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LUA NOVA EXTRAS & CORTES [TRAD.

ROSALIE’S PHONE CALL, EDWARD’S VERSION XTR


[TELEFONEMA DE ROSALIE, VERSÃO EDWARD]

O celular em meu bolso vibrou novamente. Era a vigésima quinta


vez em vinte e quatro horas. Pensei em abri-lo, ao menos para ver quem
estava tentando me contatar. Talvez fosse importante. Talvez Carlisle
estivesse precisando de mim.
Pensei a respeito, mas não me mexi.
Eu não tinha certeza exatamente de onde me encontrava. Algum
lugar parecido com um sótão sombrio, cheio de ratos e aranhas. As aranhas
me ignoravam e os ratos me davam grande espaço. O ar era denso com o
aroma pesado de óleo de cozinha, carne rançosa, suor humano e a quase
sólida camada de poluição praticamente visível na atmosfera úmida, como
um filme preto cobrindo tudo. Abaixo, quatro andares de um vacilante
gueto num conjunto habitacional pululavam de vida. Não me incomodei em
separar os pensamentos das vozes—eles formavam um grande e alto
clamor espanhol que eu não ouvia. Apenas deixei os sons me atravessarem.
Sem sentido. Tudo aquilo era sem sentido. Minha própria existência era
sem sentido.
O mundo todo era sem sentido.
Pressionei a testa contra meus joelhos, e imaginei quanto tempo mais
eu seria capaz de suportar aquilo. Talvez fosse impossível. Talvez, se
minha tentativa estava fadada ao fracasso de qualquer modo, eu devesse
parar de me torturar e só voltar...
A idéia era tão poderosa, tão cicatrizante—como se as palavras
contivessem um forte anestésico, diminuindo a montanha de dor sob a qual
estava enterrado—que me fez arfar, deixou-me atordoado.
Eu poderia partir agora, poderia voltar.
O rosto de Bella, sempre por trás de minhas pálpebras, sorriu para
mim.
Era um sorriso de boas-vindas, de perdão, mas não teve o efeito que
meu subconsciente provavelmente pretendia.
É claro que eu não podia voltar. Afinal, o que era minha dor
comparada à felicidade dela? Ela devia ser capaz de sorrir, livre do medo e
do perigo. Livre do anseio por um futuro sem alma. Ela merecia algo
melhor. Merecia algo melhor do que eu. Quando deixasse este mundo, iria
para um lugar eternamente proibido para mim, não importa como eu me
conduza por aqui.
A idéia daquela separação final foi muito mais intensa do que a dor
que já sentia. Meu corpo estremeceu. Quando Bella fosse para o lugar ao
qual pertencia e onde eu jamais poderia ir, eu não me demoraria aqui atrás.
Devia existir esquecimento. Devia existir alívio.
Esta era minha esperança, mas não havia garantias. Dormir, ter
chance de sonhar. Ah, aí é que está o problema, pensei comigo mesmo.
Mesmo quando fosse cinza, de alguma forma eu ainda sentiria a tortura de
sua perda?
Estremeci novamente.
E, maldição, eu prometi. Prometi a ela que não assombraria sua vida
de novo, não traria meus demônios sombrios. Eu não voltaria atrás em
minha palavra. Não conseguiria fazer nada certo por ela? Absolutamente
nada?
A idéia de retornar à nublada cidadezinha que sempre seria meu
verdadeiro lar nesse planeta serpenteou através de meus pensamentos
novamente.
Só para checar. Só para ver se ela estava bem, segura e feliz. Não
interferir. Ela nunca saberia que eu estive lá...
Não. Maldição, não.
O celular vibrou de novo.
“Droga, droga, droga,” rosnei.
Eu podia me servir da distração, supus. Abri o celular e registrei os
números com o primeiro choque que senti em mais de meio ano.
Por que Rose estaria telefonando? Ela era provavelmente a única
pessoa que estava apreciando minha ausência.
Devia ser algum problema realmente sério se ela precisava falar
comigo. Subitamente preocupado com minha família, apertei o botão para
atender.
“O que foi?” perguntei, tenso.
“Oh. Uau. Edward atendeu ao telefone. Sinto-me tão honrada.”
Assim que eu ouvi seu tom, soube que minha família estava bem. Ela
devia estar somente entediada. Era difícil adivinhar os motivos dela sem
seus pensamentos como guia. Rosalie nunca fez muito sentido para mim.
Seus impulsos normalmente eram baseados nos mais convolutos tipos de
lógica.
Desliguei o celular bruscamente.
“Me deixe em paz,” sussurrei para ninguém.
É claro que o telefone vibrou de novo imediatamente.
Ela continuaria ligando até passar qualquer que fosse a mensagem
com a qual planejava me aborrecer? Provavelmente. Levaria meses até ela
ficar cansada desse jogo. Brinquei com a idéia de deixá-la apertando a
rediscagem pela próxima metade do ano... então suspirei e atendi o telefone
novamente.
“Acabe logo com isso.”
Rosalie apressou-se com as palavras. “Achei que ia querer saber que
Alice está em Forks.”
Abri os olhos e fitei as vigas de madeira podres a três centímetros de
meu rosto.
“O quê?” Minha voz estava vazia, sem emoção.
“Você sabe como Alice é—pensa que sabe de tudo. Como você.”
Rosalie riu, sem humor. A voz possuía um timbre nervoso, como se de
repente estivesse incerta do que fazia.
Mas minha fúria tornou difícil distinguir qual era o problema de
Rosalie.
Alice havia jurado que seguiria minha recomendação com relação à
Bella, embora não concordasse com a decisão. Ela prometera que a deixaria
em paz... contanto que eu fizesse o mesmo. Claramente, ela pensou que
eventualmente eu me curvaria à dor. Talvez estivesse certa a respeito disso.
Mas eu não o fiz. Ainda. Então o que ela estava fazendo em Forks?
Eu quis torcer seu pescoço fino. Não que Jasper fosse me deixar chegar tão
perto, uma vez que sentisse o cheiro da fúria emanando de mim...
“Você ainda está aí, Edward?”
Eu não respondi. Apertei a base do nariz com os dedos, imaginando
se era possível um vampiro ter enxaqueca.
Por outro lado, se Alice já tinha voltado...
Não. Não. Não. Não.
Eu fiz uma promessa. Bella merecia uma vida. Fiz uma promessa.
Bella merecia uma vida.
Repeti as palavras como um mantra, tentando afastar minha mente da
imagem sedutora da janela escura de Bella. A entrada para meu único
santuário.
Sem dúvida eu teria que me humilhar se retornasse. Não me importei
com isso. Passaria alegremente a próxima década de joelhos se estivesse
com ela.
Não, não, não.
“Edward? Nem mesmo se importa com a razão para Alice estar lá?”
“Não particularmente.”
A voz de Rosalie sem dúvida soou um pouco convencida agora, já
que forçara uma reação em mim. “Bem, é claro, ela não está exatamente
quebrando as regras. Quero dizer, você só nos avisou para ficar longe de
Bella, certo? O resto de Forks não importa.”
Pisquei os olhos lentamente. Bella foi embora? Meu pensamento deu
voltas com a idéia inesperada. Ela ainda não tinha se formado, então devia
ter voltado para a mãe. Isso era bom. Ela devia viver sob a luz do sol. Era
bom que tivesse sido capaz de deixar as sombras para trás.
Tentei engolir e não consegui.
Rosalie soltou uma risada nervosa. “Então não precisa ficar zangado
com Alice.”
“Então por que me ligou, Rosalie, se não foi para meter Alice em
encrenca? Por que está me aborrecendo? Ugh!”
“Espere!” ela disse, com certeza sentindo que eu estava prestes a
desligar novamente. “Não foi por isso que liguei.”
“Então por quê? Fale rápido e, então, me deixe em paz.”
“Bem...” ela hesitou.
“Bote para fora, Rosalie. Você tem dez segundos.”
“Acho que você devia voltar para casa,” disse Rosalie numa torrente.
“Estou cansada de Esme sofrendo e Carlisle nunca rindo. Você devia se
envergonhar pelo que está fazendo a eles. Emmett sente sua falta o tempo
todo e está me dando nos nervos. Você tem uma família. Cresça e pense em
outra coisa além de si mesmo.”
“Conselho interessante, Rosalie. Deixe-me lhe contar uma pequena
história sobre o roto e o rasgado...”
“Eu estou pensando neles, ao contrário de você. Não se importa com
o quanto magoou Esme, acima de todos? Ela o ama mais do que o resto de
nós, e você sabe disso. Venha para casa.”
Eu não respondi.
“Pensei que uma vez que esse negócio em Forks tivesse acabado,
você superaria.”
“Forks nunca foi o problema, Rosalie,” respondi, tentando ser
paciente. O que ela disse sobre Esme e Carlisle havia me afetado. “Só
porque Bella” —era difícil dizer o nome dela em voz alta— “se mudou
para a Florida, não significa que sou capaz... Olhe, Rosalie. Realmente
sinto muito, mas confie em mim, não faria ninguém feliz se eu estivesse
lá.”
“Hmm...”
Ali estava, aquela hesitação nervosa de novo.
“O que é que você não está me contando, Rosalie? Esme está bem?
Carlisle está—”
“Eles estão bem. É só que... bem, eu não disse que Bella se mudou.”
Fiquei calado. Recapitulei nossa conversa em minha mente. Sim,
Rosalie havia dito que Bella se mudara. Disse: ...você só nos avisou para
ficar longe de Bella, certo? O resto de Forks não importa. E então: Pensei
que uma vez que esse negócio em Forks tivesse acabado... Então Bella não
estava em Forks. O que ela quis dizer, Bella não tinha se mudado?
Então Rosalie precipitou-se a falar novamente, quase com raiva
dessa vez.
“Eles não querem lhe contar, mas acho isso uma estupidez. Quanto
mais rápido você superar isto, mais cedo as coisas podem voltar ao normal.
Por que deixá-lo perambular por aí deprimido em algum canto escuro do
mundo quando não há necessidade? Você pode vir para casa agora.
Podemos ser uma família novamente. Está acabado.”
Minha mente parecia estar estilhaçada. Eu não conseguia encontrar
sentido em suas palavras. Era como se ela estivesse me contando algo
muito, muito óbvio, mas eu não tinha idéia do que era. Meu cérebro
brincava com a informação, produzindo estranhos padrões. Sem sentido.
“Edward?”
“Eu não entendo o que você está dizendo, Rosalie.”
Uma longa pausa, a distância de algumas batidas do coração
humanas.
“Ela está morta, Edward.”
Uma pausa mais longa.
“Eu... sinto muito. No entanto, você tinha o direito de saber, acho.
Bella... se jogou de um penhasco dois dias atrás. Alice viu, mas era tarde
demais para fazer algo. Mas acho que ela teria ajudado, rompido com a
palavra, se tivesse havido tempo. Ela voltou para fazer o que puder por
Charlie. Sabe como sempre gostou dele—”
O telefone ficou mudo. Levei alguns segundos para perceber que eu
havia desligado.
Sentei-me na escuridão empoeirada por um longo e congelado
espaço de tempo. Era como se o tempo tivesse acabado. Como se o
universo tivesse parado.
Lentamente, movendo-me como um velho, liguei o celular
novamente e disquei o número para o qual prometi nunca mais ligar de
novo.
Se fosse ela, eu desligaria. Se fosse Charlie, conseguiria a
informação que precisava através de subterfúgios. Provaria que a pequena
piada doentia de Rosalie estava errada, e então voltaria ao meu vazio.
“Residência dos Swan,” respondeu uma voz que nunca ouvi antes. A
voz áspera e profunda de um homem, mas ainda jovem.
Eu não parei para pensar nas implicações daquilo.
“Aqui é o Dr. Carlisle Cullen,” respondi, imitando perfeitamente a
voz de meu pai. “Posso, por favor, falar com Charlie?”
“Ele não está,” respondeu a voz, e fiquei levemente surpreso com o
tom zangado. As palavras foram quase rosnadas. Mas isso não importava.
“Bem, então onde ele está?” exigi, ficando impaciente.
Houve uma curta pausa, como se o estranho quisesse me negar a
informação.
“No enterro,” o garoto finalmente respondeu.
Desliguei o telefone novamente.
MISCALCULATION XTR [ERRO DE CÁLCULO]

História engraçada—De fato, eu escrevi este fragmento mais como


uma brincadeira. Tomei conhecimento de um concurso chamado “Take a
walk in my shoes” (algo como ‘estar no lugar de alguém’) do site Twilight
Fanfiction, e mencionei a Alphie (da Lexicon fame) que talvez participasse
com algo, só por brincadeira. Ela disse que nunca daria certo, Pelirroja
descobriria minha entrada num segundo. Eu apostei que Pel não me
pegaria, e Alphie apostou que sim. Então escrevi esta porção de Lua Nova
pelo ponto de vista de Rosalie (foi uma experiência bem interessante estar
na cabeça de Rosalie!) e postei, rindo comigo mesma. No fim, o tiro saiu
pela culatra. Minha participação ficou perdida no ciberespaço e Pel nunca
viu. Então acho que Alphie e eu nunca vamos saber quem ganhou nossa
aposta... A não ser que a Twilight Fanfiction faça outro concurso...
Aqui está minha brincadeira falha, o telefonema entre Alice e
Rosalie no Capítulo Dezoito de Lua Nova:

