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Direito da Concorrência

Fundamento

Em mercados competitivos, as empresas precisam manter baixos custos e margens de


lucro, oferecer produtos de boa qualidade, e estar sempre inovando e colocando novos
produtos à disposição dos consumidores. Além disso, no longo prazo, a disputa entre
empresas em um mercado competitivo leva à maximização das eficiências, garantindo
uma alocação ótima de recursos e o máximo de bem-estar social.

Para que haja concorrência, é necessário que o mercado tenha número grande de
produtores e consumidores de tamanhos não muito diferentes, agindo de forma
independente. Isso faz com que nenhum deles tenha poder de mercado.

Existem, naturalmente, setores nos quais tais princípios não podem ser aplicados, por
não produzirem os resultados apontados. É o caso, por exemplo, dos monopólios
naturais, como é típico na infra-estrutura, ou em caso de crise sistêmica no mercado
financeiro, quando a preocupação se sobrepõe à competição (a concentração viabiliza
economias de escala e o melhor aproveitamento dos recursos disponíveis).

É importante ressaltar também que nem sempre o domínio de uma empresa sobre um
mercado é o resultado de condutas anticompetitivas, podendo ser o fruto natural de
maior competência ou inventividade, e isso não deve ser desencorajado.

Conceitos

Concentração horizontal: que envolve agentes econômicos distintos e competidores


entre si, que ofertam o mesmo produto ou serviço em um determinado mercado
relevante.

Concentração vertical: que envolve agentes econômicos distintos, que ofertam produtos
ou serviços distintos e que fazem parte da mesma cadeia produtiva.

Conglomeração: concentração que envolve agentes econômicos distintos, que ofertam


produtos ou serviços distintos, que podem ou não ser complementares entre si, mas que,
certamente, não fazer parte da mesma cadeia produtiva.

Joint-venture: é uma associação entre duas ou mais empresas distintas para a formação
de uma nova empresa, sob controle comum.

A política de competição

A política de competição opera por meio de dois instrumentos distintos: a repressão ao


abuso de poder econômico e o controle de condutas anticoncorrenciais.

A defesa da concorrência é, normalmente, feita usando a regra da razão: a operação é


aprovada se benefício liquido para a sociedade for positivo, e reprovada em contrário.

O uso da regra da razão resulta em análises demoradas e caras, em virtude da


dificuldade de obtenção de informações pelas agências de defesa da concorrência,
informações essas que, normalmente, são controladas pelas próprias empresas
investigadas.

O papel das agências de defesa da concorrência é impedir que a estrutura do mercado


e/ou a conduta da empresa comprometam o desempenho do mercado. (Modelo
Estrutura-Conduta-Desempenho)

No caso de concentração horizontal, a portaria conjunta das secretarias (Secretaria de


Direito Econômico – SDE e Secretaria de Acompanhamento Econômico – SEAE,
órgãos do Sistema Brasileiro de Direito da Concorrência – SBDC, juntamente com o
CADE – Conselho Administrativo de Defesa Econômica) recomenda que se considerem
como eficiências econômicas geradas pelo ato de concentração apenas os ganhos que
efetivamente aumentem o bem-estar social, e não os ganhos pecuniários.

A prática de cartel, assim como o abuso de poder econômico são consideras condutas
que podem ser tratadas pela regra do per se, isto é, sem a necessidade de maiores
avaliações. No entanto, é preciso ter provas factuais de que há um acordo entre os
participantes do cartel: gravações de conversas telefônicas, atas de reuniões,
correspondências, etc.

Os principais determinantes da estrutura de um mercado são seu grau de concentração e


as condições de entrada.

