Você está na página 1de 22

Fundamentos Metodológicos

do Ensino de Matemática
O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Responsável pelo Conteúdo:


Prof.ª Dr.ª Edda Curi
Prof.ª Me. Priscila Bernardo Martins

Revisão Textual:
Prof. Me. Luciano Vieira Francisco
O Ensino das Operações do
Campo Conceitual Multiplicativo

• Introdução;
• Situações que Envolvem os Quatro Significados dos
Problemas do Campo Multiplicativo;
• O Contexto e os Problemas do Campo Multiplicativo;
• Procedimentos de Cálculo no Campo Multiplicativo;
• As Tabuadas;
• Procedimentos de Cálculo para Multiplicação e Divisão.


OBJETIVO

DE APRENDIZADO
• Discutir o ensino das operações do campo conceitual multiplicativo.
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Introdução
Nesta Unidade refletiremos sobre o ensino e a aprendizagem das operações do
campo conceitual multiplicativo. Você já estudou os problemas do campo aditivo e
percebeu os diferentes significados que as operações de adição e subtração apare-
cem nos problemas. Percebeu também a importância de se analisar o contexto do
problema, pois este influencia o significado da operação.

Para o campo multiplicativo também há estudos sobre os diferentes significados


das operações de multiplicação e divisão e sobre os contextos próprios dessas opera-
ções. O autor que discute esse tema também é o psicólogo Gerard Vergnaud (1996).

Como já foi dito, cada conceito matemático está inserido em um campo con-
ceitual, constituído por um conjunto de situações de diferentes naturezas. Da
mesma forma que Vergnaud (1996) sugere o trabalho conjunto com os problemas
aditivos e subtrativos, pois fazem parte de uma “mesma família”, recomenda o
trabalho conjunto com os problemas que envolvem multiplicação e/ou divisão.
O campo conceitual multiplicativo é formado por um conjunto de situações que
contemplam as operações de multiplicação e/ou divisão, com base em um campo
amplo de significados.

Da mesma forma que relaciona os cálculos do campo aditivo aos problemas


desse campo, faz as mesmas considerações para o campo multiplicativo e afir-
ma que os cálculos de multiplicação e de divisão precisam estar relacionados a
situações-problemas em contextos variados.

Provavelmente no tempo em que você estudou, o ensino das operações de


multiplicação e divisão era organizado passo a passo, ou seja, estudavam-se as
tabuadas, os resultados eram amplamente decorados; depois é que se passava
ao ensino dos algoritmos, passo a passo, aumentando a ordem de grandeza dos
números e, por último, eram apresentados problemas que poderiam ser resolvidos
por multiplicação ou por divisão, com base em problemas-modelo e outros muito
parecidos para resolução.

Esse tipo de ensino, considerado hoje tradicional ainda permanece em algumas


escolas. No entanto, estudos mais recentes e os novos currículos indicam outro foco
para o ensino desse tema. A ideia é partir de problematizações em que a criança
utilize de procedimentos pessoais para resolvê-las, depois o estudo de regularidades
e dos fatos básicos da multiplicação/divisão e, por último, o trabalho com os algo-
ritmos, porém, com compreensão.

As problematizações envolvendo as operações do campo multiplicativo devem


oferecer às crianças diferentes significados dessas operações e contextos variados
e adequados a esses significados. Não há uma relação entre os significados das
operações do campo aditivo e as do campo multiplicativo. No entanto, a Tabela a
seguir apresenta uma síntese dos significados dos dois campos:

8
Tabela 1
Significados dos Problemas do Campo Aditivo Significados dos Problemas do Campo Multiplicativo
Composição Proporcionalidade
Transformação Multiplicação comparativa
Comparação Configuração retangular
Composição de transformações Combinatória

Vergnaud (1994) apresenta vários tipos de situações e diversas classes de proble-


mas do campo multiplicativo. Destaca a importância de o professor distinguir essas
classes de problemas e analisá-las e de ajudar a criança a reconhecer as diferentes
estruturas de problemas e os procedimentos para cada solução.

Os estudos de Vergnaud (1994, 1996) foram adaptados para os Parâmetros


Curriculares Nacionais (PCN), que apresentam os quatro significados expostos na
Tabela 1 e que serão discutidos a seguir.

