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AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DO BONFIM

Análise do poema MAR PORTUGUÊS

• Em termos formais, constatamos que o poema é constituído por duas estrofes, de


seis versos (sextilhas). Quanto ao metro os versos são irregulares. Os versos são
decassilábicos e octossilábicos. A rima é emparelhada, segundo o esquema
aabbcc. As palavras que rimam são, na sua maioria, palavras importantes no
universo do poema (sal, Portugal, choraram, rezaram, Bojador, dor, céu),
realçando a sua expressividade em conjugação com a posição final de verso
ocupada.
• O tema desta composição poética pode dizer-se que é a apresentação dos perigos
e das glórias que o mar comporta ao povo português. Este tema desenvolve-se
em duas partes.
• A primeira parte é constituída pela primeira estrofe, onde o sujeito poético
apresenta uma realidade épica – é a síntese da história de um povo e dos
sacrifícios que suportou para poder conquistar o mar; a segunda estrofe é de
carácter mais reflexivo, fazendo o sujeito poético um balanço dos referidos
sacrifícios. A conclusão é de que valeu a pena, pois em resultado desse
sofrimento, o povo português conquistou o absoluto. As aspirações infinitas dos
homens conduzem-nos até este ponto. A recompensa das grandes dores são as
grandes glórias.
• A primeira parte inicia-se com uma apóstrofe ao mar, encerrando com outra
desta feita não adjetivando o mar como salgado (veja-se a expressividade deste
adjetivo, enfatizando o sabor amargo do sal, mas mais amargo ainda o
sofrimento que causa as lágrimas já de si também salgadas – perspetiva
simbólica deste elemento), mas conferindo à estrofe e de certo modo ao poema
uma espécie de circularidade. Tudo começa e termina no mar. A metáfora
associada à hipérbole nestes dois versos iniciais (Quanto do teu sal são
lágrimas de Portugal) acentuam o sofrimento causado pelo mar no povo
português. As frases exclamativas conferem o tom épico a esta primeira estrofe e
patenteiam as vítimas que o mar fazia em terra: as mães, as noivas e os filhos
são os atingidos pelo sofrimento causado pelo elemento marinho. A repetição do
determinante interrogativo, em posição anafórica, nos dois últimos versos
acentua o dramatismo das situações narradas. Foi sobretudo nos núcleos
familiares que se fizeram sentir os malefícios do mar. Ressalte-se o valor
expressivo da metáfora inicial “ Por te cruzarmos”, apontando para a cruz
símbolo de sofrimento. Os verbos choraram, rezaram, e ficaram por casar
ainda por cima reforçados pela expressão “em vão” denotam a dor, o sofrimento
e o choro aflito provocados pela destruição do amor maternal, filial e de
namorados. Tudo isto porque almejamos a posse do mar “ para que fosses
nosso, ó mar!”
• A segunda parte inicia-se com dois versos de teor axiomático, possibilitando um
balanço que para o sujeito poético é positivo, apesar de todos os sacrifícios.
Basta para tal que o objetivo que esteja na base da empresa seja nobre. Note-se a
AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DO BONFIM

reiteração de valeu...vale e mais adiante passar...passar ... reforçando a relação


necessária entre o sofrimento e o heroísmo. A própria interrogação retórica
funciona como uma chamada de atenção para as contrapartidas que o povo
português alcançara do destino.
• A resposta à questão que levantou o sujeito poético, obtém a resposta nele
mesmo, através de três frases, todas elas carregadas de grande simbolismo.
• A primeira resposta “Tudo vale a pena se a alma não é pequena” sugere a
grandeza da alma humana, sempre pronta a desejar o impossível, o que pode
proporcionar a glória, a heroicidade. Tudo vale a pena para alcançar o ideal
sonhado.
• Na segunda frase “Quem quer passar além do Bojador / tem que passar além
da dor”, deve entender-se Bojador na sua dimensão simbólica, de ultrapassar o
medo, ultrapassar o desconhecido, conseguir a glória e a heroicidade desejada.
Não obstante é necessário ultrapassar também em primeiro lugar a dor.
• Finalmente, a terceira frase “Deus ao mar o perigo e o abismo deu / mas nele é
que espelhou o céu”. O perigo e o abismo do mar são a causa de sofrimentos,
mas no sentido metafórico e simbólico que está para lá do denotativo de o céu se
refletir no mar, está a ideia de que o céu é símbolo do sonho realizado, da glória.
Daqui poderemos deduzir que quem vencer os perigos do mar e o sofrimento
alcançará a glória suprema. Nas frases enunciadas constatamos sempre a
existência de dois elementos antitéticos “ pena”, “dor”, “perigo” e “tudo vale a
pena”, “passar além da dor”, “passar além do Bojador” e “céu”. É interessante
verificarmos que não existem conjunções a ligar estas frases e que a primeira
tem sentido universal, sendo que a segunda particulariza o sentido ao caso
português, e por último, parecendo a frase de sentido universal, ela liga-se à
exclamação que introduz o poema, é para o mar português que se aponta, para a
tragédia e glória de Portugal. Daqui resulta sobretudo a dimensão épica do
poema. Este texto aproxima-se do episódio de Camões “ O Velho do Restelo”,
mas desaparece a crítica aos Descobrimentos, acentuando-se sobretudo o tom
laudatório em Pessoa.
• Ao longo do poema predominam os tempos do perfeito para evocar
acontecimentos passados trágicos e o presente que situa o sujeito poético num
tempo presente, considerando os valores morais fundamentais à construção de
heróis, bravura, tenacidade e desejo de vencer.

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