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Disciplina: clínica cirúrgica II

Professor: Lucineide
Data da Aula: 09/08/2019 Aula 4 – NPC 1

ABORDAGEM INICIAL AO ABDOME AGUDO


Esse tema é de extrema importância, pois é a queixa principal que encontramos no nosso pronto-socorro.

ANATOMIA E TOPOGRAFIA PERITONIAL

É a partir do peritônio que se inicia esse processo infeccioso.


Relembramos que ele reveste toda a nossa cavidade
abdominal. Temos o peritônio parietal, que forma várias dobras na nossa cavidade para revestir os órgãos e o
visceral. Tem uma superfície formada por membrana mesotelial que mede cerca de 1,8 metros e recobre ambos os
peritônios.

Isso nos orienta para entendermos a característica da dor que, no início é mal delimitada e depois se torna mais
localizada. O líquido produzido é em torno de 100 ml. Geralmente é estéril, se comporta como se fosse um
lubrificante e há a presença de células de defesa (macrófagos, células mesoteliais e linfócitos). Esse é depurado e é
devolvido principalmente nas porções mais altas da cavidade.

Como ocorre a inflamação? Cai bactéria, vírus ou fungo dentro da cavidade peritoneal; ocorre produção de líquido
(exsudato) que contém céls. de defesa que tentam combater esse microrganismos. Se não consegue combater,
aumenta a cascata de produção do exsudato e gera o processo infeccioso chamado de peritonite.

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PERITONITES

A primária geralmente temos um substrato que é a ascite, alguma coisa aconteceu para levar a produção
exacerbada desse líquido. Na secundária, há rompimento de alguma estrutura do trato gastrointestinal. Na
terciária, realizou-se os tratamentos adequados, mas não foi possível combater esse processo infeccioso,
ocorrendo uma perpetuação do mesmo.

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Corpo (Calibri – 11 – Justificado)

Quando as bactérias começam a se proliferar a cavidade abdominal, elas produzem um substrato que é o pus
(bactérias e cels. Mortas) que irá formar um abcesso intra-abdominal. Esse pode estar localizado (contido) naquela
área acometida ou pode ocorrer em múltiplos órgãos. Além de poder ocorrer tanto na primária quanto na
secundárias.
Exemplo de peritonite não complicada: Apendicite e o paciente está na fase 1 e 2, mas ainda não ocorreu necrose e
perfuração, está restrito aquela estrutura.
Na complicada, há a contaminação da cavidade no geral. Rompeu o substrato anatômico. Pode está localizada na
cavidade abdominal ou difusa por outras partes do organismo (sepse).

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Existe também empiema pleural. O fleimão ocorre quando o organismo forma a cavidade e isso estará
obstruído pelo processo inflamatório com as alças intestinais, omento – tecido gorduroso – que tentam
bloquear o desenvolvimento dessa infecção.

Quando eu sei o foco da infecção, eu parto para a intervenção apropriada que na maioria das vezes é
cirúrgica. No entanto, quando eu realizo toda a primeira etapa de pesquisa e propedêutica indicada e não
descubro o foco, o exame de imagem indicado é a TC, que pode ou não identificar a fonte. Se não foi
possível desvendar, o paciente passará por exames seriados, tanto laboratoriais como o físico, para
acompanhar a evolução do quadro (pode aparecer rigidez abdominal, dor mais localizada). Nesses casos
não elucidativos temos que lembrar de uma doença importante, comum em idosos e de grandes
repercussões se diagnóstico tardio, que é a isquemia mesentérica que leva a grande necrose na cavidade.

PROPEDÊUTICA ATUAL DO ABDOME AGUDO


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Síndrome dolorosa aguda, de intensidade variável, que leva o doente a procurar assistência médica e requer tratamento imediato,
clínico ou operatório

 Primeiro vamos caracterizar se é um abdome


agudo ou é uma dor de outra etiologia
O abdome agudo é uma síndrome, além da dor, haverá
outros sinais e sintomas a acompanhando. Associar
história clínica + exame físico.

 Exame Físico
 as principais causas de erro na conclusão do diagnóstico do abdome agudo são a história e exame
físico incompletos Procurar por dor, febre, ruídos hidroaéreos, sinais peritoniais (descompressão
brusca dolorosa, localizada ou difusa) toque retal e exame ginecológico.

*Toque retal faz parte da semiologia clínica, não é para especialista e todos devem saber!

