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Decrescimento Sustentável: é possível?

Ou
estaremos demasiado apegados ao
consumismo?

ECOLOGIA POLÍTICA, DESIGUALDADES E DECRESCIMENTO

Catarina Lemos – Nº94092 | Licenciatura em Antropologia - Turma LAB 1 – UC de


Poderes: o Económico e o Político | 19 dezembro 2020
Introdução
Neste trabalho será abordado o tema da ecologia política, desigualdades e
decrescimento. Para tal, irei partir da leitura do livro de Serge Latouche “Pequeno
tratado do decrescimento sereno”, e daí esclarecerei alguns pontos propostos pelo
professor: O que entende Latouche por decrescimento; que argumentos usa o autor para
defender políticas de decrescimento como forma de reduzir desigualdades, assegurar a
sustentabilidade do planeta e promover a felicidade.

E usarei os capítulos 5, 6 e 8 do livro “Antropología Economica” de Dolores D’Argemir


Comas, para esclarecer a noção de Ecologia Política.

Para Começar, decidi dividir o livro de Latouche por capítulos, resumindo-os


brevemente. Latouche faz um convite a pensar e estimular a sociedade a agir de forma
igualitária e equilibrada no que toca ao ambiente, causando uma desvantagem à
sociedade de consumo, cujo papel e consequências pontua, com inserções de autores das
mais diversas áreas, convergindo todas ao pensamento de decrescimento.

No capítulo I, Latouche fala-nos do território do decrescimento (que é, aliás, o título do


capítulo). Ele apresenta várias perceções e pesquisas de diferentes pensadores de
economia, sociologia, filosofia e ecologia. Aponta também as marcas que a sociedade
de consumo causa hoje em dia e com algum entusiasmo agrega-lhe o desafio do
decrescimento.

Neste primeiro capítulo, o autor pergunta-se de onde viemos e para onde vamos. No
entanto, tudo o que nos vai na mente no dia a dia é o que vamos comer ao jantar,
mostrando a ideia de que o ser humano é imediatista e plano. Latouche descreve o
decrescimento como sendo algo cuja principal meta é enfatizar o abandono do
crescimento ilimitado, mas que, no entanto, alerta para a possível catástrofe na taxa de
crescimento negativo. Não nos podemos esquecer que, se numa sociedade trabalhista
não houver trabalho, então numa sociedade de crescimento não vai haver crescimento
(p.5).

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No subcapítulo “A batalha das palavras e das ideias”, Latouche faz notar que para
muitas pessoas o decrescimento é sinónimo de desenvolvimento sustentável, isto porque
o desenvolvimento sustentável está a par da ideia de “conservar lucros e evitar a
mudança de hábitos quase sem alterar o rumo” (p.10). Nesta perspetiva, o autor
reconhece que as diferenças entre desenvolvimento e crescimento devem ser
colonizadas, a fim de descolonizar a ideologia atual.

Historicamente falando, o decrescimento remonta à crítica culturalizada da economia e


da ecologia, mas foi no fim dos anos 1960 que o decrescimento tomou corpo, devido ao
facto de nos questionarmos várias vezes sobre a sociedade de consumo e as suas bases
imaginárias, o progresso e a ciência. Latouche afirma ainda que é necessário corrigir a
tempo as disfunções, compreendendo e controlando o meio em que vivemos, visto que
apenas o crescimento poderá dar-se ao luxo do decrescimento.

Não se trata de voltar à Idade da Pedra, tampouco se trata de uma inversão mecânica do
crescimento. Procura-se no decrescimento uma sociedade autónoma, certamente mais
sóbria e sobretudo mais equilibrada, porque a situação do planeta é uma situação
delicada, como todos sabemos. O autor afirma igualmente que o crescimento económico
excessivo fez com que nós passássemos a viver do crédito, sendo até necessário outros
planetas pagarem a dívida da insustentabilidade. A sociedade de consumo segue este
caminho (da insustentabilidade). Dito isto, a solução encontrada por Latouche seria a
redução da população do planeta. A pergunta que faço é: Seria esta uma forma viável de
restaurar a equação da sustentabilidade? A resposta é certamente que não. É um facto
que um planeta finito, como a Terra, é incompatível com uma população infinita (p.32).
Assim, a proposta de redução da população do planeta é falsa, sendo o mais correto a
administração dos recursos disponíveis com equidade. Latouche diz ser este o desafio
do decrescimento.

