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11ª Classe Filosofia

Iº - EMERGÊNCIA DO FILOSOFAR

1.1. O que é Filosofia? Diversas maneiras de defini-la.

De uma maneira geral, a abordagem de qualquer ciência começa pela


apresentação da sua definição, pela delimitação do seu objecto e pela indicação dos seus
métodos específicos. Como será, então, em Filosofia? Qual a definição de filosofia?
O que a prática já nos demonstrou é que não se pode falar em filosofia quando
não hajam problemas por resolver. Mas só tem problemas para resolver quem está em
posse de uma razoável experiência de vida. Assim, dentre os vários grandes dilemas que
temos pela frente, o primeiro é constituído pela seguinte questão: o que é a filosofia?
A pergunta colocada tem várias respostas, de acordo com cada filósofo. No dizer
dos filósofos, ela “estuda os princípios constitutivos de todas as coisas” (Murcho,
2002, p. 14). Aristóteles, o primeiro a fazer uma pesquisa sistemática em torno dessa
disciplina diz que a filosofia “estuda as causas últimas de todas as coisas”, Cícero
define-a como o “estudo das causas humanas e divinas”; Descartes, afirma que a
filosofia “ensina a raciocinar bem”; Hegel entende-a como “o saber absoluto”; para
Whitehead, o papel da filosofia é “o de fornecer uma explicação orgânica do universo”
(Mondin, 1990, p.7). A filosofia tem “a missão de explicitar o implícito, tomar
consciência do inconsciente” (Anianw, Apud Geque e Biriate, 2013, p. 16)
Percebe-se que a definição de filosofia tem tantas respostas e todas elas
polémicas, isso prova a falta de consenso que existe entre os filósofos quanto ao
conceito desta área do saber, uma das razões para esse conflito prende-se com o facto de
nenhuma definição ser tão rigorosa até ao ponto de cobrir todos os enigmas que afligem
o homem e a sua própria existência.
A palavra filosofia é formada por dois termos gregos: philo, que traduz a ideia
de amor e sophia, que significa sabedoria. Assim, filosofia tem o sentido etimológico
de “amor à sabedoria”. Diante desta definição podemos levantar questionamentos
como: de que amor se trata? Que tipo de sabedoria?
Com efeito, aquilo que sem dúvida justificou a desconsideração da definição
etimológica de «filosofia» foi a vacuidade, a simplicidade e ainda a inexactidão da sua
tradução pelo lugar-comum «amor à sabedoria». O nosso «amor» traduz termos
gregos distintos, com graus diversos de adequação: phília, éros, agápe. Prescindindo
agora dos outros dois termos, philia pode significar duas coisas: “amor de amizade”

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(Borrón, 1998, p. 23), como é frequentemente traduzido, ou então, “afeição, anelo,


tendência” (Idem, p. 24).
É precisamente este último significado, aquele que matiza uma grande
quantidade de palavras compostas nas quais aparece como prefixo “filo”, tal como em
philo-sophia.
Conforme a tradição histórica, a criação do termo Filosofia á atribuída ao grego
Pitágoras, que viveu no século VI a. C. Certa vez, perguntado pelo príncipe Leonte
sobre qual era a natureza da sua sabedoria, Pitágoras disse: sou apenas um filósofo.
Com essa resposta, desejava esclarecer que não detinha a posse da sabedoria. Assumia a
posição de «amante do saber», alguém que procura a sabedoria, que busca a verdade.
Com o decorrer do tempo, entretanto, a palavra filosofia foi perdendo o significado
original.
Na própria Grécia passou a designar não apenas amor ou a procura da sabedoria,
mas um tipo especial de sabedoria: aquela que nasce do uso metódico da razão, da
investigação racional, na busca do conhecimento.
Da própria análise etimológica se conclui que a filosofia não é algo dado, mas
antes algo que se procura. No próprio conceito está implícita uma atitude. Em relação a
isso, Jaspers escreve:

A palavra grega filósofo “philosophos” é formada em oposição a sophos,


significa o que ama o saber, em contraposição ao possuidor de conhecimentos,
que se designava por sábio. Este sentido da palavra mantém-se até hoje: é a
demanda da verdade e não a sua posse que constitui a essência da filosofia,
muito embora tenha sido frequentemente traída pelo dogmatismo (…). Filosofar
significa estar a caminho. As interrogações são mais importantes do que as
respostas e cada uma destas transforma-se em nova interrogação (…). A filosofia
a nada se subordina ou se equipara (…). Cada filosofia define-se a si própria pelo
modo como se realiza (Jaspers, 1998, p.19)

Numa sociedade em que as explicações estão todas prontas, onde as normas são
aceites sem discussão, a tendência é estagnar. As alterações, inevitáveis em qualquer
comunidade humana, ficam por conta de factores externos, tais como: mudanças
climáticas, cataclismos, guerras, invasões… Mas, onde há questionamento de tudo,
existe um princípio interno de transformação, e existe a permanente possibilidade de
mudança.

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1.2. Objecto, método e função da Filosofia.

A filosofia estuda a natureza profunda das coisas supremas, seus fins derradeiros,
visando o conhecimento que ultrapassa a experiência sensível dos fenómenos e do que
só é acessível à razão.
A filosofia tem por objecto os princípios constitutivos de tudo que existe no
universo. Realçar que, seu objectivo é tripartido “Obtenção do conhecimento só pelo
conhecimento, permitindo deste modo a elaboração de uma cosmovisão; estimular a
pesquisa, quer seja científica quer seja especulativa; Promover a cultura da
humanidade” (Lau, 2006, p.12).
Para estudar a natureza íntima de tudo que constitui a realidade ela, serve-se de
dois métodos: “racional ou especulativo1 abarcando dois movimentos: um ascendente
“indução” e outro descendente “dedução” e o crítico-analítico2” (Geque & Biriate,
2019, p. 19).
A filosofia enquanto conhecimento sistemático é um conjunto de teorias
estruturadas e sistematizadas. Constitui-se como um conjunto de conhecimento
organizado, historicamente situado, dividido por áreas de saber filosófico e temáticas,
correntes, autores e, escolas de pensamento. Esta pluralidade de áreas e saberes advém
da multiplicidade de respostas e questionamentos acerca da totalidade do mundo e da
realidade humana, que, como vimos, constituem o cerne e objecto da própria filosofia e
do filosofar.
Com efeito, a filosofia, além de ser um saber sobre o mundo; é uma forma de
estar no mundo. Ela torna a existência humana mais consciente de si. A atitude
existencial é a forma consciente de o homem viver a sua vida no mundo e na sociedade.
Portanto, a filosofia leva o homem a uma nova forma de agir, reagir e comportar-se na
vida, face ao mundo que se lhe apresenta.
A nossa experiência como seres humanos mostra-nos que experimentamos
várias atitudes existenciais, podemos estar acordados ou adormecidos, conscientes ou
inconscientes, absorvidos por trabalho, lúcidos ou iludidos. Portanto, a filosofia leva-
nos a uma vida consciente da razão da nossa existência, ao mesmo tempo que orienta o
nosso agir, como Descartes afirmou:

1
Usado para estudar realidades meta-empíricas, tendo como substrato basilar, a razão.
2
Usado para estudar a realidade social baseando-se em factos, procedendo sua análise e consequente
crítica.

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(…) Viver sem filosofar é na verdade ter os olhos fechados, sem nunca se
esforçar por os abrir; e o prazer de ver todas as coisas que a nossa vista descobre
não é de modo nenhum comparável à satisfação que dá o conhecimento das
coisas que se descobrem por meio da Filosofia e, enfim, este estudo é necessário
para orientar as nossas acções nesta vida do que o uso dos nossos olhos para
guiar os nossos passos (Descartes, 2002, p. 67).

De acordo com o exposto acima, depreende-se que a filosofia tem duas funções:
teórica e prática. A primeira função consiste em “ajudar o homem a analisar o mundo,
a reflectir sobre todas as coisas”. A segunda, “impele o homem a ter uma atitude
existencial, um novo tipo de comportamento, fruto da reflexão filosófica” (Geque e
Biriate, 2019, p.17)

1.3. Atitude filosófica vs atitude natural.

O termo atitude é de origem latina: aptitudinem: atitude, e significa – “uma


maneira organizada e coerente de pensar, sentir e reagir em relação a acontecimentos
ocorridos em nosso meio circundante” ou, “a disposição favorável ou desfavorável,
relativamente a objectos, pessoas, acontecimentos ou em relação a alguns dos seus
respectivos atributos” (Morra, 2002, p. 165).
A atitude filosófica não é uma atitude natural. Qualquer indivíduo, de forma
imediata face à realidade, não começa a examiná-la de forma especulativa. Pelo
contrário, o que é natural é que se centre na resolução de problemas práticos, que se
guie pelo senso comum, tendo em vista resolver certas necessidades imediatas ou
interesses concretos.
Com efeito, ninguém pode viver sem se adaptar constantemente às condições do
seu mundo. Estas exigências de sobrevivência tendem naturalmente a sobrepor-se a
todas as outras preocupações. Cada mudança pode representar, assim, uma nova
possibilidade de acontecer o conhecimento. É uma possibilidade, não algo que tenha
que acontecer a todos os homens nas mesmas circunstâncias e em todas as ocasiões.
Estas mudanças frequentemente inquietam-nos ou maravilham-nos, despertando
a nossa curiosidade sobre o porquê das coisas, levando-nos a questionar o que nos
rodeia. Ao fazê-lo estamos a distanciar-nos da realidade que, de repente se tornou
estranha ou mesmo enigmática. Esta atitude reflexiva, pode conduzir-nos a uma atitude
mais radical: a atitude filosófica, que é caracterizada pelos seguintes aspectos: o
espanto, a dúvida, o rigor e a insatisfação.

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O espanto
Aristóteles afirmava que a filosofia tinha a sua origem no espanto, na estranheza
e perplexidade que os homens sentem diante dos enigmas do universo e da vida. É o
espanto que os leva a formular perguntas e os conduz à procura das respectivas
soluções. O espanto no indivíduo rompe com a tendência natural de achar que a ordem
das coisas no mundo à nossa volta é simplesmente óbvia, que “as coisas são como são
porque tinham de ser assim mesmo” (idem, p. 13)
A dúvida
Entendida como um “estado de equilíbrio entre a afirmação e negação”
(Ribeiro e Silva, 1996, p. 449). O espírito não adere, ou porque os motivos para afirmar
e negar se equilibram ou não se equilibram, mas não são suficientes para excluir o medo
de errar; ou não tem razão alguma nem para afirmar, nem para negar. O que era natural
torna-se problemático. O que então emerge é uma dimensão inquietante de insatisfação
e problematização. A reflexão começa exactamente a partir do exame daquilo que se
pensa ser verdadeiro.
O rigor
Questionamento radical que anima o verdadeiro filosófico não é mais do que um
acto preparatório para fundar um novo saber sobre bases mais sólidas. O conhecimento
em si funda-se na crítica e no rigor. A crítica filosófica é, por isso, feita com vigor, não
admite compromisso com as ambiguidades, as ideias contraditórias, os termos
imprecisos.
A insatisfação
A filosofia revela-se uma desilusão para quem quiser encontrar nela, respostas
para as suas inquietações. A única “receita” que os filósofos lhe dão é que faça da
procura do saber um modo de vida, que não se satisfaça com nenhuma conclusão, queira
saber sempre mais e mais.

1.4. Natureza das questões filosóficas.

Para Platão e Aristóteles, a filosofia nasce da admiração e do espanto. Esses


filósofos não se referiam à surpresa que é o extraordinário, o nunca visto, o inesperado,
mas sim à admiração face ao que parecia conhecido, habitual e sem surpresa. Para
Descartes, a filosofia nasce da dúvida. Tenhamos, contudo, sempre presente que não

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basta a admiração, a dúvida; estas estão presentes no início filosófico, mas, para existir
filosofia, é importante a persistência na busca de respostas.
As questões filosóficas não são simples proposições terminadas com um ponto
de interrogação; são afirmações ou negações ligadas a certas questões prévias e
representam muitas vezes a formulação avaliadora de um princípio que exige
justificação. De acordo com certos filósofos, as questões filosóficas dizem “respeito ao
Ser, que não pode ser objecto das ciências” (Jaspers, 1996, p.6), pois não está
estruturado da mesma maneira que as coisas são. Para Gabriel Marcel, as questões
filosóficas são “mistérios” (Marcel, 2005, p.7).
Portanto, o que faz com que uma pergunta seja considerada filosófica não é
apenas o modo, mas também o conteúdo que compreende quatro aspectos, a saber:
universalidade, radicalidade, autonomia e historicidade.
Universalidade
O alcance das questões filosóficas não se circunscreve a realidades particulares;
os problemas filosóficos dizem respeito a todos os homens. A filosofia coloca questões
e problemas que são filosóficos na medida em que são universais, interessam a toda a
humanidade, dizem respeito a todos os homens em todas a épocas, em todas as culturas
e em todas as localizações geográficas.
Radicalidade
Procura a raiz e a origem dos problemas; o que caracteriza as questões
filosóficas é o aprofundamento do problema e não a busca de soluções imediatas.
Autonomia
É a capacidade do filósofo de ter a liberdade de raciocinar na busca da verdade e
de fundamentos, distanciando-se muitas vezes do que a História terá definido.
Historicidade
Diz respeito ao enquadramento histórico das questões filosóficas.

1.5. Divisão da Filosofia

As questões filosóficas divergem; com efeito, cada uma aponta para um campo
de estudo específico. Kant, por exemplo, fez algumas perguntas correspondentes a
diferentes áreas do saber:
 Que posso saber?
 Que devo fazer?

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 Que me é perdido esperar?


 O que é o homem?
Principais áreas da filosofia
Metafísica geral: qualquer investigação que levante questões sobre a realidade
que esteja por detrás ou para além daquilo que pode ser tratado pelos métodos da
ciência.
Ontologia: estuda as teorias acerca do Ser. O Ser fora do qual nada pode ser. A
entidade que é a essência de todos os seres existentes.
Metafísica especial: trata dos seres particulares. Esta divide-se em: Cosmologia
racional e psicologia racional.
Cosmologia racional: estudo racional da natureza do ponto de vista da sua
especificidade substancial e das suas propriedades, usando unicamente o pensamento
lógico. Trata da natureza do natural, da constituição essencial das coisas, da sua origem
e devir.
Psicologia racional: estudo dos fenómenos psíquicos, relacionando-os com uma
natureza intrínseca.
Teodiceia: interessa-se pelo problema de Deus: justificação da possibilidade da
sua existência pela via racional e não pela fé.
Epistemologia: análise crítica acerca do conhecimento científico. A
epistemologia é o ramo da filosofia que estuda os métodos e a validade do
conhecimento científico, bem como, a sua importância e limites.
Teoria do conhecimento: ocupa-se dos problemas do conhecimento; reflexão
sobre a possibilidade do conhecimento e sua origem.
Lógica: ciência das formas válidas do pensamento. Estabelece as regras que
devem reger o pensamento humano, com vista a fixar e/ou observar o rigor e o método
para a coerência sistemática do pensamento.
Antropologia filosófica: reflexão que procura compreender a natureza do
homem. Analisa as dimensões e a especificidade do homem e o sentido da sua
existência.
Estética: estuda o Belo, a sua natureza e os fundamentos da arte enquanto
expressão do ser humano.
Ética: estuda os costumes do ser humano em comunidade e a acção humana no
que toca aos seus princípios. Se a moral, é o conjunto das normas de uma dada

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comunidade, cultura, sociedade…, a ética é, a reflexão sobre a constituição dessas


mesmas normas e sobre o sentido e a finalidade do agir humano.
Filosofia política: pesquisa a melhor forma de organização de uma comunidade
que se submete a uma mesma lei; com a finalidade de encontrar formas da realização
dos indivíduos que a essa pertencem.

1.5.1. Os diferentes períodos da filosofia.

Comummente, estuda-se a história da filosofia com a seguinte disposição


periódica:
 Filosofia antiga
Estuda-se, em filosofia antiga, o surgimento da filosofia, a origem do cosmos,
pelos gregos e, também por alguns filósofos romanos. Esta fase é dividida em quatro
etapas: cosmológica (Tales, Anaximandro, Anaxímes, Pitágoras, Melisso, Heráclito,
Zenão, Parmênides…), o antropológico (Sócrates, Sofistas e Platão), o sistemático
(Aristóteles) e o período ético ou helenístico (Epicuro, Zenão de Cítio, Diógenes de
Sínope, Pirro…). Merece também destaque nesta época, a filosofia romana (Séneca,
Plotino, Irineu, Cícero, Boaventura de Bagnoregio) que, constitui a ponte entre a
filosofia clássica e, a filosofia medieval marcada pela ascensão do cristianismo.
 Filosofia Medieval
A partir da queda do império Romano, no século V e, a expansão do
cristianismo até ao séc. XV. Identifica-se, em grande parte, com a Filosofia Cristã, que
se subdivide em: Patrística cujo expoente máximo era Agostinho de Hipona e, a
escolástica ou Tomismo (Tomás de Aquino).
Há também uma produção filosófica medieval que progressivamente
desvinculou-se do cristianismo (Gulherme de Ockham, Roger Bacon), assim como uma
produção filosófica árabe (Avicena, Averróis…).

 Filosofia moderna
Vai do final da idade média até fins do século XIX. Muitos vêm propondo a
divisão dessa etapa em duas partes: filosofia renascentista e moderna. A primeira é
fortemente marcada pela descoberta do acervo cultural aristotélico e platónico até então
desconhecido, teve como expoentes máximo Maquiavel, Montaigne, Giordano Bruno,
Tomás de Campanella e outros.

