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— É PROIBIDA A REPRODUÇÃO —

1ª Edição — 2021

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e acontecimentos


descritos são produtos da imaginação do autor. Qualquer semelhança com
nomes, datas e acontecimentos reais é mera coincidência.

Nenhuma parte deste livro pode ser utilizada ou reproduzida sob quaisquer
meios existentes sem autorização por escrito do autor.
SUMÁRIO
00. PRÓLOGO
01.
02.
03.
04.
05.
06.
07.
08.
09.
10.
EPÍLOGO.
SOBRE O AUTOR:
00. PRÓLOGO
POR SAFIRA PINHAL

“... não era um cartão qualquer. Era um


American Express Platinum”.

Há uma grande desvantagem em trabalhar como camareira no hotel


mais luxuoso da capital goiana: você entende que não é pobre, é mais que
pobre.

O Castro’s Park Hotel recebe desde celebridades nacionais, as


internacionais. É muito comum se deparar com os grandes nomes da mídia
pelos seus corredores, além das mais diversas personalidades que compõe o
empresariado.

Famosos ou não, todos possuem algo em comum: eles são ricos,


super ricos e, alguns, bilionários.

Desde já, quero fazer um adendo peculiar: o rico de berço, que é


aquele que nasceu rico, tende a ser muito educado com os funcionários do
hotel. Contudo, aqueles que ao longo da vida se tornaram ricos, não são tão
simpáticos.

É claro que isso não é uma regra, mas há poucas exceções.

Todavia, lidar com gente rica não é tão ruim, quanto lidar com gente
que se acha rico, mas não é. Esse é o caso daquele minion que vem vindo na
minha direção.

Olhos esbugalhados, rosto pálido e ossudo; cabelos presos em coque


e, uma altura mais que intimidadora: um metro e quarenta de puro ódio.

A minha chefe é quase um pinscher, com a voz do Mr. Catra. Eu


diria que o nem o diabo faria algo tão maligno.

— Safira, o que pensa que está fazendo aí, parada? Espero que não
esteja aprontando nada... — cruzou os braços ao parar diante de mim,
torcendo a boca para o lado. — O apartamento duzentos e dois acabou de
ser desocupado. — disse, indicando com a cabeça.

— Estou indo, senhora.

— Senhora está no céu. — rosnou e eu prendi a respiração, para não


respondê-la.

“Senhora está no céu, mas a educação está na Terra, bruxa órfã de


vassoura”.

— Perdão, dona Matilde. — pigarrei, corrigindo-me.

— Assim está melhor. Agora vá... — gesticulou com a ponta dos


dedos, como se estivesse enxotando um cachorro.

Segui pelo corredor, empurrando o carrinho de limpeza. Entrei no


elevador de serviço e suspirei.

Ouçam bem: um dia eu vou ser muito rica e vou descontar tudo que
passei trabalhando ao lado daquele pinscher!

Contudo, esse dia não é hoje e, dada a minha sorte, talvez, não
chegue nunca. Estou com vinte e quatro anos e nunca namorei.
Recentemente parei para pensar sobre isso e o sentimento que tal questão
gerou em mim, me destruiu ao ponto de eu perder o meu último emprego e
criar uma bola de dívidas tão grande que eu poderia chamar de sol.

Por dias me senti insuficiente, feia e solitária, mas passou. Os


sentimentos ruins, é claro. As dívidas persistem! Sem perspectiva para o
futuro, sem dinheiro para o presente e sem ânimo para homens.

Essa sou eu, Safira Pinhal.

Mamãe disse que escolheu esse nome para atrair riqueza. Não sei
bem o que aconteceu no caminho, mas, aparentemente, algo deu muito
errado.
Ao parar na porta do apartamento duzentos e dois, bati para conferir
se havia alguém. Diante do silêncio, entrei e, subitamente, parei,
arregalando os olhos, antes de analisar todo o ambiente.

Havia ao menos duas calcinhas rasgadas no chão. E tantos


preservativos espalhados pelo cômodo, que eu sequer conseguia contar.
Além do inconfundível cheiro de sexo impregnado no ar.

Aparentemente, um daqueles jovens ricaços, resolveu dar uma festa


daquelas em nosso hotel. Como dizem na recepção: pagando bem, que mal
tem?

Coloquei as luvas e iniciei a limpeza. Depois de quase uma hora,


terminei. Como de praxe, abri cada uma das gavetas para conferir se o
hospede não havia deixado nada e, para a minha surpresa, encontrei um
cartão preto.

Não um cartão qualquer, mas um American Express Platinum.


Aquele brilho fosco, as cifras saltitando por minha mente e, todas as minhas
dívidas quitadas...

Senti o meu coração disparar, como se eu estivesse a ponto de


cometer um crime, e estava, mas... Aquela era a solução de todos os meus
problemas.

Sentei na cama e abaixei a cabeça, segurando o bendito cartão com


ambas as mãos. Isso seria muito errado, mas, ao mesmo tempo, era a minha
chance de ser rica ao menos uma vez na vida.

Uma única vez em toda a minha vida...


01.
POR SAFIRA PINHAL

“...quanto o diabo não tenta,


ele manda os seus anjos”.

No dia seguinte, liguei para o trabalho informando o meu


desligamento. Para não soar tão suspeito, usei a desculpa de que mamãe
estava doente e que necessitava dos meus cuidados.

Que ela me perdoe por isso!

— ... isso é sério?! — eu conseguia imaginar a cara de espanto de


dona Matilde.

— Sim, a pobrezinha não consegue nem sentar. — funguei,


prosseguindo com o fingimento ao telefone.

— Deus me livre das minhas hemorroidas estourarem também. — o


pavor em seu tom de voz era palpável, ao ponto de eu me segurar para não
rir. — Apesar de você ser doida, pirada, maluca, uma parafuso-solto que
contratei por pura piedade, desejo melhoras a sua mãe. Ela não é culpada da
sua loucura. Até nunca mais, Safira. — rosnou, desligando o telefone na
minha cara.

Pisquei algumas vezes, ainda segurando o celular na orelha e, pouco


a pouco, desci a mão, colocando-o em cima do colo.

Eu pareço ser doida?!

A primeira coisa que fiz foi quitar todas as minhas dívidas usando
aquele cartão e, por fim, cogitei jogá-lo fora, mas havia algo dentro de mim
que me fazia visualizar riqueza, luxo e tudo o que eu sempre quis.

— Ele nem vai sentir falta... — disse a mim mesma e rapidamente


sacudi a cabeça para o lado algumas vezes, mirando o meu pedacinho do
céu fosco. — Eu me tornei uma ladra e, provavelmente, vou ser presa a
qualquer momento...

As últimas palavras ecoaram na minha cabeça e eu me pus de pé.

— Deus, eu vou ser presa... — repeti, arregalando os olhos,


enquanto perdia o fôlego.

“Sim, você vai ser presa, mas pode usar o cartão até isso
acontecer”.

Sabe aquela vozinha que ecoa na mente quando você vai fazer algo
errado? Era a minha desconsciência. E ela acabou de ecoar na minha
cabeça. Aquela não era a voz boa, era exatamente como mamãe dizia:
Quanto o diabo não tenta, ele manda os seus anjos!

Um mês depois...

A essa altura, eu havia feito tudo que eu queria. Perdi o sono apenas
na primeira semana, pois, depois disso, a vida criminosa que escolhi viver,
havia se cravado em minha carne. Eu era quase o James Bond de salto.

A cada dois dias, eu migrava de hotel, escolhendo sempre os


melhores apartamentos disponíveis. Cheguei a me dar ao luxo de contratar
dois dançarinos para realizar a fantasia de me afogar em uma banheira de
chantily, com homens bonitos me salvando de um ataque glicémico.

Depois de viajar por quase todo o litoral brasileiro, resolvi fazer


uma parada em Santos, São Paulo. Como de costume, reservei o melhor
apartamento e, depois de me hospedar, desci para o restaurante, onde me
deliciei com camarão à provençal e um drinque, que deixei a escolha do
garçom.

De onde eu estava, eu conseguia ver o mar, com a sua imponência,


cobrindo ondas sobre ondas, até chegar à areia. Tomei mais um gole do meu
drinque e fixei os olhos em um homem que havia acabado de entrar.
Ele usava um terno cinza escuro, era alto e tinha um excelente porte
físico. Gostoso o suficiente para que o tecido marcasse o seu corpo. Os
olhos cor de amêndoas se encontraram com os meus e, um sorriso brotou
em seu rosto, me fazendo corar.

Abaixei a cabeça e desviei o rosto da sua direção. Com o coração


acelerado, busquei um pouco de ar e, quando girei o rosto novamente para
procurá-lo, tomei um susto.

— Jesus! — pulei na cadeira, derrubando a bebida em mim.

— Te assustei? — a voz grossa me arrancou arrepios, ao ponto de eu


sacolejar o corpo. Ele franziu a testa e arqueou uma das sobrancelhas. —
Desculpe-me por isso. — disse, erguendo dois dedos.

O garçom rapidamente veio em nossa direção.

— Pois não, senhor Machala. — parou próximo a ele.

— Traga outra bebida para essa linda moça. — pediu e, sem


demora, o garçom atendeu ao seu pedido. Ao voltar os olhos para mim,
fitou-me por inteira. — Posso acompanhá-la?

— C-C-Claro... — respondi sem jeito.

— Viajem de trabalho? — perguntou ao se sentar e, em seguida,


cruzou as pernas, mirando-me fixamente.

O seu olhar era tão sexy e intenso, que toda vez que nossos olhos se
encontravam, eu sentia alguma coisa “coisar” dentro de mim.

— Não...

— Férias?

— Apenas curtindo a vida.


— Oh, isso é ótimo. — ele sorriu e mordeu os lábios. — Um pouco
de diversão é sempre bom.

— Sim... — dei de ombros.

O garçom retornou com a bebida e eu a peguei, agradecendo.

— E quanto a você, senhor Machala?

— Pelo visto, você é boa com nomes. — ele afinou os olhos e sorriu
de canto. — Estou aqui para resolver um pequeno problema que tive.

— Que tipo de problema?

— Um furo financeiro. — respirou fundo e eu sacudiu a cabeça. —


Contudo, não vamos falar disso agora. — disse, levando o indicador em
riste aos lábios. — Estuda?

— Tranquei a minha faculdade de relações internacionais. —


abaixei a cabeça e uni os lábios, lembrando do meu primeiro crime. —
Quitei o que devia e tranquei, pois não teria como arcar com os custos ao
longo do curso...

— Fez até que período?

— Quarto período. — assenti com a cabeça.

— Fala alguma língua estrangeira?

— Inglês e francês.

— Dis-le?

— Ouir, Monsieur.

Ele sorriu e respirou fundo, entrelaçando os dedos. O peso dos seus


olhos em mim, me deixava confusa. Eu não sabia distinguir uma possível
faísca de interesse ou qualquer outra coisa. Era apenas intimidador e,
incrivelmente sexy.

— Você é uma mulher muito interessante, Safira. — quando ele


disse meu nome, arregalei os olhos e ao notar a minha surpresa, ele mordeu
os lábios.

— Como sabe o meu nome? — fiz menção de me levantar e ele


ergueu o indicador, me fazendo engolir em seco.

— Ora, eu venho acompanhando seus roteiros há quase um mês. —


respirou fundo e assentiu com a cabeça. — Florianópolis. Natal. Vitória.
Porto de Galinhas... — enumerou com os dedos.

— Quem é você? — ofeguei, sentindo minhas pernas fraquejarem.

Nem nisso as malditas me serviam. Se fosse preciso fugir, eu teria


que me arrastar pelo chão. Eu sabia, eu sabia que um dia esse momento
chegaria, mas não imaginei que fosse chegar tão rápido e acompanhado por
esse bonitão.

Minutos atrás, imaginei estar flertando, mas agora...

— Eu sou Leon Machala. — tombou a cabeça para o lado. — CEO


das MACHALA.COM, uma das maiores fabricantes de armas do país.

Ouvir aquilo fez minha garganta secar e, por instantes, fiquei zonza.

— Não precisa me matar, eu tenho uma doença terminal... —


disparei sem pensar duas vezes.

— O nome dessa doença é falta de vergonha? — ele riu, sacudindo a


cabeça para os lados.

— Estou falando sério, eu...


— Sei tudo sobre você. Até mesmo a cor da sua calcinha. — ele me
cortou, mantendo o mesmo tom sereno de voz.

Prendi a respiração, enquanto sentia o ardor constrangedor percorrer


o meu rosto. Isso sem mencionar o seu jeito de falar, todo manso e calmo,
que o fazia soar como um psicopata.

Será que ele é um psicopata?

Abaixei a cabeça, começando a imaginar o pior, pois, certamente,


era o que aconteceria.

— Eu vou ser presa, não vou?

— Sim, você vai.

— Não pode me prender amanhã? — ergui o rosto em sua direção,


sentindo os meus olhos lacrimejarem. — Já que é para passar o resto da
minha vida na cadeira, eu gostaria de aproveitar os meus últimos
momentos.

Ele arregalou os olhos e, após alguns segundos, explodiu em


gargalhadas.

— Você é uma graça, Safira. — ele estalou a língua e respirou


fundo. — Sabe quanto gastou desde que roubou o meu cartão?

— Primeiramente, — ergui o indicador. — Não roubei, eu encontrei.


E, não, eu não consigo mensurar o quanto eu gastei...

— Quinhentos e quarenta e seis mil reais.

Pisquei algumas vezes, perplexa em como o dinheiro, literalmente,


“nada”. O peixe na nota de cem reais é um claro lembrete disso. Contudo, o
mais curioso me veio à cabeça e eu acabei pensando alto demais.

— Qual o limite do seu cartão?


— É, basicamente, ilimitado. — ele sorriu e uniu os lábios. —
Ainda estou pensando no que farei com você.

— E-E-Eu posso pagar. — endireitei-me na cadeira e assenti com a


cabeça.

— Nem mesmo se trabalhasse a vida toda para mim, pagaria, exceto


se... Cogitar me deixar vender os seus órgãos, que tal? — perguntou sério,
me fazendo saltar para trás na cadeira.

Santa Maria!
Ele é um psicopata!

Deus, de todas as pessoas que eu tinha para roubar, escolhi


justamente um maníaco que agora quer vender os meus órgãos? Isso é ainda
pior que a cadeia.

Apesar de parecer sã por fora, eu estava em pânico por dentro. Eu


queria gritar e me desesperar, mas aquela era, literalmente, uma negociação
de vida ou morte.

— Bom, o meu fígado está fodido. — comecei, elegendo defeitos


que nem mesmo eu conhecia. — Eu tenho histórico familiar de problema de
coração e...

— Safira... — ele me interrompeu, chamando o meu nome de


maneira sexy e eu o encarei. — Não quero os seus órgãos.

Soltei a respiração, aliviada.

— Obrigada.

— Talvez, te ver presa. — prendi a respiração novamente e ele riu.


— Apesar de que isso não trará o meu dinheiro de volta, mas, te deixar
passar umas noites na prisão me soa satisfatório.
— E depois? — encolhi-me na cadeira, com os olhos arregalados.

— Não sei, talvez eu te venda para algum árabe. — os meus olhos


quase saltaram da cara e ele gargalhou.

— Não tem graça! — rosnei.

— Atrasar as minhas transações milionárias também não teve. — o


tom de voz não se alterou, mas, a expressão sim, ele estava irritado. Leon
finalmente se levantou e enfiou as mãos nos bolsos. — A polícia já deve
estar entrando no hotel nesse momento.

— Posso fazer uma ligação?

— Outra hora.

Como ele havia dito, a polícia havia chegado. Eles entraram no


salão em oito. Coloquei-me de pé e o encarei, com os olhos marejados.

— Não vão te machucar.

— E se machucarem? — perguntei, aflita.

— Ninguém descumpre as minhas ordens. — deu-me as costas e


caminhou em direção a saída.

— Leon. — chamei-o em uma última tentativa de tentar amolecer o


seu coração.

— Sim? — ele parou e espiou por cima do ombro.

— Lembre-se da palavra; perdoe para ser perdoado...

Ele explodiu em gargalhadas e sacudiu a cabeça.

— Gostaria de ter te conhecido em outra ocasião, Safira. — ergueu


uma das mãos e acenou, seguindo rumo a saída.
Os policiais se aproximaram e uma mulher que os acompanhava e
trazia alguns papéis nas mãos, leu o meu nome e a minha acusação.

— ... dada as provas, a meliante será levada em custódia.

Meliante? Custódia?
Tô na merda!

Não vou dizer que não havia culpa em mim. Claro que havia, mas
eu sabia que isso poderia acontecer. Mesmo com as lágrimas descendo
desenfreadamente, não posso culpar ninguém além de mim mesma.

Pela primeira vez, entrei em um carro da polícia e, de bônus, fui


colocada atrás das grades.

— Quer ligar para alguém? — a delegada se aproximou da cela e eu


neguei com a cabeça. — Precisa de um advogado? — assenti com a cabeça.

— Um defensor público deverá vir em breve. Enquanto isso, espero


que aprecie todo o luxo que a cadeia pode oferecer. — apontou com uma
das mãos para a cela e sorriu de canto.

Ela estava debochando de mim e, por mais que a minha sensatez


clamasse para que eu não fizesse isso, era mais forte que eu.

— Pode me trazer um café, por gentileza? — segurei nas grades da


cela e lhe lancei um sorriso.

— Não brinque com a sorte, garota. — afinou os olhos e apontou o


indicador em minha direção.

— Já usufrui de toda a sorte possível. O que vem depois disso, é


você e essa cela. — dei de ombros.

— Aproveite bem. — jogou uma piscadela para mim e assim que


deu as costas, mostrei-lhe o dedo do meio.
Sem saber o que fazer e, com as lágrimas já secas, me sentei na
cama de pedra, com colchão de folha. Sim, tão fino que parecia uma folha
A4 suja de merda.

Quantos anos de prisão eu vou pegar? Vou voltar a ver a luz do sol?
Como mamãe vai reagir? O meu pai, por outro lado, deve estar se revirando
no túmulo, enquanto dispara impropérios contra mim.

Pelo visto, essa noite vai ser muito longa...


02.
POR LEON MACHALA

“...uma mulher furiosa,


faz até o diabo rezar”.

Dinheiro não é tudo na vida, mas o dinheiro pode mudar a sua vida;
foi com esse pensamento que fiz fortuna. Quando o meu pai morreu e
assumi a empresa da família, a MACHALA.COM, não estávamos em
nossos melhores dias, mas, nada que um pouco de lobby político não
resolvesse. Em pouco mais de cinco anos, nos tornei uma das maiores
fabricantes de armas do país.

Hoje, aos trinta anos, tenho uma fortuna que supera a casa do
primeiro bilhão, além de diversos investimentos em outros ramos. Apesar
de tudo, sigo solteiro.

O amor me soa complicado e eu sou um homem acostumado com


facilidades, se é que me entendem. Contudo, confesso que sempre tive um
“fraco” por mulheres engraçadas. Sim, elas são raras, mas existem.

— Já descobriu o paradeiro dela? — perguntei, mantendo as pernas


cruzadas, com os braços apoiados na poltrona, mirando o nada. — Aliás, o
carregamento com matéria prima segue atrasado. Resolveu o problema?

— Ainda não. — Ramon respondeu e eu o encarei.

— Para qual das perguntas?

— O carregamento irá chegar amanhã. Quanto a moça, Safira, ela


está em Santos, São Paulo.

Na minha cidade? Então, o destino te trouxe até mim, Safira


Pinhal...

— Peça ao motorista para ficar de prontidão. Devo visitá-la no fim


da tarde.
— Como quiser. — assentiu com a cabeça e deixou a sala.

Muitos devem dizer que é estranho ter um secretário homem,


porém, eu digo que é inteligente. A última secretária que tive, acabou
dormindo comigo e o nosso “termino” foi meio conturbado.

Quem imaginaria que ela conseguiria uma arma para me ameaçar,


trabalhando em uma empresa que fabrica armas?

Anotem isso: uma mulher furiosa, faz até o diabo rezar!

Ao descer do carro, retirei os óculos escuro e mirei o arranha-céu.