Um diminuto sussurro de som—não aqui, algumas centenas de jardas


ao norte—me fez pular. Minha mão apertou automaticamente o celular,
fechando e ocultando-o no mesmo movimento.
Joguei os cabelos por sobre os ombros, disfarçando uma olhar furtivo
através das janelas altas para a floresta. O dia estava sombrio, nublado;
meu próprio reflexo era mais brilhante do que as árvores e as nuvens. Fitei
meus olhos arregalados e assustados, meus lábios curvados para baixo nos
cantos, a pequena ruga vertical entre as sobrancelhas...
Franzi o cenho, apagando a expressão de culpa com uma de
zombaria. Zombaria atraente. Distraída, notei como a expressão feroz
combinava com meu rosto, contrastando agradavelmente com o dourado
benigno de meus cachos grossos. Ao mesmo tempo, meus olhos
perscrutaram a floresta vazia do Alasca, aliviada por ver que ainda estava
sozinha. O som não foi nada—um pássaro ou a brisa.
Não havia necessidade de sentir alívio, disse a mim mesma. Não
havia necessidade de culpa. Não fiz nada de errado.
Os outros planejaram nunca contar a verdade a Edward? Deixá-lo
chafurdar em angústia eterna em cortiços asquerosos, enquanto Esme sofria,
Carlisle repensava cada decisão e a natural alegria da existência de Emmett
era lentamente drenada pela solidão?
Além disso, não era possível esconder segredos de Edward a longo
prazo. Cedo ou tarde, ele teria nos encontrado, teria vindo ver Alice ou
Carlisle por alguma razão, e então descoberto a verdade. Ele agradeceria
por termos mentido com nosso silêncio? Dificilmente. Edward sempre teve
que saber de tudo; vivia por aquele sentido de onisciência. Teria dado um
enorme chilique, exacerbado apenas pelo fato de termos escondido a morte
de Bella dele.
Quando se acalmasse e superasse toda aquela bagunça,
provavelmente me agradeceria por ser a única corajosa o suficiente para ser
honesta com ele.
Milhas à distância, um falcão gritou; o som me fez pular e verificar a
janela novamente. Meu rosto sustentava a mesma expressão culpada de
antes, e fuzilei o reflexo no vidro.
Ótimo, então eu possuía minha própria agenda. Era algo tão ruim
querer minha família unida novamente? Era tão egoísta sentir falta da paz
diária, da felicidade suprema que eu subestimei, a felicidade que Edward
pareceu ter levado consigo em sua partida?
Eu só queria que as coisas fossem como antes. Isso era errado? Não
parecia tão terrível. Afinal, não fiz isso só por mim, mas por todos. Esme,
Carlisle e Emmett.
Não tanto por Alice, embora eu tivesse assumido... Mas Alice esteve
tão certa de que as coisas dariam certo no final—que Edward seria incapaz
de ficar longe de sua namoradinha humana—que nem se incomodou com
lamentos. Alice sempre funcionou num mundo diferente do resto de nós,
presa em sua realidade sempre mutável. Desde que Edward era o único que
conseguia participar dessa realidade, achei que sua ausência seria difícil
para ela. Mas ela estava segura como sempre, seguindo em frente, sua
mente num momento em que seu corpo ainda não alcançara. Sempre tão
calma.
Contudo, ela ficou um bocado frenética quando viu Bella pular...
Será que fui impaciente demais? Agi muito cedo?
Eu devia ser honesta comigo mesma, porque Edward veria cada
migalha de mesquinharia em minha decisão assim que chegasse em casa.
Melhor tomar conhecimento de meus motivos ruins, aceitá-los agora.
Sim, eu tinha ciúmes da forma como Alice se sentia a respeito de
Bella. Alice teria corrido tão impetuosamente, tão louca de pânico, se
tivesse visto a mim pulando do penhasco? Ela tinha de amar aquela garota
humana simplória muito mais do que a mim?
Mas o ciúme era algo pequeno. Teria acelerado minha decisão, mas
não controlado. Eu teria ligado para Edward de qualquer modo. Tinha
certeza que ele preferia a honestidade direta à decepção gentil dos outros. A
gentileza estava destinada ao fracasso desde o princípio; Edward voltaria
eventualmente.
E agora ele viria para casa ainda mais cedo.
Não era somente o contentamento de minha família de que eu sentia
falta.
Sinceramente sentia saudades de Edward também. Sentia falta de
suas pequenas observações mordazes, a sagacidade sombria que entrava em
harmonia com meu próprio senso de humor negro ao invés da natureza
brincalhona e ensolarada de Emmett. Sentia falta da música—seu estéreo
ecoando a última descoberta indie, e o piano, o som de Edward compondo
seus pensamentos normalmente remotos com transparência através da
canção. Sentia falta dele assobiando na garagem ao meu lado enquanto
ajustávamos os carros, o único momento em que estávamos em perfeita
sincronia.
Sentia falta de meu irmão. Certamente ele não me julgaria tão mal
quando visse isso em meus pensamentos.
Seria desconfortável por um tempo, eu sabia disso. Mas quanto mais
cedo ele viesse para casa, mais cedo poderíamos voltar ao normal
novamente.
Vasculhei minha mente em busca de um pouco de compaixão por
Bella, e fiquei satisfeita por descobrir que lamentava pela garota. Um
pouco. O suficiente, pelo menos: ela fez Edward feliz de um modo que
nunca vi antes. É claro, também o fez mais miserável do que qualquer outra
coisa em seu um século de vida. Mas eu sentiria falta da paz que ela deu a
ele naqueles poucos meses. Eu realmente lamentava sua perda.
Este conhecimento me fez sentir melhor comigo mesma,
complacente. Sorri para o rosto no vidro, emoldurado por meus cabelos
dourados e as paredes de cedro vermelho da enorme e aconchegante sala de
estar de Tanya, apreciando a vista. Quando eu sorria não havia mulher ou
homem neste planeta, mortal ou imortal, que se comparassem a minha
beleza. Era um pensamento reconfortante. Talvez eu não fosse a pessoa
mais fácil de se conviver. Talvez fosse superficial e egoísta. Talvez tivesse
desenvolvido uma personalidade melhor se tivesse nascido com um rosto
comum e um corpo tedioso. Talvez fosse mais feliz desse modo. Mas era
algo impossível de provar. Eu tinha minha beleza; era algo com que podia
contar.
Dei um largo sorriso.
O telefone tocou e eu automaticamente curvei a mão, embora o som
viesse da cozinha, não de meu punho.
Sabia de imediato que era Edward. Ligando para confirmar a
informação que eu dei. Ele não confiava em mim. Achava que eu era cruel
suficiente para fazer uma piada como aquela, aparentemente. Franzi o
cenho enquanto voava até a cozinha para atender ao telefone de Tanya.
O telefone ficava bem no canto de um grande balcão. Peguei-o antes
do término do primeiro toque, e fiquei de frente para as portas francesas
enquanto atendia. Eu não queria admitir, mas sabia que estava vigiando o
retorno de Emmett e Jasper. Não queria que me ouvissem conversando com
Edward. Eles ficariam zangados...
“Sim?” indaguei.
“Rose, preciso falar com Carlisle agora,” Alice disse bruscamente.
“Oh, Alice! Carlisle está caçando. O quê—”
“Tudo bem, assim que ele voltar.”
“O que houve? Vou procurá-lo imediatamente e dizer que ligue—”
“Não,” Alice interrompeu novamente. “Estarei num avião. Olhe,
soube alguma notícia de Edward?”
Foi estranho como meu estômago se contorceu, pareceu afundar em
meu abdômen. A sensação veio acompanhada de um estranho déjà vu, a
apagada sombra de uma memória humana há muito perdida. Náusea...
“Bem, sim, Alice. De fato. Eu falei com Edward. Só alguns minutos
atrás.” Por um breve segundo, brinquei com a idéia de fingir que Edward
tinha me ligado, apenas uma fortuita coincidência. Mas é claro que não
havia sentido em mentir. Edward me causaria problema suficiente quando
viesse para casa.
Meu estômago continuou a apertar-se estranhamente, mas ignorei.
Decidi ficar zangada. Alice não devia me tratar assim. Edward não queria
mentiras; queria a verdade. Ele me apoiaria nisso quando voltasse para casa.
“Você e Carlisle estavam errados,” falei. “Edward não apreciaria ser
enganado. Iria querer a verdade. Ele quer isso. Então, eu a dei. Liguei para
ele... liguei para ele um bocado,” admiti. “Até que atendeu. Uma
mensagem teria sido um... erro.”
“Por quê?” Alice ofegou. “Por que você fez isso, Rosalie?”
“Porque quanto antes ele superar isso, mais cedo as coisas voltarão
ao normal. Não teria sido mais fácil com o tempo, então por que adiar? O
tempo não irá mudar nada. Bella está morta. Edward vai lamentar e então
superar. Melhor começar agora do que mais tarde.”
“Bom, mas você está errada nos dois sentidos, Rosalie, então isso é
um problema, não acha?” Alice perguntou num tom feroz e rancoroso.
Errada nos dois sentidos? Pisquei rapidamente, tentando
compreender.
“Bella ainda está viva?” sussurrei, não acreditando nas palavras.
Apenas tentando adivinhar qual sentido Alice estava se referindo.
“Sim, isso mesmo. Ela está absolutamente bem—”
“Bem? Você a viu pular de um penhasco!”
“Eu estava errada.”
As palavras soaram tão estranhas na voz de Alice. Alice que nunca
estava errada, nunca era pega de surpresa...
“Como?” sussurrei.
“É uma longa história.”
Alice estava errada. Bella estava viva. E eu contei a...
“Bem, você fez uma bagunça e tanto,” rosnei, transformando minha
mortificação em acusação. “Edward vai ficar furioso quando voltar para
casa.”
“Mas você errou nessa parte também,” disse Alice. Eu sabia que ela
estava falando entre dentes. “É por isso que estou ligando...”
“Errei sobre o quê? Edward voltar para casa? É claro que ele vai.” Ri
zombeteiramente. “O que foi? Acha que ele vai dar uma de Romeu? Ha!
Como algum estúpido, romântico—”
“Sim,” Alice sibilou, a voz fria como gelo. “Foi exatamente o que eu
vi.”
A dura convicção nas palavras dela fez meus joelhos estranhamente
instáveis. Agarrei uma viga de cedro por apoio—apoio que meu corpo duro
como diamante provavelmente não precisaria. “Não, ele não é tão estúpido.
Ele—ele deve perceber que—”
Mas não consegui terminar a sentença, porque pude ver em minha
cabeça, uma visão própria. Uma visão de mim. Uma impensável visão de
minha vida se, de algum modo, Emmett cessasse de existir. Me encolhi
ante o horror da idéia.
Não—não havia comparação. Bella era apenas uma humana. Edward
não queria que ela fosse imortal, então não era a mesma coisa. Edward não
podia sentir o mesmo!
“Eu—eu não queria que terminasse assim, Alice! Só queria que ele
voltasse para casa!” Minha voz era quase um uivo.
“É meio tarde para isso agora, Rose,” disse Alice, mais áspera e fria
do que antes. “Poupe seu remorso para alguém que acredite nele.”
Houve um estalido, e então o telefone ficou mudo.
“Não,” sussurrei. Sacudi a cabeça lentamente por um momento.
“Edward tem de voltar para casa.”
Fitei meu rosto no vidro da porta francesa, mas não pude vê-lo mais.
Era apenas uma mancha branca e dourada sem forma.
Então, através da mancha, bem longe na floresta distante, uma árvore
enorme oscilou erraticamente, em desacordo com o resto do bosque.
Emmett.
Arranquei a porta de minha frente. Bateu ruidosamente contra a
parede, mas o som ficou para trás enquanto eu corria para o verde.
“Emmett!” gritei. “Emmett, socorro!”
NARCOTICS OTK [DROGAS]

Você reconhecerá esta cena do fim do Capítulo Dois de Lua Nova.


Apenas algumas linhas estão diferentes. No primeiro rascunho, Carlisle
deu a Bella drogas para a dor de seus ferimentos, e ela teve uma reação
anormal.
Por que este ângulo foi cortado? Primeiro, meus editores acharam
que o humor estava errado (eu tento fazer piada de tudo, eles tentam me
dominar). Segundo, eles não acharam a reação de Bella realista. A piada é
por conta deles, porque esta história é baseada numa experiência de vida
real (não minha, dessa vez).

Desabei sobre o travesseiro, arfando, minha cabeça rodando. Meu


braço não doía mais, mas eu não sabia se era por causa dos analgésicos ou
do beijo. Algo cutucou minha memória, esquivo, à margem...
“Desculpe,” disse Edward, e ele também estava sem fôlego. “Isso
não estava nos planos.”
Para minha própria surpresa, eu ri. “Você é engraçado,” murmurei e
ri novamente.
Ele franziu o cenho para mim no escuro. Parecia tão sério. Era
histérico. Cobri a boca para abafar a risada e para que Charlie não ouvisse.
“Bella, você já tomou Percocet antes?”
“Acho que não,” ri. “Por quê?”
Ele revirou os olhos e eu não consegui parar de rir.
“Como está seu braço?”
“Não consigo sentir. Ele ainda está aí?”
Ele suspirou enquanto eu continuei rindo. “Procure dormir, Bella.”
“Não, quero que me beije de novo.”
“Está superestimando meu autocontrole.”
Reprimi o riso. “O que é mais tentador para você: meu sangue ou
meu corpo?” A pergunta me fez rir.
“Dá empate.” Ele abriu um breve sorriso contra a vontade. “Eu
nunca a vi tão alta. Você é muito divertida.”
“Não estou alta.” Tentei sufocar as risadas para provar.
“Durma,” ele sugeriu.
Eu percebi que estava fazendo papel de boba, o que não era
incomum, mas ainda assim era embaraçoso, então tentei seguir seu
conselho. Descansei a cabeça no ombro dele novamente e fechei os olhos.
De vez em quando deixava uma risadinha escapar. Mas foram ficando
menos freqüentes assim que as drogas me embalaram para a inconsciência.
***

Senti-me absolutamente horrível pela manhã. Meu braço ardia e


minha cabeça doía. Edward disse que eu tive uma ressaca e recomendou
Tylenol ao invés do Percocet, antes de casualmente beijar minha testa e sair
pela janela.
Não ajudou em minha perspectiva que seu rosto estivesse tranqüilo e
distante. Senti medo das conclusões às quais ele chegou durante a noite
enquanto me observava dormir. A ansiedade pareceu aumentar a
intensidade do latejar em minha cabeça.
Tomei uma dose dupla de Tylenol, jogando o pequeno frasco de
Percocet na lata de lixo do banheiro.
JACOB XTR

Aqui está um “breve” (ha ha) resumo da história até agora, se você
é Jacob Black:

