1 Durkheim, Émile. Educação e sociologia. 10ª ed. Trad. de Lourenço Filho. São 6 Durand, Olga C. da S.: «Jovens da Ilha de Santa Catarina: sociabilidade,
Paulo, Melhoramentos, 1975. socialização». Tese Doutorado. São Paulo: Faculdade de Educação da USP.2000.
2 Berger, Peter (1999): Perspectivas sociológicas: uma visão humanística.
7 Simmel, Georg (1983): «Sociabilidade: um exemplo de sociologia pura ou formal».
Petrópolis: Vozes. Evaristo Morais Filho (org.): Simmel. São Paulo: Ática
3 Berger, Luckmann T. A construção social da realidade. Petrópolis, 1985.
8 Silva, A. I. Juventude: Socialização e Sociabilidade. Ver. Ciências da Educação. Ano
4 Freire, Paulo: Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
I. Vol.02. n.01. Abr/Jun. 2014.
São Paulo: Paz e Terra.1999. 9 Peralva, Angelina. O jovem como modelo cultural. Ver. Brasileira de Educação,
5 Charlot, Bernard: Da relação com o saber: elementos para uma teoria. Porto
São Paulo, ANPEd, n.°5/6, 1997.
Alegre.2000. 10 Melluci, Alberto. O jogo do eu: A mudança de si mesmo na sociedade
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mais presa a critérios rígidos, mas sim como parte de um socialização das futuras gerações. Deve provocar o
processo de crescimento mais totalizante, que ganha desenvolvimento de conhecimentos, ideias, atitudes e
contornos específicos no conjunto das experiências comportamentos que permitam a incorporação dos indivíduos
vivenciadas pelos indivíduos no seu contexto social. no mundo civil, no âmbito da liberdade de consumo, de escolha
Significa não entender a juventude como uma etapa com e participação política, da liberdade e responsabilidade da vida
um fim predeterminado, muito menos como um momento familiar. Por outro lado, deve desenvolver características bem
de preparação que será superado com o chegar da vida diferentes dessas, para a incorporação submissa e disciplinada
adulta. da maioria, no mundo do trabalho assalariado.
Nessa direção, Melluci (1992)10 nos propõe uma outra Assim, a escola transmite e consolida o individualismo, a
forma de compreender a adolescência e a juventude. Para ele, competitividade, a falta de solidariedade. Assume-se a ideia de
existe uma sequência temporal no curso da vida, cuja que a escola é igual para todos e de que, portanto, cada um
maturação biológica faz emergir determinadas chega onde suas capacidades e esforços pessoais lhes
potencialidades. Nesse sentido, é possível marcar um início da permitem. Impõe-se a ideologia aparentemente contraditória
juventude, quando fisicamente se adquire a capacidade de do individualismo e do conformismo social. A estrutura social
procriar, quando a pessoa dá sinais de ter necessidade de aparentemente aberta para a mobilidade individual, oculta a
menos proteção por parte da família, quando começa a determinação social do desenvolvimento do sujeito como
assumir responsabilidades, a buscar a independência e a dar consequência das profundas diferenças de origem que se
provas de autossuficiência, dentre outros sinais corporais e refletem nas formas de conhecer, sentir, esperar e atuar dos
psicológicos. indivíduos. Este processo vai minando progressivamente, as
Mas, para o autor, uma sequência temporal não implica possibilidades dos mais desfavorecidos social e
necessariamente uma evolução linear, na qual ocorra uma economicamente.
complexidade crescente, com a substituição das fases
primitivas pelas fases mais maduras, de tal forma a cancelar as E) Os mecanismo de socialização na escola
experiências precedentes. Melluci, ao contrário, defende a A escola tem sido descrita como um processo de inculcação
ideia de que os fenômenos evolutivos presentes nas mudanças e doutrinamento ideológico, feito através da transmissão de
dos ciclos vitais são fatos que dizem respeito a cada momento ideias e mensagens, seleção e organização de conteúdos de
da existência, fazendo das mudanças ou transformações uma aprendizagem. Com a sociologia da educação e a psicologia
característica estável da vida do indivíduo. social ampliou-se o foco dessa análise, levando-nos a
Assim, a adolescência não pode ser entendida como um compreender que os processos de socialização que
tempo que termina, como a fase da crise ou de trânsito entre a ocorrem na escola, acontecem também como
infância e a vida adulta, entendida como a última meta da consequência das práticas sociais que se estabelecem.
maturidade. Mas representa o momento do início da Os alunos assimilam ideias e conhecimentos que a eles
juventude, um momento cujo núcleo central é constituído de são transmitidos, mas também e principalmente os
mudanças do corpo, dos afetos, das referências sociais e aprendem como consequência das diversas interações
relacionais. Um momento no qual se vive de forma mais sociais que ocorrem na escola e na aula.
intensa um conjunto de transformações que vão estar Além disso, o conteúdo oficial do currículo, não cala nem
presentes, de algum modo, ao longo da vida. estimula os interesses e preocupações vitais da criança e do
adolescente. Eles aprendem esse conteúdo para passar nos
D) Processo de socialização da escola exames e esquecer depois, enquanto que a aprendizagem dos
Dentro deste complexo e dialético processo de socialização mecanismos, estratégias, normas e valores de interação social
que a escola cumpre nas sociedades contemporâneas é que lhes possibilitam o êxito pessoal na vida acadêmica e
necessário que compreendamos os objetivos de tal processo, pessoal do grupo, estendem seu valor e utilidade além do
os mecanismos e procedimentos usados para sua realização. campo da escola. Esta aprendizagem os induz a uma forma de
Todos os autores e correntes da sociologia da ser, pensar e agir em suas relações sociais no mundo do
educação admitem que ao menos, desde o surgimento das trabalho e na vida pública.
sociedades industriais, o objetivo básico e prioritário da Os mecanismos da socialização na escola se encontram no
socialização dos alunos na escola é prepará-los para sua tipo de estrutura de tarefas acadêmicas que se trabalhe na aula
futura incorporação no mundo do trabalho. Divergências e na forma que adquire a estrutura de relações sociais da
teóricas surgem quanto à definição do que significa escola e da aula – esses componentes encontram-se
preparação para o mundo do trabalho, como se realiza este mutuamente inter-relacionados, de modo que uma forma de
processo, que consequências advêm da promoção da conceber a atividade escolar requer uma estrutura de relações
igualdade de oportunidades ou da promoção da reprodução e sociais compatíveis e convergentes.
reafirmação das diferenças sociais de origem dos indivíduos e Nesse sentido são importantes os seguintes aspectos do
grupos. desenvolvimento do currículo:
O segundo objetivo do processo de socialização na
escola é a formação do cidadão para sua intervenção na a) A seleção e a organização dos conteúdos do
vida pública, de modo que se possa manter a dinâmica, o currículo, concretamente, o que se escolhe e o que se omite da
equilíbrio nas instituições e as normas de convivência. cultura pública da comunidade e quem tem o poder de
Para isso, é necessário que a escola assuma as fortes selecionar ou intervir em sua modificação.
contradições que marcam as sociedades contemporâneas b) O modo e o sentido da organização das tarefas
desenvolvidas. acadêmicas, bem como o grau de participação dos alunos na
De acordo com Enguita (1989)11, a sociedade é mais configuração das formas de trabalho.
ampla que o Estado, assim, na esfera política, todas as c) A ordenação do espaço e do tempo na aula e na
pessoas têm, em princípio, os mesmos direitos; na esfera escola, A flexibilidade ou rigidez do cenário, do programa e da
econômica, no entanto, a primazia não é dos direitos da sequência de atividades.
pessoa mas os da propriedade. Dessa forma a escola d) As formas e estratégias de valorização da atividade
defronta-se com demandas contraditórias no processo de dos alunos, os critérios de valorização, assim como a
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utilização diagnóstica ou classificatória dos resultados e a acesso à cultura pública se acomode às exigências de
própria participação dos interessados no processo de interesses, ritmos, motivações e capacidades iniciais dos
avaliação. que se encontram mais distantes dos códigos e
e) Os mecanismos de distribuição de recompensas características que se expressa. Sua realização requer
como recursos de motivação extrínseca e a forma e grau de flexibilidade, diversidade e pluralidade metodológica e
provocar a competitividade ou a colaboração. organizativa.
f) Os modos de organizar a participação dos alunos na A uniformidade no currículo, nos ritmos, métodos e
formulação, no estabelecimento e no controle das formas e experiências didáticas favorece os grupos que não necessitam
normas de convivência e interação. da escola para o desenvolvimento das habilidades
g) O clima de relações sociais presidido pela ideologia do instrumentais que a sociedade requer, grupos estes que
individualismo e da competitividade ou da colaboração e vivenciam em seu ambiente familiar e social uma cultura
solidariedade. parecida àquela que a escola trabalha.
Enfim, a análise deve abarcar os fatores que Pelo contrário, para aqueles grupos sociais cuja cultura
determinam o grau de participação e domínio dos é bem diferente da acadêmica da aula, a lógica da
próprios alunos sobre o processo de trabalho e os modos homogeneidade não pode senão consagrar a
de convivência, de maneira que se possa chegar a discriminação de fato, já que possuem códigos de
compreender o grau de alienação ou autonomia dos comunicação e intercâmbio bem diferentes dos que a
estudantes quanto a seus próprios processos de produção escola requer. O desenvolvimento radical da função
e intercâmbio no âmbito escolar. compensatória requer a lógica da diversidade pedagógica
dentro da escola compreensiva e comum para todos. A
F) Socialização e humanização: A função educativa da organização da aula e da escola, e a formação profissional
escola do docente devem garantir o tratamento educativo das
A função educativa da escola ultrapassa a função diferenças, trabalhando com cada aluno desde sua
reprodutora do processo de socialização, já que se apoia situação real.
no conhecimento público para provocar o Cabe, ainda, fomentar a pluralidade de formas de viver,
desenvolvimento do conhecimento particular de cada um pensar e sentir, estimular o pluralismo e cultivar a
de seus alunos. A utilização do conhecimento público, da originalidade das diferenças individuais como a expressão
experiência e da reflexão da comunidade social ao longo da mais genuína da riqueza da comunidade humana e da
história introduz um instrumento que pode quebrar o tolerância social.
processo reprodutor. Essa vinculação exige da escola e dos que Assim, se concebe a democracia mais como um estilo de
nela trabalham, que identifiquem e desmascarem seu caráter vida e uma ideia moral do que como uma mera forma de
reprodutor. governo, pensamento do autor Dewey, (1976)12 onde os
Assim, as inevitáveis influências que a comunidade indivíduos, respeitando seus diferentes pontos de vista e
exerce sobre a escola e o processo de socialização projetos vitais, se esforçam através do debate e da ação
sistemática das novas gerações devem sofrer a mediação política, da participação e cooperação ativa, para criar e
crítica da utilização do conhecimento. Deve-se analisar na construir um clima de entendimento e solidariedade.
escola a complexidade que o processo de socialização adquire
em cada época, comunidade e grupo social, assim como os F.2) A reconstrução do conhecimento e da experiência
poderosos e diferenciados mecanismos de imposição da O segundo objetivo da tarefa educativa da escola
ideologia dominante da igualdade de oportunidades numa obrigatória nas sociedades industriais, deve ser, provocar e
sociedade marcada pela discriminação. facilitar a reconstrução dos conhecimentos, atitudes e
A função educativa da escola na sociedade pós-industrial formas de conduta que os alunos assimilam direta e
contemporânea deve concretizar-se em dois eixos acriticamente nas práticas sociais de sua vida anterior e
complementares de intervenção: paralela à escola. Na sociedade contemporânea, a escola
perdeu o papel hegemônico na transmissão e distribuição da
F.1) Desenvolvimento radical da função informação.
compensatória Os meios de comunicação de massa, e em especial a
Nas sociedades industriais avançadas, apesar de sua televisão oferecem de modo atrativo e ao alcance da maioria
constituição política formalmente democrática, sobrevive a dos cidadãos uma abundante bagagem de informações. As
desigualdade e a injustiça. A escola não pode anular tal informações variadas que a criança recebe, somadas ao
discriminação, mas pode atenuar, em parte, os efeitos da conhecimento de suas experiências e interações sociais com os
desigualdade e preparar cada indivíduo para lutar e se componentes de seu meio de desenvolvimento, vão criando de
defender, nas melhores condições possíveis no cenário modo sutil, incipientes concepções ideológicas que ela utiliza
social. Só assim, esses indivíduos terão condições de enfrentar para interpretar a realidade cotidiana e para tomar decisões
a mobilidade competitiva que aí está. A escola deve, então no seu modo de intervir e reagir. A criança chega à escola com
propor uma política radical para compensar as abundante capital de informações e com poderosas e acríticas
consequências individuais da desigualdade social. preconcepções sobre os diferentes âmbitos da realidade.
Com este objetivo, deve-se substituir a lógica da Tanto o campo das relações sociais que rodeiam a
homogeneidade pela lógica da diversidade. Embora seja certo criança como o dos meios de comunicação que
que tanto nos modelos uniformes quanto nos diversificados transmitem informações, valores e concepções
pode-se fomentar e reproduzir a desigualdade e discriminação ideológicas, cumprem uma função mais próxima da
que existe na sociedade, na maioria dos países desenvolvidos reprodução da cultura dominante do que da reelaboração
o perigo de discriminação é mais decisivo nos modelos crítica e reflexiva da mesma. Não há interesse em oferecer
uniformes de trabalho acadêmico – homogeneidade de ritmo, elementos para um debate aberto e racional que permita
estratégias e experiência para todos os alunos. opções autônomas sobre qualquer aspecto da vida
A intervenção compensatória da escola deve econômica, política ou social.
considerar um modelo didático flexível e plural que Somente a escola pode cumprir esta função. E para
permita atender às diferenças de origem, de modo que o desenvolver este complexo e conflitante objetivo, a escola
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compreensiva, apoiando-se na lógica da diversidade deve (A) A orientação que assume um indivíduo que constitui e
começar por diagnosticar as preconcepções e interesses define, ao mesmo tempo, sua participação no interior de um
com que os indivíduos e os grupos de alunos interpretam processo de interação social.
a realidade e decidem sua prática. (B) O processo pelo qual o indivíduo se integra à sociedade,
Ao mesmo tempo deve oferecer o conhecimento público mediante a internalização das normas, valores e ideias
como ferramenta inestimável de análise para facilitar que cada predominantes nos coletivos sociais de que participa.
aluno questione, compare e reconstrua suas preconcepções, (C) O conjunto de normas estabelecidas por um conjunto
seus interesses e atitudes condicionadas, suas pautas de de diferentes grupos socialmente unidos entre si.
conduta induzidas por seus intercâmbios e relações sociais. (D) A unidade de comportamento e pensamento comum a
Como afirma Bernstein (1987) a escola deve transformar- todos os indivíduos pertencentes a uma determinada
se numa comunidade de vida e, a educação deve ser concebida sociedade ou a grupos sociais específicos.
como uma contínua reconstrução da experiência. A escola, ao (E) O conjunto de relações sociais, do passado e do
provocar a reconstrução das preocupações simples, facilita o presente, possíveis de serem observadas e analisadas direta
processo de aprendizagem permanente, ajuda o indivíduo a ou indiretamente.
compreender que todo conhecimento ou conduta encontram-
se condicionados pelo contexto e, portanto, precisam ser 03. (SEDUC/AM – Professor – Ciclo Regular - FGV) Leia
comparados com outras representações, assim como com a o fragmento a seguir. “A é a socialização do saber
evolução de si mesmo e do próprio contexto. acumulado, garantindo a todos a posse de que foram e que
Mais que transmitir informação, a função da escola estão sendo construídos pelo seres humanos ao longo do
contemporânea deve se orientar para provocar a tempo.” Assinale a opção que completa corretamente as
organização racional da informação fragmentária lacunas do fragmento acima.
recebida e a reconstrução das preconcepções acríticas, (A) Função da escola – historicamente – conhecimento
formadas pela pressão reprodutora do contexto social, (B) Prática dos diretores – historicamente – normas
por meio de mecanismos e meios de comunicação cada dia (C) Função da escola – mundialmente – normas
mais poderosos e de influência mais sutil. (D) Prática dos diretores – mundialmente – conhecimento
A exigência de provocar a reconstrução, por parte dos (E) Pratica dos diretores – historicamente – conhecimento
alunos, de seus conhecimentos, atitudes e modos de atuação
requer outra forma de organizar o espaço, o tempo, as 04. (Prefeitura de Cuiabá/MT – Pedagogo – FGV/2015)
atividades e as relações sociais na aula e na escola. Possibilitar Leia o fragmento a seguir. “É o processo de formação de nosso
a vivência de práticas sociais e intercâmbios acadêmicos que self e de como nossos instintos podem ou não ser suprimidos.
induzam à solidariedade, à colaboração, à experimentação Somos transformados em seres capazes de viver em sociedade
compartilhada; que estimulem a busca, a comparação, a crítica, pela internalização das coerções sociais." Assinale a opção que
a iniciativa e a criação, num outro tipo de relação com o indica o conceito apresentado no fragmento acima.
conhecimento e a cultura. (A) Familiaridade.
A função crítica da escola, em sua vertente compensatória (B) Cultura.
e em sua exigência de provocar a reconstrução crítica do (C) Identidade.
pensamento e da ação, requer a transformação radical de suas (D) Socialização.
práticas pedagógicas e sociais e das funções e atribuições do (E) Educação.
professor. O princípio básico que norteia a escola nesses
objetivos e funções é facilitar e estimular a participação
ativa e crítica dos alunos nas diferentes tarefas que se Respostas
desenvolvem na aula e que constituem o modo de viver da
comunidade democrática de aprendizagem. 01. Alternativa A
Como vimos, a sociabilidade parte do processo de
Questões socialização, vivenciado pelos jovens em seus grupos, como
um lugar privilegiado das escolhas, da construção de sentidos,
01. (Prefeitura de Fazenda Rio Grande/PR – Professor da solidariedade e da construção da autonomia, dessa forma, a
– PUC/PR/2017) O processo de socialização define-se sociabilidade é uma forma de sociação, cujo fim é a própria
(A) Somente nas atitudes observadas em ambiente escolar, relação, ou seja, os laços estabelecidos entre os indivíduos têm
pois essas interações produzem resultados de conhecimento, uma razão em si mesmos.
de acordo com a psicologia social.
(B) Por ter como seu aspecto principal a formação de 02. Alternativa B
grupos com poucas características em comum, de acordo com O filósofo Durkheim (1975), trouxe uma formulação da
a psicologia social. socialização como meio integrador, no qual as regras sociais
(C) Por produzir o conjunto de crenças, valores e são transmitidas às novas gerações pelo processo de educação.
significados, leva ao processo, denominado pela psicologia Diz que, ao nascer, o indivíduo já encontra a sociedade pronta
social, de socialização. O indivíduo passa a pertencer um e constituída em suas leis. Assim, a educação é, na verdade, um
determinado grupo social, vivenciando seus códigos e regras meio pelo qual a sociedade prepara, no íntimo das crianças, as
de relacionamento, apropriando-se dos conhecimentos já condições essenciais de sua própria existência. Considerava a
sistematizados pelo grupo. sociedade como um sistema formado pela associação de
(D) Pelos questionamentos às normas e regras de conduta indivíduos que se manifesta como um fato objetivo externo a
de determinados grupo, forçando os relacionamentos rivais. nós, que determina quase tudo que se faz.
(E) Somente pela interação entre crianças, famílias e
comunidades na busca por informações sobre qualidade de 03. Alternativa A
vida na educação dos filhos. “A função da escola é a socialização do saber
historicamente acumulado, garantindo a todos a posse de
02. (SEGEP/MA – Pedagogo – FCC/2016) A noção de conhecimento que foram e que estão sendo construídos pelo
“socialização” guarda estreitas relações com a educação seres humanos ao longo do tempo.”
escolar e não escolar e pode ser entendida como
4
04. Alternativa D não continuam a fechar suas portas para as manifestações
Como vimos, a socialização é como meio integrador, no culturais associadas à cultura popular, contribuindo, assim,
qual as regras sociais são transmitidas às novas gerações pelo para que saberes e valores familiares a muitos (as) estudantes
processo de educação, dessa forma, o indivíduo ao nascer, já sejam desvalorizados e abandonados na entrada da sala de
encontra a sociedade pronta e constituída em suas leis, o aula? Poderia ser diferente? Como?
indivíduo já encontra a sociedade pronta e constituída em suas
leis. Um terceiro sentido da palavra cultura, originado no
Assim, a sociedade é considera um sistema formado pela Iluminismo, a associa a um processo secular geral de
associação de indivíduos que se manifesta como um fato que desenvolvimento social. Esse significado é comum nas ciências
determina tudo que se faz, dessa forma, a sociedade não só sociais, sugerindo a crença em um processo harmônico de
controla nossos moimentos como dá forma aos nossos desenvolvimento da humanidade, constituído por etapas
pensamentos, identidades e emoções. claramente definidas, pelo qual todas as sociedades
inevitavelmente passam. Tal processo acaba equivalendo, por
“coincidência”, aos rumos seguidos pelas sociedades
1.2 A educação e a europeias, as únicas a atingirem o grau mais elevado de
diversidade de contextos desenvolvimento.
culturais: pluralismo e Há ainda reflexos dessa visão no currículo? Parece-nos que
diversidade cultural; sim. Em alguns cursos de História, por exemplo, as referências
se fazem, dominantemente, às histórias dos povos
“desenvolvidos”, o que nos aliena dos esforços e dos rumos
Cultura, Diversidade Cultural e Currículo13 seguidos na maioria dos países que formam o chamado
Terceiro Mundo
Que entendemos pela palavra cultura? Talvez seja útil Em um quarto sentido, a palavra “culturas” (no plural)
esclarecermos, inicialmente, como a estamos concebendo, já corresponde aos diversos modos de vida, valores e
que seus sentidos têm variado ao longo dos tempos, significados compartilhados por diferentes grupos (nações,
particularmente no período da transição de formações sociais classes sociais, grupos étnicos, culturas regionais, geracionais,
tradicionais para a modernidade. Acreditamos que tal de gênero etc) e períodos históricos. Trata-se de uma visão
esclarecimento pode subsidiar a discussão das relações entre antropológica de cultura, em que se enfatizam os significados
currículo e cultura14e15. que os grupos compartilham, ou seja, os conteúdos culturais.
Cultura identifica-se, assim, com a forma geral de vida de um
O primeiro e mais antigo significado de cultura encontra- dado grupo social, com as representações da realidade e as
se na literatura do século XV, em que a palavra se refere a visões de mundo adotadas por esse grupo. A expressão dessa
cultivo da terra, de plantações e de animais. É nesse sentido concepção, no currículo, poderá evidenciar-se no respeito e no
que entendemos palavras como agricultura, floricultura, acolhimento das manifestações culturais dos (as) estudantes,
suinocultura. por mais desprestigiadas que sejam.
O segundo significado emerge no início do século XVI, Finalmente, um quinto significado tem tido considerável
ampliando a ideia de cultivo da terra e de animais para a mente impacto nas ciências sociais e nas humanidades em geral.
humana. Ou seja, passa-se a falar em mente humana cultivada, Deriva da antropologia social e também se refere a significados
afirmando-se mesmo que somente alguns indivíduos, grupos compartilhados. Diferentemente da concepção anterior,
ou classes sociais apresentam mentes e maneiras cultivadas e porém, ressalta a dimensão simbólica, o que a cultura faz, em
que somente algumas nações apresentam elevado padrão de vez de acentuar o que a cultura é. Nessa mudança, efetua- se
cultura ou civilização. No século XVIII, consolida-se o caráter um movimento do que para o como. Concebe-se, assim, a
classista da ideia de cultura, evidente na ideia de que somente cultura como prática social, não como coisa (artes) ou estado
as classes privilegiadas da sociedade europeia atingiriam o de ser (civilização).
nível de refinamento que as caracterizaria como cultas. O
sentido de cultura, que ainda hoje a associa às artes, tem suas Nesse enfoque, coisas e eventos do mundo natural existem,
origens nessa segunda concepção: cultura, tal como as elites a mas não apresentam sentidos intrínsecos: os significados são
concebem, corresponde ao bem apreciar música, literatura, atribuídos a partir da linguagem. Quando um grupo
cinema, teatro, pintura, escultura, filosofia. Será que não compartilha uma cultura, compartilha um conjunto de
encontramos vestígios dessa concepção tanto em alguns de significados, construídos, ensinados e aprendidos nas práticas
nossos atuais currículos como em textos que se escrevem de utilização da linguagem. A palavra cultura implica,
sobre currículo? Para alguns docentes, o estudo da literatura, portanto, o conjunto de práticas por meio das quais
por exemplo, ainda tende a se restringir a escritores e livros significados são produzidos e compartilhados em um grupo.
vistos como clássicos. Para alguns estudiosos da cultura e da São os arranjos e as relações envolvidas em um evento que
educação, os grandes autores, as grandes obras e as grandes passam, dominantemente, a despertar a atenção dos que
ideias deveriam constituir o núcleo central dos currículos de analisam a cultura com base nessa quinta perspectiva, passível
nossas escolas. de ser resumida na ideia de que cultura representa um
conjunto de práticas significantes. Não será pertinente
Já no século XX, a noção de cultura passa a incluir a cultura considerarmos também o currículo como um conjunto de
popular, hoje penetrada pelos conteúdos dos meios de práticas em que significados são construídos, disputados,
comunicação de massa. Diferenças e tensões entre os rejeitados, compartilhados? Como entender, então, as relações
significados de cultura elevada e de cultura popular acentuam- entre currículo e cultura? Quando um grupo compartilha uma
se, levando a um uso do termo cultura que se marca por cultura, compartilha um conjunto de significados, construídos,
valorizações e avaliações. Será que algumas de nossas escolas ensinados e aprendidos nas práticas de utilização da
13 http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Ensfund/indag3.pdf
15 CANEN, A. e MOREIRA, A. F. B. Reflexões obre o multiculturalismo na escola e na
14 BOCOCK, R. The cultural formations of modern society. In: HALL, S. e GIEBEN, B. formação docente. In: CANEN, A. e MOREIRA, A. F. B. (Orgs.) Ênfases e omissões no
(Orgs.). Formations of modernity. Cambridge: Polity Press/The Open University, currículo. Campinas: Papirus, 2001.
1995.
5
linguagem. A palavra cultura implica, portanto, o conjunto de de aula, pelos “currículos” por eles “vividos” em outros espaços
práticas por meio das quais significados são produzidos e socioeducativos (shoppings, clubes, associações, igrejas, meios
compartilhados em um grupo. de comunicação, grupos informais de convivência etc), nos
quais se fazem sentir com intensidade muitos dos complexos
Se entendermos o currículo, como propõe Williams16, fenômenos associáveis ao processo de globalização que hoje
como escolhas que se fazem em vasto leque de possibilidades, vivenciamos. Nesses outros espaços extraescolares, os
ou seja, como uma seleção da cultura, podemos concebê-lo, currículos tendem a se organizar com objetivos distintos dos
também, como conjunto de práticas que produzem currículos escolares, o que faz com que valores como
significados. Nesse sentido, considerações de Silva17 podem padronização, consumismo, individualismo, sexismo e
ser úteis. Segundo o autor, o currículo é o espaço em que se etnocentrismo possam entrar em acirrada competição com
concentram e se desdobram as lutas em torno dos diferentes outras metas, visadas por escolas e famílias. Vale perguntar:
significados sobre o social e sobre o político. É por meio do
currículo que certos grupos sociais, especialmente os Como temos, nas salas de aula, reagido a esse “confuso”
dominantes, expressam sua visão de mundo, seu projeto panorama em que a diversidade se faz tão presente?
social, sua “verdade”. O currículo representa, assim, um Como temos nos esforçado para desestabilizar privilégios e
conjunto de práticas que propiciam a produção, a circulação e discriminações? Como temos buscado neutralizar influências
o consumo de significados no espaço social e que contribuem, “indesejáveis”?
intensamente, para a construção de identidades sociais e Como temos, na escola, dialogado com os “currículos” desses
culturais. O currículo é, por consequência, um dispositivo de outros espaços?
grande efeito no processo de construção da identidade do(a)
estudante. Em resumo, o complexo, variado e conflituoso cenário
cultural em que estamos imersos se reflete no que ocorre em
Não se mostra, então, evidente a íntima relação entre nossas salas de aula, afetando sensivelmente o trabalho
currículo e cultura? Se, em uma sociedade cindida, a cultura é pedagógico que nelas se processa. Voltamos a perguntar:
um terreno no qual se processam disputas pela preservação ou
pela superação das divisões sociais, o currículo é um espaço Como as diferenças derivadas de dinâmicas sociais como
em que esse mesmo conflito se manifesta. O currículo é um classe social, gênero, etnia, sexualidade, cultura e religião têm
campo em que se tenta impor tanto a definição particular de “contaminado” nosso currículo, tanto o currículo formal quanto
cultura de um dado grupo quanto o conteúdo dessa cultura. O o currículo oculto?
currículo é um território em que se travam ferozes Como temos considerado, no currículo, essa pluralidade, esse
competições em torno dos significados. O currículo não é um caráter multicultural de nossa sociedade?
veículo que transporta algo a ser transmitido e absorvido, mas Como articular currículo e multiculturalismo?
sim um lugar em que, ativamente, em meio a tensões, se Que estratégias pedagógicas podem ser selecionadas?
produz e se reproduz a cultura. Currículo refere-se, portanto, Temos, professores e gestores, reservado tempo e espaço
a criação, recriação, contestação e transgressão18. suficientes para que essas discussões aconteçam nas escolas?
Como nossos projetos político-pedagógicos têm incorporado
Como todos esses processos se “concretizam” no tais preocupações?
currículo? Pode-se dizer que no currículo se evidenciam Como temos atendido ao que determina a Lei nº
esforços tanto por consolidar as situações de opressão e 10.639/2003, que torna obrigatório, nos estabelecimentos de
discriminação a que certos grupos sociais têm sido ensino fundamental e médio, o ensino sobre História e Cultura
submetidos, quanto por questionar os arranjos sociais em que afro-brasileira?
essas situações se sustentam. Isso se torna claro ao nos De que modo os professores se têm inteirado das lutas e
lembrarmos dos inúmeros e expressivos relatos de práticas, conquistas dos negros, das mulheres, dos homossexuais e de
em salas de aulas, que contribuem para cristalizar outros grupos minoritários oprimidos?
preconceitos e discriminações, representações estereotipadas
e desrespeitosas de certos comportamentos, certos estudantes Sem pretender oferecer respostas prontas a serem
e certos grupos sociais. Em Conselhos de Classe, algumas aplicadas em quaisquer situações, move-nos a intenção de
dessas visões, lamentavelmente, se refletem em frases como: apresentar alguns princípios que possam nortear a construção
“vindo de onde vem, ele não podia mesmo dar certo na coletiva, em cada escola, de currículos que visem a enfrentar
escola!”. alguns dos desafios que a diversidade cultural nos tem trazido.
Fundamentamo-nos, nesse propósito, em estudos, pesquisas,
Ao mesmo tempo, há inúmeros e expressivos relatos de práticas e depoimentos de docentes comprometidos com uma
práticas alternativas em que professores (as) desafiam as escola cada vez mais democrática. Nossa intenção é convidar o
relações de poder que têm justificado e preservado privilégios profissional da educação a engajar- se no instigante processo
e marginalizações, procurando contribuir para elevar a de pensar e desenvolver currículos para essa escola.
autoestima de estudantes associados a grupos
subalternizados. O currículo é um campo em que se tenta Desejamos, com os princípios que vamos sugerir,
impor tanto a definição particular de cultura de um dado grupo intensificar a sensibilidade do (a) docente e do gestor para a
quanto o conteúdo dessa cultura. O currículo é um território pluralidade de valores e universos culturais, para a
em que se travam ferozes competições em torno dos necessidade de um maior intercâmbio cultural no interior de
significados. Ou seja, no processo curricular, distintas e cada sociedade e entre diferentes sociedades, para a
complexas têm sido as respostas dadas à diversidade e à conveniência de resgatar manifestações culturais de
pluralidade que marcam de modo tão agudo o panorama determinados grupos cujas identidades se encontram
cultural contemporâneo. ameaçadas, para a importância da participação de todos no
esforço por tornar o mundo menos opressivo e injusto, para a
Cabe também ressaltar a significativa influência exercida, urgência de se reduzirem discriminações e preconceitos.
junto às crianças e aos adolescentes que povoam nossas salas
16WILLIAMS, R. The long revolution. Harmondsworth: Penguin Books, 1984 18 MOREIRA, A. F. B. e SILVA, T. T. (Orgs.). Currículo, cultura e sociedade. São Paulo:
17 SILVA, T. T. Documentos
de identidade: uma introdução às teorias do currículo. Cortez, 1994
Belo Horizonte: Autêntica, 1999.