Era imponente, luxuoso e, sem dúvida, custava uma fortuna. O que posso
dizer? Ela tem bom gosto e está fazendo bom uso do dinheiro ao qual tem
acesso.

Com toda a certeza, eu poderia ter feito isso de outras formas: a


primeira, seria matá-la, mas não costumo ordenar a morte de mulheres. A
segunda opção, seria mandar alguém resolver isso, mas... Quem seria burro
o suficiente para me roubar?

Só uma louca faria isso!

E, por essa razão, eu vim conhecer a “louca” pessoalmente. Na


minha mente, ela poderia ter quaisquer características. Eu não conseguia
imaginar como ela seria, mas, imaginava uma mulher muito inteligente e
sagaz.

Liguei diretamente para o gabinete do governador e solicitei


algumas viaturas, sob as minhas ordens, é claro. E, conforme acertado, eles
efetuariam a prisão ao meu sinal.
Identifiquei-me na recepção, acompanhado pela polícia e
informamos a situação ali. Sem resistência alguma, eles nos conduziram
pelo interior do hotel, até pararmos no restaurante e um dos recepcionistas
identificou Safira. Naquele instante, toda a trama que teci em minha mente
se desfez.

— Ela é bem jovem. — murmurei, tentando me lembrar se Ramon


havia mencionado a idade dela. — Aguardem aqui. — ordenei aos policiais
que estavam atrás de mim.

Sem pressa, atravessei as portas do restaurante e segui em sua


direção. E, naquele momento, me vi diante da mulher que estava me
roubando.

Os seus olhos eram cor de safira, como o próprio nome diz. Cabelos
pretos e longos, batendo um pouco abaixo dos ombros e o seu corpo trazia
algumas curvas.

Uma moça pobre e cheia de sonhos, que trazia consigo o desejo de


ter o que todos deveriam ter: um pouco de luxo. Não a julgo, mas, as
opções que ela tomou para atingir suas ambições, não são honestas, muito
menos, inteligentes.

Não que eu tenha alguma moral para pautar honestidade...

Contudo, ela era engraçada. E, só Deus sabe como eu me perco


facilmente em mulheres que conseguem me fazer rir. Juntando-se a idade e
a beleza,

Até mesmo suplicando, ela era engraçada.

“...lembre-se da palavra: Perdoe para ser perdoado”.

Só Deus sabe como eu quis gargalhar quando ouvi aquilo. E, por


mais que soasse maluco, algo dentro de mim me fazia a querer por perto.
Após a prisão em flagrante efetuada, subi para conferir o
apartamento que ela havia reservado. Depois de uma breve futricada no
guarda-roupas e nas malas, constatei que havia nada de absurdo; o seu luxo
se resumia a viagens, roupas, sapatos e joias baratas.

Sentei-me na cama e, por instinto, meus olhos fixaram-se em uma


calcinha fio-dental preta e minúscula. Sorri de canto e a peguei com a ponta
dos dedos.

— Leon... — Ramon entrou no apartamento e quando me viu


segurar a calcinha, pigarreou. — Atrapalho?

— A menos que esteja cogitando que eu vá vestir a calcinha, não. —


sorri de canto, imaginando-a usando a peça.

Na minha mente, não ficava nada mal.


Pelo contrário, chegava a me excitar.

— Aqui está o seu cartão. — disse, devolvendo-o.

Peguei-o e o encarei por alguns instantes.

— Safira disse que não roubou.

— Se você não deu a ela, foi roubado. — Ramon me lembrou do


óbvio.

E foi quando mais uma das suas respostas ecoou em minha cabeça:
“Primeiramente, não roubei, eu encontrei. E, não, eu não consigo
mensurar quanto eu gastei...”

Explodi em risos, fazendo Ramon engolir em seco, encarando-me


sem entender a situação. Em uma vã tentativa de entrosá-lo a graça,
comentei:

— Viu como ela é maluca?


— Não, não vi...

— Ah, é verdade, você estava do lado de fora com os policiais. —


respirei fundo e me coloquei de pé. Sem pressa, guardei a sua calcinha no
bolso do blazer. — Uma pena. Você iria se divertir. — sacudi a cabeça e
adiantei-me até a porta.

— Imagino que sim.

Ramon é um homem de poucas palavras. Poucos sabem, mas ele é


meu primo e, prefiro que poucos saibam. Não sou um homem muito
querido e, quanto menos pessoas próximas ao meu redor eu tiver, mais
seguros eles estão.

Seguimos pelo corredor em direção ao elevador.

— Ligue para o doutor Kael. Quero falar com ele.

— Qual o assunto?

— Safira.

— Farei isso agora.

Por conta dos acontecimentos, acabei aproveitando a reserva dela no


hotel. Em outro apartamento, é óbvio. Eu queria acompanhar de perto o
desdobrar da situação daquela mulher, que não saia da minha mente.

Após o jantar, servido no quarto, como ordenei, sentei-me na sacada


para tomar um drinque. O telefone tocou. Doutor Kael.

— Boa noite, senhor Machala.

— Boa noite. — dei mais um gole no drinque. — Qual a situação


dela.
— Complicada. Sabe como a polícia funciona; o senhor é um
homem poderoso, então vão garantir que ela fique presa um bom tempo.

— O que seria um bom tempo? — trouxe o copo de bebida para


próximo da boca, ameaçando-o beber, enquanto esperava a resposta.

— No caso do estelionato, varia de um a cinco anos de prisão, mas,


levando em conta que ela é ré primária, se tiver um bom defensor público, a
pena pode ser reduzia em até 1/3.

— Entendo... — dei mais um gole na bebida.

— Quer prosseguir com o processo?

Torci a boca e dei-me ao luxo de mirar o mar mais uma vez. O


reflexo da lua tocando as suas águas, o torna mais belo ao cair da noite.

— Amanhã resolvemos isso. Obrigado. — desliguei o telefone.

Terminei de tomar o meu drinque e segui em direção a cama, onde


me joguei, buscando o descanso de um dia exaustivo. Se bem me lembro,
aquele último drinque, era o décimo daquela noite.

Por alguma razão, me veio uma história antiga a mente, que eu até
havia me esquecido que existia. O ontem parecia ser o hoje...

[...]

Lembro-me que a professora da escola havia pedido uma redação


sobre como nossos pais se conheceram e, assim que cheguei em casa,
marchei em direção a minha mãe.

— Mamãe, como você conheceu o papai? — sentei-me em seu colo


e fixei os olhos nos seus. De imediato, ela arregalou os olhos e, quando
pareceu se lembrar, riu ao ponto de sacudir a cabeça. — O que é engraçado,
mamãe?
— A história de como a mamãe conheceu o papai. — confessou,
beijando a ponta do meu nariz.

— E como foi? — arregalei os olhos, ainda mais curioso para saber.

— O papai e a mamãe não se davam muito bem. — disse,


confirmando com um aceno de cabeça. — Éramos como cão e gato. Ele
tinha uma loja onde revendia armas e eu, trabalhava na padaria ao lado.

— A senhora era pãozeira, mamãe?

— Padeira? Não. — negou com a cabeça. — Eu trabalhava no


caixa.

— Hum...

— O seu pai aparecia por lá todas as manhãs, sempre com um


revólver na cintura. Era mais fácil ele esquecer a cabeça do que aquela
bendita arma. — mamãe disse aquilo de um jeito tão engraçado que eu
gargalhei e ela me acompanhou. — E, um belo dia, ele esqueceu a carteira.

— Aí a senhora devolveu, não foi?

— Era pra ser assim, mas quando eu cheguei lá para lhe entregar, ele
disse que eu havia roubado, quando na verdade, eu encontrei. — entreabri a
boca, fazendo um “O”. — E, naquele momento, a mamãe se encheu de fúria
e pegou o revólver da cintura do papai e apontou a arma em sua direção,
dizendo: — Calado, vadio, ou eu o mato! — encenou o gesto
perfeitamente, me fazendo gargalhar ainda mais.

— A mamãe queria dar um tiro no papai? — pisquei algumas vezes.

— Sim, mas não dei. E, depois daquilo, passamos a tratar a situação


como brincadeira e a brincadeira ganhou forma. E dessa forma, veio você.

Sorri, enquanto digeria a história. Apesar de ainda ser uma criança,


não foi difícil constatar o óbvio.
— Então, a mamãe roubou o coração do papai!

A senhora minha mãe tombou a cabeça para o lado e sorriu,


balançando a cabeça para os lados algumas vezes.

— É, acho que podemos dizer que foi isso mesmo.

[...]

Ao acordar na manhã seguinte, fui bombardeado com a pior notícia


que poderia receber; a minha interprete havia sofrido um acidente e não
poderia comparecer a reunião de negócios daquela tarde.

Foram meses de negociatas para trazer aquele grupo francês — de


segurança privada — até mim. Eu não podia simplesmente abandonar as
negociações, afinal, eram milhões em jogo.

Apesar de conhecer e falar um pouco da língua, não era o suficiente


para uma negociação daquele porte. Eu necessitava de um profissional.

— Posso arrumar outra pessoa. — Ramon sugeriu após dar a notícia


e perceber o descontentamento em meu rosto.

— Sabe bem que não posso escolher qualquer pessoa para


intermediar esse tipo de negócio... — respirei, pensando em uma alternativa
segura e rápida. Fechei os olhos por alguns segundo e quando os abri, ri
sozinho. — É muita coincidência ter te encontrado...

— Quem?

— Safira.

— O que ela tem a ver com as negociações?

— Ela fala francês fluentemente.


— Isso é sério?! — Ramon se espantou de tal modo que cruzou os
braços e arqueou uma das sobrancelhas.

— Sei o que vai dizer, mas, no momento é a nossa melhor opção.


Além do mais, ela me deve. — coloquei-me de pé e assenti com a cabeça.

— Não há garantias de que ela vá manter silêncio.

— Não há garantia em nada nessa vida, meu primo. — sorri de


canto e finalmente levantei da cama. Ao tocar o seu ombro, mirei-o nos
olhos. — Essa é a melhor opção que ela tem de não seguir presa e começar
a pagar o que me deve.

Ramon apenas assentiu com a cabeça.

Ele melhor que ninguém sabia que quando eu botava algo na


cabeça, ninguém tirava. Ainda que desse errado, eu preferia sofrer tentando,
do que me martirizar por não tentar.

Naquele mesmo instante, liguei para o doutor Kael e informei o que


pretendia fazer, então fui informado de que a audiência de Safira iria
começar em instantes, pois, como determina a lei, todo flagrante deve ter
uma audiência em até vinte e quatro horas; seja para manutenção da prisão,
liberdade provisória, entre outros.

— A situação dela não configura flagrante...

— Dei um jeito nisso. — ele respondeu, cheio de si.

— Entendo. Pois bem, garanta que ela tenha liberdade provisória


nesse primeiro momento.

Por instantes, doutor Kael ficou mudo.

— Como quiser, senhor.

— E garanta que ela saiba de que fui eu quem providenciei isso.


— Assim será feito, senhor.

Desliguei o telefone e esbocei um sorriso de canto, analisando


cuidadosamente cada evento desde que a encontrei. Na minha cabeça, era
irreal tamanha coincidência, ao mesmo tempo, mais que conveniente.

O destino parecia ter me entregado o par ideal para o momento


perfeito. Sinto-me como se estivesse protagonizando o filme Sr. e Sra.
Smith.
03.
POR SAFIRA PINHAL

“...devo e não nego,


mas só pago quando puder”.

Passei a noite, imaginando como seria a minha vida na prisão e,


após decidir que não queria ter uma vida na prisão, comecei a pensar em
uma saída. Só me dei conta de que havia passado a noite em claro, quando
percebi que o sol havia surgido, atravessando a janela que ficava em cima
da minha cama.

Tempos atrás, assisti uma novela onde a ré não pôde ser julgada,
pois era um robô. No meu caso, eu não poderia afirmar isso, mas...

Os meus pensamentos foram interrompidos com a chegada do meu


advogado. Um homem moreno, de quase dois metros, que tinha olhos
claros e corpo belo.

Doutor Caio.

Apresentamo-nos e após uma breve conversa sobre o meu caso, o


coloquei a par de toda a situação sob o meu ponto de vista. É claro que eu
omiti a festa com os dançarinos, mas de resto, contei tudo.

Após todas as explicações e dúvidas sanadas, seguimos para a


audiência de custódia. Apesar de ele ter me tranquilizado, a possiblidade de
ficar cinco anos presa por usar um cartão que não era meu, me assustava.

— A ré gostaria de dizer alguma coisa? — o juiz perguntou e eu


encarei o meu advogado que negou de forma veemente, sugerindo com o
olhar para que eu permanecesse calada, mas eu precisava dizer algo.

— Sim, eu gostaria. — ergui a mão, como se estivesse pedindo para


falar.
O meu corpo tremia inteiro e se desse uma brisa, das mais leves que
fosse, era capaz o meu corpo reagir sozinho e dançar Lambada – Kaoma.

O meu advogado pigarreou e eu o ignorei.

— Prossiga. — pediu o juiz.

— Eu me declaro mentalmente incapaz. — afirmei, assentindo com


a cabeça.

O juiz espiou-me por cima dos óculos e, em seguida, mirou o meu


advogado, que apenas respirou fundo ao meu lado. Diante do silêncio de
ambos, prossegui.

— Quando eu era pequena, a minha mãe escorreu em um coco e eu


caí no chão. E, volta e meia, eu acabo fazendo essas loucuras... — gesticulei
com uma das mãos, roubando até mesmo a atenção dos policiais presentes.
— Não foi por mal, foi um impulso e...

Parei de falar quando um homem se aproximou do juiz, cochichando


algo em sua orelha.

— Que seja. — ele resmungou. — A liberdade provisória foi


concedida. Dada as condições dá ré, não se obriga a condição de fiança.

O doutor Caio engasgou com a própria saliva, ao ponto de eu ter que


socorrê-lo com tapinhas nas costas. Antes que pudéssemos dizer algo mais,
o juiz se levantou e deixou a sala. Ele simplesmente me encarou,
gesticulando com as mãos algo do tipo: não sei que merda aconteceu, mas
foi bom para você.

— Obrigada por me defender. — agradeci, segurando suas mãos. —


E ainda bem que eu não preciso pagar, pois eu não tenho dinheiro algum. —
sorri, erguendo os ombros.

— Você é uma mulher de sorte, Safira. — ele assentiu com a cabeça.


— Realmente, não sei o que foi isso, mas... vamos aguardar a próxima
audiência. Entrarei em contato para avisá-la.

— Mais uma vez, muito obrigada, doutor Caio.

— Por nada.

Contudo, ainda havia outro problema. Como eu iria voltar para


casa? Parei na porta do local da audiência e me pus a observar os carros
atravessarem a avenida. Dei um pulo ao ouvir o som de um carro frear e,
quando virei para o lado, ele estava praticamente em cima de mim.

— Não, eu acabei de ser solta! — gritei, como se aquilo fosse fazer


alguma diferença.

Ao som de um estrondo, tudo ficou escuro.

[...]

— Detenta? Detenta!

Ao abri os olhos, dei-me conta de que ainda estava na delegacia, na


maldita cela de prisão e, a delegada, me encarava com um pequeno sorriso
de canto.

— Sonhando, meu amor? — a delegada fez um beicinho, usando um


tom irônico. — É bom saber que o nosso hotel cinco estrelas está lhe
servindo bem.

— Um dia, ainda vou socar o seu olho. — murmurei e ela arqueou


uma das sobrancelhas, cruzando os braços.

— O que disse?

— Acho que estou com piolho. — cocei a cabeça e dei de ombros.


Em resposta, ela afinou os olhos.

— O senhor Machala retirou a acusação. — disse, abrindo a cela.


— Sério?! — praticamente saltei ao me por de pé e uni as mãos em
prece, enquanto mordia os lábios.

— Infelizmente, sim. — deu um passo para o lado e apontou a saída


com uma das mãos.

Sem hesitar, deixei a cela e, antes de deixar a delegacia, peguei os


meus pertences. Do lado de fora, vi a mesma cena do sonho. Uma avenida
cheia de carros e, por precaução, me escondi atrás de um poste de concreto.

— Como é que eu vou pra casa? — cruzei os braços, torcendo a


boca.

Um homem de quase cinquenta anos e terno preto, se aproximou.


Ele lembrava um daqueles caras que vendiam pacotes funerários.

— Safira?

— O que tem eu? — arregalei os olhos, sentindo o meu coração


parar.

Naquele instante, me perguntei se havia sido mesmo um sonho, ou


se ganhei a minha liberdade em outro plano astral.

— Sou o doutor Kael e estou aqui para resolver os interesses do


senhor Machala.

Respirei tão aliviada que apoiei uma das mãos em seu ombro e ri
sozinha.

— Por um segundo, eu achei que fosse a morte.

Ele forçou um sorriso e pigarreou.

— Bom, como sabe, ele retirou a queixa. Em contrapartida, espera


que a senhorita lhe pague o que deve.
Fiz menção de abrir a boca para dizer-lhe o óbvio: sou pobre,
fodida; sem eira, nem beira, mas ele não me deu tempo.

— E, por conta de uma reviravolta, ele achou um meio de a


senhorita quitar sua dívida.

Quitar a minha dívida?

No primeiro momento, aquilo pareceu interessante, mas, pensando


melhor, muito suspeito, pois me lembro bem de ele ter dito algo sobre
vender os meus órgãos.

— Ele trabalha com o quê mesmo? — perguntei baixinho e


prossegui, antes de ouvir a resposta. — Se for no ramo hospitalar e dessas
coisas, eu não quero, não, viu?

— Não, não é esse o ramo.

Soltei o ar preso aos pulmões e assenti com a cabeça.

— Menos mal...

— Ele é CEO de uma das maiores fabricantes de armas do país.

— Ele é um pistoleiro?! — abri a boca, piscando algumas vezes.

— Não, ele é um fabricante de armas.

— ... ou seja, um pistoleiro. — gesticulei com ambas as mãos e


revirei os olhos. — Olha, eu agradeço muito por ele ter retirado a queixa,
mas é como diz aquele ditado: devo e não nego, mas só pago quando puder.
— e, sem dizer mais nada, comecei a andar.

Aconteceu muito rápido. Um carro parou ao meu lado e saíram


quatro homens de dentro dele. Ao olhar para trás, o advogado do pistoleiro
apenas deu de ombros, como se não pudesse fazer nada. Não tive tempo de
gritar e covarde como sou, travei e não consegui correr. Apenas fui
colocada dentro do veículo, com os jagunços, cada um de um lado no banco
de trás.

Passado o susto, o doutor Kael que estava no banco do carona,


pigarreou:

— Como eu estava dizendo, o senhor Machala foi muito gentil em


retirar a queixa e encontrou uma alternativa ao pagamento da quantia
exorbitante que você deve.

— Sequestrar-me mostra o quanto ele é generoso.

— Pense positivo, você ainda está viva. — ele sorriu e abaixou a


cabeça.

Ouvir aquilo, me fez engolir em seco. Eu costumava lidar com


qualquer tipo de situação com a maior graça possível, mas aquele “ainda”
me fez perder o humor.

— Para onde estão me levando? — senti a minha voz tremular.

Doutor Kael não respondeu e eu tombei a cabeça para trás, mirando


o teto. Não demorou muito e o carro parou.

Sim, havia chegado o meu momento. E eu só pedia mentalmente


para que Deus não me deixasse sofrer na hora da morte. Eu sempre quis
morrer dormindo e, espero ter a oportunidade de pedir ao senhor Machala
que providencie isso e...

— Chegamos para o café da manhã. — disse o doutor Kael e eu


pisquei algumas vezes.

— Não vão me matar?! — encarei os jagunços e, em seguida,


sentei-me na ponta do banco, esticando o rosto próximo ao do advogado.
— Por que está pensando isso?! — ele franziu a testa e gargalhou,
descendo do carro.

Por ter sido sequestrada?!

Os jagunços desceram e eu desci em seguida. Um deles apontou


com uma das mãos para um bistrô, que só pela entrada, eu já sabia que era
chique. Havia uma cascata e, degraus demais para quem buscava apenas um
café da manhã.

Era quase um covil.

