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Guia prático de

Hipertrofia e
Emagrecimento

o d e H I I T
P r e s c r i ç ã
PRESCRIÇÃO DO HITT

AUTORES: Christiano Bertoldo Urtado, Douglas Popp Marin,


Luis Felipe Tubagi Polito, Denis Foschini, Jonato Prestes e Ramires Tibana

INTRODUÇÃO

Nas últimas duas décadas diversos estudos demonstraram que o HIIT (“high intensity interval
training”) é um método eficazes para promoção de diversas adaptações ao treinamento (1, 2). O HIIT
envolve repetidos estímulos de curta duração de trabalho em alta intensidade, intercalados com pe-
ríodos de recuperação (ativa ou passiva) (1), e tem sido usado por atletas durante quase um século.
O HIIT nasce no contexto do esporte de alto rendimento com o objetivo de desenvolver o VO-
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máx e melhorar a velocidade limiar de lactato em atletas de diferentes modalidades. Nos dias atuais, o
HIIT é considerado seguro e eficiente para desenvolver diferentes objetivos em diferentes populações.

TREINAMENTO INTERVALADO – DIVISÕES METODOLOGICAS

Um dos grandes desafios de treinadores e pesquisadores é sistematizar a nomen-


clatura do treinamento intervalado. Existem diversas terminologias para descrever as di-
ferentes formas e métodos do treinamento intervalado, o que, de alguma forma, con-
duz a uma enorme confusão de siglas, acrônimos, e falta de padronização na literatura.
Nesse sentido, Weston, Wisloff e Coombes (3) propuseram um esquema simples de clas-
sificação do treinamento intervalado baseado na intensidade do esforço. Os autores sugerem o
termo treinamento intervalado de alta intensidade (HIIT – High intensity Interval Training) para des-
crever o estímulo de treinamento em intensidade de 80 a 100% da frequência cardíaca máxima
(FCmáx) e o uso do termo treinamento intervalado de sprint (SIT – Sprint Interval Training) para
protocolos que envolvem esforços máximos e supramáximos (all-out), os quais utilizam cargas
de trabalho superiores aquelas correspondentes a 100% do VO2máx. Buchheit e Laursen (4) utili-
zam outro sistema de classificação do treinamento intervalado, conforme apresentado na tabela 1.
Tabela 1. Classificação do treinamento intervalado (4).

Intensidade do intervalado Duração do intervalo


Tipos
de trabalho de trabalho

HIIT - Longo 90 -100% vVO2max 1 – 5 min

HIIT - Curto 100 - 120% vVO2max < 60 s

TSR All-out (100 -160% vVO2max) 3 – 10 s

SIT All-out (>160% vVO2max) 20 – 45 s

vVO2máx = velocidade referente ao VO2máx. TSR = Treinamento de sprint repetido.


Atualmente, o maior apelo dos programas de treinamento HIIT e SIT é a garan-


tia de efetividade nas adaptações fisiológicas, tanto em magnitude, quanto no tempo em-
pregado nas sessão.es de exercício. Dessa forma, o HIIT e o SIT são considerados como
mais eficientes em função do tempo (“time-efficient”) para promoção de benefícios relacio-
nados a saúde e ao condicionamento físico (5). Entretantanto, quando o assunto é emagre-
cimento, a relação de eficiência temporal dos programas de HIIT podem ser contestadas.
Variáveis do treinamento intervalado


No treinamento intervalado são descritas ao menos oito variáveis que devem ser manipuladas
para completar a prescrição dos protocolos de treinamento. A figura 1 apresenta a (1) intensidade o
intervalo de trabalho; (2) duração do intervalo de trabalho; (3) intensidade do intervalo de recuperação;
(4) duração do intervalo de trabalho de recuperação; (5) densidade do treinamento (proporção tempo-
ral entre a duração do intervalo de trabalho e intervalo de recuperação); (6) número de repetições do
intervalo de trabalho; (7) modalidade ou tipo de exercício; (8) volume total de treinamento em minutos.
Uma vez que o HIIT foi proposto para desenvolver os determinantes do VO2máx em atletas, as
sessões de HIIT são realizadas no domínio de alta intensidade. A intensidade de esforço é prescrita por
meio de indicadores fisiológicos associados com o VO2máx, limiar de lactato, limiares ventilatórios, tes-
tes de desempenho e percepção subjetiva de esforço (figura 1). Mesmo considerando a prescrição do
treinamento intervalo para promoção do emagrecimento, e não para o desempenho esportivo, o controle
da intensidade de esforço é um critério obrigatório para monitorar o efeito do programa de treinamento.