6
O objetivo maior concentra-se, cabe destacar, na O currículo como espaço de questionamento de nossas
contextualização e na compreensão do processo de construção representações sobre os “outros”
das diferenças e das desigualdades. Nosso propósito é que os Junto ao reconhecimento da própria identidade cultural,
currículos desenvolvidos tornem evidente que elas não são outro elemento a ser ressaltado relaciona-se às
naturais; são, ao contrário, “invenções/construções” históricas representações que construímos dos outros, daqueles que
de homens e mulheres, sendo, portanto, passíveis de serem consideramos diferentes. As relações entre nós e os outros
desestabilizadas e mesmo transformadas. Ou seja, o existente estão carregadas de dramaticidade e ambiguidade. Em
nem pode ser aceito sem questionamento nem é imutável; sociedades nas quais a consciência das diferenças se faz cada
constitui-se, sim, em estímulo para resistências, para críticas e vez mais forte, reveste-se de especial importância
para a formulação e a promoção de novas situações aprofundarmos questões como: quem incluímos na categoria
pedagógicas e novas relações sociais. nós? Quem são os outros? Quais as implicações dessas
questões para o currículo? Como nossas representações dos
O currículo como espaço de reconhecimento de nossas outros se refletem nos currículos?
identidades culturais
Um aspecto a ser trabalhado, que consideramos de Esses são temas fundamentais que estamos desafiados a
especial relevância, diz respeito a se procurar, na escola, trabalhar nas relações sociais e, particularmente, na educação.
promover ocasiões que favoreçam a tomada de consciência da Nossa maneira de nos situarmos em relação aos outros tende
construção da identidade cultural de cada um de nós, docentes a construir-se em uma perspectiva etnocêntrica. Quem são os
e gestores, relacionando-a aos processos socioculturais do nós? Tendemos a incluir na categoria nós todas aquelas
contexto em que vivemos e a história de nosso país. O que pessoas e aqueles grupos sociais que têm referenciais
temos constatado é a pouca consciência que, em geral, temos semelhantes aos nossos, que têm hábitos de vida, valores,
desses processos e do cruzamento de culturas neles presente. estilos e visões de mundo que se aproximam dos nossos e os
Tendemos a uma visão homogeneizadora e estereotipada de reforçam. Quem são os outros? Tendem a ser os que entram
nós mesmos e de nossos alunos e alunas, em que a identidade em choque com nossas maneiras de nos situarmos no mundo,
cultural é muitas vezes vista como um dado, como algo que nos por sua classe social, etnia, religião, valores, tradições,
é impresso e que perdura ao longo de toda nossa vida. sexualidade etc.
Desvelar essa realidade e favorecer uma visão dinâmica, Como temos entendido esse outro? Para Skliar e
contextualizada e plural das identidades culturais é Duschatzky19, principalmente de três formas distintas: o outro
fundamental, articulando- se as dimensões pessoal e coletiva como fonte de todo mal, o outro como sujeito pleno de um
desses processos. Constitui um exercício fundamental grupo cultural, o outro como alguém a tolerar.
tornarmo-nos conscientes de nossos enraizamentos culturais,
dos processos em que misturam ou se silenciam determinados A primeira perspectiva, segundo os autores, marcou
pertencimentos culturais, bem como sermos capazes de predominantemente as relações sociais durante o século XX e
reconhecê-los, nomeá-los e trabalhá-los. Constitui um pode se revestir de diferentes formas, desde a eliminação física
exercício fundamental tornarmo-nos conscientes de nossos do outro, até a coação interna, mediante a regulação de
enraizamentos culturais, dos processos em que misturam ou costumes e moralidades. Nesse modo de nos situarmos diante
se silenciam determinados pertencimentos culturais, bem do outro, assumimos uma visão binária e dicotômica. Em um
como sermos capazes de reconhecê-los, nomeá-los e trabalhá- lado separamos os bons, os verdadeiros, os autênticos, os
los. civilizados, cultos, defensores da liberdade e da paz. Em outro,
deixamos os outros: os maus, os falsos, os bárbaros, os
Como favorecer essa tomada de consciência? Alguns ignorantes e os terroristas. Se nos identificamos com os
exercícios podem ser propostos, buscando-se criar primeiros, o que temos a fazer é eliminar, neutralizar, dominar
oportunidades em que o profissional da educação se estimule ou subjugar os outros. Caso nos sintamos representados como
a falar sobre como percebe a construção de sua identidade. integrantes do polo oposto, ou internalizamos a nossa
Como vêm sendo criadas nossas identidades de gênero, raça, maldade e nos deixamos salvar, passando para o lado dos bons,
sexualidade, classe social, idade, profissão? Como temos ou nos confrontamos violentamente com eles.
aprendido a ser quem somos, como profissionais da educação,
brasileiros (as), homens, mulheres, casados (as), solteiros (as), Como essa primeira perspectiva se traduz na escola?
negros (as), brancos (as), jovens ou idosos (as)? Nesses Mostra-se presente quando:
momentos, tem sido bastante frequente a afirmação “nunca (a) atribuímos o fracasso escolar dos (as) alunos (as) às
pensei na formação da minha identidade cultural”, ou então suas características sociais ou étnicas;
“me considero uma órfã do ponto de vista cultural”, expressão (b) diferenciamos os tipos de escolas segundo a origem
usada por uma professora jovem, querendo se referir à social dos (as) estudantes, considerando que alguns têm maior
dificuldade de nomear os referentes culturais configuradores potencial que outros e, para desenvolvermos uma educação de
de sua trajetória de vida. qualidade, não podemos misturar estudantes de diferentes
potenciais;
A socialização em pequenos grupos, entre os (as) (c) nos situamos, como professores (as), diante dos (as)
educadores (as), dos relatos sobre a construção de suas alunos (as), com base em estereótipos e expectativas
identidades culturais pode se revelar uma experiência diferenciadas segundo a origem social e as características
profundamente vivida, muitas vezes carregada de emoção, que culturais dos grupos de referência;
dilata tanto a consciência dos próprios processos de formação (d) valorizamos exclusivamente o racional e
identitária do ponto de vista cultural, quanto a sensibilidade desvalorizamos os aspectos afetivos presentes nos processos
para favorecer esse mesmo dinamismo nas práticas educativas educacionais;
que organizamos. Nesses processos, podemos nos dar conta da (e) privilegiamos somente a comunicação verbal,
complexidade envolvida na configuração dos distintos traços desconsiderando outras formas de comunicação humana,
identitários que coexistem, por vezes contraditoriamente, na como a corporal, a artística etc.
construção das diferenças de que somos feitos.
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Ao considerarmos o outro como sujeito pleno de uma interpenetração das culturas e para a pluralidade cultural,
marca cultural, estamos concebendo-o como membro de uma tanto as manifestações culturais hegemônicas como as
dada cultura, vista como uma comunidade homogênea de subalternizadas precisam integrar o currículo e ser objeto de
crenças e estilos de vida. O outro, ainda que não seja a fonte de apreciação e crítica. Talvez fosse útil, para o desenvolvimento
todo mal, é diferente de nós, tem uma essência claramente do que sugerimos, que discutíssemos, na escola, com que
definida, distinta da que nos caracteriza. Na área da educação, recursos podemos contar em nossa comunidade e como fazer
essa visão se expressa, por exemplo, quando nos limitamos a para que outros recursos venham, de alguma forma, a tornar-
abordar o outro de forma genérica e “folclórica”, apenas em se familiares a nossos (as) alunos (as). Abrir as portas, na
dias especiais, usualmente incluídos na lista dos festejos escola, a diferentes manifestações da cultura popular, além das
escolares, tais como o Dia do Índio ou Dia da Consciência que compõem a chamada cultura erudita.
Negra.
Nessa perspectiva, há um ponto que desejamos destacar.
Já a expressão o outro como alguém a tolerar convida tanto Ao intentarmos transformar a escola em um espaço cultural,
a admitir a existência de diferenças quanto a aceitá-las. Nessa estamos convidando cada professor (a), como intelectual que
admissão, contudo, reside um paradoxo. Se aceitamos, por é, a desempenhar o papel de crítico (a) cultural. Estamos
princípio, todo e qualquer diferente, deveríamos aceitar os considerando que a atividade intelectual implica o
grupos cujas marcas são comportamentos antissociais ou questionamento do que parece inscrito na natureza das coisas,
opressivos, como os racistas. Que consequências a adoção do que nos é apresentado como natural, questionamento esse
dessa perspectiva pode ter para a prática pedagógica? que visa, fundamentalmente, a mostrar que as coisas não são
Julgamos que a simples tolerância pode nos situar em uma inevitáveis. A atividade intelectual centra-se, assim, na crítica
posição débil, evitando que tomemos posição em relação aos da cultura em que estamos imersos. Como se expressa essa
valores que dominam a cultura contemporânea. Pode impedir atividade na prática curricular?
que polemizemos, levando-nos a assumir a conciliação como
valor último. Pode incentivar-nos a não questionar a “ordem”, Julgamos que cabe à escola, por meio de suas atividades
vendo-a como comportamentos a serem inevitavelmente pedagógicas, mostrar ao aluno que as coisas não são
cultivados. inevitáveis e que tudo que passa por natural precisa ser
Poderíamos acrescentar outras formas de nos situar diante questionado e pode, consequentemente, ser modificado. Cabe
dos outros. No entanto, acreditamos que a tipologia proposta à escola levá-lo a compreender que a ordem social em que está
por Skliar e Duschatzky20 expressa as posições mais presentes inserido define-se por ações sociais cujo poder não é absoluto.
na nossa sociedade hoje, evidenciando a complexidade das O que existe precisa ser visto como a condição de uma ação
questões relacionadas à alteridade e à diferença. futura, não como seu limite. Nossos questionamentos devem,
então, provocar tensões e desafiar o existente. Podem não
O que desejamos destacar é que o modo como concebemos mudar o mundo, mas podem permitir que o aluno o
a condição humana pode bloquear nossa compreensão dos compreenda melhor. Como nos diz Bauman22, “para operar no
outros. Portanto, é importante promovermos processos mundo (por contraste a ser ‘operado’ por ele) é preciso
educacionais nos quais identifiquemos e desconstruamos entender como o mundo opera”.
nossas suposições, em geral implícitas, que não nos permitem
uma aproximação aberta e empática à realidade dos outros. A crítica de diferentes artefatos culturais na escola pode,
por exemplo, levar-nos a identificar e a desafiar visões
O currículo como um espaço de crítica cultural estereotipadas da mulher propagadas em anúncios; imagens
Apresentamos agora outro princípio, fortemente desrespeitosas de homossexuais difundidas em programas
relacionado aos anteriores: sugerimos que se expandam os cômicos de televisão; preconceitos contra povos não
conteúdos curriculares usuais, de modo a neles incluir alguns ocidentais evidentes em desenhos animados; mensagens
dos artefatos culturais que circundam o (a) aluno (a). A ideia é encontradas em revistas para adolescentes do sexo feminino
tornar o currículo um espaço de crítica cultural. (e da classe média) que incentivam o uso de drogas, o
consumismo e o individualismo; estímulos à erotização
Como fazê-lo? precoce das meninas, visíveis em brinquedos e programas
Um dos caminhos é abrir as portas, na escola, a diferentes infantis; presença e aceitação da violência em filmes, jogos e
manifestações da cultura popular, além das que compõem a brinquedos.
chamada cultura erudita. Músicas populares, danças, filmes,
programas de televisão, festas populares, anúncios, Outros exemplos poderiam ser citados, reforçando-nos o
brincadeiras, jogos, peças de teatro, poemas, revistas e ponto de vista de que os produtos culturais à nossa volta nada
romances precisam fazer-se presentes nas salas de aula. Da têm de ingênuos ou puros; ao contrário, incorporam intenções
mesma forma, levando-se em conta a importância de ampliar de apoiar, preservar ou produzir situações que favorecem
os horizontes culturais dos (as) estudantes, bem como de certos grupos e outros não. Tais artefatos, como se tem
promover interações entre diferentes culturas, outras insistentemente acentuado, desempenham, junto com o
manifestações, mais associadas aos grupos dominantes, currículo escolar, importante papel no processo de formação
precisam ser incluídas no currículo. das identidades de nossas crianças e nossos adolescentes,
devendo constituir- se, portanto, em elementos centrais de
A intenção é que a cultura dos estudantes e da comunidade crítica em processos curriculares culturalmente orientados.
possa interagir com outras manifestações e outros espaços
culturais como museus, exposições, centros culturais, música Contribuições para o Estudo da Pluralidade Cultural no
erudita, clássicos da literatura. Se aceitarmos a inexistência, no Âmbito da Escola23
mundo contemporâneo, de qualquer “pureza cultural”21, se Para informar adequadamente a perspectiva de ensino e
pretendermos abrir espaço na escola para a complexa aprendizagem é importante esclarecer o caráter
20 SKLIAR, C. e DUSCHATZKY, S. O nome dos outros: narrando a alteridade na 22BAUMAN, Z. Em busca da política. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
cultura e na educação. In: LARROSA, J. e SKLIAR, C. (Orgs.). Habitantes de Babel: 23 Brasil.
Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares
políticas e poéticas da diferença. Belo Horizonte: Autêntica, 2001. nacionais: pluralidade cultural, orientação sexual / Secretaria de Educação
21 McCARTHY, C. The uses of culture: education and the lilmits of ethnic affiliation.
Fundamental.
New York: Routledge, 1998.
8
interdisciplinar que constitui o campo de estudos teóricos da Os direitos humanos assumiram, gradativamente, a
Pluralidade Cultural. A fundamentação ética, o entendimento importância de tema global. Assim como a preservação do
de preceitos jurídicos, incluindo o campo internacional, meio ambiente, os Direitos Humanos colocam-se como
conhecimentos acumulados no campo da História e da assunto de interesse de toda a humanidade. Se o planeta está
Geografia, noções e conceitos originários da Antropologia, da ameaçado por políticas de desenvolvimento predatórias, da
Linguística, da Sociologia, da Psicologia, aspectos referentes a mesma maneira a miséria e a intolerância em seus diversos
Estudos Populacionais, constituem uma base sobre a qual se matizes promovem no final do século a morte pela fome, a
opera tal reflexão que, ao voltar-se para a atuação na escola, marginalidade extrema, migrações em massa, desequilíbrios
deve ter cunho eminentemente pedagógico. internos e, no limite, guerras entre grupos humanos que
Acrescenta-se a essa evidente complexidade o fato de que outrora conviveram em suposta harmonia. A violência em que
muitos grupos humanos, de que trata o tema Pluralidade pode resultar a disputa étnica, religiosa e social, quando a
Cultural, têm produzido um saber rico e profundo acerca de si intolerância e o desequilíbrio são levados ao extremo,
mesmos, particularmente no âmbito de movimentos sociais e expressa-se em números: sabe-se que 80% das guerras que
de suas organizações comunitárias. Assim, abre-se à escola a ocorrem hoje derivam da intolerância étnica e religiosa em
possibilidade de empreender, em seu cotidiano, uma reflexão conflitos internos.
que integra, de maneira ímpar, teoria e prática, reflexão e ação. A ONU, preocupada com a conquista da paz mundial,
A seguir são apresentadas algumas indicações das promoveu conferências que buscavam um programa de
diferentes contribuições, a título de subsídios chave, a fim de consenso que orientasse os países e os indivíduos quanto à
balizar o trabalho pedagógico deste tema, embora não o questão dos direitos humanos. A Conferência de Viena de
esgotem. São pistas que o professor poderá seguir 1993, de cuja declaração o Brasil é signatário, reafirmou a
aprofundando e ampliando conforme as necessidades de seu universalidade dos direitos humanos e apresentou as
planejamento. Visam, sobretudo, explicitar que tratar do povo condições necessárias para os Estados promoverem,
brasileiro, em seus desafios e conquistas do cotidiano e no controlarem e garantirem tais direitos. Sabia-se naquele
processo histórico, exige estudo e preparo cuidadoso que não momento que o tratamento adequado do tema da pluralidade
se confundem, em hipótese alguma, com o senso comum. etnocultural era condição para a democracia e fator primordial
do equilíbrio social e internacional. Firma-se nesse contexto a
Fundamentos Éticos responsabilidade do Estado na proteção e promoção das
Uma proposta curricular voltada para a cidadania deve identidades étnicas, culturais, linguísticas e religiosas.
preocupar-se necessariamente com as diversidades existentes A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
na sociedade, uma das bases concretas em que se praticam os é uma das mais avançadas quanto aos temas do respeito à
preceitos éticos. É a ética que norteia e exige de todos, e da diferença e do combate à discriminação. O Brasil teve, por
escola e educadores em particular, propostas e iniciativas que outro lado, participação ativa nas reuniões mundiais sobre os
visem à superação do preconceito e da discriminação. A direitos humanos e sobre minorias. Aqui não se trata, é claro,
contribuição da escola na construção da democracia é a de de exigir conhecimentos próprios do especialista em Direito,
promover os princípios éticos de liberdade, dignidade, mas de saber como se define basicamente a cidadania.
respeito mútuo, justiça e equidade, solidariedade, diálogo no Vale lembrar que dispositivos presentes na Seção “Da
cotidiano; é a de encontrar formas de cumprir o princípio Educação”, da Constituição Federal, referentes às
constitucional de igualdade, o que exige sensibilidade para a comunidades indígenas, também asseguram “a utilização de
questão da diversidade cultural e ações decididas em relação suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem”
aos problemas gerados pela injustiça social. (art. 210, § 2º), consolidando o reconhecimento de exigências
A diferença entre o que se tem historicamente pregado historicamente apresentadas em trabalhos desenvolvidos
como sendo fins e valores da democracia republicana e pelos povos indígenas, em cooperação notadamente com a
práticas sociais marcadas pela dominação, exploração e sociedade civil.
exclusão, torna imperativo o posicionamento ético da escola e Alguns aspectos pedagógicos decorrem desse dispositivo.
do educador, ao mesmo tempo em que se coloca a superação O estabelecimento de escolas indígenas, com proposta
dessa situação, no campo educacional, como um dos maiores pedagógica, organização administrativa e didáticas próprias,
desafios da prática pedagógica. atende a uma exigência constitucional, traz enriquecimento
Num mundo que tende cada vez mais à globalização no pedagógico e introduz exigências adicionais na estruturação
plano econômico, da qual é ainda desconhecido o conjunto de do sistema nacional de educação.
efeitos sociais, é importante perceber o incessante processo de
reposição das diferenças e o ressurgimento de etnicidades. De O ensino religioso nas escolas públicas é assunto que exige
um lado, esse processo ensina que o fato de as culturas atenção. Tema vinculado, em termos de direito, à liberdade de
viverem dinâmicas que resultam em sua modificação consciência e de crença, a presença plural das religiões no
constante não quer dizer que o sentido da mudança seja único, Brasil constitui-se fator de possibilidade de escolha. Ao
e conduza fatalmente ao modelo de desenvolvimento indivíduo é dado o direito de ter religião, quando criança, por
dominante. De outro, apresenta com clareza a necessidade da decisão de seus pais, ou, quando adulto, por escolha pessoal;
construção de valores e novas práticas de relação social que de mudar de religião, por determinação voluntária ao longo da
permitam o reconhecimento e a valorização da existência das vida, sem restrições de ordem civil; e de não ter religião, como
diferenças étnicas e culturais, e a superação da relação de opção consciente. O que caracteriza, portanto, a inserção social
dominação e exclusão — ao mesmo tempo em que se constitui do cidadão, desse ponto de vista, é o respeito, a abertura e a
a solidariedade. liberdade.
De fato, a configuração laica do Estado é propiciadora
Conhecimentos Jurídicos dessa pluralidade, no plano social, e se caracteriza por ser
Explicitada no contexto dramático do pós-guerra, quando impeditiva de rótulos, no plano do cidadão. Ou seja, não há
se indagou como teria sido possível ao ser humano produzir a uma predeterminação que vincule compulsoriamente etnias e
barbárie do Holocausto e o horror de Nagasaki e Hiroshima, a religiões, origem de nascimento e percursos de vida.
Declaração Universal dos Direitos Humanos surgiu como a É nesse sentido que se define a postura laica da escola
ponte entre o medo e a esperança. Essa ponte, apenas pública como imperativo no cumprimento do dever do Estado
projetada ali, seria preciso ser construída. referente ao estabelecimento pleno de uma educação
9
democrática, voltada para o aprimoramento e a consolidação conhecimento desse processo pode significar o
de liberdades e direitos fundamentais da pessoa humana. dimensionamento correto do absurdo, do ponto de vista ético,
Não se trata, é claro, de mostrar um Brasil perfeito e irreal, da escravidão, de sua mercantilização e das repercussões que
mas as possibilidades que se abrem com trabalho, embates e os povos africanos enfrentam por isso.
entendimentos, mediante a colocação em prática de Da mesma forma, uma visão histórica da Ásia contribui
instrumentos jurídicos já disponíveis. para a compreensão da formação cultural brasileira, tanto no
que se refere às tradições quanto em relação aos processos
Conhecimentos Históricos e Geográficos históricos que levaram seus habitantes a imigrarem para as
O estudo da ocupação do território nacional e da Américas, e em particular para o Brasil, em diferentes
constituição da população pode ser empreendido por momentos históricos. É relevante, também, o estudo do
intermédio da trajetória das etnias no Brasil. Tarefa complexa, Oriente Médio, sua história e suas influências na constituição
esse estudo traz tanto a compreensão da produção das da civilização ocidental.
riquezas, da miséria e da injustiça quanto de aspectos que Esses conhecimentos são subsídios para que se possa
tornaram o Brasil internacionalmente reconhecido como compreender o processo de surgimento de tendências, ideias,
hospitaleiro. crenças, sistemas de pensamento, seu percurso por diversos
Os aspectos históricos e geográficos expõem uma territórios nacionais e continentais, e a ampliação da
diversidade regional marcada pela desigualdade, do ponto de influência cultural; perceber a criação e recriação constante de
vista do atendimento pleno dos direitos de cidadania, de tradições, a complexidade da convivência da diversidade em
valorização desigual de práticas culturais. A formação um mesmo território, nem sempre harmonizada, assim como
histórica do Brasil mostra os mecanismos de resistência ao processos internacionais de pressão, e desenvolvimento de
processo de dominação desenvolvidos pelos grupos sociais em processos regionais de construção da paz.
diferentes momentos. Uma das formas de resistência refere-se Cada um desses desenvolvimentos poderá estar presente
ao fato de que cada grupo encontrou maneiras de preservar conforme a necessidade e a oportunidade do trabalho em sala
sua identidade cultural, ainda que às vezes de forma de aula. É claro, contudo, que alguns desenvolvimentos
clandestina e precária. conceituais mais elaborados poderão ser deixados para as
A tendência de abafar e encobrir os problemas vividos pela quintas a oitavas séries, enquanto nas séries iniciais se poderá
diversidade, enquanto se dá destaque apenas à sua veicular informações mais simples e promover aproximações
característica de ser um dos potenciais mais férteis, conceituais que favorecerão uma futura ampliação em
tipicamente brasileiros, levou por muito tempo a acreditar que abrangência e profundidade.
o racismo era uma mazela social que o Brasil soube evitar. A
teoria da integração das raças, tradicionalmente divulgada na Conhecimentos Sociológicos
maioria das escolas de ensino fundamental, deixou pouco ou Toda seleção curricular é marcada por determinantes e
nenhum espaço para que se encarassem as reais dificuldades fatores culturais, sociais e políticos, que podem ser analisados
das diferentes etnias no contexto social brasileiro. de forma isolada, para efeito de estudo, mas que se encontram
Para a compreensão da trajetória das etnias é necessário amalgamados no social. Conhecimentos sociológicos são
tratar de temas básicos: ocupação e conquista, escravização, indispensáveis na discussão da Pluralidade Cultural, pelas
imigração, migração. Outro aspecto particularmente relevante possibilidades que abrem de compreensão de processos
refere-se à importância do estudo dos continentes de origem complexos, onde se dão interações entre fenômenos de
dos diversos grupos que compõem a população brasileira. diferentes naturezas.
Tratar da presença indígena, desde tempos imemoriais em Atuando em campo social marcado historicamente pela
território nacional, é valorizar sua presença e reafirmar seus exclusão de grandes contingentes da população, a escola pode
direitos como povos nativos, como tratado na Constituição de fortalecer sua atuação tanto mais quanto seja conhecedora dos
1988. É preciso explicitar sua ampla e variada diversidade, de problemas presentes na estrutura socioeconômica, de como se
forma a corrigir uma visão deturpada que homogeneíza as dão as relações de dominação, qual o papel desempenhado
sociedades indígenas como se fossem de um único grupo, pela pelo universo cultural nesse processo.
justaposição aleatória de traços retirados de diversas etnias. Embora tenha sido muito salientado o papel de
Nesse sentido, a valorização dos povos indígenas faz-se tanto reprodutora de mecanismos de dominação e exclusão,
pela via da inclusão nos currículos de conteúdos que informem atribuído historicamente à escola, cabe lembrar que
sobre a riqueza de suas culturas e a influência delas sobre a potencializar suas possibilidades de resistência e
sociedade como um todo, quanto pela consolidação das escolas transformação depende também, ainda que não
indígenas que destacam, nos termos da Constituição, a exclusivamente, das opções e das práticas dos educadores.
pedagogia que lhes é própria. Nesse sentido, além das diversas contribuições da Sociologia,
aspectos particulares voltados para a discussão curricular têm
Compreender a formação das sociedades europeias e das sido desenvolvidos por autores que se ocupam da Sociologia
relações entre sua história, viagens de conquista, da Educação, Sociologia do Currículo. Nesses estudos, os
entrelaçamento de seus processos políticos com os do vínculos entre escola e democracia, escola e cidadania, e
continente americano, em particular América do Sul e Brasil, democracia e currículo são analisados, permitindo uma
auxiliará professores e alunos a formarem referencial não só reflexão voltada especificamente para o interior da escola e da
de conteúdos específicos, como também da estruturação de sala de aula, no que se refere a esses assuntos.
processos de influenciação recíproca. Isso é particularmente Os conhecimentos sociológicos permitem uma discussão
importante para o momento atual, quando o quadro acurada de como as diferenças étnicas, culturais e regionais
internacional interfere no cotidiano do cidadão de muitas e não podem ser reduzidas à dimensão socioeconômica de
variadas formas. classes sociais, assim como das formas como ambas se
O estudo histórico do continente africano, com sua retroalimentam.
complexidade milenar, é de extrema relevância como fator de A desatenção à questão da diferença cultural tem sido
informação e de formação voltada para a valorização dos instrumento que reforça e mantém a desigualdade social,
descendentes daqueles povos. Significa resgatar a história levando a escola a atuar, frequentemente, como mera
mais ampla, na qual os processos de mercantilização da transmissora de ideologias. Por outro lado, a injustiça
escravidão foram um momento, que não pode ser amplificado socioeconômica se apoia em preconceitos e discriminações de
a ponto que se perca a rica construção histórica da África. O caráter etnocultural de tal forma que, muitas vezes, não é
10
possível saber se a discriminação vem pelo fato étnico, pelo tradicional, desvio e perda, o que, do ponto de vista aqui
socioeconômico, ou por ambos. colocado, é uma ideia incorreta. É preciso compreender esse
A discussão sociológica colabora para a escola e o caráter intrínseco da mudança, do ponto de vista dos grupos
professor enfrentarem o desafio que lhes está colocado, qual culturais, diferente de intromissões de elementos externos
seja, o de ser parte de certa realidade social injusta, dela sofrer que sugerem ou impõem fatores estranhos à cultura, ou até de
influências, e, ainda assim, garantir a possibilidade de educar transplantes culturais.
o aluno como cidadão em formação, de forma que atue como A cultura pode assumir um sentido de sobrevivência,
sujeito sociocultural, voltado para mudanças, para a busca de estímulo e resistência. Quando valorizada, reconhecida como
caminhos de transformação social. parte indispensável das identidades individuais e sociais,
apresenta-se como componente do pluralismo próprio da vida
Conhecimentos Antropológicos democrática. Por isso, fortalecer a cultura própria de cada
Há relações presentes em diferentes grupos e sociedades grupo social, cultural e étnico que compõe a sociedade
humanas que não se explicam exclusivamente pelo brasileira, promover seu reconhecimento, valorização e
socioeconômico, nem se reduzem a estados afetivos e conhecimento mútuo, é fortalecer a igualdade, a justiça, a
psicológicos. São exemplos, a relação do ser humano com a liberdade, o diálogo e, portanto, a democracia.
organização de seu grupo, com o sagrado, o mágico, o Alguns temas, conceitos e termos da temática da
sobrenatural, a relação com o patrimônio cultural, tudo o que Pluralidade Cultural dependem intrinsecamente de
o precede e sucede. Trata-se de fatos que caracterizam a conhecimentos antropológicos, por referirem-se diretamente
existência da cultura, especificidade exclusiva da vida humana. à organização humana, na qual se coloca a diversidade.
A Antropologia caracteriza-se como o estudo das Assim, o termo “raça”, de uso corriqueiro e banal no
alteridades, no qual se afirma o reconhecimento do valor cotidiano, vem sendo evitado cada vez mais pelas ciências
inerente a cada cultura, por se tratar daquilo que é sociais pelos maus usos a que se prestou.
exclusivamente humano, como criação, e próprio de certo Nas ciências biológicas, raça é a subdivisão de uma espécie,
grupo, em certo momento, em certo lugar. Nesse sentido, cada cujos membros mostram com frequência um certo número de
cultura tem sua história, condicionantes, características, não atributos hereditários. Refere-se ao conjunto de indivíduos
cabendo qualquer classificação que sobreleve uma em cujos caracteres somáticos, tais como a cor da pele, o formato
detrimento de outra. do crânio e do rosto, tipo de cabelo, etc., são semelhantes e se
A variabilidade interna presente em cada cultura também transmitem por hereditariedade. O conceito de raça, portanto,
é objeto de estudo da Antropologia, tornando possível assenta-se em um conteúdo biológico, e foi utilizado na
compreender variáveis formas de organização humana, tentativa de demonstrar uma pretensa relação de
convivendo dentro de visões de mundo semelhantes. superioridade/inferioridade entre grupos humanos.
É também nos conhecimentos antropológicos que se A diversidade das sociedades humanas não se explica pela
encontram subsídios para entender algumas das questões diferença genética — a variação dos caracteres genéticos
mais difíceis de nosso tempo, que vai ao encontro do terceiro internos de qualquer grupo é muito grande —, mas sim pela
milênio. Em particular, a temática étnica, cada vez mais cultura. A divisão biológica da espécie humana não implica
presente em um mundo que se complexifica de maneira hierarquia, ainda que diferentes visões de mundo expliquem
crescente, sob aparência de homogeneização, assim como o de múltiplas formas a diversidade humana. Do ponto de vista
estudo das mutações culturais, que se apresentam com ritmos de dignidade, de Direitos Universais, há uma só humanidade.
distintos, em diferentes grupos. Convém lembrar que o uso do termo “raça” no senso
Assim, falar de cultura é tratar de permanências e comum é ainda muito difundido, variando da ideia de
mudanças, de manifestações patentes, que expressam, com reafirmação étnica, de forma a distinguir singularidades de
frequência, o latente — atuante, embora nem sempre potencial e demanda, como aquele que é feito comumente por
perceptível em termos objetivos. movimentos sociais, a usos ostensivamente pejorativos, que
É preciso considerar que não se trata, aqui, do sentido mais alimentam racismo e discriminação.
usual do termo cultura, empregado para definir certo saber, Cabe, aqui, introduzir o conceito de etnia, que substitui
ilustração, refinamento de maneiras. No sentido antropológico com vantagens o termo “raça”, já que tem base social e cultural.
do termo, afirma-se que todo e qualquer indivíduo nasce no “Etnia” ou “grupo étnico” designa um grupo social que se
contexto de uma cultura, não existindo homem sem cultura, diferencia de outros por sua especificidade cultural.
mesmo que não saiba ler, escrever e fazer contas. É como se se Atualmente o conceito de etnia se estende a todas as minorias
pudesse dizer que o homem é biologicamente incompleto: não que mantêm modos de ser distintos e formações que se
sobreviveria sozinho sem a participação das pessoas e do distinguem da cultura dominante. Assim, os pertencentes a
grupo que o gerou. uma etnia partilham de uma mesma visão de mundo, de uma
A cultura é o conjunto de códigos simbólicos reconhecíveis organização social própria, apresentam manifestações
pelo grupo: neles o indivíduo é formado desde o momento da culturais que lhe são características. “Etnicidade” é a condição
sua concepção; nesses mesmos códigos, durante a sua infância, de pertencer a um grupo étnico. É o caráter ou a qualidade de
aprende os valores do grupo; por eles são mais tarde um grupo étnico, que frequentemente se autodenomina
introduzidos nas obrigações da vida adulta, da maneira como comunidade. Já o “etnocentrismo” — tendência de alguém
cada grupo social as concebe. tomar a própria cultura como centro exclusivo de tudo, e de
A cultura, como código simbólico, apresenta-se como pensar sobre o outro também apenas a partir de seus próprios
dinâmica viva. Todas as culturas estão em constante processo valores e categorias — muitas vezes dificulta um diálogo
de reelaboração, introduzindo novos símbolos, atualizando intercultural, impedindo o acesso ao inesgotável aprendizado
valores. O grupo social transforma e reformula que as diversas culturas oferecem.
constantemente esses códigos, adaptando seu acervo Por isso, é errado, conceitual e eticamente, sustentar
tradicional às novas condições historicamente construídas argumentos de ordem racial/étnica para justificar
pela sociedade. A cultura não é algo fixo e cristalizado que o desigualdades socioeconômicas, dominação, abuso,
sujeito carrega por toda a sua vida como um peso que o exploração de certos grupos humanos. Historicamente, no
estigmatiza, mas é elemento que o auxilia a compor sua Brasil, tentou-se justificar, por essa via, injustiças cometidas
identidade. contra povos indígenas, contra africanos e seus descendentes,
Entretanto, o processo de mudança intrínseco a qualquer da barbárie da escravidão a formas contemporâneas de
cultura já foi entendido como desfiguração da cultura discriminação e exclusão, desses e outros grupos étnicos e
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culturais, em diferentes graus e formas. A escola deve referentes à mortalidade infantil, abortos e esterilizações, com
posicionar-se criticamente em relação a esses fatos, mediante as consequências daí advindas. Um tratamento enriquecedor
informações corretas, cooperando no esforço histórico de da temática dos direitos reprodutivos propicia também a
superação do racismo e da discriminação. análise da relação com questões de raça/etnia.