Então você é um garoto feliz. Tem uns ótimos amigos, seu pai é bem
legal, mesmo sendo um pouco supersticioso. Você se sai muito bem na
escola—não tem que se esforçar muito. Você tem um bocado de liberdade.
Adora tudo que tem a ver com mecânica.
Um dia, a filha do melhor amigo de seu pai aparece. Ela realmente é
bonita, tipo a garota da casa vizinha, mas, mais do que isso, vocês
instantaneamente estão na mesma sintonia. Espíritos semelhantes. Bella se
afasta de todos os amigos da escola dela, parecendo totalmente interessada
em tudo que diz. Você imediatamente fica apaixonado, mas sabe que ela
está fora de sua liga. Ela é veterana, você é calouro—continue sonhando.
Contudo, você pensa um bocado nela. Talvez algum dia, diz a si mesmo.
É claro que agora você está muito mais interessado no que seu pai
tem a dizer sobre Charlie. Fica insistindo para que seu pai faça as pazes
com Charlie a respeito de toda aquela história sobre os Cullen. Em sua
cabeça, Billy é quem está errado. Você quer que ele se desculpe.
Eventualmente, ele o faz. Aparece para assistir um jogo e, naturalmente,
você o acompanha. Alguém tem que dirigir. (Você sabe que não está
enganando ninguém—Billy enxerga completamente além).
Então você vê Bella com um cara num belo carro (o carro é a
primeira coisa que você nota. Tem toneladas de aperfeiçoamento—
nenhuma economia. Fica impressionado). Você é seguro o suficiente de sua
masculinidade para admitir que o cara é realmente boa-pinta. Perceptivo
como é, consegue ver as faíscas entre eles. Você suspira—sempre soube
que ela seria conquistada rápido. Mas relacionamentos no colegial não
duram, então não liga. Imagina quem é ele (você conhece todo mundo por
ali) e por que seu pai está agindo tão estranho.
Você tem chance de conversar com Bella, e é bom novamente.
Realmente confortável com ela. Pergunta sobre o cara, e ele é um Cullen,
então você entende a reação de Billy. Tem uma noite agradável com Bella,
exceto que ela parece bem distraída e está usando algum perfume novo da
qual você não gosta nem um pouco.
Volta para casa e seu pai está pirando. Ele liga para todos os
camaradas supersticiosos. Descobre (bisbilhotando de seu quarto) que estão
lhe dizendo que não é da conta dele. Você concorda, mas Billy não pediu
sua opinião. Seu pai acha que esse sujeito é literalmente algum tipo de
monstro—é tão embaraçoso.
Billy vai ver Charlie novamente, e ainda está realmente aborrecido
sobre Bella. Está muito tenso e você adivinha (ele resmunga quando está
agitado) que ele acha estar violando aquele legendário pacto. Você meio
que considera mencionar que contou as histórias para Bella, mas sabe que
levaria bronca, então não diz nada.
Você vê Bella com o namorado novamente. Obviamente ele é o
namorado—beija-a no pescoço antes de ela entrar. Billy quase tem um
ataque. Oh, certo—vampiros. Jesus, o velho vai humilhar a nós dois. Você
imagina porque o namorado só fica lá sentado na picape...
Você fica mais triste do que imaginou que ficaria. Achou que já
aceitara que Bella tinha um namorado, mas essa prova é mais deprimente
do que esperava. A diferença entre suspeitar de algo e ver por si mesmo.
Suspiro. Seu pai o manda numa caça ao pato, e você percebe mais tarde
que ele quis conversar com Bella a sós. Você espera que ele não tenha feito
papel de bobo.
A vida continua. Você tem algumas quedas por umas garotas na
escola, mas elas desaparecem rápido. Ainda pensa um bocado em Bella.
Deseja só poder passar algum tempo, mas seu pai está sendo um idiota a
respeito dessa coisa com os Cullen. Ele o proíbe de visitá-la. Como se você
fosse se ferir ou algo do tipo. Você revira os olhos para ele um bocado.
Bella foge de casa. Quando Billy te conta, isso o atinge com força.
Você se preocupa com ela—fica acordado à noite. Não tinha idéia do
quanto ela estava infeliz. Fica zangado por Billy proibi-lo de vê-la. Talvez
você pudesse ter ajudado de algum modo...
Então Charlie liga para Billy e conta que Bella sofreu um terrível
acidente em Phoenix—ela atravessou uma janela e está em condições sérias
no hospital. A notícia é como uma bigorna caindo em sua cabeça. Quando
Billy ouve que o Dr. Carlisle está lá cuidando dela, ele implora a Charlie
que pegue um avião. Eles brigam novamente. Você se oferece para ir até lá
verificar, e Billy lhe dá uma bronca. Você sai, mas pára mal-humorado.
Você o ouve no telefone com alguém, gritando sobre pactos e guerras—não
consegue ouvir direito através da porta. Mas escuta ele falando sobre os
Cullen ferindo Bella, e também Sam. Você se pergunta por que Sam Uley é
parte daquela conversa. Não se pergunta por muito tempo. Está preocupado
demais com Bella.
Bella melhora e volta para casa. Você está louco para vê-la—
certamente pode ao menos levar flores com votos de melhoras ou algo
assim. Mas Billy o proíbe de ir e você não consegue arranjar ninguém para
lhe emprestar o carro (estão todos do lado de Billy). Não consegue
acreditar no quanto a piada sobre vampiros está fora de controle.
Então Billy muda o tom. Quer que você vá falar com Bella. Mas ele
quer que invada o baile de formatura dela. Você fica mortificado. Contudo,
ele o suborna e você realmente quer vê-la. Você vai. Bella está tão bonita.
Você passa a mensagem embaraçosa de Billy, mas, para seu alívio, ela ri da
situação com você. Você vê como ela olha para Edward Cullen e sabe que
ela está completamente fora de seu alcance. Mas está tudo bem, porque
você também sabe que ela sempre será sua amiga. Quer que ela seja feliz, e
esse sujeito claramente a faz feliz. Sente-se mal por seu pai ter sido
mesquinho e preconceituoso a respeito dos Cullen, e deseja que houvesse
um modo diplomático de se desculpar. Bella está usando aquele perfume
desagradável novamente. Você se pergunta por que ela gosta.
Você tem um bom verão em La Push. Trabalha em sua garagem na
maior parte do tempo, passa algumas horas por semana na loja por uma
grana extra, sai com Embry e Quil, vai a alguns encontros em grupo. Uma
garota se mostra interessada, mas é somente amizade para você. Billy ainda
está preocupado a respeito de Bella e você não consegue evitar prestar
atenção especial sempre que seu nome é mencionado. Há uma nova gangue
estúpida na cidade, e você e seus amigos zombam da turma de Sam pelas
costas.
A escola começa novamente, e tudo está bem normal.
Certo dia, tarde da noite, Billy recebe uma ligação apreensiva de
Charlie. Bella está desaparecida, perdida na floresta, ele acha. Billy
promete ajuda. Você está a caminho da porta, mas ele lhe diz não. Você
fica zangado, mas sai andando assim mesmo. Consegue chegar lá às três da
manhã, e todos já estão partindo. Bella está dormindo eles dizem, então
você não entra. Você vê Sam, Jared e Paul ali, e isso o irrita. O Sr. Weber
lhe oferece uma carona para casa quando o vê caminhando. É ele quem
conta que os Cullen foram embora. As pessoas já estão fofocando a
respeito. Edward largou Bella na floresta, foi assim que ela se encrencou.
A princípio, suas emoções são confusas. Você tem de admitir que
está um pouco satisfeito, mas tenta espantar aqueles sentimentos. Eles são
errados—Bella deve estar infeliz. Você espera que ela esteja bem.
Então você começa a descobrir os detalhes. Charlie está desesperado
e liga um bocado para Billy, procurando ajuda. Mas nenhuma das irmãs
jamais passou por algo assim antes, e Billy não pode ajudar muito. Você
ouve falar de como Bella está arrasada, talvez catatônica, não comendo ou
dormindo.
Você começa a odiar Edward Cullen. Como ele pôde fazer algo
assim com alguém tão bom e gentil? Que tipo de monstro era? Você se
arrepende por um dia ter desejado se desculpar com ele.
Ao mesmo tempo, você também fica zangado com as pessoas em La
Push por se sentirem tão entusiasmadas com a partida dos Cullen. Isso
realmente o aborrece. Eles estão celebrando a mesma coisa que devastou
Bella.
O tempo passa e Charlie fica cada vez mais preocupado. Billy não o
proíbe mais de ver Bella, mas você instintivamente sabe que ela não quer
vê-lo—nem ninguém. Você tenta não se preocupar, mas é difícil com Billy
resmungando sobre ela o tempo todo. Ela é como um zumbi, Charlie diz.
Não sorri desde que Edward foi embora.
Meses passam. Um dia, você ouve o rugido familiar do motor do
lado de fora da casa. Você mal consegue acreditar, mas Bella parou ali sem
mais nem menos. Fica emocionado até dar uma boa olhada nela. Ela parece
pior do que você imaginava. Perdeu um bocado de peso e os círculos ao
redor dos olhos são pretos. Seu cabelo parece mais escuro e o rosto é
branco como a morte. Parece prestes a se partir no meio. Mas então ela
olha para você e abre um verdadeiro sorriso. Está feliz por vê-lo. É algo
pequeno, mas significa tudo para você.
Você presta atenção em tudo o que ela diz e faz, mas nunca de um
modo que ela note. Compara sua aparência com tudo que ouviu falar de
Charlie. Ela fala a respeito das motos e você fica entusiasmado. Isso é algo
em que você é realmente bom, e adoraria se exibir um pouco. Ela parece
totalmente confortável, e você se sente da mesma forma. É como se ambos
tivessem ficado juntos todos os dias do último ano—não parece que não a
viu durante meses. Vocês se dão bem juntos, como sempre foi. Espíritos
semelhantes.
Você começa a perceber nos dias seguintes que é bom em algo mais
além de carros: consegue fazer Bella feliz. Não da forma como ela era
antes, mas muito melhor do que como estava a pouco tempo. Charlie e
Billy ficam ao telefone o dia todo, e você fica feliz em saber que está
ajudando. Observa-a melhorar cada vez mais—e fica grato do fundo do
coração em poder fazer isso por ela.
No entanto, ela não voltou ao normal ainda e você toma cuidado com
suas pequenas peculiaridades. Ela parece estar se reinventando e você lhe
dá espaço para isso, apenas acompanhando e seguindo na mesma direção.
As coisas com Bella estão bem, mas se não fosse por ela, sua vida
estaria um inferno. Embry juntou-se ao culto maluco de Sam, e você está
assustado e furioso com ele ao mesmo tempo. Ele não fala com você. Você
e Quil tentam descobrir o que está acontecendo, mas nada faz sentido. Billy
é tão irritante a respeito de tudo aquilo, e olha para você de um jeito
esquisito o tempo todo. Isso o deixa ansioso. Mas você fala com Bella a
respeito e ela o faz se sentir melhor porque leva a história a sério também.
Ela o abraça e seu coração quase explode.
É claro que você percebe que está se apaixonando por ela. Também
sabe que ela não está pronta e não pensa em você desse modo. Você sabe
como ser paciente, contudo, e mantém os dedos cruzados para que um dia
ela o veja de jeito diferente. Você fica contente porque é alto, não parece
ter dezesseis. Está começando a crescer sem nem ao menos levantar todos
aqueles pesos como Quil sempre faz, e isso o deixa feliz também. Ela disse
que até que você era bonito...
Ela o convida para sair com amigos da escola, mas todos os planos
são alterados, e é só você, Bella e Mike Newton. É fácil perceber a tensão.
Você está se sentindo muito bem enquanto observa—ela não gosta daquele
garoto. Não fica confortável com ele do modo como é com você. Ela mal
conversa com ele. Você está apreciando o filme horrível mais do que
qualquer outro que já viu. Ela gosta mais de você. É óbvio.
Ele passa mal. Você o espera com Bella, e está se sentindo bem
esquisito. É estranho—você se sente curiosamente poderoso, cheio de
confiança. Está voando e se espanta com as coisas que diz a ela. Você só
bota tudo pra fora. Ela admite que você é o favorito, embora ainda esteja
claramente se lamentando pelo imbecil que partiu seu coração. Por um
instante, você é inundado por essa inacreditável fúria por alguém tê-la
magoado tanto. Você deseja poder matá-lo. Fica surpreso com essa emoção
selvagem e rapidamente a sufoca.
Você leva Bella para casa e está cheio de esperança. Isso vai dar
certo. Você é o único com quem ela é feliz. Precisa de você. Você fará tudo
em seu poder para fazê-la feliz. Promete a ela. Está se sentindo ótimo. Só
um pouco mais de tempo...
Você vai para casa e Billy o olha daquele jeito irritante. Sente-se
inquieto, como se houvesse agulhas perfurando sua pele. O quarto parece
quente demais—Bella disse que você parecia estar com febre. Você mal
consegue ficar quieto.
Billy diz que você parece estranho, crítico, e aquela mesma fúria
louca o domina. Dessa vez, você não consegue parar. Sente-se perdendo o
controle com uma raiva tão forte que faz seu corpo inteiro tremer. Parte de
você sabe que a reação é estúpida, mas na maior parte você é possuído pela
fúria. Tudo é quente, como se o quarto estivesse pegando fogo. Você
consegue sentir o calor em seus ossos.
E então, para seu horror e choque, o tremor fica pior e você sente seu
corpo se despedaçar. Você fica aterrorizado. Leva apenas um segundo, mas
é o mais longo segundo de sua vida. Você se sente explodindo e pensa que
está morrendo.
Mas seu corpo o surpreende antes disso—você não acaba em
pedacinhos. Você está numa nova forma que não compreende. Sua cabeça
está atingindo o teto e você olha para Billy como se estivesse numa grande
altura. O tremor parou, mas a raiva ainda está lá. Tudo ainda é quente e
vermelho. Você tenta gritar para Billy, fazê-lo explicar, mas sai como esse
medonho uivo. Dá um passo na direção dele e o quarto treme. Seus lábios
estão repuxados sobre os dentes, você ouve rosnados, quer sacudir Billy e
exige saber o que ele fez a você. Estende a mão para ele, e essa enorme
pata com garras surge no lugar. Você olha para si mesmo e um aterrorizado
ganido sai de sua boca.
Billy fala com você como se fosse uma criança, devagar e
suavemente, dizendo para ficar calmo, que tudo ficará bem. Mas não diz o
que aconteceu—o que você é. Deixa-o zangado novamente e ele não parece
surpreso. Estava esperando por aquilo? Por que não o avisou?
Billy segue para o telefone e liga para alguém. Assim que ouve o
nome de Sam, você enlouquece. Sam estava metido nisso. Rosnados
horríveis ecoam pela casa. Billy parece assustado e você está na cara dele,
com mandíbulas ansiosas para mordê-lo. Você se afasta e escuta aquele
ganido assustado de novo.
É quando as vozes começam em sua cabeça. Mas elas são mais do
que vozes. Por trás das palavras, você pode ver as imagens e sentir as
emoções. Segundos depois, você compreende. Vê o significado por trás das
palavras, a resposta para sua pergunta. Lobisomem. Você é um monstro.
Embry é quem mais ajuda. Você reconhece sua voz embora não haja
som. Percebe o quanto ele está aliviado por tê-lo consigo agora. Sam o
deixa explicar, para fazê-lo sair da casa (Billy vai abrir a porta devagar—
seus ombros mal conseguem passar). Na floresta atrás de sua casa, você vê
os outros pela primeira vez. Eles são enormes e terríveis. Você fica
horrorizado ao saber que é igual a eles.
É uma longa noite. Eles lhe mostram tudo. Todas as histórias e
lendas que ouviu durante toda a vida são reais. É como aterrissar em Oz, ter
tudo colorido, exceto que este novo mundo não é um lugar bonito cheio de
esquilos. Você está vivendo num filme de terror. Você é um dos monstros.
Eles mostram por que isso aconteceu, e esta é a pior parte. Porque os
vampiros são reais também. E é culpa deles você ter se transformado nesta
coisa. Mais do que isso, não somente vampiros sanguessugas literalmente
existem, como sua melhor amiga, a garota que você ama, ainda está
apaixonada por um deles. A princípio, você não acredita que ela saiba a
verdade, mas eles o convencem que está totalmente informada. Deixa-o
enojado agora, lembrar o quanto ela chora por ele.
Você é um monstro também, mas não um ruim. É do tipo que existe
para proteger sua família contra o mal. Isso não lhe traz muito conforto.
Especialmente quando eles lhe dizem que sua nova posição como protetor
lendário significa que não pode mais ficar perto de pessoas normais. Você é
perigoso demais por hora. Em seis meses, um ano, talvez. Você tem que ir
para a escola para manter segredo, mas nenhum outro risco desnecessário.
Na escola, você deve focalizar toda sua energia em permanecer calmo.
Esqueça os estudos. Só não mate ninguém.
E Bella está completamente fora de questão. Quando protesta, você
vê as memórias de Sam. É como se estivesse lá. Você o vê discutindo com
Emily. Ouve a resposta que causou a fúria irracional de Sam—fúria que é a
marca e a maldição da existência dos lobos. Você o vê explodir, com a mão
ainda estendida na direção dela. Observa as garras cortarem seu rosto.
Observa-a cair no chão, inconsciente. Sente o pânico, o terror dele. É tão
forte que ele não consegue mudar para ajudá-la. Você acha que está a
vendo morrer (embora saiba que ela sobreviveu, isso o esmaga—você
vomita com a dor da memória). Você vê Jared e Paul correndo para ajudar,
trazendo Sue Clearwater (uma paramédica—a melhor escolha disponível
quando um dos funcionários do hospital é um vampiro). Sue toma conta de
Emily enquanto Sam se contorce em agonia na floresta, escondido, ainda
incapaz de se acalmar o suficiente para se transformar...
E você sabe que eles estão certos, não pode ver Bella. Sua promessa
não será mantida. Você irá magoá-la, igualzinho ao outro monstro.
Observando as lembranças de Sam chegando ao fim, você vê como
se transformar de volta. Você se acalma como ele e se descobre trêmulo em
sua verdadeira forma. Nu e doente, você se encolhe no escuro e chora como
nunca o fez na vida.
Os outros estão surpresos. Todos eles levaram dias ou até semanas
para descobrir como mudar de novo.
Sua nova vida começa numa época tensa. Os vampiros não apenas
são reais, mas ainda estão aqui. Novos, não os Cullens. Eles estão caçando
na área, e é seu trabalho detê-los. Nessa parte você pode entrar. Todo seu
ódio pelo que Edward e o resto dos Cullens fizeram a Bella está canalizado
na caçada por esse par, o macho de cabelo preto e sua companheira ruiva.
Quando você alcança o macho é na hora H. Segue o cheiro do
vampiro com cuidado, tentando pegá-lo de surpresa. Jared toma a dianteira
porque possui olhos como binóculos—consegue enxergar por milhas. O
vampiro se detém numa pequena campina, e Jared o vê conversando com
Bella. Você corre até lá, mas Sam hesita. Está fora dos limites de terra do
tratado. Aquele é um dos amigos dos Cullen? Ele rompeu o pacto com suas
matanças, mas você não tem provas—não testemunhou. Sam não quer
começar uma guerra sem ter certeza das conseqüências. Você acha que ele
se tornou cauteloso demais. Você discute e, quando fica claro que Laurent
pretende ferir Bella, Sam rapidamente fica ao seu lado.
Matar Laurent é mais fácil do que todos esperavam. É porque foram
cinco contra um? Sabe que não foi o caso. Você e Sam fizeram a maior
parte do trabalho, e você sente que poderia ter cuidado do sanguessuga
sozinho. Talvez vampiros não sejam tão durões quanto se diziam nas
histórias nas quais nós acreditávamos.
A imagem do rosto aterrorizado de Bella na campina está sempre
diante de seus olhos. Ela estava apavorada—mais aterrorizada por sua nova
aparência do que pelo vampiro caçador de olhos vermelhos. Você
constantemente se pergunta como ela explicou a si mesma o que viu.
A caçada continua, e a fêmea ruiva prova ser muito mais esquiva. O
bando não compreende as motivações dela, então é difícil adivinhar seus
movimentos. E ela é muito boa em fugir.
Ter um vampiro por perto o deixa nervoso. Todos parecem estar
envolvidos com Bella no final. Você vigia os arredores da casa dela à noite,
certificando-se de que está segura.
A vida normal tornou-se rotina. Mas os outros estão impressionados
com seu controle e, durante aquelas poucas semanas rastreando o vampiro
de cabelo preto, ficaram ainda mais espantados. Você lida melhor com seus
“episódios” (é assim que pensa neles) do que qualquer outro. Sam levou
metade de um ano para chegar ao ponto em que você está agora, após duas
semanas. Você já é melhor do que Embry, Jared e Paul. Contudo isso não o
faz feliz. Por que alguém ia querer ser o melhor lobisomem?
Porém, você começa a achar que pode ver Bella. Você tem certeza,
agora que sabe o que esperar, que pode se controlar perto dela. E ela
telefona o tempo todo. Os monstros na floresta sem dúvida a traumatizaram.
Ela precisa de você. Está em seus pensamentos na maior parte do tempo.
Sam o pune—ninguém sabe melhor do que ele o que é cometer um erro.
Você nem mesmo pode conversar com ela pelo telefone. Todos os
lobos e anciãos estão perturbados por suas lembranças—sempre foram tão
cuidadosos a respeito do tratado e você o rompeu sem saber de fato. Pelo
menos os vampiros que concordaram com o pacto foram embora, então
isso significa que não há guerra. E Bella não parece acreditar em apenas
uma das histórias... Mas Sam lhe dá uma ordem: não permite que você
conte a verdade a Bella. Diz isso em forma de lobo e você consegue sentir
a camada de autoridade correndo através do pensamento. Ele é o lobo alfa,
você não pode desobedecer.
No entanto, Bella é persistente e você não fica surpreso quando ela
acampa do lado de fora de sua casa. Você convence os outros de que pode
lidar com uma conversa, que tinha que acontecer em algum ponto. Sam
concorda—ele reluta em ser ditatorial demais em sua posição de alfa, com
você mais do que os outros (mas isso é outra história). Ele o avisa para
manter a calma e insiste que você diga o que for necessário para mantê-la
afastada. Está pensando em Emily, como você pode argumentar contra
isso?
É mais difícil do que achou que seria. Você observa o rosto de Bella
ao voltar atrás em sua palavra, e é como se alguém o apunhalasse no
estômago. Você é tão ruim quanto aquele vampiro que a quebrou. Sente
que está pegando toda a esperança e felicidade, sua e dela, e esmagando-as
com a própria mão. Algumas vezes a raiva é forte—começa a ferver, mas
você a controla. Você chega perto de perder quando ela começa a ficar
defensiva a respeito dos vampiros. Como pode pensar bem deles,
especialmente agora, com tudo que fizeram a ela? Como ser vampiro já não
fosse o suficiente.
E então ela se culpa—acha que fez algo errado e é por isso que você
está agindo assim. Ela quase suplica. Você realmente se odeia por estar
fazendo isso com ela. Você foge, transformando-se assim que fica fora de
vista para não chorar como antes.
É uma longa tarde. Você está cheio de Embry por tentar consolá-lo,
cheio da aprovação de Sam pelo que fez. Imagina amargamente se não
feriu Bella hoje assim como ele literalmente feriu Emily. Retorna à sua
forma humana para escapar deles e medita a noite toda. Você sai de casa
