessivos em todos os
cavalos nas regiões mais frias do animais certifiquem que a unidade
país. Também conhecida como esteja livre da doença (MAPA, 2004).
“garrotilho”, é causada pela bactéria O Mormo é a enfermidade
Streptococcus equi, que acomete causada pela bactéria Burkholdelia
predominantemente os animais mallei, de potencial zoonótico e alta
mais jovens. Ocasiona abcessos capacidade infecto-contagiosa. Os
nos linfonodos submandibulares animais contraem o mormo através
e retrofaríngeos, podendo causar de alimentos, água, aerossóis,
infecção respiratória do trato inferior. secreção nasal, pus e, raramente,
Os animais se contaminam pelo urina ou fezes. A bactéria penetra
contato com secreções de outros nas mucosas orofaríngea, nasal
animais acometidos. Apesar de não e intestinal; ou em soluções de
ser uma zoonose, a vacinação é continuidade na pele. Manifesta-
utilizada devido ao grande período se por descarga nasal serosa, que
de convalescença da doença e evolui para purulenta, presença de
grandes gastos com o tratamento. abcessos subcutâneos e adenopatia,
Diferentemente de sua infecção ou sob a forma de pneumonia lobular
natural, a vacinação não causa (MAPA, 2004). Não há tratamento e
imunidade duradoura, no entanto, aqueles animais diagnosticados como
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positivos devem ser eutanasiados e a spp. Possui três formas distintas:
OM interditada até que todo o plantel do leste, oeste e venezuelana, das
restante seja testado e confirmado quais duas ocorrem no Brasil (leste
livre da doença (THOMASSIAN, e oeste). A fonte de infecção são
2005). aves silvestres infectadas, sendo os
Os exames negativos para cavalos hospedeiros acidentais. Não
Mormo e AIE são requisitos para há tratamento específico, apenas
emissão da Guia de Trânsito Animal sintomático, com pequenas chances
(GTA) e ingresso de novos equinos de cura (THOMASSIAN, 2005).
nas OM, bem como sua participação A influenza equina ou gripe
em eventos desportivos (MAPA, equina é causada por um vírus
2004). do gênero Influenzavírus A dos
O Herpesvírus é o agente subtipos H7N7 e H3N8. Caracteriza-
responsável pela rinopneumonite se por ser altamente contagiosa,
equina, manifestada por causando tosse contínua, febre,
sintomatologia respiratória, apatia, descarga nasal, queda de
neurológica e/ou reprodutiva. Exitem performance, e por predispor o trato
quatro tipos de Herpesvírus (EHV), respiratório a infecções bacterianas.
porém o tipo EHV1 e o EHV4 Pode ser fatal para asnos, potros,
são os mais prevalentes, causando animais em más condições de saúde
processo respiratório brando e e não vacinados. A infecção por
facilmente tratado, predispondo o influenza é muito semelhante à
animal ao aparecimento de infecções manifestação respiratória causada
secundárias. O vírus pode ficar latente pelo Herpesvírus, sendo também
por longos períodos, no entanto, indicada a vacinação periódica e o
não é raro o reaparecimento dos tratamento sintomático (OLIVEIRA
sintomas após situações de estresse et al, 2005).
vividas pelo animal. A vacinação é O tétano é uma toxiinfecção
protetora quando periódica e deve quase sempre fatal. Sua sintomatologia
ser usada principalmente em éguas ocorre por ação de neurotoxinas
reprodutoras, diminuindo as chances produzidas pelo Clostridium tetani.
de aborto (THOMASSIAN, 2005). Os casos estão relacionados a
A encefalomielite viral causada soluções de continuidade da pele que
pelo Alphavírus, com suas várias permitiram a infecção e condições
cepas, é uma zoonose transmitida de anaerobiose para o crescimento
pelo mosquito Aedes spp e Culex bacteriano e a produção da toxina
124 Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015
(ZAPPA, 2013). A absorção da toxina e os próprios animais devem ser
tetânica provoca rigidez muscular limpos, pelo menos, uma vez
(tetania), hiperestesia e convulsões, ao dia. O cuidado especial com
ocorrendo a morte após a paralisia os cascos, devido ao frequente
dos músculos respiratórios. Para contato com a urina, é primordial.
evitar a enfermidade é fundamental Devem ser regularmente untados
a vacinação e o cuidado e limpeza com lanolina, sebos ou graxas se
de feridas, com aplicação de soro estiverem ressecados ou quebradiços.
antitetânico para reforço após Também em relação aos cascos,
possível infecção (THOMASSIAN, o ferrageamento deve ser feito de
2005). acordo com o previsto: mensalmente,
A raiva é uma zoonose causada o ferrador casqueia retirando os
por vírus da família Rabdoviridae, excessos resultantes do crescimento,
mediante penetração através de e fixa ferraduras em todos os cascos
solução de continuidade na pele do (LAROUSSE, 2006).
agente presente na saliva de animais
infectados. Nos equinos, a infecção 4 CONCLUSÃO
normalmente ocorre pela mordedura
de morcegos hematófagos portadores
e reservatórios do vírus. Os O cavalo esteve presente em
animais apresentam sintomatologia inúmeros eventos que marcaram
neurológica, mais comumente a história do Brasil e continua
paralítica, com incoordenação sendo requisitado no cumprimento
motora, paralisia dos membros de missões de GLO, além de seu
pélvicos, paresia dos membros importante papel na formação do
torácicos, cegueira, decúbito, militar. A prática dos desportos
paralisia faríngea, diafragmática e preserva as tradições militares e
consequente morte (PEDROSO, aproxima o combatente do público
2010). civil. Ao desenvolver física e
intelectualmente o cavaleiro e
simular condições que exijam
3.1.4 Higiene e cuidados gerais reflexos necessários em situações de
conflito, o cavalo garante seu lugar
A limpeza e higienização como meio de instrução. Seu manejo
das baias deve ser realizadas sanitário e nutricional tem demandas
constantemente. Bebedouros, que refletem as particularidades
comedouros, material de encilhagem dessa espécie frente às condições
Revista Interdisciplinar de Ciências Aplicadas à Atividade Militar – Ano 5 Número 1 – 1° semestre de 2015 125
artificiais de confinamento, que a Conceituação dos Atributos da
geram, principalmente, lesões e Área Afetiva, para uso pelos Órgãos
distúrbios digestivos. Sua dieta deve e Estabelecimentos de Ensino
ser adequada à carga de trabalho subordinados, coordenados ou
a qual é submetido. Tendo como vinculados técnico pedagogicamente
referência as maiores proporções nas a este Departamento. Boletim
casuísticas dos RCG, foram descritas do Exército, Brasília, DF, 29
as principais enfermidades, sugeridos maio. 1998. Disponível em:
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são necessários estudos contínuos que
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