A escolha dos conteúdos e abordagens pode nortear-se por
Linguagens e Representações questões como: quais características são relevantes quanto à
Trata-se, aqui, de trabalhar diferentes linguagens que relação entre composição populacional, aspectos culturais,
ampliam as possibilidades de expressão para além da verbal, distribuição de renda, qualidade de vida e o papel da
forma predominante de comunicação na maioria das educação? Que relações perversas estabeleceram-se,
sociedades. Integrada aos conhecimentos antropológicos, historicamente, entre exclusão socioeconômica e
permitirá o entendimento da importância de diferentes determinados grupos, que estão exigindo ações específicas?
códigos linguísticos, de diferentes manifestações culturais e Que dados são relevantes para uma compreensão integrada de
sua compreensão no campo educacional, como fator de áreas sociais, como educação e saúde, por exemplo?
integração e expressão do aluno, respeitando suas origens. Esses conhecimentos poderão, assim, oferecer subsídios
Tratando especificamente da temática das línguas, abrem- preliminares que permitam construir a compreensão do
se muitas possibilidades de transversalização com Língua entrelaçamento de componentes sociais, culturais e
Portuguesa, por exemplo, pela valorização de diferentes populacionais na definição da qualidade de vida, além de
formas de linguagem oral e escrita, pelo respeito às possíveis formas de ação voltadas para a melhoria dessa
manifestações regionais, pela possibilidade de contato e qualidade.
integração com a diversidade de línguas e de linguagens
presentes na vida de crianças e adolescentes no Brasil. Conhecimentos Psicológicos e Pedagógicos
Conhecer a existência do uso de outras línguas diferentes Alguns aspectos presentes na escola, ligados à questão da
da Língua Portuguesa, idioma oficial, significa não só expectativa, da estigmatização, da autoestima, da conduta na
ampliação de horizontes, como também compreensão da atividade educativa, com a necessária reciprocidade entre
complexidade do País. A escola tem a possibilidade de educador e educando, fazem do tema Pluralidade Cultural fim
trabalhar com esse panorama rico e complexo, referindo-se à e meio.
existência, estrutura e uso dessas centenas de línguas. Pode, Do ponto de vista psicopedagógico, conhecimentos que
com isso, promover não só a reflexão metalinguística, como tragam ao professor a compreensão do fracasso e do sucesso
também a compreensão de como se constituem identidades e que se apresentam como sendo mais da escola e de sua
singularidades de diferentes povos e etnias. atividade didática, e não só dos alunos, levam à redefinição de
Saber da existência de diferentes formas de bilinguismos e procedimentos em sala de aula.
multilinguíssimos, presentes em diferentes regiões — assim Evitar atitudes que “produzam” o fracasso escolar é uma
como ver-se reconhecida e presente neste tema transversal, possibilidade aberta ao professor. Um dos aspectos mais
aberto às suas próprias singularidades regionais, étnicas e complexos quanto ao atendimento adequado à criança e ao
culturais — será extremamente relevante na construção desse adolescente refere-se às expectativas de homogeneização.
conhecimento e na valorização do que é a pluralidade cultural Várias contribuições se apresentam para a conduta
brasileira. São exemplos de tais bilinguismos e pedagógica, sendo, porém, a mais decisiva aquela que
multilinguíssimos as vivências de escolas indígenas, escolas de intervém nas situações de discriminação, seja qual for o
regiões de fronteiras geopolíticas do Brasil, escolas vinculadas motivo.
a grupos étnicos, existentes em particular em grandes centros Com relação à discriminação, sabe-se que um de seus
urbanos, regionalismos na fala cotidiana de tantas escolas fundamentos psicológicos é o medo. Falar sobre isso
espalhadas pelo País. explicitamente, como um dos muitos e complexos motivos que
Por outro lado, o desenvolvimento de outras linguagens levam à discriminação, permite que se possa tratar o medo
será muito importante, permitindo transversalizar, em como o que é de fato: manifestação da insegurança, muitas
particular, com Educação Física e Arte. A música, a dança, as vezes plantada em cada um de maneira arcaica, que pode ser
artes em geral, vinculadas aos diferentes grupos étnicos e a revertida apenas quando encarada e trabalhada.
composições regionais típicas, são manifestações culturais que É preciso esclarecer, também, que a discriminação ocorre
a criança e o adolescente poderão conhecer e vivenciar. Dessa como uma relação em que há dois polos. No polo que
forma enriquecerão seu conhecimento sobre a diversidade discrimina, o medo se apresenta como reação ao
presente no Brasil, enquanto desenvolvem seu próprio desconhecido, visto como ameaçador. Quem tem a cor da pele
potencial expressivo. diferente, ou fala de tradições — étnicas, religiosas, culturais
— desconhecidas, confronta seu interlocutor com sua própria
Conhecimentos Populacionais ignorância de mundos diferentes do seu. É a figura do
Embora estejam presentes ao longo da discussão referente “estranho”, do “estrangeiro”, que, por escapar da apreensão
à trajetória das etnias no Brasil, os conhecimentos comum, pode ser rotulado de “esquisito”.
populacionais precisam ser aqui lembrados, por constituírem Esse medo se alimenta de si mesmo, ou seja, quanto mais
fonte de informação relevante, sobretudo a partir do segundo medo, mais se busca distância do objeto do medo. Há estudos
ciclo. que demonstram que nos conflitos inter-étnicos, quanto maior
Dados estatísticos sobre a população brasileira conforme o medo, maior a violência presente nas reações.
distribuição regional, densidade demográfica, em relação com Uma forma de trabalhar e superar esse tipo de medo é com
dados como renda per capita, PIB per capita, fornecem um informação. Trata-se, portanto, de buscar conhecer aquele que
quadro informativo de como se vive no Brasil. Cotejado com atemoriza. Esse conhecimento se dá por intermédio de textos,
informações provenientes de levantamentos feitos pelos fitas de vídeo, jornais e boletins informativos de grupos
próprios alunos (via correspondência, imprensa, etc.), organizados pelas diferentes comunidades. Contudo, a fonte
significarão a possibilidade de um conhecimento mais mais importante de conhecimento desse “desconhecido que
adequado sobre o Brasil e oportunidade, nas séries finais, de atemoriza” é ele mesmo. Assim, trata-se de, potencializando ao
discussão, de debates acerca de políticas públicas alternativas máximo a prática da transversalidade, oferecer informações,
que beneficiem a vida da população. nas diversas áreas, que permitam esse conhecimento mútuo,
Da mesma forma, História e Geografia, Ciências Naturais, tanto dos alunos entre si, quanto em relação a concidadãos,
Orientação Sexual e Saúde possibilitam discutir dados brasileiros de diferentes origens socioculturais. Trata-se
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também de recuperar, de forma não-depreciativa, para a vinculação efetiva da escola a uma sociedade
conhecimentos que os grupos étnicos e sociais têm, democrática.
permitindo, ainda, que se evidencie o saber emergente, aquele
que está em elaboração como parte do processo social de Ensinar Pluralidade Cultural ou viver Pluralidade
conscientização e afirmação de identidades e singularidades. Cultural?
No polo em que se encontra aquele que é discriminado, o Pela educação pode-se combater, no plano das atitudes, a
medo se apresenta como ameaça permanente, na qual a discriminação manifestada em gestos, comportamentos e
discriminação se dirige à sua forma extrema, aquela na qual se palavras, que afasta e estigmatiza grupos sociais. Contudo, ao
busca eliminar fisicamente quem é discriminado. É importante mesmo tempo em que não se aceita que permaneça a atual
observar que a discriminação reveste-se sempre de conteúdos situação, em que a escola é cúmplice, ainda que só por omissão,
de violência, ainda que em sua forma simbólica. Tal violência não se pode esquecer que esses problemas não são
provoca o medo da eliminação, seja de forma extrema, seja essencialmente do âmbito comportamental, individual, mas
manifestada como exclusão. Assim, é decisivo propiciar das relações sociais, e como elas têm história e permanência.
elementos ao aluno para que repudie toda forma de exclusão O que se coloca, portanto, é o desafio de a escola se constituir
social, por meio sobretudo da prática cotidiana de um espaço de resistência, isto é, de criação de outras formas
procedimentos voltados para o princípio da equidade. de relação social e interpessoal mediante a interação entre o
trabalho educativo escolar e as questões sociais,
Ensino e Aprendizagem na Perspectiva da Pluralidade posicionando-se crítica e responsavelmente perante elas.
Cultural Assim, cabe à escola buscar construir relações de confiança
O tema Pluralidade Cultural propõe que sejam revistas e para que a criança possa perceber-se e viver, antes de mais
transformadas práticas arraigadas, inaceitáveis e nada, como ser em formação, e para que a manifestação de
inconstitucionais, enquanto se ampliam conhecimentos acerca características culturais que partilhe com seu grupo de origem
das gentes do Brasil, suas histórias, trajetórias em território possa ser trabalhada como parte de suas circunstâncias de
nacional, valores e vidas. O trabalho volta-se para a eliminação vida, que não seja impeditiva do desenvolvimento de suas
de causas de sofrimento, de constrangimento e, no limite, de potencialidades pessoais.
exclusão social da criança e do adolescente. Além disso, o tema É possível identificar no cotidiano as muitas manifestações
traz oportunidades pedagogicamente muito interessantes, que permitem o trabalho sobre pluralidade: os fatos da
motivadoras, que entrelaçam escola, comunidade local e comunidade ou comunidades do entorno escolar, as notícias
sociedade: ampliando questões do cotidiano para o âmbito de jornal, rádio e TV, as festas das localidades, estratégias de
cosmopolita e vice-versa, colocando-se assim, intercâmbio entre escolas de diferentes regiões do Brasil, e de
simultaneamente, como objetivo e como meio do processo diferentes municípios de um mesmo Estado.
educacional. A escola deve trabalhar atenta às limitações éticas. Assim,
Para os alunos, o tema da Pluralidade Cultural oferece quando se fala de alguma comunidade, é preciso ter certeza de
oportunidades de conhecimento de suas origens como que se referem a conhecimentos reconhecidos por essas
brasileiro e como participante de grupos culturais específicos. comunidades como verdadeiros. Então, como conseguir
Ao valorizar as diversas culturas que estão presentes no Brasil, informações? Nesse sentido, a prática de intercâmbio escolar
propicia ao aluno a compreensão de seu próprio valor, e da consulta a órgãos comunitários e de imprensa, inclusive
promovendo sua autoestima como ser humano pleno de das próprias comunidades, é instrumento pedagógico
dignidade, cooperando na formação de autodefesas a privilegiado. Com isso, será possível transformar a
expectativas indevidas que lhe poderiam ser prejudiciais. Por possibilidade de obter informações das comunidades em fator
meio do convívio escolar possibilita conhecimentos e de corresponsabilização social pelos rumos da discussão, da
vivências que cooperam para que se apure sua percepção de formação de crianças e adolescentes.
injustiças e manifestações de preconceito e discriminação que É importante abrir espaço para que a criança e o
recaiam sobre si mesmo, ou que venha a testemunhar — e para adolescente possam manifestar-se. Viver o direito à voz é
que desenvolva atitudes de repúdio a essas práticas. experiência pessoal e intransferível, que permite um oportuno
No âmbito instrumental, o tema permite a explicitação dos e rico trabalho de Língua Portuguesa. Assim também o
direitos da criança e do adolescente referentes ao respeito e à exercício efetivo do diálogo, voltado para a troca de
valorização de suas origens culturais, sem qualquer informações sobre vivências culturais e esclarecimentos
discriminação. Exige do professor atitudes compatíveis com acerca de eventuais preconceitos e estereótipos é componente
uma postura ética que valoriza a dignidade, a justiça, a fortalecedor do convívio democrático.
igualdade e a liberdade. Exige, também, a compreensão de que
o pleno exercício da cidadania envolve direitos e O cotidiano da escola permite viver algo da beleza da
responsabilidades de cada um para consigo mesmo e para com criação cultural humana em sua diversidade e multiplicidade.
os demais, assim como direitos e deveres coletivos. Traz, para Partilhar um cotidiano onde o simples “olhar-se” permite a
os conteúdos relevantes no conhecimento do Brasil, aquilo que constatação de que são todos diferentes traz a consciência de
diz respeito à complexidade da sociedade brasileira: sua que cada pessoa é única e, exatamente por essa singularidade,
riqueza cultural e suas contradições sociais. insubstituível.
Ao mostrar as diversas formas de organização social O simples fato de os alunos serem provenientes de
desenvolvidas por diferentes comunidades étnicas e diferentes famílias, diferentes origens, assim como cada
diferentes grupos sociais, explicita que a pluralidade é fator de professor ter, ele próprio, uma origem pessoal, e os outros
fortalecimento da democracia pelo adensamento do tecido auxiliares do trabalho escolar terem também, cada qual,
social que se dá, pelo fortalecimento das culturas e pelo diferentes histórias, permite desenvolver uma experiência de
entrelaçamento das diversas formas de organização social de interação “entre diferentes”, na qual cada um aprende e cada
diferentes grupos. um ensina. O convívio, aqui, é explicitação de aprendizagem a
Esse tema necessita, portanto, que a escola, como cada momento: o que um gosta e o outro não, o que um aprecia
instituição voltada para a constituição de sujeitos sociais e ao e o outro, talvez, despreze.
afirmar um compromisso com a cidadania, coloque em análise Aprender a posicionar-se de forma a compreender a
suas relações, suas práticas, as informações e os valores que relatividade de opiniões, preferências, gostos, escolhas, é
veicula. Assim, a temática da Pluralidade Cultural contribuirá aprender o respeito ao outro. Ensinar suas próprias práticas,
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histórias, gestos, tradições, é fazer-se respeitar ao dar-se a Como a história do preconceito é muito antiga, muitos dos
conhecer. grupos vítimas de discriminação desenvolveram um medo
Para o aluno, importa ter segurança da aceitação de suas profundo e uma cautela permanente como reação. O professor
características, ter disponível a abertura para que possa dar- precisa saber que a dor do grito silenciado é mais forte do que
se a conhecer naquelas que sejam experiências particulares a dor pronunciada. Poder expressar o que sentiu diante da
suas ou do grupo humano a que se vincule e receber incentivo discriminação significa a chance de ser resgatado da
para partilhar com seus colegas a vivência que tenha fora do humilhação, e de partilhar com colegas seus sentimentos. Ou
mundo da escola, mas que possa ali ser referida, como seja, trata-se de ensinar a dialogar sobre o respeito mútuo,
contribuição sua ao processo de aprendizagem. Resumindo, num gesto que pode transformar o significado do sofrimento,
trata-se de oferecer à criança, e construir junto com ela, um ao fazer do ocorrido ocasião de aprendizagem. A sensibilidade,
ambiente de respeito, pela aceitação; de interesse, pelo apoio aqui, exige a atenção para a reação que a criança esteja
à sua expressão; de valorização, pela incorporação das apresentando, para sua maior ou menor disposição para tratar
contribuições que venha a trazer. do assunto exatamente no momento ocorrido, ou em situação
É claro que aquilo que se apresenta para o aluno é idêntico posterior.
ao que se apresenta para o professor e demais funcionários da A intencionalidade se faz necessária como produto de uma
escola: uma organização escolar que saiba estar atenta às reflexão que permita ao professor perceber o papel que
singularidades dos profissionais que ali atuam, respeitando desempenha nessa questão. É também a capacidade de
suas características próprias, entendendo que esse respeito é perceber que tem o que trabalhar em si mesmo, e isso não o
a base para a atuação profissional, e tal respeito não é impede de trilhar, junto com seus alunos, o caminho da
incompatível com o respeito às normas institucionais, embora superação do preconceito e da discriminação. Trata-se de ter a
possa, às vezes, exigir flexibilidade em sua aplicação (por certeza de que cada um de seus gestos pode fazer a diferença
exemplo, os feriados religiosos). entre o reforço de atitudes inadequadas e a chance de abrir
Tal atuação não é simples e exige por parte do professor a novas possibilidades de diálogo, respeito e solidariedade.
consciência de que ele mesmo estará aprendendo, uma vez que
nessa área a prática do acobertamento é muito mais frequente A prática do desvelamento exige perspicácia para
que a prática do desvelamento. responder adequadamente a diferentes situações que serão,
A prática do acobertamento é a mais usual, porque assim na maioria das vezes, imprevisíveis. Devido a essa
se estabeleceu no campo social. Vive-se numa realidade na imprevisibilidade, a forma de desenvolver tal perspicácia é
qual a simples menção da palavra discriminação assusta, uma preparando-se com leituras, buscando informações e
vez que se convencionou aceitar sem discussões a ideia de que vivências, estando atento aos gestos do cotidiano, explicitando
no Brasil todos se entendem e são cordiais e pacíficos (o “mito valores, refletindo coletivamente na equipe de professores.
da democracia racial”). Mais ainda, muitas vezes a ideia de Desenvolve-se, assim, como uma forma de procurar entender
aceitar que o preconceito existe gera tanto o medo de ser a complexidade da vida e do comportamento humano.
acusado de ser preconceituoso como o medo de ser vítima de Essa informação deve ser buscada de maneira intencional
preconceito. Essa atitude é o que se chama, popularmente, de e pode se fazer de maneira lúdica: conhecer os cantos, as
“política de avestruz”, na qual, por se fazer de conta que um lendas, as danças, as peculiaridades nas quais uma criança
problema não existe, tem-se a expectativa de que ele deixe, de pode ensinar a outra aquilo que é característico do grupo
fato, de existir. humano do qual participa.
Na escola, a prática do acobertamento se dá quando se Esse conhecimento recíproco respeitoso é mais que verbal.
procura diluir as evidências de comportamento Deverá incluir linguagens diversificadas, bem como a
discriminatório, com desculpas muitas vezes evasivas. Um possibilidade de o aluno assumir o papel de educador naquilo
professor pode ter tratado um aluno mal “porque estava que lhe seja próprio. Nesse sentido, o professor deverá
nervoso”, ou a ofensa de uma criança contra outra é tratada cooperar, ao mesmo tempo em que aprende com o restante da
como se fosse um simples descuido, uma distração. classe. Observe-se que essa vivência, em si, será extremamente
importante, por trazer para o aluno a possibilidade de
A prática do desvelamento, que é decisiva na superação da constatar que a sociedade se apresenta, em sua complexidade,
discriminação, exige do professor informação, discernimento como um constante objeto de estudo e aprendizagem, onde
diante de situações indesejáveis, sensibilidade ao sentimento todos sempre têm a aprender.
do outro e intencionalidade definida na direção de colaborar Assim, a problemática que envolve a discriminação étnica,
na superação do preconceito e da discriminação. cultural e religiosa, ao invés de se manter em uma zona de
A informação deverá permitir um repertório básico sombra que leva à proliferação da ambiguidade nas falas e nas
referente à pluralidade étnica suficiente tanto para identificar atitudes, alimentando com isso o preconceito, pode ser trazida
o que é relevante para a situação escolar como para buscar à luz, como elemento de aprendizagem e crescimento do grupo
outras informações que se façam necessárias. escolar como um todo.
O discernimento é indispensável, de maneira particular,
quando ocorrem situações de discriminação no cotidiano da Ensinar a pluralidade ou viver a pluralidade?
escola. Enfrentar adequadamente o ocorrido, significa tanto Sem dúvida, pluralidade vive-se, ensina-se e aprende-se. É
não escapar para evasivas quanto não resvalar para o tom de trabalho de construção, no qual o envolvimento de todos se dá
acusação. Se o professor se cala, ou trata do ocorrido de pelo respeito e pela própria constatação de que, sem o outro,
maneira ambígua, estará reforçando o problema social; se nada se sabe sobre ele, a não ser o que a própria imaginação
acusa, pode criar sofrimento, rancor e ressentimento. Assim, fornece.
discernir o ocorrido, no convívio, é tratar com firmeza a ação
discriminatória, esclarecendo o que é o respeito mútuo, como Questões
se pratica a solidariedade, buscando alguma atividade que
possa exemplificar o que diz, com algo que faça, junto com seus 01. (Prefeitura de Itaquitinga - Pedagogo IDHTEC -
alunos. 2016) A Lei nº 10.639/2003, torna obrigatório o estudo da
Aqui se coloca a sensibilidade em relação ao outro. História e Cultura Afro Brasileira e Africana:
Compreender que aquele que é alvo da discriminação sofre de (A) Nos estabelecimentos oficiais de ensino e nas
fato, e de maneira profunda, é condição para que o professor, comunidades indígenas e quilombolas.
em sala de aula, possa escutar até mesmo o que não foi dito.
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(B) Na Educação infantil e ensino fundamental de escolas (E) A forma como a diversidade é colocada na LDB, apesar
públicas. de importante, ainda é insuficiente em relação às necessidades
(C) Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, do tema e sua relevância social.
públicos e privados.
(D) Nas escolas confessionais e de movimentos populares. 05. (IF/PE - Assistente de Alunos -2016) Temos, no Brasil,
(E) Em todos os níveis e modalidades de ensino através da uma grande diversidade cultural e racial. Descendentes de
criação de uma nova disciplina curricular. povos africanos e de índios brasileiros, de imigrantes
europeus, asiáticos e latino-americanos compõem o cenário
02. (UNIRIO - Pedagogo - CESGRANRIO/2016) Os brasileiro. Por conta disso, podemos que afirmar que:
currículos têm uma estreita relação com a história e a (A) atualmente, o termo “pluralidade cultural” não se
sociedade, refletindo questões sociais de um determinado aplica ao Brasil por causa da Globalização.
momento. Os currículos são produtores de sujeitos dotados de (B) a mistura de todas estas raças e etnias não caracteriza
classe, etnia e gênero. Nessa perspectiva, o papel do pedagogo a identidade do povo brasileiro.
na instituição de ensino deve ser o de: (C) o Brasil é um país dotado de uma ampla “pluralidade
(A) Premiar os docentes que cumpram o cronograma cultural”, ou seja, diferentes culturas foram e são produzidas
estabelecido. pelos grupos sociais que fazem parte da nossa história.
(B) Separar os alunos pelas diferenças no seu ritmo de (D) a diversidade cultural e racial não interfere nas formas
aprendizagem. com que os habitantes do Brasil organizaram sua vida social e
(C) Treinar os professores segundo aulas-padrão. política.
(D) Incrementar a competição entre as diferentes (E) ações racistas e discriminatórias não existem na
disciplinas do currículo. sociedade brasileira por causa da grande diversidade cultural
(E) Promover a discussão docente sobre o significado dos e racial do país.
conteúdos do currículo.
06. (SME/SP - Professor de Ensino Fundamental II e
03. Segundo SILVA (1999), o currículo é o espaço em que Médio – Sociologia – FGV/2016) Observe a imagem a seguir:
os diferentes significados sobre o social e político fazem
sentido. Isso só é possível mediante a um currículo...
(A) que tem como cerne os elementos do processo de
ensino e aprendizagem, principalmente a didática e a
avaliação.
(B) no qual possamos identificar grupos prioritários,
evidenciando o potencial de um todo.
(C) que determinados grupos sociais, expressam sua visão
de mundo, seu projeto social, na qual sua representação se dá
através de um conjunto de práticas que favorecem a produção,
evidenciando a construção de identidades sociais e culturais.
(D) onde é possível torná-lo em um espaço de crítica
cultural, abrindo as portas, na escola, às diferentes
manifestações da cultura popular.
(E) cuja organização e gestão, as abordagens disciplinares,
pluridisciplinar, interdisciplinar e transdisciplinar possuem
papel secundário.
A partir da imagem, registro de uma atividade realizada no
04. (ESAF - MF – Pedagogo) Do ponto de vista cultural, a Ensino Fundamental, é correto afirmar:
diversidade pode ser entendida como a construção histórica, (A) Reforça a hegemonia de um conhecimento em
cultural e social das diferenças. As diferenças são também detrimento de outro e cria um imaginário que vê as culturas de
construídas pelos sujeitos sociais ao longo do processo forma hierarquizada e inferior.
histórico e cultural, nos processos de adaptação do homem e (B) Apresenta uma situação típica do currículo
da mulher ao meio social e no contexto das relações de poder. monocultural.
Sendo assim, mesmo os aspectos tipicamente observáveis, que (C) Comprova que o processo de hierarquização de
aprendemos a ver como diferentes desde o nosso nascimento, conhecimentos foi superado.
só passaram a ser percebidos dessa forma, porque nós, seres (D) Ilustra e introduz uma nova disciplina nos currículos
humanos e sujeitos sociais, no contexto da cultura, assim os escolares.
nomeamos e identificamos. (E) Ilustra a construção de um currículo intercultural, o
Em relação ao conceito de diversidade e sua relação com o lugar da diversidade nas práticas curriculares
currículo, assinale a opção incorreta.
(A) A diversidade é permitida na Lei de Diretrizes e Bases 07. (SME/SP - Professor de Ensino Fundamental II e
da Educação Nacional – LDB n. 9.394/96 em função da Médio - Matemática - FGV/2016) A coordenadora pedagógica
possibilidade de intervenção das regiões e suas do Ensino Médio reuniu um grupo de professores para analisar
especificidades na criação do currículo escolar. o currículo da escola. Ela abriu a reunião propondo aos
(B) Conviver com as diferenças é construir relações de professores uma visão ampliada do conceito de currículo.
respeito e de interpelações que irão contribuir para um espaço Segundo a coordenadora, a importância do currículo para a
hierarquicamente diferenciado entre os participantes. escolaridade reside no fato de que ele é:
(C) A presença da parte diversificada no currículo das (A) um plano de estudos pré-determinado pela escola que
escolas acaba por ocupar lugar menor na relação hierárquica articula as diferentes áreas de conhecimento em um projeto
com os demais conhecimentos. comum.
(D) A diversidade, presente em boa parte dos currículos, (B) a lista de conteúdos a serem ensinados por cada
aparece nos documentos como um tema, deixando de ser um disciplina da unidade escolar.
eixo central de orientação curricular. (C) a expressão do projeto cultural e educacional que a
unidade escolar pretende desenvolver.
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(D) uma proposta estruturada a partir de uma lista 03. Resposta: C
fragmentada de conteúdo. O currículo representa um conjunto de práticas que
(E) o conjunto de procedimentos proposto pela gestão propiciam a produção, a circulação e o consumo de
escolar com um caráter disciplinador das atividades de ensino. significados no espaço social e que contribuem, intensamente,
para a construção de identidades sociais e culturais. Desta
08. (SED/SC - Professor - Conhecimentos Comuns - maneira, ele age como um dispositivo de grande efeito no
ACAFE) Sobre a diversidade Skliar e Duschatzky (2001) dizem processo de construção da identidade do indivíduo.
que muitas vezes concebemos, “o outro como fonte de todo
mal”. O documento do MEC, Currículo Conhecimento e Cultura, 04. Resposta: B
explora como esta máxima aparece nas relações escolares. Conviver com as diferenças é construir relações de
Nesse sentido é correto afirmar, exceto: respeito e de interpelações que irão contribuir para um espaço
(A) Quando nos situamos como professores (as), diante harmonioso, de maneira que todos possam compreender e
dos (as) alunos (as) com base em estereótipos e expectativas respeitar as diferenças entre si.
diferenciadas segundo a origem social e as características
culturais dos grupos de referência. 05. Resposta: C
(B) Ao atribuímos o fracasso escolar dos (as) alunos (as) às A pluralidade de valores e universos culturais, para a
suas características sociais ou étnicas. necessidade de um maior intercâmbio cultural no interior de
(C) Quando diferenciamos os tipos de escolas segundo a cada sociedade e entre diferentes sociedades, para a
origem social dos (as) estudantes, considerando que alguns conveniência de resgatar manifestações culturais de
têm maior potencial que outros e, para desenvolvermos uma determinados grupos cujas identidades se encontram
educação de qualidade, não podemos misturar estudantes de ameaçadas, para a importância da participação de todos no
diferentes potenciais. esforço por tornar o mundo menos opressivo e injusto, para a
(D) Ao privilegiarmos todas as formas de comunicação urgência de se reduzirem discriminações e preconceitos.
humana, como a corporal e a artística. 06. Resposta: E
(E) Quando valorizamos exclusivamente o racional e É na escola que, através da prática, se proporciona a
desvalorizamos os aspectos afetivos presentes nos processos diversidade cultural.
educacionais.
07. Resposta: C
09. (SEDF - Professor de Educação Básica - CESPE/2017) Fundamentamo-nos, nesse propósito, em estudos,
A respeito do Currículo em Movimento da Educação Básica, pesquisas, práticas e depoimentos de docentes
julgue o item subsequente. As relações de gênero, ao serem comprometidos com uma escola cada vez mais democrática.
trabalhadas como tema transversal da educação básica, devem Nossa intenção é convidar o profissional da educação a
ser abordadas como fenômeno de ordem cultural. engajar- se no instigante processo de pensar e desenvolver
( ) Certo ( ) Errado currículos para essa escola.
01. Resposta: C
Lei de Diretrizes e Bases da Educação com a sanção da 1.3 Desenvolvimento
conhecida lei 10.639, que determinou o seguinte artigo histórico das concepções
(dentre outros): Art. 26 – A. Nos estabelecimentos de ensino
fundamental e médio, oficiais e particulares, torna-se pedagógicas no Brasil;
obrigatório o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira.
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Genericamente, podemos dizer que a perspectiva Conteúdos de ensino - são os conhecimentos e valores
redentora se traduz pelas pedagogias liberais e a perspectiva sociais acumulados pelas gerações adultas e repassados ao
transformadora pelas pedagogias progressistas. Essa aluno como verdades. As matérias de estudo visam preparar o
discussão tem uma importância prática da maior relevância, aluno para a vida, são determinadas pela sociedade e
pois permite a cada professor situar-se teoricamente sobre ordenadas na legislação. Os conteúdos são separados da
suas opções, articulando-se e autodefinindo-se. experiência do aluno e das realidades sociais, valendo pelo
valor intelectual, razão pela qual a pedagogia tradicional é
Assim vamos organizar o conjunto das pedagogias em dois criticada como intelectualista e, às vezes, como enciclopédica.
grupos:
Métodos - baseiam-se na exposição verbal da matéria e/ou
demonstração. Tanto a exposição quanto a análise são feitas
Pedagogia Pedagogia pelo professor, observados os seguintes passos:
Liberal Progressista - Preparação do aluno (definição do trabalho, recordação
da matéria anterior, despertar interesse);
- Tradicional - Libertadora - Apresentação (realce de pontos-chaves, demonstração);
- Renovada Progressivista - Libertária - Associação (combinação do conhecimento novo com o já
- Renovada Não Diretiva -Crítico-Social dos Conteúdos conhecido por comparação e abstração);
- Tecnicista - Generalização (dos aspectos particulares chega-se ao
conceito geral, é a exposição sistematizada);
- Aplicação (explicação de fatos adicionais e/ou resoluções
de exercícios).
É evidente que tanto as tendências quanto suas
manifestações não são puras nem mutuamente exclusivas o
A ênfase nos exercícios, na repetição de conceitos ou
que, aliás, é a limitação principal de qualquer tentativa de
fórmulas na memorização visa disciplinar a mente e formar
classificação. Em alguns casos as tendências se
hábitos.
complementam, em outros, divergem. De qualquer modo, a
classificação e sua descrição poderão funcionar como um
Relacionamento professor-aluno - predomina a autoridade
instrumento de análise para o professor avaliar a sua prática
do professor que exige atitude receptiva dos alunos e impede
de sala de aula.
qualquer comunicação entre eles no decorrer da aula. O
professor transmite o conteúdo na forma de verdade a ser
Pedagogia Liberal
absorvida; em consequência, a disciplina imposta é o meio
A Pedagogia Liberal é voltada para o sistema capitalista e
mais eficaz para assegurar a atenção e o silêncio.
esconde a realidade das diferenças entre as classes sociais.
Nessa pedagogia, a escola tem que preparar os indivíduos para
Pressupostos de aprendizagem - a ideia de que o ensino
a sociedade, de acordo com as suas aptidões individuais, por
consiste em repassar os conhecimentos para o espírito da
isso os indivíduos precisam aprender a se adaptar aos valores
e às normas vigentes na sociedade de classes através do criança é acompanhada de uma outra: a de que a capacidade
de assimilação da criança é idêntica à do adulto, apenas menos
desenvolvimento da cultura individual.
desenvolvida. Os programas, então, devem ser dados numa
progressão lógica, estabelecida pelo adulto, sem levar em
A ênfase no aspecto cultural esconde a realidade das
conta as características próprias de cada idade. A
diferenças de classes, pois, embora difunda a ideia de
igualdade de oportunidades, não leva em conta a desigualdade aprendizagem, assim, é receptiva e mecânica, para o que se
recorre frequentemente à coação. A retenção do material
de condições. Historicamente, a educação liberal iniciou-se
ensinado é garantida pela repetição de exercícios sistemáticos
com a pedagogia tradicional e, por razões de recomposição da
e recapitulação da matéria. A transferência da aprendizagem
hegemonia da burguesia, evoluiu para a pedagogia renovada
depende do treino; é indispensável a retenção, a fim de que o
(também denominada Escola Nova ou Ativa), o que não
aluno possa responder às situações novas de forma
significou a substituição de uma pela outra, pois ambas
semelhante às respostas dadas em situações anteriores.
conviveram e convivem na prática escolar.
17
- a Renovada Progressivista, ou Pragmatista, Pressupostos de aprendizagem - a motivação depende da
principalmente na forma difundida pelos pioneiros da força de estimulação do problema e das disposições internas e
educação nova, entre os quais se destaca Anísio Teixeira interesses do aluno. Assim, aprender se torna uma atividade
(deve-se destacar, também a influência de Montessori, Decroly de descoberta, é uma autoaprendizagem, sendo o ambiente
e, de certa forma, Piaget); apenas o meio estimulador. É retido o que se incorpora à
atividade do aluno pela descoberta pessoal; o que é
- a Renovada Não Diretiva orientada para os objetivos de incorporado passa a compor a estrutura cognitiva para ser
auto realização (desenvolvimento pessoal) e para as relações empregado em novas situações.
interpessoais, na formulação do psicólogo norte-americano
Carl Rogers. Avaliação - é fluida e tenta ser eficaz à medida que os
esforços e os êxitos são prontos e explicitamente reconhecidos
Tendência Liberal Renovada Progressivista pelo professor.