para fugir de Billy, que é tão irritante quanto os outros.
Você percebe que apesar de Sam tê-lo proibido de explicar a Bella,
ele tecnicamente não ordenou que não a visse. Sabe que isso será
complicado, mas não suporta fazê-la pensar que não quer ser amigo dela.
Você tem de se desculpar, encontrar uma forma de conciliar.
Você sai de moto e a esconde em outra rua. Entra sorrateiramente no
quarto dela e surpreende-se com a raiva dela. Ela também parece
horrível—tão mal quanto na primeira vez em que a viu. Seus olhos estão
vermelhos e o rosto molhado. Você se odeia novamente ao ver isso. Tenta
explicar, mas a ordem de Sam atrapalha seu caminho.
Você tenta ao menos deixar claro como ela é importante para você e
que esta separação não é escolha sua. Enquanto conversa com ela, a
princípio sente que cometeu um erro ao vir. Não está tornando as coisas
melhores. Não podem melhorar enquanto ela não compreender. Se ela ao
menos acreditasse em todas as histórias daquele primeiro dia...
Você percebe então que ela já sabe o que você quer que saiba. Tenta
fazê-la lembrar, compreender, mas ela está meio sonolenta e confusa. Está
mais esperançoso, mas também tenso. Ela vai se lembrar? Vai decifrar? Se
descobrir, o que vai pensar? Vai ficar assustada e rejeitá-lo? A idéia de que
ela possa se sentir assim o deixa louco. Ela foi capaz de aceitar um
vampiro... Isso o enoja.
Você sabe que assim que mudar de novo, Sam e os outros saberão
tudo a respeito dessa transgressão. Espera conseguir esconder até Bella
entender a situação. Volta para casa e promete a si mesmo que vai manter a
calma não importa o quanto isso custe.
Quando você acorda na manhã seguinte, Billy conta que Bella
apareceu e está esperando-o na praia. Você fica entusiasmado e temeroso.
Ela deve ter juntado as peças. Ela não telefona simplesmente. Já aceitou o
que você é?
Então você chega à praia e vê o rosto dela. Ela está assustada e
aborrecida. Consegue ver por sua expressão que não aceitou bem sua nova
vida. Isso o deixa furioso. Você tem de concentrar toda sua energia em
permanecer humano. Você a acusa de hipocrisia e então sente um alívio
esmagador quando o mal-entendido é esclarecido. Ainda dói ver como ela é
protetora a respeito de seus vampiros, mas pelo menos a aceitação dela o
inclui também. Mais uma vez, você fica esperançoso. Talvez consigam
arrumar toda aquela confusão e ficar juntos de novo.
É um enorme alívio ser capaz de conversar abertamente com ela
agora. Fica surpreso ao descobrir que ela é mais bem informada sobre os
vampiros de fora de Forks do que o bando, e horroriza-se ao saber que a
ruiva esteve atrás de Bella o tempo todo. Está ansioso para falar com os
outros; quer um plano definido para proteger Bella. Você se sente muito
feroz, sabendo que alguém está tentando machucá-la. Pela primeira vez,
fica contente por ser um lobisomem. É terrível, mas ao mesmo tempo você
pode proteger Bella. De repente, vale a pena.
Você chama o bando para se reunirem. Apesar de agora estar
confiante por conseguir se controlar perto de Bella, você esquece de levar
os outros em conta. Paul reage de maneira mais violenta do que esperava.
Você tem de se transformar diante de Bella para protegê-la e não tem
chance de ver sua reação. Tem de afastar Paul dela. Para sua sorte, você
está ficando maior e mais forte a cada dia. Não é tão difícil lançar Paul para
o meio da floresta. Sam se junta a você rapidamente e ordena que Paul se
acalme. Você lhes explica sobre a ruiva e Bella—não leva muito tempo,
falando através dos pensamentos como faz. Embora Sam tenha que tomar
conhecimento da importância e utilidade dessa informação, ele ainda se
ressente com você um pouco. Ele aponta o fato de eu colocar Bella em
perigo hoje, e então critica Paul por ser esse perigo. Finalmente, ele lembra
que compreende, e logo os três fazem as pazes rapidamente. Melhor do que
isso. Você está achando mais fácil fazer parte daquela situação, agora que
ajuda Bella.
É estranho como as coisas voltam ao normal, enquanto ao mesmo
tempo tudo é diferente e perigoso. Bella é a peça chave que ajuda a colocar
tudo em equilíbrio. Você consegue poucas horas de sono à noite, mas na
maior parte do tempo está correndo pela floresta com Sam ou Embry,
procurando por qualquer sinal de que a sanguessuga ruiva voltou. Quando
não é seu turno, você passa todo tempo possível com Bella. Há um novo
nível de intimidade em sua amizade. Ambos conhecem os segredos um do
outro, e isso faz mais diferença do que imaginou. Você se espanta com o
quanto ela não pôde compartilhar, como esteve sozinha com seu coração
partido. Ainda o perturba ver como ela lamenta pelos Cullen. Você não
consegue enxergar a diferença entre os Cullen e a vampira que a persegue
agora, mas ela sim. Obviamente está aterrorizada com aquela vampira.
Você tenta lhe dar confiança. E fica contente por ela não estar mais nisso
sozinha.
Você se preocupa por Bella estar sozinha durante suas patrulhas. Não
fica feliz quando seus planos para ajudá-la a se divertir—afastar-se da
constante ansiedade—são interrompidos por Victoria. Ela faz uma tentativa
desanimada de cruzar seu território. Parece suspeito para você, e quando
ela foge para a água, preocupa-se que tenha outro plano. Você, Jared e
Embry correm ao longo do litoral, procurando por quaisquer sinais de que
tentou chegar à praia. Volta a La Push sem cruzar com seu cheiro. Embry
continua em frente com Jared, mas você quer verificar Bella. Apenas para
se certificar de que a ruiva não chegou perto.
Bella não está na praia, nem a ruiva ou qualquer outro. Você se
mantém na floresta, mas a tempestade é ruim o bastante para alguém estar
por perto e vê-lo. A picape dela não está na frente da casa. Seu primeiro
pensamento é que ela foi embora, mas os rastros frescos do pneu indicam
que foi em outra direção. Até encontrar a picape abandonada na estrada
perto dos penhascos você não se lembra da promessa que fez no dia
anterior. Mergulho do penhasco. No mesmo instante, você ouve o grito de
Bella à distância, o som logo desaparecendo.
Você corre até a margem em segundos. Não consegue ver nada lá
embaixo—as ondas são violentas, não há traço de impacto recente. Você se
inclina na beirada, mergulhando de nariz nas águas escuras.
É difícil manter-se na água. Você sabe quanta força está usando para
continuar nadando e sabe que Bella não é assim tão forte. Nenhum humano
é forte o bastante para lidar com a correnteza.
Você procura freneticamente, seus olhos agudos varrendo a água.
Finalmente, vê algo branco e brilhante—as mãos dela lutando inutilmente
contra as ondas. Você está debaixo d’água, quase sem fôlego e entrando em
pânico. Ninguém teria sido capaz de fazer aquilo sob as mesmas
circunstâncias, nem Sam, mas você se concentra e se força a mudar para a
forma humana. Então agarra Bella e a leva de volta à superfície.
Você deseja ter aprendido primeiros socorros. Tudo em que
consegue pensar é tirar a água dos pulmões dela. Ela engoliu tanto. Está
consciente a princípio, mas então desmaia. Você não sabe o que fazer.
Você a reboca de volta a praia, esperando que a ajuda esteja a caminho. Os
pensamentos de Jared e Embry estiveram com você durante o mergulho,
mas agora está desconectado deles.
Sam aparece, mas Bella acorda antes que ele possa fazer algo além
de contar sobre a tragédia na vila. Sente-se culpado por afastá-lo de onde
ele é necessário. Bella parece estar bem. Você não sabe se ela precisa de
um médico, mas ela só quer descansar então você a leva para casa. Você
está exausto após tantas noites de vigilância e cai no sono ao lado dela.
Sente-se bem ali, juntos sem nenhum segredo, sabendo que ela está segura.
Billy o acorda quando chega em casa. É devastador saber que Harry
se foi. Ele era um dos melhores amigos de Billy, um tio de muitas formas, e
também um dos três únicos anciões que sabiam a respeito dos lobos. Não
parece justo ter partido.
Você leva Bella para a casa dela, sabendo que Charlie estará
lamentando também. No caminho, nota que algo está diferente nela, mas
não consegue descobrir o que é. Perder Harry o deixa ainda mais ciente de
que poderia ter perdido Bella também—chegou perto. O pensamento o
deixa horrorizado. Ao mesmo tempo, fica intensamente contente por ter
sido capaz de salvá-la. Ela está viva porque você é um lobisomem. Fica
ainda mais fácil conciliar seu destino.
Pensando no chamado, você a segura nos braços, aliviado por poder
fazer isso. Pela primeira vez, desde a noite em que se transformou—na
noite do terrível filme—você acha que isso pode dar certo. Parece certo
abraçá-la daquele modo. Ela sente o mesmo? Talvez não seja tão forte
quanto o que ela sentiu pelo vampiro, mas tem de significar algo o fato de
que nenhum dos dois se sente inteiro sem o outro. Parece que você é
destinado a ficar com ela.
Ela começa a se afastar. Ainda não está totalmente pronta, mas você
acha que ficará. Só um pouco mais de paciência. Você abre a porta do carro,
e esse pacífico entendimento é destruído.
Há um vampiro por perto. Seu primeiro pensamento é na ruiva, e
você acha que ela usou a morte de Harry como distração para se aproximar
furtivamente. Não tem certeza de onde ela está ou se observa. Você tem
medo de se transformar para caçar, no caso de ela surgir enquanto está
rastreando. Você decide que o melhor plano é levar Bella de volta a La
Push, deixá-la aos cuidados de Embry, e caçar a ruiva com Sam.
Entretanto, algo não está certo. O cheiro é diferente. Obviamente é
um vampiro, mas não é o mesmo cheiro que tem queimado seu nariz há
uma semana.
Antes que consiga entender, Bella lhe diz para parar. Seu rosto está
iluminado de um modo que você não via desde o dia em que ela veio
procurá-lo, toda quebrada. Ela acha que os Cullen voltaram, e o carro
brilhante estacionado perto da casa dela apóia a teoria. Seu entusiasmo o
enoja. Tudo que ela quer é ir procurar o vampiro, como se não fizesse parte
da dieta básica da espécie deles. Você fica furioso. É difícil se acalmar.
É óbvio que você terá de afastá-la dali a força se quiser impedi-la de
entrar. Ela parece ter certeza de que são os vampiros dela. Bella já se foi—
mentalmente, está há milhas de distância de você. E você tem
responsabilidades. A matilha tem ignorado completamente os limites do
tratado desde que os Cullens partiram. Você não pode causar problemas
aos seus irmãos, não contando que os Cullens estão de volta.
Você detesta deixá-la ali e está furioso porque é isso o que ela quer.
O futuro, que parecia tão promissor segundos atrás, desmorona em nada.
Ela nem mesmo se importa por eles a terem abandonado? Nada importa?
Nunca, nem mesmo uma vez, ela expressou qualquer raiva pelo que eles
lhe fizeram. Você acha que ela nunca sentiu essa raiva. Ela aceita o que
fizeram sem questionar.
Você precisa partir porque não será capaz de se segurar por mais
tempo. Sente sua fúria crescendo. Você a deixa ali na rua sozinha,
desejando mais do que tudo que ela o chame de volta, que mude de idéia.
Ela não o faz.
Você corre para o hospital, e então se transforma. A raiva passou um
pouco e você está nervoso a respeito da segurança dela novamente. Você
telefona e ela atende. É verdade. Os Cullens estão de volta e ela escolheu
os vampiros ao invés de você.
É uma noite ruim para os lobos Quileutes. Sam limita a patrulha para
proteger apenas as fronteiras da reserva. Sam não quer deixar qualquer
brecha—pode haver meia dúzia de vampiros lá fora, e suas intenções não
são claras. Você está preocupado a respeito de Bella e a ruiva, mas Sam diz
para deixar os Cullens cuidarem dos seus. Você detesta a idéia de Bella
pertencer a eles.
Os dias passam. Ninguém tenta cruzar a linha. Billy liga para Charlie
e parece que apenas um dos Cullen voltou, ela está ficando com eles. Isso o
assusta. Sam está preocupado—qual é a nova política? Os limites de
fronteira estão valendo? Por quanto tempo? O resto deles está voltando?
Eles sabem a respeito da ruiva? Consideram que ela está sob proteção do
tratado? Se for assim, o pacto foi rompido. E se eles não a deixarem partir,
o bando irá considerá-los cúmplices. Sam, Billy e o ancião Quil discutem a
possibilidade de uma guerra...
Mas Sam quer informação primeiro—tenta se manter civilizado tanto
tempo quanto for possível—e você se apresenta como voluntário para o
serviço. Insiste em ir pessoalmente. Você precisa ver o rosto dela, ver o
quanto ela está envolvida. Você diz a Sam que saberá melhor da verdade se
for pessoalmente, será capaz de ver se ela estiver mentindo. Você não o
engana com seus motivos, mas, de qualquer maneira, é seu raciocínio.
Você vai durante o funeral, então poderá conversar com ela
honestamente, sem dar chance para Charlie interromper. Jared e Embry não
querem deixá-lo lá sozinho, mesmo tendo certeza de que o vampiro saiu
por um momento. Você sabe que eles ficarão por perto, mas não quer que
ouçam. Quer realmente poder conversar com Bella, tanto quanto quer
manter a calma. A casa dela fede—queima seu nariz. O fedor da vampira a
envolve. Ambos estão um pouco hostis, mas ela responde suas perguntas.
A Cullen está somente de visita. Você diz a si mesmo que as coisas
voltarão ao normal quando a vampira partir novamente.
Você não consegue se forçar a ir embora. Percebe que a magoou e
volta para encontrá-la chorando. Sente-se pior, e melhor. Melhor porque,
pelo menos, ela se importa o suficiente. Ela chora por você. É alguma coisa.
Você é capaz de conversar agora, mas é difícil. Ela os ama. Os
monstros que a feriram—os ama. Ela gosta de você também, mas não tanto
quanto. Mas a vampira vai embora de novo... Você fica confuso, não tem
certeza de como se sente.
Você a abraça e é como antes—como se fosse destino. Segura o
rosto dela entre as mãos e, de repente, quer beijá-la mais do que qualquer
coisa no mundo. Não é como planejava—momento errado com a vampira
andando por aí em algum lugar. Mas você pensa que talvez seja algo que
tinha de acontecer também. Talvez ela sinta isso. Você vê o conflito em
seus olhos, e imagina qual lado irá vencer quando seus lábios tocarem os
dela.
O telefone toca naquele momento inoportuno, e você atende. Que
escolha você tem? Pode ser Sam, pode ser algum problema. Você ouve o
tom claro e musical da voz com um suave sotaque inglês, e sabe quem é
após a primeira palavra. Outro deles. Talvez Bella esteja errada a respeito
dos outros voltarem. Talvez esteja mentindo.
Bella fica zangada novamente quando o vampiro desliga em sua cara.
Antes que possa esclarecer, você sente o cheiro fresco e ardente da vampira
se aproximando. Ouve o som fraco da aproximação quase silenciosa dela.
Tenta ir embora, mas o cheiro fica mais forte na sala da frente. Antes que
consiga alcançar os fundos, a sanguessuga está lá.
Ela é só uma coisa minúscula, mas depois do que Bella contou a
respeito de vampiros com talentos extras, você não fica de guarda baixa.
Contudo, ela presta pouca atenção em você. Mal parece consciente dos
arredores, perturbada com algo. Bella a chama de Alice. Alice diz o nome
de Edward uma vez, e Bella se encolhe. A vampira a feriu? Você não vê
nada. Mas salta para pegar Bella antes que a vampira consiga tocá-la e a
afasta.
A pequena vampira parece bem irritada e isso o surpreende. Você
não havia percebido que eles possuíam tais emoções. Fica revoltado e
espantado com o quanto Bella e Alice parecem se sentir confortáveis
tocando uma a outra. Pensava que vampiros não fossem capazes de tocar
humanos daquele jeito sem machucá-los. E Bella está tão à vontade com
Alice—capaz de interagir com ela como se Alice fosse humana. Bella
parece vê-la desse modo—como uma pessoa, quase.
A conversa é difícil de seguir. Você entende que Edward Cullen está
com algum tipo de problema e alguém chamada Rosalie é a culpada. Bella
grita e então exige ajudar, e a vampira deixa-a tentar, embora fique claro
que é uma missão suicida.
Você segue Bella até a cozinha, onde ela escreve um bilhete para
Charlie. Você pede a ela que não vá. É como se não tivesse dito nada. Ela
pede que você tome conta do pai dela.
Bella corre para fazer as malas, e você é deixado sozinho com Alice.
Você se afasta dela tanto quanto possível—o instinto para se transformar e
atacar é difícil de reprimir—e a acusa de atrair Bella para a própria morte.
De fato é mais fácil do que você imaginou, falar com ela—a vampira reage
e fala como humana, embora sua aparência seja assustadoramente
alienígena. Para seus olhos aguçados, ela é como um cristal vivo, todo
ângulos e brilho.
Alice discute por um momento, mas então Bella volta e ambas
partem. Você a verá novamente? Você literalmente implora para que não
vá, mas Bella vai embora após beijar sua mão. Você mal consegue se
segurar por um segundo quando percebe que ela está indo morrer por
aquele sanguessuga que arruinou sua vida. Pela primeira vez, desde o
começo, você perde controle de si mesmo e explode num lobo contra a
vontade.
A vida é mais sombria do que nunca. Os outros ficam aliviados por
Alice Cullen ter partido, tendo ou não levado Bella consigo. Eles tentam
esconder os sentimentos de você, mas é claro que não existem segredos
numa matilha de lobos. Sam cautelosamente aumenta as patrulhas, e você
toma cuidado extra para vigiar Charlie, como Bella pediu.
É assim que você descobre a ruiva, tentando outra aproximação de
Bella. O bando circula, lentamente fechando o perímetro, deixando-a
chegar perto de Forks enquanto montam uma barreira entre ela e Charlie...
No entanto, ela abruptamente pára e dá meia volta. Você a persegue, mas
ela é astuta e mais rápida do que o vampiro de cabelo preto. A súbita fuga
dela o pega de surpresa—você não revelou sua aproximação. Fazendo um
breve reconhecimento após o fato, Sam descobre o que aconteceu. O
caminho dela cruzou com uma recente trilha deixada por Alice Cullen. Isso
pareceu suficiente para ela fugir em pânico. E deixa claro pelo menos que a
ruiva não é amiga dos Cullen.
Charlie está em pânico, naturalmente. Ele vem a La Push para
interrogá-lo, ver se você sabe de qualquer coisa para ajudá-lo a encontrar
Bella. Você deseja poder contar tudo a respeito dos Cullen, mas não pode
revelar os próprios segredos, e que bem isso lhe faria? Ninguém pode
salvar Bella agora.
As notícias voam em Forks, quando Bella volta viva. Charlie não
telefona a Billy de imediato—aparentemente está furioso demais—então
você ouve através de Leah Clearwater. Charlie ligou para cancelar uma
visita à sua mãe; não queria deixar Bella sozinha, porque ela está numa
grande encrenca. Você está tão aliviado por ela estar bem que não liga para
mais nada a princípio. Mas não demora muito para o resto das novidades o
alcançarem. O Dr. Cullen está retornando ao hospital—a família toda se
mudou de volta. Sam inicia as patrulhas novamente, mas não tão longe
quanto antes. Os vampiros não tinham conhecimento dos lobisomens antes,
mas agora sabem. Se eles voltaram pra valer, então o bando teria de
reforçar as fronteiras de novo. Certificar-se de que não havia mal-
entendidos sobre os pertences dos Quileutes.
Através de Charlie, Billy consegue atualizações. Edward está de
volta, aparentemente declarado por completo como “namorado” de Bella
novamente, sem nenhuma repercussão após a defecção. Bella não vem
visitá-lo e você fica zangado, embora realmente não espere que ela o faça.
Também está zangado com Charlie por deixar Bella sair com Edward de
novo. Ele não devia, como pai, ser capaz de fazer algo a respeito?
Você surge com um plano e não pensa muito no que está fazendo. Se
ela ficar de castigo, não terá permissão para vê-lo... Talvez, se ficar
afastada dele, ela seja capaz de se livrar de qualquer feitiço que ele tenha
lançado sobre ela, e se lembre do que ele é, do que fez.
Além disso, você tem uma nova preocupação agora. Quando Alice
retornou, seu maior medo foi que um dos vampiros perdesse o controle
perto dela e matasse Bella por causa da sede. Ocorre-lhe agora que talvez
haja algo pior. Talvez tenham intenções ainda piores do que usá-la para
satisfazer um apetite. Você nem mesmo quer formar a idéia em sua cabeça,
mas não consegue afastá-la.
Talvez eles tentem transformá-la num deles.
É a coisa mais terrível que você pode imaginar. Pior do que matá-
la—roubar sua essência e transformá-la numa inumana criatura de pedra,
uma piada da pessoa que ela foi certa vez. Seria como deixar algum
estranho ter seu corpo, apenas uma versão deformada e fria daquele corpo.
Você sabe que a única coisa que deixaria Charlie mais zangado do
que tudo (exceto a verdade, que você não pode contar) é a moto de Bella.
Você a leva até a casa dela e diz a Charlie que está devolvendo, já que
Bella não vai mais a La Push. Charlie fica vermelho-beterraba e grita com
você por um quarto de hora, prometendo informar Billy sobre o que está
acontecendo. Quando ele o deixa ir embora, você recua para a floresta ao
invés de ir embora, sabendo que o sanguessuga saberá pelo cheiro que você
está ali. Você tem um aviso para dar.
Como você esperava, Edward Cullen vem com Bella para encontrá-
lo, antes de ela encarar Charlie. É muito difícil se controlar, mas você não
vai se meter numa briga com Bella ali. Ela pode se ferir e não será você
quem romperá o pacto dessa vez. Deixe os Cullens bancarem os vilões por
completo.
Bella está furiosa. Você estava preparado para isso, mas mesmo
assim é difícil vê-la tão magoada.
O vampiro o pega de surpresa, agradecendo-o pelo que fez por Bella.
Você se recusa a acreditar que ele está sendo sincero de algum modo. É só
algum estratagema. Você descobre que as habilidades dele para ler mentes
são ainda piores do que temia. Ele vê tudo o que você está pensando.
Embora ele saiba do aviso que veio dar, você responde a pergunta de
Bella sobre o pacto. Eles não apenas estão proibidos de se alimentar de
humanos, se quiserem preservar a paz com os lobos, como também não
podem criar novos vampiros.
A reação furiosa de Bella lhe diz muito mais do que você quer saber.
Até aquele momento, você se preocupou com os Cullens pensando em
transformá-la. Não esperava que ela estivesse ciente desse plano. Agora
percebe que ela mesma estava planejando aquilo—é o que ela quer.
Você tem que lutar ainda mais do que antes para manter sua forma
humana. O resto da conversa não significa nada. Bella quer ser uma
vampira. Ela não percebe que esta mudança é apenas outra forma de
morte—pior do que qualquer outra.
Se ele transformá-la, isto significará guerra. Você segue pra casa
para contar aos irmãos. Precisa se preparar...
JACOB OTK