Figura 1. Variáveis de prescrição no método de treinamento intervalado.

Controle da intensidade no treinamento intervalado

A frequência cardíaca (FC) é o marcador mais comumente utilizado para monitorar a in-
tensidade de esforço no exercício. Geralmente, utilizamos zonas de percentual de FC basea-
das na FC máxima (FCmáx) ou na FC de reserva (FCR); entretanto, a efetividade da FC para
a prescrição e controle das sessões de treinamento intervalado pode ser limitada. Em primeiro
lugar, a FC não pode ser utilizada para prescrever intensidades com velocidade ou potencia aci-
ma de 100% do VO2máx, excluindo a prescrição de SIT, HIIT curto e TSR. Em segundo lugar, a
reposta de FC acima de 90% da FCmáx não é esperada em protocolos com duração curta (~30
s) ou media (1 a 2 min) de intervalos de trabalho(6). Em terceiro lugar, a inércia da FC (atraso
no declínio) ao término de cada intervalo de trabalho (FC durante a duração do intervalo de re-
cuperação) pode induzir a superestimação do trabalho metabólico. Em quarto lugar, existe uma
dissociação temporal entre a FC, o VO2 e a concentração de lactato durante o HIIT, limitando a
capacidade de estimar de forma confiável a intensidade de esforço por meio da FC (4). Mesmo
considerando os quatro tópicos apresentados, nós recomendamos o monitoramento da FC du-
rante o treinamento intervalado com o objetivo de conhecer as respostas individuais dos clien-
tes e também monitorar a demanda (7) cardiovascular do treinamento. Nesse sentido, destaca-
mos que a FC não é utilizada com indicador de parâmetro metabólico, mas sim, cardiovascular.
Aprescrição da intensidade de trabalho no treinamento intervalado pode ser realizada por meio da
percepção subjetiva de esforço (PSE) (4, 8).Aprescrição da intensidade pela PSE é simples e prática, pois
não é necessária nenhuma avaliação dos parâmetros metabólicos dos clientes. Evidentemente, à medi-
da que o cliente se familiariza mais com a escala de PSE, maior será a precisão do ajuste e intensidade.

Aplicação prática

1. A PSE apresenta baixo custo de aplicação, necessitando apenas de uma folha com
boa qualidade de impressão;
2. quando bem aplicada, a PSE apresenta elevados graus de correlação com indicado
res objetivos (frequência cardíaca e concentração sanguínea de lactato) (9);
3. o centro de controle cardiorrespiratório, localizado na ponte e no bulbo do tronco
cerebral (sistema nervoso central) leva aproximadamente de um a dois minutos para
estabilizar a FC frente a novas intensidades de exercício, o que pode prejudicar o
controle da intensidade de exercício em protocolos cujos estímulos são curtos ou
muito curto;
4. existem algumas situações em que a resposta da frequência cardíaca pode ser
influenciada pelo uso de determinados medicamentos (betabloqueadores, por exem
plo), o que a torna inviável para uso no controle de treinamento (10).

Para o controle da intensidade do treinamento intervalo sugere-se o uso da Escala Borg


PSE 6 – 20 para controle da intensidade do exercício. Alguns valores de referência em rela-
ção à RPE 6 – 20 (figura 2) e sua aplicabilidade aos modelos intervalados de treinamento po-
dem ser encontrados na literatura científica. Taylor et al. (10) recomendam para populações
clínicas (pessoas com diabetes, dislipidemia, etc.) protocolos de treinamento intervalado com va-
lores maiores que 15, em caso de exercícios intensos, ou maiores que 17, em caso de exercí-
cios muito intensos. Os mesmos escores (15 e 17 da escala de 6 – 20) foram encontrados no
estudo de Scheonmakers e Reed (11), que avaliaram o comportamento da PSE em diferen-
tes intervalos (1 a 4 minutos) de recuperação em protocolos de HIIT longo (estímulos de 4 mi-
nutos), encontrando que independente do tempo de recuperação, a PSE ao longo dos estímulos
apresenta progressivo aumento durante a sessão de treinamento, o que pode ocorrer devido ao
acúmulo de estresse não somente fisiológico, mas também psicológico, ambos inerentes à prática.
Quão intenso foi (ou está sendo) o exercício?

Figura 2. Escala de percepção de subjetiva de esforço 6-20.

