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É que se propõe o estudo da doutrina do stare decisis para verificar de que modo
a mesma foi pensada a dar coerência e segurança jurídica ao sistema.
Os law reports excluem aqueles casos que foram decididos sem discussão, uma
vez que neles não é possível identificar a ratio decidendi a vincular os casos
futuros, aqueles que não têm valor como precedentes e aqueles que sejam mera
repetiçoẽ s de outros que já foram previamente relatados. Por outro lado, os
relatórios dos casos devem dar importância a todos os casos que introduzem,
ou parecem introduzir, um novo princípio ou uma nova regra; aqueles que
alteram materialmente um princípio ou regra já existente; aos que esclarecem
um ponto controvertido do direito e aqueles que sejam aparentemente úteis do
ponto de vista informativo.
A ideia que decorre da doutrina do stare decisis, cujo respeito às decisões
judiciais precedentes, ou respeito aos precedentes, decisões que já foram
tomadas anteriormente por outros tribunais e que resolveram problema
semelhante (treat like cases alike). Diversamente do que ocorre nos sistemas de
civil law, o stare decisis significa que mesmo uma única decisão tomada
individualmente pelos tribunais deve ser respeitada, é o que GOODHART chama
de “doutrina do precedente individual obrigatório”, ou seja, um só precedente é
̃ .513
o bastante para constituir direito e gerar obrigaçao
Existem duas variaçoe ̃ s do stare decisis, que pode ser vertical ou horizontal. O
stare decisis vertical exige que os tribunais inferiores sigam as decisões dos
tribunais superiores. O stare decisis horizontal exige que a Corte siga seus
próprios precedentes.
É lógico que para saber quais fatos são exatamente iguais, enfrenta-se certa
dificuldade, como na análise de GOODHART acerca da definiçao ̃ da ratio
decidendi e da obiter dicta de um caso determinado, conforme será visto mais
adiante.
Para que uma opinião tenha o peso de um precedente é necessário que ela
tenha sido dada por um juiz e também que tenha sido necessária para a decisão
de um caso particular, isto é, não pode ser obiter dictum. 571A ratio decidendi
de uma decisão nos sistemas de common law é o que vai criar um precedente
vinculante nas decisões seguintes e, portanto, se faz necessário descobri-la.
“A ratio decidendi é uma decisão dada por um juiz de modo expresso ou implícito
que é suficiente para resolver uma questão de direito posta em causa pela
argumentaçao ̃ das partes em um caso, sendo um ponto necessário à
fundamentaçao ̃ da decisão no caso”. (MACCORMICK, Neil. Rhetoric..., p. 153).
Desse modo, torna-se necessário definir, com certo grau de precisão, o que é a
ratio decidendi (extracted element) e o que significa a importância desse extrato
nos sistemas que adotam a teoria de precedente vinculante. Assim, percebe-se
que nos sistemas de common law, grande parte das discussões sobre os
precedentes envolvem o problema do que significa a ratio decidendi de um caso
e como a ratio decidendi é estabelecida
Quando a conclusão for baseada num fato cuja existência não foi determinada
pelo Tribunal, não há criaçao
̃ de uma norma jurídica. Nesse caso, ter-se-á o
dictum. Se o juiz ao arrazoar sua decisão sugere um fato hipotético, e presume
a conclusão a que iria chegar caso este fato existisse, ele não está criando
direito. O problema é conseguir distinguir quando um enunciado é dictum ou não,
que depende do juiz estar tratando um fato como hipotético ou real,587 mas tudo
que for hipotético será dictum.588
A ratio decidendi poderá assim ser encontrada nas razões e fundamentos gerais
das decisões judiciais, os quais devem ser abstraídos a partir das peculiaridades
do caso concreto. Do mesmo modo, para SALMOND594 enquanto a ratio
decidendi concreta vincula as partes envolvidas no caso, sóa ratio decidendi
abstratamente considerada é que vai ter força normativa, ou seja, o que vincula
os casos futuros não é a decisão em si, mas os princípios implícitos que,
abstratamente considerados, a fundamentaram.