A maior diferença (e é uma ENORME diferença) entre o primeiro


rascunho de Lua Nova e a cópia final é esta: originalmente, Bella nunca
descobriu o que houve de errado com Jacob. Seria um livro mais curto
então, sem as cruciais setenta páginas onde Jacob e Bella compartilham
todos os seus segredos e fortalecem seu relacionamento em algo que
transcende a amizade.
Antes de continuar a ler, não deixe esta versão confundi-lo. Isso não
foi como “realmente aconteceu”. Assim que minha familiaridade com o
personagem de Jacob cresceu, essa versão original pareceu mais e mais
improvável. (É claro que Jacob iria quebrar as regras—ele é Jacob!) Isso
é como um esqueleto—apenas ossos, sem carne.
Tente imaginar: Bella vai até a casa de Jacob para exigir a verdade
sobre o “culto”. Jacob aparece com Sam e os outros, e então concorda em
conversar com Bella em particular. Ele termina com ela (por falta de uma
palavra que defina melhor) e ela sofre uma desilusão pela segunda vez no
livro. Tudo bem, tudo isso soa familiar. Mas então naquela noite... nada
acontece. Jacob não quebra as regras e não sobe pela janela para
conversar com ela. Jacob não lhe dá dicas, tentando ajudá-la a descobrir o
que já sabe. Bella ainda está isolada, sozinha. Não tem idéia de que
Victoria está lá fora, caçando-a, ou que os lobisomens estão lá,
protegendo-a.
Contudo, Bella é persistente demais para aceitar não como resposta
de Jacob. Ela não tem as mesmas questões de autovalor que interferiram
em seu relacionamento com Edward, no começo de Lua Nova, para detê-la
ali. Não, Jacob lhe DEVE mais do que isso, droga, e ela vai conseguir o
que quer.
No entanto, ela não consegue encontrá-lo e eventualmente sua busca
a leva até o penhasco. Ela lembra de ter visto a “gangue” mergulhar no
esquecimento—e você sabe o quanto ela é viciada em suas alucinações.
Mergulho do penhasco é a inspiração dela nesta versão. Quando Jacob
salva sua vida dessa vez, a interação entre eles é 180° diferente da versão
final...

“Como vamos sair daqui?” Eu tossi e cuspi as palavras. Sentia tanto


frio agora que não conseguia sentir muito além do calor de seu corpo,
enquanto ele me segurava cuidadosamente acima das ondas, e a dor em
minhas costas. Era como se a correnteza estivesse me arrastando pelas
pernas, indisposta a desistir, mas eu estava dormente e devia estar
imaginando.
“Vou rebocar você até a praia. Fique quieta como se estivesse
inconsciente e não lute. Isso vai tornar as coisas mais fáceis.”
“Jake,” falei ansiosa. “A correnteza está forte demais. Você
provavelmente não vai conseguir sozinho, não precisa me puxar.”
“Eu te pesquei, não foi?” Ele me abraçou com força e não pude ver
seu rosto, mas sua voz soou levemente convencida.
“Pescou,” concordei duvidosamente. “Como conseguiu? A
correnteza...”
“Sou mais forte do que você.”
Eu teria argumentado, mas a água decidiu sair de meu estômago
naquele instante.
“Okay,” ele disse, quando terminei de vomitar. “Preciso tirar você
daqui. Lembre-se, fique parada.”
Eu estava fraca demais para discutir, mas fiquei assustada ao sair da
segurança do rochedo e deixar as ondas me pegarem novamente. Apesar de
ter me conformado há dois minutos atrás com a idéia de me afogar, eu tive
medo agora. Não queria voltar para o escuro. Não queria que a água
cobrisse meu rosto novamente.
Pude sentir quando Jacob saltou do rochedo. Eu estava de costas e
ele ainda me segurava nos braços ao se impulsionar para a praia. A água
agitada nos alcançou, entrei em pânico e comecei a chutar.
“Pare com isso,” ele gritou.
Lutei para ficar inerte e foi mais difícil do que eu pensei, embora
meus membros exaustos com câimbras não quisessem mais do que flutuar
imóveis.
Foi espantoso—seguimos pela água como se uma linha nos
rebocasse até a praia. Jacob era o nadador mais forte que já vi. A força e o
empuxo da correnteza pareciam incapazes de sequer romper a rota direta
que ele tomou através das ondas. E ele era rápido. Em ritmo de recorde
mundial.
Então senti a areia arranhando meus calcanhares.
“Okay, pode ficar de pé, Bella.”
Assim que ele me soltou, caí de cara sobre uma onda na altura dos
joelhos.
Ele me puxou para fora antes que eu engolisse mais água, facilmente
me jogando sobre o ombro e caminhando rápido para a areia. Ele não disse
nada, mas seu fôlego soava irritado.
“Ali,” murmurou consigo mesmo ao mudar de direção. Eu conseguia
ver apenas seus pés descalços deixando pegadas enormes na areia molhada,
enquanto pendia em seu ombro.
Ele me largou num pedaço de areia que, de fato, parecia seco. Era
escuro ali—percebi que estávamos numa caverna rasa que a maré havia
escavado sob a rocha. A chuva não me atingia diretamente, mas pequenos
respingos de névoa e areia me cobriram.
Eu tremia tanto que meus dentes estavam apertados—o som era
como de hiper-castanholas.
“Venha cá,” disse Jacob, mas eu não tive que me mexer. Ele colocou
os braços quentes ao meu redor e me abraçou com força contra o peito nu.
Estremeci, mas ele ficou imóvel. Sua pele estava bem quente—como se a
febre tivesse voltado.
“Não está congelando?” gaguejei.
“Não.”
Senti vergonha. Ele não apenas era muito melhor do que eu na água,
como agora me fazia parecer ainda mais fraca.
“Eu sou mesmo uma frouxa,” resmunguei.
“Não, você é normal.” A amargura estava lá em sua voz. Ele se
moveu rapidamente, não me dando chance para perguntar o que quis dizer.
“Se importa de me dizer que diabo acha que estava fazendo?” exigiu.
“Mergulhando do penhasco. Recreação.” Inacreditável, mas ainda
havia um pouco de água em meu estômago. E escolheu aquele momento
para fazer sua reaparição.
Ele esperou até que eu estivesse respirando novamente. “Parece que
você se divertiu.”
“Me diverti, até atingir a água. Não devíamos ir procurar ajuda ou
algo assim?” Meus dentes ainda batiam, mas ele entendeu o que eu disse.
“Eles estão vindo.”
“Quem está vindo?” perguntei, desconfiada e surpresa.
“Sam e os outros.”
Fiz uma careta. “Como eles vão saber que precisamos de ajuda?”
Meu tom era cético.
Ele bufou. “Porque eles me viram correr e pular do penhasco atrás de
você.”
“Vocês estavam me observando?” acusei com um fraco ultraje.
“Não, eu ouvi você gritar. Se tivesse visto, eu a teria impedido. Isso
foi realmente estúpido, sabe.”
“Seus amigos fazem isso.”
“Eles são mais fortes do que você.”
“Sou uma boa nadadora,” protestei, apesar da evidência em contrário.
“Numa piscina,” ele rebateu. “Bella, um furacão está se aproximando.
Você não considerou isso?”
“Não,” admiti.
“Estúpida,” ele repetiu.
“É,” concordei com um suspiro. Estava tão frio e eu estava tão
cansada.
“Fique acordada,” Jacob me sacudiu bruscamente.
“Pare,” respondi. “Eu não vou dormir.”
“Então abra os olhos.”
Sinceramente, eu não tinha percebido que eles estavam fechados.
Não falei aquilo. Só abri e respondi, “Tudo bem.”
“Jacob?” O chamado foi ouvido claramente apesar do vento
barulhento e das ondas. A voz era bem profunda.
Jacob inclinou-se para que não tivesse que gritar em meu ouvido.
“Na caverna, Sam!”
Eu não ouvi a aproximação deles. De repente, a pequena caverna
ficou abarrotada de pernas morenas. Levantei a cabeça, sabendo que meus
olhos estavam cheios de desconfiança e raiva, consciente da proximidade
de Jacob. Os braços dele me protegeram, mas subitamente eu me senti a
protetora.
O rosto calmo de Sam foi a primeira coisa que eu vi. Uma confusa
sensação de déjà vu me dominou. A caverna escura não era tão diferente da
floresta à noite, e novamente me vi fraca e indefesa aos seus pés. Ele estava
me salvando de novo. Fitei-o aborrecida.
“Ela está bem?” perguntou a Jacob, no tom seguro de único adulto
entre crianças.
“Eu estou bem,” resmunguei.
Ninguém me deu ouvidos.
“Precisamos aquecê-la—ela está ficando sonolenta,” respondeu
Jacob.
“Embry?” indagou Sam, e um dos rapazes surgiu entregando uma
pilha de cobertores a Jacob. O tom de comando na voz de Sam irritou-me
profundamente. Era como se nenhum deles pudesse fazer nada até que ele
permitisse. Fuzilei-o com um olhar feroz, enquanto Jacob me cobria com os
cobertores ásperos.
“Vamos tirá-la daqui,” Sam instruiu friamente. Ele se inclinou em
minha direção com as mãos estendidas, mas eu me afastei.
“Eu levo ela, Sam,” disse Jacob, levantando-me suavemente nos
braços enquanto ficava de pé.
“Eu posso andar,” protestei.
“Okay.” Jacob me colocou no chão e esperou.
Meus joelhos fraquejaram. Sam me pegou antes que eu caísse;
instintivamente, lutei contra suas mãos.
Jacob me agarrou novamente, afastando-se de Sam e me puxando
para seus braços. Ele era ridiculamente forte para sua idade. Franzi o cenho,
furiosa, enquanto Sam me cobria com os cobertores.
“Paul, você tem aquele poncho?”
Outro garoto surgiu sem falar e acrescentou uma camada de plástico
para cobrir os cobertores.
Foi nesse instante, enrolada em camadas protetoras, que notei que
Sam e os outros não estavam mais vestidos do que Jacob. Presumi que
Jacob havia tirado a maioria das roupas antes de pular na água atrás de mim,
mas todos eles estavam com os pés e peitos nus, usando apenas um par de
bermudas ou calças jeans cortadas, molhados pela chuva. A água escorria
pelos seus cabelos e sobre as peles morenas e lisas; eles não pareciam notar.
Debaixo de minha pilha de cobertores, eu tremia incontrolavelmente e me
senti um ridículo bebê.
“Vamos,” Sam ordenou, e todos saíram da caverna.
Havia uma trilha num dos limites da praia. Eles escalaram o atalho
íngreme agilmente, Jacob tão rápido quanto os outros. Ninguém se
ofereceu para ajudá-lo e ele nunca pediu. Jacob não pareceu incomodado
por suas mãos não estarem livres. Ele nunca tropeçou.
Sam e os outros três rapazes seguiram na nossa frente e, enquanto os
observava subirem com a facilidade de cabritos montanheses, fiquei
impressionada com o fato de eles combinarem tão bem com a paisagem.
Eles se misturavam harmoniosamente com as cores das rochas e árvores,
com o movimento do vento; pertenciam ao lugar.
Fitei Jacob e ele se ajustava também. As nuvens, a tempestade e a
floresta emolduravam o seu novo rosto perfeitamente. Parecia ainda mais
natural, mais em casa, do que meu Jacob feliz perambulando pela garagem,
em seu próprio pequeno reino. Era perturbador.
Alcançamos o lado oposto da estrada pela qual eu me aventurei.
Pude ver um vago e enferrujado brilho colorido ao sul, e imaginei que fosse
minha picape.
Eu quis tentar caminhar novamente, mas Jacob ignorou meus
pedidos resmungados. Eles permaneceram à margem da floresta, como se
pudessem se mover mais rápido do que na estrada. E eles estavam se
movendo rápido; minha picape aproximou-se mais veloz do que devia.
“Onde estão as chaves?” Jacob perguntou quando estávamos
chegando. Sua respiração ainda era firme e regular.
“Em meu bolso,” respondi automaticamente antes de perceber o que
ele estava sugerindo.
“Me dê as chaves.”
Olhei-o furiosamente, mas seu rosto estava calmo e determinado.
Mal-humorada, enfiei a mão no bolso da calça jeans molhada e procurei a
chave. Lutei contra os cobertores até libertar a mão. Segurei-a.
“Para você ou Sam?” perguntei, ríspida.
Ele revirou os olhos. “Eu vou dirigir.”
Com um movimento súbito e rápido, ele inclinou a cabeça e arrancou
a chave de minha mão com os dentes.
“Ei!” protestei, aturdida, pulando em seus braços.
Ele sorriu ironicamente com a chave na boca.
Estávamos ao lado da picape agora; Sam abriu a porta do passageiro
e Jacob me largou ali. Deu a volta até o lado do motorista enquanto os
outros subiam na carroceria. Jacob ligou o motor e acendeu o aquecedor na
potência máxima, virando o jato na minha direção. Sentindo-me culpada,
olhei de relance para trás, para os amigos dele sentados estoicamente,
seminus sob a chuva intermitente.
“O que vocês estavam fazendo aqui afinal?” perguntei a Jacob. “Iam
nadar durante a tempestade também?”
“Estávamos correndo,” disse ele, sucinto.
“Na chuva?”
“É... sorte sua.”
Fechei a boca e olhei pela janela.
Não viramos na 110 como eu imaginava, ao invés disso seguimos
para a casa dos Black.
“Por que está me levando para a sua casa?”
“Vou pegar minha moto e colocá-la lá atrás para voltar depois—a
menos que você queira que eu fique com sua picape.”
“Ah.”
“Além disso, eu queria que Billy desse uma olhada em você. Não
quero que Charlie saiba até ter certeza de que você está bem. Ele
provavelmente vai me prender por tentativa de assassinato ou algo assim,”
acrescentou amargamente.
“Não seja estúpido,” retruquei.
“Certo,” ele concordou. “Já existe estupidez suficiente por aqui...
mergulho do penhasco!”
Corei e olhei direto para frente.
Jacob me carregou para dentro da casa. O resto do pessoal nos seguiu
silenciosamente. O rosto de Billy era inexpressivo.
“O que aconteceu?” ele perguntou, dirigindo a pergunta a Sam, ao
invés do próprio filho ou a mim. Fuzilei-o.
“Eu mergulhei do penhasco,” falei rapidamente, antes que Sam
pudesse responder.
Billy apenas levantou uma sobrancelha e manteve os olhos em Sam.
“Ela está com frio, mas acho que ficará bem com roupas secas,”
disse Sam.
Jacob ajeitou-me num pequeno sofá e rapidamente empurrou-o para
perto de um aquecedor. As pernas do sofá fizeram um ruído alto ao serem
arrastadas pelo chão de madeira. Então ele desapareceu em seu pequeno
quarto.
Billy não disse nada a respeito das condições do filho ou dos outros.
Ninguém parecia preocupado com uma hipotermia, exceto em meu caso.
Me senti mal a respeito de molhar o sofá, mas não consegui manter a
cabeça levantada para salvar o tecido dos meus cabelos pelo menos. Estava
exausta demais. Mesmo as figuras altas e ameaçadoras enchendo a pequena
sala, alinhadas e imóveis contra as paredes, não conseguiram manter meus
olhos abertos. Finalmente estava aquecida perto do aquecedor ruidoso, e
meus pulmões ardiam ao ponto da inconsciência, ao invés de me manter
acordada.
“Devo acordá-la para ela trocar de roupa?” ouvi Jacob sussurrar.
Dirigindo-se a Sam, sem dúvida.
“Como está a temperatura da pele dela?” respondeu Sam em sua voz
profunda. Eu quis lançar outro olhar áspero, mas meus olhos não abriram.
Os dedos de Jacob tocaram minha bochecha de leve.
“Morno.”
“Deixe-a dormir, então, eu acho.”
Fiquei contente por eles me deixarem em paz.
“Charlie?” Jacob perguntou.
Dessa vez, Billy respondeu. “Ele correria para cá imediatamente.
Vamos esperar até a tempestade passar antes de ligar.”
Boa resposta, pensei. Ali estava eu, cercada pelos estranhos homens
que cheguei a temer, mas sentia-me estranhamente segura e aquecida.
Alguém falou, uma voz que não reconheci. “Quer que nós três
voltemos?”
Houve uma pausa. “Acho que sim,” Sam disse finalmente. “A
tempestade é um disfarce perfeito; não devemos ser pegos de surpresa.”
“Três é seguro?” Billy perguntou, soando tenso.
Alguém deu uma risada gutural. “Nenhum problema.”
“Se for apenas um,” Sam emendou severamente. Ninguém respondeu,
mas ouvi a porta se abrindo.
“Controle, meus irmãos,” Sam falou novamente, no tom de alguém
se despedindo de modo familiar. “Velocidade e segurança para vocês.”
Fui levemente despertada por aquela troca de palavras, mas mantive
a respiração uniforme.
“Irmãos,” os outros repetiram em uníssono. Ouvi a voz de Jacob se
juntar à deles.
A porta fechou-se silenciosamente. Não houve som por um longo
tempo, e o calor empurrou-me para a inconsciência novamente. Eu estava
prestes a sucumbir quando Sam falou tranquilamente.
“Você não quer deixá-la.”
“Se acordar, acho que ela vai ficar com medo de você.” Jacob soou
defensivo.
“Você não pode fazer isso, Jacob. Foi certo salvar a vida dela hoje, é
claro. Mas não pode mantê-la por perto.”
Eu tive que morder minha língua para deter a resposta ácida que
queria lhe dar. Era mais importante ouvir agora.
“Sam... eu... eu acho que consigo. Acho que seria seguro.”
“Um instante de raiva é o suficiente. Quanto você chegou perto
ontem à tarde?”
Jacob não respondeu.
“Eu sei o quanto é difícil.”
“Sei disso,” Jacob disse, concordando. Não, eu quis gritar. Não
desista assim tão fácil!
“Seja paciente,” Sam aconselhou. “Dentro de um ano ou mais...”
“Ela terá partido,” Jacob concluiu amargamente.
“Ela não é para você,” disse Sam gentilmente.
Jacob não respondeu e eu fiquei arrasada. Detestava concordar com
Sam sobre qualquer coisa. Eu não conseguia ver por que esse fato devia
condenar nossa amizade.
Estava aquecido demais para me concentrar e, no silêncio que se
seguiu após aquela conversa, eu perdi a luta contra minha mente cansada.
Ouvi uma bela voz cantarolando uma familiar canção de ninar por perto, e
soube que estava dormindo.

