Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
DE APOIO
Índice ………………………………………………………………………………………………………………………………………….. 2
Objetivos ………………………………………………………………………………………………………………………………….…. 3
Conteúdos Programáticos …………………………………………………………………………………………………………… 4
Introdução ………………………………………………………………………………………………………………………………….. 5
1. Educação – Conceito geral ………………………………………………………………………………………………………. 6
2. Definição de (in)sucesso escolar e sucesso educativo ……………………………………………………………… 9
3. A escola como um quadro de interações sociais ……………………………………………….…………………… 11
3.1. Ao atores educativos e a comunidades escolar …………………………………….……………….. 11
4. Teorias explicativas do (in)sucesso escolar ……………………………………………………………………………. 13
4.1. Teoria dos dons naturais ……………………………………………………………………………………….. 13
4.2. Teoria do handicap sociocultural …………………………………………………………………………… 16
4.3. Teoria socioinstitucional ………………………………………………………………………………………… 20
5. Os diferentes códigos linguísticos …………………………………………………………………………………….……. 24
5.1. Código elementar ou restrito …………………………………………………………………………………. 25
5.2. Código elaborado …………………………………………………………………………………………………… 26
6. Práticas pedagógicas ……………………………………………………………………………………………………………… 27
6.1. Abordagem multinível ………………………………………………………………………………………….… 29
7. Abordagem transformadora/transformativa …………………………………………………………………………. 31
Bibliografia ……………………………………………………………………………………………………………………………….. 37
2
Objetivos Gerais
Reconhecer as diferentes dimensões da educação como um fenómeno social e
uma ferramentade transformação social.
Identificar a pluralidade de fatores que contribuem para o (in)sucesso escolar e o
papel de todos os atores da comunidade escolar no sucesso do processo
educativo.
Reconhecer a importância da escola e do contexto escolar como resposta social de
intervenção.
Objetivos Específicos
No final da formação, os formandos e as formandas deverão ser capazes de:
3
Conteúdos Programáticos
1. Educação – conceito geral
2. Definição de (in)sucesso escolar e sucesso educativo
3. A escola como um quadro de interações sociais
3.1. Os atores educativos e a comunidade escolar
4. Teorias explicativas do (in)sucesso escolar
4.1. Teoria dos dons naturais
4.2. Teoria do handicap sociocultural
4.3. Teoria sócio institucional
5. Os diferentes códigos linguísticos
5.1. Código elementar ou restrito
5.2. Código elaborado
6. Práticas pedagógicas
6.1. Abordagem multinível
7. Abordagem transformadora/ transformativa
4
INTRODUÇÃO
A educação é tão antiga como a própria Humanidade, parecendo constituir um
dos primeiros sustentáculos da própria sobrevivência do Homem. Através da
educação, pretende-se que o ser humano se adapte ao meio/ambiente, criando
condições para a aquisição e desenvolvimento de conhecimentos, valores e atitudes
favoráveis a essa adaptação.
Para se fazer uma eficaz análise à situação atual da educação em Portugal, é
necessário atendera três vetores: os pais, a sociedade e a escola.
Cada vez mais, os pais delegam quase integralmente na escola a educação dos
filhos, limitando a sua ação educativa a castigos por maus comportamentos. A forma
como grande parte dos pais portugueses educa os filhos incentiva nestes a falta de
autoconfiança, a falta de iniciativa e de responsabilidade.
Deve reconhecer-se que o problema atual da educação das crianças e dos jovens
é um problemade toda a sociedade e de cada adulto.
Todos temos uma responsabilidade com as gerações futuras. Compete-nos
preparar os jovens para a vida adulta, preparando-lhes um tipo de sociedade onde seja
possível viver.
Durante muito tempo, a escola foi vista como única fonte de saber, capaz de
assegurar prestígio e posição social. Hoje, embora continue a ter um papel importante,
ela já não tem o "monopólio" do saber exclusivo, ou seja, atualmente há já muitas
outras fontes de informação igualmente credíveis. Nestas novas fontes de informação
estão incluídas as novas tecnologias que são excelentes meios para a construção do
conhecimento.