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A filosofia moderna propriamente dita é marcada pelo predomínio da ciência


sobre toda a realidade, por conta da explicação mecânica dos fenómenos e, pela
representação do universo de modo simbólico utilizando como substrato basilar a
linguagem matemática. Seus expoentes foram, Galileu, Descartes, Pascal, Hobbes,
Newton, Kepler e, outros.
 Filosofia contemporânea
Vai do século XIX até a época actual. Constituem principais correntes de etapa
filosofia, o idealismo alemão (Hegel), Materialismo dialéctico (Feuerbach e Marx),
positivismo (Comte), Fenomenologia (Husserl e Popper), existencialismo (Heidegger,
Martin Buber)…

1.6. Relação da filosofia com outros saberes

Filosofia e ciência manifestam o esforço do ser humano em aproximar-se da


verdade das coisas. A relação entre a filosofia e a ciência é, de índole histórica “a
filosofia foi e continuará a ser a mãe das ciências, por ser aquela que se ocupa da
informação de problemas, depois tomados pela ciência para os solucionar” (Mora,
1978, p. 38). A filosofia é “a mãe das ciências em absoluto, quer por conhecer
mediante o mais alto grau de abstracção, quer por se ocupar do ser geral, quer por
tratar dos supostos problemas da ciência” (Idem, p. 39). Ela examina certos enunciados
que a ciência pressupõe mas que não pertencem à linguagem da ciência.
Possuem caminhos semelhantes com pretensões diferentes. Entre os dois
saberes existem aproximações e diferenças, das quais nos ocuparemos a expor.
Ciência e filosofia são caminhos para o conhecimento. A ciência busca descobrir
as causas pelas quais as coisas são. Visa o conhecimento “certo” (seguro) pelas causas
causas próximas. A filosofia busca compreender as causas últimas das coisas: o que
uma coisa é, não do ponto de vista particular, mas em todo o seu ser.
Do ponto de vista material, a ciência e filosofia aplicam-se ao mesmo objecto “o
mundo e o homem”. Mas cada disciplina estuda este objecto comum sob um aspecto
que lhe é próprio.
A ciência investe na determinação das leis dos fenómenos. A filosofia quer
conhecer a natureza profunda das coisas, suas causas supremas e seus fins derradeiros:
visa propriamente, em todas as suas partes o conhecimento do que ultrapassa a

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experiência sensível ou os fenómenos, e do que só é acessível à razão. A filosofia é uma


“ciência universal enquanto tende a conhecer não tudo, como pensavam os antigos
gregos, mas os primeiros princípios de tudo” (Cataneo, 2011, p. 153).
Ciência e filosofia são caminhos autónomos para o conhecimento. Uma
explicação científica não é, uma explicação filosófica; nem uma explicação filosófica, é
uma explicação científica. O encadeamento dos fenómenos, como a ciência os visa
descobrir, deixa intacta a questão da natureza profunda das coisas, de seu valor e seu
fim. O conhecimento das essências, dos fins não nos saberia dar a ciência das ligações
fenomenais.
Embora a filosofia mereça, mais do que qualquer outra espécie de conhecimento,
o título de ciência, pois se preocupa com a investigação das causas primeiras e finais de
toda a realidade, apenas é ciência no sentido lato da palavra por várias razões. Com
efeito a filosofia e a ciência diferem; “pela profundidade da sua investigação, pela sua
crítica e reflexão, pelo seu grau de generalidade e de síntese, pela humanidade e
valorização, pela sua subjectividade” (Ribeiro e Da Silva, 1962, p. 23).
Por tanto, a filosofia fornece à ciência os princípios em que ela se baseia,
legitima-a, critica-a e defende-a; porém, assim como a filosofia fundamenta a ciência,
esta fornece à filosofia os dados a partir dos quais se eleva as explicações mais
profundas.
A filosofia, para se elevar aos princípios gerais do conhecimento, apoia-se nas
leis científicas, que coordena e generaliza. O filósofo pode construir hipóteses muito
engenhosas e deduzir irrepreensíveis conclusões, mas tudo isto não passa de uma mera
abstracção, se não se apoiar nas bases sólidas da ciência3.
A ciência é bem o átrio da filosofia, como esta é o tecto do edifício científico.

1.7. Mito e Filosofia

A capacidade do homem para interpretar e para reflectir, emergiu de um estádio


lógico elementar: esse estádio é denominado por consciência mítica4.

3
RIBEIRO, J. Bonifácio e Da SILVA, José. Compêndio de Filosofia. Lisboa, Cogito Ergo Sum,
10ªedição, 1962, pág. 23.
4
GUERRA, Maria Luisa e PINTO, Elvira Costa. Filosofia 12º Ano. Lisboa, editora livraria popular
Francisco Franco. 2010, p. 7.

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Inventaram-se seres sobrenaturais para explicar tudo: o germinar das sementes,


a sucessão da luz e das trevas, o amor e o ódio, o nascimento e a morte. É como se
as acções praticadas fossem apenas a repetição de outras sementeiras, de outros
combates, de outros casamentos realizados pelos seres divinos no princípio, no tempo
original.
Com efeito, pode se dizer que o mito, tal como é vivido pelas sociedades
arcaicas:
 Constitui a História dos actos de seres Sobrenaturais.
 Esta História é considerada absolutamente verdadeira (porque se refere a
realidades) e sagrada (porque é obra de Seres Sobrenaturais).
O mito reporta-se sempre a uma «criação», conta como é que qualquer coisa
começou a ser, como é que um comportamento, uma instituição, uma maneira de
trabalhar foram fundados. Por isso, os mitos são os paradigmas de todo o ato humano
significativo.
 Conhecendo-se o mito, conhece-se a «origem» das coisas. Não se trata de um
conhecimento «exterior», «abstracto» mas de um conhecimento que se «vive»
ritualmente.
A atitude mítica caracteriza-se pela indiferenciação, não distingue sujeito e
objecto, liga-se imediatamente à experiência sensível. Não analisa, define-se pela
globalização do saber. No mito o tempo é circular: os rios correm como correram no
início e as aves voam, sem se enganarem, desde que a primeira ave, de cada espécie.
Tudo cumpre o que já foi cumprido. Tudo repete o que já foi feito. Não há, no
entanto, nem novidade nem progresso. Não há antes nem depois.
Com efeito, realçar que, o discurso mítico representa o primeiro estádio do
desenvolvimento cognitivo do homem, se tivermos em conta o tipo de respostas que
davam a certos questionamentos.
Estes questionamentos que o homem foi se colocando ao longo do tempo
recebeu três tipos de respostas, tendo em conta o grau de inteleção que possuía:
respostas míticas, científicas, filosóficas. As respostas míticas são explicações que
podem contentar a fantasia, embora não sejam verdadeiras. Já as respostas
científicas procuram satisfazer à razão, mas são sempre explicações incompletas,
parciais, fragmentárias: dizem respeito apenas a alguns fenómenos, não abrangem

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toda a realidade. As respostas filosóficas propõem-se, ao contrário, como dissemos,


oferecer explicação completa de todas as coisas, do conjunto, todo.
O mito caracteriza-se sobretudo pelo modo como estas explicações são dadas, ou
seja, pelo tipo de discurso que constitui. A expressão “mito” deriva de dois verbos da
língua grega5: do verbo mytheyo (contar, narrar, falar alguma coisa para outros) e do
verbo mytheo (conversar, contar, anunciar, nomear, designar) significa um tipo
bastante especial de discurso, o discurso ficcional ou imaginário, sendo por vezes até
mesmo sinónimo de “ mentira”. Ele é, no entanto, uma representação fantástica da
realidade delineada deliberadamente pelo mecanismo mental, ou ainda, narração de
uma história sagrada, imaginária.
As lendas e narrativas míticas não são produto de um actor ou autores, mas parte
de uma tradição cultural e folclórica de um povo. Sua origem cronológica é
indeterminada, e sua transmissão é basicamente oral. O mito é, portanto, essencialmente
fruto de uma tradição cultural e não da elaboração de um determinado indivíduo.
Por ser parte de uma tradição cultural, o mito configura assim a própria visão de
mundo dos indivíduos, a sua maneira mesmo de vivenciar esta realidade; pressupondo a
adesão, a aceitação dos indivíduos, na medida em que constitui as formas de sua
experiência do real. O mito não se justifica não se fundamenta, portanto, nem se presta
ao questionamento, à crítica ou à correcção, depende somente da confiança de quem
escuta e de quem conta, é, portanto ausente de ciência.
Um dos elementos centrais do pensamento mítico e de sua forma de explicar a
realidade é o apelo ao sobrenatural, ao mistério, ao sagrado, à magia. As causas dos
fenómenos naturais, aquilo que acontece aos homens, tudo é governado por uma
realidade exterior ao mundo humano e natural, superior, misteriosa, divina, a qual só os
sacerdotes, os magos, os iniciados, são capazes de interpretar, ainda que parcialmente.
FUNÇÕES DO MITO
 Função religiosa: atribuía poderes, capacidade e vida a seres
inanimados do universo, buscando explicar o porquê das coisas,
acontecimentos, sua criação e recriação periódica.
 Função social/normativa: servia de regra para disciplinar as acções
dos indivíduos, indicava o modelo de norma moral ou social que se devia
seguir, indicando uma série de tabus, costumes e tradições de

5
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo, Ática, 2000, p. 32.

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cumprimento obrigatório para que se evitasse a desarmonia no seio do


grupo. Esta função respondia algumas questões de âmbito moral: que
devemos fazer? Que fins devemos procurar alcançar? Que objectivos
são lícitos e desejáveis? Quais são os indesejáveis?
 Função filosófica: consistia numa certa atitude de curiosidade para
soluções os distintos enigmas que afligiam a existência do género
humano.
Com o decorrer do tempo e o evoluir das sociedades, isto é, com a invenção da
escrita, o surgimento do excendentarismo, o surgimento da moeda para as trocas
comerciais, com o desenvolvimento da actividade agrícola, com o aparecimento do
relógio “gnómon”, facilitando a medição do tempo, sem prescindir ainda da invenção do
calendário; todos estes pressupostos foram tornando a vida mais dinâmica, aumentando
desde já, o encontro entre as mais diversas culturas civilizacionais.
No entanto, em virtude de tais transformações socioculturais e políticas, o saber
mítico foi perdendo espaço, dado a complexidade das acções desempenhadas pelo
género humano, dando o surgimento assim de um novo tipo de saber não mais fundado
crença, no dogma, e sim na razão veio denominar por Filosofia (VI a.C.).
Este tipo de consciência, busca a compreensão da realidade por meio de certos
princípios estabelecidos pela razão6, como, por exemplo: o de causa e efeito “todo efeito
deve ter uma causa”. Essa busca racional se caracteriza por pretender alcançar uma
adequação entre o pensamento e realidade, isto é, entre explicação e aquilo que se
procura explicar.

1.8. Dimensão discursiva do trabalho filosófico: a filosofia e a argumentação

O argumento – é um raciocínio mediante o qual se pretende provar ou refutar


uma tese, convencendo alguém da verdade ou falsidade da mesma.
O mesmo serve para: convencer, ser convencido, justificar, explicar e
demonstrar e, podem ser: demonstrativos ou persuasivos.
O argumento é demonstrativo quando a conclusão segue necessariamente as
premissas. E, torna-se persuasivo quando se persuadir a aceitar a conclusão a partir das
premissas.
6
A razão é entendida aqui, como sendo, a capacidade intelectual para pensar e exprimir-se
correctamente, para pensar e dizer as coisas tais como são (CHAUÍ, Marilena de Souza. Convite à
Filosofia, São Paulo, Editora Ática, 14ª Edição, 2012, p.79-81).

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Usa-se também a este respeito, o vocábulo argumentação.


A argumentação é compreendida como sendo, o processo que consiste em expôr
e justificar as ideias que constituem um dado discurso. Existem duas formas de
exposição e justificação de nossas ideias: directa e indirecta.
A argumentação torna-se directa quando pensamos e expusemos nossas ideias
directamente ao auditório. É indirecta quando examinamos primeiro para depois
efectuar a comunicação.
Para sua formação, devemos usar a palavra “signo” e a mesma estudada pelo
menos em três níveis diferentes: sintaxe, semântica e pragmática.
Sintaxe – é o estudo da relação dos signos entre si. Estuda os elementos
conectores que estruturam e sequenciam os enunciados.
Semântica – estuda a relação dos signos com seus significados.
Pragmática – estuda a relação dos signos com os seus falantes.

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2.1 – DIMENSÃO ANTROPOLÓGICA, CULTURAL E ÉTICA DO HOMEM

Antropologia é de origem grega anthropos: homem e logos: ciência, tratado. O


que significa a antropologia é o estudo sobre o homem. No entanto, este termo foi
utilizado pela primeira vez pelo arquéologo alemão Otto Casmann, em 1596, século
XVI.
Com efeito, realçar que, os estudos sobre homem remontam milénios e, nem
sempre a intenção do investigador se voltou a ele com a mesma abrangência, ele foi
estudado de acordo com as circunstâncias bem como as exigências que o tempo exercia
sobre este, daí a razão de existem várias antropologias, entre as quais se notabilizam as
seguintes: Antropologia filosófica, cultural e física.
A antropologia filosófica: busca compreender o homem em todas as dimensões:
sensível, transcendental…

A antropologia cultural: estuda o homem e, suas manifestações elementares,


reconstituir seu passado por meio do estudo de fósseis.

A antropologia física: busca compreender o homem do ponto de vista


psicossomático.

Dimensão cultural do homem

Partiremos precisando quer, sua definição etimológica bem como seu conceito
formal, no entanto, apresentaremos desde já sua etimologia. Do verbo latino colӗre, que
significa “cultivo” cuidado com as plantas, animais e tudo o que se relaciona com a
terra. A cultura no sentido etimológico, é o cultivo em seu processo de humanização:
atribuição de significados do mundo e a nós mesmos, significados esses que são
passados adiante e modificados de acordo com as necessidades de cada grupo ou
indivíduo.
Realçar que existem inúmeras definições sobre cultura, mas nos ateremos a uma
que é a primeira a surgir com EDWARD Tylor, mais duas adicionais; Tylor a define
como sendo um conjunto complexo inter-dependente e inter-actuante de
conhecimentos, crenças, leis, tradições, artes, hábitos e costumes de um determinado
conjunto de seres humanos constituídos em sociedade. Ela é definida também como
sendo, o conjunto de técnicas, costumes e valores que determinam a vida de

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qualquer sociedade; tudo aquilo que o homem constrói para a sua existência e
subsistência, ou ainda, o modus vivendi de uma comunidade.
Sobre à cultura foram dadas e se podem dar várias acepções e, geralmente
consideram-se três como sendo as principais, a saber: elitista, subjectiva e objectiva.
Elitista: sob este ponto de vista ela, corresponde a erudição ou seja, a um
conjunto de conhecimento que se tem sobre determinada área do saber científico,
religioso, filosófico ou ordinário.
Subjectivo sob este ponto de vista corresponde a educação entendida como o
processo que visa o desenvolvimento integral, harmonioso e progressivo da pessoa
humana até a sua plena maturidade. Podendo esta ser: formal e informal, teórica ou
prática, subdivida em educação intelectual, moral, física e social, tendo o Estado como
seu principal mentor.
Objectivo: está relacionado aos frutos adquiridos pelo homem, mediante o
exercício de suas faculdades intelectivas “status social…”.
A dimensão cultural do homem reside no facto de cultura não ser obra de Deus,
nem da natureza nem tão pouco do acaso, mas sim e nitidamente obra do homem, pois
é, fruto do seu género da sua fantasia, da sua criatividade da sua inteligência e vontade.
Deste modo, a cultura é tudo aquilo que o homem cria graças as faculdades
privilegiadas que possui. Assim, entre o homem e a cultura há uma relação tão profunda
que não só a cultura se digne como obra do homem mas também vale o contrário. O
homem define-se através da cultura, o homem é um animal cultural, porque é o único
animal capaz de fazer cultura.

Dimensão ética do homem

O termo provém do grego ӗthos significando: costumes, modo de ser,


propriedade de carácter. Define-se vulgarmente como a ciência dos costumes7, esta
definição, porém, não é exacta, porque a moral não é uma ciência positiva que descreve
apenas os costumes; não tem por objecto propor o modo como os homens viveram ou
vivem, assim não distinguiria da etnografia, mas regula-os e dirige-os, expondo o modo
como os homens devem viver ê a ciência dos costumes tais quais devem ser. Propõe-se
saber não como os homens vivem de facto, mas como devem viver.

7
RIBEIRO, Bonifácio. Compêndio de Filosofia. Lisboa, Livraria Popular de Francisco Franco, 10ªedição,
1962, pp457-58.

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Definiremos, pois, a ética como sendo a ciência que estabelece as leis ideais a
actividade livre do homem, às quais deve conformar as suas acções, para poder
viver conforme a sua natureza e atingir o seu fim último8.
A fundamentação da dimensão ética passa por dois princípios; o superior que
impera de maneira incondicional, este que leva o homem a fazer o bem porque deve ser
feito e; por referência a um bem superior que define o comportamento moral deste
homem, neste homem; faz o bem porque o bem é um meio com o qual ele realiza suas
pretensões.
Esta dimensão é expressa a maneira de ser de costumes, de comportamentos com
que manifestam as dimensões de identidade do homem que vive em função de si
próprio e na afirmação de si.
Por conseguinte, a dimensão ética, passa também facto de o homem deve ser
feliz realizando e aperfeiçoando o que esta de acordo com a sua natureza racional.

2.1.1 – NATUREZA E ESSÊNCIA DO HOMEM

Começaremos por definir cada termo contido em nosso tema, tomaremos como
ponto de partida, o conceito de homem. Realçar que apesar da simplicidade do termo,
ele é de difícil compreensão, com efeito, apresentaremos o conceito de homem segundo
John Locke, para Ele, homem é um organismo biológico, um corpo, pois, para Ele
nascemos homens e podemos nos tornar pessoas. Da bem sucedida combinação entre
o homem e a pessoa, surge o homem moral, aquele que reflecte sobre si (…) que é
capaz de perceber-se como responsável por suas acções passadas e de reflectir sobre
suas acções futuras.
Depois de esclarecer o conceito de homem, propor-nos-emos falar da sua
natureza e posteriormente da sua essência.
Ora, natureza será neste caso: o conjunto de manifestações com uma constância
na vida do homem. Desde já realçar que há uma unanimidade entre filósofos em situar a
natureza do homem na razão. No entanto, dizer que está razão da qual fizemos menção
não é aquela relacionada com certeza, causa, motivo ou lucidez, como temos vindo a
constatar.
Na chamada sociedade ocidental da qual fizemos parte, o termo razão possui
duas fontes: uma latina e ou grega. Estes dois substantivos provêm de dois verbos de

8
Idem, p458.

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significados praticamente idênticos. Do latim, razão: ratio provém do verbo Rēor que
significa: unir, contar, medir, separar, untar, reunir, juntar; e do grego logos: razão,
provém do verbo legein: reunir, untar, juntar, contar. Com efeito, quando reunimos,
contamos, juntamos, contamos, unimos, usamos palavras, mas usamo-las de forma
ordenada, isto é, aplicamos o raciocínio, consistindo em pensar com proporção e
medida.
Portanto, a razão da qual fizemos menção, é aquela faculdade intelectual que
permite o homem pensar e exprimir-se correctamente e dizer as coisas tais quais elas
são. É essa que constitui a natureza do homem.
A essência: é aquilo que lhe particulariza como ente no seu género próprio ou na
sua espécie, isto é, qualidade ou propriedade que faz parte de sua origem. E este
elemento é a alma. É imprescindível apresentar sua origem etimológica bem como o
tipo de alma que constitui a essência do homem, visto não ser o único a possuí-la.
O termo alma é originário de três fontes, a saber: grega, latina e hebraica. Do
latim alma: anima, significa vida; do grego alma: ânemos significando sopro, vento e
anaigma significando sem sangue e do hebraico alma: nefesh significando sopro da
vida.
Tendo em conta a complexidade do problema urgiu a necessidade de se
estabelecer a tipologia de almas tendo em conta a especificidade de cada ser,
encontramos em Aristóteles tal intento, tipificando-a em três, a saber: alma sensitiva,
alma vegetativa e alma intelectiva, segundo este e seus séquitos, é a partir desta última
(alma intelectiva) que nos tornamos completamente diferentes das espécies inferiores à
nossa, nela está contida a dimensão espiritual, transcendental, e tantas outras valências
exclusivas da espécie humana; pois sabemos que o homem é o único ser que consegue
antecipar os fenómenos, exemplo claro disso é a morte, falamos dela sem, no entanto a
experimentarmos.

2.2 – A Pessoa Humana

2.2.1 – Vínculos éticos da pessoa: Amor, Ódio, Indiferença e Sofrimento.