Sem discutir, segui o doutor Kael. Ao entrar, percebi que o local


estava vazio e contava apenas com a presença dos funcionários e, bem ao
fundo, em uma mesa próxima a uma janela, estava ele: Leon Machala.

— Aqui está ela. — disse o advogado quando nos aproximamos da


mesa.

— Obrigado, doutor Kael. Pode se retirar. — ele respondeu, usando


aquele mesmo tom calmo. Em seguida, passou os olhos por mim. — Foi
bem tratada?

— Tirando o sequestro. — dei de ombros, abraçando os meus


braços.

Ele sorriu e tombou a cabeça para o lado.

— Está machucada? — neguei com a cabeça. — Ótimo. Eu


detestaria ter que matar alguém em uma manhã tão bela. — engoli em seco
ao ouvir aquilo. E, parecendo ignorar a minha expressão, ele apontou para a
cadeira a sua frente. — Sente-se.

Fiz exatamente como ele pediu.

— A minha interprete sofreu um acidente e, tendo em vista que você


fala francês muito bem, decidi que você será a minha tradutora em uma
negociação.

— E o que eu ganho com isso? — as palavras custaram a sair.

— Vou amortizar metade da sua dívida.

— A dívida toda. — debrucei-me sobre a mesa e fixei os olhos nele.

Leon Machalan cruzou os braços e fitou-me por alguns instantes.


Ele sacudiu a cabeça brevemente e assentiu com a cabeça.

— Apenas a metade. Ainda estou pensando em como cobrar a outra


metade. — jogou-me uma piscadela, que me fez corar.

Eu não estava em posição de questionar, ao mesmo tempo, eu


também não sabia como lidar com aqueles olhos amendoados que me
hipnotizavam, ao ponto de eu me perder neles.

— Safira?

— Oi?! — dei um pulinho e ele riu.

— Por favor, retribua a gentileza que eu lhe fiz hoje. Esse é um


negócio muito importante.

— Não vai me meter em outra enrascada, ou vai? — afinei os olhos.

— Você já é uma estelionatária, por isso, creio que qualquer adendo


a sua ficha criminal não fará diferença. — ele sorriu e pegou o copo com a
bebida quente, cuja fumaça sobrevoava suas bordas e, bebericou. — Vai?

Engoli em seco e abaixei a cabeça.

— Eu não fiz isso por mal... — murmurei.

— É o que todos dizem. — disse, colocando o copo sobre a mesa,


antes de fixar os olhos em minha face. — Posso ou não posso contar com
você?

— Pode.

Que opção eu tinha?


Ademais, o seu pedido era razoável.

— Excelente. — sorriu e aconchegou-se na poltrona. — Quer comer


algo?

— Sim, eu gostaria. — assenti com a cabeça e ele riu, mais uma


vez.

— Fique à vontade.

Pela expressão de Leon, tenho certeza de que ele não imaginava o


tamanho da minha fome. Quando terminei de fazer o pedido, ele piscou
algumas vezes.

— Onde cabe tudo isso?!

— Ora, na minha barriga! — pisquei algumas vezes para fazer


charme e tombei cabeça para o lado, abrindo um pequeno sorriso.

— Cinco rosquinhas. — começou a enumerar com os dedos. —


Dois cafés gelados com Nutella. Quatro pães com mortadela e uma
omelete... — ao fim, suspirou, arregalando os olhos.

— É apenas o café da manhã.

— Apenas o café da manhã... — ele repetiu, enquanto parecia conter


a risada.

— Qual a graça?! — rosnei.

— Você, comilona. — apontou para mim.


— E agora é crime comer? — cruzei os braços.

— Eu não disse isso.

— Hunf! — arrebitei o nariz e virei o rosto para o lado.

O assunto só voltou a mesa quando eu terminei de tomar o café da


manhã. Contudo, devo confessar que o fato de ele me observar comer, me
deixava desconfortável e, mais que isso, havia um brilho estranho no seu
olhar, como se aquilo lhe rendesse prazer...

Ele é um homem, no mínimo, estranho. Quero dizer, eu o roubei e


ele não parece nutrir nenhuma raiva de mim. Qualquer outra pessoa em seu
lugar, já teria me esganado.

— No que está pensando?

— Que a sua reação natural seria me odiar. — respondi de imediato.

— Você está certa, mas... — ele balançou o indicador em minha


direção. — Não consigo sentir raiva de pessoas que me fazem rir.

— Está me chamando de palhaça? — afinei os olhos.

— Estou dizendo que você é uma mulher engraçada e isso me


excita. — a última palavra soou extremamente sexy.

“... e isso me excita”.

Fui ao céu e voltei em questão de segundos.

Algo se revirou dentro de mim e eu senti a minha garganta secar,


enquanto ele parecia se deliciar com o meu constrangimento.

Sacudi a cabeça e respirei fundo.

— Quando vamos iniciar os trabalhos?


— Depende, está satisfeita ou quer pedir algo mais? — sorriu de
canto e eu afinei os olhos, fulminando-o. — Sendo assim... Vamos. —
colocou-se de pé e estendeu-me a mão.

Encarei-o sem entender e ele balançou a mão. Levantei-me e peguei


em sua mão e ele me puxou, colando meu corpo ao seu. Por instantes, o
senti invadir a minha alma e, perdi o fôlego.

Empurrei-o para trás e pisei duro, cerrando os punhos.

— O que está fazendo?

— Eu fiz algo? — ele fingiu surpresa e sacudiu a cabeça. — Está


imaginando coisas. — jogou-me uma piscadela e seguiu caminhando pelo
salão.

Como assim?! Sei que não bato muito bem da cachola, mas ele me
puxou, sim!

— Você não vai me confundir. — rosnei, marchando atrás dele.

— Tenho certeza que não, gatuna.

Gatuna?
Quer dizer, ladra?!
04.
POR LEON MACHALA

“...Infantil é o meu caralho amarrado


em um lacinho cor de rosa!”.

Quando a vi, sorri de canto. Era incrível como a sua expressão, por
si só, me dava vontade de gargalhar. Após uma breve conversa — onde fiz a
minha proposta e, sem muita resistência, ela aceitou —, Safira se reservou
ao café da manhã.

Nunca, em toda a minha vida, vi alguém comer com tamanha gula,


rapidez e vontade. Como uma leoa, Safira abateu cada um dos itens que
pediu para o café.

E não eram poucos...


Ainda assim, não sobrou nada.
Nadinha.

Estranhamente, me veio à cabeça algo que eu havia ouvido uma vez:


"... As pessoas trepam como comem".

Mordi os lábios e contive a excitação que ameaçava avolumar o meu


jeans e, por um breve momento, aquilo passou.

Mas voltou, justamente quando lhe ofereci a mão. Vi ali a primeira


oportunidade de a sentir junto a mim e não hesitei, puxei-a contra o meu
corpo e dei-me ao luxo de inspirar o seu aroma.

Era doce.
Simplesmente doce.

"O que pensa que está fazendo?".

Fingi demência e segui em direção a saída, ouvindo-a rosnar. Ao


entrar no carro, sentei-me ao lado dela e ordenei ao motorista que nos
levasse para a mansão Machala.
Safira mantinha as mãos sobre o colo, evitando lançar os olhos
intensamente azuis em minha direção.

— Como passou a noite? — provoquei-a, com bom humor.

— A delegada disse que aquela era uma cela cinco estrelas. —


respondeu, torcendo a boca.

A tristeza em seu tom de voz me fez querer rir, mas me contive,


afinal, ela estava de luto: até ontem, era uma mulher que vivia no luxo e
hoje, voltou a vida de antes; a de antes de encontrar o meu cartão ilimitado.

— Não quero nem imaginar... — murmurei e ela rapidamente me


encarou, desviando o olhar.

— Tive um sonho estranho... — desconversou, balançando a cabeça.


— Havia um advogado e, eu estava em uma audiência de custódia. —
assentiu com a cabeça. — No fim, o juiz me absolveu por eu ter me
declarado mentalmente incapaz.

Dessa vez, não consegui. Simplesmente explodi em risos, ao ponto


de lacrimejar.

Veja bem, como posso considerar incapaz uma mulher que gastou
meio milhão de reais em um mês? Até onde sei, quem é realmente louco,
rasga dinheiro. E no caso dela, não foi bem isso que aconteceu...

Safira me repreendeu com o olhar e cruzou os braços.

— Não sei qual a graça!

Após sair daquela crise de risos, pigarrei:

— Audiência de custódia é feita em flagrantes, o que não era seu


caso e... — ergui o indicador, unindo os lábios, tentando não rir. — Você é
mais que capaz.
A expressão de Safira mudou de pensativa para "não sei se isso foi
bom ou ruim".

— Seu sonho não me soa muito inteligente. — concluí.

— Está me chamando de burra? — ela entreabriu a boca e me


encarou, piscando algumas vezes.

— Não, eu disse que o sonho...

— E quem sonhou? Eu! — interrompeu-me, afinando os olhos. —


Ou seja, eu não sou muito inteligente. O mesmo que burra.

Seguindo essa lógica, não está totalmente errado, mas...

— Peço desculpas se a fiz entender errado. Eu não a acho burra,


pelo contrário, roubar o meu cartão mostra que você é bastante inteligente.
— pontuei, para que ficasse claro o que eu pensava.

— Tudo bem, vou perdoá-lo dessa vez, mas devo lembrá-lo que não
roubei, eu achei. — deu de ombros e virou o rosto para o lado, me
arrancando um breve sorriso.

Mais louca, impossível!

Já repararam como uma criança se comporta na primeira viajem?


Geralmente, se debruça na janela e observa tudo com os olhos brilhando.
Desde que atravessamos os portões da mansão Machala, Safira se
comportava assim.

— Você tem um lago na sua casa?! — voltou-se a mim, com os


olhos arregalados.

— Na verdade, são dois lagos. Esse é o pequeno, do jardim de


entrada. Há um outro maior, no jardim dos fundos. — sanei a sua dúvida,
fazendo-a piscar mais algumas vezes.
— Achei que isso fosse coisa só dois filmes... — murmurou
baixinho, voltando a admirar a paisagem ao redor.

Se formos analisar bem, a minha vida tem toda a emoção de um


filme de super-heróis do cinema e o personagem que me cabe, é o de vilão.

O veículo estacionou em frente a entrada principal, cujo acesso se


dava por alguma leva de degraus. Descemos e ela parou ao meu lado.

— Vai me dizer que você mora aqui sozinho?

— Não, moro com a minha mãe.

— Você ainda mora com a mãe? — senti a minha sobrancelha


tremular com aquela questão. — Isso é tão infantil. — riu, obrigando-me a
voltar os olhos em sua direção. — Há casos e casos, não é? — corrigiu-se
de imediato.

Bufei e sacudi a cabeça.

Como ela pode ser tão cobiçada por mim na maior parte dos
momentos e, em outros, se tornar completamente indesejável?

Infantil?!
Infantil é o meu caralho amarrado em um lacinho cor de rosa.

Precipitei-me em direção a entrada e, antes mesmo de tocar a


maçaneta, a porta se abriu. Ramon. Assim que viu Safira atrás de mim, ele
pigarreou.

— O que ela faz aqui?

— Veio se aprontar para a reunião.

— Aqui? — insistiu.
— Ela está no negócio, não há razão para temer. Se cabeças rolarem,
a primeira será a dela.

— Oi? — Safira que estava atrás de mim, deu um passo a frente. —


Não sei se entendi bem, mas ouvi algo sobre cabeças rolando e o meu
nome, na mesma frase... — disse com um meio sorriso, enquanto
gesticulava, quase que em pânico.

— Não se preocupe com isso, gatuna. — joguei-lhe uma piscadela e


ela se avermelhou por inteiro.

Eu simplesmente, adorava deixá-la daquele jeito, pois a vermelhidão


em seu rosto, indicava que a sua temperatura havia subido e, quem melhor
para baixá-la do que eu?

— Providencie roupas a altura do evento para a senhorita, Ramon.


— ordenei e precipitei-me em direção as escadas, rumo ao primeiro andar.
Ao notar que ela continuava atrás de mim, parei no primeiro degrau e a
espiei por cima do ombro. — Quer tomar banho comigo?

— T-T-Tomar banho? C-C-Com você? — ela se endireitou, como se


um capitão tivesse dado um grito em sua orelha, obrigando-a a ficar em
sentido.

— Sim. Qual outro motivo a levaria a me seguir até o meu quarto?

— E-E-Eu não sabia. — gesticulou com as mãos, ainda mais


vermelha que antes, dando curtos passinhos para trás.

Mordi os lábios e sacudi a cabeça.

— Você é cativante, Safira. — disse, acenando com uma das mãos,


antes de seguir degraus a cima.

Aquela altura, o tesão fazia o meu tecido gritar, enquanto o meu pau
o pressionava. Como uma mulher totalmente maluca consegue me excitar
tanto?
São seus olhos, cujo nome lembram o de uma pedra preciosa, assim
como o próprio? Será os cabelos lisos e grandes, cujo minha mão coça para
dar um nó e puxar para trás, enquanto esfrego meu volume em seu traseiro?

Santa Maria!

Estou envolto de pensamentos pervertidos e tudo por conta dela.


Quem sabe depois que resolvermos essa questão, eu não lhe proponha um
meio mais satisfatório de quitar o restante da sua dívida, Safira...

POR SAFIRA PINHAL

Quando o veículo atravessou os imensos portões pretos que traziam


um ar fúnebre, imaginei que estava sendo levada para o abatedouro, mas me
enganei.

Grandes palmeiras de ambos os lados, formavam um extenso


corredor de entrada e saída para os veículos. Havia jardim dos dois lados,
porém, do direito, um grande lago. A casa a minha frente, era praticamente
um palácio, tão extenso em largura que eu não conseguia contar todas as
janelas e quanto mais próximo o veículo ficava de sua entrada, mais
imponente a mansão se tornava diante de mim.

Como eu disse: conviver com ricos, só te lembra que você não é


pobre, é mais que pobre!

Atordoada com tudo aquilo, de repente, me vi absorta em outra


coisa que não fossem aqueles olhos amendoados, fitando-me a todo o
instante.

A recepção não foi nada calorosa, pois um homem, de porte grande,


cabelos cacheados e negros — e muito bonito, assim como Leon Machala
—, nos recebeu. Pela semelhança entre ambos, eles deveriam ser parentes.

Do nada, a conversa rumou para cabeças rolando e eu senti que era


o meu fim, mas Leon apenas disse para eu não me preocupar. Como não
vou me preocupar? Uma cabeça não é como um braço. Se eu perco um dos
braços, tenho o outro, mas a cabeça é apenas uma.

Claro que eu não quero perder nenhum braço, mas entre perder a
cabeça e o braço, eu escolho a “tampinha” do dedão. Inclusive, se
chegarmos a esse ponto, estou prontamente preparada para fazer essa
contraproposta.

Acompanhei-o, pois imaginei que seria o correto a se fazer, mas ele


subitamente parou e me fez incendiar por inteira com aquela pergunta:
“Quer tomar banho comigo”.

Quase cuspi um sapo, de tão zonza que fiquei. Se gaguejasse um


pouco mais, eu seria a nova Gagá de Ilhéus. Isso sem falar no fogo; as
labaredas do purgatório erguendo-se das minhas pernas e prontas para
incendiar todo aquele casarão de forma trágica e gozada.

Depois do embaraço, sentei-me em um dos sofás da sala principal e


o outro homem, Ramon, que me encarava religiosamente, sem dizer nada,
finalmente abriu a boca.

— Vou providenciar roupas. — disse e antes de sair, fez questão de


dizer. — Não toque em nada.

Assenti com a cabeça e assim que ele deu as costas, o imitei:

— Não toque em nada. — em seguida, rosnei.

Ele acha que eu sou o quê? Uma criança bagunceira que vai quebrar
a primeira coisa em que botar a mão? Jagunço!

Inconformada com a falta de confiança de Ramon em mim e a


demora de Leon, levantei-me do sofá e comecei a andar pela sala, que era
maior que a quitinete onde eu morava.

— Que pinturas feias. — comentei comigo mesma, ao visualizar


vários quadros rabiscados nas paredes. — Porém, se está na casa de rico e é
feio, vale muito. — constatei de imediato.

Aproximei-me um pouco mais para ver a assinatura nos pés do


quadro e apoiei uma das mãos em uma mesa, onde havia um jarro.

Aconteceu em questões de segundos. A mesa virou, o jarro caiu,


quebrou e eu fiquei paralisada, ao ponto de prender a respiração.

Pisquei algumas vezes e olhei para ambos os lados e, não havia


ninguém. Rapidamente, ergui a mesinha e catei juntei os cacos sobre ela.

— ... Finalmente, em casa. — a voz feminina atrás de mim, fez meu


coração parar. — Quem é você?

— E-E-Eu não sou ninguém. — girei o corpo em sua direção e


deparei-me com uma senhora e uma moça ao seu lado. Aparentemente, uma
funcionária.

Cabelos grisalhos, tão brancos que pareciam ter sido pintados. Ela
usava salto alto, uma saia preta e uma blusa de manga longa. Além dos
óculos escuros.

— Como assim ninguém? Ninguém é ninguém, ora, pois! —


rosnou, retirando os óculos.

Naquele exato momento, soube que ela era a mãe de Leon Machala.
Os traços eram idênticos, por assim dizer.

— Ora, pois eu sou, ninguém. — respondi, sem jeito.

Ela piscou algumas vezes e olhou para a moça ao seu lado, aos risos.

— Engraçada, não é?

— É, sim, senhora. — disse, assentindo com a cabeça.


— Veio para alguma vaga de emprego? — entregou a bolsa a moça
ao lado e adiantou-se até mim, mirando-me dos pés a cabeça. Sem dizer
nada, sentou-se no sofá e cruzou as pernas, fitando-me.

— Vim com o senhor Machala.

— Hum, e o que veio fazer?

— Bom, na verdade é uma história muito triste... — disse, fazendo-a


arregalar os olhos. — O seu filho, Leon Machala, é o meu salvador. —
ergui a barra da blusa e funguei, fingindo uma crise de choro.

— Oh, céus! Marília, pegue um copo de água para a moça. — ela


ordenou e a outra, foi mais que depressa. Ao voltar-se a mim, bateu uma
das mãos no sofá. — Sente-se aqui e me conte tudo.

— S-S-Sim, senhora. — funguei outra vez.

— E então? — pergunto, apreensiva.

— Estou com os dias contados. — funguei, mantendo a cabeça


baixa, sem parar de sacudi-la.

— Foi jurada de morte? Se esse for o caso, resolvemos o problema!


— bradou, erguendo o indicador.

Quê?! Virgem maria, onde eu me meti?

— Não... — choraminguei, balançando a cabeça. — Tenho uma


doença terminal e... — fingi soluçar. — O seu filho se dispôs a pagar todas
as despesas do meu tratamento.

Após um breve momento de silêncio, espiei-a rapidamente e ela


estava com um sorriso bobo no rosto.

— Ah, o Leon é um menino de ouro. Ele sempre ajuda aqueles que


pode. — disse, pegando as minhas mãos, unindo-as as suas.
— Sim, ele é um homem bom. — assenti com a cabeça.

A moça retornou com o copo de água e eu tomei aos goles.

— Seja lá o que for, eu tenho certeza que ele fará de tudo para que
seus últimos dias sejam os melhores. — engoli em seco ou melhor dizendo,
engoli em líquido, pois aquela foi a água mais difícil de descer na minha
vida inteira.

— Obrigada, eu acho... — gemi baixinho, devolvendo o copo a


moça, que se adiantou pelo cômodo, na mesma direção que havia vindo.

Quando me dei conta, a senhora havia me abraçado, pousando uma


das mãos em meus cabelos, afagando-os.

— Tudo vai ficar bem, ok? — apenas assenti com a cabeça, sem
dizer nada.

Contudo, o momento foi interrompido por um pigarreio. Ao


girarmos em direção as escadas, meu coração gelou. Era Leon Machala,
mirando-me com os olhos afiados e os braços cruzados.

— Leon! — a senhora se levantou e foi em sua direção. Sem dizer


nada, levou ambas as mãos ao seu rosto e beijou a sua testa. — Estou
orgulhosa de você, meu filho.