A escola já não deve ser encarada como um espaço fechado e triste, mas sim
como um lugar de prazer e de aprendizagem. Para tal, o contributo do professor é
fundamental. O papel deste não se deve resumir à transmissão de teorias muitas vezes
já em desuso, mas em estar aberto à imprevisibilidade e às constantes mutações
socioculturais. O papel do professor não poderá limitar-se a uma comunicação
unilateral entre este e os seus alunos. Este papel terá de ser ativo e criativo, para que a
educação decorra numa ação cooperativa e onde haja espaço para a criatividade de
alunos e professores.
5
1. Educação – Conceito geral
Todos os sistemas educativos revelam as ideologias políticas dos regimes que as
enformam. Já no século XIX, Durkheim referia: "As transformações educacionais são
sempre o resultado de um sistema de transformações sociais em termos das quais
devem ser explicitadas. Para um povo sentir, num dado momento, a necessidade de
mudar o seu sistema educacional, é necessário que novas ideias e necessidades tenham
emergido e para as quais o velho sistema já não está adequado".
Se é certo que o mundo sempre tenha estado em crise, a mesma afirmação é
mais válida hoje pelo que a transitoriedade é um feito incontroverso e a crise parece
ter-se acentuado nos últimos tempos.
Assistimos sem dúvida, a um desmoronamento dos modelos educativos
tradicionais, põe-se mesmo em causa a existência da escola, o modelo de homem e de
sociedade para que educar. Face à escola autoritária opõe-se a libertadora, face ao
conservadorismo o progresso... A conceção antinómica da escola parece ter absoluta
vigência.
Têm aparecido teorias e modelos que tentam resolver esta crise: pedagogias
não diretivas, não repressivas, libertárias e libertadoras, morte da escola, escolas novas,
etc.
Philip H Coombs analisou o problema em profundidade, as suas causas e
consequências, acentuando a ideia de que até o mesmo conceito de Educação se
alterou, especialmente a partir dos anos 70.
Para esta crise contribuíram também fatores específicos que Coombs analisa
cuidadosamente destacando entre eles a inesperada explosão escolar, a escassez de
recursos, o incessante incremento dos custos, a ineficácia dos atuais sistemas educativos
não adaptados à realidade atual, etc.
No entanto, é certo que as origens da crise se remontam a tempos pretéritos
como mostram as diversas reformas e inovações levadas a cabo, especialmente a partir
dos finais do século passado. A Escola Nova é um bom exemplo, apesar da conhecida
informação de que “não há novidade mais velha do que a escola nova».
Trata-se de um movimento que pretende modificar e aperfeiçoar a educação
com a aplicação de técnicas e conceções inovadoras. Nela se destaca o pai do centrismo, a
6
vida em situação semelhante à da família, a educação moral, o trabalho manual, a
coeducação, o auto governo, a participação coletiva, etc.
7
em paralelo com ela, constituem inapreciáveis meios, que confirmam a ideia de que a
escola não é o único local onde se realiza a educação.
Esta escola, que será no nosso entender, a Escola do futuro, será uma escola que
pensa e é feita por pessoas que pensam e que aprendem a pensar. Que quer dizer
literalmente que promovem uma discussão contínua, um interrogar-se continuamente,
um observar, em que cada um controla a própria discussão, consciência,
8
responsabilidade, pensamento ético, pensamento cultural. O que é necessário é que a
escola pense e para pensar fazem falta muitas cabeças. Uma cabeça só pode pensar,
pode chegar longe, mas, no campo da educação é necessária a discussão conjunta, é
necessário entrar em crise.
9
As causas dominantes do insucesso escolar são de natureza:
1. Económica e cultural (família e origem dos alunos);
2. Sociocultural e escolar;
3. Escolar (sistema de ensino).
De facto, não existe uma definição universal de insucesso escolar. Para começar
diremos que não existe um, mas vários insucessos escolares. Depende tudo da
perspetiva em que nos colocamos: insucesso em relação a quê? — Em relação ao aluno
ou em relação à escola?