***

A seção anterior pareceu uma boa introdução para o epílogo


original de Lua Nova. Ao continuar nesse universo alternativo, lembre-se
de que, apesar de Bella saber que há algo errado com Jacob, ela ainda
não tem pistas de que ele é um lobisomem. No epílogo, ela e Edward estão
juntos em Forks novamente, e as coisas voltaram ao normal...

Epílogo – Humana

Era um daqueles raros dias ensolarados, meu tipo de dia menos


favorito. Mas Edward não podia manter sua promessa a cada minuto. Ele
tinha necessidades.
“Alice pode ficar novamente,” ele ofereceu no fim da tarde de sexta-
feira. Pude ver a ansiedade em seus olhos—o medo de que eu ficasse louca
e fizesse alguma bobagem. Como recuperar minha moto em La Push ou
jogar roleta russa com a pistola de Charlie.
“Eu vou ficar bem,” respondi com falsa confiança. Tantos meses de
fingimento haviam afiado minha habilidade de enganar. “Você tem que se
alimentar também. Temos de voltar à rotina.”
Quase tudo voltou ao normal, em menos tempo do que eu julgava ser
possível. O hospital acolheu Carlisle de volta de braços abertos e ansiosos,
sem sequer se incomodar em esconder seu deleite por Esme ter achado a
vida em Los Angeles medíocre demais para o gosto dela. Graças à prova de
Cálculo que perdi enquanto estava no exterior, Alice e Edward estavam em
melhor situação para se formar do que eu no momento. Charlie não estava
satisfeito comigo—nem falando com Edward—mas pelo menos Edward
tinha permissão para entrar lá em casa de novo. Eu é que não tinha
permissão de sair dela.
“De qualquer forma, eu tenho todo esse trabalho para fazer,” suspirei,
acenando para a pilha de formulários de universidades—Edward
desenterrara um de cada faculdade apropriada cujo prazo de inscrição ainda
estava aberto—sobre a escrivaninha. “Não preciso de qualquer distração.”
“É verdade,” ele disse com severidade zombeteira. “Você tem um
bocado de coisas para mantê-la ocupada. E eu estarei de volta quando
escurecer.”
“Leve o tempo que quiser,” respondi despreocupadamente, e fechei
os olhos como se estivesse cansada.
Eu estava tentando convencê-lo de que confiava nele, o que era
verdade. Ele não precisava saber a respeito dos pesadelos com zumbis. A
questão não era falta de confiança nele—era em mim que eu ainda não
podia confiar.
Charlie ficou em casa, o que não era normal num sábado. Trabalhei
nos formulários na mesa da cozinha para que ele pudesse ficar de olho em
mim com mais facilidade. Mas eu era chata de vigiar, e ele raramente
largou a TV para verificar se eu ainda estava ali.
Tentei me concentrar nos formulários e nas perguntas, mas era difícil.
De vez em quando me sentia sozinha; minha respiração acelerava e eu
tinha que lutar para me acalmar. Usei um pequeno estratagema—várias e
várias vezes eu tive que repetir para mim mesma, você consegue fazer isso,
você consegue fazer isso, você consegue fazer isso.
Então, quando a campainha tocou, a distração foi mais do que bem-
vinda. Eu não tinha idéia de quem poderia ser, mas realmente não me
importava.
“Eu atendo!” Levantei-me da mesa num instante.
“Está bem,” disse Charlie, ausente. Enquanto eu corria para a sala de
estar, ficou claro que ele não moveu um centímetro.
Eu já tinha um sorriso de alívio e boas-vindas no rosto, pronto para
atordoar o vendedor ou testemunha de Jeová.
“Oi, Bella,” Jacob Black devolveu um sorriso sardônico para mim,
quando a porta foi aberta.
“Ah, Jacob, oi,” murmurei surpresa. Não tinha notícias dele desde
que consegui voltar da Itália com vida. Eu tinha aceitado seu último adeus
como final. Doía quando pensava a respeito, mas para ser perfeitamente
honesta, minha mente andava ocupada demais com outras coisas para sentir
falta dele tanto quanto deveria.
“Você está livre?” ele perguntou. O tom amargo não desapareceu de
sua voz, e ele disse aquelas palavras em particular com um ressentimento
extra.
“Isso depende.” Minha voz ficou ácida, combinando com a dele.
“Não estou tão ocupada, mas estou em prisão domiciliar. Então não
exatamente livre, não.”
“Mas está sozinha, certo?” ele esclareceu sarcasticamente.
“Charlie está aqui.”
Ele franziu os lábios cheios. “Eu gostaria de conversar com você a
sós... se for permitido.”
Levantei as mãos, impotente. “Pode perguntar a Charlie,” falei,
ocultando o triunfo. Charlie nunca me deixaria sair da casa.
“Não foi o que eu quis dizer.” Os olhos escuros ficaram subitamente
mais sérios. “Não era a permissão de Charlie que eu estava pedindo.”
Fuzilei-o com um olhar sombrio. “Meu pai é a única pessoa que me
diz o que eu posso ou não fazer.”
“Se você diz,” ele deu de ombros. “Ei, Charlie!” gritou por sobre
meu ombro.
“É você, Jake?”
“É. Bella pode sair comigo para um passeio?
“Claro,” Charlie respondeu casualmente, e meu sorriso de
expectativa, esperando por sua negativa, transformou-se numa careta.
Jacob levantou as sobrancelhas em desafio.
A expressão zombeteira em seus olhos me fez mover mais rápido do
que eu teria feito de outra maneira. Saí pela porta num segundo, fechando-a
atrás de mim.
“Aonde você quer ir?” perguntei, falsamente animada.
Pela primeira vez, ele pareceu incerto de si mesmo. “É sério?”
perguntou. “Vai ficar sozinha comigo de verdade?”
“É claro,” franzi o cenho. “Por que não?”
Ele não respondeu. Encarou-me por um longo minuto com olhos
enigmáticos e desconfiados.
“O que foi?” indaguei.
“Nada,” murmurou. Ele seguiu na direção da floresta.
“Vamos por este caminho,” sugeri, gesticulando para a rua oeste.
Tivera o suficiente daquela trilha na floresta em particular por uma
eternidade.
Ele me fitou rapidamente, novamente desconfiado. Então deu de
ombros e caminhou lentamente pela calçada.
Aquela era a festa dele, então eu fiquei de boca fechada, embora
estivesse ficando mais curiosa a cada segundo.
“Tenho de dizer que eu estou surpreso,” disse ele finalmente, quando
estávamos na metade do caminho até a esquina. “A pequena sanguessuga
não lhe contou nada?”
Dei meia volta e segui de volta para casa.
“O que foi?” ele perguntou confuso, acompanhando meus passos
zangados facilmente.
Parei e fuzilei-o com o olhar. “Não vou conversar com você se
começar com insultos.”
“Insultos?” ele piscou surpreso.
“Pode se referir aos meus amigos pelos nomes apropriados.”
“Ah.” Ele ainda parecia um pouco surpreso por eu achar a palavra
ofensiva. “Então Alice, certo? Não acredito que ela manteve a boca
fechada.” Ele continuou a caminhar pela rua e eu o segui relutante.
“Eu não sei do que está falando.”
“Você nunca cansa de se fingir de estúpida?”
“Não estou fingindo,” respondi mal-humorada. “Aparentemente, sou
apenas estúpida.”
Ele me olhou cuidadosamente. “Humph,” resmungou.
“O que foi?” exigi.
“Ela realmente não lhe contou sobre mim?”
“Sobre você? O que tem você?”
Seus olhos se estreitaram enquanto perscrutava meu rosto novamente.
Então sacudiu a cabeça, resignado, e mudou de assunto.
“Eles já a fizeram escolher?”
Soube o que ele quis dizer imediatamente.
“Eu disse a você que eles não fariam isso. Você é o único obcecado
em escolher lados.”
Ele deu um sorriso rígido e estreitou os olhos. “É o que veremos.”
Abruptamente, ele se inclinou e me pegou num entusiasmado abraço
de urso que me arrancou do chão.
“Me solte!” Lutei inutilmente. Ele era forte demais.
“Por quê?” ele riu.
“Porque eu não consigo respirar!”
Ele me largou, dando um passo para trás, com um pequeno sorriso no
rosto.
“Você está drogado,” acusei, olhando para baixo embaraçada,
fingindo arrumar minha blusa.
“Apenas lembre-se de que eu a avisei,” ele sorriu afetadamente,
inclinando-se de novo—não muito—para tomar meu rosto entre as mãos
grandes.
“Hmm, Jacob...” eu protestei, a voz atingindo uma oitava, minha
mão voando infantilmente para cobrir a boca.
Ele me ignorou, inclinando a cabeça para pressionar firmemente os
lábios em minha testa por um prolongado segundo. O beijo pareceu
começar como uma brincadeira, mas seu rosto estava zangado quando se
endireitou.
“Você devia me deixar beijá-la, Bella,” disse ele, afastando-se, as
mãos soltas. “Pode gostar. É algo caloroso para variar.”
“Eu lhe disse desde o começo, Jacob.”
“Eu sei, eu sei,” suspirou. “Minha culpa. Fui eu quem soltou a
granada.”
Abaixei a cabeça, mordendo o lábio.
“Eu ainda sinto sua falta, Bella,” ele disse. “Muito. Então, justo no
momento em que estávamos começando a ficar amigos de novo, ele volta.”
Eu o fitei. “Se não fosse por Sam, teríamos sido amigos de qualquer
forma.”
“Você acha?” Jacob sorriu de repente, e era um sorriso arrogante.
“Certo, vou deixar isto nas mãos dele então.” Obviamente, o pronome não
se referia a Sam.
“O que quer dizer?”
“Eu serei seu amigo—se ele não tiver problema com isso,” ofereceu
Jacob, e então começou a rir com algo semelhante à verdadeira diversão.
Eu franzi a testa, mas não deixaria passar aquela oportunidade
inesperada. “Tudo bem.” Levantei a mão. “Amigos.”
Ele apertou minha mão com um sorriso afetado. “A parte irônica é
que—se ele deixasse você ser minha amiga,” ele bufou em escárnio,
“provavelmente daria certo. Sou melhor nisso do que os outros. Sam diz
que sou natural.” Ele fez uma cara revoltada.
“Natural no quê?” perguntei, confusa.
“Vou deixar que o sanguessuga lhe diga—quando explicar por que
você não pode ser minha amiga.” Jacob riu novamente.
Me virei automaticamente, mas ele agarrou meu ombro.
“Desculpe. Escapou. Eu quis dizer... Edward, é claro.”
“Claro. Apenas lembre-se de que fez um acordo,” falei
sombriamente.
“Vou manter meu lado da barganha, não se preocupe.” Ele riu.
“Eu não entendi a piada,” reclamei.
“Você vai entender.” Ele continuou a rir. “Mas não posso garantir
que vá achar engraçado.”
Ele começou a fazer o caminho de volta para minha casa, então
imaginei que havia dito tudo que planejava dizer.
“Como está Sam?” perguntei num tom brando.
“Não está satisfeito, como você provavelmente deve imaginar,” disse
sucinto. “Não pode esperar que fiquemos emocionados pelos vampiros
voltarem para a cidade.”
Eu o encarei, meu rosto congelado de choque.
“Ah, qual é, Bella,” ele gemeu, revirando os olhos.
Fiz uma careta e desviei o rosto, enquanto ele ria novamente. Minha
cólera se inflamou.
“Como está Quil?” eu o provoquei.
Sua expressão imediatamente se tornou ameaçadora. “Eu não o vejo
muito,” rosnou.
“Bom.”
“É só uma questão de tempo,” ele disse, a voz enojada e raivosa.
“Agora.”
“Agora o quê?”
“Agora que seus amigos estão de volta.”
Nos encaramos por um momento.
“Eu não consigo falar com você quando age dessa forma,” decidi
fortuitamente.
Eu não esperava que recuasse, mas ele o fez.
“Você está certa. Não estou sendo muito amigável, estou? Eu não
devia desperdiçar o momento—esta provavelmente será a última conversa
que teremos.”
“Eu realmente vou apreciar provar que está errado,” murmurei.
“Muito engraçado. Eu não acho que vou gostar de provar que você
está errada afinal.”
Estávamos de volta à minha casa. Jacob acompanhou-me até a
varanda, mas parou ali.
“Você acha que ele vai voltar logo?” Jacob perguntou casualmente.
“Quer dizer, Edward?”
“É... Edward.” Pareceu difícil para ele dizer o nome. Teve menos
problema com ‘Alice’.
“Mais tarde,” respondi num tom vago.
Jacob fitou o sol, brilhando através das nuvens rarefeitas pouco
características.
“Ah,” disse, claramente compreendendo bem demais. “Diga a ele um
‘oi’ por mim.”
Ele se soltou com outra longa gargalhada.
“Claro,” resmunguei.
“Gostaria muito que você estivesse errada dessa vez,” disse quando
terminou, o sorriso desaparecendo. “La Push não é divertida sem você.”
Tão rápido que entrei em choque, Jacob me abraçou novamente.
“Adeus, Bella,” murmurou, o hálito quente em meus cabelos.
Antes que eu pudesse me recuperar e responder, Jacob se virou e
seguiu adiante pela rua, as mãos enfiadas nos bolsos dos jeans. Foi só então
que me perguntei como ele chegou aqui. Não havia nenhum veículo à vista.
Mas suas pernas eram tão rápidas que eu teria de gritar para perguntar. E eu
tinha certeza de que ele encontraria Sam em algum lugar ali perto.
Parecia que tudo o que eu fazia com Jacob era dizer adeus. Suspirei.
Charlie não levantou os olhos quando passei por ele.
“Até que foi rápido,” ele notou.
“Jacob estava agindo como um fedelho,” respondi.
Ele soltou uma risada curta, os olhos na TV.
Levei minha tarefa comigo para o quarto então, determinada a me
concentrar melhor. Sabia que, se permanecesse na cozinha, eu nunca
conseguiria tirar os olhos do relógio sobre o fogão nem por um segundo.
Em meu quarto, era possível simplesmente arrancar o despertador da
tomada para resolver o problema. Tinha terminado de preencher cinco
formulários para botá-los no correio, quando o som da chuva chamou
minha atenção. Olhei pela janela. Aparentemente, o tempo bom
desaparecera. Sorri fugazmente e comecei com outro formulário. Ainda
tinha muitas horas pela frente.
Algo duro me agarrou pela cintura e arrancou-me da cama. Antes
que eu pudesse reunir fôlego para gritar, minhas costas estavam
pressionadas contra a parede. Algo duro e frio me prendia—e familiar. Um
rosnado baixo de aviso escapou da boca dele.
“Edward, qual é o problema? Quem está aqui?” sussurrei
aterrorizada. Havia tantas respostas ruins àquela pergunta. Era tarde demais.
Eu nunca devia tê-los escutado, devia ter feito Alice me transformar
imediatamente. Comecei a ofegar de medo.
Então Edward disse, “Hmm,” num tom de voz que não soava nem
um pouco preocupado. “Alarme falso.”
Respirei fundo para me acalmar. “Está bem.”
Ele se virou, afastando-se um pouco para me dar espaço. Colocou as
mãos sobre meus ombros, mas não me puxou para mais perto. Seus olhos
perscrutaram meu rosto e o nariz perfeito se franziu de leve.
“Desculpe por isso,” ele sorriu arrependido. “Reação exagerada.”
“Por quê?” indaguei.
“Num minuto,” prometeu. Ele deu um passo para trás e me olhou
com uma expressão estranha que não consegui decifrar. “Primeiro, por que
não me conta o que andou fazendo hoje?”
“Até que fui bem,” respondi sem fôlego. “Estou quase acabando.”
“Quase?” ele brincou, me percorrendo com aquele olhar estranho
novamente.
“Você voltou cedo. Não que eu esteja reclamando.” Agora que
começava a me recuperar do momento de pânico, pude sentir a onda de
felicidade brotando dentro de mim. Ele tinha voltado.
“Você fez mais alguma coisa?” continuou ele, esperançoso.
Dei de ombros. “Jacob Black passou por aqui.”
Ele assentiu, sem surpresa. “Ele escolheu bem o momento. Imagino
que tenha esperado eu sair.”
“Provavelmente,” admiti, ficando subitamente ansiosa. “Porque,
Edward, ele... bem, ele parece saber de tudo. Eu não sei por que começou a
acreditar em Billy agora—”
“Eu sei,” ele murmurou.
“O quê?” perguntei, pega com a guarda baixa.
Mas Edward se afastou, o rosto distante e meditativo.
Comecei a ficar aborrecida. “Isso é tão irritante. Você vai me contar
o que está acontecendo?”
“Talvez.” Mas ele hesitou. “Posso lhe pedir um favor primeiro?”
Eu gemi. “Tudo bem.” Fui me sentar na cama, tentando reorganizar
os papéis espalhados. “O que você quer?” Devia saber que não havia quase
nada que eu não fizesse por ele. Perguntar era quase supérfluo.
“Eu apreciaria muito se você prometesse ficar longe de Jacob Black.
Pelo bem de minha paz de espírito.”
Minha boca se abriu. Encarei-o com horrorizada descrença. “Você
está brincando,” respondi incrédula.
“Não, não estou.” Ele me encarou com olhos sombrios. “Você quase
me causou um ataque cardíaco agora a pouco—e isso não é algo fácil de se
fazer.”
Não compreendi o que ele quis dizer com aquilo, apenas que estava
fazendo exatamente o que eu tinha certeza que não faria. “Não está falando
sério. Sinceramente, você não pode estar me dizendo para escolher um
lado.”
“Escolher?” ele indagou, franzindo a testa.
“Jacob disse que eu teria de escolher, que você não me deixaria ser
amiga dele—e eu respondi que aquilo era ridículo.” Fitei-o com um olhar
suplicante—implorando para que validasse minha confiança.
Seus olhos se estreitaram de leve. “Eu realmente odeio dar razão a
Jacob Black...” começou.
“Não!” lamentei. “Não posso acreditar nisso!” Bati o pé de modo
petulante e a pilha de formulários se espalhou no chão.
Os olhos dele esfriaram. “Você pode escolher o outro lado,” lembrou.
“Não seja idiota!” rosnei.
“Eu não percebi que ele era tão importante para você,” Edward disse
em tom sombrio. Seus olhos se estreitaram de novo.
“Não pode estar com ciúmes,” gemi em descrença.
Ele fungou e franziu o nariz outra vez. “Bem, parece que ele chegou
bem perto esta tarde.”
“Não foi idéia minha.” Corei.
Ele notou aquilo. Levantou uma sobrancelha.
“Não existe absolutamente nenhuma razão para que sinta ciúmes de
algo ou alguém. Como pode não saber disso? Mas Jacob é importante para
mim. Ele é o melhor amigo humano que eu tenho. É família. Se não fosse
por Jacob...” eu parei, sacudindo a cabeça. Estar morta não seria a pior
coisa que teria me acontecido se não fosse por Jacob.
“Melhor amigo humano,” Edward repetiu em voz baixa, ausente,
olhando pela janela por um segundo antes de se voltar para mim. Ele se
sentou ao meu lado na cama, embora deixasse um pequeno espaço entre
nós, o que me surpreendeu. “Tenho que admitir, eu devo uma a ele—pelo
menos—por salvá-la de uma grande enrascada. Apesar disso, eu... prefiro
que você mantenha a distância. Porque a questão não é se eu tenho ou não
ciúmes. Você deve ter notado agora que a única coisa com a qual eu
realmente me preocupo é sua segurança.”
Eu pisquei surpresa. “Segurança? O que diabos quer dizer?”
Ele suspirou, franzindo o cenho. “Na verdade, não é um segredo meu
para contar. Por que não perguntou a Jacob o que está acontecendo?”
“Eu perguntei.”
Ele levou o dedo aos lábios, me lembrando para falar mais baixo.
“Eu fiz, outra vez,” continuei zangada, mas mais contida. “E Jacob
disse, ‘Vou deixar que o sanguessuga lhe diga, quando explicar por que
você não pode ser minha amiga’.”
Ele apenas revirou os olhos, então continuei.
“Ele também mandou dizer ‘oi’,” acrescentei, usando o mesmo tom
zombeteiro de Jacob.
Ele sacudiu a cabeça e então sorriu pesaroso. Colocou as mãos em
meus ombros, segurando-me levemente à distância, como se estivesse
estudando melhor minha expressão. “Tudo bem, então,” disse. “Vou lhe
contar tudo. De fato, explicarei cada minúsculo detalhe e responder cada
pergunta que você tiver. Mas pode fazer algo por mim primeiro?” Levantou
as sobrancelhas, quase em tom de desculpa, e franziu o nariz novamente.
“Você se importa de lavar os cabelos? Você está praticamente fedendo a
lobisomem.”