Situações que Envolvem os Quatro Significados


dos Problemas do Campo Multiplicativo
Situações que Envolvem o Significado de Proporcionalidade
Os problemas que envolvem esse significado surgem com muita frequência na
vida cotidiana e costumam ser trabalhados na escola como adição de parcelas iguais.
Veja exemplos:

Se um chocolate custa R$ 2,50, quanto custarão 3 chocolates iguais a esse?


Neste problema sabe-se o preço de uma quantidade e necessita-se saber o preço de
3 quantidades iguais, ou seja, 1 está para 2,50 assim como 3 está para X (situação
de proporcionalidade).

Em uma promoção, três pacotes de bolacha custam R$ 7,00. Quanto custarão seis
pacotes iguais a esses?
Se 3 pacotes custam 7 reais, seis pacotes custarão X (situação de proporcionalidade).

Fabiana comprou para o seu filho 4 camisetas iguais, mas de cores diferentes. Se elas
custaram R$ 48,00, qual foi o preço de cada uma?
Se 4 camisetas custaram 48,00, uma camiseta custou X (situação de proporcionalidade).

9
9
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Mariana distribuiu 30 bombons em pacotinhos com seis bombons, cada. Quantos


pacotinhos Mariana precisou para essa distribuição?
Cada pacotinho tinha 6 bombons, logo, X pacotinhos foram necessários para os
30 bombons (situação de proporcionalidade).

Na maioria das vezes, as crianças no início da escolaridade resolvem esses pro-


blemas por procedimentos pessoais, usando desenhos ou esquemas para mos-
trar seu raciocínio. Às vezes resolvem aditiva ou subtrativamente, pois ainda não
apresentam indicações de usar o raciocínio multiplicativo. No entanto, é preciso
evoluir. Pesquisadores afirmam que a evolução do raciocínio multiplicativo se dá
pelo envolvimento das crianças com os vários significados da multiplicação e com
os contextos adequados a esses significados.

Situações que Envolvem Multiplicação Comparativa


As situações que abrangem multiplicações comparativas também são comuns no
nosso cotidiano e envolvem termos que embora sejam matemáticos, são absorvidos
no vocabulário comum, tais como dobro, triplo, metade, terça parte, duas vezes
mais, cinco vezes mais etc. Veja exemplos:

Marcos tem 15 figurinhas e seu primo Otávio tem o dobro das figurinhas de Marcos.
Quantas figurinhas tem Otávio?
Comparação envolvendo a relação de dobro.

Simone tem 3 bonecas e Silvana tem quatro vezes mais que Simone. Quantas bonecas
tem Silvana?
Comparação envolvendo a relação de quádruplo – quatro vezes mais.

Fernanda tem 6 chocolates, ou seja, o triplo dos chocolates de Bernardo. Quantos


chocolates tem Bernardo?
Comparação envolvendo a relação de triplo/terça parte.

No início da escolaridade, as crianças resolvem esses tipos de problemas por


estratégias pessoais, no geral usando desenhos, agrupando a quantidade de um ele-
mento e depois usando a relação comparativa e indicando “quantas vezes mais” se
repete aquele agrupamento.

10
Situações que Envolvem o Significado de Configuração Retangular
Essas situações envolvem, no geral, objetos organizados em filas (linhas) e colunas
em uma espécie de retângulo. O total de objetos corresponde ao produto do número
de objetos dispostos em uma fileira pelo número de objetos dispostas em uma coluna.
Os contextos que propiciam esse significado podem ser caixas de frutas, de ovos, audi-
tórios, teatros etc., dado que esse tipo de problema permite a compreensão da noção
de área de uma superfície retangular como produto de suas medidas. Veja exemplos:

Em uma caixa de pêssegos, as frutas estão dispostas em 4 fileiras e 5 colunas.


Quantos pêssegos há nessa caixa?
Produto: 4 × 5

Em uma caixa de ovos, estes são colocados em fileiras de dois em dois.


Quantas colunas tem essa caixa de ovos se possui 30 ovos no total?
2 × 15 = 30 ou 30 / 2 = 15

No início da escolaridade, as crianças resolvem esse tipo de problema por estra-


tégias pessoais, no geral usando desenhos de retângulos e indicando as fileiras e co-
lunas. Primordialmente contam todos os elementos desenhados, após algum tempo,
contam os elementos da fileira, da coluna e os multiplicam.