Pode dizer-se que há insucesso ou fracasso escolar quando algum ou alguns dos
objetivos da educação escolar não são alcançados. Ora, a educação escolar tem como
finalidade instruir, estimular e socializar os educandos. Ou, dito por outros termos, visa a
aquisição de determinados conhecimentos e técnicas (instrução), o desenvolvimento
equilibrado da personalidade do aluno (estimulação) e a interiorização de determinadas
condutas e valores com vista à vida em sociedade (socialização). Se algum destes
objetivos, que constituem outras tantas dimensões da educação, não é atingido, pode
dizer-se que há insucesso na educação escolar. Sendo assim, os dados referentes à
percentagem de reprovações no ensino são só por si insuficientes para caracterizar o
insucesso escolar.
Eles dizem-nos que houve insucesso em relação à instrução, mas não nos
permitem diretamente concluir que este insucesso também se verifica nas outras
dimensões educativas. Todavia,não deixa de ser indicativo que muitas análises correntes
tomem como elemento de referência do insucesso dados referentes à instrução escolar.
Isso revela que na escola é valorizada a instrução em detrimento de uma conceção mais
ampla de educação onde a dimensão personalista (formação de uma personalidade
equilibrada, estimulação das potencialidades individuais) e a dimensão socializadora
(criação de hábitos de cooperação, espírito crítico, participação em decisões comuns) são
claramente inferiorizadas
Frequentemente acontece que estas dimensões não são tomadas em
consideração num juízo global sobre sucesso ou insucesso escolar, quando realmente
elas são essenciais para caracterizar a eficácia do projeto educativo.
10
3. A escola como um quadro de interações sociais
3.1. Os atores educativos e a comunidade escolar
O desenvolvimento humano está relacionado com a evolução contínua traçada
ao longo de todo o ciclo de vida, sendo que esta, nem sempre linear, se dá em diversos
campos da existência, como o afetivo, o cognitivo, o social e o motor. “Este caminhar
contínuo não é determinado apenas por processos de maturação biológicos ou
genéticos”, sendo o meio (cultura, sociedade, práticas e interações) o “fator de máxima
importância no desenvolvimento humano”, pois através da interação social o indivíduo
aprende a desenvolver-se (Rabello & Passos, s/d, p. 1).
Para teóricos construcionistas, como Piaget, “o desenvolvimento é construído a
partir de uma interação entre o desenvolvimento biológico e as aquisições da criança
com o meio”, já numa abordagem sociointeracionista, como defende Vygotsky, o
desenvolvimento humano dá-se “nas trocas entre parceiros sociais, através de processos
de interação e mediação” (Rabello & Passos, s/d, p. 2), sendo que ambas as teorias têm
em comum o reconhecimento da importância das interações (embora distintas) para o
processo de desenvolvimento.
No que concerne à aprendizagem, este conceito emergiu de investigações levadas
a termo com base no pressuposto de que todo o conhecimento provém da experiência,
significando isto que o sujeito adquire, através dos sentidos, as impressões do mundo
que, associadas umas às outras, dão lugar ao conhecimento, sendo este um conjunto de
ideias formado a partir do registo dos factos vivenciados (Giusta, 2013). Assim, é
possível afirmar que as caraterísticas e as atitudes individuais de cada sujeito estão
diretamente relacionadas com as interações que este constrói com os outros e com o
meio, querendo isto dizer que mesmo o que achamos ser a característica mais individual
e específica de um indivíduo, esta foi construída a partir da sua relação com o meio e
com os outros (Vygotsky et al., 1988, citado por Rabello & Passos, s/d).
Sendo a escola “determinante para o desenvolvimento cognitivo e social” da
criança e sendo este (desenvolvimento) essencial “para o curso posterior da sua vida”, é
neste ambiente “que se constrói parte da identidade de ser e pertencer ao mundo”,
pois é nele que se adquirem “os modelos de aprendizagem” e os “princípios éticos e
11
morais”.
13
origem intelectual (determinada através de quocientes de inteligência) ”. Peixoto
aponta igualmente o nível intelectual como um aspeto ligado ao insucesso escolar,
quando nos diz que “à medida que caminhamos do alto para o baixo nível intelectual
diminui a percentagem de sujeitos com zero reprovações” (cf. 1999:138), acrescentando
a autoestima e referindo-a como sendo outro aspeto que funciona como um fator
relacionado com o insucesso escolar.