A definição do mercado relevante é, normalmente, a etapa mais difícil e importante na


análise de um processo de infração à concorrência.
Ela tem duas dimensões: a de produto e a geográfica. A primeira define quais produtos
são os substitutos próximos do produto em questão (se ele aumentasse de preço, o
consumidor iria trocá-lo por eles? Devem ser estudados os submercados, e não o
mercado da empresa.), e a segunda quais os concorrentes próximos em tamanho e
condições de produção capazes de coibir o exercício de poder de mercado pela nova
empresa.

Uma boa forma de fazer essa aferição é realizar o teste do “monopolista hipotético”.

Analisa-se, em seguida, o número e o tamanho das empresas concorrentes, o grau de


homogeneidade dos produtos comercializados e as barreiras à entrada de novos
concorrentes.
Os índices que medem o grau de concentração são vários: O Guia de Análise de
Concentrações Horizontais utiliza o C4 para avaliar se o grau de concentração é elevado,
considerando que uma concentração gera controle de parcela de mercado
suficientemente alta para viabilizar o exercício de poder de mercado quando ela tornar o
índice C4 do mercado igual ou maior que 75%, e a participação da nova empresa no
mercado relevante for de 10% ou mais. As autoridades americanas, por outro lado,
utilizam o índice HHI, em que se somam os quadrados das quotas detidas por todas as
empresas do mercado, e se o número obtido for inferior a 1000, considera-se que o
mercado é pouco concentrado, se entre 1000 e 1800, moderadamente concentrado, e se
maior que 1800, altamente concentrado.

As barreiras à entrada são importantes determinantes do grau de poder de mercado das


empresas, pois influenciam no grau de concentração do mercado e na extensão da
competição potencial exercida pelas empresas que estão for do mercado. Uma barreira à
entrada é qualquer fator em um mercado que ponha um potencial competidor eficiente
em desvantagem com relação aos agentes econômicos estabelecidos, como, por
exemplo, o reconhecimento da marca. As importações também podem ter efeito
disciplinador, coibindo o exercício do poder de mercado, e quando isso ocorrer, a
dimensão geográfica relevante para a análise antitruste inclui pelo menos parte do
mercado internacional.

Consoante o artigo 20 da Lei 8.884/94, nem todo ato de concentração é relevante para a
análise antitruste.

Os atos de concentração horizontais, por envolverem associação de concorrentes, são os


mais preocupantes, pois quanto menos empresas num mercado, mais fácil fica para elas
coordenar sua atuação, de forma a aumentar preços e lucros.

Os atos de concentração verticais podem ser problemáticos também, quando, por


exemplo, se dá entre uma empresa dominante na distribuição de um bem e outra que o
fabrica.

Uma joint-venture deve ser tratada como uma fusão.

Venda casada consiste num acordo vertical ofensivo à ordem econômica no qual o
vendedor de um bem ou serviço condiciona a sua venda à compra de outros bens ou
serviços.

Acordos verticais que não abrangem nem a fixação de preços nem a venda casada são
melhores vistos pelas agências, pois normalmente têm uma justificativa comercial
plausível, a exemplo dos contratos de exclusividade e das restrições territoriais de
venda.

Outra forma de conduta desleal é a prática de preços predatórios.

Legislação

Em 1964, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica foi criado. No entanto,


apenas em 1994 ele foi transformado em autarquia, pela Lei 8.884. Essa lei deu ao
CADE a responsabilidade de decidir sobre a existência de infração à ordem econômica
e de aplicar as devidas penalidades, além de poder aprovar termos de compromisso de
cessação de prática e compromisso de desempenho (a SDE fiscaliza o cumprimento
desses compromissos.)

O SBDC tem também função de promoção (advocacia) da concorrência.

O CADE, a SDE e a SEAE compõem o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência.

O CADE é uma autarquia federal vinculada ao Ministério da Justiça. Há mandatos fixos


e restrições à exoneração de seus conselheiros que lhe dão autonomia decisória,
fortalecendo a instituição. Ele tem uma procuradoria que lhe dá assistência jurídica, o
defende em juízo e promove a execução judicial de suas decisões. O procurador-geral
tem as mesmas prerrogativas dos conselheiros e participa das reuniões do CADE, apesar
de não ter direito de voto. Junto ao CADE funciona também um representante do MPF.