— E qual seria o motivo? — arqueou uma das sobrancelhas,


revezando os olhos entre a mãe e eu, que fingia olhar para outra direção,
mas me mantinha atenta a conversa.

— Ajudar essa pobre moça que tem uma doença terminal. Oh, que
coração bondoso você tem, meu amor.

Leon entreabriu a boca e eu me encolhi no sofá, arregalando os


olhos. Ele subitamente explodiu em gargalhadas e a mãe o mirou com
estranheza.
— Qual a graça?

— Nada, mamãe. Nada... — sorriu e tocou o rosto da mãe,


acariciando. — Como foi a viajem? Achei que fosse chegar amanhã.

— Adiantei o voo. Paris estava tediosa! — revirou os olhos.

— Imagino que sim... — respondeu.

— Bom, vou subir para tomar um banho. Nos vemos no jantar?

— Com toda certeza, mamãe.

— Aliás... — a senhora voltou-se a mim. — O meu nome é Elisa. É


um prazer tê-la em nossa casa, senhorita...?

— Safira.

— Fique quanto tempo quiser, meu amor.

— Obrigada, dona Elisa.

Ela sorriu e marchou degraus acima, enquanto o filho, vinha em


minha direção, em completo silêncio.

— Ela entrou e eu não sabia o que dizer quando perguntou quem eu


era, então eu inventei uma história e, foi isso... — disse, emendando as
palavras.

Leon levou uma das mãos ao queixo, sem tirar os olhos de mim e,
explodiu novamente em gargalhadas.

— Você é muito mais sagaz do que eu imaginava... — mordeu os


lábios.

— Sou? — estufei o peito e pigarreei. —É claro que sou.


Subitamente, vi seus olhos focarem em outra direção e quando o
acompanhei, encontrei o bendito vaso, que tinha cara de ser tão caro quanto
os quadros.

— Não fui eu. — rapidamente me defendi.

— Eu não disse nada... — ele ergueu as sobrancelhas, não


escondendo a desconfiança do atentado terrorista as suas peças de arte.

— Foi o gato cinzento. Ele entrou pouco antes a sua mãe e quando
tentei pegá-lo, ele voou sobre o vaso. — assenti com a cabeça.

— Hum, e o quê mais?

— E-E-E ele fugiu. — assenti com a cabeça.

— Apesar de ter custado setenta mil dólares, eu odiava esse vaso.

— S-S-Setenta mil dólares? — pisquei algumas vezes. — Não vou


pagar por isso! — coloquei-me de pé, cruzando os braços.

— E a história do gato?

— Hunf! — arrebitei o nariz e virei o rosto para o lado.

E, novamente, a sua risada ecoou pelo cômodo, ao ponto de me


fazer fervilhar de raiva, pois, eu me sentia uma palhaça de circo quando ele
ria de mim.

— Ramon ainda não voltou?

— Nem sinal do jagunço... — dei de ombros.

E falando no capitão do mato...


Ramon atravessou a porta principal, com centenas de sacolas.
Primeiro encarou Leon, depois me encarou e, em seguida, mirou o bendito
vaso.

— Que diabos aconteceu aqui?

— Foi um gato cinzento. — Leon disse com bom humor. — Preciso


falar com você.

— Certo. — assentiu com a cabeça e precipitou-se até mim,


entregando-me uma dúzia de sacolas. — Você tem o mesmo porte físico da
minha irmã, imagino que seja seu tamanho e número. — em seguida,
apontou com o dedo. Tem um banheiro no final do corredor.

— Obrigada. — agradeci e me apressei em direção ao banheiro. E


mesmo um pouco distante, consegui ouvir o jagunço questioná-lo.

— Ela quebrou o vaso da sua mãe?

— Sim, ela é a gata cinzenta. — respondeu Leon, aos risos.

Encolhi-me e apressei o passo, pronta para me trancar dentro


daquele banheiro e não sair nunca mais. Na cotação atual do dólar, aquele
bendito vaso vale muito mais que a minha dívida do cartão.

Por mais que Leon me despertasse desejo, ao mesmo tempo, eu


sentia medo. Um homem que é sorridente sempre, mesmo quando está
irritado com algo. Aquele papo da sua mãe sobre resolver as coisas e...

Acho que eles realmente são pistoleiros.


Nada me tira isso da cabeça!
05.
POR LEON MACHALA

“...não, menino, o meu c*, não!


Deixe-o fora isso”.

— Sabe que ela é inapta para o negócio, não sabe? — Ramon


cruzou os braços e me encarou. A sua expressão dizia muito mais do que
ele havia dito.

— Sim, talvez eu tenha interesse nela.

— Isso já ficou óbvio. A pergunta a se fazer é: vale a pena colocar a


negociação em risco?

— Os franceses são bem humorados. Com toda certeza, irão adorá-


la. — joguei-lhe uma piscadela e ele sacudiu a cabeça.

Aproveitando que estávamos à sós, toquei em um assunto delicado,


que eu pensei ter resolvido há um tempo, mas que voltou a me rondar.

— Alguma notícia sobre Kaio Noruega?

— Até o momento, não. Ele te enviou mais alguma mensagem?

— A última foi há dois meses, dizendo o quanto me ama e como


pretende estourar os meus miolos. — sorri de canto, ao lembrar da audácia
daquele verme.

Kaio Noruega era um dos meus mais importantes clientes e sabendo


exatamente como eu trabalhava, resolveu saquear uma das minhas cargas
— avaliada em quarenta milhões de reais em armamentos. A sua
empreitada teve sucesso de início, mas ele não contava com o fato de eu
descobrir toda a história.

Aqui se faz, aqui se paga!


Ordenei que recuperassem a carga e o matassem. Cumpriram a
primeira parte, mas, por descuido, ele escapou. Se você não pode matar um
homem, destrua o que ele tem. E foi isso que isso, deixei-o sem um único
centavo no bolso, despertando em seu coração o sentimento que corrompe
todos os homens: o desejo por vingança.

E quando a vingança toma conta de um homem, não é preciso


encontrá-lo. Ele vem até você.

Diante da demora da gatuna, deixei Ramon na sala e precipitei-me


em direção ao banheiro dos funcionários. Ao parar na porta, dei dois toques
breves e a chamei.

— Safira?

— Estou quase pronta.

— Espero que não esteja guardando nenhum dos meus sabonetes no


sutiã. — provoquei-a.

Ouvi um estrondo dentro do banheiro e, segundos depois, ela abriu a


porta, encarando-me com uma das sobrancelhas arqueadas.

— Por acaso, os seus sabonetes são de ouro? Se for o caso, quero


alguns.

Até pensei em respondê-la, mas a elegância que encontrei na


simplicidade do seu vestuário, me deixo hipnotizado. O vestido preto e
curto, que batia acima dos joelhos, valorizava suas coxas. O decote, o seu
busto e os pequenos fios que os seguravam, a deixavam inteiramente sexy.

— Não é o que eu imaginava para uma reunião de negócios, mas...


— gesticulei com uma das mãos e mordi os lábios. — Eu adorei.

Ela corou instantaneamente e uniu as mãos sobre o ventre.

— Obrigada.
— Eu só disse a verdade. — estendi-lhe uma das mãos e Safira me
lançou um olhar desconfiado. — Não vou te puxar, não dessa vez. Com
esse vestido, as coisas ficam mais perigosas. — pisquei para ela, que
avermelhou-se de vez.

— Pare de me dizer essas coisas! — rosnou.

— Que coisas? — ergui as sobrancelhas, fingindo não entender.

Ela bateu os pés no chão e cerrou os punhos, visivelmente irritada.

— Vamos agora?

Mirei o relógio de pulso.


Quase uma da tarde.

— Sim, agora.

— Estou com fome. — choramingou, pegando em minha mão.

Segui conduzindo-a até a sala e quando Ramon a viu, seus olhos


faltaram saltar. Sorri de canto para ele, quase lhe mandando um “eu falei,
ela é bonita”. Safira é uma joia bruta que precisa de cuidado. Apenas isso.

— Você está sempre com fome.

— Como é?! — encarou-me, perplexa. — Comi uma única vez em


sua presença. — disse, balançando a cabeça para os lados. — Se contar com
o dia da prisão, são duas vezes.

— O suficiente para constatar que você está sempre com fome. —


respondi com bom humor.

Por instantes, achei que ela fosse me dar um soco, contudo, a sua
reação me encantou. Ela abriu um largo sorriso e assentiu com a cabeça.
— Não posso negar. Comer é a melhor coisa do mundo e eu faço
isso muito bem.

— Concordo plenamente. Comer é a melhor coisa do mundo. — ao


usar um tom malicioso, estalei a língua, fazendo-a engolir em seco.

Ramon pigarreou, lembrando-me de que estava ali.

— O motorista está aguardando.

— Obrigado. — agradeci.

Soltei a mão de Safira e apontei para a porta principal. Sem dizer


nada, ela seguiu na frente e eu fui logo atrás. Depois de entrarmos no
veículo, atentei-me as negociações.

— ... entendeu o que eu quis dizer?

— Sim. Vou apenas traduzir o que você disser ao seu cliente.

— Isso mesmo. — confirmei e pousei uma das mãos sobre a sua,


apertando-a. — Conto você, gatuna.

Safira me encarou rapidamente e puxou a mão, virando para o lado.


Ela não disse nada, porém, eu conseguia ouvir a sua respiração ofegante.

Deixei um sorriso de canto escapar e mordi os lábios. Eu


simplesmente quero essa mulher, de todos os jeitos possíveis.

Quando chegamos ao aeroporto, descemos e seguimos para um dos


meus jatos. Acomodamos um de frente para o outro. Por instantes,
encontrei os seus grandes olhos azuis.

— Esse jato é seu?

— Sim.
— Uau! — ela disse, passando os olhos ao seu redor. — É quase
uma casa.

— Essa é a intenção; conciliar conforto e trabalho. — cruzei as


pernas e respirei fundo. — Nunca andou de avião antes?

— Algumas vezes... — respondeu, cobiçando a adega com os


olhos.

— Só na volta.

— Não me trate feito uma criança! — bateu as mãos no colo e


cruzou as pernas para um lado, em seguida, as cruzou para o outro,
fechando o cenho.

— E como devo tratá-la?

— Como uma mulher adulta. — encarou-me fixamente nos olhos.


As suas pupilas pareciam estar em chamas.

— Bem, não estava no roteiro te fazer gemer durante essa viajem,


mas se quiser... — fiz menção de desabotoar o blazer e ela quase saltou do
assento. Imediatamente ergui as mãos.

Safira sacudiu a cabeça e virou o rosto para o lado, rindo sozinha,


deixando claro que a minha constatação sobre ela ser maluca, não era
“achismo”, mas, sim, fato.

— Você se acha um gostosão...

— E eu não sou?

— Não! — ralhou e me encarou. Apenas tombei a cabeça para o


lado e ela engoliu em seco. — Bom, não é de se jogar fora, mas.. — ergueu
o tom de voz. — Se comporta como se fosse o último homem da Terra.

— Talvez você faça eu me sentir assim.


— Como? Eu não fiz nada...

— Justamente. — balancei a cabeça, sanando a sua dúvida. —


Todas as outras fazem tudo para chamar a minha atenção, mas você, Safira,
não faz nada. A sua naturalidade me cativou.

— Apaixonado pela mulher que roubou o seu cartão? — ela


gargalhou, como se aquilo fosse a coisa mais idiota do mundo. — Parece
até título de livro, daqueles bem clichês...

Gargalhei.

— E que título daria? — ignorei o “apaixonado”. Não, ainda não é o


caso.

— Roubando o cartão do bilionário. — abriu as mãos no ar e se


rendeu aos risos.

Por instantes, pensei naquilo e na forma em que nos conhecemos.


Realmente, fazia sentido.

— Você é boa nisso. Já pensou em escrever? — estiquei o assunto,


evitando deixar o trajeto monótono.

— Não. — negou com a cabeça e respirou fundo. — Sou apenas


uma boa leitora.

— Também gosto de ler. — quando falei aquilo, vi a surpresa tomar


o seu rosto. — É um bom passatempo.

— Quais autores? — ela tombou a cabeça para o lado, fitando-me


com curiosidade.

Pode parecer bobo, mas para os leitores, não. Sem sombra de


dúvida, o tipo de autor que alguém lê, diz muito sobre uma pessoa.
— Jane Austen. Virginia Woolf. Nora Roberts e, recentemente,
acrescentei a minha lista, a jovem Victoria Aveyard.

— Hum... — ela afinou os olhos. — Então você gosta de romances?

— Apenas nos livros.

— Isso não é nenhuma novidade. — deu de ombros.

Aquilo soou tão verídico, que me perguntei de onde ela havia tirado
tal afirmação e, foi quando uni os acontecimentos: o meu quarto de hotel
em Goiânia, Goiás.

— Aquela foi uma noite divertida. — murmurei, deixando um


sorriso de canto escapar.

— Imagino... — mexeu os ombros e torceu a boca, voltando os


olhos a janela.

Em pouco menos de trinta minutos, chegamos à capital paulista.


Descemos e entramos em outro veículo, que seguiu rumo ao restaurante no
qual combinamos de resolver os últimos detalhes do negócio.

Ao chegarmos ao Rubaiyat — famoso restaurante de São Paulo,


Capital —, fomos recepcionados pelo gerente do local. Conforme eu havia
pedido, o lugar havia sido reservado para mim, durante todo o dia. Isso
proporcionaria ao meu cliente mais conforto e discrição.

Depois de nos levar até uma das mesas, o gerente solicitou que
trouxessem água. O cheiro de comida era tão bom que meu estomago
roncava.

— Agora estou sentindo mais fome que antes... — Safira gemeu,


apoiando um cotovelo sobre a mesa e o queixo em cima do punho fechado.

— Não vamos demorar.


Mal fechei a boca e o meu convidado chegou, acompanhado por
alguns seguranças. Sem pressa, veio em nossa direção.

— Bonne après-midi, mon ami. — dirigiu-se a mim e se voltou a


Safira. — Bon après-midi mademoiselle.

Levantei-me e ela me acompanhou.

— Bon après-midi. — apertei a sua mão.

— Monsieur. — disse Safira, assentindo com a cabeça e ele


prontamente apertou a sua mão.

— Vamos começar com isso. — voltei-me a Safira.

— Sim, pois estou com fome e com fome, fico de mau humor. —
ela sorriu de canto.

— Sente-se, por favor. — apontei uma das mãos para o meu cliente
e, em seguida, me sentei.

— Asseyez-vous, s'il vous plait. — Safira traduziu e ele sorriu,


assentindo com a cabeça.

E, foi naquele exato instante, que me dei conta que ela fica
incrivelmente sexy falando francês. Por Deus, cada palavra que saia da sua
boca me arrancava um arrepio, ao ponto de me excitar no meio de uma
reunião de negócios.

Se o jeans que estou usando não fosse de qualidade, a calça já teria


cedido a pressão...

Não enrolei e fui objetivo. Em questão de uma hora de conversa, a


negociação foi fechada com sucesso. Exatamente como eu esperava.

Após fechar o negócio e confirmar a transação bancária, despedimo-


nos.
— Foi um prazer fazer negócio com você.

— Ce fut un plaisir de faire affaire avec vous. — Safira traduziu e


ele sorriu, assentiu com a cabeça e despediu-se com um aceno, sem dizer
mais nada.

Quando ficamos a sós, Safira voltou-se a mim e me fez a mais óbvia


pergunta. Inclusive, eu já esperava por isso.

— Por qual razão negociar um contrato de valor tão alto aqui, ao


invés de fazer isso na sua empresa? — piscou algumas vezes, mirando-me
com mais certezas que dúvidas.

— Há coisas que é melhor não saber, mocinha. — respondi e ergui


dois dedos, chamando um dos garçons.

— Oui, monsieur. — ela respondeu, dando-se por satisfeita.

Imediatamente sorri.

— Se continuar falando em francês perto de mim, não respondo


pelos meus atos. — mordi os lábios e desviei o rosto do dela, pois qualquer
traço de timidez, me faria saltar para o seu lado da mesa.

Engoli em seco e busquei controle, pois eu estava sedento por


aquele maldito sotaque francês ecoando em minhas orelhas.

— Pois não, senhor?

— O almoço, por gentileza.

— Como quiser. — assentiu com a cabeça e se retirou.

Quando finalmente percebi que havia me recomposto, voltei-me a


ela, que seguia mirando-me com curiosidade.
— Agora que quitou metade da sua dívida, pretende pagar a outra
como? — colei as costas na poltrona e a encarei.

— Não sei...

Sorri de canto e ela arqueou uma das sobrancelhas e, segundos


depois, fechou o cenho e cruzou os braços.

Após o almoço, onde ela comeu quatro vezes — sim, quatro vezes
—, retornamos para Santos. No caminho, após pensar sobre qual função ela
iria exercer, roubei a sua atenção na paisagem, que ela fazia questão de
admirar através da janela.

— Acompanhante de luxo.

— Quê? — ela me encarou, surpresa.

— Sim, essa será sua função de agora em diante.

— Não, menino, o meu cu, não. — disparou, mirando-me com


estranheza, ao ponto de levar o corpo para trás na poltrona.

Gargalhei, ao ponto de lacrimejar com a sua reação. Quando


finalmente recuperei o ar que me fugiu dos pulmões, me expliquei.

— Acompanhante de luxo é uma função de companhia em viagens e


eventos, mas agora que você botou o cu na jogada...

— Eu não botei nada! — ela me interrompeu, apontando o indicador


na minha direção. — Tire o meu cu disso! — usou um tom ainda mais sério
que antes.

Deus, aonde é que essa mulher estava que eu não a encontrei antes?

O meu corpo inteiro fervilhava em sua presença. Era um misto de


tesão, junto a imensa vontade de explodir em risos. Ora eu queria me
deliciar com a sua graça, ora eu queria me deliciar com o seu corpo.
06.
POR SAFIRA PINHAL

“...Não se preocupe. Só gosto de


carne de qualidade.”.

Na maioria das vezes, Leon era encantador. E, quase que o tempo


todo, era erótico; com o seu sorriso, o seu jeito de falar e se comportar. Ele
parecia sexy de todas as formas possíveis e eu já havia perdido as contas do
quanto ficava atiçada em sua presença.

Naquele momento, dentro do carro, quando ele pousou sua mão


sobre a minha, chiei por dentro feito uma panela de pressão. O coração foi a
boca e voltou e eu virei o rosto para o lado.

Leon se acha “o” gostosão do pedaço. Não estou dizendo que não é,
afinal, aqueles braços fortes que faltam rasgar o tecido das roupas e aquele
rosto de canalha que fode perguntando se quer mais...

Perdi o fôlego com os meus pensamentos, mas segui com o rosto na


direção oposta a dele.

Um detalhe muito importante sobre homens ricos. Em sua maioria,


eles andam com segurança e Leon não foge a regra. Contudo, os seus são
mais discretos; sempre a paisana. Percebi quando saímos que dois carros
vieram logo atrás de nós e, não demorou para que um deles ultrapassasse o
nosso veículo.

Aparentemente, até o senhor das armas sentado ao meu lado, teme a


morte. E cá entre nós, quem não teme? Confesso que o meu maior medo e
morrer pelada dentro do banheiro e não ter me depilado antes.

Eu ficaria conhecida como a defunta da xana amazônica e, ninguém


merece esse tipo de fama após a morte.

Finalmente chegamos!
A entrada do restaurante era magnifica. Eu não conseguiria
descrever detalhadamente os seus traços, mas era de cair o queixo,
literalmente. Ao entrar, acompanhando Leon, percebi que as poltronas eram
de couro e as mesas bem afastadas umas das outras.

E ali começou a sina de pagar metade da minha dívida. Não tive


muita dificuldade de interpretar a situação. Na verdade, eu estava ansiosa
para findá-la, pois no ritmo atual, o ronco de fome da minha barriga, logo
entraria nas negociações.

— O que foi? — resmunguei, de boca cheia, segurando um enorme


pedaço de pernil com uma das mãos.

— Nada... — Leon respondeu, unindo os lábios.

— Pare de debochar de mim! — falei com a boca cheia.