2.2. DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Ao se falar de pessoa humana, torna-se imprescindível conceptualizar os termos


pessoa bem como humanidade. Assim, podemos dizer que o termo pessoa de origem

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latina, grega, e etrusca, todas designando, máscara, face, rosto, aí, o que se oferece ao
olhar do outro, posterior conheceu uma evolução semântica, significando não mais uma
máscara e, sim o personagem que interpreta determinada peça teatral e que se encontra
por detrás da máscara. Afinal, nunca enxergamos a pessoa no seu verdadeiro ser, pois
não conseguimos ler os pensamentos e as pretensões de cada um, sabemo-lo, quando os
mesmos são expressos.
A raiz da palavra “dignidade” vem de dignus, que ressalta aquilo que possui
honra ou importância. Com São Tomás de Aquino, há o reconhecimento da dignidade
humana, qualidade inerente a todos os seres humanos, que nos separa dos demais seres
e objectos. São Tomás de Aquino defende o conceito de que a pessoa é uma substância
individual de natureza racional, centro da criação pelo fato ser imagem e semelhança de
Deus. Logo, o intelecto e a semelhança com Deus geram a dignidade que é inerente ao
homem, como espécie.
Para Kant, tudo tem um preço ou uma dignidade: aquilo que tem um preço é
substituível e tem equivalente; já aquilo que não admite equivalente, possui uma
dignidade. Assim, as coisas possuem preço; os indivíduos possuem dignidade. Nessa
linha, a dignidade da pessoa humana consiste que cada indivíduo é um fim em si
mesmo, com autonomia para se comportar de acordo com seu arbítrio, nunca um meio
ou instrumento para a consecução de resultados, não possuindo preço.
Consequentemente, o ser humano tem o direito de ser respeitado pelos demais e
também deve reciprocamente respeitá-los.
Assim, a dignidade humana consiste na qualidade intrínseca e distintiva de cada
ser humano, que o protege contra todo tratamento degradante e discriminação odiosa,
bem como assegura condições materiais mínimas de sobrevivência. Consiste em
atributo que todo indivíduo possui, inerente à sua condição humana, não importando
qualquer outra condição referente à nacionalidade, opção política, orientação sexual,
credo etc.
Tanto nos diplomas internacionais quanto nacionais, a dignidade humana é
inscrita como princípio geral ou fundamental, mas não como um direito autónomo. De
fato, a dignidade humana é uma categoria jurídica que, por estar na origem de todos os
direitos humanos, confere-lhes conteúdo ético. Ainda, a dignidade humana dá unidade
axiológica a um sistema jurídico, fornecendo um substrato material para que os direitos
possam florescer.

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Diferentemente do que ocorre com direitos como liberdade, igualdade, entre


outros, a dignidade humana não trata de um aspecto particular da existência, mas sim de
uma qualidade inerente a todo ser humano, sendo um valor que identifica o ser humano
como tal. Logo, o conceito de dignidade humana é polissémico e aberto, em permanente
processo de desenvolvimento e construção.
Há dois elementos que caracterizam a dignidade humana: o elemento positivo e
o elemento negativo. O elemento negativo consiste na proibição de se impor tratamento
ofensivo, degradante ou ainda discriminação odiosa a um ser humano. Por isso, a
própria Constituição dispõe que “Ninguém pode ser submetido a tortura, a trabalhos
forçados, nem a tratamentos ou penas cruéis, desumanas ou degradantes.” (CRA,
2010, art. 60º, p. 22).
Já o elemento positivo do conceito de dignidade humana consiste na defesa da
existência de condições materiais mínimas de sobrevivência a cada ser humano. Nesse
sentido, a Constituição estabelece que a nossa ordem económica tem “criar
progressivamente as condições necessárias para tornar efectivos os direitos
económicos, sociais e culturais dos cidadãos” (CRA, 2010, art. 21º, alínea c, p. 10).
Na mesma linha, há aqueles que defendem que o núcleo essencial do princípio
da dignidade da pessoa humana é composto pelo mínimo existencial, que consiste em
um “conjunto de prestações materiais mínimas sem as quais se poderá afirmar que o
indivíduo se encontra em situação de indignidade” tal como consta na alínea i do artigo
21º:
Efectuar investimentos estratégicos, massivos e permanentes no capital humano,
com destaque para o desenvolvimento integral das crianças e dos jovens, bem
como na educação, na saúde, na economia primária e secundária e noutros
sectores estruturantes para o desenvolvimento auto-sustentável (CRA, 2010,
art. 21º, p. 10)

Para compor esse mínimo existencial indispensável à promoção da dignidade


humana, é necessário, levar em consideração a implementação dos direitos à educação
básica, à saúde, à assistência social e acesso à justiça. Por sua vez, Maria Celina Bodin
de Moraes assinala que o conteúdo da dignidade humana pode ser composto por quatro
princípios: “o da igualdade, integridade física e psíquica, liberdade e solidariedade”
(Moraes, apud Ramos, 2013, p.70).
Existem dois deveres impostos ao Estado para proteger a dignidade humana. O
dever de respeito que consiste na imposição de limites à acção estatal, ou seja, é a

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dignidade um limite para a acção dos poderes públicos. Há também o dever de garantia,
que consiste no conjunto de acções de promoção da dignidade humana por meio do
fornecimento de condições materiais ideais para seu florescimento.

Características essências e distintas da pessoa humana.

 Singularidade;
 Interioridade;
 Unidade;
 Abertura;
 Projecção;
 Autonomia vs liberdade;
 Dignidade vs valor.

O homem é a união substancial entre alma e corpo, como já afirmara Aristóteles.


A alma espiritual e imortal é o princípio de unidade do ser humano, é aquilo pelo qual
este existe como um todo – enquanto pessoa. Esta concepção lembra-nos a ligação da
razão e vontade livre das faculdades corpóreas e sensíveis.
A pessoa, incluindo o corpo, está totalmente confiada a si própria, e é na unidade
da alma e do corpo que ela é o sujeito dos próprios actos morais. Mediante a sua
corporeidade o homem unifica em si os elementos do mundo material e, tal unificação
com mundo é feita estabelecendo uma relação com certos vínculos da vida prática.
Os aspectos da ética individual resumem-se nas formas fundamentais da co-
existência com os outros, entre eles destacam-se os seguintes:
Amor

O amor implica, em primeiro lugar, a afirmação do outro como sujeito, isto é,


como pessoa. Não só afirmar para promover: afirmação e promoção do outro na sua
originalidade e unicidade. Este amor de afirmação é necessariamente incondicionado
“ama-se o que o outro é e não o que ele tem”; é desinteressado “o amor não procura
vantagens pessoais, egoístas, o que seria instrumentalizar a pessoa”; finalmente, o amor
é fidelidade criadora que procura realizar e promover o outro de acordo com o seu
projecto existencial próprio e original. É evidente que esta fidelidade se deve realizar
dentro do quadro de valores.

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Ódio

Segundo Santo Agostinho, da inveja nasce o ódio, a maledicência, calúnia,


alegria consolada pelo mal do próximo e o desgosto consolado pela sua propriedade.
Muitas vezes o ódio nasce do egoísmo dos homens.

Indiferença

Não retribuir ou corresponder a algo é sinal de indiferença, Ex: falta de


sensibilidade pela dor do outro; não podemos ser indiferente em defesa legítima da
pessoa e da sociedade, como é o caso de tanta violência que atinge a nossa sociedade
nos dias de hoje, o esforço do estado em reprimir a difusão de comportamentos que
lesam os direitos humanos e as regras fundamentais da convivência civil, correspondem
a uma urgência de preservar o bem comum.

Sofrimento

A doença e o sofrimento estiveram sempre entre os problemas mais graves que


afligem a vida humana. Na doença o homem experimenta a sua incapacidade, os limites
e a sua finitude. Qualquer enfermidade pode fazer-nos antever. A doença pode levar a
angústia, ao fechar-se em si mesmo e até mesmo ao desespero e a revolta contra a
família, mas também pode tornar uma pessoa mais madura, ajudando-a a discernir na
sua vida. Muitas vezes a doença leva a busca de Deus.
Por sofrimento podemos entender ainda a aflição que qualquer um sente em
alcançar alguma coisa.

2.3. O homem como produto e produtor da cultura

O processo de socialização se inicia por meio da acção exercida pela


comunidade sobre os homens. O mundo cultural é, dessa forma, um sistema de
significados já estabelecidos por outros, de modo que, ao nascer, a criança encontra um
mundo de valores dados, onde ela se situa.
É possível dizer então que, a condição humana não resulta da realização
hipotética de instintos, mas da assimilação de modelos sociais: o ser do homem se faz
mediado pela cultura. Por isso, a condição humana não apresenta características
universais e eternas, pois variam as maneiras pelas quais os homens respondem

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socialmente aos desafios, a fim de realizar sua existência, sempre historicamente


situada.
A natureza modificada pelo trabalho humano não é apenas a do mundo exterior,
mas também a da individualidade humana, pois nesse processo o homem se auto
produz, isto é, faz a si mesmo homem. O auto produzir-se humano se completa em dois
movimentos contraditórios e inseparáveis: por um lado, a sociedade exerce sobre o
indivíduo um efeito plasmador, a partir do qual é construída uma determinada visão de
mundo; por outro, cada um elabora e interpreta a herança recebida na sua perspectiva
pessoa.
O homem é, portanto, um produto da natureza e da cultura e ao mesmo tempo,
um transformador da natureza e produtor da cultura. Criatura e criador do mundo em
que vive. Um ser capaz de, em muitos aspectos dominar a natureza mesmo fazendo
parte dela. Capaz não só de criar coisas extraordinárias, mas também de destruir de
modo devastador.

2.3.1. A Cultura e o Homem

O homem “culto” seria aquele que tem instrução, teve acesso à produção
intelectual da civilização a que pertence. O conceito cultura compreende tudo aquilo
que o homem produz para construir sua existência.
Ela exprime as mais variadas formas pelas quais os homens estabelecem
relações entre si e com a natureza: como constroem abrigos para se proteger das
intempéries, como organizam suas leis, costumes e punições, como se alimentam,
casam e têm filhos, como concebem o sagrado e como se comportam diante da morte.
O contacto do homem com a natureza, com outros homens e consigo mesmo
intermediado pelos símbolos, isto é, - arbitrários e convencionais – por meio dos quais o
homem representa a si próprio e o mundo.
Nesse sentido pode se dizer que a cultura é o conjunto de símbolos elaborados
por um povo em determinado tempo e lugar, entretanto, estes símbolos resultam da
infinidade de representar o mundo. O animal vive em harmonia coma natureza. Isso
significa que sua actividade é determinada por condições biológicas que lhe permitem
adaptar-se ao meio em que vive, não sendo livre para agir em discrepância com a sua
própria natureza, razão pela qual o comportamento de cada espécie animal é sempre
idêntico.

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A diferença do homem com o animal consiste no facto de este não dominar o


tempo, porque seu acto se esgota no momento em que o executa. Mesmo quando repete
com maior rapidez comportamentos aprendidos anteriormente, o uso do instrumento
não remete para o passado nem para o futuro.
Totalmente diversa é a acção do homem sobre a natureza e sobre si mesmo. Ao
reproduzir técnicas usadas por outros homens e inventar outras novas, a acção humana
se torna fonte de ideias e por isso uma experiência propriamente dita. A noção de
experiência não se separa do carácter abstracto da inteligência humana, pelo qual pode
ser superada a vivência do aqui e agora, passando a existir no tempo.
A transformação que o homem faz na natureza chama-se trabalho. O trabalho é
a acção transformadora dirigida por finalidades conscientes. A cultura é, portanto, o
que resulta do trabalho humano: a transformação realizada pelos instrumentos, as
ideias que tornam possível essa transformação e os produtos dela resultante.
Portanto, a acção humana transformadora não é solitária, mas social, já que os
homens, ao se relacionarem para produzir sua própria existência, desenvolvem
condutas, a fim de atender às necessidades.

Elementos fundamentais da cultura

Os elementos fundamentais da cultura são quatro: a língua, os costumes, as


técnicas e os valores. Com base em tais elementos, cada povo desenvolve todos os
outros aspectos que contribuem para conferir-lhe sua forma específica: a arte, a
filosofia, a religião, a ciência, a literatura, a política etc.
O primeiro elemento fundamental é a língua. Onde não há uma língua, não pode
haver uma sociedade, não pode haver uma nação e, portanto, não pode desenvolver-se
nenhuma cultura.
Além da língua, outro elemento fundamental da cultura é o costume. Este pode
referir-se a tudo: o alimento, o vestuário, o caminhar, o gesticular, a educação das
crianças, a atenção aos velhos, as crenças religiosas (…), os costumes referem-se ao
comportamento em geral.
Além dos hábitos comportamentais, todo grupo humano desenvolve técnicas de
trabalho que lhes são próprias. Estas correspondem às exigências do ambiente, à
capacidade, a criatividade e ao nível de civilização de um povo.

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Outro elemento constitutivo fundamental de toda a cultura é os valores. Toda


cultura se caracteriza por apreciações especiais em ordem a determinadas acções,
costumes, técnicas, coisas. Trata-se de acções que se revestem de extraordinária
importância para o grupo social, que os toma como critérios, normas e ideias. Todas
estas coisas juntas constituem a esfera dos valores.

Principais características da cultura.

Vários estudiosos concordam com os elementos apontados por Robert


Braidwood9, caracterizando a cultura como10:
 Adquirida pela aprendizagem e, não herdada pelos instintos;
 Transmitida de geração a geração, através da linguagem, nas diferentes
sociedades;
 Criação exclusiva dos seres humanos, incluindo a produção material e não
material.
 Múltipla e variável, no tempo e no espaço, de sociedade para sociedade.

2.4. O homem perante a situação de limite: morte

As situações de limite são aquelas em que sujeito em questão muda


absolutamente de dimensão social, psicológica, cultural ou ainda pode conhecer seu fim.
Entre elas salientam: as doenças, os acidentes, a morte.

Conceito de morte

Em sentido geral a morte é definida como: “cessação do processo vital num


organismo vivo”. Na linguagem da biologia molecular, a morte é definida como “a
dissolução da estrutura molecular necessária para a existência do fenómeno da
vida”. Do ponto de vista filosófico ela é compreendida como sendo, a separação da
alma e do corpo.
Costuma-se a distinguir dois tipos de morte: clínica e absoluta. A morte clínica
é o morrer graças ao qual se verifica no homem a cessação das funções essenciais do
corpo. Ao contrário, a morte absoluta é a separação definitiva da alma e dos corpos.

9
Arqueólogo norte-americano.
10
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia. São Paulo, Saraiva, 2006, p. 18.

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Perante a morte as atitudes são diferenciadas, em função da cultura, lugar,


comportamento pessoal e impacto do acontecimento e da transmissão da notícia.
Segundo o psiquiatra Klubler-Ross, existem 5 etapas do morrer:
 Negação;
 Ira;
 Negociação;
 Depressão;
 Aceitação.
Também o mesmo apresenta os padrões de pesar “formas com que lidamos com
o fenómeno morte”
 Choque e descrença;
 Preocupação com a memória do falecido;
 Resolução;
 Uma mudança de dimensão.
A morte, embora seja, um facto biológico, tem implicações sociais, culturais,
históricos, religiosos, legais, psicológico.

Caracterização da morte
A experiência ordinária e a fenomenologia existencial estão concordes em
reconhecer no fenómeno da morte as características seguintes: individualidade,
universalidade, inelutabilidade, inexorabilidade, iminência e temibilidade.
 Individualidade: a morte é acontecimento que cada um deve enfrentar por conta
própria. Ninguém pode assumir a morte de outro. Cada homem deve sempre
assumir por si a própria morte11.
 Universalidade: todos caem sob a foice da morte: jovens, e velhos, sábios e
ignorantes, ateus e crentes, ricos e pobres, brancos e negros, homens e mulheres,
sãos e doentes.
 Inelutabilidade: contra a morte não há o que fazer. Nem o ouro, nem a espada,
nem a astúcia a podem derrotar. Contra a morte, antes ou depois, mesmo o
melhor jogador deve dar-se por vencido, portanto diante dela, devemos somente
aceitá-la se quisermos ter uma morte tranquila.

11
M. Heidegger, Essere e tempo, Fratelli Boca, Milão, 1953, p.253.

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 Iminência: os homens teimam em viver como se a morte não existisse, ou fosse


enormemente longínqua ou não lhes dissesse respeito. Ela é uma realidade
sempre presente na vida do homem.
 Inexorabilidade: diante da morte toda a oração, súplica, invocação é vã.
 Temibilidade: por causa das características precedentes, a morte parece
assustadora. Ela suscita, horror, aversão, angústia no homem.

1.5. Problemática dos valores:

1.5.1. Definição de valor.

Em toda acção humana, o ser humano exprime o modo como se relaciona com o
mundo, podendo preferir ou preterir algo. A acção humana está estritamente ligada aos
valores, explícita ou implicitamente. Os valores dão ao sujeito, o motivo para agir. É
mediante os valores que hierarquizamos os nossos actos, considerando uns preferíveis a
outros.
Os valores: “são critérios segundo os quais damos ou não importância às
coisas; os valores, são razões que justificam ou motivam as nossas acções, tornando-as
preferíveis às outras” (Geque & Biriate, 2019, p. 50).
Juízo de facto: é aquele em que se descreve a realidade objectiva, neutra e
impessoal. Estes juízos podem ser verificáveis e podem verdadeiros ou falsos.
Juízos de valor: é uma manifestação de preferência e apreciação sobre a
realidade e, é fruto de uma interpretação parcial e subjectiva feita com base valores. Os
juízos de valor são relativos, pois variam de pessoa para pessoa e, por isso, estão
sujeitos a discussão.
É no contexto dos juízos de valor que enquadramos a acção humana, pois o juízo
de valor é já o resultado do que se designa por valores.
Formação de valores.
Para a formação de valores deve se ter em conta três pressupostos basilares, a
saber: “A vivência com o objecto ou com o ser; a ideia que se tem do objecto o do ser;
a qualidade em si a ser atribuída ao objecto ou ser” (Rodrigues e Sameiro, 1993,
p.108)

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3.5.2 Classificação dos valores.

Os valores não são coisas, nem simples ideias que adquirimos, mas conceitos
que traduzem as nossas preferências. O valor te sempre como referencia a avaliação do
sujeito que o enuncia, não se trata de características e qualidades próprias de algo,
a1guém ou acontecimentos (cor, tamanho, duração, forma, altura, etc.), mas qualidades
e atributos que são atribuídos pelo sujeito a algo, alguém ou a um acontecimento, São
importantes para o agir humano na medida em que constituem os critérios e padrões que
orientam a acção e lhe dão sentido.
Existe uma enorme diversidade de valores, que podemos agrupar em espirituais
e materiais:
1. Valores espirituais:
 Valores religiosos: aqueles que dizem respeito a relação do Homem com a
transcendência: o sagrado ou divino, pureza, santidade, perfeição, castidade, etc.
 Valores estéticos: os valores de expressão: beleza, harmonia, graciosidade,
elegância, feio, sublime, trágico, etc.
 Valores éticos: aqueles que se referem As normas ou critérios de conduta que
afectam todas as áreas da nossa actividade: lealdade, verdade, solidariedade,
honestidade, bem, bondade, altruísmo, amizade, liberdade, etc.
 Valores políticos: aqueles que, dizem respeito ao Homem na qualidade de
cidadão: justiça, igualdade, imparcialidade, cidadania, liberdade de expressão ou
de associação ou de culto, etc.
2. Valores materiais ou sensíveis
 Valores do agradável e do prazer: aqueles que exprimem as sensações de prazer
e de satisfação, assim como as suas fontes: comida, bebida, vestuário, etc.
 Valores vitais: aqueles que se referem ao estado físico: a saúde, força, resistência
física, vigor e robustez, êxito, felicidade, amor, etc.
 Valores de utilidade ou económicos: aqueles que se referem a habitação,
dinheiro, meios de comunicação, electrodomésticos, vestuário, alimentos,
automóveis, máquinas, etc.
2.5.2.1. Hierarquia de valores

A hierarquização é a propriedade que determinados valores têm de se


sobreporem aos outros. Diante a esta realidade, não se atribuem os valores a mesma

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importância. Aquando da tomada de qualquer decisão, cada um hierarquiza-os de modo


bastante diverso.
No campo do valor, como no da bondade, da beleza e da verdade, dão-se
degraus e, portanto, existe uma hierarquia, que apresenta no vértice o valor máximo,
com dignidade plena, absoluta, total, perene; ao passo que, na base, isto é, nos degraus
mais baixos apresenta valores com pouca dignidade: uma dignidade caduca, relativa,
condicionada, parcial e provisória.
O grau do valor corresponde ao do ser. Quanto mais elevado é o grau do ser que
uma coisa possui, tanto maior é o seu valor. Os valores, não sendo entidades abstractas,
mas dimensões da realidade, têm vital e capital importância para o homem na relação
consigo próprio e com o meio.
Max Scheller, um dos mais importantes filósofos no âmbito da axiologia, legou-
nos cinco critérios que se revelam imprescindíveis no acto de determinar a altura de
qualquer valor:
 Em primeiro lugar, os valores são tanto mais altos quanto maior for a sua
duração. Vale mais o que perdura.
 Em segundo lugar, os valores são tanto mais altos quanto menos
divisíveis forem.
 Em terceiro lugar, o valor, que serve de fundamento a outros é mais alto
que os que se fundam neles.
 Em quarto lugar, os valores são tanto mais altos quanto mais profunda é
a satisfação que a sua realização produz ao sujeito.
 Em quinto lugar, os valores são relativos. Existem valores que só podem
ser praticados por determinados seres.
Portanto, uma realidade ocupa um degrau tanto mais elevado na hierarquia dos
valores, quanto maior é o seu contributo em tal sentido e, tanto mais baixo quanto
menor é o seu contributo.