Situações que Envolvem o Significado de Combinatória


Tais situações ainda são menos trabalhadas na escola. Para determinar o resultado,
é preciso fazer todas as combinações possíveis entre os termos. Esse significado
envolve uma noção matemática importante, que é o produto cartesiano. Os con-
textos apropriados para esse tipo de problema envolvem combinações de roupas,
sanduiches, tipos de alimentação etc. Veja exemplos:

Sofia foi viajar para a praia. Colocou em sua mala duas saias, uma preta e uma jeans
e três camisetas, uma vermelha, outra branca e uma dourada.
De quantas formas Sofia pode se vestir nessa viagem combinando suas 3 camisetas
com suas 2 saias?
As combinações possíveis de camisetas e saias: (v,p), (v,j), (b,p), (b,j), (d,p), (d,j).
Podendo ser escrita como: 3 × 2 = 6

11
11
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Rafael gosta muito de sorvete. Poderia escolher duas bolas de sorvete com 4 tipos de
cobertura entre os oferecidos na sorveteria.
Quantos tipos de sorvete Rafael poderia escolher?
2×4=8

As crianças tentam resolver esse tipo de problema apoiadas em desenhos e


esquemas em que ligam cada elemento do primeiro conjunto com todos os elemen-
tos do segundo conjunto e depois contam quantas ligações fizeram. Nem sempre
obtêm êxito, pois às vezes esquecem de fazer alguma correspondência ou se atra-
palham nas contagens.

Importante!
Cabe destacar que no campo multiplicativo os significados mais trabalhados na escola
são os de proporcionalidade e de multiplicação comparativa. É preciso mudar esse qua-
dro, tornando-se necessário trabalhar com todos os significados do campo multiplicativo
e com contextos adequados para que a criança se aproprie do raciocínio multiplicativo.

O Contexto e os Problemas
do Campo Multiplicativo
Fosnot e Dolk (2001) destacam a importância da escolha do contexto nos pro-
blemas do campo multiplicativo. Afirmam que esses contextos devem envolver três
componentes: permitir o uso de modelos; “fazer sentido” para as crianças; ser de-
safiador e provocar questões. Discorreremos sobre o que esses autores entendem
por esses componentes do contexto.

Uma situação-problema permite modelos quando o aluno puder usar imagens,


desenhos ou representações para esses modelos, por exemplo, situações que envol-
vem frutas, bombons, objetos, modelos retangulares etc. Destacam que a utilização
do mesmo modelo em diferentes situações-problemas possibilita a generalização,
facilitando o uso por parte das crianças.

Esses autores consideram que uma situação-problema deve fazer sentido para
a criança. Atribuem à expressão “fazer sentido” uma situação imaginária ou não
em que as crianças consigam compreendê-la, analisar a razoabilidade dos resulta-
dos e das ações realizadas para a construção de estruturas e relações como, por
exemplo, calcular a quantidade de figurinhas de uma criança que tem o dobro de
figurinhas de outra.

O terceiro componente é igualmente importante. Um problema deve ser desafia-


dor e permitir avanços e outras questões que podem ser feitas pelo professor, por

12
exemplo: Por que isso acontece? E se acontecer tal coisa? E se? Esses autores
afirmam que a possibilidade de novas questões caracteriza bons contextos, pois tais
contextos permitem a explicação do que acontece e dão origem a outras questões que
podem ser interessantes tanto do ponto de vista da criança, como da Matemática.

Os estudos de Fosnot e Dolk (2001) mostram a importância de o professor se-


lecionar (ou elaborar) problemas com bons contextos e diversificados, pois assim
possibilitarão aos seus alunos a construção gradativa da noção de multiplicação. Des-
tacam que tais contextos devem ser interessantes aos alunos, mas também devem
incluir possibilidades de o estudante usar diferentes modelos em que possa empregar
estratégias de contagem de um a um, contagem por grupos, uso intuitivo das pro-
priedades da multiplicação (comutativa, associativa, distributiva) e do cálculo formal.

Os modelos de agrupamento (agregados à ideia de proporcionalidade) e os de


configuração retangular, próprios da multiplicação devem ser explorados em diver-
sos contextos. Treffers e Buys (2001) afirmam que o modelo que mais se aproxima
da operação de multiplicação, do ponto de vista formal, é o de configuração retan-
gular. Destacam ainda que existem contextos que fazem emergir a validade da pro-
priedade comutativa, mesmo intuitivamente, como o de configuração retangular,
daí a importância de serem trabalhados com as crianças. Esses autores destacam
que contextos que envolvem o significado de combinatória da multiplicação podem
ser resolvidos com o auxílio de esquemas, de árvores ou de tabelas de dupla entrada
e que esse contexto também possibilita a validação da propriedade comutativa.