Papel da escola - a finalidade da escola é adequar as
necessidades individuais ao meio social e, para isso, ela deve Manifestações na prática escolar - os princípios da
se organizar de forma a retratar, o quanto possível, a vida. pedagogia progressivista vêm sendo difundidos, em larga
Todo ser dispõe dentro de si mesmo de mecanismos de escala, nos cursos de licenciatura, e muitos professores sofrem
adaptação progressiva ao meio e de uma consequente sua influência. Entretanto, sua aplicação é reduzidíssima, não
integração dessas formas de adaptação no comportamento. somente por falta de condições objetivas como também
Tal integração se dá por meio de experiências que devem porque se choca com uma prática pedagógica basicamente
satisfazer, ao mesmo tempo, os interesses do aluno e as tradicional. Alguns métodos são adotados em escolas
exigências sociais. À escola cabe suprir as experiências que particulares, como o método Montessori, o método dos centros
permitam ao aluno educar-se, num processo ativo de de interesse de Decroly, o método de projetos de Dewey. O
construção e reconstrução do objeto, numa interação entre ensino baseado na psicologia genética de Piaget tem larga
estruturas cognitivas do indivíduo e estruturas do ambiente. aceitação na educação pré-escolar. Pertencem, também, à
tendência progressivista muitas das escolas denominadas
Conteúdos de ensino - como o conhecimento resulta da ação “experimentais”, as “escolas comunitárias” e mais
a partir dos interesses e necessidades, os conteúdos de ensino remotamente (década de 60) a “escola secundária moderna”,
são estabelecidos em função de experiências que o sujeito na versão difundida por Lauro de Oliveira Lima.
vivencia frente a desafios cognitivos e situações
problemáticas. Dá-se, portanto, muito mais valor aos Tendência Liberal Renovada Não Diretiva
processos mentais e habilidades cognitivas do que a conteúdos Papel da escola - formação de atitudes, razão pela qual deve
organizados racionalmente. Trata-se de “aprender a estar mais preocupada com os problemas psicológicos do que
aprender”, ou seja, é mais importante o processo de aquisição com os pedagógicos ou sociais. Todo esforço está em
do saber do que o saber propriamente dito. estabelecer um clima favorável a uma mudança dentro do
indivíduo, isto é, a uma adequação pessoal às solicitações do
Método de ensino - a ideia de “aprender fazendo” está ambiente. Rogers26 considera que o ensino é uma atividade
sempre presente. Valorizam-se as tentativas experimentais, a excessivamente valorizada; para ele os procedimentos
pesquisa, a descoberta, o estudo do meio natural e social, o didáticos, a competência na matéria, as aulas, livros, tudo tem
método de solução de problemas. Embora os métodos variem, muito pouca importância, face ao propósito de favorecer à
as escolas ativas ou novas (Dewey, Montessori, Decroly, pessoa um clima de autodesenvolvimento e realização pessoal,
Cousinet e outros) partem sempre de atividades adequadas à o que implica estar bem consigo próprio e com seus
natureza do aluno e às etapas do seu desenvolvimento. Na semelhantes. O resultado de uma boa educação é muito
maioria delas, acentua-se a importância do trabalho em grupo semelhante ao de uma boa terapia.
não apenas como técnica, mas como condição básica do
desenvolvimento mental. Os passos básicos do método ativo Conteúdos de ensino - a ênfase que esta tendência põe nos
são: processos de desenvolvimento das relações e da comunicação
- Colocar o aluno numa situação de experiência que tenha torna secundária a transmissão de conteúdos. Os processos de
um interesse por si mesma; ensino visam mais facilitar aos estudantes os meios para
- O problema deve ser desafiante, como estímulo à buscarem por si mesmos os conhecimentos que, no entanto,
reflexão; são dispensáveis.
- O aluno deve dispor de informações e instruções que lhe
permitam pesquisar a descoberta de soluções; Métodos de ensino - os métodos usuais são dispensados,
- Soluções provisórias devem ser incentivadas e prevalecendo quase que exclusivamente o esforço do
ordenadas, com a ajuda discreta do professor; professor em desenvolver um estilo próprio para facilitar a
- Deve-se garantir a oportunidade de colocar as soluções à aprendizagem dos alunos. Rogers explicita algumas das
prova, a fim de determinar sua utilidade para a vida. características do professor “facilitador”: aceitação da pessoa
do aluno, capacidade de ser confiável, receptivo e ter plena
Relacionamento professor-aluno - não há lugar privilegiado convicção na capacidade de autodesenvolvimento do
para o professor; antes, seu papel é auxiliar o desenvolvimento estudante. Sua função restringe-se a ajudar o aluno a se
livre e espontâneo da criança; se intervém, é para dar forma ao organizar, utilizando técnicas de sensibilização onde os
raciocínio dela. A disciplina surge de uma tomada de sentimentos de cada um possam ser expostos, sem ameaças.
consciência dos limites da vida grupal; assim, aluno Assim, o objetivo do trabalho escolar se esgota nos processos
disciplinado é aquele que é solidário, participante, respeitador de melhor relacionamento interpessoal, como condição para o
das regras do grupo. Para se garantir um clima harmonioso crescimento pessoal.
dentro da sala de aula é indispensável um relacionamento
positivo entre professores e alunos, uma forma de instaurar a Relacionamento professor-aluno - propõe uma educação
“vivência democrática” tal qual deve ser a vida em sociedade. centrada no aluno, visando formar sua personalidade através
da vivência de experiências significativas que lhe permitam
18
desenvolver características inerentes à sua natureza. O restrita aos especialistas; a “aplicação” é competência do
professor é um especialista em relações humanas, ao garantir processo educacional comum.
o clima de relacionamento pessoal e autêntico. “Ausentar-se” é A escola atua, assim, no aperfeiçoamento da ordem social
a melhor forma de respeito e aceitação plena do aluno. Toda vigente (o sistema capitalista), articulando-se diretamente
intervenção é ameaçadora, inibidora da aprendizagem. com o sistema produtivo; para tanto, emprega a ciência da
mudança de comportamento, ou seja, a tecnologia
Pressupostos de aprendizagem - a motivação resulta do comportamental. Seu interesse imediato é o de produzir
desejo de adequação pessoal na busca da auto realização; é, indivíduos “competentes” para o mercado de trabalho,
portanto um ato interno. A motivação aumenta, quando o transmitindo, eficientemente, informações precisas, objetivas
sujeito desenvolve o sentimento de que é capaz de agir em e rápidas.
termos de atingir suas metas pessoais, isto é, desenvolve a A pesquisa científica, a tecnologia educacional, a análise
valorização do “eu”. Aprender, portanto, é modificar suas experimental do comportamento garantem a objetividade da
próprias percepções; daí que apenas se aprende o que estiver prática escolar, uma vez que os objetivos instrucionais
significativamente relacionado com essas percepções. Resulta (conteúdos) resultam da aplicação de leis naturais que
que a retenção se dá pela relevância do aprendido em relação independem dos que a conhecem ou executam.
ao “eu”, ou seja, o que não está envolvido com o “eu” não é
retido e nem transferido. Conteúdos de ensino - são as informações, princípios
científicos, leis etc., estabelecidos e ordenados numa
Avaliação - perde inteiramente o sentido, privilegiando-se sequência lógica e psicológica por especialistas. É matéria de
a autoavaliação. ensino apenas o que é redutível ao conhecimento observável e
mensurável; os conteúdos decorrem, assim, da ciência
Manifestações na prática escolar - o inspirador da objetiva, eliminando-se qualquer sinal de subjetividade. O
pedagogia não diretiva é C. Rogers, na verdade mais psicólogo material instrucional encontra-se sistematizado nos manuais,
clínico que educador. Suas ideias influenciam um número nos livros didáticos, nos módulos de ensino, nos dispositivos
expressivo de educadores e professores, principalmente audiovisuais etc.
orientadores educacionais e psicólogos escolares que se
dedicam ao aconselhamento. Menos recentemente, podem-se Métodos de ensino - consistem nos procedimentos e
citar também tendências inspiradas na escola de Summerhill técnicas necessárias ao arranjo e controle nas condições
do educador inglês A. Neill. ambientais que assegurem a transmissão/recepção de
informações. Se a primeira tarefa do professor é modelar
- Tendência Liberal Tecnicista respostas apropriadas aos objetivos instrucionais, a principal
A tendência Liberal Tecnicista subordina a educação à é conseguir o comportamento adequado pelo controle do
sociedade, tendo como função a preparação de “recursos ensino; daí a importância da tecnologia educacional.
humanos” (mão-de-obra para a indústria). A sociedade
industrial e tecnológica estabelece (cientificamente) as metas A Tecnologia Educacional é a “aplicação sistemática de
econômicas, sociais e políticas, a educação treina (também princípios científicos comportamentais e tecnológicos a
cientificamente) nos alunos os comportamentos de problemas educacionais, em função de resultados efetivos,
ajustamento a essas metas. utilizando uma metodologia e abordagem sistêmica
No tecnicismo acredita-se que a realidade contém em si abrangente”28.
suas próprias leis, bastando aos homens descobri-las e aplicá-
las. Dessa forma, o essencial não é o conteúdo da realidade, Qualquer sistema instrucional (há uma grande variedade
mas as técnicas (forma) de descoberta e aplicação. A deles) possui três componentes básicos: objetivos
tecnologia (aproveitamento ordenado de recursos, com base instrucionais operacionalizados em comportamentos
no conhecimento científico) é o meio eficaz de obter a observáveis e mensuráveis, procedimentos instrucionais e
maximização da produção e garantir um ótimo funcionamento avaliação.
da sociedade; a educação é um recurso tecnológico por
excelência. As etapas básicas de um processo de ensino e de
Ela “é encarada como um instrumento capaz de promover, aprendizagem são:
sem contradição, o desenvolvimento econômico pela - Estabelecimento de comportamentos terminais, através
qualificação da mão-de-obra, pela redistribuição da renda, de objetivos instrucionais;
pela maximização da produção e, ao mesmo tempo, pelo - Análise da tarefa de aprendizagem, a fim de ordenar
desenvolvimento da ‘consciência política’ indispensável à sequencialmente os passos da instrução;
manutenção do Estado autoritário”27. Utiliza-se basicamente - Executar o programa, reforçando gradualmente as
do enfoque sistêmico, da tecnologia educacional e da análise respostas corretas correspondentes aos objetivos.
experimental do comportamento.
O essencial da tecnologia educacional é a programação por
Papel da escola - a escola funciona como modeladora do passos sequenciais empregada na instrução programada, nas
comportamento humano, através de técnicas específicas. À técnicas de microensino, multimeios, módulos etc. O emprego
educação escolar compete organizar o processo de aquisição da tecnologia instrucional na escola pública aparece nas
de habilidades, atitudes e conhecimentos específicos, úteis e formas de: planejamento em moldes sistêmicos, concepção de
necessários para que os indivíduos se integrem na máquina do aprendizagem como mudança de comportamento,
sistema social global. Tal sistema social é regido por leis operacionalização de objetivos, uso de procedimentos
naturais (há na sociedade a mesma regularidade e as mesmas científicos (instrução programada, audiovisuais, avaliação etc.,
relações funcionais observáveis entre os fenômenos da inclusive a programação de livros didáticos).
natureza), cientificamente descobertas. Basta aplicá-las. A
atividade da “descoberta” é função da educação, mas deve ser Relacionamento professor-aluno - são relações
estruturadas e objetivas, com papéis bem definidos: o
27 KUENZER, AcáciaA; MACHADO, Lucília R. S. “Pedagogia Tecnicista”, in Guiomar 28 AURICCHIO, Lígia O. Manual de tecnologia educacional, p.25.
N. de MELLO (org.), Escola nova, tecnicismo e educação compensatória, p. 34.
19
professor administra as condições de transmissão da matéria, eclética em torno de princípios pedagógicos assentados nas
conforme um sistema instrucional eficiente e efetivo em pedagogias tradicional e renovada.
termos de resultados da aprendizagem; o aluno recebe,
aprende e fixa as informações. O professor é apenas um elo de Pedagogia Progressista
ligação entre a verdade científica e o aluno, cabendo-lhe “Formulação de inspiração marxista que influenciou
empregar o sistema instrucional previsto. O aluno é um diversos pedagogos brasileiros em fins de 1970. Trabalha com
indivíduo responsivo, não participa da elaboração do a educação na perspectiva da luta de classes, ou seja, a escola
programa educacional. Ambos são espectadores frente à pode e deve servir na luta contra o sistema capitalista, visando
verdade objetiva. A comunicação professor-aluno tem um a construção do socialismo. Dessa forma, sua metodologia tem
sentido exclusivamente técnico, que é o de garantir a eficácia inspiração na teoria do conhecimento marxista, pela dialética
da transmissão do conhecimento. Debates, discussões, materialista, pelo movimento de continuidade e ruptura.
questionamentos são desnecessários, assim como pouco Na sala de aula, parte-se da necessidade e aspirações dos
importam as relações afetivas e pessoais dos sujeitos estudantes, com seu cotidiano, com o objetivo de estimular
envolvidos no processo de ensino e de aprendizagem. rupturas, sair do imediato e chegar ao teórico e abstrato.
Depois desse movimento, espera-se um retorno ao real com
Pressupostos de aprendizagem29 - as teorias de uma nova visão que possibilite uma nova ação sobre ele.
aprendizagem que fundamentam a pedagogia tecnicista dizem
que aprender é uma questão de modificação do desempenho: Foi proposta pelo educador francês Georges Snyders31 em
o bom ensino depende de organizar eficientemente as pelo menos quatro de suas obras: Pedagogia progressista, Para
condições estimuladoras, de modo a que o aluno saia da onde vão as pedagogias não-diretivas? Alegria na escola e
situação de aprendizagem diferente de como entrou. Ou seja, Alunos felizes.
o ensino é um processo de condicionamento através do uso de
reforçamento das respostas que se quer obter. Assim, os Opõe-se ao ensino tecnicista, de linha autoritária, adotado
sistemas instrucionais visam ao controle do comportamento por volta de 1970, em que professores e alunos executam
individual face objetivos preestabelecidos. projetos elaborados em gabinetes e desvinculados do contexto
Trata-se de um enfoque diretivo do ensino, centrado no social e político. Ou seja, a pedagogia progressista procura
controle das condições que cercam o organismo que se formar cidadãos conscientes e participativos na vida da
comporta. O objetivo da ciência pedagógica, a partir da sociedade, que leve o aluno a refletir, a desenvolver o espírito
psicologia, é o estudo científico do comportamento: descobrir crítico e criativo e a relacionar o aprendizado a seu contexto
as leis naturais que presidem as reações físicas do organismo social.”32
que aprende, a fim de aumentar o controle das variáveis que o
afetam. A pedagogia progressista tem-se manifestado em três
Os componentes da aprendizagem - motivação, retenção, tendências:
transferência - decorrem da aplicação do comportamento - a libertadora, mais conhecida como pedagogia de Paulo
operante. Segundo Skinner, o comportamento aprendido é Freire;
uma resposta a estímulos externos, controlados por meio de - a libertária, que reúne os defensores da autogestão
reforços que ocorrem com a resposta ou após a mesma: “Se a pedagógica;
ocorrência de um (comportamento) operante é seguida pela - a crítico-social dos conteúdos que, diferentemente das
apresentação de um estímulo (reforçador), a probabilidade de anteriores, acentua a primazia dos conteúdos no seu confronto
reforçamento é aumentada”. Entre os autores que contribuem com as realidades sociais.
para os estudos de aprendizagem destacam-se: Skinner,
Gagné, Bloon e Mager. As versões libertadora e libertária têm em comum o
antiautoritarismo, a valorização da experiência vivida como
Manifestações na prática escolar30 - a influência da base da relação educativa e a ideia de autogestão pedagógica.
pedagogia tecnicista remonta à 2ª metade dos anos 50 Em função disso, dão mais valor ao processo de aprendizagem
(PABAEE - Programa Brasileiro-americano de Auxílio ao grupal (participação em discussões, assembleias, votações) do
Ensino Elementar). Entretanto foi introduzida mais que aos conteúdos de ensino. Como decorrência, a prática
efetivamente no final dos anos 60 com o objetivo de adequar o educativa somente faz sentido numa prática social junto ao
sistema educacional à orientação político-econômica do povo, razão pela qual preferem as modalidades de educação
regime militar: inserir a escola nos modelos de racionalização popular “não-formal”.
do sistema de produção capitalista.
Quando a orientação escolanovista cede lugar à tendência A tendência da pedagogia crítico-social dos conteúdos
tecnicista, pelo menos no nível de política oficial; os marcos de propõe uma síntese superadora das pedagogias tradicional e
implantação do modelo tecnicista são as leis 5.540/68 e renovada, valorizando a ação pedagógica enquanto inserida na
5.692/71, que reorganizam o ensino superior e o ensino de 1º prática social concreta. Entende a escola como mediação entre
e 2º graus. o individual e o social, exercendo aí a articulação entre a
A despeito da máquina oficial, entretanto, não há indícios transmissão dos conteúdos e a assimilação ativa por parte de
seguros de que os professores da escola pública tenham um aluno concreto (inserido num contexto de relações
assimilado a pedagogia tecnicista, pelo menos em termos de sociais); dessa articulação resulta o saber criticamente
ideário. A aplicação da metodologia tecnicista (planejamento, reelaborado.
livros didáticos programados, procedimentos de avaliação
etc.) não configura uma postura tecnicista do professor; antes, - Tendência Progressista Libertadora33
o exercício profissional continua mais para uma postura Papel da escola - não é próprio da pedagogia libertadora
falar em ensino escolar, já que sua marca é a atuação “não-
29 AURICHIO, Lígia de. Manual de Tecnologia Educacional; 32 MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais Helena dos. Verbete pedagogia
OLIVEIRA, J.G.A. Tecnologia Educacional teorias da instrução. progressista. Dicionário Interativo da Educação Brasileira - Educabrasil. São
30 FREITAG, Barbara. Escola, Estado e Sociedade; GARCIA, Laymert G. S.
Paulo: Midiamix, 2001. http://www.educabrasil.com.br/pedagogia-progressista/
Desregulagens - Educação, planejamento e tecnologia como ferramenta social; 33 FREIRE, Paulo. Ação Cultural para a Liberdade; Pedagogia do Oprimido e
CUNHA, Luis A. Educação e desenvolvimento social no Brasil. Extensão ou Comunicação?
31 SNYDERS, Georges. Pedagogia progressista. Lisboa, Ed. Almedina.
20
formal”. Entretanto, professores e educadores engajados no grupo e, às vezes, a auto avaliação feita em termos dos
ensino escolar vêm adotando pressupostos dessa pedagogia. compromissos assumidos com a prática social.
Assim, quando se fala na educação em geral, diz-se que ela é
uma atividade onde professores e alunos, mediatizados pela Relacionamento professor-aluno - no diálogo, como método
realidade que apreendem e da qual extraem o conteúdo de básico, a relação é horizontal, onde educador e educandos se
aprendizagem, atingem um nível de consciência dessa mesma posicionam como sujeitos do ato de conhecimento. O critério
realidade, a fim de nela atuarem, num sentido de de bom relacionamento é a total identificação com o povo, sem
transformação social. o que a relação pedagógica perde consistência. Elimina-se, por
Tanto a educação tradicional, denominada “bancária” - que pressuposto, toda relação de autoridade, sob pena de esta
visa apenas depositar informações sobre o aluno, quanto a inviabilizar o trabalho de conscientização, de “aproximação de
educação renovada - que pretenderia uma libertação consciências”. Trata-se de uma “não diretividade”, mas não no
psicológica individual - são domesticadoras, pois em nada sentido do professor que se ausenta (como em Rogers), mas
contribuem para desvelar a realidade social de opressão. A que permanece vigilante para assegurar ao grupo um espaço
educação libertadora, ao contrário, questiona concretamente humano para “dizer sua palavra” para se exprimir sem se
a realidade das relações do homem com a natureza e com os neutralizar.
outros homens, visando a uma transformação - daí ser uma
educação crítica. Pressupostos de aprendizagem - a própria designação de
“educação problematizadora” como correlata de educação
Conteúdos de ensino - denominados “temas geradores”, são libertadora revela a força motivadora da aprendizagem. A
extraídos da problematização da prática de vida dos motivação se dá a partir da codificação de uma situação-
educandos. Os conteúdos tradicionais são recusados porque problema, da qual se toma distância para analisá-la
cada pessoa, cada grupo envolvido na ação pedagógica dispõe criticamente. “Esta análise envolve o exercício da abstração,
em si próprio, ainda que de forma rudimentar, dos conteúdos através da qual procuramos alcançar, por meio de
necessários dos quais se parte. O importante não é a representações da realidade concreta, a razão de ser dos
transmissão de conteúdos específicos, mas despertar uma fatos”.
nova forma da relação com a experiência vivida. A transmissão Aprender é um ato de conhecimento da realidade concreta,
de conteúdos estruturados a partir de fora é considerada como isto é, da situação real vivida pelo educando, e só tem sentido
“invasão cultural” ou “depósito de informação” porque não se resulta de uma aproximação crítica dessa realidade. O que é
emerge do saber popular. Se forem necessários textos de aprendido não decorre de uma imposição ou memorização,
leitura estes deverão ser redigidos pelos próprios educandos mas do nível crítico de conhecimento, ao qual se chega pelo
com a orientação do educador. processo de compreensão, reflexão e crítica. O que o educando
Em nenhum momento o inspirador e mentor da pedagogia transfere, em termos de conhecimento, é o que foi incorporado
libertadora Paulo Freire, deixa de mencionar o caráter como resposta às situações de opressão - ou seja, seu
essencialmente político de sua pedagogia, o que, segundo suas engajamento na militância política.
próprias palavras, impede que ela seja posta em prática em
termos sistemáticos, nas instituições oficiais, antes da Manifestações na prática escolar - a pedagogia libertadora
transformação da sociedade. Daí porque sua atuação se dê tem como inspirador e divulgador Paulo Freire, que tem
mais a nível da educação extraescolar. O que não tem aplicado suas ideias pessoalmente em diversos países,
impedido, por outro lado, que seus pressupostos sejam primeiro no Chile, depois na África. Entre nós, tem exercido
adotados e aplicados por numerosos professores. uma influência expressiva nos movimentos populares e
sindicatos e, praticamente, se confunde com a maior parte das
Métodos de ensino – “Para ser um ato de conhecimento o experiências do que se denomina “educação popular”. Há
processo de alfabetização de adultos demanda, entre diversos grupos desta natureza que vêm atuando não somente
educadores e educandos, uma relação de autêntico diálogo; no nível da prática popular, mas também por meio de
aquela em que os sujeitos do ato de conhecer se encontram publicações, com relativa independência em relação às ideias
mediatizados pelo objeto a ser conhecido” (...) “O diálogo originais da pedagogia libertadora. Embora as formulações
engaja ativamente a ambos os sujeitos do ato de conhecer: teóricas de Paulo Freire se restrinjam à educação de adultos
educador-educando e educando-educador”. ou à educação popular em geral, muitos professores vêm
Assim sendo, a forma de trabalho educativo é o “grupo de tentando colocá-las em prática em todos os graus de ensino
discussão a quem cabe autogerir a aprendizagem, definindo o formal.
conteúdo e a dinâmica das atividades. O professor é um
animador que, por princípio, deve descer ao nível dos alunos, - Tendência Progressista Libertária34
adaptando-se às suas características ao desenvolvimento Papel da escola - a pedagogia libertária espera que a escola
próprio de cada grupo. Deve caminhar ‘junto’, intervir o exerça uma transformação na personalidade dos alunos num
mínimo indispensável, embora não se furte, quando sentido libertário e autogestionário. A ideia básica é introduzir
necessário, a fornecer uma informação mais sistematizada. modificações institucionais, a partir dos níveis subalternos
que, em seguida, vão “contaminando” todo o sistema. A escola
Os passos da aprendizagem - codificação-decodificação, e instituirá, com base na participação grupal, mecanismos
problematização da situação - permitirão aos educandos um institucionais de mudança (assembleias, conselhos, eleições,
esforço de compreensão do “vivido”, até chegar a um nível reuniões, associações etc.), de tal forma que o aluno, uma vez
mais crítico de conhecimento e sua realidade, sempre através atuando nas instituições “externas”, leve para lá tudo o que
da troca de experiência em torno da prática social. Se nisso aprendeu.
consiste o conteúdo do trabalho educativo, dispensam um Outra forma de atuação da pedagogia libertária, correlata
programa previamente estruturado, trabalhos escritos, aulas a primeira, é - aproveitando a margem de liberdade do sistema
expositivas assim como qualquer tipo de verificação direta da - criar grupos de pessoas com princípios educativos
aprendizagem, formas essas próprias da “educação bancária”, autogestionários (associações, grupos informais, escolas
portanto, domesticadoras. Entretanto admite-se a avaliação da autogestionários). Há, portanto, um sentido expressamente
prática vivenciada entre educador-educandos no processo de político, à medida que se afirma o indivíduo como produto do
21
social e que o desenvolvimento individual somente se realiza professor cabe a função de “conselheiro” e, outras vezes, de
no coletivo. instrutor-monitor à disposição do grupo. Em nenhum
A autogestão é, assim, o conteúdo e o método; resume momento esses papéis do professor se confundem com o de
tanto o objetivo pedagógico quanto o político. A pedagogia “modelo”, pois a pedagogia libertária recusa qualquer forma
libertária, na sua modalidade mais conhecida entre nós, a de poder ou autoridade.
“pedagogia institucional”, pretende ser uma forma de
resistência contra a burocracia como instrumento da ação Pressupostos de aprendizagem - as formas burocráticas das
dominadora do Estado, que tudo controla (professores, instituições existentes, por seu traço de impessoalidade,
programas, provas etc.), retirando a autonomia. comprometem o crescimento pessoal. A ênfase na
aprendizagem informal, via grupo, e a negação de toda forma
Conteúdos de ensino - as matérias são colocadas à de repressão visam favorecer o desenvolvimento de pessoas
disposição do aluno, mas não são exigidas. São um mais livres. A motivação está, portanto, no interesse em
instrumento a mais, porque importante é o conhecimento que crescer dentro da vivência grupal, pois supõe-se que o grupo
resulta das experiências vividas pelo grupo, especialmente a devolva a cada um de seus membros a satisfação de suas
vivência de mecanismos de participação crítica. aspirações e necessidades.
“Conhecimento” aqui não é a investigação cognitiva do real, Somente o vivido, o experimentado é incorporado e
para extrair dele um sistema de representações mentais, mas utilizável em situações novas. Assim, o critério de relevância
a descoberta de respostas às necessidades e às exigências da do saber sistematizado é seu possível uso prático. Por isso
vida social. Assim, os conteúdos propriamente ditos são os que mesmo, não faz sentido qualquer tentativa de avaliação da
resultam de necessidades e interesses manifestos pelo grupo e aprendizagem, ao menos em termos de conteúdo.
que não são, necessária nem indispensavelmente, as matérias
de estudo. Outras tendências pedagógicas correlatas - a pedagogia
libertária abrange quase todas as tendências antiautoritárias
Método de ensino - é na vivência grupal, na forma de em educação, entre elas, a anarquista, a psicanalista, a dos
autogestão, que os alunos buscarão encontrar as bases mais sociólogos, e também a dos professores progressistas. Embora
satisfatórias de sua própria “instituição”, graças à sua própria Neill e Rogers não possam ser considerados progressistas
iniciativa e sem qualquer forma de poder. Trata-se de “colocar (conforme entendemos aqui), não deixam de influenciar
nas mãos dos alunos tudo o que for possível: o conjunto da alguns libertários, como Lobrot. Entre os estrangeiros
vida, as atividades e a organização do trabalho no interior da devemos citar Vasquez y Oury entre os mais recentes, Ferrer y
escola (menos a elaboração dos programas e a decisão dos Guardia entre os mais antigos. Particularmente significativo é
exames que não dependem nem dos docentes, nem dos o trabalho de C. Freinet, que tem sido muito estudado entre
alunos)”. Os alunos têm liberdade de trabalhar ou não, ficando nós, existindo inclusive algumas escolas aplicando seu método.
o interesse pedagógico na dependência de suas necessidades Entre os estudiosos e divulgadores da tendência libertária
ou das do grupo. pode-se citar Maurício Tragtenberg, apesar da tônica de seus
trabalhos não ser propriamente pedagógica, mas de crítica das
O progresso da autonomia, excluída qualquer direção de instituições em favor de um projeto autogestionário.
fora do grupo, se dá num “crescendo”: primeiramente a
oportunidade de contatos, aberturas, relações informais entre - Tendência Progressista “Crítico Social dos
os alunos. Em seguida, o grupo começa a se organizar, de modo Conteúdos”35
que todos possam participar de discussões, cooperativas, Papel da escola - a difusão de conteúdos é a tarefa
assembleias, isto é, diversas formas de participação e primordial. Não conteúdos abstratos, mas vivos, concretos e,
expressão pela palavra; quem quiser fazer outra coisa, ou portanto, indissociáveis das realidades sociais. A valorização
entra em acordo com o grupo, ou se retira. No terceiro da escola como instrumento de apropriação do saber é o
momento, o grupo se organiza de forma mais efetiva e, melhor serviço que se presta aos interesses populares, já que
finalmente, no quarto momento, parte para a execução do a própria escola pode contribuir para eliminar a seletividade
trabalho. social e torná-la democrática.
Se a escola é parte integrante do todo social, agir dentro
Relação professor-aluno - a pedagogia institucional visa dela é também agir no rumo da transformação da sociedade.
“em primeiro lugar, transformar a relação professor-aluno no Se o que define uma pedagogia crítica é a consciência de seus
sentido da não diretividade, isto é, considerar desde o início a condicionantes histórico-sociais, a função da pedagogia “dos
ineficácia e a nocividade de todos os métodos à base de conteúdos” é dar um passo à frente no papel transformador da
obrigações e ameaças”. Embora professor e aluno sejam escola, mas a partir das condições existentes.
desiguais e diferentes, nada impede que o professor se ponha Assim, a condição para que a escola sirva aos interesses
a serviço do aluno, sem impor suas concepções e ideias, sem populares é garantir a todos um bom ensino, isto é, a
transformar o aluno em “objeto”. O professor é um orientador apropriação dos conteúdos escolares básicos que tenham
e um catalisador, ele se mistura ao grupo para uma reflexão em ressonância na vida dos alunos. Entendida nesse sentido, a
comum. educação é “uma atividade mediadora no seio da prática social
Se os alunos são livres frente ao professor, também este o global”, ou seja, uma das mediações pela qual o aluno, pela
é em relação aos alunos (ele pode, por exemplo, recusar-se a intervenção do professor e por sua própria participação ativa,
responder uma pergunta, permanecendo em silêncio). passa de uma experiência inicialmente confusa e fragmentada
Entretanto, essa liberdade de decisão tem um sentido bastante (sincrética) a uma visão sintética, mais organizada e unificada.
claro: se um aluno resolve não participar, o faz porque não se Em síntese, a atuação da escola consiste na preparação do
sente integrado, mas o grupo tem responsabilidade sobre este aluno para, o mundo adulto e suas contradições, fornecendo-
fato e vai se colocar a questão; quando o professor se cala lhe um instrumental, por meio da aquisição de conteúdos e da
diante de uma pergunta, seu silêncio tem um significado socialização, para uma participação organizada e ativa na
educativo que pode, por exemplo, ser uma ajuda para que o democratização da sociedade.
grupo assuma a resposta ou a situação criada. No mais, ao
35 SAVIANI,
Dermeval, Educação: do senso comum à consciência filosófica, p.120; CURY, Carlos R. J. Educação e contradição: elementos. p.75.
MELLO, Guiomar N de, Magistério de 1° grau. p.24;
22
Conteúdos de ensino - são os conteúdos culturais universais Relação professor-aluno – se o conhecimento resulta de
que se constituíram em domínios de conhecimento trocas que se estabelecem na interação entre o meio (natural,
relativamente autônomos, incorporados pela humanidade, social, cultural) e o sujeito, sendo o professor o mediador,
mas permanentemente reavaliados face às realidades sociais. então a relação pedagógica consiste no provimento das
Embora se aceite que os conteúdos são realidades exteriores condições em que professores e alunos possam colaborar para
ao aluno, que devem ser assimilados e não simplesmente fazer progredir essas trocas. O papel do adulto é insubstituível,
reinventados eles não são fechados e refratários às realidades mas acentua-se também a participação do aluno no processo.
sociais. Não basta que os conteúdos sejam apenas ensinados, Ou seja, o aluno, com sua experiência imediata num contexto
ainda que bem ensinados, é preciso que se liguem, de forma cultural, participa na busca da verdade, ao confrontá-la com os
indissociável, à sua significação humana e social. conteúdos e modelos expressos pelo professor.
Essa maneira de conceber os conteúdos do saber não Mas esse esforço do professor em orientar, em abrir
estabelece oposição entre cultura erudita e cultura popular, ou perspectivas a partir dos conteúdos, implica um envolvimento
espontânea, mas uma relação de continuidade em que, com o estilo de vida dos alunos, tendo consciência inclusive
progressivamente, se passa da experiência imediata e dos contrastes entre sua própria cultura e a do aluno. Não se
desorganizada ao conhecimento sistematematizado. Não que contentará, entretanto, em satisfazer apenas as necessidades e
a primeira apreensão da realidade seja errada, mas é carências; buscará despertar outras necessidades, acelerar e
necessária a ascensão a uma forma de elaboração superior, disciplinar os métodos de estudo, exigir o esforço do aluno,
conseguida pelo próprio aluno, com a intervenção do propor conteúdos e modelos compatíveis com suas
professor. experiências vividas, para que o aluno se mobilize para uma
participação ativa.
