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Para Costanza,
paz, amor e alegria
PASSAPORTE
Nova York está cada vez maior e melhor, mais divertida e menos perigosa.
E para brasileiros está cada vez mais presente, mais perto e mais acessível.
Para gostar e aproveitar não é preciso muito, além de um mínimo de
curiosidade, um pouco de inglês e algum dinheiro. Há cidades boas, médias e
ruins, mas sem dinheiro algum são todas péssimas, embora algumas fiquem
mais péssimas do que as outras. E falando inglês fica tudo muito melhor, tudo
faz muito mais sentido, fica tudo mais fácil. Ou menos dificil. Mas não precisa
ter vergonha do seu sotaque, porque aqui todo mundo tem um. Latinos,
negros, orientais, europeus, eslavos, árabes, judeus, irlandeses, índios, fazem
Nova York ser o que é, maior, mais diversa e mais intensa. Uma das graças da
cidade é esta, a mistura, a variedade, a diversidade de raças, origens e culturas.
Se todo mundo aqui é meio estrangeiro, então todo mundo se sente um pouco
menos estrangeiro aqui.
Não conheço Nova York como a palma de minha mão. Ninguém conhece.
Por seu volume e potência, por sua vitalidade e diversidade e sobretudo por
sua permanente e vertiginosa transformação. O que estava não está mais, onde
era bom não é mais, o que era isso virou aquilo. A metro, a toneladas, aos
montões: ou então esgotou. Do melhor e do pior, tudo é grande, variado,
exagerado: há gosto para tudo, há para todos os gostos. Mas mesmo assim a
cidade às vezes pode ser chatissima, às vezes é feia e triste, às vezes parece
mesquinha e provinciana, mas é quase sempre vigorosa e vibrante,
freqüentemente emocionante. Às vezes dá a sensação (como em Tóquio) de
que se está vivendo no futuro, numa espécie de quase-futuro, um tempinho à
frente.
Isto não é exatamente um guia nem um livro de crônicas, é mais uma coleção
de impressões e sugestões, de reflexões e conexões, de descobertas e
informações. Pessoais e transferiveis. Guias de Nova York há vários ótimos,
completos e detalhados, como os de Katia Zero ou o célebre Zagat, de
restaurantes. Há até guias de restaurantes só para fumantes, como o Smoker's
Guide. Guias de " clubes de cavalheiros", de gays, de bares, de compras e
museus, guia de tudo. Esta é uma seleção de experiencias, lugares, eventos,
serviços, diversões e artes, absolutamente pessoal, arbitrária e transitória, já
que - como o autor - tudo aqui está mudando o tempo todo, cozinheiros estão
trocando de restaurantes, lojas estão trocando de estoques e de endereço,
shows e peças estão entrando e saindo de cartaz, milhões estão entrando e
saindo da cidade. Só as ruas, os rios e os parques continuam (quase) sempre os
mesmos. O resto é risco: telefone, confira, reserve. Em Nova York tem
telefone em tudo que é lugar e todos dão linha e todos atendem.
Uma boa dica para não gostar, não entender e não aproveitar é ver, ouvir e
andar com deslumbramento, paranóia ou ressentimento. A cidade é segura,
prática e eficiente. Mas como bem sabem os brasileiros, olho vivo e faro fino
são indispensáveis. Com voces, o melhor e o pior de Manhattan. Divirtam-se:
Nova York é aqui.
RODANDO EM MANHATTAN
Com seus 12 mil carros celebremente amarelos, Nova York tem um dos
melhores serviços de táxi do mundo, tanto em quantidade como em conforto e
preços - e alguns dos piores taxistas do planeta, vindos de todos os confins da
Terra. Mesmo assim, ou por isso mesmo, tenha compaixão e dê sempre
gorjeta: eles vivem disso e é um emprego que não se deseja a um inimigo.
Como são todos tão estrangeiros como você, não se envergonhe de dar seu
itinerário bem ex-pli-ca-do, mesmo que pareça que você não sabe falar inglês
direito. Eles também não sabem. E não tente impressionar esses pobres diabos
com seu inglês maravilhoso: eles não vão entender nada. Mas fique tranqüilo:
ninguém vai te roubar, ninguém vai "envenenar" o taxímetro, ninguém vai
fazer o caminho mais longo de propósito para tomar-lhe uma grana: as
corridas em que eles ganham mais são as curtinhas, por causa da bandeirada.