— Não estou debochando. Estou apreciando o quanto a sua


boquinha trabalha bem. — piscou para mim e, na pressa para não engasgar,
engoli e quase sufoquei.

— Maldito! — puxei fôlego, afinando os olhos.

Em resposta, Leon apenas gargalhou.

— Perfeita! — bateu palmas e recostou-se sobre a poltrona,


cruzando as pernas. — Sorte a sua que eu sou rico, caso contrário, temo
ficar sem um dos membros.

— Não se preocupe. — estiquei uma das mãos e peguei o colo de


suco, dando um gole. — Só gosto de carne de qualidade. — retribui-lhe a
piscadela e ele mordeu os lábios novamente.

Era um jogo para ele.


Para mim, era questão de não ir presa.
Apesar desse pequeno detalhe, eu gostava da sua companhia e o
modo ousado com que ele tentava flertar comigo. Aquilo ressoou na minha
mente e eu ri sozinha.

Flertar comigo?
Corajoso demais!

— Posso saber do que está rindo? — cruzou os braços, passando os


olhos por mim.

— De você.

— O que eu fiz?

— Pensei umas coisas aí e... — ergui o indicador, dando uma


garfada em um pedaço de bife. — Se importa se eu terminar de comer?

— Não... — ele sacudiu a cabeça, parecendo conter mais uma


gargalhada.

Depois de comer feito uma porca que deu cria, escorei-me na


poltrona, tombando a cabeça para trás. Por instantes, jurei ter visto
rosquinhas achocolatas girando ao redor da minha cabeça, mas o mais
hilário mesmo, foi acompanhar as expressões de Leon ao me ver comer,
pois, dessa vez, foi diferente.

Eu realmente estava com fome e...


Ele não estava preparado para isso.
Nenhum homem está.

Sou o famoso slogan que roda na internet: “rostinho de princesa e


prato de pedreiro”.

Na volta, já dentro do jato, ele me pegou desprevenida com aquela


proposta para eu quitar o restante da dívida. Saiu automático: “Não,
menino, o meu cu, não!”.
As palavras da boca, iam na via contraria da visão que tive
mentalmente: Leon usava uma cueca, com uma espécie de cinto do Batman,
cheia de apetrechos; algemas, lubrificantes, preservativos... Enquanto seus
olhos miravam-me com desejo, ele fazia questão de bater o pequeno chicote
em uma das mãos.

E foi quando ele me tirou daquele transe, explicando-se. Da sua


forma é claro. Ele nunca perdia a oportunidade de lançar sua carta na mesa.

Por conta do percurso curto, não demoramos para chegar. Assim que
descemos, segui em direção a entrada, mas fui interceptada por Leon, que
centrou os olhos nos meus e pegou minhas mãos.

— Obrigado por hoje.

— Só cumpri o combinado.

— Sim, eu sei. Ainda assim, agradeço. — assentiu com a cabeça e


soltou as minhas mãos, apressando-se em entrar.

Por instantes, fiquei parada, esperando o meu corpo esfriar, antes de


segui-lo. Essa sensação de estar pegando fogo quando ele me toca, só pode
ser tesão. Caso contrário, é o tinhoso me rodeando.

Finalmente entrei e o vi conversando com Ramon. Segui para a sala


principal, sentando-me no sofá. Quase no mesmo instante, uma mulher, se
aproximou. Pela roupa, tratava-se de uma das funcionárias da mansão.

— Senhorita Safira, pode me acompanhar, por favor? Vou te levar


aos seus aposentos.

— Tão nova e já aposentada. — levantei, fazendo piada da palavra.

A moça forçou um sorriso e pigarreou. Sem delongas, guiou-me


pelas escadas. O quarto era o último do corredor. A cama imensa, com um
closet do lado esquerdo e o banheiro do lado direito. Também havia uma
sacada que me roubou a atenção de imediato. Caminhei até ela e de lá, pude
admirar o outro lago que ele havia mencionado.

— Meu Deus... — murmurei, chocada.

Não era só o lago que era grande. Eu simplesmente não conseguia


ver o fim da propriedade. Os muros que cerceavam o lugar, simplesmente
desapareciam entre as árvores distantes, que eu mal conseguia visualizar
com nitidez.

— O jantar será servido às oito. — a moça se pronunciou,


lembrando-me de que eu não estava sozinha.

Girei o corpo em sua direção e simplesmente agradeci. Assim que


ela fechou a porta, joguei-me na cama e estiquei os braços.

— Estou exausta. — disse, respirando fundo.

Peguei o celular e mirei-o por alguns instantes. Nenhuma


mensagem. Geralmente, eu só falava com mamãe. O meu jeito
desengonçado e meio maluquinho, sempre me impediu de solidificar
amizades. Eu era sempre a “amiga indesejada”.

No fim das contas, ficar sozinha não foi tão ruim.

Ao anoitecer...

Sentei-me a mesa com a família Machala. O silêncio sepulcral era


incômodo, mas parecia ser uma regra de não falar a mesa, a menos que...

— Leon, meu filho... — dona Elisa o mirou de forma séria. — O


que aconteceu com o meu vaso?

Engoli em seco.

Aquele era o momento em que eu seria descoberta e morta. Pelo que


ela havia dito na nossa conversa, matar era quase um hobby.
Assim como filho, a matriarca, era uma pistoleira.
Uma velha pistoleira.

— Foi o gato cinzento. — disse com bom humor.

— Que gato? — ela franziu a testa.

— Um gato maluco entrou na sala e quando Safira tentou afugentá-


lo, ele derrubou o seu vaso. — contou, voltando os olhos a mim. — Não foi
isso, Safira? — arqueou uma das sobrancelhas.

Assenti com a cabeça e, não contente em apenas confirmar, tive que


abrir a minha boca grande.

— Dona Elisa... — comecei, sacudindo a cabeça. — Quase um


demônio! Os olhos estavam vermelhos de raiva...

— Santa Maria! — ela fez o sinal da cruz. Leon e Ramon abaixaram


a cabeça, contendo o riso.

— O bicho era enorme e tinha um miado muito estranho. Era quase


o sussurro do tinhoso, “cafugando” aqui. — apontei para a minha nuca. —
Eu achei que ele fosse me rasgar na unha. — sacudi a cabeça e fiz o sinal da
cruz, igual ela. — Coisa de outro mundo... — fechei o cenho, tentando soar
séria.

— Dê um jeito nesse gato, Leon. — dona Elisa piscou algumas


vezes e sacudiu a cabeça, preocupada com a história.

— Já dei jeito, mamãe. — ele me lançou um sorriso de canto e eu


arrebitei o nariz.

De repente, o assunto mudou bruscamente, voltando-se a mim.

— Leon estava me contando que te contratou como intérprete. —


assenti com a cabeça. — Fico feliz por você.
— Obrigada, dona Elisa.

— Qual é a sua doença mesmo?

— Câncer. — Ramon engasgou e eu o encarei. Ele apenas acenou.


— Câncer terminal.

— Pobrezinha... — ela gemeu, pousando uma das mãos sobre a de


Leon. — E onde começou, você sabe?

— No reto. — foi a primeira parte que me veio à cabeça.

Que merda!
Literalmente, era uma merda.

Os olhares presentes se fixaram em mim de forma tão incômoda,


que senti vergonha e não me contive:

— O que foi, gente?! Pode acontecer com qualquer um... — dei de


ombros.

— É, de fato. — dona Elisa torceu a boca e pigarreou. — Vamos nos


ater aos assuntos felizes. — concordei com um aceno. — Viram quem
morreu hoje? O maldito Jhon Pedron, aquele das propagandas de cano na
TV. Céus, eu odiava aqueles comerciais...

Oi?
Assuntos felizes?

Ao perceber a minha estranheza, Leon lançou-me um sorriso


discreto. E, apesar de tentar fazer aquilo soar normal, eu sabia que nada
naquela família era normal; muito menos parecia.

Era como se a qualquer momento, todos fossem sacar as suas armas


e iniciar um tiroteio em pleno jantar. Em pleno jantar... A ideia de outra
coisa ser cravada na comida, além dos meus dentes, me entristecia.
Depois do jantar, onde me comportei e comi apenas duas vezes,
segui para a sala principal. Dona Elisa e Ramon subiram para os seus
quartos, enquanto Leon, sentou-se no sofá em frente ao meu.

— Quer beber algo?

— Uma taça de vinho cairia bem...

— Tinto ou suave? — ele se levantou, caminhando em direção a


outra sala.

— Suave, por favor.

— Esses embebedam mais rápido. — Leon comentou, sumindo


pelos cômodos.

Vou deixá-lo descobrir que quando se trata de bebida, pareço nem


ter fome...

Depois de alguns minutos, ele retornou com uma garrafa em mãos e


duas taças. Ao longo da noite, Leon fez o mesmo trajeto quatro vezes.

A conversa era pouca, mas os seus olhos diziam o que não saia dos
seus lábios. Cada vez que eu sentia um arrepio, sabia que ele estava me
fitando de algum modo e, gole após gole, aquele homem moreno se tornou
ainda mais atraente para mim, por isso, antes que eu cometesse alguma
loucura, decidi bater em retirada.

— Bom, eu vou dormir... — coloquei-me de pé e acenei com uma


das mãos. — Boa noite, Leon Machala... — disse, virando-me para ir em
direção as escadas, mas acabei pisando em falso.

Eu teria rachado a cabeça no chão se ele não tivesse me segurado


pela cintura, mas, agora, sentindo o seu volume rígido em meu traseiro, eu
queria ser rachada ao meio por ele.
— Está tudo bem?

— Não, não está. — ofeguei, erguendo-me e, lentamente, passei as


mãos sobre as suas, acariciando-as.

— O que foi?

— Parece que Satanás veio beber conosco. Que calor... — ofeguei,


abanando-me.

— Está quente? — ele sussurrou em minha orelha, fazendo-me


arrepiar por completo. — Podemos dar uma volta no jardim.

Aconteceu de súbito.

Virei-me em sua direção e o encarei nos olhos. Nossas bocas


estavam próximas demais, assim como nossos corpos. Trocamos um breve
sorriso e eu abaixei a cabeça, mas quando a ergui, simplesmente senti seus
lábios se colarem aos meus.

Volta no jardim?
Quero dar uma volta em cima de você!

Suas mãos grandes subindo por minha cintura, me faziam arrepiar,


ao ponto de eu me contorcer em seus braços. O seu cheiro, aroma de café,
invadia as minhas narinas e, por mais que faíscas de lucidez acendessem em
minha mente, me advertindo que alguém poderia chegar a qualquer
momento, as ignorei, pois...

Seu beijo era viciante o suficiente para me capturar por inteira.

Suas mãos desceram um pouco mais e apalparam o meu traseiro em


cheio, me fazendo soltar nossas bocas e arfar, puxando um pouco de ar.

Quando seu rosto se encontrou ao meu, mordi os lábios de excitação


com aqueles grandes olhos amendoados me fitando com puro desejo. Era
intenso, penetrante e...
— Vou te foder até você ficar mole em meus braços. — o tom sexy
fez minhas pernas bambearem e o senti me puxar pela cintura, colando meu
corpo ao seu.

De súbito, aquela maldita letra na minha cabeça e, sem saber o que


dizer, cantei:

— ... Se tu não acredita, vou mostrar para você, mas quando eu


mostrar, você vai ter que lamber.
(Tcheca – Danny Bond)

Leon piscou algumas vezes e gargalhou.

— Pois bem, gata cinzenta, me mostre. — aproximou os lábios dos


meus, mordiscando-o, antes de puxá-los em sua direção.

As coisas aconteceram aleatoriamente. Em meio ao beijo, as peças


de roupa foram caindo no chão e, quando percebi, estávamos nus. O seu
cacete era grosso e de tamanho mediano, sem um único pelo — diga-se de
passagem, mais que desejoso —, assim como o restante do corpo, que
exibia músculos onde quer que olhasse.

Não tive tempo suficiente para admirá-lo, pois Leon havia me


empurrado contra o sofá e se debruçado entre as minhas pernas. Ele
mordiscou a minha boceta carinhosamente e, em seguida, usando a língua,
massageou o meu clitóris, deixando-me ainda mais excitada.

— Santa Maria! — ofeguei, segurando os seus cabelos. — Achei


que você fosse bom apenas com a pistola, mas essa boca... — ofeguei,
quando o senti me invadir com a língua.

Suas mãos alisavam as minhas coxas, enquanto eu ouvia os estalos


que ele dava, sempre que se afastava por alguns segundo, antes de retornar
com mais voracidade.

Esse homem vai me fazer gozar sem enfiar um dedo dentro de mim...
— Que boceta gostosa de chupar! — disse ao se afastar e lamber os
lábios, mirando os meus olhos. O meu rosto avermelhou-se inteiro e ele
sorriu. — Agora eu quero te ouvir gemer.

— Mais? — ofeguei e ele assentiu com a cabeça, mordendo a boca.

Sem pressa, Leon retirou um preservativo da calça e o vestiu. Ao


aconchegar-se novamente entre as minhas pernas, encaixou a glande. Com
as mãos apoiadas entre a minha cabeça e os olhos fixos nos meus, entrou
em mim lentamente.

Dou um pouco no começo, pois o seu cacete era grosso e quando o


senti todo, avancei sobre o seu peitoral e o mordisquei, fazendo-o
intensificar os movimentos. Quanto mais ele socava, mais eu gemia em sua
orelha e, me dava conta de que o “me deixar de pernas bambas” era bem
real.

Os movimentos eram frequentes, mudando a velocidade a cada


momento, conforme eu gemia. Ele parecia entender o que os sons que
escapavam dos meus lábios queriam dizer; ora sentia um imenso prazer,
mas, às vezes, um pouco de dor.

Depois de vários minutos na mesma posição, trocamos de lugar e


ele se sentou no sofá. Sem demora, sentei-me em seu pau e comecei a
quicar, subindo e descendo o quadril. O prazer se intensificou quando o
senti abocanhar os meus seios, chupando-os com fartura.

Tombei a cabeça para trás e, parei em seu colo, mas ele não me deu
descanso. Suas mãos seguraram minha cintura com firmeza, enquanto o
ritmo de estocadas voltava, com mais força e rapidez que antes.

O meu interior se contorcia, prestes a explodir e, pela sua pulsação


contínua dentro de mim, ele também estava chegando lá. O primeiro
orgasmo veio e eu senti o meu corpo amolecer, caindo sobre o dele, mas,
ainda assim, fiz questão de gemer em sua orelha.
Segundos depois, os seus gemidos másculos ecoaram em minha
orelha, me deixando completamente arrepiada e, com o rosto ardendo de
vergonha.

Os movimentos foram cessando lentamente. Permaneci abraçada ao


seu pescoço, sem dizer nada e, ficamos naquela posição por alguns
segundos, enquanto eu sentia o seu pau ainda pulsar dentro de mim.

— ... isso foi muito bom. — sussurrou em minha orelha, deslizando


a língua pelo meu pescoço.

— Tão bom quanto um milkshake de sorvete, com chocolate quente


e kitkat.

Leon gargalhou e tombou a cabeça para trás.

— Tão bom quanto isso. — ele concordou.


07.
POR LEON MACHALA

“... será que você finalmente


encontrou a Sra. Machala?”.

Depois da terceira transa, Safira acabou dormindo em meu colo e eu


a trouxe para o meu quarto...

Uma mulher é linda de várias formas, mas nada se iguala ao ato de


despertar e vê-la nua em sua cama: os cabelos caindo sobre o rosto e o
sorriso em sua face, atados a vulnerabilidade de alguém que confiou em
você, mesmo que por uma noite, para dormir ao seu lado e para ter prazer;
encanta até o mais perverso dos homens.

— Sim, nós vamos nos conhecer melhor. — murmurei, ainda


sentado na cama, admirando-a.

— ... espera, eu ainda não comi a sobremesa. — murmurou de olhos


fechados, me arrancando um sorriso.

— Está sonhando? — tombei a cabeça para o lado, mordendo os


lábios. — Pelo visto, nem mesmo dormindo, você consegue se esquecer da
comida...

Espreguicei-me na cama e a admirei uma vez mais, antes de seguir


em direção ao banheiro. Tomei uma ducha rápida e me aprontei para o
trabalho. Acabei encontrando com Ramon na sala. A sua expressão era de
poucos amigos.

— Bom dia.

— Bom dia para quem? — resmungou, tomando mais um gole do


que eu deduzi ser café.

— Não conseguiu dormir?


— A sua diversão noturna me tirou o sono. — respirou fundo, sem
me encarar.

Apenas sorri e sacudi a cabeça.

— Sinto muito por isso.

Ramon, por sua vez, apenas revirou os olhos, sem se importar com
meu pedido de desculpas.

— ... está realmente interessado nela? Quero dizer, ao ponto de


investir? — seus olhos fixaram-se no meu rosto e eu enfiei as mãos nos
bolsos. — Isso não é do seu feitio.

— Ela é uma mulher exótica.

— Quando você diz exótica, está querendo dizer maluca?

Sorri ao ouvir aquilo e assenti com a cabeça.

— É, basicamente isso.

— Que gosto estranho.

— Ela é divertida. Traz alegria ao meu dia.

— Espera que ela seja divertida a vida toda?

— Duvido que seja diferente. Está enraizado no ser dela. — cruzei


os braços e mordi os lábios, lembrando-me do primeiro instante em que a
conheci. — Não, ela não vai mudar. Ela é o pau torto que nunca se
endireita.

Ramon piscou algumas vezes e, por fim, gargalhou.

— Qual a graça?
— Está apaixonado.

— Não, não estou.

— Sim, está. Vejo nos seus olhos. — deu mais um gole, findando o
café e se levantou, aproximando-se de mim. — Será que...

— Não. — revirei os olhos e precipitei-me em direção a cozinha,


tentando fugir daquele assunto que não surgia há muto tempo.

— Será que você finalmente encontrou a Sra. Machala? —


perseguiu-me até o outro cômodo.

Ignorei a questão e me servi um pouco de café, provando-o.

— Sra. Machala? Hum... — sorri ao repetir aquilo. — Não soa tão


mal, mas a resposta ainda é não.

— Certeza? — Ramon parou ao meu lado, exibindo aquele sorriso


sacana.

— Quer ganhar um soco no nariz?

— Oh, ele me ameaçou. — Ramon deu alguns passos para trás e


levou uma das mãos ao queixo, afinando os olhos.

— Deus, não faça isso.

— Por que?

— Isso é... — gesticulei com uma das mãos, procurando palavras.


— É algum tipo de feitiçaria. Sempre que faz isso, me envolvo com a
mulher.

— Mentira.

— Fez isso há alguns anos e quase me casei. Quase. — lembrei-o.


— Não me lembro.

— Pois eu, sim. Agora pare com isso.

— Felicidades, primo. — insistiu e antes que eu virasse em sua


direção para socá-lo, o filho de uma boa mãe, já havia deixado o cômodo.

Sra. Machala?

Aquilo ecoou na minha cabeça por alguns segundos, mas, ao pensar


na possibilidade, logo desisti da ideia. Lembro-me como se fosse ontem...

“... sua mulher será um alvo”.

Foi o que a mamãe disse e com razão.

Quando digo que quase me casei, estou me referindo a um término


que ocorreu por motivo de força maior. A minha ex-noiva foi ameaçada e,
aparentemente, não me amava o suficiente para arriscar a própria vida.

Apesar de ter ouvido diversas vezes de mamãe que ela era uma
mulher interesseira, eu estava encantado, o suficiente para fazer qualquer
coisa por ela, mas não ela por mim.

E, foi nesse instante que entendi que isso não era o suficiente para
um casamento.

Outra questão surgiu.

Vale a pena colocá-la em risco?

Enquanto ela for uma funcionária, por assim dizer, não terão olhos
para ela, mas se em algum momento isso mudar, a sua cabeça irá a prêmio
no mesmo dia.
— Se a sequestrarem, acredito que vão me pagar para recebê-la de
volta...

Gargalhei sozinho ao cogitar aquela possibilidade.

— Santa Maria! — mamãe entrou na cozinha, fazendo o sinal da


cruz. — Deu para conversar sozinho?

— Eu estava pensando alto. — aproximei e beijei o seu rosto. —


Dormiu bem?