2.5.2.2. Polaridade dos valores

A polaridade corresponde a uma característica segundo a qual em cada valor


tem um contra-valor/oposto, o contra-valor pode ser positivo ou negativo. Nessa
perspectiva os valores são classificados considerando o seu oposto.

Elaborado por: Olívio Santana Página 29


11ª Classe Filosofia

Os valores tendem a ser organizados tendo em conta suas oposições. Prefere-se e


opõe-se a bondade à maldade, a verdade à mentira, a beleza à fealdade, justiça à
injustiça.

2.5.2.2.1. Historicidade dos valores

A selecção, a hierarquização e o próprio conteúdo dos valores sofrem


condicionalismos e influência da época em que são enunciados.

Objectividade e subjectividade dos valores

O valor, embora seja, um ente imaterial possui dois pólos, que o completam na
sua relação com o homem e o meio em que ele actua; no entanto, o primeiro pólo em
que o valor se apresenta ao género humano é o da objectividade; ou seja, o valor apesar
de ser algo que dependa do homem para sua expressão, é algo que não depende do
homem para existir, ele existe por si e para si.
Objectividade – corresponde a tudo que é externo à consciência do homem e,
que resulta de uma observação imparcial. Para esta concepção, os valores são objectivos
e, por isso, não dependem das preferências individuais, são absolutos e autónomos. Têm
validade universal.
Esta concepção vem sendo defendida desde a antiguidade clássica até aos nossos
dias, seus expoentes são: Platão, Descartes, Kant e Marx Scheller.
A subjectividade é uma concepção que contrapõe a doutrina da objectividade;
sustentando que os valores são meras criações individuais e, que podem variar em
virtude dos interesses de seu criador.
A subjectividade – corresponde ao mundo interno do ser humano composto por
emoções, sentimentos e pensamento. Encontrou inúmeros defensores desde a
antiguidade clássica até aos nossos dias, entre eles destacam-se: Sofistas, empiristas,
Nietzsche e Sartre.
A subjectividade de um valor é compreendida em duas dimensões:
 Características positivas: defende que a qualidade atribuída ao objecto ou
acontecimento deva ser positiva. Esta característica agrupa consigo todas as
qualidades racionais do sentido positivo que devem ser atribuídas aos objectos,

Elaborado por: Olívio Santana Página 30


11ª Classe Filosofia

independentemente da área desse objecto – a verdade, o bem, a paz, a alegria, o


belo, agradável, o útil, etc.
 Características negativas: determinam as qualidades do tipo desagradável
(negativo) que qualquer homem atribui às coisas: mentira, falsidade, inútil, etc.12

2.5.4. Crise de valores no mundo contemporâneo.

O relativismo vivido hoje faz com que não se tenham critérios seguros e claros
que facilite a distinção entre o bem e o mal, a beldade da fealdade, o certo e o errado,
tudo depende da concepção que cada um tem das coisas, do outro e da realidade. Esses
pressupostos levou a sociedade hodierna a uma grande crise de valores. Tudo agora é
líquido, desde o amor até as leis, muda a cada instante conforme o desejo do homem.
Chama-se crise a um momento de ruptura no funcionamento de um sistema, a
uma mudança qualitativa em sentido positivo ou negativo, a uma virada de improviso,
algumas vezes até violenta e não prevista no módulo normal segundo o qual se
desenvolveu as interacções dentro do sistema em exame (BOBBIO, Norberto, 1998, p.
313).
Quando nos referimos a crise, queremos entendê-la no sentido de um momento
de confusão e de dificuldade que caracteriza os períodos de transição nos quais o
“velho” ainda não morreu e o “novo” não se apresenta com clareza. Mesmo porque o
novo resultará do que os homens poderão construir a partir dos desafios a serem
enfrentados.
As crises são habitualmente caracterizadas por três elementos. Antes de tudo,
pelo “carácter de subitaneidade e por vezes de imprevisibilidade; em segundo lugar,
pela duração normalmente limitada, finalmente pela incidência no funcionamento do
sistema” (Idem, p. 313).
A compreensão de uma crise se funda sobre a análise de três fases do estado de
sistema:
 Fase precedente ao momento em que se inicia a crise.
 Fase da crise propriamente dita.
 Fase depois que a crise passou e o sistema tomou um certo “módulo” de
funcionamento que não se identifica mais com o que precedeu a crise.

12
Nesta perspectiva, o valor do objecto será positivo quando agrada aos sentidos e ao espírito e, será
negativo quando não causa em nosso espírito e em nossos órgãos de sentidos uma harmonia.

Elaborado por: Olívio Santana Página 31


11ª Classe Filosofia

Três são os pressupostos basilares reconhecidos como eventuais causas da


crise de valores no mundo contemporâneo:

 A crítica sistemática dos valores tradicionais, por parte dos seguintes filósofos:
Karl Marx13, Nietzsche14 e Freud15.
 Crise nos modelos16 e relações familiares17.
 Profundas alterações económicas18, científicas e tecnológicas19 que a nossa
sociedade moderna tem conhecido.

2.5.5.Resgate dos valores cívicos e morais no mundo contemporâneo

Não há sociedade que viva sem as suas instituições. As distintas instituições


sociais têm como missão garantir a execução de todos os pressupostos morais para o
bom funcionamento da sociedade. Caberá a cada instituição dar o melhor de si, para que
sejam reconquistados todos aqueles valores perdidos que tanta falta fazem na
estabilidade de uma vida moral.
Para o efeito, faz-se necessário empoderar as famílias angolanas para que,
activamente participem neste processo de resgate dos valores morais e cívicos e, a ela
devem unir-se as igrejas e ONG´S. Os pais, na geração e gestão dos filhos possuem
dupla função: individual20 e social21. Os pais têm a obrigação de construir uma ponte
entre os filhos e a sociedade.
A modernidade, além dos benefícios que a nós trouxe, fez-se acompanhar de
inúmeras ambiguidades, pois grande parte da juventude deixou de ter em si a noção do
certo e do errado. Tudo é líquido, o consumismo tomou conta de nossas vidas, as
impressões valem mais que a essência.

13
Os valores dominantes de uma sociedade são aqueles que velam pelos interesses da classe dominante.
14
Não existem valores absolutos.
15
Os valores morais constituem um mecanismo repressivo imposto pelos pais aos filhos.
16
Marcado pelo desaparecimento do modelo patriarcal de família e, o consequente aparecimento do
modelo infantocrato de família e a família hotel.
17
Prostituição, gravidez precoces, filhos nos contentores de lixo, promiscuidade entre professores e
alunas na escola, corrupção, incumprimento do normativo, alcoolismo.
18
Flutuação do câmbio gerando empobrecimento das famílias, endividamento dos Estados, má gestão do
erário público.
19
Uso inadequado das mass-média.
20
Funda-se na educação dos filhos, protecção, limpeza e adestramento (ENKVIST, Inger. Repensar a
educação (2006). Trad. Daniela Trindade, São Caetano do Sul, Bunker Editora, p. 15).
21
Consiste em integrar os filhos nos distintos grupos sociais de forma positiva (Idem, p.16)

Elaborado por: Olívio Santana Página 32


11ª Classe Filosofia

Para voltar a ter um paradigma normativo que facilite o convívio sadio dos
homens na sociedade contemporânea a todos os níveis, é imprescindível que tenhamos
em conta, três acções fundamentais, a saber:
 Acções de curto prazo: as boas maneiras dizer obrigado, por favor, licença,
desculpa, etc.
 Acções de médio prazo: intervenção das associações cívicas e culturais,
congregações religiosas, etc.
 Acções de longo: intervenção dos órgãos estatais, Ministério da educação, etc.

2.5.6. DIMENSÃO ÉTICO – POLÍTICA DOS VALORES:

2.5.7 Normas e valores morais

A vida humana em sociedade seria um verdadeiro caos se não houvesse um


vasto e diverso conjunto de normas que regulasse o comportamento humano. Em plano
de destaque situam-se as normas e os valores morais.
Norma moral: é uma regra de comportamento que determina o que devemos ou
não fazer para que a nossa acção seja moralmente boa ou valiosa. Elas não se impõem,
são absolutas e incondicionais, não retiram a liberdade, tão pouco a responsabilidade ao
agente. São princípios orientadores da acção humana.
Cumprindo-as ou não, elas continuam existindo na medida em que o homem é
um ser em sociedade e nas suas decisões é impelido a fazer o bem e não o mal. Embora,
nalgumas vezes as desrespeite, ele reconhece sua importância.
Valores morais: correspondem a todos os preceitos tidos como certos ou
errados por determinada pessoa na sociedade.
Os valores morais começam a ser transmitidos para as pessoas nos seus
primeiros anos de vida, por intermédio convívio familiar. A medida que o tempo for
passando, o indivíduo será chamado a aperfeiçoar todos aspectos positivos recebidos no
seio familiar. Estes valores não são universais, eles conhecem significativas alterações
de uma sociedade para outra e, até mesmo de um grupo social para outro.

2.6. Origem e natureza da consciência moral: liberdade e responsabilidade.

As normas morais são muito gerais e a moral é uma ciência prática e não teórica.
É, por conseguinte, necessária constantemente a aplicação dessas normas aos casos
concretos.

Elaborado por: Olívio Santana Página 33


11ª Classe Filosofia

Esta aplicação é feita pela consciência moral, que a faz por meio de um
silogismo, cuja premissa maior é a norma moral, e a menor enuncia o caso concreto,
indicando que esta ou aquela acção ou omissão está compreendida ou não na norma
estabelecida, e, finalmente, a conclusão pronuncia um juízo prático moral a respeito do
caso em questão, juízo esse que constitui o ditame ou sentença da razão: isto deve fazer-
se ou evitar-se.
O termo “consciência” é de origem latina «cum-scire», significando o saber de
si; indica aquele tipo de saber pelo qual, duma certa maneira, o homem, “se acompanha
a si próprio”22.
A consciência pode tomar-se em três sentidos: biológico, psicológico e moral.
Em sentido biológico, a consciência significa a possibilidade que todo o ser vivo
tem de se adaptar ao meio em que vive.
Em sentido psicológico, a consciência é o conhecimento intuitivo e imediato dos
fenómenos psíquicos ou a intuição que o espírito tem dos seus actos e das suas afecções
A consciência moral é a propriedade que o espírito tem de julgar o bem e o mal
das nossas acções, o seu valor moral, pela comparação que estabelece entre elas e as
normas que devemos seguir. Ou, o juiz do valor moral das nossas actividades; avalia os
nossos actos, atribuindo-lhes mérito ou demérito; julga-os sob o ponto de vista de bem
ou de mal; indica o dever a seguir. É uma forma de conhecimento que o homem não
pode não experimentar quando deve decidir fazer algo, revestidas de um tríplice
carácter: carácter imperativo, indicativo e judicativo.
 Carácter imperativo: faz o bem, evita o mal; não faças ao outro o que não queres
que te façam a ti; faz ao outro o que desejas que te façam a ti; faz isto e não
faças aquilo...
 Carácter indicativo: aponta caminhos e fins seguir e a perseguir, dizendo-nos os
bons e honestos, os maus e desonestos.
 Carácter judicativo: fizeste bem, fizeste mal...
Ela é um fenómeno tipicamente humano, é uma realidade muito complexa. Para
os filósofos antigos, a consciência moral era algo inato, que pertencia ao próprio
homem. Os filósofos modernos e contemporâneos, porém defendem a tese de que a
consciência moral é algo que o homem adquire estando em sociedade, através do

22
COSTA, Paulo Dalla, ofmcap. Teologia Moral Fundamental. Luanda, Arquidiocese de Luanda, 1998.
p. 157.

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processo de socialização. Para estes, trata-se de uma aprendizagem que poderá ser feita
com a família, grupo social, escola, igreja, etc.
Relativamente a sua formação e desenvolvimento, notabilizam dois autores: Jean
Piaget e Lawrence Kohlberg, cada um apresenta uma explicativa sobre o processo
evolutivo da consciência moral. Para Piaget, a moralidade se desenvolve à medida que a
inteligência humana se vai desenvolvendo, seguindo um processo delineado por três
etapas fundamentais:

Moral de obrigação e/ou heteronomia (entre os 2 e os 6 anos) – nesta etapa a


criança vive uma atitude unilateral de respeito absoluto para com os mais velhos e as
normas são totalmente exteriores a si.

Moral da solidariedade (7 e os 11 anos) – aqui o unilateral é substituído pelo


respeito mútuo e começa a desenvolver-se a noção de igualdade entre todos e as normas
de conduta humana são aplicadas de forma rigorosa.

Moral de equidade/autonomia (12-) – marcado pelo altruísmo, o interesse pelo


outro e a compaixão, e a moral torna-se autónoma.

Paralelamente, Lawrence Kohlberg considera que a consciência moral se forma


num processo de conhecimento que decorre de fases de aprendizagem social. Na sua
opinião, há, três etapas de desenvolvimento moral, todas elas baseadas na noção que
cada um tem de justiça. Segundo ele, cada pessoa estará num determinado estádio de
desenvolvimento moral de acordo com as suas respostas a dilemas morais.
Nível pré convencional e define que as pessoas respeitam as normas sociais
mas, receiam o castigo se não as cumprirem esperam uma recompensa pelo seu
cumprimento.
Nível convencional - determina que as pessoas respeitam as normas sociais
porque consideram importante que cada um desempenhe seu papel numa sociedade
moralmente organizada.
Nível pós-convencional - estabelece que as pessoas se preocupam com um juízo
autónomo e com o estabelecimento de princípios morais universais.

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11ª Classe Filosofia

Estrutura da consciência moral


São três os elementos influentes na estruturação da consciência moral, a saber:
complexidade, evolução e dialéctica.
 Complexidade: é complexa porque a sua própria natureza é externa e interna
não facilita a compreensão exacta dos diferentes modos de actuação das
pessoas.
 Evolutiva: os actos estão em constante evolução, o que não permite ter uma
conduta única em todos os tempos de uma comunidade porque amadurecem ao
longo do tempo.
 Dialéctica: os elementos interagem.
A voz da consciência é a última norma do agir humano, isto é, aquilo que no
momento concreto da acção nos deve levar a comportar-nos desta ou daquela maneira.
Daqui a necessidade e a obrigação de formá-la rectamente segundo critérios
objectivos de verdade e de bem, pois o homem está moralmente obrigado a procurar a
verdade e agir de acordo com ela.
Ela dirige as acções do homem em virtude da presença em seu seio de dois
fenómenos: intelectuais ou juízos morais e afectivos ou sentimentos morais.
Os juízos morais: são formados antes e depois do acto. Antes a consciência
aprecia-o sob o ponto de vista de bem e de mal, pronunciando um «sim» ou um «veto».
Consumando o acto, diz-nos se foi bom ou mau e, por isso, se é digno de mérito ou
castigo. Durante a realização do acto também a consciência nos mostra se o acto está a
ser bem ou mal executado.
Estes juízos morais são acompanhados de sentimentos, que são o remorso ou dor
moral pelo mal feito, a satisfação íntima ou contentamento pelo dever cumprido e o
arrependimento, que é a resolução de reparar a falta cometida ou de não tornar a cair
nela.

Liberdade

O tema da liberdade surge em filosofia a partir da relação que há entre as


realidades: corpórea e espiritual. Segundo o modo como concebemos a relação corpo -
espírito ou matéria - consciência, assim nós poderemos pronunciar sobre um problema
crucial e de várias consequências.

Elaborado por: Olívio Santana Página 36


11ª Classe Filosofia

Ora, se a consciência não passa de simples reflexo da matéria submetida a lei do


determinismo que exclui a liberdade, então palavra liberdade não tem sentido.
Pelo contrário, se a consciência submetida a lei do determinismo for concedida
como a capacidade de escolha entre várias opções possíveis, então a liberdade passa a
ter um significado autêntico e com ela a responsabilidade humana “independência do
espírito em relação a matéria”. A liberdade só é liberdade enquanto realidade
espiritual.
No sentido amplo, liberdade significa o poder de agir por si próprio sem
qualquer coação. A sua existência é garantida pelos seguintes pressupostos:
“autonomia do sujeito face às suas condicionantes, consciência da acção e escolhas
fundamentadas em valores” (Geque & Biriate, 2019, p. 55).
E porque as forças que eventualmente nos impedem de agir podem ser externas
ou internas, então temos dois tipos de liberdades: liberdade de execução e liberdade de
decisão.
Liberdade de execução “externa”: consiste no poder de agir ou não agir sem ser
coagido ou impedido por forças exteriores. Essa liberdade pode assumir formas
diferentes:
 Liberdade física: é o poder que a pessoa tem de dispor do seu próprio corpo,
plenamente e sem qualquer coação.
Exemplo: mudo, cego, surdo, paralítico, doente…
 Liberdade civil: é o poder de agir dentro dos limites estabelecidos pela lei em
vigor, ou, o direito de fazer o que a lei não proíbe.
Exemplo: escolher uma profissão, comprar ou vender, constituir uma família.
 Liberdade política: é o poder ou direito que as nações têm em constituir
governos próprios e para os indivíduos em participar directa ou indirectamente
na direcção do estado ainda para os indivíduos poder exprimir publicamente as
suas ideias de forma oral ou escrita.
 Liberdade de consciência: é o direito de escolher, professar ou não qualquer
religião, significa por outro lado, o reconhecimento e a garantia da liberdade e
inviolabilidade de que crenças e práticas religiosas.
Liberdade de decisão “interior”: é a liberdade de querer, que pode ser
limitada por forças internas ou seja por obsessões, paixão, medo, etc. Este tipo de
liberdade supõe o domínio das forças do automatismo, da paixão e do instinto podendo

Elaborado por: Olívio Santana Página 37


11ª Classe Filosofia

definir-se como o poder de orientar o comportamento para objectivos ou fins,


inteligentemente escolhidos. Essa liberdade possui dois tipos:
 Liberdade de indiferença: também conhecido por livre arbítrio que significa o
poder de agir independentemente dos motivos; significa agir arbitrariamente.
 Liberdade moral: é o poder de reflexão e de escolha. Corrige a forma anterior na
medida em que coloca em relevo o papel das funções intelectuais “reflexão” no
exercício da actividade livre. Assim um ser é livre não só na medida em que
quer, sabe o que quer e porque quer.

