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Ateísmo Existencialista

O existencialismo de Sartre

O existencialismo de Sartre é um projecto ambicioso: a interpretação total do


mundo. Baseado principalmente na fenomenologia de Husserl e em 'Ser e
Tempo' de Heidegger, o existencialismo sartriano procura explicar todos os
aspectos da experiência humana. A maior parte deste projeto está
sistematizada em seus dois grandes livros filosóficos: "O ser e o nada" e
"Crítica da razão dialética".

O Em-si
Segundo a fenomenologia e o existencialismo, o mundo é povoado de seres
Em-si. Podemos entender um Em-si como qualquer objeto existente no mundo
e que possui uma essência definida. Uma caneta, por exemplo, é um objeto
criado para suprir uma necessidade: a escrita. Para criá-lo, parte-se de uma
ideia que é concretizada, e o objeto construído enquadra-se nessa essência
prévia. Um ser Em-si não tem potencialidades nem consciência de si ou do
mundo. Ele apenas é. Os objetos do mundo apresentam-se à consciência
humana através das suas manifestações físicas (fenómenos).

O Para-si

A consciência humana é um tipo diferente de ser, por possuir conhecimento a


seu próprio respeito e a respeito do mundo. É uma forma diferente de ser,
chamada Para-si. É o Para-si que faz as relações temporais e funcionais entre
os seres Em-si e ao fazer isso constrói um sentido para o mundo em que vive.
O Para-si não tem uma essência definida. Ele não é resultado de uma idéia
pré-existente. Como o existencialismo sartriano é ateu, ele não admite a
existência de um criador que tenha predeterminado a essência e os fins de
cada pessoa. É preciso que o Para-si exista, e durante essa existência ele
define, a cada momento o que é sua essência. Cada pessoa só tem como
essência imutável, aquilo que já viveu. Posso saber que o que fui se definiu por
algumas características ou qualidades, bem como pelos atos que já realizei,
mas tenho a liberdade de mudar minha vida deste momento em diante. Nada
me compele a manter esta essência, que só é conhecida em retrospecto.
Podemos afirmar que meu ser passado é um Em-si, possui uma essência
conhecida, mas essa essência não é predeterminada. Ela só existe no
passado. Por isso se diz no existencialismo que "a existência precede e
governa a essência". Por esta mesma razão cada Para-si tem a liberdade de
fazer de si o que quiser.

A liberdade

Em decorrência disso, uma das afirmações mais conhecidas de Sartre é que o


ser humano está condenado à liberdade. Isso significa que cada pessoa pode a
cada momento escolher o que fará de sua vida, sem que haja um destino
previamente concebido. Ao invés disso, as escolhas de cada um são
direcionadas por projetos. Há vários tipos de projeto, como escrever um artigo
na Wikipedia ou comprar uma casa, mas Sartre considerava que todas as
pessoas são movidas por um projeto fundamental, o projeto de auto-realização,
da transcendência. Todos temos o sonho de sermos pessoas que já realizaram
todas as suas potencialidades, todos os projetos. Um ser que realizou tudo o
que podia esgota suas potencialidades, torna-se um Em-si. Isso pode
acontecer, por exemplo quando morremos. Nesse momento a consciência
deixa de existir, e nos tornamos um ser de essência conhecida, completo e
acabado. Mas a morte é uma contingência, algo que acontece sem que
possamos evitar e impede a concretização de nossos projetos. Não é a morte a
transcendência desejada. Sartre nos diz que o projeto fundamental é tornar-se
um ser que já realizou tudo, mas preserva sua consciência, um ser Em-si-Para-
si. Tal ser corresponde à noção que temos de Deus, um ser completo, sem
limitações e com todas as suas potencialidades já realizadas, mas ainda
consciente de si e do mundo. Em outras palavras, para Sartre, o homem é um
ser que "projeta tornar-se Deus".

A liberdade é que torna possível escolher dentre todas as alternativas


possíveis, aquela que vai nos levar a um caminho mais curto em direção ao
projeto fundamental. Obviamente as pessoas estão sujeitas a limitações e
contingências. Ela não pode sobrepujar seu limite físico e escolher que a partir
de agora pode voar, mas pode agir, apesar destas limitações. Sartre explica
que isso não diminui a liberdade. Pelo contrário, são as limitações que tornam
a liberdade possível, pois se pudéssemos realizar instantaneamente qualquer
coisa que quiséssemos, nós estaríamos no universo do sonho. No mundo real,
são as limitações que me impõem escolhas. Mesmo um homem preso a uma
cama pode ter a liberdade de querer se curar e andar. Esta é, para Sartre, a
verdadeira liberdade da qual nenhum homem pode escapar: "não é a liberdade
de realização, mas a liberdade de eleição". O importante não é o que o mundo
faz de você, mas o que você faz com aquilo que o mundo fez de você. Uma
conhecida fala de Sartre sobre a liberdade é esta:" Uma vez que a liberdade
explode no peito de um homem, contra este homem nada mais podem os
deuses"