14
simultaneamente uma causa/efeito de situações de insucesso escolar. A diferença de
atitudes e comportamentos dos alunos em contexto escolar interfere, direta ou
indiretamente, “na realização e satisfação escolares”. Assim encontramos o
desinteresse, a falta de participação e de confiança, a ansiedade durante a avaliação, a
fraca assiduidade escolar, uma precária alimentação, a falta de cuidados de saúde e
higiene, sobretudo no que diz respeito aos olhos, ouvidos e dentes, e ainda a presença
de deficiências congénitas e mentais como sendo elementos referenciados que
interferem no rendimento escolar.
15
que a personalidade de causa adjuvante e o desajuste das diferentes instituições de
ensino aos condicionamentos sociopsicológicos da população escolar incrementam o
insucesso. Aponta, ainda, que esta adaptação deveria ser concretizada pelo aluno e
professor, indo um ao encontro do outro e a escola deveria encaminhar tais ações de
forma convergente. A nosso ver, este desajuste da escola está relacionado com uma
teoria que a seguir abordaremos mais aprofundadamente, a teoria socioinstitucional.
Acrescente-se que muitos destes fatores exercem influência mesmo antes do aluno
iniciar a sua escolarização e prolongam os seus efeitos ao longo de toda a sua
escolaridade.
17
Os alunos das classes sociais baixas, que acedem ao patamar do sucesso,
legitimado pela escola apenas para os alunos das classes ditas socialmente privilegiadas,
é explicado por uma árdua aculturação escolar que pressupõe, em muitos casos, o
enfraquecimento dos laços com o meio social de origem. Rangel (1994), também
sustenta que a abordagem ao problema do insucesso escolar tem um núcleo central na
família e na sua herança ou cultura. Deste modo, esta teoria alega que as práticas e as
vivências são diferentes comparando crianças dos meios rurais com as crianças dos meios
urbanos.
O primeiro aspeto remete-nos para o facto de não ser vantajoso impor aos
alunos, longas ou cansativas deslocações, uma vez que estas reduzem o tempo e a
disposição para se dedicarem ao estudo e a atividades recreativas. Relativamente ao
segundo, residir em zonas degradadas pode ter também consequências negativas para o
aproveitamento escolar. Uma família, com um nível socioeconómico baixo terá
provavelmente um acesso reduzido a uma boa e saudável alimentação, vestuário,
18
habitação, bem como, a um escasso poder de compra de bens de cultura.
O rendimento económico familiar fraco pode ainda conduzir ao abandono
escolar na medida em que se torna necessário reduzir as despesas e aumentar o
rendimento per capita. Vendo a escola como um gasto desnecessário levará os jovens
com um historial de insucesso a iniciarem mais cedo o mundo profissional.
19
As classes mais altas têm, por norma, expectativas mais elevadas para os seus
educandos tendendo a encaminhá-los para profissões mais prestigiadas, enquanto as
classes mais baixas procuram que estes atinjam objetivos a curto prazo em profissões
pior remuneradas e com menos prestígio social. Deste modo, é fundamental que o
currículo estabeleça corretamente a proporcionalidade entre o teórico e o prático para
que não ocorram casos de desinteresse que poderão originar situações de insucesso
escolar devido à não correspondência entre a realidade escolar e as expectativas quanto
ao futuro profissional.
A afetividade familiar em equilíbrio constitui também para Avanzini (s.d.) um
factor relevante para um bom aproveitamento escolar. Os problemas familiares como
desentendimentos conjugais, ciúmes, comportamento de agressividade e de
infantilidade, potenciam situações de insucesso escolar. A este respeito, Muñiz (cf.
1993:76) refere que “quando o casal não funciona adequadamente, os interesses da
criança são reabsorvidos pelos conflitos familiares, pelos receios deles derivados e,
portanto, a capacidade de se interessar e de enfrentar problemas e dificuldades
escolares fica diminuída e imbuída da problemática familiar”.
20
escolares e métodos de ensino.
Torna-se necessário apostar na transformação da própria escola, nas suas
estruturas, conteúdos e práticas, procurando ‘adaptá-la’ às necessidades dos diversos
públicos que as frequentam, elucidando subtis mecanismos de reprodução de diferenças
e procurando caminhos de facilitação dasaprendizagens para todos os alunos.