A postura da pedagogia “dos conteúdos” - ao admitir um Evidentemente o papel de mediação exercido em torno da
conhecimento relativamente autônomo - assume o saber como análise dos conteúdos exclui a não diretividade como forma de
tendo um conteúdo relativamente objetivo, mas, ao mesmo orientação do trabalho escolar, por que o diálogo adulto-aluno
tempo, introduz a possibilidade de uma reavaliação crítica é desigual. O adulto tem mais experiência acerca das
frente a esse conteúdo. Como sintetiza Snyders, ao mencionar realidades sociais, dispõe de uma formação (ao menos deve
o papel do professor, trata-se, de um lado, de obter o acesso do dispor) para ensinar, possui conhecimentos e a ele cabe fazer
aluno aos conteúdos, ligando-os com a experiência concreta a análise dos conteúdos em confronto com as realidades
dele - a continuidade; mas, de outro, de proporcionar sociais.
elementos de análise crítica que ajudem o aluno a ultrapassar A não diretividade abandona os alunos a seus próprios
a experiência, os estereótipos, as pressões difusas da ideologia desejos, como se eles tivessem uma tendência espontânea a
dominante - é a ruptura. alcançar os objetivos esperados da educação. Sabemos que as
Dessas considerações resulta claro que se pode ir do saber tendências espontâneas e naturais não são “naturais”, antes
ao engajamento político, mas não o inverso, sob o risco de se são tributárias das condições de vida e do meio. Não são
afetar a própria especificidade do saber e até cair-se numa suficientes o amor, a aceitação, para que os filhos dos
forma de pedagogia ideológica, que é o que se critica na trabalhadores adquiram o desejo de estudar mais, de
pedagogia tradicional e na pedagogia nova. progredir: é necessária a intervenção do professor para levar
o aluno a acreditar nas suas possibilidades, a ir mais longe, a
Métodos de ensino - a questão dos métodos se subordina à prolongar a experiência vivida.
dos conteúdos: se o objetivo é privilegiar a aquisição do saber,
e de um saber vinculado às realidades sociais, é preciso que os Pressupostos de aprendizagem - por um esforço próprio, o
métodos favoreçam a correspondência dos conteúdos com os aluno se reconhece nos conteúdos e modelos sociais
interesses dos alunos, e que estes possam reconhecer nos apresentados pelo professor; assim, pode ampliar sua própria
conteúdos o auxílio ao seu esforço de compreensão da experiência. O conhecimento novo se apoia numa estrutura
realidade (prática social). Assim, nem se trata dos métodos cognitiva já existente, ou o professor provê a estrutura de que
dogmáticos de transmissão do saber da pedagogia tradicional, o aluno ainda não dispõe. O grau de envolvimento na
nem da sua substituição pela descoberta, investigação ou livre aprendizagem dependa tanto da prontidão e disposição do
expressão das opiniões, como se o saber pudesse ser aluno, quanto do professor e do contexto da sala de aula.
inventado pela criança, na concepção da pedagogia renovada. Aprender, dentro da visão da pedagogia dos conteúdos, é
desenvolver a capacidade de processar informações e lidar
Os métodos de uma pedagogia crítico-social dos conteúdos com os estímulos do ambiente, organizando os dados
não partem, então, de um saber artificial, depositado a partir disponíveis da experiência. Em consequência, admite-se o
de fora, nem do saber espontâneo, mas de uma relação direta princípio da aprendizagem significativa que supõe, como
com a experiência do aluno, confrontada com o saber trazido passo inicial, verificar aquilo que o aluno já sabe. O professor
de fora. O trabalho docente relaciona a prática vivida pelos precisa saber (compreender) o que os alunos dizem ou fazem,
alunos com os conteúdos propostos pelo professor, momento o aluno precisa compreender o que o professor procura dizer-
em que se dará a “ruptura” em relação à experiência pouco lhes. A transferência da aprendizagem se dá a partir do
elaborada. Tal ruptura apenas é possível com a introdução momento da síntese, isto é, quando o aluno supera sua visão
explícita, pelo professor, dos elementos novos de análise a parcial e confusa e adquire uma visão mais clara e unificadora.
serem aplicados criticamente à prática do aluno. Resulta com clareza que o trabalho escolar precisa ser
Em outras palavras, uma aula começa pela constatação da avaliado, não como julgamento definitivo e dogmático do
prática real, havendo, em seguida, a consciência dessa prática professor, mas como uma comprovação para o aluno de seu
no sentido de referi-la aos termos do conteúdo proposto, na progresso em direção a noções mais sistematizadas.
forma de um confronto entre a experiência e a explicação do
professor. Vale dizer: vai-se da ação à compreensão e da Manifestações na prática escolar36 - o esforço de elaboração
compreensão à ação, até a síntese, o que não é outra coisa de uma pedagogia “dos conteúdos” está em propor modelos de
senão a unidade entre a teoria e a prática. ensino voltados para a interação conteúdos-realidades sociais;
portanto, visando avançar em termos de uma articulação do
político e do pedagógico, aquele como extensão deste, ou seja,
23
a educação “a serviço da transformação das relações de ou seja, como processo de interação verbal, que constitui a sua
produção”. Ainda que a curto prazo se espere do professor realidade fundamental.
maior conhecimento dos conteúdos de sua matéria e o
domínio de formas de transmissão, a fim de garantir maior
competência técnica, sua contribuição “será tanto mais eficaz
quanto mais seja capaz de compreender os vínculos de sua
prática com a prática social global”, tendo em vista (...) “a
democratização da sociedade brasileira, o atendimento aos
interesses das camadas populares, a transformação estrutural
da sociedade brasileira”.
37 SILVA, Delcio Barros da. As PrincipaisTendências Pedagógicas na Prática 38 ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. Filosofia da Educação. São Paulo: Editora
Escolar Brasileira e seus Pressupostos de Aprendizagem. Moderna, 1998.
LIBÂNEO, José Carlos. Democratização da Escola Pública. São Paulo: Loyola, 1990.
24
QUADRO SÍNTESE DAS TENDÊNCIAS PEDAGÓGICAS
Nome da
tendência Papel da escola Conteúdos Métodos Professor x Aluno Aprendizagem Manifestações
pedagógica
São
conhecimentos e
A aprendizagem
valores sociais Exposição e Nas escolas que
Preparação é receptiva e
acumulados demonstração Autoridade do adotam
Tendência intelectual e moral mecânica, sem se
através dos verbal da professor que exige filosofias
Liberal dos alunos para considerar as
tempos e matéria e /ou atitude receptiva humanistas
Tradicional assumir seu papel características
repassados aos por meio de do aluno. clássicas ou
na sociedade. próprias de cada
alunos como modelos. científicas.
idade.
verdades
absolutas.
Os conteúdos são
estabelecidos a Por meio de É baseada na
A escola deve Montessori,
Tendência partir das experiências, O professor é motivação e na
adequar as Decroly, Dewey,
Liberal experiências pesquisas e auxiliador no estimulação de
necessidades Piaget, Cousinet,
Renovada vividas pelos método de desenvolvimento problemas. O
individuais ao Lauro de
Progressivista alunos frente às solução de livre da criança. aluno aprende
meio social. Oliveira Lima.
situações problemas. fazendo.
problema.
Educação
centralizada no
Tendência Baseia-se na busca aluno; o professor
Aprender é Carl Rogers,
Liberal dos Método baseado deve garantir um
Formação de modificar as “Sumerhill”,
Renovada Não conhecimentos na facilitação da clima de
atitudes. percepções da escola de A.
Diretiva pelos próprios aprendizagem. relacionamento
realidade. Neill.
(Escola Nova) alunos. pessoal e autêntico,
baseado no
respeito.
Lobrot, C.
Também prima
Freinet, Miguel
pela valorização
Transformação da É não diretiva, o Gonzales,
Tendência As matérias são Vivência grupal da vivência
personalidade num professor é Vasquez, Oury,
Progressivista colocadas, mas na forma de cotidiana.
sentido libertário e orientador e os Maurício
Libertária não exigidas. autogestão. Aprendizagem
autogestionário. alunos livres. Tragtenberg,
informal via
Ferrer y
grupo.
Guardia.
O método parte
Conteúdos Makarenko, B.
Tendência de uma relação Papel do aluno
culturais Baseadas nas Charlot,
Progressivista direta da como participador
universais que são estruturas Suchodolski,
“Crítico-social Difusão dos experiência do e do professor
incorporados pela cognitivas já Manacorda, G.
dos conteúdos conteúdos. aluno como mediador
humanidade estruturadas nos Snyders
ou histórico- confrontada com entre o saber e o
frente à realidade alunos. Demerval
crítica” o saber aluno.
social. Saviani.
sistematizado.
25
Questões 09. (TJ/DF – Analista Judiciário – Pedagogia – CESPE) A
partir das concepções pedagógicas, julgue o item subsequente:
01. (SEDUC/RO – Professor de História – FUNCAB) Na Os trabalhos realizados por Freinet são significativos na
tendência tradicional, a Pedagogia Liberal se caracteriza por: concretização do papel da escola na concepção progressista
(A) subordinar a educação à sociedade, tendo como função libertária.
a preparação de recursos humanos por meio da ( ) Certo ( ) Errado
profissionalização.
(B) valorizar a autoeducação, a experiência direta sobre o 10. (MPE/RO - ANALISTA JUDICIÁRIO – PEDAGOGIA –
meio pela atividade e o ensino centrado no aluno e no grupo. FUNCAB) As práticas do cotidiano escolar têm vários
(C) acentuar o ensino humanístico, de cultura geral, condicionantes políticos e sociais que configuram diferentes
através do qual o aluno deve atingir pelo seu próprio esforço, concepções de homem e sociedade e, em consequência,
sua plena realização. diferentes concepções de escola, aprendizagem, relação
(D) considerar a educação um processo interno, que parte professor/a– aluno/a, técnicas pedagógicas, entre outras.
das necessidades e dos interesses individuais. Conforme Libâneo (1992), as tendências pedagógicas
(E) focar no aprender a aprender, ou seja, é mais classificam-se em duas grandes vertentes:
importante o processo de aquisição do saber do que o saber (A) Pedagogia Liberal (tradicional, renovada não diretiva e
propriamente. tecnicista) e Pedagogia Emancipatória (libertadora, renovada
progressista, libertária e crítico-social dos conteúdos).
02. (INSS – Analista – Pedagogia – FUNRIO) A ênfase em (B) Pedagogia Liberal (libertadora, libertária e crítico-
um ensino funcional ou ativo, baseado nos interesses naturais social dos conteúdos) e Pedagogia Progressista (tradicional,
das crianças e no trabalho em grupo ou em comunidade, para renovada progressista, renovada não diretiva e tecnicista).
criar o hábito da cooperação e incentivar a relação entre a (C) Pedagogia Liberal (tradicional, renovada progressista,
escola e a vida. Essas são características de uma pedagogia renovada não diretiva e tecnicista) e Pedagogia Progressista
baseada (libertadora, libertária e crítico social dos conteúdos).
(A) na teoria crítico-social dos conteúdos. (D) Pedagogia Autoritária (tradicional, renovada
(B) na naturalização das práticas pedagógicas. progressista, renovada não diretiva e tecnicista) e Pedagogia
(C) nos princípios escolanovistas. Capitalista (libertadora, libertária e crítico social dos
(D) na utilização de técnicas motivacionais. conteúdos).
(E) em aprendizagens de abordagem behaviorista.
11. (SEDUC/RJ - PROFESSOR – MATEMÁTICA – CEPERJ)
03. (TJ/DF – Analista Judiciário – Pedagogia – CESPE) A Luckesi analisa diversas tendências pedagógicas e as
partir das concepções pedagógicas, julgue o item seguinte: As características da prática escolar a elas correspondentes.
experiências de alfabetização de jovens e adultos inspiradas Nesse contexto, considere as observações abaixo, todas
nas ideias do educador Paulo Freire são exemplo da concepção relativas a uma determinada tendência pedagógica.
liberal renovada progressista. - Seu interesse imediato é o de produzir indivíduos
( ) Certo ( ) Errado “competentes” para o mercado de trabalho, transmitindo
informações precisas, objetivas e rápidas.
04. (TJ/DF – Analista Judiciário – Pedagogia – CESPE) A - Os conteúdos de ensino são as informações, princípios
partir das concepções pedagógicas, julgue o item seguinte: científicos, etc., estabelecidos e ordenados por especialistas
Manacorda é um dos autores que retratam em suas obras os numa sequência lógica e psicológica.
pressupostos da concepção progressista libertadora. - A tarefa inicial do professor é modelar respostas
( ) Certo ( ) Errado apropriadas aos objetivos instrucionais.
- O professor é apenas um elo entre a verdade científica e
05. (TJ/DF – Analista Judiciário – Pedagogia – CESPE) A o aluno, devendo empregar o sistema instrucional previsto.
partir das concepções pedagógicas, julgue o item seguinte: As - Foi efetivamente introduzida no Brasil no final da década
escolas que utilizam o método montessoriano são de 1960, com o objetivo de adequar o sistema educacional à
consideradas uma manifestação da concepção liberal orientação político-econômica do regime militar então
tradicional. vigente.
( ) Certo ( ) Errado Essas características permitem identificar que o autor se
refere à:
06. (INSS – Analista – Pedagogia – CESPE) A partir das (A) tendência progressista libertadora
concepções pedagógicas, julgue o item seguinte: Questionar a (B) tendência liberal tradicional
realidade das relações do homem com a natureza e com os (C) tendência progressista libertária
outros homens, para promover a transformação dessa (D) tendência liberal tecnicista
realidade, é o papel da escola na perspectiva progressista
libertadora. 12. (IF/SP - TÉCNICO EM ASSUNTOS EDUCACIONAIS)
( ) Certo ( ) Errado Ghiraldelli afirma que os professores brasileiros chegaram ao
século XXI guiando suas práticas por cinco tendências
07. (TJ/DF – Analista Judiciário – Pedagogia – CESPE) A pedagógico-didáticas que seguem a inspiração de filosofia
partir das concepções pedagógicas, julgue o item seguinte: A educacional de seus autores. De acordo com uma delas, os
escola de Summerhill é uma das concretizações dos passos segundo os quais acontece o processo ensino
pressupostos da concepção liberal renovada não diretiva. aprendizagem, se resumem, sequencialmente, em: vivência,
( ) Certo ( ) Errado temas geradores, problematização, conscientização e ação
política.
08. (TJ/DF – Analista Judiciário – Pedagogia – CESPE) A Assinale o autor cujas ideias melhor caracterizam essa
partir das concepções pedagógicas, julgue o item subsequente: sequência.
A Lei n.º 5.692/1971, que organizou a educação brasileira (A) Herbart.
durante um longo período, é uma manifestação da tendência (B) Dewey.
liberal tecnicista nas políticas educacionais. (C) Paulo Freire.
( ) Certo ( ) Errado (D) Paulo Ghiraldelli Júnior.
26
Respostas Menos recentemente, podem-se citar também tendências
inspiradas na escola de Summerhill do educador inglês A. Neill.
01. Resposta: C
A Tendência Liberal Tradicional parte do pressuposto de 08. Resposta: Certa
que o aluno deve ser preparado intelectual e moralmente para A Lei n.º 5.692/1971 fixava as Diretrizes e Bases para o
assumir seu papel na sociedade. Caracteriza-se por um ensino ensino de 1° e 2º graus. A tendência Liberal Tecnicista
humanístico e cultural. Fundamenta-se em conhecimentos e subordina a educação à sociedade, tendo como função a
valores acumulados ao longo do tempo, tratando-os como preparação de “recursos humanos” (mão-de-obra para a
dogmas, utiliza-se de métodos universais onde o professor é o indústria). A sociedade industrial e tecnológica estabelece
centro do processo de ensino e de aprendizagem. (cientificamente) as metas econômicas, sociais e políticas, a
educação treina (também cientificamente) nos alunos os
02. Resposta: C comportamentos de ajustamento a essas metas.
Nos Princípios Escolanovistas. O ideário da Escola Nova
veio para contrapor o que era considerado “tradicional”. Os 09. Resposta: Certa
seus defensores lutavam por diferenciar-se das práticas A Pedagogia Libertária espera que a escola exerça uma
pedagógicas anteriores. transformação na personalidade dos alunos num sentido
libertário e autogestionário. A ideia básica é introduzir
... a centralidade da criança nas relações de aprendizagem, modificações institucionais, a partir dos níveis subalternos
o respeito às normas higiênicas na disciplinarização do corpo do que, em seguida, vão “contaminando” todo o sistema.
aluno e de seus gestos, a cientificidade da escolarização de
saberes e fazeres sociais e a exaltação do ato de observar, de 10. Resposta: C
intuir, na construção do conhecimento do aluno. (Vidal39) A pedagogia liberal acredita que a escola tem a função de
O conhecimento, em lugar de ser transmitido pelo professor preparar os indivíduos para desempenhar papéis sociais,
para memorização, emergia da relação concreta estabelecida baseadas nas aptidões individuais. Dessa forma, o indivíduo
entre os alunos e esses objetos ou fatos, devendo a escola deve adaptar-se aos valores e normas da sociedade de classe,
responsabilizar-se por incorporar um amplo conjunto de desenvolvendo sua cultura individual. Com isso as diferenças
materiais. (Vidal) entre as classes sociais não são consideradas, já que, a escola
não leva em consideração as desigualdades sociais. Já as
03. Resposta: Errada tendências pedagógicas progressistas analisam de forma
O correto é Tendência Progressivista Libertadora, que critica as realidades sociais, cuja educação possibilita a
faz parte da Pedagogia Progressista, que dá valorização à compreensão da realidade histórico-social, explicando o papel
experiência vivida como base da relação educativa e a ideia de do sujeito como um ser que constrói sua realidade. Ela assume
autogestão pedagógica. Em função disso, dão mais valor ao um caráter pedagógico e político ao mesmo tempo.
processo de aprendizagem grupal (participação em
discussões, assembleias, votações) do que aos conteúdos de 11. Resposta: D
ensino. Como decorrência, a prática educativa somente faz Para essa tendência liberal tecnicista, a escola tem um
sentido numa prática social junto ao povo, razão pela qual papel fundamental na formação de indivíduos que se integrem
preferem as modalidades de educação popular “não-formal”. à “máquina social”. Para isso, a escola deve moldar o
comportamento, organizar o processo de aquisição de
04. Resposta: Errada habilidades e conhecimentos já historicamente descobertos.
Manacorda é um dos autores que retratam em suas obras Descobrir o conhecimento é função da educação, mas isso cabe
os pressupostos da Concepção Progressivista Crítico-Social aos especialistas, o papel da escola é repassá-lo e aplicá-lo.
dos Conteúdos ou Histórico-Crítica. A Concepção Dessa forma, percebe-se a divisão entre trabalho intelectual e
Progressivista Libertadora da qual apresenta a questão é de manual. Portanto, os conteúdos a serem ensinados já estão
Paulo Freire. muito bem explicitados nos manuais, nos livros didáticos, nas
apostilas, entre outros. Cabe ao professor buscar a melhor
05. Resposta: Errada forma de controlar as condições ambientais que assegurem a
As escolas que utilizam o método montessoriano são transmissão/recepção de informações. A relação professor-
consideradas uma manifestação da concepção Liberal aluno passa a ser estruturada e objetiva, cabendo ao professor
Renovada Não Diretiva (Escola Nova) da Pedagogia Liberal. transmitir a matéria e ao aluno receber, aprender e fixar.
39 VIDAL, Diana Gonçalves. Escola Nova e processo educativo. In: LOPES, Eliane
Marta, FIGUEIREDO, Luciano e GREIVAS, Cynthia (orgs.). 500 anos de educação no
Brasil. Belo Horizonte: Autêntica, 3ª. Ed., 2003
27
tendência em certas instituições, inclusive de ensino superior,
em criar cursos com caráter puramente técnico. Ninguém quer
1.4 A educação na condenar a técnica e a ciência, nem se trata de divinização ou
perspectiva de Paulo Freire; diabolização, ambas são formas superficiais de compreender
os fatos e implicam em pensar errado, apesar de ser
necessário, o ensino técnico-científico é insuficiente, apenas
ele não favorece a construção, a conquista da autonomia.
Educação – Paulo Freire
Uma educação que vise formar para a autonomia deve
incluir a formação ética e, ao seu lado, a formação estética. É
1. A concepção de Educação40
nossa liberdade que nos insere um compromisso ético e uma
perspectiva estética, assim só podemos ser autônomos graças
A concepção de educação de Freire41 está fundada no
a nossa liberdade, por isso uma educação que vise formar para
caráter inconcluso do ser humano, o homem não nasce
a autonomia engloba necessariamente a dimensão ética e
homem, ele se forma homem pela educação, por isso, a
estética.
educação é formação. A concepção de educação como
Uma das dimensões éticas que uma educação que busca
formação, como processo de conhecimento, de ensino, de
formar para a autonomia deve atentar é a corporeificação da
aprendizagem, se tornou, ao longo da aventura no mundo dos
palavra pelo exemplo do educador. De nada adianta um
seres humanos uma conotação de sua natureza, gestando-se
professor em seu discurso exaltar a criticidade, a
na história, como a vocação para a humanização. Assim, não democracia, o pensamento autônomo, se sua prática é
sendo possível ser gente senão por meio de práticas
antidialógica, vertical, bancária. A ação generosa que
educativas.
testemunha a palavra a torna viva, a faz palavra viva, dando
Esse processo de formação perdura ao longo da vida
um significado especial a ela. Assim, não é uma prática
toda, o homem não para de educar-se, sua formação é
puramente descritiva, "mas algo que se faz e que se vive
permanente e se funda na dialética entre teoria e prática.
enquanto dele se fala com a força do testemunho". O
A educação tem sentido porque o mundo não é
testemunho concreto de um professor que possui uma prática
necessariamente isto ou aquilo, e os seres humanos são tão
autônoma é essencial em uma educação que vise a autonomia.
projetos quanto podem ter projetos para o mundo. O homem é
A educação para a autonomia supõe o respeito às
inacabado e possui consciência de seu inacabamento, isso é
diferenças, assim, rejeita qualquer forma de discriminação,
importante para que ele se torne autônomo, assim, com a
seja ela de raça, classe, gênero, etc. Como a autonomia não é
liberdade o ser humano foi transformando a vida em
autossuficiência, ela inclui estar aberto à comunicação com o
existência e o suporte em mundo.
outro, com o diferente, e estar aberto à comunicação com o
Por isso, a experiência animal se dá no suporte, que é
outro, segundo o autor, é pensar certo. Não há por isso mesmo
espaço restrito em que o animal é treinado, adestrado para
pensar sem entendimento e o entendimento, do ponto de vista
caçar, defender-se, sobreviver, e é graças a esse suporte que os
do pensar certo, não é transferido mas coparticipado. Toda
filhotes dependem de seus pais por menos tempo que as
inteligência, se não distorcida, é comunicação do
crianças. A explicação do comportamento animal se encontra
inteligido, portanto, a inteligibilidade se funda na
muito mais na espécie do que no indivíduo. Eles não possuem
comunicação, na intercomunicação, na dialogicidade. O
liberdade, assim não criam um mundo para si, não são
pensar certo é dialógico, é aberto ao outro, igual enquanto
autônomos.
membro da humanidade e diferente enquanto sujeito
Já o homem possui existência, o domínio da existência é o
único. Portanto, a autonomia supõe o respeito tanto à
domínio do trabalho, da cultura, da história, dos valores -
dignidade do sujeito enquanto membro da humanidade,
domínio em que os seres humanos experimentam a dialética quanto o respeito às suas especificidades de indivíduo.
entre determinação e liberdade. É no domínio da existência De acordo com o pensamento de Freire42, para a prática de
que os homens se fazem autônomos. A partir da invenção
uma educação que visa a autonomia, uma das tarefas mais
da existência não foi mais possível ao homem existir sem importantes é possibilitar condições para que os educandos
assumir o seu direito e dever de decidir. Por isso, assumir
possam "assumir-se". Isso envolve assumir a condição
a existência em sua totalidade é necessário para que o
sóciohistórica, a condição de ser pensante, comunicante,
homem seja autônomo. Enquanto inacabados, homens e transformador, criador, sonhador, que ama e sente raiva. Essa
mulheres se sabem condicionados, mas a consciência mostra a assunção do eu não significa a autossuficiência, a exclusão dos
possibilidade de ir além, de não ficar determinados, isso
outros, é a 'outredade' do 'não eu', ou do tu que me faz assumir
significa reconhecer que somos condicionados mas não a radicalidade o meu eu.
determinados. Essa assunção está ligada à identidade cultural que faz
A construção da própria presença no mundo não se faz parte, ao mesmo tempo, da dimensão individual e de classe dos
independente das forças sociais, mas se essa construção for educandos. Tem que ver diretamente com a assunção de nós
determinada, não há autonomia. Se minha presença no mundo por nós mesmos. O assumir-se como sujeito da própria
é feita por algo alheio a mim, estou abrindo mão de minha assunção possibilita que o sujeito possa ser ele mesmo, possa
liberdade, de minha responsabilidade ética, histórica, política ser autônomo, a aprendizagem da assunção do sujeito é
e social, estou abrindo mão de minha autonomia. Afinal, minha incompatível com o treinamento pragmático ou com o
presença no mundo não é a de quem apenas se adapta, mas a elitismo autoritário. Assumir-se implica em ser autêntico,
de quem nele se insere. É a posição de quem luta para não em ser o que se é a partir de si mesmo, por isso, para ser
ser apenas objeto mas sujeito também da História. A autônomo o homem precisa assumir-se. A assunção,
presença no mundo de quem é sujeito da História é uma enquanto exige autenticidade, engloba as dimensões ética
presença autônoma. e estética. Para que haja tal assunção, o educador deve
Para o autor, educar é substantivamente formar, por isso o respeitar a autonomia do educando.
ensino dos conteúdos não pode se dar alheio à formação moral Outro ponto essencial ao se pretender uma educação para
e estética do educando, como um ensino tecnicista, que visa a autonomia, é a questão ética do respeito aos professores. É
apenas o treinamento, diminui o que há de fundamentalmente direito e dever dos educadores lutar por sua valorização, e isso
humano na educação, o seu caráter formador. Há hoje uma
40 ZATTI,
V. Autonomia e Educação em Immanuel Kant e Paulo Freire, Porto Alegre: 41 FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa.
EDIPUCRS, 2007. 42 Idem
28
inclui lutar por salários dignos, menos imorais. A elevação Segundo Freire, na constituição da necessária disciplina
urgente da qualidade de nossa educação passa pelo respeito não há como identificar o ato de estudar, de aprender, de
aos educadores e educadoras mediante substantiva melhora conhecer, de ensinar, com o puro entretenimento. A prática
de seus salários, pela sua formação permanente e educativa é difícil, é exigente, não pode ter "regras frouxas", no
reformulação dos cursos de magistério. Penso que a limitação entanto, também não pode ser um ato insosso, desgostoso,
nociva da autonomia dos educadores devido a condições enfadonho, deve ser prazeroso. Há alegria embutida na
econômicas e formativas desfavoráveis inegavelmente aventura de conhecer, de descobrir, sem a qual o ato educativo
prejudica a qualidade da educação e tem reflexos diretos na pode se tornar desmotivador. Mesmo assim, "Estudar é,
limitação da autonomia dos educandos. realmente um trabalho difícil. Exige de quem faz uma postura
Defendemos que uma educação que visa promover a crítica, sistemática. Exige uma disciplina intelectual que não se
autonomia deve atentar para a formação do ser humano e não ganha a não ser praticando-a". É a postura ativa, criativa,
apenas para o ensino-aprendizagem de conteúdos. Dessa crítica, necessária para a construção da autonomia, que a
forma, precisa atentar para todos elementos envolvidos na disciplina típica da educação bancária abafa e a disciplina
educação: a postura do professor, da direção, a situação respeitosa da educação dialógica promove.
material da escola, a participação dos pais, os conteúdos a A construção respeitosa da disciplina deve incluir a
serem apreendidos. A formação ocorre na interação de todos educação da vontade. A vontade só se torna autêntica em
elementos que envolvem a educação, por isso todos eles sujeitos que assumem seus limites. "A vontade ilimitada é a
devem ser pesados de tal forma a contribuir para a vontade despótica, negadora do outras vontades e
aprendizagem crítica e para a construção gradativa da rigorosamente, de si mesma". A vontade despótica é negadora
autonomia do educando. da própria autonomia e da autonomia dos outros. Por isso a
O educador, que em sua prática busca promover a disciplina da vontade é uma prática difícil mas necessária, é
autonomia dos educandos, deve estar atento à relação por meio dela que se constitui a autoridade interna a partir da
autoridade-liberdade. Para que haja a necessária disciplina introjeção da autoridade externa, o que permitirá a liberdade
sem haver autoritarismo ou licenciosidade, o equilíbrio entre viver plenamente suas possibilidades, as quais incluem a
ambas é necessário. "O autoritarismo é a ruptura em favor da construção da própria autonomia. A vivência da tensão
autoridade contra a liberdade e a licenciosidade, a ruptura em dialética entre liberdade e autoridade nos mostra que elas
favor da liberdade contra a autoridade". podem não ser antagônicas necessariamente uma da outra.
Assim o autoritarismo não é mais autoridade, mas abuso O melhor para a promoção da autonomia, é que a
de autoridade, a licenciosidade não é mais liberdade, mas liberdade possa se constituir assumindo seus limites
depravação da liberdade. Ambos são nocivos à autonomia, já criticamente. O confronto com as demais liberdades e com
que o autoritarismo mantém o educando excessivamente a autoridade dos pais, professores, do Estado, é bom e
dependente da autoridade e poda a liberdade de escolher e necessário, pois amadurece a liberdade, ela descobre que
fazer por si mesmo. Já a licenciosidade impede a aprendizagem não é absoluta, mas é cerceada por outras liberdades e
da auto responsabilização e permite que o educando se torne pela autoridade, e sua autonomia não é absoluta ou
dependente dos próprios impulsos e desejos. Tanto a autossuficiente. Por isso é indispensável que os pais
dependência excessiva da autoridade externa quanto a tomem parte nas discussões sobre as decisões dos filhos,
dependência dos próprios impulsos são formas de o que não pode é tomar a decisão por eles, mas devem
heteronomias, pois impedem que o sujeito haja de acordo mostrar que a decisão é um processo responsável e
com sua própria lei, impedem que o sujeito seja ele acarreta em consequências. Ninguém é autônomo antes de
mesmo. decidir, a autonomia se faz ao longo da vida pelas decisões que
Para Freire, a autoridade docente precisa estar fundada na tomamos, por isso a importância em assumir a própria
autoridade da competência, não que a competência técnica na liberdade responsavelmente.