Avançando pelo livro, no capítulo II, o autor explica que o processo de decrescimento
possui etapas que passam por ser um círculo de transformação, ou seja, passam por oito
erros, oito mudanças interdependentes que se reforçam mutuamente. Ele demonstra
estes oito erros como sendo uma receita de sucesso para alcançar o equilíbrio
económico e ambiental, utilizando premissas sendo essas: fazer de outra forma o que
tem vindo a ser feito, aprender a realidade, mudar valores, gerir os limites da natureza,
pensar e agir localmente, recuperar a ancoragem territorial, diminuir e limitar o

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consumo, repetir o uso para aumentar a vida útil, entre outras. Depois de reconhecer
esses oito erros necessários para o decrescimento, o autor evidencia três erros
primordiais, a reavaliação, a relocalização e a redução, garantindo as condições
necessárias para a utopia concreta do decrescimento.

Aperfeiçoando o projeto do “Tratado de Decrescimento Sereno”, Latouche traz o


decrescimento sob a visão local, voltando-se à velha fórmula dos ecologistas: pensar
globalmente e agir localmente. Assim como Michael Singleton em 1954, “o universal é
o local menos os muros” (p.63). Deste modo, a inovação política com estratégia
ecológica para o território e a autonomia económica local avança, surgindo uma
substituição da antiga Organização Mundial do Comércio (OMC), para a Organização
Mundial pela Localização (OML) que tem como slogan “Proteger o local globalmente”
(p.71). O autor, sendo defensor da necessidade de mudança mo que diz respeito ao
modelo económico do crescimento pelo crescimento, estimula o leitor a refletir sobre
essa temática que está muito presente nos dias de hoje, e convida-nos a questionar essa
lógica a partir de outra lógica, a do decrescimento, que Latouche acredita ser possível de
concretizar desde que haja condições necessárias para a sua implementação, além de
apontar os mecanismos par a sua concretização.

O decrescimento tem a sua origem nos países do hemisfério sul, mais precisamente na
África, onde o decrescimento da pegada económica e o PIB não são desejáveis.
Latouche, perante estes factos, tentar aplicar o decrescimento no hemisfério descrito
acima é provocar um movimento em espiral para se colocar na órbita do círculo virtuoso
dos oito erros, sejam esses: reavaliar, redistribuir, reestruturar, relocalizar, reduzir,
reutilizar e reciclar.

É importante salientar que o decrescimento não deve ser entendido como um possível
retrocesso da humanidade, mas sim como uma mudança no estilo de vida da sociedade,
de modo a transcender um simples reparo do sistema que vigora. Posto isto, o
decrescimento implica compreender uma forma de produção e consumo excessivos
presentes no quotidiano da sociedade atual. Assim, Latouche afirma que o projeto do
decrescimento tem uma visão revolucionária, visto que se trata de uma mudança de
ordem cultural, bem como das estruturas jurídicas e das relações de produção, tendo em
vista uma melhor qualidade de vida para a sociedade e para a sobrevivência do planeta.
Tratando-se de um projeto político, obedece mais à ética do que à convicção (p.92).

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Chegando ao final do livro, percebemos que o decrescimento se situa numa conceção de
uma ecologia profunda, que evoca a inclusão do componente ecológico nos projetos
políticos nas suas mais variadas dimensões, seja económica, social ou cultural, uma vez
que o decrescimento é compreendido por Latouche como “filosofia fundadora de um
projeto de sociedade autónoma.” Numa sociedade na qual a tendência industrial possui
uma certa força, o decrescimento apresenta-se como um fator adverso ao crescimento
vigente e ao sistema capitalista que impera de forma global. No entanto, apesar de toda
a força que o capitalismo possui e diante dos desequilíbrios enfrentados pela sociedade
contemporânea, o decrescimento é uma resposta positiva no que toca à mudança de
postura da sociedade e das relações com o planeta. “Pequeno tratado do decrescimento
sereno” é um livro que nos leva a refletir a dualidade crescimento e decrescimento, e
estimula a uma discussão profunda.