Esta teoria do insucesso escolar compreende o percurso individual e centra-se na
procura das condições educativas ideais, avaliando e distinguindo as que favorecem das
que inibem o trabalho escolar. Pires, Fernandes e Formosinho mencionam um conjunto
de fatores escolares que podem estar na base do insucesso escolar, como tipo de cursos
e currículos, estruturas e métodos de avaliação, formas de agrupamento dos alunos,
preparação científica e pedagógica dos professores.
Esta teoria coloca na escola a responsabilidade pelo insucesso escolar, alegando
que as práticas escolares e pedagógicas têm por base o modelo de “aluno ideal”,
O insucesso escolar pode ter origem no próprio Sistema Escolar, uma vez que a
escola tende a valorizar os saberes académicos em detrimento dos saberes que se
enquadram melhor com a realidadeenvolvente dos alunos.
21
Os saberes académicos obrigam ainda a uma abstração que não está de acordo
com os códigoslinguísticos e posturas das classes mais baixas ou marginais ao sistema de
valores dominante.
A incapacidade e a não compreensão das mensagens por parte dos alunos vão,
desta forma, criar barreiras à aprendizagem e conduzir os alunos ao insucesso. De igual
forma, a não transição parece apresentar desvantagens para o aluno, já que este poderá
desenvolver comportamentos específicos negativos interiorizando o fracasso,
condicionando o bom aproveitamento escolar.
Existem indicadores de que quanto mais um aluno reprova, mais facilidade tem
em voltar a reprovar, uma vez que o insucesso escolar, além de massivo é também
considerado socialmente seletivo.
23
Como podemos concluir do anteriormente exposto, compreender a ocorrência
do insucesso escolar parece-nos uma tarefa interminável, uma vez que se trata de um
fenómeno dinâmico sobre o qual haveria muito mais a acrescentar.
Durante alguns anos o fracasso escolar das crianças das camadas populares foi
alvo de diversos estudos e pesquisas que chegaram à seguinte conclusão: a linguagem
falada pelos estudantes da classetrabalhadora não era a mesma linguagem utilizada pela
escola.
A partir daqui, Bernstein procurou compreender a relação causal entre classe
social, linguagem e rendimento escolar, partindo dos dados concretos segundo os quais
os estudantes da classe média obtinham, contrariamente aos da classe trabalhadora,
êxito em sua vida acadêmica.
Nos seus estudos e pesquisas, que se basearam em vários estudos e
experiências, o sociólogo da linguagem encontrou características gerais que, segundo
ele, opunham completamente a linguagem da classe trabalhadora e a linguagem da
classe média. Daí deriva a teoria dos códigos linguísticos, o restrito e o elaborado.
Os resultados obtidos nesses testes comprovaram a vinculação dos códigos às
classes sociais porque o grupo da classe média alcançou praticamente a mesma
24
quantidade de pontos no teste verbal e no não-verbal, enquanto a classe trabalhadora
obteve pontuação maior no teste não-verbal.
O pensamento de Bernstein evoluiu durante toda sua produção intelectual, e alguns
conceitos básicos de sua teoria vão sendo modificados e complementados a cada
trabalho. Sendo assim, os seus primeiros trabalhos enfatizam os aspetos lexicais e
morfossintáticos na caracterização dos dois códigos, enquanto os posteriores voltam-se
para os aspetos semânticos. Nesse percurso, há inclusive alterações na terminologia
empregada: se, inicialmente, Bernstein emprega os termos “linguagem pública” e
“linguagem formal”, logo em seguida, passa a empregar “código restrito” e “código
elaborado”.
O uso do termo código não deve levar-nos a pensar que Bernstein refere-se à
língua enquanto sistema de regras, mas sim à linguagem, à fala enquanto atividade
concreta exercida pelos sujeitos falantes. Nesse sentido, vale a pena, desde já,
esclarecer que o conceito de códigos linguísticos do autor inglês não se confunde com o
de variedades linguísticas ou normas linguísticas, uma vez que, estas sim, são
relacionadas à língua como código.
O código restrito não é o mesmo que variedade popular e o código elaborado
não é o mesmo que variedade culta da língua.
Um acréscimo importante é feito alguns anos depois para a definição dos dois
códigos,acréscimo esse que leva em conta aspetos semânticos.