área em que atua seja suficiente para garantir a autoridade, O que é preciso, fundamentalmente mesmo, é que o filho
mas a incompetência profissional a desqualifica. A autoridade assuma eticamente, responsavelmente, sua decisão, fundante
está relacionada com promover, incentivar, por isso demanda de sua autonomia. Ninguém é autônomo primeiro para depois
generosidade. Relações justas e generosas geram um clima em decidir. A autonomia vai se constituindo na experiência de
que a autoridade do professor e a liberdade do aluno se várias, inúmeras decisões, que vão sendo tomadas.
assumem em sua eticidade. A autoridade não pode cair no A autonomia é conquistada gradualmente, é processo que
autoritarismo, caso em que educará para a servilidade, que é consiste no amadurecimento do ser para si, por isso a
uma forma de heteronomia. A autoridade que é democrática se educação deve possibilitar experiências que estimulem as
preocupa com a construção de um clima de real disciplina, de decisões e a responsabilidade. Freire fala que mais importante
respeito. Procura levar o educando a construir, por meio de do que o testemunho espontâneo dos pais é aproveitar a força
sua liberdade e fundado na responsabilidade, a autonomia. do testemunho de pai para exercitar a "liberdade do filho no
Assim, a autoridade democrática é a que se empenha em sentido da gestação de sua autonomia". Segundo o autor,
realizar o seguinte sonho fundamental: quanto mais os filhos vão se tornando "seres para si", tanto
O de persuadir ou convencer a liberdade de que vá mais são capazes de reinventar seus pais, em vez de copiá-los
construindo consigo mesma, em si mesma, com materiais que, ou até negá-los.
embora vindo de fora de si, sejam reelaborados por ela, a sua O educador que busca criar condições para que seus alunos
autonomia. É com ela, a autonomia, penosamente construindo- criem sua própria autonomia e que não quer ter uma prática
se, que a liberdade vai preenchendo o 'espaço' antes 'habitado' autoritária, deve saber escuta. Falar para os alunos como se
por sua dependência. Sua autonomia que se funda na fosse o portador da verdade é uma prática bancária, é preciso
responsabilidade que vai sendo assumida. escutar, e a partir da escuta aprender a falar com eles e não
Dessa forma, a escola deve ter conteúdos para eles. Se quisermos promover no educando a autonomia, o
programáticos, mas deve ficar claro que o essencial na processo educativo como um todo deve ser de falar com. Pode
aprendizagem dos conteúdos é a construção da haver momentos de falar para, desde que como um momento
responsabilidade da liberdade que se assume, é a do falar com. A escuta é fundamental para que o processo
reinvenção do ser humano no aprendizado de sua educativo ocorra, como ensinar não é transferir
autonomia. Enquanto gente posso vir saber o que não sei e conhecimento, e sim exige a problematização e
posso aperfeiçoar o que sei, tanto mais saberei quanto mais acompanhamento para que os educandos vão construindo
construir minha autonomia em respeito à dos outros. seus conhecimentos, a escuta do outro é essencial, sem
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isso, o processo educativo de construção da autonomia ingênuo. O conhecimento crítico, necessário para a autonomia,
fica comprometido. Também é importante que os se alcança com rigorosidade metódica. O pensar certo não é
educandos aprendam a fazer o uso responsável da presente dos deuses ou fruto de uma iluminação especial
palavra, que aprendam a falar autonomamente. sobre uma ou outra mente privilegiada, o pensar certo é
De acordo com Freire, para que haja uma comunicação possível a todos e deve ser produzido; na escola ele deve ser
dialógica, que não seja nem licenciosa nem autoritária, é produzido pelo educando em comunhão com seu educador.
indispensável, em sala de aula, a disciplina do silêncio. Mas Todos somos curiosos, a curiosidade faz parte do fenômeno
silêncio não é silenciamento. Educador e educando devem ser vital. O conhecimento sempre começa pela pergunta, pela
sujeitos do diálogo. E, da mesma forma que não deve ser curiosidade. Mas o que deve ser obra do sujeito é a passagem
autoritário, o educador não deve ser licencioso, deve assumir da curiosidade espontânea, ingênua para a curiosidade
sua autoridade e educar para possibilitar o exercício epistemológica. Isso só é feito com reflexão crítica sobre a
responsável e racional da liberdade, a fim de que a autonomia prática. Quanto mais a reflexão crítica ajudar o sujeito a se
possa ser gestada. perceber e perceber suas razões de ser, mais consciente está o
A educação que vise formar para a autonomia deve tornado, mais está reforçando a curiosidade epistemológica, e
fomentar nos educandos a curiosidade e a criticidade. Um assim, haverá condições para que ele seja sujeito autônomo.
educador que busca despertar a curiosidade e a A teoria pedagógica de Freire, sua filosofia existência",
criticidade em seus educandos, não pode basear-se na tem como grande proposta, como grande utopia, a
memorização mecânica. Pensar mecanicamente é pensar libertação dos oprimidos. Como ninguém liberta ninguém, a
errado. Pensar certo significa procurar descobrir e entender libertação acontece a partir da autoconfiguração responsável.
o que se acha mais escondido nas coisas e nos fatos que nós Os caminhos da libertação são do oprimido que se liberta: ele
observamos e analisamos. E pensar certo é condição para não é coisa que se resgata, é o sujeito que se deve
ensinar certo e ele só se faz no respeito à unidade entre teoria autoconfigurar responsavelmente. Ao se libertarem pela
e prática. E uma das condições necessárias a pensar certo é não autoconfiguração responsável, os homens estão fazendo-se
estarmos demasiado certos de nossas certezas. A arrogância autônomos, pois estão suprimindo situações que limitavam
de achar-se o detentor de verdades imutáveis e sua autonomia e ao mesmo tempo fazendo-se por si mesmos.
inquestionáveis também é pensar errado. Os homens e Há então, uma relação entre libertação e autonomia, na medida
mulheres como seres históricos podem intervir no mundo, em que a libertação das condições opressoras possibilita o
conhecê-lo e transformá-lo. O conhecimento também por eles aumento do poder de se autodeterminar, de ser para si, e
produzido, igualmente é histórico. Dessa forma, os consequentemente do poder de ser autônomo.
conhecimentos que temos hoje superaram conhecimentos A construção da autonomia assim, passa pela
produzidos por gerações passadas, mas tais conhecimentos, conscientização, ele propõe a conscientização como um
também serão superados por outros produzidos por gerações esforço de conhecimento crítico dos obstáculos que impedem
que virão. Esse processo de superação é constante e não há a transformação do mundo, que impedem a superação das
nenhum conhecimento que seja absoluto. Por isso é tão condições de heteronomia. O homem é o único ser vivo que
importante estar aberto a novos conhecimentos e buscar consegue tomar distância do mundo, objetificá-lo, admirá-lo,
produzi-los, quanto conhecer o que a humanidade já produziu. para promover uma aproximação maior, para conhecê-lo. Aí a
A educação para a autonomia só é possível havendo essa dialogicidade aparece como exigência epistemológica. Mas
possibilidade de recriar o que o passado nos legou e criar o essa aproximação espontânea que o homem faz do mundo
novo. ainda não é uma posição crítica sobre ele, é uma posição
Paulo Freire, defende a indissociabilidade entre ingênua, é tomada de consciência, mas não é conscientização.
ensino e pesquisa, pois faz parte da natureza da prática A última "não pode existir fora da 'práxis', ou melhor, sem o
docente indagar, buscar, pesquisar. A pesquisa possibilita ato ação-reflexão". A conscientização está baseada na relação
conhecer a novidade e contribui para que a curiosidade vá consciência-mundo, e implica em transformar o mundo, é
se tornando cada vez, metodicamente, mais rigorosa, e inserção crítica na História e exige que os sujeitos criem a
assim saia da ingenuidade e transforme-se em própria existência com aquilo que o mundo os dispõe. A
curiosidade epistemológica. A curiosidade ingênua é o que conscientização exige que ultrapassemos a esfera da
caracteriza o senso comum, é um saber feito apenas da espontaneidade, que substituamos a consciência ingênua pela
experiência sem rigorosidade metódica. A ingenuidade é consciência crítica. Freire diz que a consciência do homem
nociva à autonomia, pois impede, inclusive, a percepção dos pode evoluir em diferentes níveis. A consciência ingênua ou
elementos de heteronomia que nos cercam. A rigorosidade consciência semi intransitiva representa uma aproximação
metódica é necessária para que conheçamos melhor o mundo espontânea em relação ao mundo sem que o homem se
e a nós, e, assim, tenhamos maior capacidade de nos reconheça como agente, permanece mero expectador. A
determinarmos, elemento essencial para sermos autônomos. consciência ingênua-intransitiva se caracteriza por ampliar a
Freire considera que a diferença e a distância entre capacidade de compreensão e de resposta aos desafios do
ingenuidade e criticidade não se dá na ruptura entre elas, mas meio. Na consciência transitivo-crítica o homem cria e recria
na superação. A curiosidade ingênua sem deixar de ser suas ações, é sujeito, conhece a causalidade dos fenômenos
curiosidade, ao criticizar-se se torna curiosidade sociais, assimila criticamente a realidade e tem consciência da
epistemológica. Essa superação ocorre devido à rigorosidade historicidade de suas ações. É a consciência transitivo-crítica
metódica na aproximação do objeto, que caracteriza a segunda que possibilita a construção da autonomia.
curiosidade. A essência da curiosidade permanece a mesma, o É na práxis do distanciamento/aproximação que o
que muda é a qualidade. A curiosidade é condição para a mundo é problematizado, decodificado, que os seres
criatividade, ela é a "indagação inquietadora" que nos move no humanos se descobrem instauradores do próprio mundo,
sentido de desvelar o mundo que não fizemos e acrescentar a descobrem que não apenas vivem, também existem. A
ele algo que nós fazemos. A prática educativa progressista que consciência do mundo e consciência de si crescem juntas.
visa educar para a autonomia deve promover a superação para Mas ninguém se conscientiza separadamente dos demais. A
a curiosidade epistemológica, não há como ser autônomo sem consciência se constitui como consciência do mundo. Não há
criticidade, mantendo uma visão ingênua do mundo. um mundo para cada consciência, elas se desenvolvem em um
A partir das concepções de Freire a educação envolve o mundo comum a elas, se desenvolvem essencialmente
movimento dialético entre o fazer e o pensar sobre o fazer. comunicantes, por isso se comunicam. A intersubjetividade
Práticas espontâneas produzem geralmente um saber das consciências se dá junto com a mundaneidade e a
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subjetividade. O sujeito se constitui em sua subjetividade pela mundo melhor não se perca. Dizer que a educação vai suprimir
consciência do mundo e do outro. O diálogo fenomeniza e todas as injustiças, opressões, e assim mudar completamente
historiciza a essencial intersubjetividade humana; ele é a sociedade suprimindo todas heteronomias, é ingenuidade,
relacional e, nele, ninguém tem iniciativa absoluta. O diálogo é da mesma forma que dizer que a educação não pode realizar
o próprio movimento constitutivo da consciência, que é mudança alguma. Temos que estar conscientes do nosso
consciência do mundo. Ao objetivar o mundo, o homem o condicionamento, mas não somos determinados, há
historiciza, o humaniza, ele passa a ser mundo da consciência possibilidade da transformação. "A compreensão da história
que é uma elaboração humana. Assim, o mundo passa a ser um como possibilidade e não determinismo, seria ininteligível
projeto humano, o homem se faz livre e pode ser autônomo. sem o sonho, assim como a concepção determinista se sente
Nesse sentido, os temas geradores possuem importância incompatível com ele e, por isso, o nega". Ao se reconhecer a
central nos processos de alfabetização. "Procurar o tema possibilidade e manter vivo o sonho, o papel histórico da
gerador é procurar o pensamento do homem sobre a realidade subjetividade, de transformar, recriar o mundo, adquire papel
e a sua ação sobre esta realidade que está em sua práxis". A relevante. Como não estamos determinados, estamos abertos
atitude ativa de procurar o próprio tema gerador vai ao "inédito viável". O poder de se autodeterminar é necessário
possibilitar que o educando tome consciência de sua realidade para que o sujeito fuja do determinismo, esteja aberto ao
e também de si. É a práxis sobre a realidade que possibilita a inédito viável e, assim, possa ser autônomo.
tomada de consciência crítica, que permite a decisão, a escolha, Freire insiste no que ele chama de humanização como
a liberdade, a conquista do poder de ser autônomo. Uma vocação ontológica do ser humano, ou ser mais. Essa "vocação"
educação desconectada da realidade, não fará mais que não é um a priori, mas é algo que vem sendo construído pelo
domesticar, adequar, ou seja, reforçar a situação de homem ao longo da história. A vocação para ser mais é
heteronomia. expressão da natureza humana que se constitui na História e
Para Freire, é a partir da reflexão sobre seu contexto, do precisa de condições concretas sem as quais será distorcida.
comprometimento, das decisões, que os homens e mulheres se "Esta vocação para ser mais que não se realiza na inexistência
constroem a si mesmos e chegam a ser sujeitos, chegam a ser de ter, na indigência, demanda liberdade, possibilidade de
autônomos. O ser humano percebe sua temporalidade, decisão, de escolha, de autonomia". Ou seja, a indigência, a
reconhece que não vive num eterno presente, e por isso é pobreza, a insuficiência de recursos materiais, limitam a
histórico. Também se reconhece em relação com outros seres possibilidade de decisão, limitam a liberdade, e assim, limitam
e com a própria realidade. A realidade com o seu devir e as a autonomia. Por esse motivo, uma educação que busca formar
relações que estabelece impõe ao ser humano desafios. As para a autonomia deve estar preocupada com a transformação
respostas dadas a esses desafios não mudam apenas a dessas condições concretas que limitam a autonomia. Essa
realidade, mas mudam o próprio homem. No ato mesmo de transformação tem caráter político, por isso a educação está
responder aos desafios que lhe apresenta seu contexto de vida, vinculada indissociavelmente com a política.
o homem se cria, se realiza como sujeito, porque esta resposta Para que as condições concretas que limitam a autonomia
exige dele reflexão, crítica, invenção, eleição, decisão, sejam transformadas, é preciso reinventar o mundo de hoje e
organização, ação. Assim o homem não se adapta apenas à a educação é indispensável nessa reinvenção. Essa reinvenção
realidade, ele a configura, e na práxis configuradora se do mundo exige comprometimento. Da mesma forma que não
constrói como homem. A partir das concepções de Freire, é possível entrar na chuva sem se molhar, não é possível
afirmamos que esse é o processo pelo qual os seres humanos educar sem revelar a própria maneira de ser, de pensar
conquistam sua autonomia, processo pelo qual são politicamente. Por isso a importância da coerência entre o que
construtores de si próprios. se diz e o que se faz. Freire nos diz que o professor não pode
A proposta de Freire é de uma educação ser um sujeito de omissão, mas de opções. Como experiência
problematizadora, dialógica, oposta à educação bancária, especificamente humana, a educação é uma forma de
por isso não trata os alunos como depósitos de conteúdos, intervenção no mundo, o que implica além do conhecimento
busca promover caminhos para que o próprio aluno seja dos conteúdos, um esforço de reprodução ou
sujeito e construa sua autonomia, dessa forma, a desmascaramento da ideologia dominante. Neutra em relação
contradição educador-educando, em que o professor era à ideologia dominante a educação não pode ser. Freire destaca
o sujeito e o aluno objeto passivo, é superada. Já agora que os interesses dominantes procuram promover uma
ninguém educa ninguém, como tampouco ninguém se educação cuja prática é imobilizadora e ocultadora de
educa a si mesmo: os homens se educam em comunhão, verdades. Mas os fatalismos que procuram deixar as coisas
mediatizados pelo mundo. Por isso a proposta freireana é como estão devem ser negados, eles ajudam a manter uma
essencialmente dialógica. Para Freire os elementos situação que é imoral e heterônoma. A prática educativa que
constitutivos do diálogo são ação e reflexão. propomos deve ser uma tomada de posição frente ao mundo
Não há palavra verdadeira que não seja práxis, por isso o no sentido de transformá-lo para que condições heterônomas
diálogo implica na transformação do mundo. A pronúncia do sejam superadas, para que se estabeleçam relações e
mundo é um ato de criação e recriação, é um ato de amor. Nas condições que possibilitem a autonomia.
relações de dominação, diálogo e amor estão ausentes. Diálogo
é o encontro dos homens para Ser Mais, para construir sua 2. A Prática Educativa segundo Paulo Freire43
autonomia. Para que a educação promova no educando a Antes de anunciar a presença de Paulo Freire como
autonomia, é essencial que ela seja dialógica, pois assim há educador faz-se necessário contextualizá-lo como homem.
espaço para que o educando seja sujeito, para que ele mesmo Diga-se um “percebedor” da realidade por sua condição de
assuma responsavelmente sua liberdade e, com a ajuda do pobre, nordestino e brasileiro. Sua luta e presença baseiam-se
educador, possa fazer-se em seu processo de formação. na categoria “opressão”, principalmente, por ter sido um
Para Freire, é uma contradição um ser consciente de seu homem que fez uma leitura concreta do mundo do oprimido,
inacabamento não buscar o futuro com esperança, não sonhar da complexidade da relação oprimido e opressor, para,
com a transformação, enfim, não buscar a construção de um finalmente, propor uma pedagogia libertadora que
mundo onde todos possam realizar-se com autonomia. Cabe à consiste em uma educação voltada para a conscientização
educação problematizar o futuro para que a utopia de um da opressão e a consequente ação transformadora.
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Segundo Andreolla44, a categoria opressão em Paulo Freire de professores tomam conhecimento de sua proposta. Nas
assume dimensões várias. A saber, na dimensão antropológica, análises de currículo, prática pedagógica e avaliação, em
mata a cultura do homem, o seu saber enquanto homem nas nossas escolas, percebe-se uma aplicabilidade de sua
palavras de Boaventura Santos, um epistemicídio: matar o proposta, ou seja, quando analisamos sobre os conteúdos
conhecimento do outro, na dimensão psicológica derruba com serem interdisciplinares (politécnicos), fragmentários,
o ser, o “eu” do homem, permitindo como consequência sua quando abordamos a necessidade de união entre teoria e
coisificação e ou despersonalização; na dimensão ontológica prática enquanto metodologia e, ainda a democracia
está paralelo à desumanização, enquanto “ser homem” enquanto gestão, nós nos damos conta da pedagogia
(Processo de hominização x Cultura necrófila); na dimensão problematizadora de Paulo Freire.
econômica, a opressão permite que ricos estejam cada vez A lição maior como educadores que temos de Freire é a
mais ricos e pobres cada vez mais pobres. preocupação com o social, a busca de alternativas e propostas
A ideologia do “ter mais” se concretiza na relação devem ser uma constante em nosso dia a dia, no sentido de
dominador e dominado, na dimensão política há resgatar o “homem”, o “cidadão” e o “trabalhador” da alienação
desenfreadamente a ação do poder central sobre a de seu “ser”, de seu exercício de cidadania e de sua dignidade.
periferia, isto é, ou são leis que beneficiam e privilegiam Ainda, como homem de seu tempo, devemos aprender de
alguns, ou são “medidas provisórias” que retratam um Freire, a ter presente o nosso tempo sem alienação do real.
poder autoritário que é cego às necessidades e As proposta pedagógicas devem ser alternativas de
prioridades de uma grande maioria, e por último a hominização em contraposição ao processo de relações
dimensão pedagógica cujo caráter de opressão se econômicas, que se definem em alienação do homem e
estabelece na forma de leis que na prática retrocedem às expropriação de seu saber.
conquistas e desejos de toda comunidade educativa e Segundo Marx45, em O Capital, com a venda da força de
também na forma de relação professor e aluno e todas as trabalho, o trabalhador é considerado igual a uma mercadoria,
nuances do sistema de ensino (currículo, prática é coisificado na relação de produção, é “apropriado” pelo
pedagógica e avaliação). capital, as relações de produção passam pelos critérios do
Ao tratar da pedagogia da consciência pretendeu elucidar capital e não pelos critérios da humanidade. A mercadoria
do educando sua criticidade, criatividade e ação diante do que encobre as características sociais do próprio trabalho dos
está dado, é preciso que o oprimido tenha consciência de sua homens. Fernandes46 explica assim este fetichismo da
opressão, ao tratar da pedagogia da “pergunta” ele torna-se um mercadoria: “(...)...quanto mais o trabalhador se apropria do
sociólogo da sala de aula e reflete a relação professor e aluno mundo exterior, da natureza sensorial, através do seu trabalho,
enquanto concepção bancária x concepção libertadora, onde o tanto mais ele se priva de meios de vida segundo um duplo
primeiro (como num banco) deposita conhecimentos através aspecto; primeiro que cada vez mais o mundo exterior sensorial
da transmissão apenas no segundo e, este o armazena e cessa de ser um objeto pertencente ao seu trabalho, um meio de
devolve na prova final. vida do seu trabalho; segundo, que cada vez mais cessa de ser
O educador faz “depósitos” de conteúdos que devem ser meio de vida no sentido imediato, meio para a subsistência física
arquivados pelos educandos. Desta maneira a educação se do trabalhador. (...) apenas como sujeito físico ele é
torna um ato de depositar, em que os educandos são os trabalhador.”
depositários e o educador o depositante. O educador será Finalizando, as categorias diálogo, oprimido,
tanto melhor educador quanto mais conseguir “depositar” nos problematização, conscientização, libertação definem o
educandos. Os educandos, por sua vez, serão tanto melhores homem político em Paulo Freire. Ou seja, sua proposta vai
educados, quanto mais conseguirem arquivar os depósitos além das críticas das formas educativas atuais, porque define-
feitos. se em uma pedagogia da consciência, consciência crítica
Prova, tão logo, que através da “problematização” da enquanto conhecimento e práxis de classe. Na escola formal, a
realidade, da significação é possível desenvolver uma pedagogia de Paulo Freire requer um professor
concepção libertadora na relação professor e aluno e problematizador da realidade, pois trata-se da pedagogia da
conhecimento e aprendizagem. pergunta que requer diretividade, através de uma relação
Como situação gnosiológica, em que o objeto cognoscível, dialógica e dialética entre professor e aluno, a proposta
em lugar de ser o término do ato cognoscente de um sujeito, é pedagógica de Freire, centraliza-se na dimensão do
mediatizador de sujeitos cognoscentes, educador, de um lado, conhecimento, no sentimento de aceitação do outro, da
educandos, de outro, a educação problematizadora coloca, interação, da intersubjetividade.
desde logo, a exigência da superação da contradição educador A revolução necessária para a transformação social que
x educando. Sem esta, não é possível a relação dialógica, não considera o amor, apenas substituirá o opressor – o
indispensável à cognoscibilidade dos sujeitos cognoscentes, oprimido passa a ser o opressor – que continuará a mesma
em torno do mesmo objeto cognoscível. lógica da dominação.
Entre educador e educandos não há mais uma relação de A revolução deve ser entendida como um processo, uma
verticalidade, em que um é o sujeito e o outro objeto. Agora a mudança democrática e não apenas como uma ruptura. A
pedagogia é dialógica, pois ambos são sujeitos do ato revolução é um processo político pedagógico de
cognoscente. É o “aprender ensinando e o ensinar transformação, que requer reconstrução do poder em novas
aprendendo”. O diálogo, em Freire, exige um pensar formas de relação, a revolução que deve ocorrer é uma grande
verdadeiro, um pensar crítico. Este não dicotomiza homens e ação cultural para a liberdade, realizada pelo povo.
mundo, mas os vê em contínua interação. Como seres A pedagogia do oprimido tem por base o diálogo,
inacabados, os homens se fazem e refazem na interação necessidade ontológica do ser humano. Ser utópico, também, é
com mundo, objeto de sua práxis transformadora. A uma exigência ontológica do ser humano, uma exigência
prática pedagógica passa a ser uma ação política de troca histórica. Esta foi sua luta e, é esta a sua lição.
de concretudes e de transformação.
O que Paulo Freire nos ensina hoje é colocar em prática
uma lição que sabemos de cor. Afinal, os cursos de formação
44 ANDREOLA, Balduíno. Comunicação especial. Palestra proferida na disciplina 45 MARX, K. O Capital. Vol. 1, Livro 1: O processo de produção capitalista. Civilização
“História das Idéias Pedagógicas” no curso de Mestrado em Educação da Brasileira, 1968.
Universidade Federal de Pelotas. Dia 16 e 23 de maio de 1997. 46 FERNANDES, Florestan. Marx-Engels: História (textos selecionados) São Paulo:
Ática, 1989.
32
3. A dialogicidade em Freire47 estruturação dos Círculos de Cultura, peça fundamental da
Para a criação de um clima dialógico é preciso um educação popular, onde é aplicado o método de alfabetização.
componente especial do diálogo, que é a palavra, o autor Assim, percebe-se que com a dialogicidade as pessoas
comenta que a palavra verdadeira, práxis, é composta de ação podem despertar para a consciência crítica do mundo em
e reflexão. Sem esta mistura, o diálogo se torna meramente que se encontram, saindo de sua condição de oprimidas, e
palavras jogadas ao vento, ou seja, falar por falar, ou então, se buscando assim a condição do ser mais, em meio a um
for inautêntica, oca e esgotada de sua dimensão de ação, processo de humanização, em atendimento a uma vocação
sacrificada automaticamente, a reflexão se transforma em blá, humana universal.
blá, blá. Além disso, a palavra pode se tornar ativismo, ação
pela ação, se minimizada a sua reflexão. 4. Os sete princípios da aprendizagem dialógica
Neste sentido, é importante que todos nós saibamos que A origem deste conceito se deu no Centro Especial de
sendo o diálogo um conjunto de palavras verdadeiras em que Investigação em Teorias e Práticas Superadoras das
deve haver a união da ação com a reflexão, as pessoas não são Desigualdades (CREA), da Universidade de
capazes de fazê-lo sozinhas, pois para que seja estabelecido é Barcelona/Espanha que tem por objetivo estudar as
necessário que outras pessoas se encontrem e o pronunciem transformações sociais e culturais a fim de garantir
juntas. educação de qualidade a todos. Este grupo tem como base
Segundo Freire48, não existe diálogo se não houver um teórica os estudos de Paulo Freire com a sua dialogicidade e os
profundo amor ao mundo e aos homens, sendo assim, o estudos de Habermas com sua teoria da Ação Comunicativa.
diálogo deve ser ato de coragem, além de ser também Sendo assim, participantes deste Centro de Investigação, como
compromisso às mulheres e aos homens, para que haja um Ramon Flecha, Ligia Puigvert e outros, criaram os sete
clima dialógico, é preciso que haja ainda, além da ação e da princípios da aprendizagem dialógica que são:
reflexão, a fé, o amor, a humildade e a esperança intensa nos
homens. Isto porque com a fé é possível se instaurar um clima A) Diálogo Igualitário:
de confiança entre todas as pessoas antes de se encontrarem e Antes de entrarmos na explicação de diálogo igualitário,
pronunciar a palavra verdadeira. Sendo assim, esta confiança nos perguntávamos o porquê da palavra diálogo vir
vai fazendo as cada vez mais companheiras e dialógicas no acompanhada do adjetivo igualitário. Então, refletimos que
mundo. Já o amor é imprescindível para o clima dialógico, pois este adjetivo mostra um compromisso com o diálogo,
sem ele não se conquistam os sonhos. Se não há um clima de caracterizando-o como igualitário, ou seja, que haja respeito
amor o diálogo se perde no percurso e, portanto, deixa de ser em saber ouvir, que haja direito de todos se manifestarem e
verdadeiro. Além disso, se não houver a humildade o diálogo terem opiniões distintas. O adjetivo igualitário, com o
não existe, pois se as pessoas não veem em si a sua ignorância, substantivo diálogo, fortalece a ideia de que o diálogo deve ser
mas só a do outro, se se pensa dono do saber e da verdade não igual. Sendo assim, reforçando assim, a ideia da igualdade
é capaz de criar um clima dialógico. entre as pessoas, no sentido de que todos devem ter o direito
Por último, é importante destacar que a esperança está da palavra.
na própria imperfeição das pessoas, e estas fazem com Para se definir o diálogo igualitário, conceito formado pelo
que vivam sempre na eterna busca, busca essa que se CREA, foram utilizadas grandes teorias do sociólogo europeu,
traduz em busca de se melhorar, de aprender, de querer como a da Ação Comunicativa de Habermas e a dialogicidade
ser, portanto, sendo o diálogo um encontro das pessoas de Paulo Freire.
para ser mais é preciso que este seja feito sempre com A teoria de Habermas está pautada na validez dos
esperança. Assim, a esperança não é um cruzar de braços argumentos e no consenso, ou seja, é mais importante que haja
e esperar, mas sim um mover-se na esperança enquanto o diálogo e boas argumentações para se alcançar um objetivo
luta, e se luta com esperança então pode esperar. do que alcançar um resultado pela posição de poder. Um
Portanto, para haver a comunicação entre as pessoas é exemplo de Ação Comunicativa, encontrada em Flecha50 é um
preciso que haja a fé, o amor, a humildade e a esperança, a fim casal de namorados decidir junto sua programação do final de
de estabelecer o diálogo verdadeiro através de um pensar semana pensando que o importante na relação é fazerem algo
verdadeiro e crítico. Preocupado em despertar a consciência juntos e interessante para os dois. Neste caso, o importante é
de todas/todos para o mundo em que estão inseridas/os e que estejam felizes e bem juntos, sem que apenas um decida o
para a busca de sua liberdade, criou um método pautado na que deverá ser feito. Segundo este autor, o conceito central da
dialogicidade em que pode aplicar todo o seu pensamento para Ação Comunicativa é que se não houver um consenso e a
tirá-las da condição de oprimidas. manifestação de todos e todas sobre determinado assunto, não
Como parte deste método, Freire e as/os deve existir então uma decisão.
educandas/os investigavam, por meio de entrevista e por A teoria de Habermas contribuiu para a formação do
meio de visitas ao cotidiano das/os educandas/os, a diálogo igualitário, a ação Comunicativa permite-nos pensar o
realidade de cada participante, criando assim os temas diálogo, assim como a dialogicidade nos dá este suporte.
geradores. Estes se dão pelo universo temático do povo ou do Conforme Freire51, para o diálogo se estabelecer é preciso que
conjunto de seus temas geradores e se define como sendo o haja ação e reflexão, ou seja, práxis verdadeira, compromisso
universo mínimo temático de cada educanda/o. Portanto, se com a palavra. Se não for assim, a palavra acaba por se tornar
fundamenta no universo temático do povo, ou seja, pesquisa- um ativismo, ação pela ação, ou então a reflexão se torna um
se o universo de palavras das/os educandas/os para através emaranhado de palavras sem sentido e sem reflexão.
destas, ensiná-las/os, conscientizá-las/os. Para que exista este espaço de dialogicidade com o
De acordo com o prefácio de Weffort na obra Educação diálogo igualitário, é necessário dar prioridade de fala aos
como Pratica da Liberdade, a pedagogia de Freire49 é pautada grupos que historicamente sofrem maior exclusão social,
na liberdade que só pode ter sentido se a prática educativa for como os grupos de mulheres, dos negros, das pessoas com
alcançada pela participação crítica e livre das/os menor grau de escolaridade, dando-lhes a oportunidade
educandas/os, e este é um dos princípios essenciais para a de inclusão à manifestação e diminuindo as barreiras ou
47 MORETTI, J. A. A dialogicidade de Freire na construção do diálogo igualitário e 50 FLECHA, R. Compartiendo palabras: el aprendizaje de las personas adultas a
suas relações com os princípios da Aprendizagem Dialógica. 2007.
48 FREIRE, P. Pedagogia do Oprimido. Rio de Janeiro: Paz e Terra. 35ª edição, 2003. través del diálogo. Barcelona: Paidós, 1997.
49 FREIRE, P. Educação como prática da liberdade, Rio de Janeiro: Paz e Terra. 29ª 51 Idem
edição, 2006.
33
imposições geralmente sofridas na sociedade. quando este discute em sua obra Pedagogia do Oprimido que
Portanto, é evidente que o diálogo igualitário é um meio de as pessoas são seres da transformação e nunca de adaptação.
comunicação importante em que as pessoas podem aprender De transformação porque os seres humanos são capazes de
e ensinar, ou seja, que todas/os devemos nos educar para fazê- tomar consciência de sua realidade e de mudá-la, ou seja,
lo; não é uma tarefa fácil, mas é necessária para realizar as transformá-la. São capazes de tomar a transformação para si,
transformações sociais que queremos, ou seja, como diria a fim de que esta passe a ser parte deles próprios. Já a
Freire: para tornar o mundo menos feio e difícil de amar. Além adaptação não passa de mera aceitação da realidade, posta tal
disso, é ele quem dá suporte para pensar os outros princípios como foi criada pelas classes dominantes.
da aprendizagem dialógica. Assim, o autor retoma o seu método de alfabetização para
jovens e adultos que traz claramente o conceito de
B) Inteligência cultural: transformação. Pois, através deste método, se espera que as
A inteligência cultural, segundo princípio da aprendizagem mulheres e os homens tomem consciência de sua
dialógica parte do princípio de que todas as pessoas realidade, podendo transformá-la saindo assim de sua
possuem conhecimentos, sejam tácitos ou acadêmicos, e condição de oprimidos. Ou seja, a transformação aqui é um
que estes conhecimentos podem ser trocados com outras conceito que serve para mudar algo já imposto socialmente.
pessoas em relações mais ou menos formais. Para isso é Entretanto, é importante destacar que a transformação só
importante que as pessoas saibam fazer o diálogo igualitário deve ocorrer quando todas as pessoas de um grupo estão
para não reproduzir ainda mais as relações de poder. Portanto, efetivamente sujeitas a mudanças, e estas, devem ocorrer
todas as pessoas, de qualquer idade e classe social e capazes através do diálogo, sem que se imponham ideias às demais
de linguagem, se desenvolvem através das interações, ou seja, pessoas e coletivos.
podem adquirir ainda mais conhecimento através da
troca de experiência adquirida por sua inteligência D) Dimensão instrumental
cultural. A dimensão instrumental está presente na aprendizagem
Todos ser humano vive em meio a sua cultura, e através dialógica, pois é importante que se aprenda tudo o que parece
dela aprende muitas outras coisas, conhece muitas outras necessário para viver de forma mais igualitária no mundo.
culturas e vive muitas outras experiências. A isto chamamos Podemos dizer que a dimensão instrumental é a
de inteligência cultural, pois é todo conhecimento de mundo aprendizagem de conteúdos, instrumentos fundamentais
que adquirimos com o passar dos anos, das nossas vivências. que constituem a base para ultrapassar as demais
Ou seja, o mais importante é que duas pessoas ao interagir aprendizagens. Ou seja, são pré-requisitos que devem ser
tenham a consciência de que ambos podem aprender e bem compreendidos para se poder aprender outros
ensinar, independentemente de seu grau de escolaridade. adiante.
O conceito de inteligência cultural tem seu marco Na dimensão instrumental o processo de ensino e
adequado para superar as teorias dos déficits, aprendizagem não acontece como na educação bancária,
especificamente, referidas à população adulta. Flecha52, em explicitada por Freire, em que o professor deposita nos alunos
sua obra, cita outros autores que mostraram que estudos conteúdos descontextualizados da realidade destes. Aqui, para
quantitativos confirmaram a diminuição da inteligência depois a dimensão instrumental acontecer, é necessário que o
da juventude. grupo e cada indivíduo dele dialoguem sobre as
Autores como Wechsler e outros citados por Flecha, que experiências que têm sobre o tema escolhido para a
mediram a relação da inteligência com a idade, concluíram que discussão. Portanto, todos trazem contribuições para a
a inteligência decrescia conforme a pessoa se tornava adulta, e aprendizagem, levando em conta suas experiências e
assim confundiam idade com geração. Ou seja, esqueceram de conhecimento sobre o assunto.
considerar que gerações diferentes tiveram oportunidades e A dimensão instrumental não é uma pedagogia menos
aprendizagem muito desiguais. Além disso, seus testes dirigida, descomprometida com a realidade, que apenas
transversais mediam a inteligência de pessoas diferentes em fortalece o espírito crítico deixando em segundo plano a
um mesmo momento. aprendizagem. Ao contrário, Freire já afirmava que o diálogo
Em outras palavras estas pessoas foram, por muito tempo, implica possibilita que todos as crianças possam aprender
marginalizadas da sociedade, pois se considerava que se não conteúdos e estratégias para viver em sociedade.
aprendessem conteúdos conceituais quando crianças não mais Vale destacar ainda que a dimensão instrumental da
seriam capazes de aprender quando adultas. aprendizagem dialógica se pauta na intenção de darmos
Flecha53 (1997) diz que Freire, por exemplo, não às crianças uma educação de qualidade, para que estas
desvaloriza aquele que não tem acesso à educação formal, ao tenham as mesmas oportunidades que os filhos da elite ou
contrário, valoriza muito estas pessoas, pois possuem uma de quem pode pagar por educação de qualidade. Isto é
grande experiência de vida, ou seja, inteligência cultural. importante, porque a sociedade da informação na qual
Concordando com Freire, acredito que não ter conhecimento estamos vivendo atualmente exige cada vez mais que os
escolar não é sinônimo de falta de cultura e de falta de educandos adquiram uma série de aprendizagens
inteligência. Os analfabetos têm história, e não é porque não instrumentais para não serem excluídos do mercado de
sabem ler a palavra nem mesmo escrever sua história que não trabalho, da formação permanente e da participação social
são capazes de transformar a realidade, pois sabem ler o como cidadão de plena formação.
mundo e contar sua história. Portanto, considerou-se que a leitura e a escrita são
Para Freire (1994) a leitura de mundo precede a leitura da elementos imprescindíveis desta dimensão instrumental, pois
palavra, pois antes da aquisição do código da leitura e da através delas é possível processar e selecionar informações
escrita o ser humano já decodifica os códigos do entorno de além daquelas que são conteúdos escolares obrigatórios.
qual faz parte, apreendendo as relações entre os objetos e a
razão de ser dos mesmos, o sujeito cognoscente produz a E) Criação de sentido
inteligência dos objetos, dos fatos, do mundo. Este princípio tem relação direta com o sonhar e o sentir,
pois defende a ideia de que todos podem sonhar e sentir, dar
C) Transformação: sentido a sua e a nossa existência. Ou seja, todas as pessoas têm
Este conceito foi inspirado na teoria de Paulo Freire, que buscar motivação nas coisas que fazem, e devemos gostar
52 Idem 53 Idem
34
do que fazem, pois quando não se faz algo com prazer ocorre a excluídas dos âmbitos da sociedade. Portanto, deve existir
perda de sentido. uma consideração de justiça nas nossas diferenças.