DOR
Pode ser classificado em 5 tipos de acordo com a dor e evolução:

O inflamatório geralmente começa com uma dor (mal-estar) mal definida, mais arrastada. A obstrução
causa dor em cólica pelo aumento da peristalse tentando vencer o obstáculo, e o tempo é variado, pois
podemos ter uma obstrução aguda ou uma mais arrastada. A perfurativa, hemorrágica e vascular têm a
característica em comum de ser uma dor súbita. Como diferencia-las? No perfurativo, essa dor se torna
difusa rapidamente, pois há presença de conteúdo muito irritativo na cavidade (perfuração de úlcera
péptica, gástrica ou duodenais são as mais comuns); há contratura involuntária (abdome em taboa). Já
no hemorrágico (rompimento de cisto ovariano, ruptura de baço ou vaso), o sangue inunda o peritônio,
mas demora para ser tão irritativo; começa mais moderada e vai evoluindo. A vascular é a mais difícil
de todas, pois acomete o peritônio visceral e a dor não é localizada; como o peritônio parietal não é
acometido, o paciente diz que está com dor intensa e não se encontra ao toque do exame físico.
Quando se encontra irritação peritoneal, já evoluiu muito mal.

*Dúvida do aluno: Na angioTC será visível falha de enchimento nos vasos, ar dentro da veia porta ou edema de alça
intestinal (ela disse que isso será melhor abordado nas próximas aulas)

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Notem as as duas principais são: Apendicite aguda no jovem e colecistite aguda no idoso

FEBRE
 Pode ou não estar associada às infecções abdominais
 Sensibilidade e especificidade variáveis
 Não distingue doenças do idoso e do não idoso
Atenção em idosos e imunodeprimidos que podem não apresenta-la.

RUIDOS HIDROAÉREOS
 Podem auxiliar na avaliação da dor abdominal
 Ruídos hidroaéreos anormais = abdome agudo obstrutivo
 Idosos com dor abdominal e ruídos hidroaéreos anormais apresentam frequentemente doença grave

Antes de palpar, fazer ausculta.


Pode ter peristalse de luta ou silencia abdominal (fase mais tardia, alsas paralisadas).
Qual é o tipo que teremos essa clínica mais exuberante na ausculta? O Obstrutivo

SINAIS PERITONEAIS
É um dos mais importante, pois nos ajuda a pensar se é cirúrgico na localização
 Dor na descompressão brusca do abdome
Sensibilidade 81% e especificidade 50% para peritonites
 Descompressão brusca em FID
Sensibilidade 82% e especificidade 90% para apendicite aguda
 Contratura muscular
É o sinal mais importante possui substrato fisiopatológico, é permanente significa irritação do peritônio
parietal. Pode ser voluntária e a involuntária
Exemplo clássico – úlcera perfurada
 Se for mulher pode ser gravidez ectópica, torção de cisto de ovário ou rotura, DIP (o toque
ginecológico distingue, há leucorreia e dor no colo uterino).

TOQUE RETAL
Perguntar se houve alteração do hábito intestinal, se houve diarreia, se há sangue nas fezes...
 sensibilidade do peritôneo pélvico
 presença de fezes na ampola
 presença de sangue
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 fecaloma
 tumores de reto
Exemplo: pct com dor abdominal na FID e no toque retal, ao palpar fundo de saco anterior, ele relata muita dor;
pode ser uma apendicite retrocecal. Outro caso importante é o quadro clássico de obstrução em idoso: Distensão
abdominal, vômitos, RX cheio de alças edemacias e empilhamento de moedas presente e você manda para cirurgia
sem o toque retal, e na verdade era somente um fecaloma.

EXAME GINECOLÓGICO
 pelviperitonite
 gravidez
 prenhez tubária
 cistos ovarianos
 sensibilidade pélvica

Quadro com as principais causas de abdome agudo:

LABORATÓRIO
Hemograma completo – níveis de leucócitos, hematócrito e hemoglobina (sangramento), eosiofilia
(ascaris).

EAS – se houver piúria até que se prove o contrário com dor na FID pode ser apêndicite, pois há contati
com o peritônio do ureter e transloca bactérias. (febre e jordano +, hematúria pode ser pielonefrite)

PCR – marcador de necrose (pancreatite)

Coagulograma

Função hepática – não é sempre necessária, mas pode haver colesistote com obstrução do sitema biliar
havendo alteração de TGO, TGP, gamaGT e fosfatase alcalina.

Após coletar uma história perfeita e um exame físico minucioso; nem sempre ele chega com uma irrtação peritonial
clássica! Qual o exame de imagem inicial a ser solicitado ?

Radiografia Abdominal
 Rotina radiológica do abdome agudo
Composta por três incidências básicas:
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Antero-Posterior (AP) de abdome em decúbito dorsal;

Antero-Posterior (AP) de abdome em ortostase;

Póstero-anterior (PA) de tórax em ortostase.