As adaptações da PSE ao longo do programa de treinamento foram avaliadas por Stavrinou et


al. (12) que avaliaram 35 sujeitos e encontraram um resultado interessante: ao longo de dois meses de
treinamento, independente da frequência semanal (duas ou três vezes na semana), os valores médios
de PSE foram menores, o que ocorreu devido às adaptações crônicas do treinamento. Assim sendo,
cabe aos profissionais do exercício quando do controle do treinamento a partir da PSE, levarem em
consideração que para uma mesma taxa submáxima de exercício, ao longo do tempo, a PSE pode
apresentar ligeiras reduções, sinalizando a necessidade de aumento da carga de treino se o objetivo
do programa estiver relacionado com cargas progressivas para a continuidade do processo adaptativo.
Recomendações para utilizar a PSE

• Faça, quando possível, as coletas da PSE de forma individual;


• Deixe bem claro ao seu cliente que não há resposta certa ou errada e que este instru
mento não irá avaliar o desempenho físico (bom ou ruim), apenas servirá de parâme
tro para ajuste da intensidade de exercício;
• Não induza resposta ao avaliado;
• Repita a resposta do avaliado em tom de voz neutro, sem expressões faciais;
• Sempre, independente do grau de treinamento e da familiaridade do indivíduo com o
instrumento, apresente a Escala e peça que o indivíduo leia atentamente antes de
responder;
• Quando almejar que seu cliente realize o exercício em alta intensidade, mantenha
os valores de PSE > 15 da Escala RPE 6 – 20, levando-se em consideração que os
limiares ocorrem entre os níveis 13 e 15 (13).

Exemplos de protocolos de treinamento

Um dos protocolos mais clássicos de HIIT estudados atualmente é o de 10 x 1min em


intensidade referente a 90-95% FCpico (determinada em teste máximo) para 1 min de re-
cuperação (ativa leve) (REF) (figura 3). Podemos prescrever o mesmo protocolo de exer-
cício considerando a escala de PSE Borg 6-20. Nesse caso, o protocolo de treinamen-
to seria: 10 x 1 min (Borg 15-17): 1 min (Borg 9-11). Teríamos um volume final de 20 min
de exercício realizado com densidade 1:1 (intervalo de trabalho : intervalo de recuperação).
É importante notar que o volume deste protocolo de exercício pode ser manipulado em fun-
ção do nível de condicionamento físico do cliente. Podemos iniciar com somente 6 interva-
los de trabalho (6 séries) e progredindo para 8 séries e, por fim, aumentarmos para 10 séries.

Intervalo de trabalho = 1 min e Intervalo de recuperação = 1min

Figura 3. Montagem da sessão de HIIT.


REFERÊNCIAS

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tions for middle- and long-distance running. Part I: aerobic interval training. Sports Med. 2001;31(1):13-31.
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tor. Endurance training: science and practice Vitoria-Gasteiz2012. p. 41-50.
3. Weston KS, Wisloff U, Coombes JS. High-intensity interval training in patients with lifestyle-induced
cardiometabolic disease: a systematic review and meta-analysis. Br J Sports Med. 2014;48(16):1227-34.
4. Buchheit M, Laursen PB. High-intensity interval training, solutions to the pro-
gramming puzzle: Part I: cardiopulmonary emphasis. Sports Med. 2013;43(5):313-38.
5. Gibala MJ, Gillen JB, Percival ME. Physiological and health-related adaptations to low-
-volume interval training: influences of nutrition and sex. Sports Med. 2014;44 Suppl 2:S127-37.
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7. Astorino TA, Schubert MM. Changes in fat oxidation in response to various re-
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8. Coutts AJ, Rampinini E, Marcora SM, Castagna C, Impellizzeri FM. Heart rate and blood lactate
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9. Borg G, Hassmen P, Lagerstrom M. Perceived exertion related to heart rate and blood
lactate during arm and leg exercise. Eur J Appl Physiol Occup Physiol. 1987;56(6):679-85.
10. Taylor JL, Holland DJ, Spathis JG, Beetham KS, Wislo-
ff U, Keating SE, et al. Guidelines for the delivery and monitoring of high intensi-
ty interval training in clinical populations. Prog Cardiovasc Dis. 2019;62(2):140-6.
11. Schoenmakers P, Reed KE. The effects of recovery duration on physiological and perceptual
responses of trained runners during four self-paced HIIT sessions. J Sci Med Sport. 2019;22(4):462-6.
12. Stavrinou PS, Bogdanis GC, Giannaki CD, Terzis G, Hadjicharalam-
bous M. Effects of high-intensity interval training frequency on perceptual respon-
ses and future physical activity participation. Appl Physiol Nutr Metab. 2019;44(9):952-7.
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ved exertion at the ventilatory threshold. Eur J Appl Physiol Occup Physiol. 1987;56(2):206-11.

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