Neste livro, Serge Latouche apresenta-nos o conceito de decrescimento. Para este


economista, a noção de decrescimento baseia-se num primeiro momento, que é a crítica
antropológica da modernidade, nos anos 1970, quando a mensagem de Ivan Illich era a
de que viveríamos melhor de outra forma, ou seja, seria desejável sair do sistema
capitalista. O segundo momento da teoria do decrescimento está ligado à ecologia e ao
relatório do Clube de Roma, que torna imperativo sair do sistema capitalista. Latouche
apresenta diversas razões para esta saída:

- O funcionamento do sistema económico atual depende essencialmente de recursos não


renováveis e, portanto, não se pode perpetuar. As matérias-primas são limitadas,
sobretudo quanto a fontes de energia, o que contradiz o princípio de crescimento
ilimitado do PIB;

- Não há evidencias de que existe a possibilidade de separar o crescimento económico


do aumento do seu impacto ambiental;

- A riqueza produzida pelos sistemas económicos não consiste apenas de bens e


serviços. Há outras formas de criar riqueza social, tais como promover a saúde dos
ecossistemas, a qualidade da justiça e das relações entre os membros de uma sociedade,
o grau de igualdade e o caráter democrático das instituições. O crescimento da riqueza
material, medido somente por indicadores monetários pode ocorrer, prejudicando estas
outras formas de riqueza;

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- E por fim as sociedades ocidentais, que são dependentes do consumo excessivo, em
geral não percebem a progressiva perda de riquezas, como a qualidade de vida.

E para o autor, é extremamente importante defender a existência de políticas de


decrescimento, como forma de reduzir desigualdades, assegurar a sustentabilidade do
planeta e promover a felicidade. Assim, ele aposta num decrescimento sustentável, ou
seja, um decrescimento onde haja uma redução dos níveis de produção e consumo,
aumentando o bem-estar de todos e melhorando as condições ecológicas e a igualdade
no planeta Terra.

Para Latouche, o PIB é uma medida somente parcial da riqueza, como já referi, e se se
pretende restabelecer toda uma variedade de riquezas possíveis, é preciso deixar de
utilizar o PIB como orientação. Para isso, estes teóricos defendem a utilização de outros
indicadores, tais como IDH, a “pegada ecológica” e o Índice de Saíde Social. Esta é
uma visão do futuro onde as sociedades possam viver dentro das suas possibilidades
ecológicas, com economias abertas, mas localizadas, em que os recursos sejam
distribuídos de uma forma mais equilibrada, através de novas formas de instituições
democráticas. Desta forma, as sociedades já não serão obrigadas a “crescer ou morrer”,
e a acumulação de bens materiais deixará de ser predominante no imaginário cultural.

No seu livro, Latouche refere algumas fezes o conceito de ecologia política. Ecologia
política é o estudo da relação (harmoniosa ou não) entre os grupos sociais e o
ecossistema em que estão inseridos. Alguns desses grupos encontram-se com bastantes
recursos, enquanto outros sofrem com a poluição. Alguns cientistas acreditam que a
noção de ecologia política se insere no ramo da biologia, enquanto outros consideram
que ecologia política é uma interdisciplina com a geopolítica. No entanto, esta disciplina
refere-se à influência da sociedade, do estado, e das empresas (nomeadamente as
transacionais) na criação de problemas ambientais e também na conceção e
implementação de políticas ambientais. Brevemente, a ecologia política propõe-se a
contribuir para:

- Entender que os problemas ambientais não afetam todos igualmente, sendo a


população pobre os mais afetados;

- Entender que a riqueza dos ricos depende maioritariamente do apodrecimento do meio


ambiente;

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- Entender as decisões das comunidades sobre o ambiente natural, considerando o seu
contexto político, a pressão económica e as regras da sociedade;

- Compreender como é que as relações desiguais entre sociedades afetam o ambiente;

- E finalmente compreender como é que a desigualdade social afeta o meio ambiente.

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Referências
Latouche, Serge, 2011, Pequeno Tratado do Decrescimento Sereno, Ed.70, Lisboa

Comas D’Argemir, Dolores 1998 Antropología Económica, Barcelona: Ariel (cap. 5, 6


e 8)

Wikipédia. Decrescimento (economia). Consultado em 18 dezembro 2020. Disponível


em https://pt.wikipedia.org/wiki/Decrescimento_(economia)

Instituto Humanitas Unisinos. Serge Latouche, o precursor da teoria do decrescimento,


defende uma sociedade que produza menos e consuma menos. Consultado a 18
dezembro 2020. Disponível em http://www.ihu.unisinos.br/171-noticias/noticias-
2013/523299-serge-latouche-o-precursor-da-teoria-do-decrescimento-defende-uma-
sociedade-que-produza-menos-e-consuma-menos

CIDAC. Serge Latouche - Decrescimento: uma proposta polémica? Consultado a 18


dezembro 2020. Disponível em https://www.cidac.pt/index.php/o-que-fazemos/centro-
de-recursos/documentacao/dossies-de-informacao/decrescimento-uma-proposta-
polemica/

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