A tese de Bernstein é que o fator determinante para o desenvolvimento dos
códigos seria as formas diferentes de socialização que a criança recebe no ambiente
familiar, isto é, haveria formas desocialização distintas nas famílias de classe média e nas
famílias de classe trabalhadora, e essas formas de socialização estariam diretamente
relacionadas à aquisição ou de ambos ou de apenas um dos códigos (Bernstein sustenta
que os indivíduos de classe média dominam os dois códigos, enquanto os indivíduos de
26
classe trabalhadora dominam apenas o código restrito).
Nas suas reflexões, o autor salienta a importância do tipo de organização das
famílias, que, segundo ele, são basicamente de dois tipos: a família posicional e a família
pessoal.
Na família posicional, as regras e decisões estão centradas na posição que o
membro ocupa na família (pai, mãe, filho, avó, neto). As diferenças individuais são fracas
e baseiam-se na autoridade. Consequentemente, a comunicação realiza-se por meio do
código restrito.
6. Práticas pedagógicas
É hoje consensual que a Escola deve assumir uma perspetiva inclusiva. Devendo
ter em consideração as características singulares de cada aluno e tentando dar resposta
27
às suas necessidades. Mais do que transmitir conhecimentos, a Escola dos nossos dias
pretende formar futuros adultos que revelem competências, saberes e valores. Os
mesmos devem permitir-lhes ter um papel ativo na sociedade. A par disso, pretende
formar cidadãos empreendedores, interventivos, capazes de se adaptar a diversos
contextos. E, acima de tudo, pessoas felizes e integradas numa sociedade que os
valorize a si e às suas capacidades.
Neste sentido, a implementação do Decreto-lei n.º 54/2018 veio reforçar esta
perspetiva. O mesmo defende princípios e valores inclusivos, através da implementação
de medidas de política educativa que enquadrem a ação das escolas e comunidade
educativa. Levando-nos assim, a refletir ea alterar as nossas práticas educativas.
29
Um docente de educação especial
Três membros do conselho pedagógico com funções de coordenação
pedagógica dediferentes níveis de ensino
Um psicólogo
Cabe a esta equipa, entre outras funções:
Propor as medidas de suporte à aprendizagem
Acompanhar e monitorizar as mesmas
Prestar aconselhamento aos docentes e orientá-los para práticas
pedagógicas inclusivas
Elaborar os documentos definidos pelo decreto-lei
30
aprendizagem do aluno. Vai passar a privilegiar-se a sua autonomia e o poder de decisão
relativamente aos seus alunos e às práticas educativas que adota em sala de aula.
Este aspeto traz-lhe sem dúvida maior responsabilidade pelo sucesso ou
insucesso académico dos seus alunos. Apesar das mudanças, por mim consideradas
positivas, nem tudo tem sido fácil na implementação deste decreto-lei.
Um dos aspetos que mais dúvidas tem colocado aos professores, e
inclusivamente às equipas multidisciplinares, tem sido a operacionalização das
diferentes medidas de suporte à aprendizagem e inclusão. Isto porque são enumeradas,
mas não operacionalizadas no decreto-lei nem no respetivo manual de apoio à prática.
Constata-se então que cada pessoa interpreta e operacionaliza à sua maneira,
surgindo modos de atuação diferentes de escola para escola. Talvez não tenha sido ao
acaso esta falta de operacionalização, já que se espera cada vez mais autonomia e
flexibilidade por parte das escolas. Mas a verdade é que esta questão gerou (e ainda
gera) muita confusão. Tem sido fundamental o diálogo e a partilha entre as escolas para
se chegar a um entendimento e linguagem comuns.
Outro fenómeno que se pode observar é a multiplicação de documentos de
registo, grelhas de observação e monitorização. Tem havido uma preocupação por parte
dos professores e equipas multidisciplinares em registar todas as medidas adotadas
para determinado aluno, assim como, em criar grelhas de monitorização da eficácia das
mesmas.
Esperemos que esta preocupação se estenda efetivamente à implementação das
medidas no processo educativo do aluno e não se restrinja ao preenchimento desses
mesmos documentos.
7. Abordagem transformadora/transformativa
O último século marca uma importante viragem no universo económico, social,
político e comunitário, nomeadamente pelo aparecimento e desenvolvimento de uma
vasta pluralidade de sentidos e significados que a globalização trouxe.