Responsabilidade

O termo responsabilidade deriva do verbo latino respondere. Ter


responsabilidade significa “que se deve responder (dar conta) /pela ação própria / a
alguém.
Este termo, a partir do século XVIII, de um ponto de vista ético-filosófico,
assume o significado de responder de, e responder diante de.
A responsabilidade é a obrigação que tem o agente moral de dar conta dos seus
actos e suportar as suas consequências. Supõe como condição a imputabilidade, isto é,
a atribuição de um acto a uma pessoa como seu autor, e esta supõe o conhecimento do
bem e do mal e a liberdade para o fazer, pois só se é responsável por actos que são
verdadeiramente seus; o que dá ao homem pleno domínio dos seus actos e os torna
susceptíveis de valorização moral, dignos de mérito23 ou demérito24.
O homem é tanto mais responsável por um acto quanto melhor o conhecer e
mais livre for em praticá-lo. Tudo o que afecta a razão e a vontade livre afectará na
mesma medida a responsabilidade.
Entre os factores que afectam a liberdade, enumeramos a violência, o medo, a
paixão e o hábito. A violência ou o constrangimento da vontade por causas extrínsecas
ou mesmo intrínsecas, como a embriaguês, a loucura, etc., priva-nos do domínio de nós
próprios, tornando-nos irresponsáveis pelos actos executados nesses estados.

23
O mérito é o merecimento ou valor moral do acto que é conforme à lei moral ou acréscimo do valor
moral da pessoa que a prática, dando direito a uma recompensa (RIBEIRO, J. Bonifácio e da Silva, José.
Compêndio de Filosofia. Lisboa, Cogito Ergo Sum, 10ª edição, p.474)
24
O demérito é a diminuição do valor moral de uma pessoa por uma acção mal feita, conduzindo ao
castigo (Idem…, p.474).

Elaborado por: Olívio Santana Página 38


11ª Classe Filosofia

O medo, ou a perturbação do espírito provocada por um mal eminente, diminui


ou suprime por completo a liberdade e, por conseguinte, a responsabilidade.
Quanto à paixão e ao hábito, é mais delicada a questão de determinar em que
medida é que estes dois fenómenos concorrem para enfraquecer a liberdade.
Pois se, por um lado, a paixão perturba a deliberação da vontade e o hábito
subtrai à reflexão os respectivos actos, diminuindo, assim, a sua responsabilidade, por
outro lado, como paixão e o hábito têm a sua origem na repetição de actos livres, aprece
que somos responsáveis pela aquisição da paixão e do hábito e, por isso, ainda que
indirectamente, pelos actos praticados nesses estados.
A responsabilidade perfeita advém do pleno consentimento da inteligência e da
completa liberdade da vontade.
Todo acto moralmente responsável exige as seguintes condições:
“imputabilidade25, consciência26 e intencionalidade27” (Geque & Biriate, p. 57).
Espécies de responsabilidade
Há duas espécies de responsabilidade: a responsabilidade moral e a
responsabilidade social. A primeira leva-nos a responder perante Deus; a segunda
perante os tribunais e a sociedade.
A moral científica faz nascer a responsabilidade moral da responsabilidade
social, afirmando que aquela resultou da interiorização desta.
Tal opinião não pode admitir-se, pois a responsabilidade social diz respeito às
leis da sociedade e é determinada pelo medo das sanções penais e, ainda, abrange
apenas os actos externos; sem ter em conta a intenção; ao passo que a responsabilidade
moral procede do reconhecimento da lei moral como digna de todo o respeito, à qual
nos sujeitamos livremente e com amor, porque representa o ideal do nosso
procedimento e o caminho da nossa perfeição e felicidade.
Esta responsabilidade abrange todos os actos externos e internos, públicos e
privados e até mesmo os próprios pensamentos, desejos e intenções e supõe o
conhecimento da lei ao passo que a social não.

25
Só é responsável por determinado acto, aquele a quem esse mesmo acto é imputado, isto é, aquele a
quem é atribuída a sua autoria.
26
O sujeito age conscientemente, com o conhecimento de causa, isto é, não ignora as circunstâncias em
que a sua acção se desenrola e, de certa forma, pode controlar as consequências imediatas do seu
comportamento.
27
Quando deriva de uma decisão consciente, voluntária e livre do sujeito.

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2.6.1 Sociedade, liberdade e pessoa.

O homem – afirmamos – é essencialmente sociável: sozinho não pode vir ao


mundo, não pode crescer, não pode educar-se; sozinho não pode nem satisfazer suas
necessidades mais elementares, nem realizar suas aspirações mais elevadas; ele somente
pode obter isto em companhia dos outros.
Por isso, desde seu primeiro aparecimento sobre a terra, encontramos sempre o
homem colocado em grupos sociais, no início bem pequeno (a família, o clã, a tribo) e
depois sempre maior (a aldeia, a cidade, o Estado). “À medida que o nível cultural da
humanidade se eleva, também a dimensão de sociabilidade torna-se mais ampla e rica.
Hoje ela alcançou um horizonte ilimitado: de nacional tornou-se primeiro internacional,
depois intercontinental e já está assumindo proporções planetárias28”.
A sociabilidade assumiu, em nosso século, tais proporções que pode
legitimamente ser considerada um fenómeno típico de nosso tempo. A dimensão
privada praticamente desapareceu. Com muito custo podemos ocultar nossos
pensamentos e nossos desejos. Mas, tão logo estes se traduzem em ação, tornam-se
apanágio também dos outros e, graças à televisão, ao rádio e imprensa, num piscar de
olhos são divulgados pelos quatro ventos.
Se a pessoa é interioridade, no mundo único, uma esfera reservada, ela é também
aberta aos outros. Neste sentido, podemos dizer que a pessoa é indigente; não se basta a
si mesma, necessita dos outros. A pessoa tem uma estrutura dialógica EU – TU – NÓS
que faz a sociedade. Toda moralidade tem que se basear na pessoa. Por que é ela que
constitui o centro dos valores morais.
Para que isto aconteça é necessário que ele esteja em pleno gozo e exerça
efectivamente a sua liberdade de agir, sem a presença de qualquer tipo de coerção.
Podemos dizer que há uma interdependência entre Sociedade – Liberdade – Pessoa; pois
cada uma existe pela existência da outra, isto é, só existe sociedade havendo pessoa, só
existe pessoa enquanto forem livres e só existe liberdade havendo homens em
sociedade. Caso contrário, não se pode falar de sociedade, mas sim de um aglomerado
de pessoas dependentes de uma única vontade. Para que isto não aconteça é necessário
que haja liberdade entre as pessoas de uma determinada sociedade.

28
MONDIN, Battista. Introdução à Filosofia: Problemas, sistemas, autores e obras. São Paulo,
Ed.Paulus, 2006. p.134-135.

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Tipos de sociedade
Sociedades primitivas ou tribais: aquelas que não desenvolveram a escrita…
Sociedades científicas: aquelas que fundam seus padrões vivenciais na
tecnologia.

2.7.1. Ética, Estado E direito.

Historicamente, a palavra ética foi aplicada à moral sob todas as suas formas,
quer como ciência do comportamento efectivo dos homens, quer como arte de guiar o
comportamento. Propriamente a ética deveria ocupar-se do bem como valor primário
assumido pela liberdade como guia das próprias escolhas.
A ética debate-se com dois aspectos principais: um relativo ao fundamento e ao
valor dos códigos, dos princípios, das normas, das convicções morais já existentes;
trata-se do problema crítico. O outro diz respeito às condições que possibilitam a acção
moral em absoluto; o critério daquilo que é moral e imoral para o homem; o fim último
da vida humana e os meios mais aptos para atingi-lo. Este é o problema teórico.
Os dois problemas, entretanto, não estão separados um do outro, mas sim
intimamente ligados, na medida em que o primeiro introduz o segundo: antes de
implantar sistematicamente a moral, coloca-se em questão, problematiza-se a moral
comum.
O objecto da ética se subdivide em duas partes:
Objecto material, aquele que se prende com os actos. Objecto formal, referente
às leis ou normas que regulam esses actos, quando são identificados. Existem duas
categorias avaliativas dos actos ético-morais: 1º actos do homem e 2ºactos humanos.
Actos do homem: São acções que não implicaram qualquer intenção da parte do
sujeito. São acontecimentos em que nos limitamos a ser meros receptores de efeitos que
não provocamos.
Actos humanos: são aqueles que o sujeito executa voluntariamente, com o pleno
uso das suas faculdades psico-morais. Pode ainda, se acrescer nessa escala, o acto misto,
que resulta da combinação de regras voluntárias e não voluntárias para a sua execução;
neste caso executa-se o acto com pendor voluntário, em pleno uso da consciência.
Por isso, toda a acção humana implica, necessariamente, os seguintes elementos:
Agente: o sujeito da acção que é capaz de se reconhecer como autor da acção e
que age com consciência.

Elaborado por: Olívio Santana Página 41


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Motivo: a razão que justifica a acção; o que nos leva a agir ou fazer algo. Diz
respeito ao que o sujeito pretende fazer ou ser com a sua acção.
Intenção: respeito ao que o sujeito pretende fazer ou ser com a sua acção.
Fim: o fim da acção é a possessão daquilo para que se quer a acção voluntária.
Formalmente, os actos são avaliados sob dois pontos de vista: a licitude e a
ilicitude.
Um acto é considerado lícito, quando corresponde as acções humanas
autorizadas ou permitidas pelo comportamento moral ou ainda pela lei que rege a
conduta da comunidade; tais acções podem ser negativas, mas autorizadas por lei.
Os actos ilícitos, são aqueles que se encontram proibidos e são rejeitados na
conduta social das pessoas, mesmo quando são bons e, por isso, a sociedade repugna-os
e luta para acabar com eles.

Origem e formação do estado


O Estado, segundo Aristóteles, é produto da Natureza: “é evidente que o Estado
é uma criação da Natureza e que o Homem é, por natureza, um animal político”
(Aristóteles, apud Geque & Biriate, 2019). O facto de o Homem ser capaz de discursar
prova a sua natureza política.
Historicamente, explica Aristóteles, o Estado desenvolveu-se a partir da família:
ao unirem-se, as famílias deram origem a aldeias. Estas desenvolveram-se e formaram
as cidades (Estado). Este, apesar de ter sido o último a criar-se, é superior às anteriores
uniões da sociedade, pois o Estado é auto-suficiente. O objectivo do Estado é
proporcionar felicidade aos cidadãos. O escopo da vida humana é a felicidade e o
escopo do Estado é facilitar a consecução da felicidade. Dito de outra forma, o escopo
do Estado é facilitar a consecução do bem comum
A palavra Estado com actualmente é empregada na generalidade dos estudos
(sociedade política organizada), toma como base a denominação nascida nos escritos de
Maquiavel, em sua obra intitulada o Príncipe, datada de 1513, para se referir àquele
como atributo de uma cidade independente. Isto acontece quando inaugura o príncipe
com a célebre frase: todos os Estados, todos os domínios que têm tido ou têm império
sobre os homens são Estados e, são repúblicas ou principados29.

29
MAQUIAVEL, Nicolau. O príncipe (1996) Rio de Janeiro, Tradução de Maria Lúcia Cumo, 16ª
edição, p. 11.

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11ª Classe Filosofia

O estado é um ente dotado de poder e constituído jurídico e politicamente


através da sociedade civil e que dotado de soberania procura eleger determinados,
prescrever condutas e garantir a segurança por meio da isonomia ou seja, almejando-se
o bem de todos.
O estado é constituído por dois elementos tidos como fundamentais; o primeiro é
de ordem material e outro de ordem formal.
São elementos materiais os seguintes: povo, nação e território. Constituem os
elementos formais, os seguintes: poder político, soberania e ordem jurídica
(constituição)
Direito
Ao dever que impende sobre o homem, corresponde o direito que é como que o
baluarte que nos protege mutuamente.
O dever e o direito têm a mesma origem – a lei – e a mesma condição – a
liberdade. Na verdade, um e outro não são mais que a própria lei considerada sob
aspectos diferentes: o dever é a necessidade moral de praticar a lei; o direito é um poder
moral de exigir os meios indispensáveis para o cumprimento da lei. O primeiro constitui
o que há de passivo na pessoa, o que ela deve; o segundo o que nela há de activo, o que
lhe é devido.
O direito pode tomar-se sob o aspecto objectivo e subjectivo. Objectivamente é o
conjunto de leis que regulam o homem ou sociedade, por exemplo: o direito civil.
Subjectivamente, é o poder moral inviolável de possuir, fazer ou exigir qualquer
coisa, isto é, de exigir o necessário para prosseguir a sua finalidade.
O direito é um poder moral, porque se funda na lei moral e exclui o poder físico,
fundado na força. Podemos ter direito a exercer a força, mas a força não é direito.
Pelo facto de, o direito ser um poder moral, só o ser racional é capaz de o
possuir. As crianças e os anormais têm os mesmos direitos que o adulto normal, mas são
exercidos pelas pessoas que os têm a seu cargo.

2.7.2. Ética ambiental/ecológica

O problema da relação entre a ética e o meio ambiente deve ser entendido de


modo recíproco, por um lado “como o impacto da acção humana sobre o meio
ambiente natural e social” e, por outro, “como o desafio que as transformações no
ambiente colocam para a reflexão sobre a acção humana” (Viegas, 2004, p. 49). Ao

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mesmo tempo que o estudo do meio ambiente se desenvolvia como ciência, também se
desenvolveram reflexões éticas de como o homem se devia comportar perante o meio
ambiente.

No entanto, deve diferenciar-se entre o meio ambiente natural composto pelos


recursos naturais, plantas e animais e o meio ambiente social composto pelo próprio
homem na sociedade. Ambos constituem o meio ambiente que, por sua vez, influência a
acção e o comportamento humano. Em seguida, utilizar-se-á o termo “meio ambiente
para designar unilateralmente o meio natural (…). Esta utilização de certo modo
limitada do termo, visa enfatizar as condições naturais de existência da humanidade”
(Idem, p. 49)

A relação do homem com a natureza na história

Foram efectivamente os filósofos de Mileto a serem os primeiros a tecerem


considerações racionais sobre a natureza e origem, analisando a diversidade das coisas
que ela se lhes apresentava, tais como o dia e a noite, a água dos rios que corre, a
sucessão das estações do ano. Estes pensadores fizeram da natureza seu objecto de
análise, procurando encontrar nele o “elemento primário originário e a causa comum
de todas” (Marcondes, 2012, p.67).

O cristianismo veicula uma imagem particular da relação entre homem e


natureza. No antigo testamento apresenta-se a terra como sendo uma criação de Deus.
Neste mito da criação da natureza, todos os animais no mar, na terra e no ar são
apresentados como propriedade do homem

Criou, pois, Deus o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou,


homem e mulher os criou (…), e lhes disse: frutificai e multiplicai-vos;
enchei a terra e sujeitai-a; dominai sobre os peixes do mar, sobre as aves do
céu e sobre todos os animais que se arrastam sobre a terra. Disse-lhes mais:
eis que vos tenho dado todas as ervas que produzem semente, as quais se
acham sobre a face de toda a terra, bem como todas as árvores em que há
fruto que dê semente; ser-vos-ão para mantimento (Gn, 1, 27-29).

O direito romano, por seu lado, coloca os animais na mesma condição legal
que as coisa mortas e inanimadas. No novo testamento e, na tradição do cristianismo, há
poucas referências que apelam à atenção e consideração aos animais, exemplo claro
disso encontramos no evangelho de Mateus “e os demónios rogavam-lhe, dizendo: se
nos expulsas manda-nos entrar naquela manada de porcos” (Mt, 8. 31ss). Outro

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exemplo sobre a falta de preocupação com a natureza é-nos apresentado pelo


evangelista Mateus “e, avistando uma figueira à beira do caminho, dela se aproximou,
e não achou nela senão folhas somente; e disse-lhe: nunca mais nasça fruto de ti. E a
figueira secou imediatamente” (idem, 21:19ss). Um dos mais conceituados teólogos
cristãos de todos os tempos, Tomás de Aquino, defendia que o homem, ao matar
animais para sua alimentação, correspondia ao mandamento de Deus “Deus não irá
perguntar ao homem, o que ele fez com o jumento ou um outro animal qualquer”
(Aquino, 2002, 257).

O pensamento filosófico moderno começa com Descartes, este iguala o animal,


a planta a uma coisa automática, sem alma e sem sentimentos, pois para Ele, possuem
existência garantida somente os seres capazes de produzirem conhecimento, daí sua
velha máxima “cogito ergo sum: penso, logo existo” (Descartes, 2005, p. 98). No
iluminismo há vozes isoladas que apelam para que o homem respeite os animais, a
exemplo disso Jeremy Bentham sustenta que “a questão não é se os animais podem
pensar ou não e, muito menos, se eles podem falar ou não; a questão é se os animais
sofrem” (Bentham, 2003, p. 39). Este autor fez esta observação quando comparava o
tratamento reservado aos animais com a situação dos escravos negros.

No século XIX surgiram na Inglaterra os primeiros movimentos e leis de


defesa dos animais. Pode apontar-se ainda personalidades particulares como o escritor
russo Leo Tolstoi e, muito antes dele, o pintor e sábio Leonardo da Vinci, que
rejeitavam uma alimentação excessiva com base na carne.

No livro “Bioética” de Archer e Luis, são apontadas as cinco atitudes de


relacionamento do homem para com o meio ambiente ao longo da história:

1. A dominação. Na primeira fase da sua existência, os seres humanos, afectados


pelas condições duras de existência e de sobrevivência, viam a natureza como o
domínio donde tiravam aquilo que necessitavam para a sobrevivência. A técnica
desenvolvida na idade moderna, e que teve sua elaboração filosófica na
subjectividade do cogito de Descartes, foi sempre no intuito de exploração
sistemática da natureza.
2. A natureza foi tão “convocada” para servir o homem que começou a esgotar-se
aos poucos. As fontes e reservas de energia começaram a chegar aos limites. Os

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negativos das transformações do ambiente natural que o homem encontrou na


terra, tornaram a vida quotidiana quase impossível. Se por um lado, a qualidade
de vida individual melhorou por outro, o homem actual tem de alimentar-se de
fruta impregnada de pesticidas, de ovos “industriais”, ou ainda, de vacas
“loucas”. Este fenómeno pode denominar-se de ambivalência, uma vez que
chegamos a detestar aquilo de que ao mesmo tempo gostamos (Viegas, op. cit.
P. 50).
3. A tomada de consciência dos problemas ambientais estimulou, nos últimos
tempos, várias reflexões filosóficas para a sua interpretação, explicação e
resolução. O ponto de partida destas reflexões era o seguinte “se por um lado, os
homens dominavam a natureza, por outro, estes mesmos fazem parte da própria
natureza e dela depende a sua sobrevivência como espécie” (Idem, p.51).
4. Finalmente, exige-se responsabilidade: em primeiro, aceitar pagar o custo,
humano e financeiro, da alteração dos maus hábitos sociais quanto ao
tratamento das reservas naturais e energéticas. Em segundo lugar, verificar que
existem para sociedade de consumo limites de direito, impostos pela obrigação
de não esgotar a natureza (…), enfim, “juntar à transformação do olhar
individual de cada ser humano sobre a Natureza que o rodeia a necessidade de
trabalhar para a elaboração de códigos jurídicos e de decisões políticas
relativamente à ecologia” (Archer, Luis; et al;Bioética; Verbo, Lisboa / São
Paulo; 1996, p. 234).