A responsabilidade

Cada escolha carrega consigo uma responsabilidade. Se escolho ir a algum


lugar, falar alguma coisa, escrever um artigo, tenho que ter consciência de que
qualquer conseqüência desses atos terá sido resultado de minha própria
escolha. E cada escolha ao ser posta em ação provoca mudanças no mundo
que não podem ser desfeitas. Não posso, segundo o existencialismo, atribuir a
responsabilidade por estes atos a nenhuma força externa, ao destino ou a
Deus. Em cada momento, diante de cada escolha que faço, torno-me
responsável não só por mim, mas por toda a humanidade. E faço isso por
minha própria escolha, para que o mundo se torne mais como eu o projetei. Eis
a essência da responsabilidade segundo os existencialistas: eu, por minha
vontade e escolha ajo no mundo e afeto o mundo todo. É uma
responsabilidade da qual não podemos fugir. Ser livre também tem que ser
responsável, liberdade so dá certo quando o indivíduo age com
responsabilidade.

A angústia

A responsabilidade por todo o mundo é um fardo pesado para qualquer


pessoa. A angústia existencial decorre da consciência de que são as escolhas
dessa pessoa que definem o que ela é ou se tornará. E também por saber que
estas escolhas podem afetar, de maneira irreparável, o próprio mundo. A
"angústia" decorre portanto, da consciência da liberdade e do receio de usar
essa liberdade de forma errada.

É muito mais fácil acreditar que existe um plano, um propósito no universo, e


que nossos atos são guiados por uma mão invisível em direção a esse
propósito. Neste caso, meus atos não seriam responsabilidade minha, mas
apenas o meu papel em um roteiro maior. Mas Sartre nos dá mais um de seus
conceitos em oposição a essa crença: Não há um propósito ou um destino
universal. E o homem diante desta constatação se desalenta. O desalento é a
constatação de que nada fora de nós define nosso próprio futuro. Apenas
nossa liberdade.
A má-fé

Segundo Sartre, a má-fé é uma defesa contra a angústia e o desalento, mas


uma defesa equivocada. Pela má-fé renunciamos à nossa própria liberdade,
fazendo escolhas que nos afastam do projeto fundamental, atribuindo
conformadamente estas escolhas a fatores externos, ao destino, a Deus, aos
astros, a um plano sobre humano. Sartre também considerava a idéia freudiana
de inconsciente como um exemplo de má-fé.

Ma-fé, no existencialismo, não é mentir para outras pessoas, mas mentir para
si mesmo e permitir-se fugir de sua própria auto-determinação.

Quando Sartre refere-se à má-fé, ele o faz no sentido de que a mesma


compreende mentir para si próprio. Porém, o fato de não utilizá-la leva o
indivíduo à angústia uma vez que ele não mente mais para si, tendo
consciência de que tudo aquilo que lhe ocorrera em vida é atribuído às suas
escolhas, somadas evidentemente às suas limitações naturais, socilógicas,
econômicas, históricas e culturais. Assim, não há como responsabilizar o
destino ou qualquer providência divina pelos acontecimentos de sua vida. Diria
Sartre: "Estamos sós e sem desculpas".
Ao abandonar a má-fé, o homem passa a viver em angústia, pois ele deixa de
se enganar. Esta passagem do estado de má-fé para a o de angústia é
extremamente importante para que o sujeito possa encontrar sua liberdade no
âmbito metafísico.

Sartre e Kant: convergências

Immanuel Kant afirma que o ser racional tem a causalidade na vontade da


mesma maneira como nos irracionais é a necessidade natural. Isso porém não
serve para demonstrar a essência da liberdade do ser racional (Fundamentos
da Metafísica dos Costumes, p. 101). Partindo da física mecânica onde a
relação causa-conseqüência é dado universal, a vontade autônoma seria a
causa, e a liberdade, a conseqüência. Assim, a vontade está submetida à lei
moral ou o imperativo categórico, e, desta forma Kant, define sua máxima "age
de modo que a máxima de tua vontade possa valer sempre, ao mesmo tempo,
como princípio de legislação universal" tornando o dever uma possibilbidade.
Num hipotético diálogo entre Sartre e Kant, o pensador francês diria ser mera
ilusão a natureza humana, pois o homem é projeto inacabado de si mesmo,
inserido num mundo absurdo e fadado a uma condição intransponível: ser livre!
Partindo disso, deve-se entender que o ser livre é condição universal humana e
esta condição não resulta em outra coisa senão o querer, sujeito livre, almejar
a liberdade de todos os homens. Ambos colocam o ser humano na condição de
sujeitos que não podem agir em conformidade com a má-fé, seja pelo dever ou
pela liberdade.´´ O inferno são os outros``