Os conceitos de educação e de desenvolvimento são particularmente
importantes neste processo, na medida em que a sua concetualização, interpretação e
prática foram sendo enriquecidos por visões diversificadas e multidisciplinares.
31
Numa sociedade cada vez mais complexa e global, fruto das transformações
constantes do universo económico e, por sua vez, também, político e social, a educação
aparece enquanto bandeira transversal para a compreensão e interação com o mundo. A
educação parece assumir, cada vez mais,um papel heterogéneo e plural, respondendo às
suas controvérsias e contradições, desafios e tensões.
32
Particularmente sobre o contexto educativo formal, a escola, na sua
função mais global, tem uma preocupação evidente com o
desenvolvimento da subjetividade e de identidades pessoais. A
globalização vem trazer a este processo uma vertigem complexa ao nível
da formação do indivíduo, na medida em que acrescenta, como antes
descrito, à assimilação natural da cultura do sujeito, uma compreensão
33
A condição global deve ser abordada a partir da complexidade dos esquemas
que são necessários para reorganizar os nossos saberes especializados que nos
incapacitam para a compreensão da realidade que nos afeta, para compreender as
responsabilidades que nos incumbem e para participar como cidadãos numa sociedade
cujos destinos se decidem como esferas e contextos nem sempre fáceis de identificar.
A partir destas preocupações e problemas, que desafiam a educação e o sentido
que esta deve assumir na contemporaneidade, mais global e ao serviço do
desenvolvimento humano, surge a Educação para o Desenvolvimento (ED). Assumindo a
ausência de uma definição consensual da ED, crê-se que a sua complexidade concetual e
das práticas que suporta e problematiza, a tornam mais ricae dinâmica.
Genericamente, a ED objetiva o seu propósito na transformação social,
assentando em valores e princípios para um mundo mais justo, equitativo, inclusivo e
sustentável. Promove, para isso, a participação social ativa, consciente e responsável,
para o exercício de uma cidadania informada, comprometida e crítica. Desta forma,
pois, procede-se à sensibilização e formação da opinião pública e à consciencialização
para a participação ativa para as questões globais e para o combate e prevenção de
desigualdades e injustiças sociais.
Fundamentalmente, e respondendo à premissa anterior, esta é uma orientação
cívica de participação enquanto exercício da ED, na medida em que se tornam mais
evidentes o sentido democrático e dialógico do processo. Ao mesmo tempo, a ED
procura, a partir da cooperação, assegurar a diversidade de perspetivas e experiências,
reconhecendo enquanto contexto a educação formal, não-formal e informal.
Subentende-se, pois, a ideia de que a ED se baseia intrinsecamente no princípio
de “educação ao longo da vida”, na medida em que, é preciso conhecer, questionar,
compreender, comprometer-se,criar alianças, refletir e avaliar.
No sentido da transformação social, a sociedade civil tem um papel fundamental
para a mudança de posturas, comportamentos e atitudes, sendo que, por isso, a
educação não-formal é um espaço privilegiado de aprendizagem.
35
A educação global é uma perspetiva educativa que decorre da constatação de que
os povos contemporâneos vivem e interagem num mundo cada vez mais globalizado.
Este facto faz com que seja crucial dar aos aprendentes oportunidades e competências
para refletirem e partilharem os seus próprios pontos de vista e papéis numa sociedade
global e interligada, bem como compreenderem e discutirem as relações complexas
entre questões sociais, ecológicas, políticas e económicas que a todos dizem respeito,
permitindo-lhes descobrir novas formas de pensar e de agir. Contudo, a educação global
não deverá ser apresentada como uma perspetiva a aceitar universalmente de forma
acrítica, pois são bem conhecidos os dilemas, tensões, dúvidas e diferenças de perceção
presentes em qualquer processo de educação sempre que se lida com questões globais.
36
Bibliografia
Alves, F. (2004). Diário: Um contributo para o desenvolvimento profissional dos
professores e estudo dos seus dilemas. Millenium, 29, 222-239.
Arezes, M., & Colaço, S. (2014). A interação e a cooperação entre pares: Uma prática
em contexto de creche. Interacções, 30, 110-137.