— Feito um anjo. — disse, passando os olhos pela cozinha. —


Matou os funcionários da casa e não me avisou?

— De modo algum.

— E onde estão? — o tom irritadiço ecoou e logo, passos


apressados ressoaram em seguida.

Em questão de segundos, eles surgiram de todos os cantos. Abri um


pequeno sorri e respirei fundo.

— Ainda são oito da manhã. — lembrei-a e pedi: — Seja gentil.

— Não se conquista o mundo com gentileza. — rosnou e voltou-se a


uma deles. — Onde está o meu café com creme?

— Já vou preparar, senhora.

— Deveria estar pronto. — resmungou e girou em cima dos saltos,


marchando em direção a cozinha.

Mamãe nunca passou uma boa impressão, mas é uma mulher


incrível. As pessoas que trabalham na mansão, foram contratadas por ela.
Cada um traz uma história triste e graças a sua compaixão, eles mudaram de
vida.
Dentro de toda essa postura imponente, há uma mulher de imenso
coração, sempre pronta para ajudar os outros. Do seu modo, é claro.

Pedi a uma das moças para que me preparasse o café da manhã:


torradas, ovos mexidos e café com creme. E é claro, lembrei-a de nossa
hóspede.

— Não se esqueça; apesar de ter o corpo de uma formiga, come


feito um elefante. — disse, segurando o riso.

— Sim, senhor.

Depois do café, segui para a empresa. Pelo WhatsApp, enviei ordens


precisas a Ramon:

“Assim que ela acordar, deixe-a tomar café e a traga para a


empresa”.
“Por acaso eu virei babá da gata Cinzenta?”.
“Se eu disser que não, vai se sentir melhor?”.
“Não!”.

Eles chegaram por volta das dez horas. Essa era a primeira vez que
Safira vinha na empresa e o seu espanto, estava estampado em seu rosto.

— O que foi? — perguntei, roubando a sua atenção da decoração da


parede.

— Que medieval. — murmurou e ao voltar aos olhos a mim, corou


por completo. — Nada...

— Inspirado na idade das trevas, a imagem remete o início da guerra


santa. — expliquei, caminhando até uma das paredes, apontando para um
imenso desenho. — Sabe que arma é essa?

Safira se aproximou e negou com a cabeça.


— Uma alabarda. Foi muito usada para cortar cabeças. — sorri ao
dizer aquilo. Ao mirar Safira, percebi seus olhos arregalados e pigarreei: —
É claro que hoje temos métodos menos primitivos.

— Para matar ou cortar cabeças? — tombou a cabeça para o lado.

— Ambos.

A minha resposta a fez ir longe, ao ponto dos seus olhos parecerem


perdidos e ela murmurar:

— Será essa a sensação de perder a cabeça? — ergueu as


sobrancelhas.

— Quer experimentar?

— Quê? — arregalou os olhos e rapidamente os afinou, rosnando


para mim: — Sempre soube que você queria os meus órgãos. — e erguendo
o indicador, começou: — Sou toda podre por dentro. Não valho um
centavo.

Gargalhei e dei alguns passos a frente, parando diante dela. Safira


engoliu em seco quando alinhei nossos olhos.

— O seu gosto é doce. — sussurrei, fazendo-a arregalar os olhos. O


seu rosto corou por inteiro e, imediatamente sorri.

— Não faço ideia do que está insinuando. — deu-me as costas e


cruzou os braços.

— Devo refrescar a sua memória? — pousei ambas as mãos em sua


cintura, fazendo-a dar um pulinho, sem sair do lugar.

— Sabe que estamos em um local repleto de armas, não é? — suas


mãos desceram lentamente, pousando sobre as minhas.
— Você e armas são uma combinação extremamente perigosa. —
mordi os lábios e me afastei educadamente.

— Esse é o meu segredo, Leon... — virou-se em minha direção,


afinou os olhos e cruzou os braços. — Eu sou uma arma.

Aquilo deveria soar ameaçador, mas, ao contrário do que ela


esperava, tive uma crise de risos.

— Do que está rindo, seu... seu... seu idiota!

— Nada... — disse assim que recuperei fôlego.

— Hunf! — arrebitou o nariz e virou o rosto para o lado.

— Quer conhecer a fábrica?

— Tem ouro aqui dentro? — respondeu com outra pergunta,


tornando a passar os olhos pela minha sala. — Vi tantos seguranças na porta
que logo imaginei que estava entrando no cofre do banco central.

— Armamento é algo cobiçado. — disse, precipitando-me em


direção a porta. Assim que a abri, apontei uma das mãos. — Vamos fazer
um tour pela empresa.

— Se é o jeito... — deu de ombros e atravessou a porta.

Naturalmente, a maioria das mulheres não tem interesse por armas


e, Safira não era diferente. Passamos desde a produção de munição, até o
principio de construção de um revólver. Apesar da curiosidade em seus
olhos, ela não se deu ao trabalho de fazer uma única pergunta, exceto
quando viu a sala de treinamento de tiro.

— O que é aquilo? — a alegria era palpável em sua voz.

— Não, nem pensar. — neguei com a cabeça.


— Uma vez só. — pediu, fazendo um beicinho.

Sacudi a cabeça algumas vezes, dizendo a mim mesmo que aquilo


era uma péssima ideia, mas acabei cedendo.

Nada que um colete a prova de balas não resolva, não é mesmo?

— Quer a maior. — apontou na direção das armas expostas e eu


afinei os olhos. — O que foi?!

— Vamos começar do começo. — disse, caminhando até o


expositor, onde peguei um revólver e voltei-me a ela, que prontamente
ergueu as mãos para o alto. — O que foi? — arqueei uma das sobrancelhas.

— Está apontando para mim. — respondeu, quase que em pânico.

Ri e sacudi a cabeça.

Na verdade, a traseira da arma estava apontada para a direção dela.


Em todo caso, comecei a lhe ensinar o básico: como pegar uma arma;
coloquei a pistola sobre a mesa e posicionei-me atrás dela:

— Pegue a arma.

— E se ela atirar? — encarou-me, piscando algumas vezes.

— Se eu tivesse criado uma arma que atira sozinha, provavelmente,


eu seria o homem mais rico do mundo, ao invés de ser um deles. — sacudi
a cabeça e peguei a arma de forma correta, mostrando a ela. Em seguida,
entreguei-lhe.

— Isso, você segura no cabo. — expliquei. — Vê esse buraco onde


se põe o dedo? — ao perceber o quanto aquilo foi desconcertante, pigarreei.
— Isso, esse mesmo. — confirmei quando ela fez o que eu havia dito e
segurei o seu pulso, mirando no alvo. — Aperte o gatilho.

— Não.
— Por que não?

— Eu vou atirar.

— ... mas não é essa a intenção? — Safira revirou os olhos e eu


mordi os lábios. — Pronta?

— Sim.

— Atire!

Assim que ela deu o primeiro tiro, um grito ecoou junto.


Provavelmente, ela se assustou com o som, mesmo com o equipamento
adequado para abafar ruídos.

— Santa Maria... — murmurou, ofegante.

A pistola estava quase despencando da sua mão, quando a segurei.

— De novo? — ela assentiu com a cabeça e eu a ajudei, mais uma


vez, com a postura e mira.

Outro tiro.
Outro grito.

Por fim, ela soltou a pistola e ofegando, apoiou ambas as mãos


sobre a mesa.

— Não sirvo para ser pistoleira. — sacudiu a cabeça e ao voltar-se a


mim, sorri. — O que foi?

— Você fica incrivelmente sexy quando está armada. — joguei-lhe


uma piscadela e ela corou.

Então, o inesperado aconteceu. Safira pegou o revólver e o apontou


em minha direção. Confesso, por alguns segundos, senti o meu corpo
tremer, mas...

— Pretende me matar?

— Não. Eu só queria mostrar que aprendi a segurar uma arma. —


sorriu, abaixando-a.

Muitas mulheres já fizeram o meu coração palpitar, mas, dessa


forma, foram poucas. Abaixei a cabeça e mordi os lábios e quando ergui o
rosto novamente, puxei-a pela cintura, colando o seu corpo ao meu.

— E agora, pretende me matar? — rocei o nariz no seu, mirando-a


nos olhos. Safira ofegou e negou com a cabeça. Mordi os lábios e passei a
ponta da língua em sua boca. — E agora? — ela sorriu de volta, exibindo
aquele olhar sexy e negou novamente. — Não faça isso, não aqui, pois vou
acabar não me contendo...

— E qual o problema? — perguntou, corando automaticamente, ao


ponto de fechar os olhos e tombar a cabeça para trás.

— A janela atrás de mim é de vidro, lembra? Foi assim que você


descobriu essa sala e...

— Tarado! — empurrou-me para se afastou, dando alguns passos


descompassados.

Desde o primeiro momento em que a vi, eu sabia que era ela e,


agora, não tenho dúvidas disso, pois...

O meu coração palpita em sua presença, assim como os meus lábios


secam, ansiosos pelos seus. O meu pau, literalmente, falta atirar quando
sinto o seu cheiro.

Por isso, devo confessar: tudo isso junto, diante de uma única
mulher, nunca me aconteceu antes...
08.
POR SAFIRA PINHAL

“...os meus órgãos estão todos


podres, caralho!”.

Ao acordar, me vi em um quarto diferente. Quase que de


instantâneo, imagens da noite passada vieram a minha cabeça. Os seus
lábios nos meus, os gemidos, o toque quente que quase me transformou em
um míssil tático do exército...

— Santa Maria! — ofeguei ao tocar os meus lábios e, deitei na cama


novamente, cobrindo o meu rosto com um travesseiro.

Só de ver cada uma das cenas mentalmente, o meu rosto ardia de


vergonha. Sim, Leon é um pistoleiro, que tem uma pistola de grosso calibre
e, o mais importante, ele sabe muito bem como manusear.

— Deve ter sido um sonho... — joguei o travesseiro para o lado e


mirei o teto, sacudindo a cabeça. — Só pode ter sido um sonho. — sentei-
me na cama e passei os olhos por mim mesma, dando-me conta de que
ainda estava nua. — Não foi um sonho... — prendi a respiração.

O meu coração batia sem parar, em alta velocidade. A adrenalina


que me tomava trazia paixão e medo, pois eu não sabia o que poderia
acontecer dali em diante.

Agora que conseguiu o que sempre demonstrou buscar, posso


simplesmente ser dispensada ou, pior ainda, os meus órgãos devem voltar à
mesa de negociação...

Pistoleiro e traficante de órgãos.

Nada tirava da minha cabeça que Leon era uma espécie de doutor
monstro e que ele aliciava as suas vítimas da mesma forma: esquecia o
cartão propositalmente, propunha um trabalho e, puft, caixão azul escrito
indigente na porta.
Prendi a respiração e quase perdi o fôlego, enquanto mais uma
dedução mirabolante de última hora me fazia maquinar as possibilidades do
futuro.

— Não. — neguei com a cabeça, desmanchando toda aquela teia de


loucura. — A sua gargalhada é real e sincera. Isso diz muita coisa... —
respirei aliviada.

Após o primeiro surto do dia, tomei uma ducha na suíte de Leon.


Era completamente diferente da minha. A banheira duas vezes maior e a
vista para o lago, dava um ar ainda mais aconchegante. Isso sem falar na
imensa parede espelhada e nos produtos de beleza.

Então, você é vaidoso?


Um homem que se cuida é um homem que se garante.
Tenho dito!

Passei quase uma hora no banho e, ainda assim, eu continuava


sentindo o seu cheiro em minha pele. O delicioso aroma de café.

A pior parte, foi ter que atravessar o corredor feito uma criminosa
— na teoria, eu era uma... —, esgueirando-me pelos cantos, com uma
toalha enrolada ao corpo, enquanto rezava para que ninguém notasse de
qual quarto eu havia saído.

— Safira? — reconheci a voz de imediato. Era dona Elisa.

Paralisei com um pé na frente e outro atrás, com ambas as mãos no


ar. Senhor, se for da tua vontade, a tua filha está pronta! Naquele momento,
o meu coração realmente parou e só voltei pela vontade de Deus, pois se
fosse pela minha, ali mesmo teria morrido.

— Oi?! — gemi baixinho.

— Está tudo bem, você parece... — disse, rodeando-me e ao parar


na minha frente, cruzou os braços. — travada?
— É a minha coluna. — gemi baixinho e me fiz torta, para
corroborar com a mentira.

— Santa Maria! — levou uma das mãos a boca, apavorada com a


situação. — Quer que eu chame um médico?

— Não precisa. — neguei com a cabeça e respirei fundo. — Logo a


coluna volta.

— Ah sim... — assentiu com a cabeça e soltou aquele comentário,


que fez minhas pernas bambearem. — E esse cabelo molhado?

— E-E-Eu estava na banheira.

— No quarto do Leon?

— Sim. — estiquei o “im” e assenti com a cabeça. — É muito maior


e mais confortável que a minha. — ela sorriu e sacudiu a cabeça.

— Você é uma boa menina. — ela tocou o meu rosto e mirou-me no


fundo dos olhos. — Conta histórias divertidas, mas, ainda assim, é uma boa
menina que o faz rir bastante.

Conta histórias divertidas...

Tal comentário fez a minha cabeça rodar. Dona Elisa praticamente


esfregou na minha cara que sabia das minhas mentiras, mas fez isso de uma
forma gentil.

— E-E-Eu...

— Vá se trocar e tome café. — disse, roçando o polegar no meu


rosto e, por fim, se afastou, retornando ao seu quarto.

Quando ouvi a porta bater, praticamente voei para dentro do meu


quarto. E, o óbvio me veio de imediato: meu Deus, o que foi isso?
Por um momento, achei que dona Elisa fosse sacar uma pistola e
bang bang! Fiz o sinal da cruz e sacudi a cabeça.

Depois de um susto daqueles, precisei de um tempo para me


recompor. Afinal, não é todo dia que a mãe do cara que você roubou e
dormiu, te cerca no corredor e te dá uma indireta que faz você sentir o seu
espírito deixar o corpo.

Aprontei-me e desci. Na mesa do café, comi tudo que tinha direito e


um pouco mais. Pela quantidade diferenciada de comida dos outros dias,
imagino que Leon tenha feito algum comentário.

— Ele se atreveu?! — afinei os olhos, rosnando sozinha.

— Ele quem? — Ramon surgiu entre a porta, mirando-me curioso.

— O gato. — apontei para a janela. — Acabei de vê-lo passar.

Ramon revirou os olhos e sacudiu a cabeça.

— Ok, gata cinzenta. — levou ambas as mãos a cintura. —


Terminou de comer? — assenti com a cabeça. — Venha, vou te levar para a
empresa. Leon está a sua espera.

— O que está insinuando com “gata cinzenta”? — levei uma das


mãos ao peito, fingindo estar ofendida.

Ramon respirou fundo e riu.

— Agora sei a razão de ele ter se interessado por você.

— E qual foi? — perguntei como quem não quer nada.

— Você é doida. Pirada. Maluca de pedra. — entreabri a boca e ele


riu. — Contudo, me simpatizo com você, aspirante a Stephen King. —
jogou-me uma piscadela.
Por um momento, pensei se aquilo era um elogio ou uma ofensa e,
acabei concluindo que ele começou com a ofensa e terminou fazendo um
elogio.

O que esperar do jagunço do pistoleiro?

Sem demora, atendi ao seu pedido. Segui com Ramon para o veículo
e rumamos em direção a empresa. Demoramos quase uma hora, mas, enfim,
chegamos. Um pequeno detalhe que não posso ignorar é que há tantos
seguranças, que imaginei estar entrando no Banco Central.

Logo eu, que sempre quis protagonizar alguma cena da série La


Casa de Papel.

— Está proibida de tocar em qualquer coisa, principalmente em


armas. — disse Ramon, assim que abriu a porta para que eu saísse.

— Está proibida... — imitei-o e ele riu, revirando os olhos.

Acompanhei-o por um imenso corredor e, finalmente cheguei ao


escritório de Leon. A decoração medieval me chamou a atenção de
imediato, ele logo se propôs a explicar do que se tratava. Depois de uma
breve conversa, que deixou meus ânimos excitados, seguimos por um tour
em sua empresa.

O lugar era imenso e deveria contar com pelo menos, mil


funcionários. Passamos por todas as sessões, desde a fabricação de
munição, até a montagem das armas de baixo, médio e grande calibre.

Contudo, a parte mais interessante era a sala de tiro ao alvo e, com


jeitinho, o convenci a me levar lá. E, foi lá que perdi de vez a noção das
coisas e quase...

— Tarado! — rosnei, assim que ele me lembrou da parede de vidro.


Ele me alisou em diversos momentos e só me conta que qualquer
um poderia testemunhar aquela safadeza, depois de tê-la feito.

— Sou uma mulher de respeito! — assenti com a cabeça e ele


cruzou os braços, mordendo os lábios. — Por que está me olhando assim?

— Gosto quando você fica brava. É excitante... — as últimas


palavras soaram tão sexy que um arrepio me contorceu.

— Estou sentindo falta de ar... — gemi, apressando-me em deixar a


sala, ouvindo-o gargalhar atrás de mim.

Por instantes, fechei os olhos, repreendendo a mim mesma por ser


tão mole quando estou próxima daquele homem e, quando finalmente os
abri, congelei. Leon Machala estava parado em minha frente.

— Está tudo bem? — Leon franziu a testa.

— Só com um pouco de fome... — dei de ombros e ele assentiu com


a cabeça.

— Quer comer algo? Temos refeitório aqui.

— Já que você perguntou, há alguns metros da entrada tem uma


lanchonete e eu vi donuts...

— Vocês pararam lá? — ele cruzou os braços e eu prontamente


neguei com a cabeça. — Então como viu?

— Nenhuma comida passar despercebida diante dos meus olhos. —


estufei o peito, orgulhosa de mim mesma.

— Levando em conta que o expositor fica lá no fundo, considero


que se fosse atiradora, seria de elite. — concluiu, estalando a língua.

— Bom, vou lá buscar o meu lanche. — acenei com uma das mãos
e, depois de dar alguns passos, parei. Ao girar o corpo em cima dos saltos,
encontrei o seu rosto novamente e sorri. — Pode me emprestar cinquenta
reais?

— Cinquenta reais em donuts? — Leon uniu os lábios e eu uni as


mãos sobre o colo, assentindo com a cabeça.

— Santa Maria!

— Qual o problema? — cruzei os braços, indignada.

— Nenhum.

Sem demora, Leon sacou a carteira e me deu uma note de cem reais
e o seu único pedido foi: traga para mim também.

Assim que coloquei os pés do lado de fora, dei-me conta de que


havia seis homens armados ao meu lado.

— Ué? — passei os olhos por eles.

— Ordens do senhor Machala. — um deles respondeu.

— Para lanchar? — ergui as sobrancelhas.

— Para escoltar a senhorita.

— E para quê eu vou precisar de escolta até uma padaria? —


resmunguei, acelerando o passo. — Por acaso, a rosquinha vai ganhar vida
e me atingir com tiros de creme de avelã? — revirei os olhos.

Mas, lá no fundo, eu estava vibrando. Quem diria! Da prisão, para a


mansão e agora, com escolta particular. Como li esses dias no twitter,
aquele meme: qualquer coisa me bota no paredão!

Depois de andar alguns minutos, entrei no estabelecimento e fui


recebida por uma senhora. Pedi cem reais em donuts e, apesar da surpresa,
ela prontamente me atendeu. Enquanto eu a aguardava embrulhar tudo,
mirei uma mensagem escrita com letras enormes, na parede:

— A vida é um sopro...

A senhorinha retornou e assim que a paguei, começou um reboliço


do lado de fora. Quando me dei conta, estava no centro de um tiroteio.
Joguei-me no chão, abraçada com as sacolas de donuts e me protegi.

— Santa Maria... — ofeguei e fechei os olhos, sentindo o meu


coração palpitar sem parar. — A minha vida não é um sopro, não.

De repente, tudo parou.

Ao abrir os olhos, vi pés em minha frente e quando ergui o rosto,


haviam vários homens encapuzados.

— É ela? — um deles perguntou.

— Sim.

— É quem? — sentei-me e sem soltar minhas sacolas com lanches,


arrastei-me para trás, mirando-os. — Não, não sou eu, não... — neguei com
a cabeça.