Críticas ao existencialismo sartriano

O existencialismo ateu de Sartre, por sua natureza avessa aos dogmas da


igreja e da moral constituída, atraiu muitos grupos que viam na defesa da
liberdade e da vida autêntica um endosso à vida desregrada - obviamente, por
um erro na compreensão do que há de essencial na concepção de liberdade
elaborada pelo filósofo francês. Por razões semelhantes foi vista por muitos
como uma filosofia nociva aos valores da sociedade e à manutenção da ordem.
Seria uma filosofia contra a humanidade. Esta é uma das razões porque toda a
obra de Sartre foi incluída no Index de obras proibidas pela Igreja Católica.

Sartre responde a isso na conferência "O existencialismo é um humanismo" em


que afirma que o existencialismo não pode ser refúgio para os que procuram o
escândalo, a inconseqüência e a desordem. O movimento, segundo este texto,
não defende o abandono da moral, mas a coloca em seu devido lugar: na
responsabilidade individual de cada pessoa. O existencialismo prega uma
moral laica em que nossas escolhas não são determinadas pelo medo da
punição divina, mas pela consciência de nossa responsabilidade.

No meio acadêmico, o existencialismo foi criticado por tratar exclusivamente de


questões ontológicas, e por sua defesa da auto-determinação. O
existencialismo seria uma filosofia excessivamente preocupada com o
indivíduo, sem levar em conta os fatores sócio-econômicos, culturais e os
movimentos históricos coletivos que, segundo o marxismo e o estruturalismo,
determinam as escolhas e diminuem a liberdade individual.

Em resposta a esta crítica, Sartre fez alterações ao seu sistema, e escreveu "A
crítica da razão dialética" como tentativa de compatibilizar o existencialismo ao
marxismo. Dos dois tomos planejados, apenas o primeiro foi publicado em vida
em 1960. O segundo tomo, inacabado, foi publicado postumamente. Neste
texto, afirma que "o marxismo é a filosofia insuperável de nosso tempo", e
admite que enquanto a humanidade estiver limitada por leis de mercado e pela
busca da sobrevivência imediata, a liberdade individual não poderia ser
totalmente alcançada.

Não se pode negar sua duradoura influência sobre os mais variados ramos do
conhecimento humano. Por ser muito voltado à discussão de aspectos
formadores da personalidade humana, o existencialismo exerceu influência na
psicologia de Carl Rogers, Fritz Perls, R. D. Laing e Rollo May. Na literatura,
influenciou a poesia da Geração Beat, cujos maiores expoentes foram Jack
Kerouac, Allen Ginsberg e William S. Burroughs, além dos dramaturgos do
chamado Teatro do absurdo. Sartre prova sua relevância até na TV
contemporânea, onde o cultuado produtor Joss Whedon costuma inserir o
existencialismo em seus projetos Buffy, a Caça Vampiros, Angel e Firefly - o
que, através da repetição descontextualizada dos jargões existencialistas,
acaba por contribuir para a incompreensão e reforça preconceitos já existentes.
Através de suas contribuições à arte, Sartre conseguiu inserir a filosofia na vida
das pessoas comuns. Esta continua a ser sua maior contribuição à cultura
mundial.

Wikipédia - Sartre

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MAR C AD OR ES:   ATEÍSMO

8 COMENTÁRIOS:

dori disse...

cara,seu blog é mt bom,mesmo.!!!!


parabéns!!!
obrigada por postar sobre a definição do existencialismo.
esclareceu algumas dúvidas minhas.
ass:bruna

13 DE SETEMBR O D E 2 0 08 08 :5 0

nilton disse...

Oi beleza 
sou João, faço faculdade de Filosofia em Manaus 
essa sintese está bem elaborado gostei ... muito bom mesmo 
estou fazendo a minha monografia sobre o Existencialismo segundo
Sartre. 
gostei ,,,,

8 D E OU TU BR O D E 2 00 9 13 :0 7

Giovanni disse...

Cara gostei muito do seu blog ! não sou nenhum crítico ou estudante
formal de filosofia, mas achei realmente muito bom.
Deliciosa leitura para quem quer conhecer ^^.

obrigado.

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