Azevedo, A. (2009). Revelando as aprendizagens das crianças: A documentação
pedagógica. Braga: Universidade do Minho.
Baptista, N., Monteiro, C., Silva, M., Santos, F., & Sousa, I. (2011). Programa de
promoção de competências sociais: Intervenção em grupo com alunos do 2º e 3º
ciclo do ensino básico. [On- line: http://www.psicologia.com.pt]
Bogdan, R., & Biklen, S. (1994). Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto
Editora.
Borsa, J. C. (2007). O papel da escola no processo de socialização
infantil. [On-line:http://www.psicologia.com.pt]
Carvalho, S. (2008). A importância da afetividade docente, para o desenvolvimento
cognitivo decrianças da educação infantil, de uma escola particular da RA do
César, M., & Kumpulainen, K. (Eds.) (2009). Social interactions in multicultural
settings. Rotterdam:Sense Publishers.
Clandinin, D. J., & Connelly, F. M. (1998). Personal experience methods. In N. K.
Coll, C., Palacios, J., & Marchesi, A. (1995). Desenvolvimento psicológico e educação:
Psicologiaevolutiva. Porto Alegre: Artes Médicas.
Denzin, & Y. S. Lincoln (Eds.), Collecting and interpreting qualitative materials (pp. 150-
178). ThousandOaks, CA: Sage Publications.
Dias, A. (2011). Aprendizagens não formais em ciências: contributos das actividades de
um museu paraa literacia científica. Cadernos de sociomuseologia, 41, 133-144.
Erickson, F. (1986). Qualitative methods in research on teaching. In M. C. Wittrock (Ed.),
Handbook ofresearch on teaching (3.ª ed.) (pp. 119-161). New York: Macmillan
Publishing Company.
Estrela, A. (1994). Teoria e prática de observação de classes: Uma estratégia de
formação deprofessores (4.ª ed.). Porto: Porto Editora.
37
Martins, C., & Franco, F. (2009). O papel das interações sociais no desenvolvimento da
linguagem de crianças de dois a três anos na creche. In Atas do IX Congresso
Nacional de Educação - EDUCERE/III Encontro Sul Brasileiro de Psicopedagogia
(3907-3914). Curitiba: Editora Champagnate.
Matta, I. (2001). Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem. Lisboa:
Universidade Aberta. Máximo-Esteves, L. (2008). Visão panorâmica da
investigação-ação. Porto: Porto Editora.
Mello, T., & Rubio, J. (2013). A importância da afetividade na relação professor/aluno
no processo de ensino/aprendizagem na educação infantil. Revista Eletrónica
Saberes da Educação, 4(1), 1-11.
Mesquita, S. (2015). O desenvolvimento da comunicação e as interações entre pares:
Uma prática em contexto de creche (Dissertação de mestrado, documento
policopiado). Escola Superior de Educação do Porto, Porto.
Oliveira, Z. (2002). Educação Infantil: Fundamentos e métodos. São Paulo:
Cortez Editora.Outeiral, J. (2003). O mal estar na escola. Rio de Janeiro:
Revinter.
Paranoá DF. [On-line: http://www.conhecer.org.br]
Patton, M. Q. (1980). Qualitative evaluations methods. Newbury Park, CA:
Sage Publications.Piaget, J. (1994). O juízo moral na criança (2.ª ed.). São
Paulo: Summus.
Post, J., & Hohmann, M. (2004). Educação de bebés em infantários: Cuidados e
primeirasaprendizagens (2.ª ed.). Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian.
Rabello, E., & Passos, J. (s/d). Vygotsky e o desenvolvimento humano. [On-line:
http://www.josesilveira.com]
Ramos, G. (2012). Um convite às descobertas. In G. Ramos, & S. Rosa (Eds.), Os saberes
e as falas debebés e suas professoras (Parte II). Belo Horizonte: Autêntica.
Rosa, A. (2014). Interações sociais entre pares em creche e jardim-de-infância
(Dissertação demestrado, documento policopiado). Instituto Politécnico de
Setúbal, Setúbal.
Silva, A. (2004). Desenvolvimento de competências sociais nos adolescentes. Lisboa:
Climepsi Editores.
38
39
40