Os contextos que envolvem o significado de proporcionalidade não possibilitam


a validação da propriedade comutativa, pois é diferente tomar 5 gotas de remédio
durante 3 dias (5 + 5 + 5, ou 3 × 5) do que tomar 3 gotas de remédio durante
5 dias (3 + 3 + 3 + 3 + 3, ou 5 × 3) embora os resultados dessas duas multiplica-
ções sejam iguais a 15.

Esses autores afirmam que quando a ideia de multiplicar está associada à adição de
parcelas iguais (significado de proporcionalidade ou de multiplicação comparativa), a
tendência das crianças é adicionar várias vezes o agrupamento que se repete e que
esse tipo de raciocínio acaba por não validar a propriedade comutativa.

No entanto, como já foi discutido nesta Unidade, o raciocínio multiplicativo envolve


ideias mais amplas do que as associadas à adição de parcelas iguais. Vejamos alguns
apontamentos sobre procedimentos de cálculo.

Procedimentos de Cálculo
no Campo Multiplicativo
Pesquisadores como Treffers e Buys (2001) e Fosnot e Dolk (2001) discutem os
procedimentos das crianças na resolução de problemas do campo multiplicativo.
Afirmam que as crianças dão sentido às situações-problemas que envolvem a ideia

13
13
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

de multiplicação a partir de suas vivências no dia a dia. Segundo esses pesquisado-


res, as crianças apresentam algumas formas de multiplicar, assim como determina-
das relações entre essas de acordo com as suas experiências, ou seja, a ideia que
as crianças têm da multiplicação determina a forma como multiplicam, os procedi-
mentos que usam nos cálculos.

Treffers e Buys (2001) apresentam três níveis de aprendizagem na realização de


cálculos para a multiplicação: por contagem, estruturado e formal – discutiremos
cada um a seguir, apresentando uma possível resolução para o seguinte problema:

Em uma caixa cabem 4 bombons.


Quantos bombons cabem em 12 caixas como essa?

Segundo Treffers e Buys (2001), o cálculo por contagem corresponde ao


primeiro nível da multiplicação. É baseado na ação de adicionar para multiplicar e a
operação de multiplicação não é explícita. Os alunos, ao resolverem um problema,
utilizam apenas adições repetidas, vejamos:

0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000

Para Treffers e Buys (2001), no cálculo estruturado a ideia é de agrupamento,


ou seja, a mesma quantidade se repete algumas vezes, de modo que as crianças
associam essa repetição de agrupamentos à multiplicação, vejamos:

4
+4 = 8
+4 = 12
+4 = 16
+4 = 20
+4 = 24

14
+4 = 28
+4 = 32
+4 = 36
+4 = 40
+4 = 44
+4 = 48

Algumas vezes usam modelos de apoio, representações, esquemas, diagramas


etc. – por exemplo, no problema anterior, em que 4 bombons são colocados em
cada caixa e pergunta-se quantos bombons serão colocados em 12 caixas. Muitas
vezes, as crianças desenham grupos de 4 bolinhas (representando os bombons) e
repetem esse grupo 12 vezes e indicam 12 × 4, contando de 4 em 4, apoiadas no
desenho dos grupos até chegar ao 48.

0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
0000
12 × 4 = 48

Esses autores destacam que as crianças se utilizam do cálculo formal quando


não necessitam de modelos de apoio ao cálculo, mas ainda não usam o algoritmo,
apresentando apenas as sentenças matemáticas e as resolvem recorrendo a dife-
rentes relações entre a multiplicação e a produtos já conhecidos. Por exemplo,
na mesma situação anterior, as crianças indicam 12 × 4 e fazem 10 × 4 + 2 × 4,
pois já conhecem esses produtos. Como é possível perceber, o cálculo formal está
amparado no cálculo mental e no trabalho desenvolvido pelo professor – de relacio-
nar produtos conhecidos e utilizá-los na busca de outros produtos.