Os problemas do meio ambiente na actualidade.

A actividade humana tem como consequência alterações mais ou menos


profundas no planeta em que habitamos. Estas alterações são algumas vezes locais, mas
muitas vezes atingem todo o planeta quer nos países ricos quer nos pobres. Isto provoca
alguns problemas ambientais que pela, sua dimensão, se podem considerar como
globais. É sobre alguns desses problemas que nos iremos ocupar em seguida.

A água

Alguns prognósticos, embora de certa forma fantástica, sustentam o seguinte:


as próximas guerras em algumas regiões do mundo, como no Médio Oriente, já não

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serão por causa do petróleo, serão por causa da água. Uma guerra pela água será ainda
mais letal que pelo petróleo, pelo simples deste líquido ser mais importante para o
homem que o petróleo e daí os ânimos serem mais difíceis de controlar. Já na
antiguidade clássica, o filósofo grego Tales de Mileto destacava a importância da água
ao apontá-la como a “origem de todas as coisas” (Marcondes, 2013, p. 31)

No Globo terrestre existem cerca de 1360 milhões de quilómetros cúbicos de


água, dos quais 97,3% é água salgada dos oceanos. Quer dizer que apenas 37 milhões de
quilómetros cúbicos são de água doce.

Cada pessoa de cerca de um litro por dia para sobreviver. Fazendo cálculos
arredondados, a humanidade precisa, por dia, de cerca de 7200 milhões de litros para o
consumo. Teoricamente, existem reservas d´água suficientes para todos. No entanto na
prática, há sérios problemas de distribuição para a sua utilização. Segundo o relatório da
ONU sobre a utilização da água em 1995, cada cidadão japonês ou americano consome
em média e, por dia, entre 110 e 260 litros de água.

Nos países subdesenvolvidos consome cada cidadão, em média, apenas 10


litros. Um outro aspecto prende-se com a qualidade da água que se consome “cerca de
1,2 bilhões de pessoas consome água imprópria para beber” (Harari, 2018, p. 46).
Destes dados conclui-se claramente que o problema da água não está tanto na sua
quantidade, mas sim, na distribuição desigual pelos habitantes do planeta.

A energia

A energia em sentido lato “é o motor de todas as formas de vida e de todos os


processos de formação estrutural das plantas e dos animais” (Viegas, op. cit. p.51).
Isto é, toda a transformação de um estado para o outro, precisa de energia. As plantas
não podem crescer sem utilizar energia, bem como os animais não poderiam viver e os
homens não poderiam trabalhar.

No âmbito do meio ambiente, referimo-nos aqui sobre energia que precisamos


para o consumo e que, normalmente, se obtém a partir da combustão de alguns produtos
da Natureza ou da sua exploração. No entanto, existem diversos tipos de energia. Para o
cultivo, por exemplo, precisamos de energia muscular do homem ou da energia animal.
Para a iluminação e para cozer os alimentos precisamos de energia produzida a partir da

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combustão do carvão ou da energia eléctrica ganha a partir de moinhos, da energia


fotovoltáica, da energia térmica. Também se pode obter energia a partir do gás.

Embora sua finitude não esteja em causa, o grande problema parece ser, a
distribuição no consumo mundial de energia. Nas nações africanas do sul do Sahara, a
lenha e outros combustíveis de biomassa constituem 60 e 90 % da provisão total
nacional de energia. São combustíveis que, em que primeiro lugar, servem o sector
doméstico. Também são utilizados para que pequenas indústrias.

A lenha constitui a opção mais barata de aquisição de energia para a confecção


de alimentos. No entanto, devido ao crescimento da população que assola África nos
últimos tempos, o consumo de lenha cresceu muito, e, por consequência, aumentam os
perigos do desflorestamento, um dos grandes problemas para a África. Nas nações
desenvolvidas, como EUA, um cidadão usa cerca de 11 kW por dia, o europeu gasta em
média 6 kW e o cidadão dos países mais pobres somente 200 W.

A poluição do meio ambiente

A poluição é a “adição de elementos estranhos ao ar, água, solo ou alimentos


de tal forma ou quantidade que prejudique a saúde, a capacidade de sobrevivência ou
actividade humana ou de qualquer outro ser vivo” (Santana, 2017, p. 24).

O resultado do fenómeno da industrialização que aumentou em cerca de 50


vezes em relação ao século anterior, tem sido a contaminação do ar que respiramos, das
terras que precisamos para cultivar, dos rios e lagos onde pescamos, assim como dos
oceanos onde também desenvolvemos várias actividades económicas.

A contaminação é o resultado directo do consumo descontrolado, pelo homem,


de toneladas de minérios e de petróleo como combustível. A utilização de adubos
químicos na agricultura intensiva contribuiu para a deterioração do solo. A agricultura
intensiva obrigou o homem a desviar os cursos de água. Estas actividades provocaram,
por sua vez, transformações profundas na vegetação natural, principalmente, nas zonas
de grande actividade industrial.

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O clima

Falaremos aqui sobre as grandes quantidades de dióxido de carbono e outros


gases libertados pelas indústrias.

Estes gases estão a provocar o chamado “efeito estufa”, que faz com que a
temperatura média anual se eleve de 1,5 a 4,5 graus célsius nos próximos anos. Por
outro lado, o consumo de combustíveis fósseis provoca a destruição progressiva da
camada de ozono pelos clorofluorcarbonetos utilizados nos aerossóis o que pode
acarretar graves riscos para a vida humana.

Desertificação

Este fenómeno define-se como sendo “a degradação do solo em zonas áridas,


semiáridas e secas ou sub-húmidas” (MiniA; 2006, p. 67). A desertificação tem ligação
com as alterações climáticas assim como com a actividade humana. A floresta tropical
está actualmente a ser derrubada a uma taxa de cerca de “40 hectares por minuto e, se
não forem tomadas medidas que interrompam tal destruição, daqui há 50 anos aquelas
formações vegetais terão desaparecido” (Bioética; 1993, p. 141).

A desertificação é um problema global que afecta cerca de um texto da


população mundial. Estão na sua origem distintos elementos, entre eles destacam-se,
“As práticas não sustentáveis de cultivo e colheita; as pastagens excessivas; a prática
de desmatamento para a limpeza da terra e obtenção da lenha e o abaixamento dos
lençóis freáticos devido a sobre exploração da água” (Viegas, op. cit. p. 54)

2.8. Direitos humanos

Foram os latinos quem legaram a nós a palavra direito e a mesma resulta da


fusão de dois termos: derectum que é a junção do termo De (totalidade, perfeição), com
o termo Rectum (reto), podendo ser traduzido por totalmente reto. Tal ideia nos
remete a um dos símbolos tradicionais do direito: a balança e por conseguinte a ideia
de igualdade, pois quando o fiel da balança está totalmente reto, os dois têm pesos
iguais.

Essa análise etimológica nos permite chegar a algumas conclusões: em 1º lugar,


podemos dizer que o direito é uma exigência da vida em comunidade, (…), tal ideia se

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encontra na frase: “Ubi societas, ibi ius” (onde há sociedade, há direito). Pois, os seres
humanos, são por natureza animais sociais como se referira Aristóteles de Estagira.
Somando todas essas ideias, temos que os Direitos Humanos são “um conjunto
de direitos, positivados ou não, cuja finalidade é assegurar o respeito à dignidade da
pessoa humana, por meio da limitação do arbítrio estatal e do estabelecimento da
igualdade nos pontos de partida dos indivíduos, em um dado momento histórico”
(Bianchini & Gomes, 2012, p. 21).

CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS HUMANOS


Embora seja controverso abordar essa temática dentro da jurisprudência e,
mesmo dentro da filosofia, costuma-se falar que os direitos humanos possuem, entre
outras características: “universalidade, indisponibilidade, inalienabilidade e
irrenunciabilidade, imprescritibilidade, indivisibilidade, interdependência e
complementaridade, historicidade e proibição do retrocesso, aplicabilidade imediata e
carácter declaratório” (Idem, p. 21).
 Universalidade: os Direitos Humanos possuem validade e são legítimos para
todos os indivíduos.
 Indisponibilidade, inalienabilidade e irrenunciabilidade: os Direitos
Humanos também são indisponíveis, no sentido de que não podem ser
transmitidos ou mesmo renunciados por seus titulares.
 Imprescritibilidade: são imprescritíveis, no sentido de que não deixam de ser
exigíveis com o decorrer do tempo.
 Indivisibilidade, interdependência e complementaridade: Os Direitos
Humanos formam um sistema indivisível, interdependente e complementar entre
si. As normas sobre direitos fundamentais se complementam, garantindo, assim,
a efectividade plena que elas buscam alcançar.
 Historicidade e proibição do retrocesso: os direitos humanos nascem quando
devem e podem nascer; tal como afirma Norberto Bobbio “os direitos humanos
não nascem todos de uma vez nem de uma vez por todas” (Bobbio, pud
Bianchini & Gomes, 2012, p24). Hannah Arendt, por seu turno, celebrizou-se
por sua frase “os direitos humanos não são um dado, mas um construído”
(Arendt, apud Bianchini & Gomes, 2012, p. 24). Assim, temos que os Direitos
Humanos são uma criação humana em constante mutação.

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 Aplicabilidade imediata e carácter declaratório: Pela importância que os


direitos humanos possuem no ordenamento jurídico, eles devem ser assegurados
independentemente de norma regulamentadora. Ou seja, pelo simples fato de
terem sido declarados, já devem ser garantidos a todos.
Em geral, todo direito exprime a faculdade de exigir de terceiro, que pode ser o
Estado ou mesmo um particular, determinada obrigação. Por isso, os direitos humanos
têm estrutura variada, podendo ser: “direito-pretensão, direito-liberdade, direito-poder
e, finalmente, direito-imunidade” (Ramos, 2013, p. 24), que acarretam obrigações do
Estado ou de particulares revestidas, respectivamente, na forma de: dever, ausência de
direito, sujeição e incompetência.
O direito-pretensão: consiste na busca de algo, gerando a contrapartida de
outrem do dever de prestar. Nesse sentido, determinada pessoa tem direito a algo, se
outrem tem o dever de realizar uma conduta que não viole esse direito.
O direito – liberdade: consiste na faculdade de agir que gera a ausência de
direito de qualquer outro ente ou pessoa. Assim, uma pessoa tem a liberdade de credo,
não possuindo o Estado (ou terceiros) nenhum direito de exigir que essa pessoa tenha
determinada religião.
O direito-poder: implica uma relação de poder de uma pessoa de exigir
determinada sujeição do Estado ou de outra pessoa. Assim, uma pessoa tem o poder de,
ao ser presa, requerer a assistência da família e de advogado, o que sujeita a autoridade
pública a providenciar tais contactos.
O direito-imunidade: consiste na autorização dada por uma norma a uma
determinada pessoa, impedindo que outra interfira de qualquer modo.
Ademais, torna-se imprescindível estabelecer a diferente existente entre direitos
fundamentais e direitos humanos. Consideram-se direitos humanos a todos aqueles
valores e direitos positivos e/ou não, consagrados em tratados internacionais. Estes, por
sua vez, tornar-se-ão em direitos fundamentais quando inseridos na constituição.

2.9. Experiência religiosa.

A experiência religiosa é produto da fé humana na existência de uma ou mais


entidades divinas – um deus ou muitos deuses e, na possibilidade de se relacionar com
este (s).

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Ela provém das revelações do mistério, do culto, por algo que é interpretado
como mensagem ou manifestação divina. Tais revelações são transmitidas por alguém,
por tradição acumuladas ao longo da história ou através de escritos sagrados.
De modo geral, a experiência religiosa apresenta respostas para questões que o
homem religioso não consegue resolver segundo o seu juízo, com o conhecimento
científico ou filosófico. Assim, as revelações feitas pelos deuses ou em seu nome são
consideradas por este homem como satisfatórias e aceitas como expressões de verdade.
Tal aceitação, porém, racional ou não, tem necessariamente de resultar da fé que
o aceitante deposita na existência de uma divindade.

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3.TEORIA DO CONHECIMENTO

A história do pensamento ocidental testemunha a atenção que as especulações


filosóficas têm concentrado sobre determinados temas. Esses, discutidos em diversos
períodos, tornaram-se o que chamamos problemas filosóficos. Entre os principais
problemas filosóficos está o do conhecimento.
Diante deste dilema poderíamos levantar a seguinte questão: Para que investigar
o conhecimento? De acordo com o que se estudou, desde os primórdios até nossos dias,
vive-se uma busca incessante por compreender a si mesmo e o mundo à sua volta. Isso
levou a que muitos pensadores sentissem que era necessário entender primeiro sua
própria capacidade de entender, antes de confiar plenamente na percepção e
compreensão que alcançavam das coisas.
Desde a Antiguidade grega, quase todos os filósofos se preocuparam com o
problema do conhecimento; envolvendo questões básicas como:
 O que é conhecimento?
 Qual é o fundamento do conhecimento?
 É possível o conhecimento verdadeiro?
Todas essas questões têm sido tratadas por uma disciplina filosófica que costuma
ser designada por diversos nomes: teoria do conhecimento, gnosiologia, crítica do
conhecimento ou epistemologia.
Em que consiste, então, a teoria do conhecimento?
A teoria do conhecimento pode ser definida como, a investigação acerca das
condições do conhecimento verdadeiro30.
Dentre as principais questões abordadas na teoria do conhecimento podemos
citar: as fontes primeiras de todo conhecimento ou ponto de partida; o processo que faz
com que os dados se transformem em juízos ou afirmações acerca de algo; a maneira
como é considerada a actividade do sujeito frente ao objecto a ser conhecido; o âmbito
do que pode ser conhecido segundo as regras da verdade etc.31.
Cada teoria do conhecimento constitui portanto, uma reflexão filosófica com o
objectivo de investigar as origens, as possibilidades, os fundamentos, a extensão e o
valor do conhecimento.

30
LEOPOLDO E SILVA, Franklin. Teoria do conhecimento. In: MORA DE Oliveira, Armando etalli.
Primeira filosofia. Tópicos de filosofia geral, p. 175.
31
Ibidem, p. 175.

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3.1.2. A estrutura do acto do conhecimento e a dicotomia sujeito-objecto.

O acto de conhecer é a actividade do espírito pela qual se representa um objecto


ou uma realidade. É um acto do espírito e não uma simples reacção automática mais ou
menos adaptada às circunstâncias; não é propriamente um acto de conhecimento o
sentar-me na cadeira, mas sim o saber porque me sento e como sento. O resultado do
acto de conhecer é uma representação e, portanto, conhecer é representar alguma coisa
distinta do sujeito que conhece.
Há, por conseguinte, no conhecimento três elementos: sujeito que conhece,
objecto conhecido e relação sujeito-objecto. Este objecto pode ser exterior ao sujeito,
pode ser interior e, pode ainda, identificar-se com o próprio sujeito, como ao procurar
conhecer-me a mim próprio. Mesmo no caso de identificação do sujeito com o objecto,
não deixam de existir aí os três elementos referidos, pois o «eu» que é conhecido
apresenta-se ao «eu» conhecedor como uma realidade distinta, mas em relação com ele.
Quando as impressões da realidade chegam à razão, elabora-se o conhecimento,
mas a elaboração do conhecimento funda-se no processo recíproco entre sujeito e
objecto, o que permite compreender na teoria do conhecimento a fórmula básica do
conhecimento:
SUJEITO OBJECTO.

O facto de que o sujeito, mesmo pensante, por si só não produz conhecimento, é


irrefutável, pelo simples facto de que quando se pensa, sempre que se pensa em algo, o
ser. Logo, o pensamento percebe o ser dos objectos em razão da sua própria capacidade
de revelação ao sujeito. Para o sujeito perceber o ser das coisas é certo que não
compreende coisas estranhas a essas coisas. Se o pensamento compreende que as coisas
têm movimento ou que são úteis é porque as próprias coisas revelam tal movimento e
utilidade ao pensamento.
Portanto, o próprio se revela, deixa-se perceber pela razão. Porém, é importante
compreender o movimento das coisas, do ser à razão e da razão ao ser para o
surgimento do conhecimento.
Da ordem em que o sujeito vai ao encontro do ser das coisas, para a obtenção do
conhecimento, e compreende que elas podem esconder-se dele, pelo que se o
pensamento capta o ser das coisas é porque, de certa maneira, para além da física, o ser
se deixa revelar ao pensamento, daí que, decididamente, devemos ter em conta a

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reciprocidade, segundo a qual as coisas ou o próprio ser se move ao encontro do sujeito


para ser percebido, vendo-nos obrigados ao dever da obediência aos factos, a suprir uma
deficiência constante na fórmula acima referida sobre a relação entre o sujeito e o
objecto para a produção do conhecimento: sujeito↔obecto=conhecimento.

3.1.3. As correntes filosóficas sobre a origem do conhecimento: racionalismo e


empirismo

O nosso conhecimento é constituído por ideias, juízos e raciocínios, mas como


os juízos e os raciocínios são obtidos a partir das ideias, o problema da origem do
conhecimento consiste em determinar como se adquirem as ideias e os primeiros
princípios que normalizam todo conhecimento.
Para que o conhecimento seja considerado como autêntico, é preciso que seja
universal e necessário e, ao mesmo tempo, se aplique à realidade, que é singular e
contingente. Ante este dilema a questão que ecoa é a seguinte: de onde deriva o
conhecimento, de modo a satisfazer estas duas condições? Se procede apenas da
experiência, satisfará a segunda, mas não a primeira; se é obtido só pela razão, terá
carácter universal e necessário, mas não valerá da realidade.
Foi esta dificuldade que dividiu todos os filósofos em duas correntes opostas –
empirismo e racionalismo – que o apriorismo kantiano ou empírico-racionalismo ou
intelectualismo procura conciliar32.

3.1.3.1. O racionalismo.

A palavra racionalismo deriva do latim ratio, que significa “razão”. O termo é


empregado de muitas maneiras. Aqui, racionalismo está sendo empregado para designar
a doutrina que atribui exclusiva confiança na razão humana como instrumento capaz
de conhecer a verdade. Ou, como recomendou o filósofo racionalista René Descartes:
“nunca nos devemos deixar persuadir senão pela evidência de nossa razão”.
Os racionalistas afirmam que a experiência sensorial é uma fonte permanente de
erros e confusões sobre a complexa realidade do mundo. Somente a razão humana,
trabalhando com os princípios lógicos, pode atingir o conhecimento verdadeiro, capaz
de ser universalmente aceito.