Negar não adiantou. Ele simplesmente avançou sobre mim e me


jogou sobre o seu ombro. O brutamontes era maior que a porta.

Gritei o máximo que pude, pedindo por socorro. Ao ver que aquilo
não iria ajudar, não tive outra saída; travei a entrada do carro com as pernas,
enquanto berrava:

— Os. Meus. Órgãos. São. Podres. Caralho! — soletrei, puxando a


voz do fundo da garganta. — Eu não valho um centavo no mercado negro!

O desespero havia tomado conta de mim e, era tamanho, que as


lágrimas que se recusavam a descer. Tentei fazer minha voz soar o mais alto
possível, pois, quem sabe, Leon conseguiria me ouvir.

Só ele poderia me tirar dessa. Aliás, eu nem sei o que fiz para estar
nessa!

De repente, uma pancada na nuca me fez amolecer e, o mundo girou


ao meu redor. Pouco a pouco, tudo ficou escuro e, foi naquele momento,
que eu realmente entendi.

Sim, a vida é um sopro.


09.
POR LEON MACHALA

“...Eu, Leon Machal, irei garantir que as gavetas do seu


caixão sejam recheadas com notas de cem”.

Flagrei-me rindo com a situação dos donuts. Se eu não a


conhecesse, diria que aquele seria um estoque de doces para uma semana,
mas como a conheço e muito bem, não tenho dúvida de que ela irá abatê-los
em menos de vinte minutos.

Safira Pinhal...

Bela, inteligente, criativa e dona de uma maluquice sem tamanho.


Como não se encantar por uma mulher assim? Em um momento, você a
ensina a atirar e, instantes depois, ela está apontando a arma para você.

Um sorriso de canto escapou e eu sacudi a cabeça, agradecendo


mentalmente ao destino por ter trazido essa mulher para a minha vida.

Retornei ao escritório, pois precisava estudar algumas propostas e


fechar outras. Depois de fechar com os franceses, outras duas empresas de
origem europeia e de países diferentes, entraram em contato conosco.

Nesse ritmo, bateríamos o recorde de lucro do ano passado,


passando da casa do segundo bilhão de dólares.

As milhares de cifras que rodeavam a minha cabeça, desapareçam


quando ouvi uma troca de tiros se iniciar do lado de fora. Arregalei os
olhos, lembrando de Safira e, imediatamente, me levantei.

Ramon atravessou a porta bruscamente, ofegante.

— Dois carros, com armamento pesado cercaram a padaria.

— Kaio Noruega... — senti o meu sangue ferver ao constatar que só


poderia ser obra daquele infeliz. Respirei fundo e adiantei-me pela porta.
Ao parar na porta principal, acionei o alarme. Um reboliço de passos
se iniciou. Ramon colocou-se ao meu lado, encarando-me com certo receio.

— Está sem colete.

— Foda-se o colete! — rosnei.

Ao atravessar a porta principal, a minha segurança privada


aguardava ordens. Adiantei o passo e assim que passei por eles, ergui o tom
de voz.

— Aguardem o meu sinal. — determinei.

Só de imaginar que a machucaram, o meu sangue evaporava no


mais puro ódio, fazendo o meu coração bater sem parar. Seguimos em
carros, motos e alguns, a pé. Quando chegamos próximos, notei que ela
estava lutando para não ser jogada dentro do carro.

— Ordens, senhor? — o chefe da segurança perguntou.

Sem tirar os olhos daquela cena e sentindo uma fúria incontida,


ergui o punho, fechando-o.

— Não atirem.

E foi quando ouvi seus últimos gritos.

— ... eu não valho um centavo no mercado negro!

O som de sua voz sumiu quando um dos capangas de Kaio a acertou


com um golpe na nuca. Ofeguei, cerrando os punhos. Então, um dos seus
homens se voltou a mim.

— O senhor Noruega irá entrar em contato. — disse, entrando no


carro logo em seguida.
Ramon se alinhou a mim e me encarou algumas vezes, torcendo a
boca. Os carros aceleraram e tomaram distância.

— Sigam os veículos a uma distância segura... — ordenei.

— Sim, senhor.

O chefe da segurança partiu com quatro veículos e algumas motos.


E, de onde estava, os vi sumir. Todos eles.

— Ele não vai machucá-la. — disse Ramon, tentando acalmar os


meus ânimos.

— Ligue para o governador. Quero as estradas, aeroportos e portos


monitorados e, também, a cooperação do serviço de inteligência do estado.

— Sério?! — ele me encarou, piscando algumas vezes. — Quer


falar com o governador por causa da gata cinzenta?

— Faça o que mandei e não me deixe mais irritado. — respirei


fundo e dei meia volta, precipitando-me em direção a empresa. Ramon
assentiu com a cabeça e retirou o telefone do bolso. — Sabe, Ramon,
aquela não é uma mulher comum. Eu nunca mais vou encontrar uma doida
feito ela. — sorri de canto e ajeitei o meu blazer.

Apesar de estar puto, eu sabia exatamente o que Kaio Noruega


queria e, ele sabia melhor que ninguém as minhas condições. Matar Safira
não é uma opção para ele. Não nesse primeiro momento.

Quando entrei no escritório, passei pela minha mesa e parei em


frente a estante, onde peguei uma garrafa de vodca e me servi um copo.
Depois de dar um gole, respirei fundo.

— Eu vou te matar da pior forma possível, Kaio Noruega. —


murmurei, afinando os olhos.
— O governador já sinalizou que vai atender ao seu pedido. — disse
Ramon ao entrar na minha sala. — O que faremos agora?

— Esperamos. — respondi, mantendo-me de costas para ele.

— E os nossos homens?

— Provavelmente não vão ter sucesso nessa perseguição. — dei


mais uma gole na bebida e fechei os olhos. — Diga-me, Ramon, sou um
homem perigoso?

— O pior dos piores. — sorri de canto com a sua resposta.

— Se Kaio Noruega sabe disso, por qual razão me testar de tal


forma?

— O desejo de vingança desperta a burrice em qualquer criatura.

— Exatamente. E, na lição de hoje, você aprendeu que nunca se


deve agir pelo impulso que a vingança lhe dá. O resultado pode ser fatal. —
dei mais um gole na vodca e respirei fundo. — Triplique a segurança da
mansão e, até a segunda ordem, mamãe está proibida de sair.

— Acabei de fazer isso e... Ela te mandou um recado.

— Qual? — girei o corpo em sua direção e cruzei os braços.

— Primeiro, ela disse que avisou. Segundo, que gosta de Safira e,


por isso, espera vê-la novamente. — abaixei a cabeça e sorri.

Ela é encantadora, não é mamãe?

Pigarreei e sentei-me no sofá do escritório. Cruzei as pernas e mirei


Ramon, que me encarou sem entender.

— Quer se sentar também?


— Não, estou bem aqui. O que imagina que ele vá pedir por Safira?

— Dinheiro. O que mais um homem falido poderia pedir? — torci a


boca.

Você irá ganhar todo o dinheiro que quiser, Kaio Noruega. Eu, Leon
Machala, irei garantir que as gavetas do seu caixão estejam recheadas com
notas de cem.

POR SAFIRA

Acordei assustada e o pânico latente, aumentou quando me dei conta


de que estava amarrada a uma cadeira. Respirei fundo, tentando não surtar
e, após alguns segundos, quando consegui ficar mais calma, passei os olhos
ao meu redor.

Era uma espécie de galpão. Estava completamente vazio, exceto por


eu estar em seu centro, com uma luz sobre a minha cabeça. Aquele era o
único ponto de iluminado do lugar.

Será que eu morri?


Gente, isso aqui não se parece com o céu, não...

O desespero me tomou.

Morrer e ainda ir para o inferno é demais.


É um castigo para o pobre que já nasce no sofrimento!

— Oh, ela finalmente acordou. — a voz masculina ecoou, me


deixando em alerta, ao mesmo tempo, me causando alívio.

A voz não era grossa o suficiente, então, não é o tinhoso e se não é o


tinhoso, significa que estou viva.

— Quem é você? — perguntei, sentindo a minha voz falhar. — Já


adianto que eu tenho problemas nos ossos. O meu pé é torto e o meu fígado
está entrando em colapso...
— O meu nome é Kaio Noruega e eu sou um velho amigo do seu
namorado.

Kaio Noruega?!

— Que namorado? — franzi a testa e, lembrei-me de Leon. — Não,


ele não é meu namorado.

— Ele quem? — o som dos passos se aproximando, ficava cada vez


mais alto e foi quando o localizei. Estava atrás de mim.

— Não sei, ué. Você disse que é amigo do meu namorado, mas eu
nem tenho namorado. — sacudi a cabeça.

— E o que Leon Machala é seu?

— O-O-O que ele é meu?

— Sim, foi isso que perguntei. — disse e ao rodear a cadeira,


deslizou a ponta dos dedos pela minha pele.

Quando o homem se colocou diante de mim, pude ver o seu rosto.


Os olhos eram claros, os cabelos lisos batiam na nuca e o rosto fino
harmonizava com o seu porte físico. Ele era magro, mas daqueles magros
gostosos.

Santa Maria!
Estou chamando o meu raptor de gostoso...

— O Leon é meu paciente. — engoli em seco e o homem sorriu de


canto, cruzando os braços.

— Você é médica?

— Sim, médica psiquiatra. — assenti com a cabeça e o homem em


minha frente, tombou a cabeça para lado.
Apesar de agir como bandido, ele não parecia um. Se eu o visse na
rua, diria que ele é um ricaço qualquer. As aparências enganam mesmo.

— Psiquiatra? — levou uma das mãos ao queixo, acariciando-o.

— Sim, pobrezinho... — sacudi a cabeça. — Tantos traumas do


passado e no presente. — fiz “tsc tsc” com a boca.

— Entendo... — o homem voltou a me rodear e, parou atrás de mim,


pousando ambas as mãos em meus ombros. — Você costuma sair com
frequência com os seus pacientes?

— S-S-Sim, é terapêutico.

— Dormir na casa deles, também?

Engoli em seco, sentindo o meu coração se acelerar. Esse tal de


Kaio Noruega, passou todos esses dias nos vigiando? Como ele sabe disso
tudo?

— Não gosto que mintam pra mim.

— E-E-Eu não menti. Só estiquei a história. — prontamente me


defendi.

— Sabe o que faço com mentirosos? — o tom de voz soou


ameaçador, ao ponto de me fazer trancar o cu. Neguei com a cabeça. —
Geralmente, ainda vivos, os corto em pedaços. Primeiro um pé, depois, um
dedo da mão e...

— Não, por favor... — senti os meus olhos lacrimejarem. — Eu sou


pobre e a única riqueza que tenho são os meus pés e os meus dedos... —
supliquei para que ele não fizesse aquilo. — Se tirar isso de mim, vou ser
mais que pobre. Vou ser... — ofeguei entre as palavras. — Miserável.
O silêncio que nos dividiu, ruiu quando sua gargalhada
maquiavélica ecoou pelo galpão, me fazendo sentir um arrepio
aterrorizante.

Era o meu fim.

— Você é hilária. Gosto disso. — disse, rodeando-me outra vez e, ao


parar em minha frente, mirou-me no fundo dos olhos. — Não costumo fazer
esse tipo de coisa com mulheres, principalmente, quando são bonitas.

— Obrigada. Obrigada, sequestrador. — assenti com a cabeça e ele


arqueou uma das sobrancelhas, cruzando os braços, mais uma vez.

— Está com fome?

— Muita! — arregalei os olhos ao responder aquilo. — E quando


fico com fome, tenho abstinência de glicose e isso é muito ruim, pois vou
tagarelar o tempo todo. Até falo sozinha. — aquela última parte, contei
baixinho, como se fosse um segredo.

— Vou pedir para que lhe tragam algo para comer. — deu-me as
costas e apressou o passo, sabe-se lá para onde.

— Pode trazer os meus donuts? Os que comprei na padaria... —


pedi baixinho.

Kaio subitamente parou e, de costas para mim, gargalhou outra vez.

— Você é uma comediante de primeira, Safira. — sacudiu a cabeça


e retomou os passos. — Vou ver o que posso fazer.

Finalmente, respirei com certo alívio. Mamãe sempre disse e eu não


me esqueço: pobre só é sequestrado para roubarem os órgãos. Contudo,
aquele não era o caso.

Ao que tudo indica, Kaio Noruega tem algum tipo de rixa com Leon
Machala e, eu caí de paraquedas no meio da briga desses dois. O importante
agora é tramar uma forma de escapar, sem perder os pés e os dedos.

— Minha Santa Maria! — gemi baixinho, balançando a cabeça para


os lados. — O que é que eu vou fazer?

A artimanha mais usada nos filmes é sempre...

— Alguém? — chamei e sem obter resposta, insisti. — Eu preciso ir


ao banheiro. É urgente.

Depois de quase dez minutos implorando, alguém surgiu. Era o


brutamontes que havia me carregado nos ombros.

— Se tentar alguma gracinha, te desmaio novamente. — rosnou.

— Não vou tentar nada, eu prometo.

O homem me desamarrou e me conduziu até os fundos do galpão,


onde havia um banheiro. Ele me aguardou do lado e fora, enquanto eu
seguia sentada sobre a tampa do vaso, perguntando a mim mesma como
derrubaria um monstro daquele tamanho?

É impossível.

— Vai demorar?

— Estou terminando... — gemi.

Levantei-me e fingi dar descarga. Assim que abri a porta, lá estava


ele. Num movimento súbito, dei um soco na sua barriga, mas ele sequer se
mexeu. O semblante se fechou e eu me encolhi, abrindo o meu melhor
sorriso.

— E-E-Eu só estava testando os seus reflexos. — respondi e,


rapidamente, fiz menção de chutar as suas bolas, mas ele prendeu o meu pé
com as pernas. — São ótimos. Os seus reflexos. — forcei um sorriso que
mostrava todos os dentes.
— Vamos. — resmungou, soltando o meu pé e me puxando pelo
braço.

Santa Maria!
O que o homem tem que gordo, tem de rápido.

Sem saída, percebi que o jeito seria esperar ser resgatada, mas...
Será que Leon virá me buscar? Sim, ele tem que vir, eu não roubei e gastei
milhares de reais no seu cartão à toa.

Quero que ele venha me buscar para que eu termine de pagar a


minha dívida! Não posso contar com outra alternativa. Antes, eu pagaria
quando puder. Agora, eu ainda não posso, mas quero pagar!

— Moço... — chamei-o, enquanto ele terminava de me amarrar


novamente a cadeira. — E os meus donuts?

— As rosquinhas? Estavam deliciosas. — assim que se levantou,


exibiu um sorriso faltando alguns dentes.

— Ladrão! — exclamei, entreabrindo a boca. — Comeu as minhas


rosquinhas... E eu ainda devo cem reais delas. — pisquei algumas vezes e
afinando os olhos, despejei todo meu ódio sobre ele. — Espero que tenha
uma congestão. Que cague até virar do avesso... — choraminguei.

O homem riu e simplesmente me deu as costas.

Como ele pôde? Não se rouba comida de uma mulher. É questão de


equilíbrio. Uma mulher alimentada, é feliz. Com fome, ela fica irritada.

— Ninguém aqui quer me ver irritada, não é? — o ódio pelo roubo


dos meus donuts ecoou em minha voz. — Quero comer! Quero comida! —
gritei o mais alto que pude.
10.
POR LEON MACHALA

“...não precisa chorar.


Agora você está segura...”.

Os meus homens haviam retornado e, como previ, acabaram


perdendo Safira de vista. Era esperado. Kaio não seria tão imprudente de
perder o único trunfo que tinha contra mim naquele momento delicado.

Mirei o relógio de pulso pela centésima vez e respirei fundo, dando


mais um gole no copo de vodca. Paciência é um dom que eu não tenho, mas
não me resta outra alternativa a não ser esperar.

— É impossível que tenham deixado a cidade. — disse Ramon ao


entrar no meu escritório. — Acabei de falar com a secretária do governador
e não há sinal deles.

— Kaio está sendo cauteloso. Ele sabe que o meu poder se abrange
por todo o país. Sair da cidade seria muito arriscado. — disse,
movimentando o copo da minha bebida. — Os homens estão prontos?

— Sim.

— Ótimo. — dei mais um gole na bebida e mirei o teto,


experimentando o sabor amargo de me sentir, mesmo que por algumas
horas, derrotado.

Sem mencionar o fato de que, agora que Safira está longe de mim,
percebo o quanto ela faz falta; os comentários aleatórios que quase me
matam de rir. O seu perfume. O jeito que ela fica vermelha quando falo algo
inapropriado e, principalmente, dos seus lábios.

— E aquele outro assunto? — finalmente encarei Ramon.

— Tudo certo. O cemitério já reservou uma gaveta.


— Garantiu que fosse uma das melhores? — ergui as sobrancelhas,
esboçando um breve sorriso de canto. Ramon assentiu com a cabeça, me
fazendo estalar a língua. — Ótimo.

Ramon cruzou os braços e me fitou por alguns instantes. Sem dizer


nada, aproximou-se, servindo um copo de bebida e depois de dar alguns
moles...

— Pelo visto, está mesmo disposto a morrer por ela.

— Certamente. — ergui o copo em sua direção.

— Que seja. — respondeu, terminando a bebida aos goles.

Naquele mesmo instante, o meu celular tocou. Assim que o peguei,


visualizei em sua tela: “número desconhecido”. Sem demora, o atendi,
colocando no vivo a voz:

“Boa noite, meu amigo”.


O deboche em seu tom de voz me deixava irritado.
“Vamos direto ao assunto. O que quer?”.
Cortei as formalidades.
“Dez milhões de reais. Em dinheiro”.
O maldito fez questão de pontuar.
“Primeiro, quero saber como ela está”.
A resposta, veio de imediato:
“Viva. Passou um tempo gritando feito uma louca, pois queria
comida, mas já resolvi isso...”.
Senti o meu sangue ferver.
“Se tocar nela, irei te torturar por mil dias e o meu dinheiro e a
medicina avançada, podem garantir isso facilmente...”.
Kaio gargalhou dou outro lado.
“Dei-lhe um pedaço de torta de chocolate. Fique despreocupado,
Leon. A sua garota está bem”.

Arregalei os olhos e, segurei o riso. Ela era mesmo única. Quem em


uma situação de sequestro pensaria em comida?
“Horário e local?”.
“Galpão vinte e três, no antigo porto. Às 23 horas”.
“Estarei lá com o seu dinheiro”.
Respondi, desligando a ligação.

Ao voltar os meus olhos a Ramon, ele assentiu com a cabeça. Ele já


sabia o que fazer. Provavelmente, no cofre da mansão, há uma quantia
muito superior a essa que ele pediu. Não seria dificultoso providenciar o
dinheiro.

Um pouco mais tarde e com tudo organizado, seguimos para o ponto


de encontro, com uma escolta de vinte homens, portados de armamento de
guerra. Caso algo desse errado, a prioridade era ela. Fiz questão de deixar
isso claro.

Assim que deixei o veículo, carregando duas maletas, uma em cada


mão, um homem surgiu na porta do galpão. Era grande, feito um urso de pé.
Aparentemente, não estava armado e, também, não se intimidou com a
minha escolta.

— O senhor Noruega o aguarda. — disse, abrindo um pouco mais o


imenso portão.

Precipitei-me em sua direção e, quando os meus homens fizeram


menção de me acompanhar, ele ergueu a mão.

— Apenas o senhor.

— Nada disso. — Ramon se contrapôs de imediato.

— Está tudo bem. — disse, espiando-o por cima do ombro.

Ramon assentiu com a cabeça e sorriu de canto.

— Cerquem o lugar. Eles só saem quando eu ver o rosto de Leon. —


determinou, me fazendo sacudir a cabeça.
Sem demora, segui atrás do homem, que fechou o portão assim que
entrei. Ele não disse nada, apenas me guiou pelo salão e, foi quando, ainda
ao longe, a vi de pé, com as mãos amarradas para trás, a boca amordaçada e
Kaio ao seu lado, apontando uma arma contra a sua cabeça.