A SDE é uma das secretarias do Ministério da Justiça, sendo o seu titular indicado pelo
ministro e passível de demissão a qualquer momento. A SEAE é uma secretaria do
Ministério da Fazenda, não cuidando apenas de defesa da concorrências, mas de
serviços públicos, infra-estrutura, entre outros assuntos.

As secretarias funcionam como instâncias de investigação e instrução dos processos,


enquanto o CADE é instância judicante, apesar de não ser tribunal administrativo.

Procedimento

Os atos de concentração em que pelo menos uma das empresas envolvidas tem 20% ou
mais do mercado relevante ou pertence a um grupo empresarial com faturamento anual
de R$ 400 milhões ou mais devem passar pelo crivo do SBDC. Esses atos deverão ser
comunicados pelas partes previamente ou até 15 dias úteis após a sua realização, sob
pena de multa.

É a SDE que averigua preliminarmente as denúncias de infrações da ordem econômica


(que podem ser feitas por terceiros ou pelo próprio SBDC) e que analisa os atos de
concentração.

Se pertinente a denúncia, a SDE colhe provas e fatos, aprofundando a análise, através de


obtenção de documentos e de realização de estudos e de entrevistas, o que não deve
exceder o prazo de 8 dias. Se não pertinente, a SDE arquiva a denúncia por insuficiência
de indícios, comunicando tal fato ao CADE.

Julgando pertinente, a SDE pode solicitar à SEAE uma análise dos aspectos econômicos
do processo.

A SEAE age por provocação da SDE e, junto a ela, elabora um parecer que será enviado
ao CADE, quando for o caso, para julgamento final do ato de concentração ou da
denúncia. O prazo para elaboração do parecer é de 30 dias para cada secretaria.

O processo fica constantemente suspenso para que sejam obtidas informações das
empresas.

No caso do ato de concentração, o CADE pode aprová-lo, rejeitá-lo ou aprová-lo com


restrições.(sem obrigação de seguir as recomendações das secretarias) No caso de
infração, ela pode ser aceita ou rejeitada, cabendo tomar as providências necessárias,
quando for o caso, para impedi-las ou reparar os danos causados por elas. O CADE tem
um prazo de 60 dias para deliberar.

O CADE e o secretário da SDE podem adotar uma decisão com caráter suspensivo
durante o trâmite do processo, quando considerarem que o ato pode causar lesão ao
mercado difícil ou impossível de reparar, ou que torne ineficaz o processo.

A prática investigada também pode ser suspensa por meio de um compromisso de


cessação, que, no entanto, não implica admissão de culpa. Esse compromisso suspende
o processo administrativo enquanto estiver sendo cumprido, podendo levar ao seu
arquivamento no término do prazo, se cumpridas todas as exigências. Ele é um título
executivo extrajudicial.

Há também a figura do acordo de leniência, através do qual os infratores à ordem


econômica se apresentam espontaneamente à autoridade antitruste e cooperam com ela,
identificando os demais co-autores e apresentando provas concretas, podendo ser
poupados de processo administrativo ou ter suas penas reduzidas de um a dois terços,
sendo extendido inclusive para a esfera penal.

Analisa-se o grau de concentração do mercado, a presença ou não de contrapeso de


importações, o mercado competitivo potencial, a presença de rivalidade efetiva entre as
concorrentes, o nexo causal entre o ato de concentração e o exercício do poder de
mercado e se as eficiências geradas são maiores que o poder de mercado conseqüente.

Quando houver uma aprovação condicionada, as empresas são obrigadas a assinar um


compromisso de desempenho, contendo metas com prazo definido, tanto com as
condições impostas ao ato quanto com os ganhos com as eficiências que se esperam
auferir.

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