Eu tenho que admitir, ainda gosto da última linha.


SCHOLARSHIP OTK [BOLSA DE ESTUDOS]

Esta é a maior seção que cortei de Lua Nova; quase tudo é o


original do Capítulo Seis (chamado “Afirmação”, na época), mais sete
cenas curtas que continuaram a narrativa da “bolsa de estudos” ao longo
do romance, até o fim. Achei que era meio engraçado, mas meus editores
discordaram. Não era necessário, então foi sacrificado no altar da edição.

Cena Um: o dia seguinte após Bella ter ido ao cinema com Jessica.

Eu ainda sentia falta de Phoenix em raras ocasiões, quando


provocadas. Agora, por exemplo, ao seguir para o Banco Federal de Forks
para depositar meu contracheque. O que eu não daria pela conveniência de
um caixa eletrônico automático. Ou pelo menos o anonimato de um
estranho atrás do balcão.
“Boa tarde, Bella,” a mãe de Jessica me cumprimentou.
“Oi, Sra. Stanley.”
“Que bom você ter saído com Jessica na noite passada. Fazia tanto
tempo.” Ela estalou a língua para mim, sorrindo para tornar o som mais
amigável. Algo em minha expressão devia estar ausente, porque de repente
o sorriso ficou inexpressivo e ela passou nervosamente a mão pelo cabelo,
onde parou por um minuto; o cabelo dela era tão enrolado quanto o de
Jessica e espalhava-se como um arranjo rígido de caracóis.
Eu devolvi o sorriso, percebendo estar um segundo atrasada. Meu
tempo de reação estava enferrujado.
“É,” respondi no que esperava ser um tom sociável. “Tenho andado
tão ocupada, sabe. Escola... trabalho...” Lutei para pensar em algo mais a
acrescentar em minha pequena lista, mas minha mente estava em branco.
“Claro,” ela sorriu mais calorosa, provavelmente feliz por minha
resposta ter soado normal e bem ajustada de algum modo.
Subitamente me ocorreu que não devia ficar me enganando sobre a
razão por trás daquele sorriso. Quem sabe o que Jessica contou a ela sobre
a noite passada. O que quer que fosse, não era totalmente mentira. Eu era
filha da ex-mulher excêntrica de Charlie—insanidade pode ser genética.
Antiga associada das aberrações da cidade; afastei esse pensamento
rapidamente, encolhendo-me. Vítima recente de um coma ambulante.
Decidi que havia um bom argumento para minha loucura, sem nem mesmo
contar as vozes que eu ouvia agora, e imaginei se a Sra. Stanley realmente
pensava assim.
Ela deve ter visto a especulação em meus olhos. Desviou o olhar
rapidamente, para as janelas atrás de mim.
“Trabalho,” repeti, chamando sua atenção ao colocar meu cheque no
balcão. “E é por isso que estou aqui, claro.”
Ela sorriu novamente. Seu batom se partira ao longo do dia, e estava
claro que destacara os lábios para parecerem bem maiores do que eram na
realidade.
“Como estão as coisas com os Newton?” ela perguntou alegremente.
“Boas. A temporada está movimentada,” falei automaticamente,
embora ela passasse pelo estacionamento da ‘Equipamentos Olympic’
todos os dias—teria visto os carros estranhos. Ela provavelmente conhecia
a maré e o fluxo de negócios de materiais esportivos melhor do que eu.
Ela assentiu distraidamente enquanto teclava no computador à sua
frente. Meus olhos vagaram ao longo do balcão marrom escuro com suas
linhas anos setenta, as aparas laranja brilhantes. As paredes e o carpete
eram de um cinza mais neutro, mas o balcão atestava a decoração original
do prédio.
“Hmmm,” o murmúrio da Sra. Stanley foi um pouco mais alto do
que o normal. Fitei-a, apenas meio interessada, imaginando se foi uma
aranha em sua mesa que a assustou.
Mas seus olhos continuavam grudados na tela do computador. Os
dedos estavam imóveis agora, a expressão surpresa e desconfortável. Eu
esperei, mas ela não disse mais nada.
“Algo errado?” Os Newton estavam tentando passar cheques ruins?
“Não, não,” ela murmurou rapidamente, fitando-me com um
estranho brilho nos olhos. Parecia estar reprimindo algum tipo de excitação.
Lembrou-me de Jessica quando ela tinha alguma fofoca nova que estava
louca para compartilhar.
“Gostaria de ter um extrato de sua conta?” A Sra. Stanley perguntou
avidamente. Não era meu hábito—minha conta crescia tão devagar e
previsível que não era difícil fazer a matemática em minha cabeça. Mas a
mudança no tom dela me deixou curiosa. O que havia na tela do
computador que a fascinou?
“Claro,” concordei.
Ela apertou uma tecla e a impressora rapidamente cuspiu um
documento curto.
“Aqui está.” Ela puxou a folha com tanta pressa que a rasgou no
meio. “Epa, me desculpe.” Ela deu a volta no balcão, evitando meu olhar
curioso, até encontrar um rolo de fita adesiva. Colou os dois pedaços de
papel e empurrou para mim.
“Ahn, obrigada,” murmurei. Com o papel na mão, me virei e segui
para a porta da frente, dando uma rápida olhada para verificar qual era o
problema da Sra. Stanley.
Achei que minha conta devia estar com cerca de mil quinhentos e
trinta e cinco dólares. Eu estava errada, eram trinta e seis dólares e quinze
centavos ao invés de trinta e cinco.
E havia vinte mil extras também.
Congelei no lugar, tentando compreender os números. A conta estava
com vinte mil dólares a mais antes do meu depósito de hoje, que foi
acrescentado corretamente.
Por um breve minuto, considerei fechar a conta imediatamente. Mas,
suspirando, voltei ao balcão onde a Sra. Stanley esperava com um brilhante
e interessado olhar.
“Há algum tipo de erro de computador, Sra. Stanley,” falei,
devolvendo o pedaço de papel. “Devia ter apenas mil quinhentos e trinta e
seis dólares.”
Ela riu conspiradoramente. “Achei que parecia um pouco estranho.”
“Em meus sonhos, certo?” Retribui o riso, me impressionando com a
normalidade do tom.
Ela apertou as teclas vigorosamente.
“Estou vendo qual é o problema aqui... houve um depósito há três
semanas atrás de vinte mil dólares... hmm, aparentemente de outro banco.
Imagino que alguém tenha errado nos números.”
“Em quanta encrenca vou me meter se fizer uma retirada?” brinquei.
Ela riu distraidamente enquanto continuava a teclar.
“Hmmm,” disse novamente, a testa franzindo-se em três rugas
profundas. “Parece que foi uma transferência eletrônica. Isso não acontece
com freqüência. Quer saber? Vou fazer a Sra. Gerandy dar uma olhada...”
Ela parou de falar enquanto se afastava do computador, o pescoço se
virando para olhar a porta aberta atrás dela. “Charlotte, você está
ocupada?” chamou.
Não houve resposta. A Sra. Stanley pegou o comprovante e
rapidamente entrou pela porta dos fundos onde devia ser o escritório.
Fiquei olhando a porta por um minuto, mas ela não reapareceu. Virei
e olhei pela janela da frente, ausente, observando a chuva bater no vidro. A
chuva escorria em linhas imprevisíveis, às vezes inclinando-se por causa do
vento. Não tive noção do tempo enquanto esperava. Tentei deixar minha
mente vagar distraidamente, pensando em nada, mas parecia que eu não
conseguia voltar àquele estado de semi-inconsciência.
Eventualmente, escutei vozes atrás de mim novamente. Voltei-me
para ver a Sra. Stanley e a esposa do Dr. Gerandy surgindo na sala com os
mesmos sorrisos educados nos rostos.
“Desculpe sobre isso, Bella,” disse a Sra. Gerandy. “Serei capaz de
resolver isso com um telefonema bem curto. Você pode esperar se quiser.”
Ela gesticulou para uma fileira de cadeiras de madeira contra a parede.
Pareciam ter pertencido à mesa da sala de jantar de alguém.
“Tudo bem,” concordei. Caminhei até as cadeiras e sentei-me no
meio, subitamente desejando ter um livro. Não havia lido nada por um
tempo, fora da escola. E mesmo assim, quando alguma ridícula história de
amor fazia parte do currículo, eu trapaceava com anotações antigas. Era um
alívio estar trabalhando com Fazenda Animal agora. Mas havia outros
livros seguros. Thrillers políticos. Assassinatos misteriosos. Mortes
horrendas não eram problema, contanto que não houvesse enredos
românticos e melosos com as quais lidar.
Demorou tanto que comecei a ficar irritada. Estava cansada de ficar
olhando aquela tediosa sala cinzenta, sem um quadro para aliviar as
paredes nuas. Não conseguia ficar observando a Sra. Stanley enquanto ela
remexia uma pilha de papéis, parando de vez em quando para verificar algo
no computador—ela olhou para mim uma vez, e quando percebeu meu
olhar, pareceu desconfortável e derrubou um arquivo. Ouvi a voz da Sra.
Gerandy, um murmúrio apagado vindo da sala dos fundos, mas não era
claro o suficiente para me dizer algo a não ser que ela mentira a respeito do
tempo necessário para o telefonema. Demorou tempo demais até para uma
pessoa esperar com a mente vazia e, se aquilo não terminasse logo, eu não
seria capaz de evitar. Eu teria que pensar. Comecei a entrar em pânico
silenciosamente, tentando lembrar de algum tópico seguro na qual pensar.
Fui salva pelo reaparecimento da Sra. Gerandy. Sorri com gratidão
quando ela enfiou a cabeça pela porta, os cabelos grossos e grisalhos
chamando minha atenção de imediato.
“Bella, você se importaria de vir comigo?” ela perguntou, e percebi
que estava com o fone pressionado no ouvido.
“Claro,” murmurei enquanto ela desaparecia.
A Sra. Stanley teve que destrancar a porta no fim do balcão para me
deixar entrar. Seu sorriso era ausente, ela não encontrou meu olhar. Eu
tinha absoluta certeza de que ela planejava bisbilhotar.
Minha mente examinou as possibilidades concebíveis, enquanto eu
entrava no escritório. Alguém estava lavando dinheiro através de minha
conta. Ou talvez Charlie estivesse recebendo suborno e eu estraguei sua
cobertura. Mas quem teria essa quantidade de dinheiro para subornar
Charlie? Talvez Charlie estivesse envolvido com a máfia, recebendo
suborno, e usando minha conta para lavar o dinheiro. Não, eu não
conseguia imaginar Charlie na máfia. Talvez fosse Phil. Afinal, eu o
conhecia tão bem assim?
A Sra. Gerandy ainda se encontrava ao telefone, e acenou com o
queixo para a cadeira de metal dobrável junto à sua escrivaninha. Ela
rabiscava algo apressadamente nas costas de um envelope. Eu me sentei,
imaginando se Phil possuía um passado negro e se eu iria para a cadeia.
“Obrigada, sim. Bem, acho que isso é tudo. Sim, sim. Muito
obrigada por sua ajuda,” a Sra. Gerandy desperdiçou um sorriso no receptor
antes de desligar. Ela não parecia zangada ou sombria. Mais excitada e
confusa. O que me fez lembrar da Sra. Stanley no corredor. Brinquei por
um segundo com a idéia de pular através da porta e lhe dar um susto.
Mas a Sra. Gerandy falou.
“Bem, acho que tenho algumas notícias muito boas para você...
embora não consiga imaginar como ainda não foi informada sobre isso.”
Ela me encarou de forma crítica, como se estivesse esperando que eu desse
um tapa na testa e dissesse, oh ESSES vinte mil! Tinha me esquecido por
completo!
“Boas notícias?” incitei. As palavras deram a entender que aquele
erro era complicado demais para ela desemaranhar e tinha a impressão de
que eu estava mais rica do que pensamos há alguns minutos atrás.
“Bem, se você realmente não sabe... então, parabéns! Você ganhou
uma bolsa de estudos da...” olhou para as anotações rabiscadas—
“Fundação Pacific Northwest.”
“Uma bolsa de estudos?” repeti incrédula.
“Sim, não é excitante? Meu Deus, você poderá ir para qualquer
faculdade que quiser!”
Foi nesse preciso instante, enquanto ela sorria radiante com minha
boa sorte, que eu soube exatamente de onde vinha o dinheiro. Apesar da
súbita onda de fúria, suspeita, ultraje e dor, tentei falar calmamente.
“Uma bolsa de estudos que deposita vinte mil dólares em dinheiro na
minha conta,” assinalei. “Ao invés de pagar a escola. Sem meios de se
certificar de que eu usaria o dinheiro para a faculdade.”
Minha reação a confundiu. Ela pareceu ficar ofendida com minhas
palavras.
“Seria muito imprudente não usar esse dinheiro para o propósito
original, Bella querida. É uma chance única na vida.”
“É claro,” respondi mal-humorada. “E essa Fundação Pacific
Northwest mencionou exatamente por que escolheram a mim?”
Ela olhou para as anotações novamente, com uma leve ruga no rosto
devido ao meu tom.
“É muito prestigioso—eles não dão uma bolsa como essa todo ano.”
“Aposto que não.”
Ela me encarou e eu desviei o olhar rapidamente. “O banco em
Seattle que administra o fundo me colocou em contato com o homem que
cuida da distribuição das bolsas. Ele disse que essa bolsa é oferecida
baseada em mérito, sexo e localização. É destinada a estudantes do sexo
feminino em cidades do interior que não têm oportunidades disponíveis em
grandes cidades.”
Parecia que alguém achou que ele estava sendo engraçado.
“Mérito?” perguntei desaprovadoramente. “Eu tenho uma média de
3.7 na classe. Posso dar o nome de três garotas em Forks com notas
melhores do que as minhas, e uma delas é Jessica. Além disso—eu nunca
me inscrevi para essa bolsa de estudos.”
Ela estava completamente atrapalhada agora, pegando e largando a
caneta várias vezes, apertando entre os dedos o pingente que usava.
Verificou as anotações de novo.
“Ele mencionou isso...” Ela manteve os olhos no envelope, incerta do
que fazer com minha atitude. “Eles não aceitam requerimentos. Examinam
formulários de outras bolsas de estudos e escolhem estudantes que eles
acham que foram rejeitados injustamente. Pegaram seu nome de uma
inscrição que você enviou pedindo ajuda financeira baseada em mérito para
a Universidade de Washington.”
Senti os cantos de minha boca rígidos. Eu não sabia que aquele
pedido tinha sido rejeitado. Foi algo que preenchi há muito tempo atrás,
antes de...
E eu não continuei com quaisquer outras possibilidades, embora
prazos estivessem passando por mim. Eu não conseguia me concentrar no
futuro. Mas a Universidade de Washington era o único lugar que me
mantinha perto de Forks e Charlie.
“Como eles conseguem as inscrições rejeitadas?” perguntei em tom
monótono.
“Não tenho certeza, querida.” A Sra. Gerandy estava infeliz. Ela
queria excitação e estava conseguindo hostilidade. Desejei poder explicar
que a negatividade não era direcionada a ela. “Mas o administrador deixou
o número se eu tivesse qualquer pergunta—você mesma pode telefonar.
Tenho certeza de que ele irá assegurá-la de que este dinheiro é realmente
para você.”
Eu não tinha dúvida a respeito. “Eu gostaria de ter o número.”
Ela escreveu rapidamente num pedaço de papel. Fiz uma nota mental
para anonimamente doar um bloco de anotações ao banco.
O número era de longa distância. “Imagino que ele não tenha
deixado um endereço de e-mail?” perguntei cética. Não queria aumentar a
conta do telefone de Charlie.
“De fato, ele deixou,” ela sorriu, feliz por ter algo que eu parecia
querer. Inclinou-se sobre a mesa para escrever outra linha no pedaço de
papel.
“Obrigada, vou entrar em contato com ele assim que chegar em
casa.” Minha boca era uma linha rígida.
“Querida,” disse a Sra. Gerandy hesitante. “Você devia ficar feliz por
isso. É uma grande oportunidade.”
“Não vou aceitar vinte mil dólares que eu não mereci,” respondi,
tentando suprimir o tom ultrajado de minha voz.
Ela mordeu o lábio e olhou para baixo novamente. Achava que eu
era louca também. Bem, eu a faria dizer isso em voz alta.
“O que foi?” exigi.
“Bella...” ela se deteve e eu esperei com os dentes cerrados.
“Substancialmente são mais do que vinte mil dólares.”
“Como é?” Eu engasguei. “Tem mais?”
“Vinte mil é apenas o pagamento inicial, de fato. De agora em diante,
você receberá cinco mil dólares por mês até o fim de sua carreira
universitária. Se você se matricular para uma graduação, a bolsa de estudos
vai continuar pagando!” Ela ficou excitada novamente enquanto me
contava.
Não consegui falar a princípio, estava lívida demais. Cinco mil
dólares por mês durante um espaço de tempo ilimitado. Eu quis bater em
algo.
“Como?” consegui continuar.
“Não sei o que quer dizer.”
“Como eu vou conseguir cinco mil dólares por mês?”
“Será depositado em sua conta aqui,” ela respondeu perplexa.
Houve um breve segundo de silêncio.
“Vou fechar esta conta agora,” falei em tom vazio.
Levei quinze minutos para convencê-la de que estava falando sério.
Ela possuía uma infinita provisão de razões do porque aquilo era uma má
idéia. Eu argumentei acaloradamente até que finalmente me ocorreu que ela
estava preocupada sobre me dar vinte mil dólares. Eles teriam tudo aquilo
em mãos?
“Olhe, Sra. Gerandy,” assegurei. “Eu só quero retirar meus mil e
quinhentos. Eu realmente apreciaria se depositasse o resto do dinheiro de
volta ao lugar de onde veio. Vou me entender com esse—” verifiquei o
pedaço de papel—“Sr. Isaac Randall. Foi realmente um engano.”
Aquilo pareceu relaxá-la.
Vinte minutos mais tarde, com um rolo de mil e quinhentos, uma
nota de vinte dólares, outra de dez, uma de cinco, uma de um e quinze
centavos em meu bolso, eu escapei do banco com alívio. A Sra. Stanley e a
Sra. Gerandy ficaram lado a lado no balcão, me encarando de olhos
arregalados.