Treffers e Buys (2001) afirmam que a transição entre esses níveis não é linear,
mas precisa de apoio em situações-problemas com contextos variados em que as
crianças possam se utilizar de modelos para resolvê-los. Concluem que o uso de
diferentes situações que envolvem o mesmo modelo possibilita à criança a passa-
gem ao nível formal em que essa não precisa mais se apoiar nos modelos.

15
15
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Nas nossas escolas é muito comum a ansiedade de se trabalhar com as tabuadas e com
o algoritmo da multiplicação. Tal trabalho deve ser posterior a essas etapas de cálculo.

As Tabuadas
No esquema construído por você, usando as memórias de suas aprendizagens
sobre a multiplicação, certamente as tabuadas foram lembradas como cálculos
em que é preciso primeiro “saber de cor” para só depois aprender a multiplicar.
A preocupação excessiva com a memorização das tabuadas, antes da resolução de
problemas, é presente nas atuais salas de aula. São comuns afirmações de profes-
sores que o aluno não resolve um problema que envolve multiplicação porque não
sabe a tabuada. O que discutimos nesta Unidade quebra um pouco esse mito: as
situações-problemas envolvendo diferentes contextos e significados da multiplicação
são anteriores às tabuadas.

A ideia proposta pelos autores estudados é que a resolução de problemas


necessita de contextos adequados e diversificados, envolvendo o mesmo ou dife-
rentes significados da multiplicação. Essa abordagem permite a compreensão da
ideia da multiplicação, o uso intuitivo de propriedades e relações multiplicativas.
Nesse percurso, as crianças vão naturalmente e de forma gradual construindo os
produtos que constituem as chamadas tabuadas.

O que deve ficar claro é que a tabuada não é pré-requisito para a multiplicação,
como se achava há algum tempo, mas que sua memorização é importante para uso
em outros produtos e que essa memorização deve ser gradativa e com compreensão.

Treffers e Buys (2001) identificam três fases para aprendizagem das tabuadas:
a construção do conceito; o cálculo inteligente e flexível; a memorização completa
das tabuadas mais importantes. Afirmam que cada uma acompanha os níveis de
aprendizagem já referidos neste texto, ou seja, na construção das tabuadas, as crian-
ças iniciam com cálculos por contagem e progridem até o cálculo formal.

Você deve ter lembrado que as tabuadas eram trabalhadas na sala de aula pela
ordem da sequência numérica, ou seja, primeiro a do 2, depois a do 3, depois a
do 4, a do 5, a do 6 etc., sem a preocupação da exploração de regularidades e das
propriedades da multiplicação que podem ser usadas na sua construção. Igualmente,
a ordem dos fatores, na construção das tabuadas é importante. Por exemplo, na
tabuada do 2, o fator que se repete é o 2, então temos:

• 1 × 2 = 2 (um agrupamento de 2);


• 2 × 2 = 4 (dois agrupamentos de 2);
• 3 × 2 = 6 (três agrupamentos de 2);
• 4 × 2 = 8 (quatro agrupamentos de 2);
• 5 × 2 = 10 (cinco agrupamentos de 2).

16
O que propomos neste texto é a exploração das regularidades das tabuadas e
das relações numéricas existentes. Por exemplo, a partir da resolução de problemas
que envolvam multiplicações por 2, por 5 ou por 10 e trabalhar com essas tabuadas
devem se dar de forma consistente, pois são as bases para a construção das outras.
A partir da tabuada do 2 é possível construir a tabuada do 10 multiplicando os re-
sultados da tabuada do 2 por 5.

A partir dos produtos já memorizados da tabuada do 2 e utilizando relações nu-


méricas como, por exemplo, 4 é o dobro de 2, ou 8 é o dobro de 4 ou o quádruplo
de 2, ou ainda 6 é o triplo de 2, é possível construir as tabuadas do 4, do 6 e do 8.

A tabuada do 2 é base para a tabuada do 4. Como 6 × 2 = 12, então 6 × 4


que é a mesma coisa que (6 × 2) × 2 ou o dobro de 12, ou 12 × 2 = 24. Portanto,
6 × 4 = 24. A tabuada do 6 apoia-se na do 2 ou do 3. Como o produto 4 × 2 = 8,
então 4 × 6 é a mesma coisa que 3 × (4 × 2), ou 3 × 8 = 24. O produto 4 × 3
também é base para 4 × 6, ou seja, 2 × (4 × 3), ou o dobro de 12, ou 2 × 12 = 24.
A análise de regularidades numéricas desse tipo permite a construção das tabuadas
do 8 e do 9.