Para eles é melhor várias curtinhas do que uma longa, ao contrário do Brasil,
onde o cara fica furioso porque você paga uma bandeirada (muito mais cara
que a de Nova York) para uns poucos quarteirões.
Mas se estiver chovendo ou for entre 16:30 e 18:30 hs, esqueça. E dê graças
a Deus que Nova York é uma cidade maravilhosa para se caminhar e que tem
um dos maiores e melhores metrôs do mundo, razoavelmente limpo, muito
eficiente, absolutamente seguro (pelo menos até as 22 h) e relativamente fácil
de usar para sair de um sufoco. O básico é você saber se quer ir para cima de
onde está ou para baixo: uptown e downtow, cada um tem sua entrada
separada. Preste bem atenção porque essa é a bobeira-básica. Depois é
simples: voce compra um "token" sem se assustar com o mau-humor da
negona atrás do guichê, que é um clássico local, paga U$ 1,50 e pronto. Se
errar, não tem problema: salta na estação errada e vai para o outro lado pegar o
trem certo. Todo mundo anda de metrô em Manhattan, onde punks e
estudantes se juntam a senhoras elegantes e senhores respeitáveis no empurra-
empurra geral na hora do rush, quando não adianta você ter uma Mercedes
com motorista porque vai apodrecer no trânsito alucinante, onde o mau-humor
e a grosseria nova-iorquina imperam. Melhor o metrô. Ou então o sonho de
consumo de Paulo Francis: um helicóptero com chofer.
Às vezes - quando são quatro pessoas - é mais jogo alugar um carro com
motorista para um programa noturno, tipo um show no Teatro Apollo no
Harlem, ou para ir a um jogo ou um show no Giants Stadium, na base de U$
40 por hora. Para o aeroporto são U$ 30 e eles são melhores que os táxis
amarelos ( mesmo preço ), porque seus motoristas estão mais familiarizados
com as "quebradas" e itinerários alternativos em vez de enfrentar os
engarrafamentos exasperantes das freeways que levam ao Kennedy.
YES: 1-800-2215249 - o dono é brasileiro, falam português, tem bons
carros, são corretos e eficientes. Ou as inesquecíveis TEL-AVIV: 777-7777 e
CARMEL 666-6666. Mesmos preços, só que não falam português. É bom
reservar um pouco antes.
Fiquem tranqüilos com os motoristas de taxi, que ladram mas não mordem:
como são todos imigrantes em situação precária (senão não pegariam um
rabo-de-foguete desses) a última coisa que querem é aprontar alguma.
E não se assute quando entrar no taxi e ouvir uma voz gravada fazendo
gracinhas, elogiando a sua aparencia e pedindo para voce colocar o cinto de
segurança. E quando for sair também: a voz recomenda recolher o que é seu e
pedir o recibo ao motorista. São vozes de vários comediantes locais e estrelas
internacionais e a idéia é do prefeito Giuliani, em momento techno-maia. A
gravação de Placido Domingo é a melhor porque faz qualquer um perder a
vergonha do sotaque.
PS - Não confundir jamais "Park Avenue" com "Park Avenue South", que é
como a célebre avenida se denomina do tunel da Rua 45 para baixo, até a
Union Square. É a mesma rua, com nomes diferentes, mas os numeros são
iguais e se repetem nas duas, podendo levar um desavisado ao desespero: o
150 da Park Avenue é uma coisa e o 150 da Park Avenue South é outra e
assim por diante.
CORREÇÃO ALIMENTAR
- Por favor, eu queria um omelete sem colesterol, com bacon vegetal, duas
torradas de pão sem trigo e um café descafeinado com leite sem lactose. Com
adoçante, por favor.
Parece sketch de humor mas é o breakfast que muitos americanos -
alimentarmente corretos - estão pedindo. E comendo !