Desta forma, nota-se que ter um ambiente para dialogar
com outras pessoas ajuda a recriar continuamente o sentido 4. Pedagogia da autonomia: Saberes necessários à
global de suas vidas, assim, para a criação de sentido existir e prática educativa
permanecer, é importante descobrir o sentido pelo qual se Ensinar exige rigorosidade metódica
fazem determinadas tarefas como trabalhar, estudar, comer, O educador democrático não pode negar-se o dever de, na
enfim, é descobrir que cada uma das nossas atitudes tem um sua prática docente, reforçar a capacidade crítica do educando,
impacto em nossas vidas e na sociedade. sua curiosidade, sua insubmissão. Uma de suas tarefas
Um clima dialógico aqui funciona como um espaço em primordiais é trabalhar com os educandos a rigorosidade
que as pessoas possam, juntas, contando suas metódica com que devem se “aproximar” dos objetos
experiências, dar sentido a seus atos e às coisas que fazem cognoscíveis.
em suas vidas. E esta rigorosidade metódica não tem nada que ver com o
discurso “bancário” meramente transferidor do perfil do
F) Solidariedade: objeto ou do conteúdo. É exatamente neste sentido que
Com o advento do capitalismo e com a complexificação da ensinar não se esgota no “tratamento” do objeto ou do
vida em sociedade, passou-se a exigir cada vez mais que as conteúdo. É exatamente neste sentido que ensinar não se
pessoas obtivessem informações rápidas e, aqueles que não esgota no “tratamento” do objeto ou do conteúdo,
tinham oportunidade e acesso às informações foram excluídos superficialmente feito, mas se alonga à produção das
do mercado de trabalho e de muitos círculos sociais, sendo condições em que aprender criticamente é possível.
selecionados, para determinadas funções por não serem E essas condições em que aprender criticamente é
considerados aptos. possível, que implica ou exige a presença de educadores e de
Sendo assim, a solidariedade surge aqui como um educandos criadores, instigadores, inquietos, rigorosamente
sentimento de ser humano pelo outro, de se fazer curiosos, humildes e persistentes. Faz parte das condições em
tentativa de incluí-lo na vida cotidiana que o excluiu, que aprender criticamente é possível a pressuposição por
trazendo-lhe informações e, mais do que isso, lhe dando o parte dos educandos de que o educador já teve ou continua
direito e o sentido da palavra, aqui a solidariedade tem tendo experiência da produção de certos saberes e que estes
como fundamento práticas educativas igualitárias. não podem a eles, os educandos, ser simplesmente
Assim, um ambiente de solidariedade abre espaço para as transferidos. Pelo contrário, nas condições de verdadeira
pessoas excluídas e incluídas - que procuram deixar de ser o aprendizagem os educandos vão se transformando em reais
oprimido e o opressor - se comunicarem, expondo suas ideias sujeitos da construção e da reconstrução do saber ensinando,
a respeito dos fatos que ocorrem ao seu redor. Ou seja, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo. Só assim
discutem as concepções de poder que muitas vezes falam mais podemos falar realmente de saber ensinado, em que o objeto
alto que qualquer outra coisa e acarretam a exclusão de ensinado é apreendido na sua casa razão de ser e, portanto,
muitas/os, seja com relação a nível social, econômico ou aprendido pelos educandos.
cultural. Percebe-se assim, a importância do papel do educador, o
O mais importante nisso tudo é que, a solidariedade se mérito da paz com que viva a certeza de que faz parte de sua
estabelece dando sempre prioridade de participação tarefa docente não apenas ensinar os conteúdos, mas também
daqueles que têm menor nível acadêmico, a fim de ensinar a pensar certo. Daí a impossibilidade de vir a tornar-
propiciar um ambiente em que as oportunidades de se um professor crítico se, mecanicamente memorizador, é
participação se equilibrem. muito mais uma repetidor cadenciado de frases e de ideias
Na sociedade, a solidariedade é um conceito que inertes do que desafiador...
dificilmente se estabelece pela falta de compreensão de
mundo que ainda temos nos seres humanos, há um outro fator, Ensinar exige pesquisa
atrelado às relações sociais, que não abre espaço para a Não há ensino sem pesquisa e pesquisa sem ensino,
solidariedade ocorrer efetivamente, que são as relações de esses fazeres se encontram um no corpo do outro,
poder. Estas dominam os seres humanos e, devido à correria enquanto ensino continuou buscando. Ensino porque
da vida cotidiana, muitas vezes não permitem que as pessoas busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso
parem para refletir sobre seus atos, ou seja, para ser solidárias para constatar, constatando, intervenho intervindo educo e
com o próximo. me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço e
comunicar ou anunciar a novidade.
G) Igualdade de diferenças: Pensar certo, em termos críticos, é uma exigência que os
A igualdade de diferença é um conceito que busca momentos do ciclo gnosiológico vão pondo à curiosidade que,
valorizar a cultura, raça, etnia, decisão política, a tornando-se mais e mais metodicamente rigorosa, transita de
diferença de cada pessoa de forma respeitosa, a diferença ingenuidade para que venho chamando “curiosidade
aqui não é problema, como costumamos ver na sociedade, pois epistemológica”.
se espera que as pessoas aprendam a conviver socialmente A curiosidade ingênua, de que resulta indiscutivelmente
com diferentes pessoas, conhecendo diferentes modos de vida. em certo saber, não imposta que metodicamente é a que
Dessa forma, a aprendizagem dialógica se orienta para a caracteriza o senso comum. O Saber de pura experiência feito.
igualdade das diferenças, quando afirma que a verdadeira Pensar certo, do ponto de vista do professor, tanto implica
igualdade inclui o direito a todas pessoas de viver e ser de o respeito ao senso comum no processo de sua necessária
forma diferente, assim devemos superar alguns muros superação quanto o respeito e o estímulo à capacidade
antidialógicos postos na sociedade como, por exemplo, os criadora do educando. Implica o compromisso da
culturais, os sociais e os pessoais. educadora com a consciência crítica do educando, cuja
Embora a diversidade entre as pessoas venha criando “promoção” da ingenuidade não se faz automaticamente.
desigualdades educativas, visto que a diferença gera, de
certa forma, desigualdade, espera-se com a perspectiva Ensinar exige respeito aos saberes dos educadores
dialógica orientada para o exercício do direito uma O pensar certo coloca ao professor ou, mais
educação igualitária, dar o direito às pessoas de serem amplamente, à escola, o dever de não só respeitar os
diferentes e, mais que isso, de se manifestarem sem serem saberes com que os educandos, sobretudo os das classes
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populares, chegam a ela – saberes socialmente dificuldades que os caminhos verdadeiros podem nos
construídos na prática comunitária -, mas também, colocar.
discutir com os alunos a razão de ser de alguns desses Mulheres e homens, seres histórico-sociais, nos tornamos
saberes em relação com o ensino dos conteúdos. capazes de comparar, de valorar, de intervir, de escolher, de
Por que não aproveitar a experiência que têm os alunos de decidir, de romper, por tudo isso, nós fizemos seres éticos.
viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público para Éticos, somos porque estamos sendo a condição, entre nós,
discutir, por exemplo, a poluição dos riachos e dos córregos e para ser.
os baixos níveis de bem-estar das populações, os lixões e os Não é possível pensar os seres humanos longe, sequer, da
riscos que oferecem à saúde das gentes. Por que não há lixões ética, quanto mais fora dela. Estar longe ou, pior, fora da
no coração dos bairros ricos e mesmo puramente remediados ética, entre nós mulheres e homens, é uma transgressão. É
dos centros urbanos? Essa pergunta é considerada em sim por isso que transformar a experiência educativa em puro
demagógica e reveladora da má vontade de quem faz. É a treinamento técnico é amesquinhar o que há de
pergunta de subversivo, dizem certos defensores da fundamentalmente humano no exercício educativo; o seu
democracia. caráter formador. Se se respeita a natureza do ser humano, o
Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a ensino dos conteúdos não pode dar-se alheio à formação moral
que se deve associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a do educando. Educar é substantivamente formar.
realidade agressiva em que a violência é a constante e a Divinizar ou diabolizar a tecnologia ou a ciência é uma
convivência das pessoas é muito maior com a morte do que forma altamente negativa e perigosa de pensar errado, de
com a vida? Por que não estabelecer uma “intimidade” entre testemunhar aos alunos, às vezes com ares de quem possui a
os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a verdade, um rotundo desacerto. Pensar certo, pelo contrário,
experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não demanda profundidade e não superficialidade na
discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal compreensão e na interpretação dos fatos. Supõe a
descanso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A disponibilidade à revisão dos achados, reconhece não apenas
ética de classe embutida neste descanso? a possibilidade de mudar de opção, de apreciação, mas o
Porque, dirá um educador reacionariamente direito de fazê-lo. Mas como não há pensar certo à margem de
pragmático, a escola não tem nada que ver com isso. A princípios éticos, se mudar é uma possibilidade e um direito,
escola não é partido. Ela tem que ensinar os conteúdos, cabe a quem muda – exige o pensar certo – que assuma a
transferi-los aos alunos. Aprendidos, estes operam por si mudança operada. Do ponto de vista do pensar certo não é
mesmos. possível mudar e fazer de conta que não mudou. É que todo
pensar certo é radicalmente coerente.
Ensinar exige criticidade
A curiosidade ingênua que, “desarmada”, está associada ao Ensinar exige a corporificação das palavras pelo
saber do senso comum, é a mesma curiosidade que, criticando- exemplo
se, aproximando-se de forma cada vez mais metodicamente O professor que realmente ensina, quer dizer, que trabalha
rigorosa do objeto cognoscível, se torna curiosidade os conteúdos no quadro da rigorosidade do pensar certo, nega,
epistemológica. Muda de qualidade, mas não de essência. como falsa, a fórmula farisaica do “faça o que mando e não o
A curiosidade como inquietação indagadora, como que eu faço”. Quem pensa certo está cansando de saber que as
inclinação ao desvelamento de algo, como pergunta palavras a que falta a corporeidade do exemplo pouco ou
verbalizada ou não, como procura de esclarecimento, quase nada valem. Pensar certo é fazer certo.
como sinal de atenção que sugere alerta, faz parte O clima de quem pensa certo é o de quem busca
integrante do fenômeno vital. Não haveria criatividade seriamente a segurança na argumentação, é o de quem
sem a curiosidade que nos move e que nos põe busca seriamente a segurança na argumentação, é o de
pacientemente impacientes diante do mundo que não quem, discordando do seu oponente, não tem por que
fizemos, acrescentando a ele algo que fazemos. contra ele ou contra ela nutrir uma raiva desmedida, bem
Como manifestação presente à experiência vital, a maior.
curiosidade humana vem sendo histórica e socialmente
construída e reconstruída. Precisamente porque a promoção Ensinar exige risco, aceitação do novo e rejeição a
da ingenuidade para a criticidade não se dá automaticamente, qualquer forma de descriminação
uma das tarefas precípuas da pratica educativo-progressiva é É próprio do pensar certo a disponibilidade ao risco, a
exatamente o desenvolvimento da curiosidade com que aceitação do novo que não pode ser negado ou acolhido só
podemos nos defender de “irracionalismos” decorrentes do ou porque é novo, assim como o critério de recusa ao velho não é
produzimos por certo excesso de “racionalidade” de nosso apenas o cronológo. O velho que preserva sua validade ou que
tempo altamente tecnologizado. E não vai nesta consideração encarna uma tradição ou marca uma presença no tempo
nenhuma arrancada falsamente humanista de negação da continua novo.
tecnologia e da ciência. Pelo contrário, é consideração de Faz parte igualmente do pensar certo a rejeição mais
quem, de um lado, não diviniza a tecnologia, mas, de outro, não decida a qualquer forma de descriminação. A prática
a diaboliza. De quem a olha ou mesmo a espreita de forma preconceituosa de raça, de classe, de gênero ofende a
criticamente curiosa. substantividade do ser humano e nega radicalmente a
democracia.
Ensinar exige estética e ética Pensar e fazer errado, pelo visto, não têm mesmo nada ver
A necessária promoção da ingenuidade à criticidade com a humildade que o pensar certo exige. Não têm nada que
não pode ou não deve ser feita à distância de uma rigorosa ver com o bom-senso que regula nossos exageros e evita as
formação ética ao lado sempre da estética. Cada vez me nossas caminhadas até o ridículo e a insensatez.
convenço mais de que, desperta com relação à possibilidade de Dessa forma, mesmo que ainda não totalmente convertido
enveredar-se no descaminho do puritanismo, a prática ao “pragmatismo” neoliberal, mas por ele já tocado, diga que,
educativa tem de ser, em si, um testemunho rigoroso de sonhador, continuo a falar de uma educação de anjos e não de
decadência e de pureza. mulheres e de homens. O que tenho dito até agora, porém, diz
Uma crítica permanente aos desvios fáceis com que respeito radicalmente à natureza de mulheres e de homens.
somos tentados às vezes ou quase sempre, a deixar as Natureza entendida como social e historicamente
constituindo-se, e não como um a priori da história.
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Ensinar exige reflexão crítica sobre a prática Ensinar exige consciência do inacabamento
O pensar certo sabe, por exemplo, que não é a partir dele Um professor crítico, sou um “aventureiro” responsável
como um dado que se conforma a prática docente crítica, mas predisposto à mudança, à aceitação do diferente, deve
sabe também que sem ele não se funda aquela. necessariamente repetir-se. Aqui chegamos ao ponto de que
A prática docente crítica, implicante do pensar certo, talvez devêssemos ter partido. O do inacabamento do ser
envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e humano. Na verdade, o inacabamento do ser ou sua
o pensar sobre o fazer. O Saber que a prática docente inconclusão é próprio da experiência vital. Onde há vida, há
espontânea ou quase espontânea, “desarmada”, inacabamento.
indiscutivelmente produz é um saber ingênuo, um saber de Mas só entre mulheres e homens o inacabamento se tornou
experiência feito, a que falta rigorosidade metódica que consciente. A invenção da existência a partir dos materiais que
caracteriza a curiosidade epistemológica do sujeito. a vida oferecia levou homens e mulheres a promover o suporte
Este não é o saber que a rigorosidade do pensar certo em que os outros animais continuam, em mundo. Seu mundo,
procura. Por isso, é fundamental que, na prática da formação mundo dos homens e das mulheres. A experiência humana
docente, o aprendiz de educador assuma que o indispensável no mundo muda de qualidade com relação à vida animal.
pensar certo não é presente dos deuses nem se acha nos guias O suporte é o espaço, restrito ou alongado, que o animal se
de professores que iluminados intelectuais escrevem desde o prende "afetivamente" tanto quanto para, resistir; e o espaço
centro do poder, mas, pelo contrário, o pensar que supera o necessário a seu crescimento e que delimita seu domínio. É o
ingênuo tem que ser produzido pelo próprio aprendiz em espaço em que, treinado, adestrado, "aprende" a sobreviver, a
comunhão com o professor formador. caçar, a atacar, a defender- se nutri tempo de dependência dos
É preciso, por outro lado, reinsistir em que a matriz do adultos imensamente menor do que é necessário ao ser
pensar ingênuo, como a do crítico, é a curiosidade mesma, humano para as mesmas coisas.
característica do fenômeno vital. Neste sentido, Quanto mais cultural é o ser maior a sua infância, sua
indubitavelmente, é tão curioso o professor chamado leigo no dependência de cuidados especiais. Faltam ao "movimento"
interior de Pernambuco quanto o professor de filosofia da dos outros animais no suporte à linguagem conceitual, a
educação na universidade A ou B. O de que precisa é inteligibilidade do próprio suporte de que resultaria
possibilitar, que, voltando-se sobre si mesma, através da inevitavelmente a comunicabilidade do inteligido, o espanto
reflexão sobre a prática, a curiosidade ingênua, percebendo-se diante da vida mesma, do que há nela de mistério.
como tal, se vá tornando crítica... No suporte, os comportamentos dos indivíduos têm sua
explicação muito mais na espécie a que pertencem os
Ensinar exige o reconhecimento e a assunção de indivíduos do que neles mesmos. Falta- lhes liberdade de
identidade cultural opção. Por isso, não se fala em ética entre os elefantes.
O verbo assumir é um verbo transitivo e que pode ter como A vida no suporte não implica a linguagem nem a postura
objeto o próprio sujeito que assim se assume. Outro sentido ereta que permitiu a liberação das mãos. Mãos que, em grande
mais radical tem assunção ou assumir quando digo: uma das medida, nos fizeram. Quanto maior se foi tornando a
tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é solidariedade entre mente e mãos, tanto mais o suporte foi
proporcionar as condições em que os educandos em suas virando mundo e a vida, existência. O suporte veio fazendo- se
relações uns com os outros e todos com o professor ou a mundo e a vida, existêmia, na proporção que o corpo humano
professora ensaiam a experiência profunda de assumir- vira corpo consciente, captador, apreendedor, transformador,
se. criador de beleza e não "espaço" vazio a ser enchido por
Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, conteúdos.
comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos,
capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se como Ensinar exige o reconhecimento de ser condicionado
sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto. A Esta é a diferença profunda entre o ser condicionado e o
assunção de nós mesmos não significa a exclusão dos outros, É ser determinado. A diferença entre o inacabado que não se
a “outredade” do “não eu”, ou do tu, que me faz assumir a sabe como tal e o inacabado que histórica e socialmente
radicalidade de meu eu. alcançou a possibilidade de saber- se inacabado. Gosto de
A questão da identidade cultural, de que fazem parte a ser gente porque, como tal, percebo afinal que a construção de
dimensão individual e a de classe dos educandos cujo respeito minha presença no mundo, que não se faz no isolamento,
é absolutamente fundamental na prática educativa isenta o a influência das forças sociais, que não se compreende
progressista, é problema que não pode ser desprezado. Tem fora da tensão entre o que herdo geneticamente e o que herdo
que ver diretamente com assunção de nós por nós mesmos. É social, cultural e historicamente, tem muito a ver comigo
isto que o puro treinamento do professor não faz, perdendo-se mesmo.
e perdendo-o na estreita e programática visão do processo. Gosto de ser gente porque, mesmo sabendo que as
condições materiais, econômicas, sociais e políticas, culturais
Ensinar não é transferir conhecimento e ideológicas em que nos achamos geram quase sempre
As considerações ou reflexões até agora feitas vêm barreiras de difícil superação para o cumprimento de nossa
sendo desdobramentos de um primeiro saber tarefa histórica de mudar o mundo, sabe-se também que os
inicialmente apontado como necessário à formação obstáculos não se eternizam.
docente, numa perspectiva progressista. Saber que
ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as Ensinar exige respeito à autonomia do ser do
possibilidades para a sua própria educação produção ou a educando
sua construção. Outro saber necessário à prática educativa, e que se funda
É preciso insistir: este saber necessário ao professor - de na mesma raiz - a da inconclusão do ser que se sabe inconcluso
que ensinar não é transferir conhecimento - não apenas -, é o que fala do respeito devido à autonomia do ser do
precisa ser apreendido por ele e pelos educandos nas suas educando, do educando criança, jovem ou adulto.
razões de ser – odontológica, política, ética, epistemológica, Como educador, devo estar constantemente advertido
pedagógica, mas também precisa ser constantemente com relação a este respeito que implica igualmente o que
testemunhado, vivido. devo ter por mim mesmo. Não faz mal repetir afirmação
várias vezes feita neste texto - o inacabamento de que nos
tornamos conscientes nos fez seres éticos.
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O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um tomada de posição, a que não pode faltar a ética, em face do
imperativo ético e não um favor que podemos ou não que devo fazer.
conceder uns aos outros. Precisamente porque éticos
podemos desrespeitar a rigorosidade da ética e resvalar para Ensinar exige humildade, tolerância e luta em defesa
a sua negação, por isso é imprescindível deixar claro que a dos direitos dos educadores
possibilidade do desvio ético não pode receber outra Se há algo que os educandos brasileiros precisam saber,
designação senão a de transgressão. desde a mais tenra idade, é que a luta em favor do respeito aos
O professor que desrespeita a curiosidade do educando, o educadores e à educação inclui que a briga por salários menos
seu gosto estético, a sua inquietude, a sua linguagem, mais imorais é um dever irrecusável e não só um direito deles.
precisamente, a sua sintaxe e a sua prosódia; o professor que A luta dos professores em defesa de seus direitos e de
ironiza o aluno, que o minimiza, que manda que "ele se ponha sua dignidade deve ser entendida como um momento
em seu lugar" ao mais tênue sinal de sua rebeldia legítima, importante de sua prática docente. Não é algo que vem de
tanto quanto o professor que se exime do cumprimento de seu fora da atividade docente, mas algo que dela faz parte. O
dever de propor limites à liberdade do aluno, que se furta ao combate em favor da dignidade da prática docente é tão parte
dever de ensinar, de estar respeitosamente presente à dela mesma quanto dela faz parte o respeito que o professor
experiência formadora do educando, transgride os princípios deve ter à identidade do educando, à sua pessoa, a seu direito
fundamentalmente éticos de nossa existência. de ser.
É neste sentido que o professor autoritário, que por isso Um dos piores males que o poder público vem fazendo a
mesmo afoga a liberdade do educando, amesquinhando o seu nós, no Brasil, historicamente, desde que a sociedade
direito de estar sendo curioso e inquieto, tanto quanto o brasileira foi criada, é o de fazer muitos de nós correr o risco
professor licencioso rompe com a radicalidade do ser humano de, a custo de tanto descaso pela educação pública,
- a de sua inconclusão assumida em que se enraíza a eticidade. existencialmente cansados, cair no indiferentismo
É neste sentido também que a dialogicidade verdadeira, fatalistamente cínico que leva ao cruzamento dos braços. "Não
em que os sujeitos dialógicos aprendem e crescem na há o que fazer" é o discurso acomodado que não podemos
diferença, sobretudo, no respeito a ela, é a forma de estar aceitar.
sendo coerentemente exigida por seres que, inacabados, O meu respeito de professor à pessoa do educando, à sua
assumindo- se como tais, se tornam radicalmente éticos. É curiosidade, à sua timidez, que não devo agravar com
preciso deixar claro que a transgressão da eticidade jamais procedimentos inibidores exige de mim o cultivo da
pode ser vista ou entendida como virtude, mas como ruptura humildade e da tolerância. Como posso respeitar a curiosidade
com a decência. do educando se, carente de humildade e da real compreensão
do papel da ignorância na busca do saber, temo revelar o meu
Ensinar exige bom-senso desconhecimento? Como ser educador, sobretudo numa
A vigilância do meu bom senso tem uma importância perspectiva progressista, sem aprender, com maior ou menor
enorme na avaliação que, a todo instante, devo fazer de minha esforço, a conviver com os diferentes? Como ser educador, se
prática. Antes, por exemplo, de qualquer reflexão mais detida não desenvolvo em mim a indispensável amorosidade aos
e rigorosa é o meu bom senso que me diz ser tão negativo, do educandos com quem me comprometo e ao próprio processo
ponto de vista de minha tarefa docente, o formalismo formador de que sou parte? Não posso desgostar do que faço
insensível que me faz recusar o trabalho de um aluno por sob pena de não fazê-lo bem. Desrespeitado como gente no
perda de prazo, apesar das explicações convincentes do aluno, desprezo a que é relegada a prática pedagógica não tenho por
quanto o desrespeito pleno pelos princípios reguladores da que desamá-la e aos educandos. Não tenho por que exercê-la
entrega dos trabalhos. mal. A minha resposta à ofensa à educação é a luta política
É o bom senso que adverte de que exercer a autoridade consciente, crítica e organizada contra os ofensores. Aceito até
de professor na classe, tomando decisões, orientando abandoná-la, cansado, à procura de melhores dias. O que não é
atividades, estabelecendo tarefas, cobrando a produção possível é, ficando nela, aviltá-la com o desdém de mim mesmo
individual e coletiva do grupo não é sinal de autoritarismo e dos educandos...
de minha parte. É a autoridade cumprindo o seu dever.
Não resolvemos bem, ainda, entre nós, a tensão que a Ensinar exige apreensão da realidade
contradição autoridade- liberdade nos coloca e Outro saber fundamental à experiência educativa é o que
confundimos quase sempre autoridade com diz respeito à sua natureza, como professor é preciso me
autoritarismo, licença com liberdade. mover com clareza na minha prática, preciso conhecer as
Saber que respeitar à autonomia, à dignidade e à diferentes dimensões que caracterizam a essência da prática,
identidade do educando e, na prática, procurar a coerência o que me pode tornar mais seguro no meu próprio
com este saber, nos inapelavelmente à criação de algumas desempenho.
virtudes ou qualidades sem as quais aquele saber vira O melhor ponto de partida para estas reflexões é a
inautêntico, palavreado vazio e inoperante. inconclusão do ser humano de que se tornou consciente. Como
De nada serve, a não ser para irritar o educando e vimos, aí radica a nossa educabilidade bem como a nossa
desmoralizar o discurso hipócrita do educador, falar em inserção num permanente movimento de busca em que,
democracia e liberdade, mas impor ao educando a vontade curiosos e indagadores, não apenas nos damos conta das
arrogante do mestre. coisas, mas também delas podemos ter um conhecimento
O exercício do bom senso, com o qual só temos o que cabal.
ganhar se faz no "corpo" da curiosidade. Neste sentido, quanto A capacidade de aprender, não apenas para nos
mais pomos em prática de forma metódica a nossa capacidade adaptar mas sobretudo para transformar a realidade,
de indagar, de comparar, de duvidar, de aferir, tanto mais para nela intervir, recriando- a, fala de nossa
eficazmente curiosos nos podemos tornar e mais crítico se educabilidade a um nível distinto do nível do
pode fazer o nosso bom senso. O exercício ou a educação do adestramento dos outros animais ou do cultivo das
bom senso vai superando o que há nele de instintivo na plantas.
avaliação que fazemos dos fatos e dos acontecimentos em que A nossa capacidade de aprender, de que decorre a de
nos envolvemos. Se o bom senso, na avaliação moral que faço ensinar, sugere ou, mais do que isso, implica a nossa
de algo, não basta para orientar ou fundar minhas táticas de habilidade de apreender a substantividade do objeto
luta, tem, indiscutivelmente, importante papel na minha aprendido.
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A memorização mecânica do perfil do objeto não é perguntas a serem feitas insistentemente por todos nós e que
aprendizado verdadeiro do objeto ou do conteúdo. Neste caso, nos fazem ver a impossibilidade de estudar por estudar.
o aprendiz funciona muito mais como paciente da De estudar descomprometidamente como se
transferência do objeto ou do conteúdo do que como sujeito misteriosamente de repente nada tivéssemos que ver com o
crítico, epistemologicamente curioso, que constrói o mundo, um lá fora e distante mundo, alheado de nós e nós dele.
conhecimento do objeto ou participa de sua construção.
É precisamente por causa desta habilidade de apreender a Ensinar exige curiosidade
substantividade do objeto que nos é possível reconstruir um Se há uma prática exemplar como negação da
mal aprendizado, o em que o aprendiz foi puro paciente da experiência formadora é a que dificulta ou inibe a
transferência do conhecimento feita pelo educador. curiosidade do educando e, em consequência, a do
educador. É que o educador que, entregue a
Ensinar exige alegria e esperança procedimentos autoritários ou paternalistas que
Há uma relação entre a alegria necessária à atividade impedem ou dificultam o exercício da curiosidade do
educativa e a esperança, a esperança de que professor e alunos educando, termina por igualmente tolher sua própria
juntos podemos aprender, ensinar, inquietar-nos, produzir e curiosidade.
juntos igualmente resistir aos obstáculos à nossa alegria. Nenhuma curiosidade se sustenta eticamente no exercício
Na verdade, do ponto de vista da natureza humana, a da negação da outra curiosidade, assim a curiosidade dos pais
esperança não é algo que a ela se justaponha, ela faz parte da que só se experimenta no sentido de saber como e onde anda
natureza humana. Seria uma contradição se, inacabado e a curiosidade dos filhos se burocratiza e fenece. A curiosidade
consciente do inacabamento, primeiro, o ser humano não se que silencia a outra se nega a si mesma também. O bom clima
inscrevesse ou não se achasse predisposto a participar de um pedagógico- democrático é o em que o educando vai
movimento constante de busca e, segundo, se buscasse sem aprendendo à custa de sua prática mesma que sua
esperança. curiosidade como sua liberdade deve estar sujeita a
A desesperança é negação da esperança. A esperança é limites, mas em permanente exercício. Limites eticamente
uma espécie de ímpeto natural possível e necessário, a assumidos por ele. Minha curiosidade não tem o direito de
desesperança é o aborto deste ímpeto. A esperança é um invadir a privacidade do outro e expô-la aos demais.
condimento indispensável à experiência histórica. Sem Como professor devo saber que sem a curiosidade que me
ela, não haveria História, mas puro determinismo. Só há move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo
História onde há tempo problematizado e não pré-dado. nem ensino. Exercer a minha curiosidade de forma correta é
A desproblematização do futuro numa compreensão um direito que tenho como gente e a que corresponde o dever
mecanicista da História, de direita ou de esquerda, leva de lutar por ele, o direito à curiosidade. Com a curiosidade
necessariamente à morte ou à negação autoritária do sonho, domesticada posso alcançar a memorização mecânica do perfil
da utopia, da esperança. É que, na inteligência mecanicista deste ou daquele objeto, mas não o aprendizado real ou o
portanto determinista da História, o futuro é já sabido. A luta conhecimento cabal do objeto. A construção ou a produção do
por um futuro assim "a priori" conhecido prescinde da conhecimento do objeto implica o exercício da curiosidade,
esperança. A desproblematização do futuro, não importa em sua capacidade crítica de "tomar distância" do objeto, de
nome de quê, é uma violenta ruptura com a natureza humana observá-lo, de delimitá-lo, de cindi-lo, de "cercar" o objeto ou
social e historicamente constituindo- se. fazer sua aproximação metódica, sua capacidade de comparar,
de perguntar.
Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível Estimular a pergunta, a reflexão crítica sobre a própria
Um dos saberes primeiros, indispensáveis a quem, pergunta, o que se pretende com esta ou com aquela pergunta
chegando a favelas ou a realidades marcadas pela traição a em lugar da passividade em face das explicações discursivas
nosso direito de ser, pretende que sua presença se vá tornando do professor, espécies de resposta a perguntas que não foram
convivência, que seu estar no contexto vá virando estar como feitas. Isto não significa realmente que devamos reduzir a
ele, é o saber do futuro como problema e não como atividade docente em nome da defesa da curiosidade
inexorabilidade. É o saber da História como possibilidade e necessária, a puro vai- e- vem de perguntas e respostas, que
não como determinação. O mundo não é. O mundo está burocraticamente se esterilizam.
sendo. A dialogicidade não nega a validade de momentos
Como subjetividade curiosa, inteligente, interferidora na explicativos, narrativos em que o professor expõe ou fala
objetividade com que dialeticamente me relaciono, meu papel do objeto. O fundamental é que professor e alunos saibam
no mundo não é só o de quem constata o que ocorre mas que a postura deles, do professor e dos alunos, é dialógica,
também o de quem intervém como sujeito de ocorrências. Não aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto
sou apenas objeto da História mas seu sujeito igualmente. fala ou enquanto ouve. O que importa é que professor e
No mundo da História, da cultura, da política, constato não alunos se assumam epistemologicamente curiosos.
para me adaptar, mas para mudar. No próprio mundo físico
minha constatação não me leva à impotência. O conhecimento Ensinar é uma especificidade humana
sobre os terremotos desenvolveu toda uma engenharia que Uma das qualidades essenciais que a autoridade
nos ajuda a sobreviver a eles. Não podemos eliminá-los, mas docente democrática deve revelar em suas relações com
podemos diminuir os danos que nos causam. as liberdades dos alunos é a segurança em si mesma, é a
Constatando, nos tornamos capazes de intervir na segurança que se expressa na firmeza com que atua, com
realidade, tarefa incomparavelmente mais complexa e que decide, com que respeita as liberdades, com que
geradora de novos saberes do que simplesmente a de nos discute suas próprias posições, com que aceita rever- se.
adaptar a ela. É por isso também que não me parece possível Segura de si, a autoridade não necessita de, a cada instante,
nem aceitável a posição ingênua ou, pior, astutamente neutra fazer o discurso sobre sua existência, sobre si mesmo. Não
de quem estuda, seja o físico, o biólogo, o sociólogo, o precisa perguntar a ninguém, certa de sua legitimidade, se
matemático, ou o pensador da educação. Ninguém pode estar "sabe com quem está falando?" Segura de si, ela é porque tem
no mundo, com o mundo e com os outros de forma neutra. Não autoridade, porque a exerce com indiscutível sabedoria.
posso estar no mundo de luvas nas mãos constatando apenas.