32
RIBEIRO, J. Bonifácio e da SILVA, José. Compêndio de Filosofia. Lisboa, Cogito Ergo Sum, 10ª
edição, pág. 167.

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Esta corrente teve sempre ilustres defensores desde a antiguidade clássica até
precisamente a época moderna, como é o caso de Platão, Santo Agostinho, Descartes e
Leibniz, porém, cada um destes apresentou sua contribuição baseando-se em elementos
peculiares de suas filosofias, voltados todos para o idealismo.
Platão sustentava a origem do conhecimento baseando-se na sua teoria da
reminiscência “as realidades do mundo em que vivemos, são imitações ou sombras das
ideias e estas são os modelos ou arquétipos daquelas”. A semelhança de Platão, S.
Agostinho, admitiu a teoria das ideias, mas considerando estas realidades perfeitas e
absolutas, existentes na mente divina e de que Deus se serviu, como modelos, ao criar as
realidades do mundo em que vivemos.
Descartes, afirma a presença de três tipos de ideias: inatas, adventícias e
factícias. As inatas são as que nascem connosco e que servem de normas ou de
princípios directores do nosso conhecimento. As adventícias, aquelas formadas a partir
dos dados dos sentidos, como as ideias de calor e amargo e ideias factícias, resultantes
da combinação das ideias adventícias e que permitem representar coisas nunca vistas,
como a ideia de sereia.
Leibniz sustenta o inatismo virtual, admitindo a presença em nosso espírito de
certos conhecimentos inatos ou disposições, mas esses conhecimentos são apenas
virtuais e só se tornam actuais por meio da experiência. Existem na inteligência em
estado virtual como a imagem na película já impressionada, antes de ser revelada.
Para o racionalismo, os princípios lógicos fundamentais seriam inatos, isto é,
eles já estão na mente do homem desde o seu nascimento. Daí por que a razão deve ser
considerada como a fonte básica do conhecimento.
Com efeito, não basta ser racional para possuir a razão dos fatos, para tal, é
imprescindível que se utiliza determinado método, para os racionalistas o método viável
para se chegar a verdade é a dúvida metódica ou hiperbólica33, o mesmo contempla
quatro regras a serem seguidas:
O primeiro passo consiste em jamais aceitar como exacta coisa alguma que eu
não conheça evidentemente como tal, quer dizer, em evitar cuidadosamente a
precipitação e a precaução, incluindo apenas nos meus juízos aquilo que se mostre de
modo tão claro e distinto à minha mente que não subsista à razão alguma de dúvida.

33
Nsumbo, Mvindo. Apontamentos de Filosofia da Educação. Luanda, Instituto Superior de Ciências da
Educação – ISCED, 2014.

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O segundo consiste em dividir cada dificuldade a ser examinada em tantas


partes quantas possíveis e necessárias para resolvê-las;
O terceiro, em pôr ordem nos meus pensamentos, começando pelos assuntos
mais simples e fáceis de serem conhecidos, para atingir paulatinamente o conhecimento
dos mais complexos e supondo, ainda, uma ordem entre os que não se precedem
normalmente uns aos outros;
O último, em fazer, para cada caso, enumerações tão exactas e revisão tão
geral que esteja certo de não ter esquecido nada.
São estas as regras certas e fáceis do novo método, e quem as observar com exactidão
nunca confundirá o falso com o verdadeiro e chegará ao verdadeiro conhecimento, sem
gastar esforços inutilmente, segundo o racionalismo.

3.1.3.2. O empirismo.

Em linhas gerais, o empirismo significa uma posição filosófica que toma a


experiência como guia e critério de validade de suas afirmações, sobretudo nos campos
da teoria do conhecimento e da filosofia da ciência34.
O termo é derivado do grego empeiria35, significando basicamente uma forma de
saber derivado da experiência sensível (realidade objetiva) e dados acumulados com
base nessa experiência, permitindo a realização de fins práticos.
O lema do empirismo é a frase de inspiração aristotélica: “nada está no intelecto
que não tenha passado antes pelos sentidos”. Ou seja, todo conhecimento resulta de uma
base empírica, de percepções ou impressões sensíveis sobre o real, elaborando-se e
desenvolvendo-se a partir desses dados.
Embora seja uma doutrina fundada por Bacon, tem em John Locke, seu máximo
expoente, porém, esta concepção é tão antiga quanto a própria filosofia, embora em
sentido embrionário, e remonta o período sistemático, isto é, com Aristóteles.
Esta concepção reconhece que todo o conhecimento é «a posteriori»36 vem da
experiência (das impressões recebidas pelos sentidos e da consciência) e à experiência
se reduz não podendo elevar-se acima dos dados experimentais.

34
MARCONDES, Danilo, Iniciação a história da filosofia, Rio de Janeiro, Zahar editora, 2007, p. 181.
35
Idem, p. 181ss.
36
A forma a posterior é aquela em que o conhecimento se dá como posterior à experiência e decorrente
dela (PATRÍCIO, Manuel e SEBASTIÃO, Luís Miguel. Conhecimento do Mundo Social e da Vida.
Lisboa, Universidade Aberta, 2004, p. 24.

Elaborado por: Olívio Santana Página 57


11ª Classe Filosofia

Teve como representantes, os seguintes filósofos: J. Locke, Condillac, David


Hume, Stuart Mill, HerbertSpencer e Augusto Conte.
John Locke afirmava que, ao nascermos, nossa mente é como um papel em
branco, desprovida de ideias. Segundo este autor, o vasto conjunto de ideias que existe
na mente humana, que chamamos de conhecimento provém da experiência37. E a
experiência, segundo Locke supre nosso conhecimento por meio de duas operações:
sensação e reflexão. A primeira, leva para a mente as várias e distintas percepções das
coisas, sendo, por isso, bastante dependente dos sentidos. Já, a reflexão consiste nas
operações internas de nossa própria mente que, nesse caso, desenvolve as ideias
primeiras fornecidas pelos sentidos.
Condillac a propósito do conhecimento, sustenta que, este vem da sensação e só
dela, explicando todos os fenómenos do espírito pela transformação da sensação.
Hume e Stuart Mill repete Locke, modificando o vocabulário deste: os elementos
do conhecimento são a sensação e a reflexão ou as impressões e as ideias; estas
distinguem-se daquelas, porque as impressões são mais fortes e mais vivas. Para
Spencer, os conhecimentos humanos são fruto de uma evolução apoiada na experiência.
Para Augusto Conte, o conhecimento humano não pode ir além da experiência sensível
e não pode conhecer mais do que aquilo que os sentidos permitem verificar.

3.1.3.2.1. Posição de síntese: apriorismo kantiano.

Vimos que o empirismo considera a experiência dos sentidos como a base do


conhecimento. Já, o racionalismo afirma ser a razão humana, a verdadeira fonte do
conhecimento. Existem também posições filosóficas que buscaram um meio-termo para
essas visões tão opostas. É o caso do que se denominou apriorismo kantiano.
Kant afirma que todo conhecimento começa com a experiência, mas que a
experiência sozinha não nos dá o conhecimento. Ou seja, é preciso um trabalho do
sujeito para organizar os dados da experiência. Por isso, ele buscou saber como é o
sujeito a priori, isto é, o sujeito antes de qualquer experiência, e concluiu que existem
no homem certas faculdades ou estruturas que possibilitam a experiência e determinam
o conhecimento.

37
COTRIM, Gilberto. Fundamentos da Filosofia: História e Grandes temas. São Paulo, Saraiva, 2006, p.
60.

Elaborado por: Olívio Santana Página 58


11ª Classe Filosofia

Para Kant, portanto, a experiência forneceria a matéria do conhecimento,


enquanto a razão organizaria essa matéria de acordo com suas formas próprias,
estruturas existentes a priori38no pensamento, daí o nome apriorismo.
3.2. NATUREZA DO CONHECIMENTO

Em todo o acto do conhecimento, podemos considerar três elementos: sujeito


que conhece, o objecto conhecido e a relação entre o sujeito e o objecto. Para conhecer,
o sujeito com que tem de sair de si mesmo para ir ao encontro do objecto e aprender as
suas propriedades, de modo a representá-lo no espírito.
O conhecimento apresenta-se-nos, assim, como uma representação na
consciência. Partindo deste pressuposto, dois são os questionamentos que temos
enfrentar e solucionar: essa representação foi provocada pelo objecto existente fora do
sujeito?
Neste caso, o conhecimento tem valor objectivo, porque atinge uma realidade
que existe independentemente da nossa representação; o conhecimento é a
representação das coisas de faço das coisas de facto existentes. Ou essa representação
será simplesmente uma criação da nossa consciência à qual nada corresponda fora do
sujeito ou, se corresponde, é como se não existisse, porque não pode conhecer-se? O
conhecimento, assim, terá unicamente valor subjectivo: representará as modificações
subjectivas e atingirá os nossos estados de consciência.
Em resposta a estas perguntas, temos o realismo e o idealismo.
3.2.1. O realismo39.

De acordo com as teorias realistas do conhecimento, as percepções que temos


dos objectos são reais, ou seja, correspondem de fato as características presentes nesses
objectos, na realidade.
Por exemplo: as formas e cores que o sujeito percebe no pássaro são cores e
formas que o pássaro realmente tem em si.
No realismo mais ingénuo, isto é, menos crítico, o conhecimento ocorre por uma
apreensão imediata das características dos objectos, isto é os objectos se mostram como

38
Por conhecimentos a priori entenderemos não os que ocorrem independente desta ou daquela
experiência, mas absolutamente independente de toda a experiência. Opõem-se os conhecimentos
empíricos ou aqueles que são possíveis apenas a posteriori, isto é, por experiência (KANT, Immanuel.
Crítica da Razão Pura, Lisboa, Calouste Gulbenkiam, 3ª edição, 2003, p. 13.)
39
Ibidem, p.56.

Elaborado por: Olívio Santana Página 59


11ª Classe Filosofia

realmente são ao sujeito que o percebe, determinando o conhecimento que então se


estabelece.
Há, no entanto, outras formas mais críticas de realismo, que problematizam a
relação sujeito-objecto, mas que mantêm a ideia básica de que o objecto é determinante
no processo de conhecimento.
Para o realismo o nosso conhecimento atinge a própria realidade e não apenas as
representações subjectivas – atinge o que é e não o que pensamos.

3.2.2. O idealismo.

Segundo as teorias idealistas do conhecimento, o sujeito é que predomina em


relação ao objecto, isto é, a percepção da realidade é construída das nossas ideias, pela
nossa consciência. Assim, os objectos seriam “construídos” de acordo com a capacidade
de percepção do sujeito.
Consequentemente, o que existiria como realidade seria a representação que o
sujeito faz do objecto. Por exemplo: as formas e cores que o sujeito percebe no pássaro
são apenas ideias ou representações desses atributos; não entra em questão se elas
realmente estão no pássaro.
Também no idealismo, há posições mais ou menos radicais em relação à
afirmação do sujeito como elemento determinante na relação de conhecimento.

3.2.3. Três modelos explicativos do conhecimento.

O conhecimento humano é estudado sob diversos pontos de vista, religioso,


científico e filosófico, no entanto, abdicaremos dos dois primeiros aspectos, para nos
cingir unicamente no aspecto filosófico.

Contudo, sendo a filosofia um corpo de saberes que busca saber a totalidade do


real bem como do supra-real, apresenta três modelos, não os únicos, mas os mais
expressivos sobre a natureza e origem do conhecimento.

3.2.3.1. Teoria do conhecimento de David Hume.

Hume formulou sua teoria do conhecimento, conceptualizando dois aspetos


fundamentais, as impressões e as ideias.
 Impressões: referem-se aos dados fornecidos pelos sentidos, como, por
exemplo, as impressões visuais, auditivas, táteis, etc.

Elaborado por: Olívio Santana Página 60


11ª Classe Filosofia

 Ideias: referem às representações mentais (memória, imaginação, etc.) derivadas


das impressões.
Assim, toda ideia é uma re(a)presentação de alguma impressão. Essa
representação pode possuir diferentes graus de fidelidade. Alguém que nunca teve uma
impressão visual, um cego de nascença, por exemplo, jamais poderá ter uma ideia de
cor, ainda que seja uma ideia não muito fiel.
Crítica ao raciocínio indutivo

Sabemos de antemão que, o raciocínio indutivo vai do particular para o geral. As


condições indutivas são produzidas, portanto, pelo seguinte processo mental: partindo
de percepções repetidas que nos chegam da experiência sensorial, saltamos para
uma conclusão geral, da qual não temos experiência sensorial40.
Hume argumentou que, a conclusão indutiva, por maior que seja o número de
percepções repetidas do mesmo fato, não possui fundamento lógico. Será sempre um
salto do raciocínio impulsionado pela crença ou hábito, isto é, as repetidas percepções
de um fato nos levam a confiar em que aquilo que se repetiu até hoje irá se repetir
amanhã. Assim, por exemplo, cremos que o Sol nascerá amanhã porque até hoje ele
sempre nasceu. Mas nada pode garantir essa certeza em termos lógicos.
Para Hume, somente o raciocínio dedutivo utilizado na matemática fundamenta-
se numa lógica racional, criando assim, o cepticismo teórico, gerando por sua vez a
probabilidade das teses científicas.
3.2.3.2. Teoria do conhecimento de Aristóteles.

Discípulo de Platão por 20 anos, não obstante a este aspecto, Aristóteles diverge
substancialmente de seu mestre em vários aspectos de âmbito e, um deles prende-se
com a teoria do conhecimento. Para Aristóteles, o dualismo cosmológico platónico era
um artifício dispensável para responder à pergunta sobre o conhecimento verdadeiro, tal
como ele afirma “Nada está no intelecto que não tenha passado antes pelos sentidos”
(Aristóteles, apud, Marcondes, 2012, p.197).

Do excerto supracitado deduz-se a ideia segundo a qual todas as representações


intelectuais são consequências do contacto que o sujeito mantém com determinado
objecto. Dizer que, nossa razão não é mera receptora de estímulos/informações. É com o

40
COTRIM, Gilberto. Fundamentos de Filosofia: História e grandes temas. São Paulo, Saraiva, 2006,
pp.153-154.

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11ª Classe Filosofia

suporte dela «razão», que abstraímos, separamos, classificamos e organização objectos,


acontecimentos obedecendo determinados critérios.

Em sua obra imponente obra intitulada a Metafísica, Aristóteles capítulo


primeiro “Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer…” (Aristóteles,
1984, p. 6). Esta frase abre o debate epistemológico. Nesse processo de aquisição de
conhecimento, o órgão de sentido sobrevalorizado é a visão “uma prova disso é o
prazer das sensações, pois, fora até da sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas
e, mais que todas, as visuais” (Idem, p. 6).

Os sentidos em contacto com o mundo vão gerar a sensação, o que sentimos ao


ouvir, ver, cheirar, degustar e, estas sensações, em alguns animais geram memória. E,
esta memória nos animais permite a existência do processo de reminiscência.

Paralelamente aos animais, o homem concatena as sensações, organizam suas


lembranças pela memória e, esta por sua vez, gera a experiência. Isto só é possível
porque a razão se encarrega em ligar as memórias provenientes do acúmulo de
sensações.

3.2.3.3. Teoria do conhecimento de Immanuel Kant41.

Uma das questões mais importantes que dominam o pensamento de Kant é o


problema do conhecimento, a questão do saber. Na Crítica da razão pura, ele distingue
duas formas básicas do ato de conhecer:
 O conhecimento empírico (a posteriori): aquele que se refere aos dados
fornecidos pelos sentidos, isto é, que é posterior à experiência.
 O conhecimento puro (a priori): aquele que não depende de quaisquer dados
dos sentidos, ou seja, que é anterior à experiência, nascendo puramente de uma
operação racional. Por exemplo: duas linhas paralelas jamais se encontram no espaço
“constituindo portanto uma lei universal, referindo-se a todas as linhas paralelas”.
Este de conhecimento conduz a juízos universais e necessários, enquanto o
conhecimento empírico não possui essa característica. Os juízos, por sua vez, são
classificados por Kant em dois tipos: juízo analítico e sintético.
 Juízo analítico: aquele em que o predicado já está contido no conceito do
sujeito. Ou seja, basta analisar o sujeito para deduzir o predicado. Por exemplo: a
41
Ibidem…, pp.160-163.

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11ª Classe Filosofia

afirmação, o quadro tem quatro lados. Também considerados de juízos de elucidação,


pois o predicado simplesmente elucida algo que já estava contido no conceito sujeito.
 Juízo sintético: aquele em que o predicado não está contido no conceito do
sujeito. Nesses juízos, acrescenta-se algo de novo ao sujeito, que é o predicado. Assim,
os juízos sintéticos enriquecem nossas informações e ampliam o conhecimento.
Também denominados de juízos de ampliação. Exemplo: os corpos se movimentam.
Por mais que analisemos o conceito corpo, não extrairemos dele a informação
representada pelo predicado se movimentam.
Quanto ao valor, Kant distingue três categorias:
 Juízo analítico: como no exemplo da afirmação “o quadrado tem quatro lados”, é
um juízo universal e necessário, mas serve apenas para tornar mais claro, para elucidar
ou explicar aquilo que já se conhece do sujeito. Ou seja, a rigor, é apenas importante
para se chegar à clareza do conceito já existente, mas não conduz a conhecimentos
novos;
 Juízo sintético a posteriori: como no exemplo da afirmação. “Este livro é
verde”, amplia o conhecimento sobre o sujeito, mas sua validade está sempre
condicionada ao tempo e ao espaço em que se dá a experiência e, portanto, não constitui
um juízo universal e necessário.
 Juízo sintético a priori: como no exemplo da afirmação “A linha reta é o menor
caminho entre dois pontos”, e em outras da Matemática e da Geometria, acrescenta
informações novas ao sujeito, possibilitando uma ampliação do conhecimento.

3.2.3.4. A interpretação do processo cognitivo segundo Jean Piaget42.

Durante muito tempo se considerou que o homem, em oposição ao animal, era,


na sua essência, definível pelo pensamento acabado que possuía e do qual dispunha
sempre que necessário. Esse pensamento ter-lhe-ia sido conferido à semelhança de um
dote, e o homem nada mais teria que fazer do que, nas alturas devidas, servir-se dessa
faculdade eficaz e disponível.
Hoje, tal tese encontrasse em desuso, pois podemos afirmar com plena certeza
que o homem não é um animal que pensa do mesmo modo que o peixe é um animal que
nada ou a ave um animal que voa.

42
BELO, Malungo. Apontamentos de Teoria do Conhecimento. Luanda, Instituto Superior de Educação-
ISCED, 2013.

Elaborado por: Olívio Santana Página 63


11ª Classe Filosofia

Enquanto esses dois seres nascem como suas actividades desenvolvidas, o


homem não nasce a saber pensar.
Como surge, então, a possibilidade de pensar, instrumento necessário à
compreensão profunda do mundo?
Realçar que o pensamento não lhe é oferecido de forma acabada. De certo modo,
a possibilidade de pensar é uma conquista do próprio homem para a qual tem que
laborar activamente.
Jean Piaget, que se dedicara no estudo do desenvolvimento intelectual na
criança, estabelece fases sucessivas: sensório-motor; pré-operatório; operações
concretas e operações formais.
Período sensório-motor: com duração de dois anos (0-2), há uma inteligência
antes da linguagem, mas não há raciocínio. A inteligência é a solução de um problema
novo para o indivíduo, é a coordenação dos meios para atingir um determinado fim que
não é acessível de um modo imediato; ao passo que o raciocínio é a inteligência
interiorizada, não se apoiando já na acção directa, mas num simbolismo, na evocação
simbólica por meio da linguagem, das imagens mentais.
A criança vive através de reflexos “suga quando lhe tocam os lábios…” não tem
carácter de permanência. Repete actividades, imita os acontecimentos a sua volta. Já
fala e conhece o significado de algumas palavras.
Período pré-operatório (2 aos 7 anos), o que caracteriza esta fase é o
aparecimento da função semiótica ou simbólica que se manifesta sob várias formas,
sendo uma das mais importantes a linguagem “o desenho”.
O pensamento ainda não é lógico. É a fase do egocentrismo. Quer sempre ser o
centro das atenções. Considera os objectos como tendo vida “dar de comer a uma
boneca”
Período das operações43 concretas (7 a 11anos), nesta fase a criança é, capaz
de pensar logicamente na medida em que as suas operações intelectuais se tornaram
reversíveis. Contudo, tais operações só são susceptíveis de realização se incidirem sobre
o concreto (a montagem de um puzzle).