O que se pode concluir é que todo precedente é e apenas pode ser “an illustration
of principle”, ou seja, é o que se quer dizer quando se afirma que a única parte
do precedente que tem força obrigatória é sua ratio decidendi.595
Possibilidades de superaçao
̃ dos precedentes:overruling e distinguishing
Assim, os dois principais métodos utilizados pelos Tribunais para evitar seguir
um precedente são distinguishing e overruling. Em ambos os casos é necessário
que os juízes deixem claros os motivos da não aplicaçao
̃ do precedente.
A distinçao
̃ de um caso é fundamentalmente um problema de diferenciar a ratio
decidendi da obiter dicta – separando-se os fatos que são materialmente
relevantes daqueles que são irrelevantes para a decisão. A distinçao
̃ entre um
caso e outro é primeira e primordialmente uma questão de se mostrar diferenças
fáticas entre o caso antecedente e o caso atual, demonstrando-se que a ratio do
precedente não se aplica satisfatoriamente ao caso em questão.610
Essa nova situaçao ̃ causa insegurança jurídica, eis que não existem limites pré-
definidos para a atividade interpretativa, não pelo menos no modelo mecanicista,
ficando os juízes livres para dar conteúdo aos direitos humanos. Além disso, o
fato de os tribunais brasileiros não se sentirem vinculados às decisões emanadas
pelos Tribunais Superiores sobre o mesmo assunto também causa insegurança
jurídica.
Já nos sistemas de common law a busca da segurança jurídica não estava
baseada na lei, ou na suposta completude do sistema, mas no sistema de
precedentes judiciais, no qual, por meio de uma racionalidade se procurava
garantir a coerência entre as decisões. Assim, nesse sistema, em que pese o
juiz não se encontrar limitado pela lei, se encontrava limitado pelos precedentes.
Essa limitaçaõ imposta pela doutrina do stare decisis significa respeito aos
precedentes; respeito este que engloba os atos de segui-los, distingui-los ou
revogá-los.
O que se observa, entretanto, é uma grande mudança nos sistemas júridicos na
segunda metade do século XX, com a revoluçao ̃ dos direitos humanos. Como
visto anteriormente, diversos países vêm adotar constituiçoẽ s democráticas com
catálogos de Direitos fundamentais – como aconteceu no Brasil com a
Constituiçao
̃ Federal de 1988 – ou incorporar documentos internacionais para
proteçao
̃ dos direitos humanos. A mudança de pilar nas estruturas jurídicas do
sistema de civil law para dar primazia aos direitos humanos fundamentais altera
substancialmente o papel da jurisdiçao
̃ constitucional na interpretaçaõ do direito,
na medida em que não é possível uma definiçaõ a priori desses direitos. Ou seja,
em que pese muitas vezes estarem expressos num documento escrito, não há
como prever o resultado de sua interpretaçaõ no caso concreto.
Para além disso, a insegurança jurídica também vem sendo sentida na medida
em que os Tribunais brasileiros não se preocupam em garantir uma coerência
às suas decisões, nem em respeitar os precedentes dos Tribunais Superiores,
ademais, mesmo as Cortes Superiores não respeitam sua própria construçaõ
jurisprudencial.
Aideia do direito como integridade, que também pode ser comparada à doutrina
da responsabilidade política a que estariam sujeitos os juízes, desenvolvida por
DWORKIN em “Levando os Direitos a sério”655. Referida doutrina “condena a
prática de tomar decisões que parecem certas isoladamente, mas que não
podem fazer parte de uma teoria abrangente dos princípios e das políticas gerais
que seja compatível com outras decisões igualmente consideradas certas”.
Para além disso, é possível afirmar que o atual sistema jurídico brasileiro, em
que pese ter sua tradiçaõ no civil law, acaba tendo que enfrentar um paradoxo,
na medida em que o sistema não consegue dar previsibilidade na aplicaçao ̃ das
leis; por outro lado, também não admite um sistema que busque uma coerência
nas decisões judiciais, como forma de garantia da segurança jurídica dos
cidadãos e da estabilidade e previsibilidade das relaçoe
̃ s sociais.