Procedimentos de Cálculo
para Multiplicação e Divisão
A partir das estratégias usadas pelas crianças na resolução de um problema
multiplicativo é possível construir com compreensão o algoritmo da multiplicação.
Vejamos o problema a seguir e uma estratégia de criança. Em seguida, como o algo-
ritmo foi proposto a partir da resolução da criança:

Na caixa há 3 fileiras com 14 bombons em cada fileira.


Quantos são os bombons dessa caixa?

1 0 + 4
X 3
3 0 + 1 2

4 2
Ou:
Um.
1 4
X 3
4 2

Figura 1

17
17
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Para o problema:
Uma doceira fez 375 brigadeiros e precisava distribui-los igualmente em 3 caixas.
Quantos brigadeiros colocou em cada caixa?

Figura 2
Fonte: Acervo do conteudista

A partir dessa resolução, é possível trabalhar com o algoritmo denominado americano:

Tabela 2
3 7 5 3
– 3 0 0 1 0 0
7 5 + 2 0
– 6 0 5
1 5 1 2 5
– 1 5
0

Após a compreensão desse processo, é possível apresentar o processo longo e,


por último, o processo curto:

Tabela 3 – Processo longo


3 7 5 3
– 3 0 0 1 2 5
7 5 C D U
– 6 0
1 5
– 1 5
0

Tabela 4 – Processo curto


3 7 5 3
0 7 1 2 5
1 5
0

18
Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

Livros
Uma Análise sobre as Aprendizagens e Dificuldades Reveladas por Alunos do 5º Ano na Resolução de
Problemas de Estruturas Multiplicativas
ZARAN, M. L. O.; SANTOS, C. A. B. Uma análise sobre as aprendizagens e
dificuldades reveladas por alunos do 5º ano na resolução de problemas de estruturas
multiplicativas. In: CURI, E.; NASCIMENTO, J. C. P. (Org.). Educação matemática:
grupos colaborativos, mitos e práticas. São Paulo: Terracota, 2012. P. 131-152.
Educação Matemática: Conversas com Professores dos Anos Iniciais
PIRES, C. M. C. Educação matemática: conversas com professores dos anos
iniciais. São Paulo. Zapt, 2012.

Leitura
O Raciocínio de Estudantes do Ensino Fundamental na Resolução de Situações
das Estruturas Multiplicativas
https://bit.ly/2XYjCKu
Análise dos Procedimentos de Resolução de Alunos de 5° Ano em Relação a Problemas do Grupo
Isomorfismo de Medidas
https://bit.ly/2S0C4yt

19
19
UNIDADE O Ensino das Operações do Campo Conceitual Multiplicativo

Referências
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Ensino Fundamental. Parâmetros
curriculares nacionais para os 1º e 2º ciclos. Brasília, DF, 1996.

FOSNOT, C.; DOLK, M. Young mathematicians at work: constructing


multiplication and division. Portsmouth, England: N. H. Heineman, 2001.

PIRES, C. M. C. Educação matemática: conversas com professores dos anos


iniciais. São Paulo. Zapt, 2012.

TREFFERS, A.; BUYS, K. Grade 2 and 3 – calculation up to 100. In: PANHUIZEN,


M. H. Children learn mathematics. [S.l.]: Frendenthal Institute, 2001. p. 61-88.

VERGNAUD, G. A criança, a Matemática e a realidade: problemas de ensino de


Matemática na Escola Elementar. Trad. Maria Lucia Moro. Curitiba, PR: UFPR, 2009.

______. A teoria dos campos conceituais. In: BRUN, J. Didática das matemáticas.
Lisboa: Instituto Piaget, 1996. p. 155-191.

______. Multiplicative conceptual field: what and why? In: GUERSHON, H.;
CONFREY, J. (Ed.). The development of multiplicative reasoning in the learning
of Mathematics. Albany, NY: University of New York, 1994. p. 41-59.

ZARAN, M. L. O.; SANTOS, C. A. B. Uma análise sobre as aprendizagens e


dificuldades reveladas por alunos do 5º ano na resolução de problemas de estruturas
multiplicativas. In: CURI, E.; NASCIMENTO, J. C. P. (Org.). Educação matemáti-
ca: grupos colaborativos, mitos e práticas. São Paulo: Terracota, 2012. P. 131-152.

20

Você também pode gostar