43
Designamos por «operações» as acções interiorizadas, isto é, executadas, já não materialmente, mas
interiormente e simbolicamente, acções que podem combinar-se de todas as maneiras e, em especial, que
podem ser invertidas, sendo, pois, reversíveis. Ora estas acções que constituem o pensamento, estas
acções interiorizadas, é preciso aprender primeiro a executá-las materialmente.

Elaborado por: Olívio Santana Página 64


11ª Classe Filosofia

Período das operações formais (11 anos a idade adulta), é este último período
no decorrer do qual, o indivíduo fica habilitado a raciocinar sobre proposições
abstractas, não tendo já necessidade da presença dos objectos concretos.

3.3. Valor, possibilidade e limites do conhecimento44.

Somos capazes de conhecer a verdade? É possível ao sujeito aprender o objecto?


Afinal, quais são as possibilidades e limites do conhecimento humano?
As respostas dadas a essas questões levaram ao surgimento de duas correntes básicas e
antagónicas na história da Filosofia.
Uma é o cepticismo, que diagnostica a impossibilidade de conhecermos a
verdade. A outra é o dogmatismo, que defende a possibilidade de conhecermos a
verdade.
Mas o que queremos dizer por verdade? Que verdade é essa da qual tratam
tantos pensadores? A palavra verdade tem o sentido básico de uma correspondência
entre o que se pensa ou se diz e a realidade que se quer conhecer ou expressar. Se
eu digo “A caneta é preta” e a caneta for realmente preta, então isso é uma verdade,
um conhecimento verdadeiro.
No entanto, quando os diversos filósofos que tratam da temática do
conhecimento falam em “conhecer a verdade” estão se referindo não só a esse sentido
básico, mas também, e principalmente, à ideia de conhecer como objecto é na sua
essência, ou seja, a realidade mesma, intrínseca, daquilo que se quer conhecer.
Nesse sentido, eles também usam a expressão o ser das coisas, ou seja, sua
realidade essencial. O que se discute aqui é que, por exemplo: a caneta pode parecer
preta a muitas pessoas, mas ser verde-azulado para outras, talvez ter outra cor
totalmente distinta ou mesmo não ter cor nenhuma. Qual será a cor verdadeira dessa
caneta? Será possível conhecer a verdade?
A essas questões forma dadas certas respostas consignadas em teses,
salientando-se as seguintes: cepticismo e do dogmatismo e, em seguida, uma terceira
doutrina, o criticismo, que tenta superar o impasse criado por essas posições
antagónicas.

44
Ibidem. p. 57.

Elaborado por: Olívio Santana Página 65


11ª Classe Filosofia

3.3.1. O cepticismo: absoluto “tudo é ilusório” e relativo “o domínio do provável”.

O ceticismo absoluto consiste em negar de forma total nossa possibilidade de


conhecer a verdade. Assim, para o ceticismo absoluto, o homem nada pode afirmar, pois
nada conhece com total certeza.
Muitos consideram o filósofo grego Górgias (485-380 a. C.), o pai do ceticismo
absoluto. Segundo ele: “o ser não existe; se existisse não poderíamos conhecê-lo; e se
pudéssemos conhecê-lo, não poderíamos comunica-lo aos outros”.
Outros estudiosos apontam o filósofo grego Pirro (365-275 a. C.) como o
fundador do cepticismo absoluto. Pirro afirmava ser impossível ao homem conhecer a
verdade devido a duas fontes principais de erro: os sentidos e a razão.
Os sentidos: segundo Ele, nossos conhecimentos são provavelmente dos
sentidos (visão, audição, olfacto, tacto, paladar). Mas estes não são dignos de confiança,
pois podem nos induzir ao erro.
A razão: para Pirro, as diferentes e contraditórias opiniões manifestadas pelas
pessoas sobre os mesmos assuntos revelam os limites de nossa inteligência. Jamais
alcançaremos certeza de qualquer coisa.
Os críticos do cepticismo consideram-no uma doutrina radical, estéril e
contraditória. Radical porque nega totalmente a possibilidade de conhecer. Estéril
porque não leva a nada. Contraditória porque, ao dizer que nada é verdadeiro, acaba
afirmando que existe algo de verdadeiro, isto é, o conhecimento de que nada é
verdadeiro. Então, aqueles que duvidam plenamente da nossa possibilidade de conhecer,
ironiza o filósofo Jacques Maritain, “só poderiam filosofar guardando um silêncio
absoluto – mesmo no interior de suas almas”.
Cepticismo relativo, consiste em negar apenas parcialmente nossa capacidade
de conhecer a verdade, ou seja, apresenta uma posição moderada em relação às
possibilidades de conhecimento, comparada ao cepticismo absoluto.
Entre as doutrinas que manifestam um cepticismo relativo, destacamos as seguintes:
subjectivismo e relativismo.
Subjectivismo: considera o conhecimento uma relação puramente subjectiva e
pessoal entre o sujeito e a realidade percebida. O conhecimento limita-se às ideias e
representações elaboradas pelo sujeito pensante, sendo impossível alcançar a
objectividade.

Elaborado por: Olívio Santana Página 66


11ª Classe Filosofia

O subjectivismo nasce com o pensamento do grego Protágoras, sofista do


século V a.C., que dizia que o homem é a medida de todas as coisas, ou seja, a
verdade é uma construção humana, ela não está nas coisas.

3.3.2. O dogmatismo.

Uma doutrina é dogmática quando defende, de forma categórica, a


possibilidade de atingirmos a verdade. Dentro do dogmatismo, podemos distinguir
duas variantes básicas: o dogmatismo ingénuo e o crítico.
O dogmatismo ingénuo é predominante no senso comum, confia plenamente
nas possibilidades do nosso conhecimento. Não vê problema na relação sujeito
conhecedor e objecto conhecido. Crê que, sem grandes dificuldades, percebemos o
mundo tal qual ele é.
O crítico defende nossa capacidade de conhecer a verdade mediante um esforço
conjugado de nossos sentidos e de nossa inteligência. Confia que, através de um
trabalho metódico, racional e científico, o ser humano se torna capaz de conhecer a
realidade do mundo.

Valor do conhecimento
Este debate é travado por duas correntes. Uma delas é o absolutismo, que afirma
não só a objectividade do conhecimento, como também lhe confere um valor absoluto.
Portanto, não restam dúvidas sobre o valor do conhecimento e não apresenta nenhum
limite. Do outro lado, temos o relativismo. Este atribui valor simplesmente relativo ao
conhecimento, quer em função ao sujeito cognoscente, quer em função do objecto
conhecido.

3.3.3. O relativismo.

Entende que não existem verdades absolutas, mas apenas verdades relativas, que
têm uma validade limitada a um certo tempo, a um determinado espaço social, enfim, a
um contexto histórico.

O relativismo tem várias subdivisões, nomeadamente:


O relativismo sensorial dos sofistas - segundo Protágoras Século V a. C.), o
Homem é a medida de todas as coisas, o que quer dizer que todo o conhecimento é
relativo, isto é, depende do sujeito cognoscente.

Elaborado por: Olívio Santana Página 67


11ª Classe Filosofia

O relativismo positivista - para Augusto Comte, pai do positivismo, nenhum


conhecimento que ultrapassa a experiência é possível e, por conseguinte, tão pouco
poderia ser válido ou certo, trata-se de um relativismo objectivo;

3.3.4. O pragmatismo.

Propõe uma concepção dos homens como seres práticos, activos, e não apenas
como seres pensantes. Por isso, abandonam a pretensão de alcançar a verdade,
entendida como a correspondência entre o pensamento e a realidade. Para o
pragmatismo, o conceito de verdade deve ser outro: verdadeiro é aquilo que é útil,
que dá certo, que serve aos interesses das pessoas na sua vida prática.
Nesse sentido, a verdade não seria correspondência do pensamento com o
objecto, mas a correspondência do pensamento com o objectivo a ser atingido.

3.4. Importância e perigo do conhecimento científico do século XX: Círculo de


Viena.

O Círculo de Viena consistiu em um grupo de filósofos e cientistas que se


reuniram regularmente em Viena desde o início do século XX, sob a liderança de
Moritz Schlick (1882-1936), Otto Neurath (1882-1945) E Rudolph Carnap (1891-1970),
com o objectivo de desenvolver um projecto de fundamentação das teorias científicas
em uma linguagem lógica, e discutir questões filosóficas através de uma análise lógica
rigorosa que levasse à solução, ou melhor, a dissolução dessas questões tal como
formuladas tradicionalmente.
O Círculo de Viena desenvolveu o neopositivismo, também denominado
positivismo lógico ou ainda empirismo lógico, que pretendeu formar uma concepção
científica do mundo e se opunha às especulações.
Em suas reflexões acerca do procedimento científico, enfatizou as exigências de
clareza e precisão e propôs o critério da verificabilidade para validar uma teoria
científica. Em outras palavras, a teoria deveria, para ser aceita como verdadeira, passar
pelo crivo da verificação empírica45.

45
COTRIM, Gilberto. São Paulo, Saraiva, 2006, p. 229.

Elaborado por: Olívio Santana Página 68


11ª Classe Filosofia

3.4.1. Problema da cultura científico-tecnológica.

3.5. Atitude da inteligência perante a verdade.

Muito embora o objecto da inteligência seja a verdade, esta nem sempre lhe
aparece clara e, por vezes, só passando por diversos estados é que chega a adquiri-la e
mesmo assim com grande esforço.
São quatro os principais estados do espírito em relação à verdade de um
enunciado: a verdade pode apresentar-se-lhe como se não existisse – é o estado de
ignorância; pode aparecer-lhe como possível – é o estudo de dúvida; pode surgir-lhe
como provável – é o estado de opinião; e, finalmente, pode deparar-se-lhe como
evidente - é o estado de certeza.
Ignorância: é a ausência de todo o conhecimento relativamente a um enunciado.
Ela pode ser vencível ou invencível, consoante está ou não em nosso poder fazê-la
desaparecer; culpável ou inculpável, conforme termos ou não o dever de a dominar.
Dúvida: é um estado de equilíbrio entre a afirmação e a negação. O espírito não
adere, ou porque os motivos para afirmar e negar-se equilibram “dúvida positiva” ou
não se equilibram, mas ao são suficientes para excluir o medo de errar “ainda dúvida
positiva”; ou não tem razão alguma nem para negar, nem para afirmar “dúvida negativa
que equivale à ignorância”.
As principais espécies de dúvida são a metódica46 ou cartesiana e a sistemática47
ou céptica.
Opinião: é a adesão receosa do espírito à afirmação ou à negação de um
enunciado.
Certeza: é a adesão firme e inabalável do espírito a uma verdade conhecida,
sem receio de errar. Ela supõe, pois, a manifestação completa da verdade, isto é da
conformidade do enunciado com a realidade, emitindo um juízo seguro. Esta
manifestação faz-se mediante a evidência, que é o motivo e o fundamento da certeza
como a probabilidade é o motivo da opinião.

46
Esta modalidade de dúvida consiste na suspensão voluntária, fictícia ou real, mas sempre provisória, do
assentimento a uma verdade tida por certa, com o fim de verificar o seu valor (RIBEIRO, J. Bonifácio e
da Silva, José. Compêndio de Filosofia. Lisboa, Cogito Ergo Sum, 10ª edição, p. 449).
47
A dúvida céptica é o estado definitivo do espírito relativamente a toda a verdade (Idem…, p. 449).

Elaborado por: Olívio Santana Página 69


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3.5.1. Critérios da verdade.

Dá-se o nome de critério, em geral, ao sinal pelo qual distinguimos uma coisa de
outra. Por isso, quanto ao conhecimento, é a norma pela qual distinguimos o
conhecimento verdadeiro do falso; é o sinal que nos permite reconhecer a verdade da
falsidade – critério da verdade. E, visto que, quando sabemos que estamos de posse da
verdade, aderimos sem medo de errar, o mesmo sinal que nos permite reconhecer a
verdade é também critério da certeza.
Entretanto, cada ordem de verdades tem o seu critério próprio. Assim, as
verdades históricas possuem um critério histórico, as matemáticas, um critério moral.
Mas, além destes, existe um critério supremo para toda a espécie de verdades. Este e a
evidência que é o motivo último de toda a certeza.
No entanto, perante tal realidade, pergunta-se se a evidência deve ser
considerada um critério da verdade ou se é a própria verdade. Parece-nos que a
evidência não se distingue da própria verdade: é a verdade enquanto se manifesta ao
espírito. A verdade não tem portanto, outro critério senão ela mesma: a luz que incide
sobre os objectos permite ver estes e vê-la a ela própria.
A evidência é a clareza com que a verdade se impõe ao nosso espírito; é uma
espécie de luz que ilumina a realidade e nos permite ver que aquilo que temos no
espírito está conforme a essa mesma realidade patenteada.
A evidência é, pois, motivo supremo da certeza. Tudo o que é evidente é
necessariamente verdadeiramente; e tudo que é verdadeiro é evidente, ou pelo menos
devemos, através da demonstração, procurar atingir essa evidência.
Não devemos confundir «evidência» com «certeza», porque a evidência é
objectiva e a certeza é subjectiva; é um estado do espírito provocado pela evidência.
Não pode haver certeza sem evidência, nem evidência sem certeza; por
conseguinte, estes termos são correlativos, como a possibilidade é correlativa da dúvida
e a probabilidade da opinião.

Elaborado por: Olívio Santana Página 70


11ª Classe Filosofia

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 MONDIN, Battista (2006), Introdução à filosofia, 13ª edição, Paulus, São Paulo.
 MONDIN, Battista (2011), O homem, quem é ele?14ª edição, Paulus, São Paulo.
 BERTEN, A. (2004), Filosofia social, 2ª edição, Paulus, São Paulo.
 MARCONDES, Danilo (2012), Iniciação à história da filosofia: Dos pré-
socráticos a Wittgenstein, 13ª edição, Zahar editora, Rio de Janeiro.
 TEIXEIRA, Evilázio F. Borges (2006), A educação do homem segundo platão,
4ª edição, Paulus, São Paulo.
 COTRIM, Gilberto (2006), Fundamentos da Filosofia: História e grandes temas.
São Paulo, Saraiva.
 COSTA, PaoloDalla (1998), Teologia moral fundamental, Arquidiocese de
Luanda, Luanda.
 VEIGA, Américo Martins (2005), A educação hoje: A realização integral e feliz
da pessoa humana, 7ª edição, Vila nova de Gaia.
 GIORDANI, Mário Curtis (1969), Hístória da antiguidade oriental, 10ª edição,
Vozes editora, Rio de Janeiro.
 CHAUÍ, Marilena (2000), Convite à Filosofia, Editora Ática, São Paulo.

Elaborado por: Olívio Santana Página 71


11ª Classe Filosofia

SUMÁRIOdo
Iº - EMERGÊNCIA DO FILOSOFAR ............................................................................ 1
1.1. O que é Filosofia? Diversas maneiras de defini-la. ............................................... 1
1.2. Objecto, método e função da Filosofia. ................................................................. 3
1.3. Atitude filosófica vs atitude natural. ...................................................................... 4
1.4. Natureza das questões filosóficas. ......................................................................... 5
1.5. Divisão da Filosofia ............................................................................................... 6
1.5.1. Os diferentes períodos da filosofia. ................................................................. 8
1.6. Relação da filosofia com outros saberes ................................................................ 9
1.7. Mito e Filosofia .................................................................................................... 10
1.8. Dimensão discursiva do trabalho filosófico: a filosofia e a argumentação ......... 13
2.1 – DIMENSÃO ANTROPOLÓGICA, CULTURAL E ÉTICA DO HOMEM ........ 15
2.1.1 – NATUREZA E ESSÊNCIA DO HOMEM .................................................... 17
2.2 – A Pessoa Humana .............................................................................................. 18
2.2.1 – Vínculos éticos da pessoa: Amor, Ódio, Indiferença e Sofrimento. ........... 18
2.3. O homem como produto e produtor da cultura .................................................... 22
2.3.1. A Cultura e o Homem ................................................................................... 23
2.4. O homem perante a situação de limite: morte ..................................................... 25
1.5. Problemática dos valores: .................................................................................... 27
1.5.1. Definição de valor. ........................................................................................ 27
3.5.2 Classificação dos valores. .............................................................................. 28
2.5.2.1. Hierarquia de valores ................................................................................. 28
2.5.2.2. Polaridade dos valores ................................................................................ 29
2.5.2.2.1. Historicidade dos valores ........................................................................ 30
Objectividade e subjectividade dos valores ................................................................ 30
2.5.4. Crise de valores no mundo contemporâneo. ..................................................... 31
2.5.5.Resgate dos valores cívicos e morais no mundo contemporâneo ...................... 32
2.5.6. DIMENSÃO ÉTICO – POLÍTICA DOS VALORES: ..................................... 33
2.5.7 Normas e valores morais.................................................................................... 33
2.6. Origem e natureza da consciência moral: liberdade e responsabilidade. ............ 33
2.6.1 Sociedade, liberdade e pessoa. ........................................................................... 40

Elaborado por: Olívio Santana Página 72


11ª Classe Filosofia

2.7.1. Ética, Estado E direito. ..................................................................................... 41


2.7.2. Ética ambiental/ecológica ................................................................................. 43
2.8. Direitos humanos ................................................................................................. 49
2.9. Experiência religiosa............................................................................................ 51
3.TEORIA DO CONHECIMENTO ............................................................................... 53
3.1.2. A estrutura do acto do conhecimento e a dicotomia sujeito-objecto. ............... 54
3.1.3. As correntes filosóficas sobre a origem do conhecimento: racionalismo e
empirismo ................................................................................................................... 55
3.1.3.1. O racionalismo. .......................................................................................... 55
3.1.3.2. O empirismo. .............................................................................................. 57
3.1.3.2.1. Posição de síntese: apriorismo kantiano.................................................. 58
3.2. NATUREZA DO CONHECIMENTO ................................................................ 59
3.2.1. O realismo. .................................................................................................... 59
3.2.2. O idealismo. .................................................................................................. 60
3.2.3. Três modelos explicativos do conhecimento. ................................................... 60
3.2.3.1. Teoria do conhecimento de David Hume. .................................................. 60
3.2.3.2. Teoria do conhecimento de Aristóteles. ..................................................... 61
3.2.3.3. Teoria do conhecimento de Immanuel Kant. ............................................. 62
3.2.3.4. A interpretação do processo cognitivo segundo Jean Piaget...................... 63
3.3. Valor, possibilidade e limites do conhecimento. ................................................. 65
3.3.1. O cepticismo:................................................................................................. 66
3.3.2. O dogmatismo. .............................................................................................. 67
3.3.3. O relativismo. ................................................................................................ 67
3.3.4. O pragmatismo. ............................................................................................. 68
3.4. Importância e perigo do conhecimento científico do século XX: Círculo de
Viena. ...................................................................................................................... 68
3.4.1. Problema da cultura científico-tecnológica. .................................................. 69
3.5. Atitude da inteligência perante a verdade. ........................................................... 69
3.5.1. Critérios da verdade. ..................................................................................... 70
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ....................................................................... 71

Elaborado por: Olívio Santana Página 73

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