No de tórax eu busco pneumoperitôneo em abdome agudo perfurativo. Outro exemplo seria uma
pneumonia que irrita o diafragma e pode refletir no abdome.

No valor do rx de abdome agudo é limitado e não deve ser utilizada como triagem

 Melhores indicações
Suspeita de abdome agudo obstrutivo – edema de alça, empilhamento de moedas, distensão periférica
(cólon) ou central (delgado).
Perfurativo
ingesta de corpo estranho – quantidade e saber se vai ou não conseguir eliminar naturalmente.

Obstrução periférica

Obstrução central
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Empilhamento de moedas e níveis hidroaéreos
Apendicite Aguda

Presença de corpo estranho


**gente, no slide está apendicite aguda e na aula ela diz que é corpo estranho, vou questiona-la e dou o feedback**
✦ Sinal de Rigler
Duas paredes intestinais e entre elas há ar (perfuração).

ULTRASSONOGRAFIA
 Vantagem por não ser invasiva e ser realizada à beira - leito

 Melhor indicação para via biliar ou massa abdominal


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sensibilidade de 95% para colelitíase e 85% para colecistite aguda

 Desvantagem de ser operador dependente


sinal de Murphy' é indicativo de colecistite. Paciente suspende a inspiração por dor à compressão do
rebordo costal direito(local onde se encontra a vesícula biliar). As vezes o paciente não possui o
espessamento da parede, então é só colelitíase e dá para acompanhar ambulatoriamente e indicar o
pré operatório com mais calma.

TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA
Excelente exatidão diagnóstica para : cólica renal, apendicite, diverticulite, abscessos intra-
abdominais e aneurisma de aorta abdominal
Melhora o índice de acerto para diagnóstico etiológico
Reduz o retardo terapêutico dos pacientes graves e não há evidências de redução de
mortalidade nesse grupo de pacientes
SITUAÇÕES ESPECIAIS
IDOSO
Dor abdominal tem níveis significantes de morbi / mortalidade
Relativa falta de achados no exame físico apesar da gravidade
Rigorosa observação hospitalar em idosos com dor abdominal
Mortalidade de idosos com dor abdominal é de 7%
Catástrofes vasculares em pacientes acima de 70 anos : isquemia mesentérica, dissecção ou ruptura de
aneurisma e infarto do miocárdio
IMUNOCOMPROMETIDOS OU COM HIV
infecções oportunistas causam perfurações ou obstruções
65% dos casos de dor abdominal são não cirúrgicos : gastrenterite não-bacteriana, linfoma de hodkin,
citomegalovírus, enterocolite por mycobacterium, colangite esclerosante, gastrite ou esofagite por
citomegalovirus
dificuldade muito grande de diferenciar quadro cirúrgico de não cirúrgico

ANALGESIA e DIAGNÓSTICO DE ABDOME AGUDO

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Zachary Cope em 1921 : analgesia atenuaria os achados do exame físico e induziria ao retardo do diagnóstico
Thomaz e Silen em 2003 trabalhos prospectivos e randomizados mostram que a analgesia não prejudicou ou retardou o
diagnóstico etiológico da dor abdominal ou modificou a morbidade ou a mortalidade

Posso fazer analgesia, desde que essa não prejudique o exame físico. Começa com uma dipirona.

MULHERES EM FASE REPRODUTIVA OU GRÁVIDAS


Mulheres apesentam dor abdominal quando há rompimento dos folículos ovarianos. Perguntar se já
menstruou, se está para menstruar, ultima menstruação e fase fértil.
Sempre afastar ou confirmar diagnóstico de gravidez ( 13% estão gravidas) por dosagem sérica de
gonadotropina coriônica humana
Diagnóstico de apendicite na grávida é dificil: primeiro trimeste confusão com sintomas digestivos próprios
da gravidez e segunda metade da gravidez mudança de posição do apêndice (dor pode ser no andar
superior do abdome).

CONCLUSÕES
 Definir se é ou não abdome agudo: Outros sinais e sintomas além da dor
 Método propedêutico essencial: história e exame físico completo
 Erro diagnóstico: história incompleta, pacientes idosos, mulheres e pacientes imunocomprometidos
 Diagnósticos iniciais errôneos: gastrenterite, infecção urinária, DIP e lombalgia
 Exames subsidiários não tem valor sem história e exame físico adequados
 Analgesia pode ser feita sem comprometer o diagnóstico
 Melhor opção: após história adequada, exame físico de repetição (seriado). Pode recorrer até a TC
caso não encontre a causa etiológica.

SABISTON JUNIOR, David C.; TOWNSEND, Courtney M. et al. Sabiston tratado de cirurgia:
a base biológica da prática cirúrgica moderna. 18.ed. Rio de Janeiro: Elsevier, 2016.

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