***

Cena Dois: naquela mesma noite, após comprar as motos e visitar


Jacob pela primeira vez...

Fechei a porta e tirei o dinheiro da faculdade do bolso. Parecia pouco,


enrolado na palma de minha mão. Enfiei o dinheiro num pé de meia
extraviado e guardei-o no fundo de minha gaveta de roupas íntimas.
Provavelmente não era o local mais original para esconder, mas me
preocuparia com algo criativo mais tarde.
No outro bolso estava o pedaço de papel amassado com o número do
telefone e endereço eletrônico de Isaac Randall. Procurei e larguei sobre o
teclado do computador, então liguei a máquina, tamborilando com os pés
enquanto a tela lentamente brilhava para a vida.
Quando fiquei conectada, abri minha conta de e-mail grátis. Adiei,
levando tempo para apagar a montanha de propagandas que se acumulara
durante os poucos dias desde que escrevi para Renee. Logo me livrei de
todo o trabalho e comecei a escrever uma nova mensagem.
O endereço eletrônico era para “irandall”, então presumi que iria
diretamente para o homem que eu queria.
Caro Sr. Randall, escrevi.
Espero que se lembre da conversa que teve esta tarde com a Sra.
Gerandy do Banco Federal de Forks. Meu nome é Isabella Swan e,
aparentemente, o senhor tem a impressão de que fui premiada com uma
muito generosa bolsa de estudos da Fundação Pacific Northwest.
Sinto muito, mas não posso aceitar esta bolsa. Pedi para que o
dinheiro que já recebi fosse enviado de volta ao local de origem e fechei
minha conta no Banco Federal de Forks. Por favor, conceda a bolsa para
um candidato diferente.
Obrigada, I. Swan.
Demorou um pouco para soar do jeito certo—formal e, sem dúvida,
sucinto. Li duas vezes antes de enviá-la. Eu não tinha certeza que tipo de
instruções esse Sr. Randall havia recebido a respeito dessa bolsa de estudos
falsa, mas não vi quaisquer lapsos em minha resposta.

***

Cena Três: algumas semanas mais tarde, pouco antes do “encontro”


de Bella e Jacob com as motocicletas...

Quando voltei, peguei a correspondência no caminho. Verifiquei


rapidamente as contas e malas diretas, até chegar à carta no fim da pilha.
Era um envelope comercial normal, endereçado a mim—meu nome
escrito à mão, o que era incomum. Olhei o endereço para devolução com
interesse.
Interesse que rapidamente se transformou em náusea nervosa. A
carta era da Fundação Pacific Northwest, Departamento de Concessão de
Bolsas de Estudo. Não havia endereço da rua sob o nome.
Provavelmente era apenas um reconhecimento formal de minha
recusa, disse a mim mesma. Não havia razão para ficar nervosa. Nenhuma
razão afinal, exceto pelo pequeno detalhe de que pensar a respeito daquilo a
fundo poderia me enviar diretamente numa espiral para o mundo dos
zumbis. Só isso.
Joguei o resto da correspondência sobre a mesa para Charlie, juntei
meus livros no chão da sala e corri para cima. Uma vez dentro do quarto,
tranquei a porta e abri o envelope. Tinha que me lembrar de permanecer
zangada. Raiva era a chave.

Cara Srta. Swan,


Permita-me formalmente parabenizá-la por ter sido escolhida para
receber a prestigiada bolsa de estudos J. Nicholls da Fundação Pacific
Northwest. Esta bolsa de estudos é raramente concedida e deve sentir-se
orgulhosa em saber que foi escolhida unanimemente pelo Comitê de
Concessão para esta honra.
Houve algumas pequenas dificuldades quanto ao pagamento de
quotas da bolsa, mas não se preocupe, por favor. Eu me responsabilizei
pessoalmente para que tenha a menor inconveniência possível. Note que
um cheque ao portador, no valor de vinte e cinco mil dólares, foi enviado
anexo; valor inicial incluso ao primeiro mês de concessão.
Mais uma vez, felicitações pela efetivação. Por favor, aceite os
melhores votos de toda a Fundação Pacific Northwest em prol de sua
futura carreira acadêmica.
Sinceramente,
I. Randall.

Raiva não era problema.


Olhei dentro do envelope e, com certeza, havia um cheque.
“Quem são essas pessoas?” resmunguei entre dentes, amassando a
carta numa bola com a mão.
Marchei furiosamente até minha lata de lixo para procurar o número
do telefone de I. Randall. Pouco importava se era uma ligação de longa
distância—aquela conversa seria realmente bem curta.
“Ah, merda,” sibilei.
O cesto estava vazio. Charlie havia jogado o lixo fora.
Joguei o envelope com o cheque sobre a cama e peguei a carta
novamente. Era em papel timbrado, com Departamento de Concessão de
Bolsas de Estudo Pacific Northwest escrito em letras verde-escuras na parte
de cima, mas não havia informação, nenhum endereço, nenhum número de
telefone.
“Droga.”
Sentei-me na beirada da cama e tentei pensar com clareza.
Obviamente, eles iam me ignorar. Eu havia deixado evidentes meus
sentimentos, então isso não era um mal-entendido. Provavelmente não faria
diferença se eu telefonasse.
Então havia apenas uma coisa a se fazer.
Amassei a carta, o envelope e o cheque também, e desci as escadas.
Charlie estava na sala de estar, com a TV ligada em volume alto.
Fui até a pia da cozinha, e joguei as bolas de papel ali. Então remexi
as gavetas de quinquilharias até encontrar uma caixa de fósforos. Acendi
um e levei-o cuidadosamente sobre os pedaços de papel. Acendi outro
fósforo e fiz o mesmo. Quase acendi um terceiro, mas o papel queimou
alegremente, então não houve necessidade.
“Bella?” Charlie chamou, acima do som alto da TV.
Abri a torneira rapidamente, com uma sensação de satisfação
enquanto a força da água extinguia as chamas, transformando-as num
simples monte de cinzas.
“Sim, pai?” Joguei os fósforos de volta na gaveta e fechei-a
silenciosamente.
“Você está sentindo cheiro de fumaça?”
“Não, pai.”
“Hmph.”
Enxagüei a pia, me certificando de que as cinzas descessem todas
pelo ralo, e liguei o triturador de lixo como garantia.
Voltei para o quarto, sentindo-me um pouco apaziguada. Eles
poderiam me mandar todos os cheques que quisessem, pensei
sombriamente. Sempre conseguiria mais fósforos quando acabassem.

***

Cena Quatro: durante o período em que Jacob estava a ignorando...

Havia um pacote da FedEx na entrada da porta. Peguei-o curiosa,


esperando um endereço de devolução da Flórida, mas fora enviada de
Seattle. Não havia remetente especificado na caixa.
Estava endereçada a mim, não Charlie, então levei a caixa até a mesa
e puxei a lingüeta do papelão para abrir.
Assim que vi o logotipo verde-escuro da Fundação Pacific Northwest,
senti como se a virose gástrica tivesse voltado. Cai sobre a cadeira mais
próxima sem olhar para a carta, a raiva crescendo lentamente.
Não conseguia nem me forçar a ler, embora fosse uma carta curta.
Larguei-a sobre a mesa, e olhei para a caixa relutantemente, para verificar o
que havia dentro. Era um estufado envelope pardo. Estava com medo de
abrir, mas zangada o suficiente para mesmo assim puxá-la.
Minha boca era uma linha rígida enquanto eu rasgava o papel sem
me incomodar com a lingüeta. Já tinha o suficiente com que lidar agora.
Não precisava da lembrança da irritação.
Fiquei chocada, mas não surpresa. O que mais seria além daquilo—
três grossos maços de notas, firmemente presos com elásticos de borracha.
Eu não precisava olhar para as especificações. Sabia exatamente quanto
dinheiro eles estavam tentando forçar em minhas mãos. Trinta mil dólares.
Peguei o envelope cuidadosamente ao me levantar, virando-me para
jogá-lo na pia. Os palitos de fósforo estavam na primeira gaveta, bem onde
os havia deixado na última vez. Peguei um e acendi.
Queimou quase até a ponta de meus dedos enquanto eu olhava para o
odioso envelope. Não conseguia fazer meus dedos largarem. Apaguei a
chama antes que me queimasse, meu rosto contorcendo-se numa careta
desgostosa.
Peguei a carta sobre a mesa e amassei-a numa bola, jogando-a na
outra pia. Acendi outro fósforo e atirei-o sobre o papel, observando com
sombria satisfação enquanto se consumia em chamas. Um ensaio. Alcancei
outro fósforo. Novamente, segurei-o, queimando sobre o envelope.
Novamente, quase queimei os dedos antes de jogá-lo nas cinzas da carta.
Eu não conseguiria simplesmente queimar trinta mil dólares em dinheiro.
Então o que eu faria com aquilo? Não possuía um endereço para a
qual devolver—eu tinha certeza de que a companhia sequer existia.
Então me ocorreu que havia um endereço.
Enfiei o dinheiro de volta na caixa da FedEx, arrancando o endereço
de destinatário para que, caso alguém a encontrasse, fosse impossível
conectá-la a mim e segui para a picape, resmungando incoerentemente pelo
caminho todo. Prometi a mim mesma que faria algo especialmente
imprudente com a moto esta semana. Faria saltos acrobáticos se fosse
preciso.
Detestei cada quilômetro ao dirigir através da floresta escura,
cerrando os dentes até meu maxilar doer. Os pesadelos seriam ferozes esta
noite—eu já antevia aquilo. As árvores se seguiram entre as samambaias e
eu dirigi furiosa por elas, deixando uma linha dupla de ramos esmagados
para trás. Parei diante dos degraus em ponto morto.
A casa parecia exatamente a mesma, dolorosamente vazia, morta. Eu
sabia que estava projetando meus próprios sentimentos em sua aparência,
mas aquilo não mudava a forma como parecia para mim. Cuidadosamente
evitando olhar através das janelas, eu caminhei até a porta da frente.
Desejei desesperadamente ser uma zumbi por um minuto, mas o
entorpecimento há muito desaparecera.
Deixei a caixa cuidadosamente junto à porta da casa abandonada e
me virei para partir.
Parei no topo do degrau. Eu não podia simplesmente deixar uma
caixa de dinheiro na frente da porta. Aquilo era tão ruim quanto queimá-lo.
Com um suspiro, mantendo os olhos baixos, me virei e peguei a
caixa ofensiva. Talvez pudesse apenas doá-lo anonimamente para uma boa
causa. Uma caridade para pessoas com doenças do sangue ou algo assim.
Mas sacudi a cabeça enquanto voltava para a picape. Era o dinheiro
dele e, maldição, o manteria. Se fosse roubado da varanda, seria culpa dele,
não minha.
Minha janela estava aberta e, ao invés de sair, eu simplesmente
arremessei a caixa com toda a força na direção da porta.
Eu nunca tive uma boa pontaria. A caixa atravessou ruidosamente a
janela da frente, deixando um buraco tão grande que parecia que havia
jogado uma máquina de lavar.
“Ah, merda!” arfei em voz alta, cobrindo o rosto com as mãos.
Eu devia saber que, não importa o que faça, apenas pioraria as coisas.
Por sorte, a raiva então se reafirmou. Isto era culpa dele, recordei a
mim mesma. Estava apenas devolvendo seus pertences. Era problema dele,
transformar aquilo numa tarefa. Além disso, o som do vidro se quebrando
até que foi legal—me fez sentir um pouco melhor de um modo perverso.
Eu realmente não me convenci, mas coloquei o motor para funcionar
e dirigi a picape para longe apesar de tudo. Isso era o mais perto que eu
conseguiria de devolver o dinheiro a quem pertencia. E agora eu possuía
uma caixa de correspondência conveniente para a entrega do mês seguinte.
Era o melhor que podia fazer.
Repensei uma centena de vezes após chegar em casa. Verifiquei o
catálogo telefônico procurando por vidraceiros, mas não havia estranhos
para quem pedir ajuda. Como eu explicaria o endereço? Charlie teria que
me prender por vandalismo?

***

Cena Cinco: na primeira noite em que Alice volta após ter visto
Bella “cometer suicídio”...

“Jasper não quis vir com você?”


“Ele não aprova que eu interfira.”
Eu funguei. “Você não é a única.”
Ela enrijeceu e então relaxou. “Isso tem algo a ver com o buraco na
janela da frente de minha casa e a caixa cheia de centenas de dólares no
chão da sala de estar?”
“Tem,” respondi zangada. “Desculpe pela janela. Foi um acidente.”
“Com você normalmente é assim. O que ele fez?”
“Algo chamado Fundação Pacific Northwest me premiou com uma
muito estranha e persistente bolsa de estudos. Não foi exatamente um
disfarce. Quero dizer, não consigo imaginar ele querer que eu soubesse que
era ele, mas espero que não ache que sou assim tão estúpida.”
“Ora, aquele grande trapaceiro,” Alice murmurou.
“Exatamente.”
“E ele me disse para não olhar.” Ela sacudiu a cabeça, irritada.

***

Cena Seis: com Edward na noite após a volta da Itália, no quarto de


Bella...

“Existe alguma razão para o perigo não conseguir resistir a você


mais do que eu?”
“O perigo não tenta,” murmurei.
“É claro, parece que você andou ativamente procurando pelo perigo.
No que estava pensando, Bella? Vi na cabeça de Charlie o número de vezes
em que você esteve na sala de emergências recentemente. Eu mencionei
que estou furioso com você?”
A voz calma soou mais ferida do que zangada.
“Por quê? Isso não é da sua conta,” falei embaraçada.
“De fato, eu recordo especificamente de você prometendo não fazer
nada imprudente.”
Minha réplica foi rápida. “E você não prometeu algo sobre não
interferir?”
“Na época em que você estava cruzando a linha,” ele classificou
cuidadosamente, “eu estava mantendo minha parte do trato.”
“Ah, é mesmo? Três palavras, Edward: Fundação. Pacific.
Northwest.”
Ele levantou a cabeça para olhar para mim; sua expressão era de
completa confusão e inocência—inocência demais. Era uma confissão
mortal. “Isso devia significar algo para mim?”
“É simplesmente insultante,” reclamei. “Quanto você acha que sou
estúpida?”
“Não tenho idéia do que está falando,” disse ele, os olhos enormes.
“Que seja,” resmunguei.

***

Cena Sete, a conclusão dessa trama: nessa mesma noite/manhã,


quando eles chegam à casa dos Cullen para a votação...

Subitamente, a luz da varanda se acendeu e eu pude ver Esme parada


na porta. Os cabelos ondulados cor caramelo estavam puxados para trás, e
ela tinha uma espécie de pá na mão.
“Todos estão em casa?” perguntei esperançosamente enquanto subia
as escadas.
“Sim, estão.” Enquanto ela falava, as janelas abruptamente se
encheram de luz. Olhei através da mais próxima para ver quem havia nos
notado, mas a vasilha de massa cinzenta sobre o banco em frente chamou
minha atenção. Vi a perfeição lisa do vidro e percebi o que Esme estivera
fazendo na varanda com uma pá.
“Oh, céus, Esme! Eu realmente sinto muito sobre a janela! Eu ia—”
“Não se preocupe com isso,” ela interrompeu com uma risada. “Alice
me contou a história e tenho que dizer, eu não a teria culpado se tivesse
feito de propósito.” Ela encarou o filho que, por sua vez, me encarou.
Eu levantei uma sobrancelha. Ele desviou os olhos e murmurou algo
ininteligível a respeito de cavalos dados.

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