O novo ôvo chama-se "egg beaters" e é o nosso bom e velho ôvo em nova
embalagem ( como se pudesse ser criada uma melhor do que a original) e nova
composição - já com todo o colesterol eliminado ( sabe Deus como ! ). Tem
gosto de coisa amarela. Não serve nem pra jogar em politicos abusados,
quanto mais para comer.
O leite sem lactose, ou é de soja ou de arroz ou de outras coisas que não se
sabe bem o que são mas que com certeza não são produzidas por nossas irmãs
vacas ou cabras. É branquinho, encorpado e parece igualzinho ao original.
Mas naturalmente tem gosto de uma coisa branca sem gosto. Claro: também
não tem uma gota de gordura, mas isto o "skim milk" também não tem -
embora tenha gosto de água.
Para evitar a maligna cafeína a moda é o café descafeinado. Mas quando
voce fica sabendo quais os processos, as quimicas, as reações, a porcariada
que faz o café, pateticamente, descafeinar...melhor pedir uma coca-coca.
Não uma "classic", que é comprovadamente veneno cafeinado. Mas uma
coca-cola que naturalmente é diet, sem açucar (mas com pavorosos adoçantes
quimicos), e agora com a novidade: sem cafeína. Sem açucar e sem cafeína (
que substituiu, diz a lenda, a cocaína dos primeiros tempos) a coca virou uma
água preta, embora não seja politicamente correto falar pejorativamente desta
cor. A coca tem tanta cafeína quanto um copo de café "do bão" e os
alimentarmente corretos dispensam os dois.
Falsas manteigas então nem se fala. Não, não se fala de margarinas - que
perto do que é vendido como "substituto de manteiga" - são consideradas
manjar dos deuses. A mais popular chama-se " You dont believe it's not butter
" ( Voce não acredita que não é manteiga ), isto mesmo, o nome já é uma
frase, um slogan. O gosto daquela pasta amarela e gordurosa não pode ser
descrito em ambientes familiares. No entanto vende como água e é consumido
- acreditem - como manteiga.
Vender como água não é modo de dizer: água está vendendo muito nos
Estados Unidos, um país onde em qualquer lugar se pode beber água da
torneira com absoluta segurança - embora se tenha que tapar o nariz para não
sentir o cheiro de cloro. Àguas minerais do mundo inteiro, aos borbotões, em
qualquer supermercado: águas francesas, italianas, australianas, canadenses,
algumas delas, como a Perrier e a San Pellegrino, nos bares chegam a U$ 3,50
a garrafinha de um copo.
Carne de soja não é novidade, depois da ascenção do vegetarianismo. Mas o
bacon vegetal é absoluta novidade e faz sucesso. Juro: são fatias de uma coisa
esbranquiçada e com umas faixas vermelhas que voce coloca no micro-ondas
e em cinco minutos se transforma em bacon borbulhante, mas sem gordura,
sem colesterol, sem açucar, sem sal, sem porco, sem bacon. Mas - acreditem -
o gosto e a textura são parecidissimos com o original - embora tudo seja
colorido e aromatizado artificialmente. Com o que, não se sabe. Só se sabe
que coisa boa não pode ser.
Aqui perto da minha casa - na Union Square - tem uma famosa feirinha de
"fazendeiros" duas vezes por semana. São aqueles caminhões enormes,
refrigerados, poderosos, cheios de verduras e frutas e vegetais "organicos",
isto é, foram plantados e cultivados ( diz a lenda ) sem fertilizantes, pesticidas,
sem nada. E porisso custam o dobro - embora quase nunca sejam melhores (
pelo menos de gosto ) do que os "não-organicos". Vendem barbaridades, o
pessoal acha chique e saudável. Coisas de cidade grande.
Enquanto aguardo o cigarro sem nicotina, o uisque sem alcool e o lexotan
vegetal, não posso deixar de pensar que nos anos 60 e 70, antes do sexo com
camisinha, todo mundo comia tudo ( e todos ! ) sem maiores consequencias.
Não se "morria mais" naquele tempo do que agora, apesar do açucar, do
colesterol, da cafeína, da lactose, dos pesticidas, dos fertilizantes, do alcool e
da nicotina - e se vivia com mais alegria.