O meu coração começou a bater sem parar quando a vi, ainda mais
naquela situação. Eu queria pegá-la nos braços e dizer que tudo ficaria bem,
mas ainda é cedo para saber o desfecho desse encontro.

— Pode parar aí. — disse Kaio.

Parei há alguns metros de distância.

— Esse é o seu novo empreendimento? — passei os olhos ao redor,


não poupando sarcasmo.

— Você não está em posição de fazer piada. — comentou, mirando


Safira. — Vamos lá, mande as malas para cá.

— Primeiro ela.

— As malas primeiro. —rosnou.

Pousei os olhos em Safira, mais uma vez. E foi quando percebi seus
olhos lacrimejarem. Respirei fundo, contendo a fúria dentro de mim e
assenti com a cabeça.

— Se fizer qualquer coisa errada, não sairá daqui vivo.

— E se eu fizer certo, também não tenho garantias de que sairei


vivo. — mordeu os lábios e assentiu com a cabeça. — Temos um impasse.

— Sim, temos.

— E como vamos resolvê-lo? — Kaio perguntou, me fazendo


respirar fundo.
Odeio ter que ceder, mas ela está em seu limite. Consigo ver isso em
seus olhos.

— As maletas. — eu disse, jogando-as no chão, a uma distância que


ficava tão próximo dele, quanto de mim. — Agora, solte-a.

Kaio mirou-me por alguns segundos e, em seguida, as maletas. Ele


parecia pensar na situação com cautela. Assim como eu, que já estava
pronto para sacar duas pistolas em sua direção.

— Tudo bem. — disse e, em seguida, desamarrou as mãos de Safira


e tirou a sua mordaça, empurrando-a para frente. — Ande devagar, sem
pressa.

— S-S-Sim. — a voz dela tremulou.

Enquanto ela caminhava em minha direção, Kaio vinha logo atrás.


Quando ela finalmente parou em minha frente, com os lábios unidos,
prestes a explodir em choro, não me contive e simplesmente a puxei contra
mim, abraçando.

— Não precisa chorar. Agora você está segura... — sussurrei,


pousando a mão em sua nuca, sem tirar os olhos de Kaio.

— Eu achei que fosse parar na terra do pé junto. — fungou,


abraçando-me com força. — O tanto de coisa que eu ia deixar de comer...

Santa Maria! Não me faça rir em um momento desses, mulher...

Outros dois homens surgiram e pegaram as maletas, enquanto Kaio


mantinha a pistola apontada em nossa direção. Aproveitei a oportunidade
para sacar uma das armas na cintura e assim que me afastei de Safira,
empurrando-a para trás de mim, apontei a pistola em sua direção.

— Seguimos em um impasse. — pontuei, sentindo uma imensa


vontade de mandá-lo para o quinto dos infernos.
Contudo, a presença de Safira me impedia de cometer qualquer ato
precipitado. Sacar a pistola foi uma precaução. O silêncio pairou entre nós
por alguns segundos, até que a voz dela ecoou.

— Vocês precisam parar! — Safira gritou, surpreendo a todos nós.

O que diabos ela pensa que está fazendo?

POR SAFIRA

No mesmo instante em que o vi, senti o meu coração se aquecer. O


homem que quase nunca mudava a expressão, exceto quando ria com
minhas maluquices, exibia um semblante obscuro, repleto de fúria.

Uma faísca de esperança ressurgiu dentro de mim, pois, eu tinha


absoluta certeza de que Leon Machala não pagaria a quantia que Kaio
Noruega havia pedido.

Era muito dinheiro!

Surpreendo-me como nunca imaginei, ele veio ao meu resgate. E,


pela primeira vez na vida, me senti valorizada. Não só no sentido
emocional, como também, material. Afinal, quem é que desembolsa dez
milhões para salvar a vida de uma maluca feito eu?

Depois do acordo feito, fui liberada e caminhei em sua direção. Com


as pernas ainda trêmulas e os olhos lacrimejando, abracei-o como se não o
visse há dez anos. Sentir o seu abraço naquele momento, me fez sentir
segura como nunca.

Era como se ninguém pudesse me machucar. Leon Machala, me


fazia sentir muitas coisas, mas, pela primeira vez em toda a minha vida, a
sensação de segurança despertou em mim.

“... não precisa chorar, agora você está segura”.


Aquilo ecoou tantas vezes por minha cabeça que, toda a aflição que
eu estava sentindo, desapareceu. E foi quando, me dei conta de que o
impasse entre os dois persistia, por isso, decidi intervir.

— Vocês precisam parar! — gritei e adiantando-me para o meio do


galpão, entre os dois, encarei-os alternadamente. — Não podem ser
amigos?

— O que está fazendo, Safira? — Leon sacudiu a cabeça, sem


baixar a arma. — E, não. Não podemos!

— Como ele disse, não podemos. — Kaio emendou.

— Por que não? — insisti.

— Onde achou essa mulher? — Kaio respirou fundo, balançando a


pistola em minha direção. — Se não estivéssemos em um momento
adequado, eu a convidaria para sair. Bonita, divertida...

— O mato antes de fazer isso. — Leon rosnou e assentiu com a


cabeça. — Ela roubou o meu cartão de crédito e foi assim que nos
conhecemos.

Kaio gargalhou e fixou os olhos em mim.

— Que ironia do destino. — disse Kaio, assentindo com a cabeça.


— Bom, creio que está do lado errado, Safira. Os que roubam de Leon
Machala, ficam nessa parte do galpão. — apontou com o queixo para o seu
lado.

— Eu já paguei metade. — defendi-me.

— Viu só? Quer ser amiga dele? Primeiro, ele me rouba. Depois,
rouba você, te deixa com fome e ainda debocha do seu roubo mal sucedido?
— assenti com a cabeça na maioria das coisas que Leon mencionou, exceto
no roubo mal sucedido.
— Bom, não foi tão mal sucedido e... — sacudi a cabeça. — Isso
não vem ao caso. Eu quero te conhecer melhor e, odiaria saber que você
matou alguém! — confessei, sentindo o meu rosto corar de imediato,
quando seus olhos se arregalaram.

— Uau! — disse Kaio, mordendo os lábios. — Armas apontadas,


ameaças de morte e uma declaração de amor.

— Safira... — Leon esboçou um sorriso de canto. — Não posso


fazer isso.

— Por favor, faça isso por mim. — pedi, voltando minha total
atenção a ele.

— Sim, Leon, faça isso por ela. — Kaio me imitou em tom de


deboche.

— Não está ajudando. — murmurei, cerrando os punhos.

Nesse ritmo, eu mesmo daria fim a Kaio Noruega. Quando estou


tentando tirar o seu da reta, ele me vem com piadinhas?!

Leon centrou os olhos nos meus e, por longos segundos, que


pareceram uma eternidade, se pôs a pensar. Quando, finalmente, ele
guardou a arma na cintura e cruzou os braços.

— Tudo bem... — rosnou, afinando os olhos.

Respirei aliviada e me virei, encarando Kaio Noruega. Ao levar


ambas as mãos a cintura, respirei fundo e ergui o indicador em sua direção.

— Tudo bem?

— Como quiser, senhorita... — assentiu com a cabeça.

Com a situação resolvida, marchei na direção de Leon Machala e, ao


parar em sua frente, encarei-o fixamente. Seus olhos, no entanto,
acompanhavam Kaio sumir pelas sombras. Quando ele sumiu, sua atenção
se voltou a mim.

— Agora me deve dez milhões e meio. — franziu a testa.

— Vou arrumar um jeito de te pagar. — uni os lábios e abaixei a


cabeça, sentindo os meus olhos lacrimejarem.

É, agora não tem jeito. A vez dos meus órgãos chegou e...

Senti o seu toque suave em meu queixo, erguendo-o lentamente.


Assim que nossos rostos se alinharam, senti o seu polegar roçar em minha
bochecha, seguido de um selinho.

— Um milhão. — ele sorriu, selando novamente. — Dois milhões.


— e contendo o riso, me puxou pela cintura, colando meu corpo ao seu. —
Cinco milhões e... — subindo uma das mãos da minha cintura a nuca, colou
os lábios aos meus, envolvendo-me em um beijo lento e sem pressa. Senti o
meu coração palpitar com força, enquanto o meu corpo aquecia-se cada vez
mais. — Dez milhões. — disse ao seu afastar.

— O que foi isso? — sorri, franzindo a testa.

— O meu pagamento.

— Acho que está faltando uns duzentos e poucos mil nessa conta,
não? — uni as mãos sobre o ventre e dei de ombros, me fazendo de tonta.

Ele cruzou os braços e mordeu os lábios.

— Não, você ainda me deve isso.

Rimos e, subitamente, saltei em seu pescoço, abraçando-o. Passei


alguns minutos colada ao seu corpo. Eu estava com saudade do seu sorriso
e do seu aroma de café.


Depois de toda aquela confusão, não me segurei no jantar e comi
quatro vezes. Ramon me encarava embasbacado, enquanto dona Elisa, não
segurava o riso.

— Está uma delícia. — comentei, tomando um gole de suco.

— Não se segure. — ela acenou com ambas as mãos e mirou o


filho. — Sorte a sua ser rico, pois, uma mulher dessas, não se sustenta com
pouco.

Leon gargalhou e tombou a cabeça para o lado.

— Sim, que sorte a minha, não apenas por ser rico, mas por tê-la
comigo... — Leon tombou a cabeça para o lado e fitou-me, ao ponto de me
deixar tão vermelha, que cheguei a engasgar.

Ramon saltou da cadeira, próximo a mim e me deu tapinhas nas


costas. Em seguida, se voltou a Leon.

— Eu te disse que ela iria morrer de tanto comer!

O som de risos incendiou a mesa.

Quis socar Ramon mas, primeiro, eu precisava desengasgar ou


acabaria morrendo de verdade; com tanta comida no mundo, essa não era
uma opção e, também, tinha Leon...

Um pouco mais tarde...

Sentei-me na cama após o banho. Eu ainda estava usando um


roupão, quando Leon entrou no quarto. Assim que o vi, senti meu rosto
enrubescer e prendi a respiração.

— Depois de pensar um pouco, decidi que não me deve mais nada.


— começou, parando em minha frente, com ambas as mãos nos bolsos. —
Sabe, eu nunca me senti tão feliz ao lado de uma mulher, mas esse
sentimento de que você só está aqui comigo por me dever algo, me
incomoda, por isso, considere a nossa dívida quitada.

Pisquei algumas vezes e, depois de digerir suas palavras, ergui o


rosto em sua direção.

— Isso é sério?

— Sim. — deu de ombros e, ao virar o rosto para o lado, respirou


fundo. — Se quiser, posso chamar um carro para te levar até o aeroporto e
te deixar em casa.

— O que você quer? — perguntei e, no impulso, coloquei-me de pé


e prendi a respiração.

Leon voltou o rosto a mim e sorriu.

— Quero você, Safira. Quero como nunca quis outra coisa na minha
vida... — disse, usando aquele tom sexy me deixava toda arrepiada.

— E-E-Eu também. — respondi, ofegante.

E foi naquele momento que eu entendi. Às vezes, um “eu te amo”


vem disfarçado por outras palavras, mas elas têm o mesmo peso.

Nossos olhos fixaram-se um ao outro e, hesitamos por alguns


instantes, até que seu corpo veio de encontro ao meu...

Ardi por inteira, sentindo o meu corpo ser consumindo pelo desejo.
A excitação me deixava tão úmida que eu facilmente poderia ser a cascata
de um chafariz.

Sentir as suas mãos me tocarem era a melhor sensação que ele me


proporcionava, além dos beijos e arrepios. Contudo, a sensação dos seus
lábios roçarem em meu pescoço, enquanto a sua mão se enfiava em minha
calcinha, em direção ao meu clitóris, me fazia arfar em seus braços.
— Gosta disso? — mordeu os lábios depois de perguntar, mirando
meu rosto.

— S-S-Sim... — respondi, sentindo o meu rosto arder de vergonha.

E, diferente da primeira vez, fui tomada por uma sensação que


ultrapassava o prazer...

Completamente nua na cama, senti seus lábios beijarem o meu


corpo inteiro. Havia desejo, mas, também havia carinho. As mordidas
suaves e os seus dedos dentro de mim, me faziam contorcer, puxando os
lençóis.

Quando seus lábios desceram e ele se encaixou entre as minhas


pernas, apoiei ambas as mãos em sua cabeça, sentindo-o beijar os meus
lábios vaginais como beijava a minha boca.

— Ah.. — ofeguei.

— Pronta para fazer isso a noite inteira? — sussurrou e antes que eu


respondesse, mordiscou meu clitóris, me fazendo abafar o grito com uma
das mãos. — Espero que isso seja um sim...

Sim, isso é um sim!


EPÍLOGO.
POR LEON MACHALA

“... eu vou adorar fazer parte


da sua família”.

Acordei com o celular tocando.

Pisquei algumas vezes, ainda sonolento e mirei Safira, adormecida


feito um anjo. Mirei-a por alguns segundos, o suficiente para sentir o meu
coração se acelerar.

Ela é simplesmente perfeita para mim!

O celular tocou novamente.

Levantei-me sem pressa, ainda nu e, quando o atendi, segui para a


sacada do quarto. Era Ramon. Eu já sabia do que se tratava.

— E então?

— Ele está morto. — respirei fundo e assenti com a cabeça. —


Como pediu, o caixão providenciado está repleto de gavetas e, os dez
milhões estão nelas.

— Ótimo. Volte para casa.

— Estou indo.

Desliguei o telefone e mirei a lua, imensa no céu. Tão grande


quando o amor que eu sentia por aquela mulher. No momento em que ela
foi sequestrada, dei-me conta do que sentia e, apesar de ainda estarmos no
começo, preciso garantir para que coisas como o seu sequestro, não se
repitam.

Girei o corpo em sua direção e de onde estava, mirei-a, esboçando


um sorriso de canto.
— Tão espontânea...

Safira é uma mulher única e de imenso coração. Provavelmente, ela


não me entenderia, mas os homens que trabalham para mim e negociam
comigo, não são bons homens. Kaio Noruega não foge a regra. Ele é um
dos piores. E, provavelmente, no futuro, quando perdesse todo o dinheiro
que levou, repetiria o sequestro e, não quero pensar nessa possibilidade nem
por um instante.

Eu não sou um bom homem, mas, por você, gata cinzenta, posso
tentar me endireitar. Sei que o futuro me reserva muitas surpresas ao seu
lado, afinal, espero alguém como você há muito tempo e, agora que
encontrei, ninguém irá nos separar...


Alguns dias depois, viajamos para a sua cidade natal, Goiânia —
Goiás. Confesso que eu estava ansioso para conhecer a sua mãe, mas antes,
ela resolveu parar no Castro’s Park Hotel, onde tudo começou.

Ao chegarmos na recepção, uma moça arregalou os olhos, surpresa


com Safira. Ela rodeou o balcão e mirou de cima a baixo.

— O que aconteceu, garota? Você está... — as palavras sumiram e


quando se voltou a mim, piscou algumas vezes. — Quem é ele?

— O meu namorado. — ela sorriu ao responder. — A dona Matilde


está?

— Sim, ela está resolvendo algumas coisas...

— Pode chamá-la, por gentileza?

— Claro. — assentiu com a cabeça e rodeou o balcão, pegando o


telefone.
— O que está aprontando? — prontamente perguntei.

— Não é nada... — deu de ombros.

Enfiei as mãos nos bolsos e permaneci ao seu lado. Depois de


alguns minutos, uma senhora baixinha surgiu na recepção. Ao passar os
olhos por Safira, boquiaberta, piscou algumas vezes.

— Então, você voltou, Safira Pinhal... — disse, com certo descaso.

— De agora em diante, pode me chamar de senhora. — Safira


respondeu e me encarou. Em seguida, mirou a tal Matilde. — Voltei como
hospede. Pode preparar o meu apartamento?

— E pretende pagar como? — a senhora respirou fundo e sacudiu a


cabeça. — Não parcelamos...

Safira não hesitou em sacar o cartão preto fosco e o exibi-lo como


um troféu.

— Voltarei para fazer checkin às dezoito horas. Não se esqueça, viu?


Se-nho-ra. — soletrou as últimas palavras e deu-lhe as costas, encarando-
me. — Vamos?

— Vamos...

Quando entramos no carro, ela deu um longo suspiro e fechou os


olhos, sorrindo.

— Eram inimigas? — perguntei ao dar partida no carro,


manobrando-o para seguir o GPS.

— Ela é a minha ex-chefe. Aquela bruxa órfã de vassoura... —


rosnou, afinando os olhos.

Gargalhei e sacudi a cabeça.


Onde é que ela arruma esses nomes?!
Quarenta minutos depois, chegamos à porta da casa da mãe de
Safira. Estacionei o carro e descemos. O portão estava trancando, então ela
bateu palmas, chamando pela mãe.

— Dona Creusa. — gritou, batendo palmas novamente.

— Já vou, caralho! — o grito ecoou de dentro da casa.

Encaramo-nos e ela sorriu, corando.

— Mamãe é muito espontânea...

— Eu percebi. — sorri, abaixando a cabeça.

Depois de ouvir ao menos dez trancas sendo abertas, o portão


finalmente se abriu. Dona Creusa surgiu no portão. Cabelos presos em um
coque com caneta, um longo vestido que contornava seu corpo rechonchudo
e, prendedores, espalhados pelo seu vestido.

Primeiro, ela sorriu ao encarar a filha. Depois, me encarou e, quando


encarou Safira novamente, fechou o cenho e cruzou os braços.

— Caralho, meu! Não acredito que você se envolveu com político?


— rosnou, balançando a cabeça sem parar. — Eu já te falei, minha filha.
Eles roubam tudo... — e, subitamente parou, entreabrindo a boca. — Santa
Maria! — piscou algumas vezes. — Não me diga que está grávida?

— Não, não estou mamãe... — Safira negou com a cabeça e, a essa


altura, o seu rosto parecia um pimentão.

— Que alívio. — a senhora suspirou, levando uma das mãos ao


peito. — Nada contra, viu, moço? — mirou-me. — É que a gente é pobre,
mas é honesto. Esse negócio de ter um ladrãozinho a caminho, eu não
aprovo.
Não me contive e gargalhei, ao ponto de lacrimejar. Por Deus, agora
sei de quem ela puxou toda essa loucura.

— Não sou político, não, dona Creusa. — neguei com a cabeça. —


Sou um empresário do ramo...

— Dos doces! — Safira interviu com um berro, quase que em


pânico. — Balas que faltam matar de tão gostosas... — assentiu com a
cabeça e a mãe dela arqueou uma das sobrancelhas, mirando-a com
desconfiança.

— Hunf! — dona Creusa sacudiu a cabeça e deu-nos as costas.


Safira e eu nos encaramos e outro berro veio. — Vão entrar ou precisam
que os puxe pela mão? Caralho, meu!

Safira corou mais uma vez e eu, simplesmente, aproximei os lábios


dos seus, selando-os. Ela abaixou a cabeça e mirou-me fixamente nos olhos.

— Como deu para notar, a minha mãe é tão maluquinha quanto eu...
— ela comentou, sem jeito.

— E eu vou adorar fazer parte da sua família. — sussurrei,


encostando minha testa na dela.

— E eu da sua. — ela respondeu, toda sorridente.

— Nada de safadeza na minha porta! — dona Creusa retornou,


mantendo as mãos na cintura, enquanto nos fulminava com o olhar. — Isso
aqui é uma casa de família, entenderam? De família! — gritou, erguendo o
indicador e, girou sobre os pés, entrando novamente.

Safira e eu nos encaramos mais uma vez e, juntos, explodimos em


gargalhadas.

~FIM~
SOBRE O AUTOR:
RODOLPHO SOUSA TOLEDO, mais conhecido como Tom
Adamz. O autor atingiu a marca de dez milhões de leituras na Amazon.

Tom escreve desde os doze anos de idade, tendo escrito mais de


cem livros, contos e crônicas até os dias de hoje. Atualmente mora em
Goiânia - Goiás.

Autor de romances conhecidos como: Dr. Prazer, Lúcifer, Um


Milagre Para o CEO, Nos Braços do Predador, Grávida do Meu Inimigo e
vários outros...

Livros na Amazon:
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