A acomodação em mim é apenas caminho para a inserção,
que implica decisão, escolha, intervenção na realidade. Há
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Ensinar exige segurança, competência profissional e Evidentemente, não posso levar meus dias como professor
generosidade a perguntar aos alunos o que acham de mim ou como me
A segurança com que a autoridade docente se move avaliam. Mas devo estar atento à leitura que fazem de minha
implica uma outra, a que se funda na sua competência atividade com eles. Precisamos aprender a compreender a
profissional. Nenhuma autoridade docente se exerce significação de um silêncio, ou de um sorriso ou de uma
ausente desta competência. O professor que não leve a retirada da sala. O tom menos cortês com que foi feita uma
sério sua formação, que não estude, que não se esforce pergunta. Afinal, o espaço pedagógico é um texto para ser
para estar à altura de sua tarefa não tem força moral para constantemente "lido", interpretado, "escrito" e "reescrito".
coordenar as atividades de sua classe. Isto não significa, Neste sentido, quanto mais solidariedade exista entre o
porém, que a opção e a prática democrática do professor ou da educador e educandos no "trato" deste espaço, tanto mais
professora sejam determinadas por sua competência possibilidades de aprendizagem democrática se abrem na
científica. escola...
Ou seja, a incompetência profissional desqualifica a
autoridade do professor. Ensinar exige compreender que a educação é uma
Outra qualidade indispensável à autoridade em suas forma de intervenção no mundo
relações com as liberdades é a generosidade. Não há nada que Outro saber de que não posso duvidar um momento sequer
mais inferiorize a tarefa formadora da autoridade do que na minha prática educativo-crítica é o de que, como
a mesquinhez com que se comporte. A arrogância farisaica, experiência especificamente humana, a educação é uma
malvada, com que julga os outros e a indulgência macia com forma de intervenção no mundo.
que se julga ou com que julga os seus. A arrogância que nega Intervenção que além do conhecimento dos conteúdos
a generosidade, nega também a humildade. Que não é bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o
virtude dos que ofendem nem tampouco dos que se regozijam esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o
com sua humilhação. seu desmascaramento. Dialética e contraditória, não
O clima de respeito que nasce de relações justas, sérias, poderia ser a educação só uma ou só a outra dessas coisas.
humildes, generosas, em que a autoridade docente e as Nem apenas reprodutora nem apenas desmascaradora da
liberdades dos alunos se assumem eticamente, autentica o ideologia dominante.
caráter formador do espaço pedagógico. A reação negativa ao Neutra, "indiferente" a qualquer destas hipóteses, a da
exercício do comando é tão incompatível com o desempenho reprodução da ideologia dominante ou a de sua contestação, a
da autoridade quanto a sofreguidão pelo mando. O educação jamais foi, é, ou pode ser. É um erro decretá-la como
mandonismo é exatamente esse gozo irrefreável e desmedido tarefa apenas reprodutora da ideologia dominante como erro
pelo mando. é tomá-la como uma força de desocultação da realidade, a
A autoridade docente mandonista, rígida, não conta com atuar livremente, sem obstáculos e duras dificuldades. Erros
nenhuma criatividade do educando. Não faz parte de sua que implicam diretamente visões defeituosas da História e da
forma de ser, esperar, sequer, que o educando revele o gosto consciência.
de aventurar- se. De um lado, a compreensão mecanicista da História, que
A autoridade coerentemente democrática, fundando- se na reduz a consciência a puro reflexo da materialidade, e de outro,
certeza da importância, quer de si mesma, quer da liberdade o subjetivismo idealista, que hipertrofia o papel da consciência
dos educandos para a construção de um clima de real no acontecer histórico. Nem somos mulheres e homens, seres
disciplina, jamais minimiza a liberdade. simplesmente determinados nem tampouco livres de
Pelo contrário, aposta nela. Empenha- se em desafiá-la condicionamentos genéticos, culturais, sociais, históricos, de
sempre e sempre; jamais vê, na rebeldia da liberdade, um sinal classe, de gênero, que nos marcam e a que nos achamos
de deterioração da ordem. A autoridade coerentemente referidos.
democrática a está convicta de que a disciplina verdadeira não
existe na estagnação, no silêncio dos silenciados, mas no Ensinar exige liberdade e autoridade
alvoroço dos inquietos, na dúvida que instiga, na esperança Inclinados a superar a tradição autoritária, tão presente
que desperta... entre nós resvalamos para formas licenciosas de
comportamento e descobrimos autoritarismo onde só houve o
Ensinar exige comprometimento exercício legítimo da autoridade.
Não é possível exercer a atividade do magistério como se Recentemente, jovem professor universitário, de opção
nada ocorresse conosco. Como impossível seria sairmos na democrática, comentava comigo o que lhe parecia ter sido um
chuva expostos totalmente a ela, sem defesas, e não nos desvio seu no uso de sua autoridade. Disse, constrangido, ter
molhar. Não posso ser professor sem me pôr diante dos se oposto a que aluno de outra classe continuasse na porta
alunos, sem revelar com facilidade ou relutância minha entreaberta de sua sala, a manter uma conversa gesticulada
maneira de ser, de pensar politicamente. Não posso com uma das alunas. Ele tivera inclusive que parar sua fala em
escapar à apreciação dos alunos. E a maneira como eles me face do descompasso que a situação provocava. Para ele, sua
percebem tem importância capital para o meu desempenho. decisão, com que devolvera ao espaço pedagógico o necessário
Daí, então, que uma de minhas preocupações centrais deva ser clima para continuar sua atividade específica e com a qual
a de procurar a aproximação cada vez maior entre o que digo restaurara o direito dos estudantes e o seu de prosseguir a
e o que faço, entre o que pareço ser e o que realmente estou prática docente, fora autoritária. Na verdade, não. Licencioso
sendo. teria sido se tivesse permitido que a indisciplina de uma
Saber que não posso passar despercebido pelos liberdade mal centrada desequilibrasse o contexto
alunos, e que a maneira como me percebam me ajuda ou pedagógico, prejudicando assim o seu funcionamento.
desajuda no cumprimento de minha tarefa de professor, Num dos inúmeros debates de que venho participando, e
aumenta em mim os cuidados com o meu desempenho. Se em que discutia precisamente a questão dos limites sem os
a minha opção é democrática, progressista, não posso ter quais a liberdade se perverte em licença e a autoridade em
uma prática reacionária, autoritária, elitista. Não posso autoritarismo ouvi de um dos participantes que, ao falar dos
discriminar o aluno em nome de nenhum motivo. A percepção limites à liberdade eu estava repetindo a cantilena que
que o aluno tem de mim não resulta exclusivamente de como caracterizava o discurso de professor seu, reconhecidamente
atuo mas também de como o aluno entende como atuo. reacionário, durante o regime militar. Para o meu interlocutor,
a liberdade estava acima de qualquer limite. Para mim, não,
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exatamente porque aposto nela, porque sei que sem ela a Somente quem escuta paciente e criticamente o outro, fala
existência só tem valor e sentido na luta em favor dela. A com ele, mesmo que, em certas condições, precise falar a ele. O
liberdade sem limite é tão negada quanto à liberdade que jamais faz quem aprende a escutar para poder falar
asfixiada ou castrada. com é falar impositivamente. Até quando, necessariamente,
O grande problema que se coloca ao educador ou à fala contra posições ou concepções do outro, fala com ele como
educadora de opção democrática é como trabalhar no sujeito da escuta de sua fala crítica e não como objeto de seu
sentido de fazer possível que a necessidade do limite seja discurso. O educador que escuta aprende a difícil lição de
assumida eticamente pela liberdade. Quanto mais transformar o seu discurso, às vezes necessário, ao aluno,
criticamente a liberdade assuma o limite necessário tanto em uma fala com ele.
mais autoridade tem ela, eticamente falando, para Há um sinal dos tempos, entre outros, que me assusta: a
continuar lutando em seu nome. insistência com que, em nome da democracia, da liberdade e
da eficácia, se vem asfixiando a própria liberdade e, por
Ensinar exige tomada consciente de decisões extensão, a criatividade e o gosto da aventura do espírito. A
É preciso deixar claro que o conceito de intervenção liberdade de nos mover, de nos arriscar vem sendo
não está sendo usado com nenhuma restrição semântica, submetida a uma certa padronização de fórmulas, de
quando falo em educação como intervenção me refiro maneiras de ser, em relação às quais somos avaliados. É
tanto à que aspira a mudanças radicais na sociedade, no claro que já não se trata de asfixia truculentamente
campo da economia, das relações humanas, da realizada pelo rei despótico sobre seus súditos, pelo
propriedade, do direito ao trabalho, à terra, à educação, à senhor feudal sobre seus vassalos, pelo colonizador sobre
saúde, quanto à que, pelo contrário, reacionariamente os colonizados, pelo dono da fábrica sobre seus operários,
pretende imobilizar a História e manter a ordem injusta. pelo Estado autoritário sobre os cidadãos, mas pelo poder
É na diretividade da educação, esta vocação que ela tem, invisível da domesticação alienante que alcança a
como ação especificamente humana, de "endereçar- se" até eficiência extraordinária no que venho chamando
sonhos, ideais, utopias e objetivos, que se acha o que venho "burocratização da mente".
chamando politicidade da educação. A qualidade de ser Um estado refinado de estranheza, de "auto demissão" da
política, inerente à sua natureza. É impossível, na verdade, a mente, do corpo consciente, de conformismo do indivíduo, de
neutralidade da educação. E é impossível, não porque acomodação diante de situações consideradas fatalistamente
professoras e professores "baderneiros" e "subversivos" o como imutáveis. E a posição de quem encara os fatos como algo
determinem. A educação não vira política por causa da consumado, como algo que se deu porque tinha que se dar da
decisão deste ou daquele educador. Ela é política. forma como se deu, é a posição, por isso mesmo, de quem
Quem pensa assim, quem afirma que é por obra deste ou entende e vive a História como determinismo e não como
daquele educador, mais ativista que outra coisa, que a possibilidade. É a posição de quem se assume como fragilidade
educação vira política, não pode esconder a forma depreciativa total diante do todo poderosismo dos fatos que não apenas se
como entende a política. Pois é na medida mesmo em que a deram porque tinham que se dar, mas que não podem ser
educação é deturpada e diminuída pela ação de "baderneiros" "reorientados" ou alterados.
que ela, deixando de ser verdadeira educação, possa a ser Não há, nesta maneira mecanicista de compreender a
política, algo sem valor. História, lugar para a decisão humana. Na medida mesma em
A raiz mais profunda da politicidade da educação se acha que a desproblematização do tempo, de que resulta que o
na educabilidade mesma do ser humano, que se funda na sua amanhã ora é a perpetuação do hoje, ora é algo que será
natureza inacabada e da qual se tornou consciente. Inacabado porque está dito que será não há lugar para a escolha, mas para
e consciente de seu inacabamento, histórico, necessariamente a acomodação bem comportada ao que está aí ou ao que virá.
o ser humano se faria um ser ético, um ser de opção, de Nada é possível de ser feito contra a globalização que,
decisão. Um ser ligado a interesses e em relação aos quais realizada porque tinha de ser realizada, tem de continuar seu
tanto pode manter- se fiel à eticidade quanto pode transgredi- destino, porque assim está misteriosamente escrito que deve
la. É exatamente porque nos tornamos éticos que se criou para ser.
nós a probabilidade, como afirmei antes, de violar a ética.
Para que a educação fosse neutra era preciso que não Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica
houvesse discordância nenhuma entre as pessoas com Saber igualmente fundamental à prática educativa do
relação aos modos de vida individual e social, com relação professor é o que diz respeito à força, às vezes maior do que
ao estilo político a ser posto em prática, aos valores a pensamos da ideologia. E o que nos adverte de suas manhas,
serem encarnados. das armadilhas em que nos faz cair. É que a ideologia tem que
Para que a educação não fosse uma forma política de ver diretamente com a ocultação da verdade dos fatos,
intervenção no mundo era indispensável que o mundo em com o uso da linguagem para penumbrar ou opacizar a
que ela se desse não fosse humano. Há uma realidade ao mesmo tempo em que nos torna "míopes".
incompatibilidade total entre o mundo humano da fala, da A própria "miopia" que nos acomete dificulta a
percepção, da inteligibilidade, da comunicabilidade, da ação, percepção mais clara, mais nítida da sombra. Mais séria
da observação, da comparação, da verificação, da busca, da ainda é a possibilidade que temos de docilmente aceitar
escolha, da decisão, da ruptura, da ética e da possibilidade de que o que vemos e ouvimos é o que na verdade é, e não a
sua transgressão e a neutralidade não importa de quê. verdade distorcida. A capacidade de penumbrar a
O que devo pretender não é a neutralidade da educação realidade, de nos "miopizar", de nos ensurdecer que tem
mas o respeito, a toda prova, aos educandos, aos educadores e a ideologia faz, por exemplo, a muitos de nós, aceitar
às educadoras. O respeito aos educadores e educadoras por docilmente o discurso cinicamente fatalista neoliberal
parte da administração pública ou privada das escolas; o que proclama ser o desemprego no mundo uma desgraça
respeito aos educandos assumido e praticado pelos do fim de século. Ou que os sonhos morreram e que o
educadores não importa de que escola, particular ou pública. É válido hoje é o "pragmatismo" pedagógico, é o treino
por isto que devo lutar sem cansaço. Lutar pelo direito que técnico- científico do educando e não sua formação de que
tenho de ser respeitado e pelo dever que tenho de reagir a que já não se fala. Formação que, incluindo a preparação
me destratem. técnico científica, vai mais além dela.
A capacidade de nos amaciar que tem a ideologia nos faz às
Ensinar exige saber escutar vezes mansamente aceitar que a globalização da economia é
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uma invenção dela mesma ou de um destino que não poderia de sua forma de estar sendo, no mínimo, menos estranho e
se evitar, uma quase entidade metafísica e não um momento distante dela. E a diminuição de minha estranheza ou de minha
do desenvolvimento econômico submetido, como toda distância da realidade hostil em que vivem meus alunos não é
produção econômica capitalista, a uma certa orientação uma questão de pura geografia.
política ditada pelos interesses dos que detêm o poder.
Pega-se o trem no meio do caminho e não se discutem as Ensinar exige querer bem aos educandos
condições anteriores e atuais das diferentes economias. Esta abertura ao querer bem não significa, na verdade,
Nivelam-se os patamares de deveres entre as distintas que o porquê professor se obriga a querer bem a todos os
economias sem se considerarem as distâncias que separam os alunos de maneira igual. Significa, de fato, que deve haver
"direitos" dos fortes e o seu poder de usufruí-los e a fraqueza afetividade, sem medo de expressá-la.
dos débeis para exercer os seus direitos. Se a globalização Assim, esta abertura ao querer bem a maneira que tenho
implica a superação de fronteiras, a abertura sem restrições ao de autenticamente selar o meu compromisso com os
livre comércio acabe-se então quem não puder resistir. Não se educandos, numa pratica específica do ser humano. Na
indaga, por exemplo, se em momentos anteriores da produção verdade preciso descartar como falsa a separação radical entre
capitalista nas sociedades que lideram a globalização hoje elas seriedade docente e efetividade. Não é certo, sobretudo do
eram tão radicais na abertura que consideram agora uma ponto de vista democrático, que serei tão melhor professor
condição indispensável ao livre comércio. quanto mais severo, mais frio, mais distante e "cinzento" me
Exigem, no momento, dos outros, o que não fizeram ponha nas minhas relações com os alunos, no trato dos objetos
consigo mesmas. Uma das eficácias de sua ideologia fatalista é cognoscíveis que devo ensinar.
convencer os prejudicados das economias submetidas de que A afetividade não se acha excluída da
a realidade é assim mesmo, de que não há nada a fazer, mas cognoscibilidade. O que não posso obviamente permitir é
seguir a ordem natural dos faros. Pois é como algo natural ou que minha afetividade interfira no cumprimento ético de
quase natural que a ideologia neoliberal se esforça por nos meu dever de professor no exercício de minha autoridade.
fazer entender a globalização e não como uma produção Não posso condicionar a avaliação do trabalho escolar de
histórica. um aluno ao maior ou menor bem querer que tenha por
ele.
Ensinar exige disponibilidade para diálogo A atividade docente de que a discente não se separa é uma
O professor não deve poupar oportunidade para experiência alegre por natureza. E falso também tomar como
testemunhar aos alunos a segurança de discutir um tema, inconciliáveis seriedade docente e alegria, como se a alegria
ao analisar um fato ou a expor uma opinião. Minha fosse inimiga da rigorosidade. Pelo contrário, quanto mais
segurança não repousa na falsa suposição de que sei tudo, de metodicamente rigoroso me torno na minha busca e na
que sou o "maior". Minha segurança se funda na convicção de minha docência, tanto mais alegre me sinto e esperançoso
que sei algo e de que ignoro algo a que se junta à certeza deque também. A alegria não chega apenas no encontro do achado
posso saber melhor o que já sei e conhecer o que ainda não sei. mas faz parte do processo da busca. E ensinar e aprender não
Minha segurança se alicerça no saber confirmado pela própria podem dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria.
experiência de que, se minha inconclusão, de que sou O desrespeito à educação, aos educandos, aos educadores
consciente, atesta, de um lado, minha ignorância, me abre, de e às educadoras corrói ou deteriora em nós, de um lado, a
outro, o caminho para conhecer. sensibilidade ou a abertura ao bem querer da própria prática
Sinto-me seguro porque não há razão para me educativa de outro, a alegria necessária ao que- fazer docente.
envergonhar por desconhecer algo. Testemunhar a abertura É digna de nota a capacidade que tem a experiência pedagógica
aos outros, a disponibilidade curiosa à vida, a seus desafios, para despertar, estimular e desenvolver em nós o gosto de
são saberes necessários à prática educativa. querer bem e o gosto da alegria sem a qual a prática educativa
Viver a abertura respeitosa aos outros e, de quando em vez, perde o sentido. É esta força misteriosa, às vezes chamada
de acordo com o momento, tomar a própria prática de vocação, que explica a quase devoção com que a grande
abertura ao outro como objeto da reflexão crítica deveria fazer maioria do magistério nele permanece, apesar da imoralidade
parte da aventura docente. A razão ética da abertura, seu dos salários. E não apenas permanece, mas cumpre como pode,
fundamento político, sua referência pedagógica; a seu dever. Amorosamente, acrescento.
boniteza que há nela como viabilidade do diálogo. A Mas é preciso, que, permanecendo e amorosamente
experiência da abertura como experiência fundante do cumprindo o seu dever, não deixe de lutar politicamente, por
ser inacabado que terminou por se saber inacabado. Seria seus direitos e pelo respeito à dignidade de sua tarefa, assim
impossível saber-se inacabado e não se abrir ao mundo e como pelo zelo devido ao espaço pedagógico em que atua com
aos outros à procura de explicação, de respostas a seus alunos.
múltiplas perguntas. O fechamento ao mundo e aos outros É preciso, por outro lado, reinsistir em que não se pense
se torna transgressão ao impulso natural da que a prática educativa vivida com afetividade e alegria,
incompletude. O sujeito que se abre ao mundo e aos prescinda da formação científica séria e da clareza política dos
outros inaugura com seu gesto a relação dialógica em que educadores ou educadoras. A prática educativa é tudo isso:
se confirma como inquietação e curiosidade, como afetividade, alegria, capacidade científica, domínio técnico a
inconclusão em permanente movimento na História. serviço da mudança ou, lamentavelmente, da permanência do
A formação dos professores e das professoras devia insistir hoje. É exatamente esta permanência do hoje neoliberal que a
na constituição deste saber necessário e que me faz certo desta ideologia contida no discurso da "morte da História" propõe.
coisa óbvia, que é a importância inegável que tem sobre nós o Permanência do hoje a que o futuro desproblematizado se
contorno ecológico, social e econômico em que vivemos. E ao reduz. Daí o caráter desesperançoso, fatalista, antiutópico de
saber teórico desta influência teríamos que juntar o saber uma tal ideologia em que se forja uma educação friamente
teórico- prático da realidade concreta em que os professores tecnicista e se requer um educador exímio na tarefa de
trabalham. Já sei, não há dúvida, que as condições materiais em acomodação ao munido e não na de sua transformação. Um
que e sob que vivem os educandos lhes condicionam a educador com muito pouco de formador, com muito mais de
compreensão do próprio mundo, sua capacidade de aprender, treinador, de transferidor de saberes, de exercitador de
de responder aos desafios. Preciso, agora, saber ou abrir- me à destrezas.
realidade desses alunos com quem partilho a minha atividade Os saberes de que este educador "pragmático" necessita na
pedagógica. Preciso tornar-me, se não absolutamente íntimo sua prática não são os de que venho falando neste livro. A mim
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não me cabe falar deles, os saberes necessários ao educador (B) F, F, F, F.
"pragmático" neoliberal mas, denunciar sua atividade anti- (C) V, F, V, V.
humanista. (D) F, V, F, V.
O educador progressista precisa estar convencido
como de suas consequências é o de ser o seu trabalho uma 03. (Prefeitura de são Paulo/SP – Professor de
especificidade humana. Já vimos que a condição humana Educação Infantil e PEB I – FCC) Ensinar exige primeiro,
fundante da educação é precisamente a inconclusão de saber o que se ensina; segundo, saber como ensinar. Quer
nosso ser histórico de que nos tornamos conscientes. dizer, para ensinar eu não preciso apenas saber o objeto que
Nada que diga respeito ao ser humano, à possibilidade de eu vou ensinar, mas saber como tratar o objeto. O ato de
seu aperfeiçoamento físico e moral, de sua inteligência ensinar exige de mim saber como trato o outro sujeito e como
sendo produzida e desafiada, os obstáculos a seu trato o objeto que mediatiza os sujeitos que conhecem. Por
crescimento, o que possa fazer em favor da boniteza do isso, o ato de ensinar demanda, indiscutivelmente
mundo como de seu enfreamento, a dominação a que competência científica, competência técnica, seriedade,
esteja sujeito, a liberdade por que deve lutar, nada que porque o ato de ensinar é delicado.
diga respeito aos homens e às mulheres pode passar Numa situação do cotidiano de uma escola, numa sala de
despercebido pelo educador progressista. Não importa 3º ano, a professora escreveu algumas contas de divisão, na
com que faixa etária trabalhe. lousa, para que os alunos as copiassem e resolvessem. Em
O nosso é um trabalho realizado com gente, miúda, jovem seguida dirigiu-se para a mesa do professor e começou a
ou adulta, mas gente em permanente processo de busca. Gente corrigir alguns cadernos. Um aluno, depois de terminar de
formando- se, mudando, crescendo, reorientando- se, copiar, perguntou à professora:
melhorando, mas, porque gente, capaz de negar os valores, de − De que lado eu começo a fazer as contas?
distorcer-se, de recuar, de transgredir. Não sendo superior Sem levantar os olhos do que fazia, a professora
nem inferior a outra prática profissional, a minha, que é a respondeu-lhe simplesmente:
prática docente, exige de mim um alto nível de − Do lado que está a janela.
responsabilidade ética de que a minha própria capacitação Tomando como referência o fragmento do texto de Paulo
científica faz parte. É que lido com gente. Lido, por isso mesmo, Freire:
independente- mente do discurso ideológico negador dos (A) a professora não domina o objeto do conhecimento e
sonhos e das utopias, com os sonhos, as esperanças tímidas, às por isso adota uma postura aparentemente indiferente para
vezes, mas às vezes, fortes, dos educandos. Se não posso, de um não revelar seu desconhecimento do conteúdo.
lado, estimular os sonhos impossíveis, não devo, de outro, (B) a professora respondeu de forma desatenciosa ao
negar a quem sonha o direito de sonhar. Lido com gente e não aluno.
com coisas. E porque lido com gente, não posso, por mais que, (C) ao responder ao aluno da forma como o fez, além de
inclusive, me dê prazer entregar- me à reflexão teórica e crítica demonstrar pouco domínio do conteúdo, a professora deixou
em torno da própria prática docente e discente, recusar a claro não ter competência técnica, competência científica e
minha atenção dedicada e amorosa à problemática mais nem seriedade em relação ao seu ofício de educadora.
pessoal deste ou daquele aluno ou aluna. Desde que não (D) pode ser que a professora, por não ter tido uma
prejudique o tempo normal da docência, não posso fechar-me formação para ensinar matemática e não valorizando sua
a seu sofrimento ou à sua inquietação porque não sou profissão não dê importância a este tipo de pergunta.
terapeuta ou assistente social.
Mas sou gente. O que não posso, por uma questão de ética 04. (TSE – Analista Judiciário – Pedagogia –
e de respeito profissional, é pretender passar por terapeuta. CONSULPLAN) Um projeto pedagógico, na perspectiva de
Não posso negar a minha condição de gente de que se alonga, Freire, deve tomar o “homem como um ser de relações,
pela minha abertura humana, uma certa dimensão terápica. temporalizado e situado”. Isso significa que o projeto
pedagógico deve
Questões (A) considerar os contextos sociais e culturais em que
vivem os sujeitos que irão fazer parte dele.
01. (Prefeitura de Montes Claros/MG – PEB I – (B) desenvolver uma série de ações que permitam a
UNIMONTES) Para Freire, saber ensinar não é transferir ocultação de saberes ingênuos e depositários de não saberes.
conhecimento e, sim: (C) sobrelevar a realidade dos sujeitos envolvidos no
(A) criar as possibilidades para a própria produção ou sua projeto.
construção. (D) prescindir de uma reflexão sobre o homem e de suas
(B) entender que o ensino exige a consciência do fim. condições culturais.
(C) respeitar a autonomia do ser professor.
(D) compreender que o ensinar exige o distanciamento da
realidade.
05. (TSE – Analista Judiciário – Pedagogia –
02. (Prefeitura de Montes Claros/MG – PEB I – CONSULPLAN) A relação entre a educação e a sociedade é
UNIMONTES) Transformar a experiência educativa em puro estreita. Pode-se dizer que a educação é uma prática social. As
treinamento técnico é amesquinhar o que há de relações que se estabelecem podem ser de variadas ordens:
fundamentalmente humano no exercício educativo: o seu política, social, cultural, econômica. O que dará vida a essa
caráter formador. Considerando o pensamento do autor, relação é a pedagogia que, numa perspectiva de uma educação
marque V para verdadeiro e F para falso, nas seguintes bancária, fará com que as práticas sejam qualificadas como:
afirmativas: (A) emancipatórias.
( ) Educar é exercitar o bom senso. (B) dialéticas.
( ) Educar é essencialmente formar. (C) libertadoras.
( ) Educar relaciona-se à alegria e à esperança. (D) opressoras.
( ) Educar é estimular a pergunta e sua reflexão crítica.
06. (Prefeitura de Jaboticabal/SP – Educador Infantil –
A sequência CORRETA é: ADVISE) Para Paulo Freire, grande educador brasileiro, a
(A) V, V, V, V. educação serve para:
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(A) a conscientização; ensino dos conteúdos, acrescente-se a leitura crítica sobre a
(B) a libertação; realidade. Não apenas para desocultá-la, mas para agir sobre
(C) a leitura; ela, transformando-a. Um desafio que se apresenta frente a
(D) o racismo; uma transformação possível.
(E) o silencia.
05. Alternativa D
Respostas Para descrever o processo educativo tradicional, elaborou
o conceito de “educação bancária”, onde o conhecimento é
01. Alternativa A apenas transmitido para o educando e este deve absorver as
O referido autor considera ainda que: “Ensinar não é informações sem questionar, o que o reduz à mero espectador,
transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a tornando-o um objeto do processo de ensino, porque não é
sua produção ou a sua construção”. Dito de outra forma, o capaz de exercer atividades básicas para qualquer sujeito: a
docente deve transmitir o conhecimento buscando participação e o diálogo. Neste contexto o educador mantém
proporcionar ao discente a compreensão do que foi exposto e, uma postura rígida, com ideias fixas e invariáveis, que julga o
a partir daí, permitir que o mesmo dê um novo sentido, quer valor da sua existência a partir da sua ideia de que os
dizer, a ideia é não dar respostas prontas, mas criar educandos são ignorantes, e que precisam dele para se
possibilidades, abrir oportunidades de indagações e transformar, caso contrário, nunca serão capazes de serem
sugestões, de raciocínio, de opiniões diversas etc. Jamais inteligentes. Esta visão retira do educando a possibilidade de
impedir as interações, as opiniões, os erros e os acertos, isto é, viver sua autonomia e permitir esta experiência é uma atitude
todos esses elementos permitirão que o aluno alcance o real de respeito e amor com os educandos, a partir de uma postura
conhecimento e continue a buscá-lo incessantemente de forma ética do educador educando, que estimula, e aceita a vocação
autônoma e prazerosa. ontológica do ser humano de ser mais.
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necessidade de repensar várias coisas relacionadas a dedicação exclusivamente por parte do professor, de
educação. acompanhar as mudanças que se processam no campo de
Diante tais situações, são muitas as vozes que reivindicam trabalho, atualizando o seu currículo e sua metodologia.
a importância da educação para enfrentar os desafios. Em todo Para dar sustentação às contínuas evoluções, a educação
mundo, a educação hoje é uma prioridade nos programas de precisa ressaltar um ensino que crie conexão entre o que o
quase todos os partidos políticos. De fato, umas das principais aluno aprende nela e o que ele faz fora dela, há um parâmetro
funções da escola sempre foi a de preparar as novas entre o ensino formal, o trabalho, o conhecimento e a na vida
gerações para as mudanças e garantir uma melhor prática do aluno.
inserção no mundo profissional e no mercado de trabalho. Buscando a solucionar essas lacunas, o Poder Público tem
Devemos perguntar o que significa hoje pedir mais buscado alternativas de reforma do sistema ensino, criando e
educação. Por um lado, essas mudanças introduzidas pela aprovando leis, como: Lei de Diretrizes e Bases da Educação
sociedade da informação e do conhecimento fazem que – LDB – n. 9.394/96, que institui o Fundo de Manutenção e
tenhamos de rever o significado atual do conceito de educação, Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização
pois em nenhum caso as formas de transmissão e de criação do Magistério – FUNDEF – Lei n. 9.424/96 e o Plano
do conhecimento serão as mesmas. Nacional de Educação (PNE). É importante reconhecer o
As mudanças ocorridas no âmbito político, científico e papel da legislação tem exercido no cenário brasileiro, seja no
tecnológico não parecem trazer uma sociedade mais justa e sentido de promover reformas necessárias ou de implantar a
solidária, pelo contrário, introduzimos novas formas de profissionalização da educação básica. Mas a reflexão sobre a
desigualdade e de injustiça, que fazem aumentar a pobreza, a função social da escola, não pode ser vista somente com base
marginalização e a exclusão. Diante de tal fato, devemos na legislação, isto porque nela estão definidos os fins da
repensar essa frase “a educação para todos durante toda a educação brasileira.
vida”, está bem longe de ser realidade num mundo que O direito de todos à educação está estabelecido na
20%(vinte por cento) das crianças entre 6 a 11 anos estão fora Constituição Federal no artigo 205 e no artigo 2 da Lei de
das escolas, mesmos nos países desenvolvidos. Podem refletir Diretrizes e Bases da Educação – LDB – n. 9.394/96:
em fenômenos derivados da negação da diferença, em Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da
forma de guerra, xenofobia e violência, demonstrando que família, será promovida e incentivada com a colaboração da
existe uma importante crise ética e moral. Por tudo isso, é sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preciso que deixemos de pensar na educação exclusivamente preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
a partir dos parâmetros econômicos e produtivos e passamos trabalho.
a uma concepção da educação que cultive, sobretudo em Art. 2º. A educação, dever da família e do Estado, inspirada
valores de cidadania democrática, conforme a resolução da nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade
Unesco54: humana, tem por finalidade o pleno desenvolvimento do
“Aprender a ser, a formação de uma cidadania criativa, educando, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
capaz de transformar a informação em conhecimentos qualificação para o trabalho.
que, a partir da diferença, afirme o respeito e a De acordo como o artigo 12 da LDB, os seguintes
valorização do próximo, para, dessa forma, projetarem parâmetros:
juntos um futuro comum de convivência ativa e Artigo 12. Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as
participativa na vida democrática, como lugar normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a
privilegiado para consensuar objetivos que conciliem os incumbência de:
legítimos interesses individuais como os coletivo.” VI - articular-se com as famílias e a comunidade,
criando processos de integração da sociedade com a escola;
Muitos anos, a escola e a família foram as duas instituições Portanto, conforme previsto em lei, o papel da escola é de
encarregadas da educação e da formação das novas gerações, promover o pleno desenvolvimento do educando e
mas hoje isso é impossível de afirmar. A família está passando preparar para a cidadania, qualificando-o para o trabalho,
por grandes transformações e muitas vezes, delega sua função conforme cada características e formas de organização
educativa tradicional para outros agentes, como a televisão ou própria, dependendo de sua localização geográfica e outros
a própria escola. Por um lado, a escola não pode enfrentar aspectos.
sozinha todos os desafios apresentados pela nova sociedade A função do professor
da informação. Nos dias atuais levam-nos a refletir sobre a complexidade
A crise nas escolas agravam, como também aumentam as das funções entre uma boa ou péssima administração da
sensações de desvalorizações sociais aos professores. Nos educação e as políticas de formação dos profissionais.
dias atuais, a influência educativa é exercida a partir de vários No contexto das transformações que vêm ocorrendo no
âmbitos, a tais como a família, trabalho, sociedade, associações mundo, os desafios das políticas de formação dos profissionais
etc., e por diferentes meios, televisão, multimídia e as vezes da educação. O professor, exerce sua função enquanto
que opõem às propostas educativas. educador, ao estimular o educando a refletir sobre os cuidados
Considerando, todas essas mudanças dentro do contexto com a saúde, natureza, as questões da sociedade, entre outros,
histórico, visando a sua transformação, pois se compreende a consciência do que seja participante dessa sociedade, sendo
que a realidade não é algo pronto e acabado, não se trata, no aspecto importante ao exercício da democracia, isso se torna
entanto, de atribuir à educação e a escola nenhuma função de mais fácil, facilitar a aprendizagem do aluno, aguçar seu poder
salvação e sim de reconhecer seu incontestável papel social no de argumentação, conduzir ás aulas de modo questionador,
desenvolvimento de processos educativos, na sistematização e onde o aluno- sujeito ativo estará também exercendo seu papel
socialização da cultura historicamente produzida pelos de sujeito pensante; que dá ótica construtivista constrói seu
homens. aprendizado, através de hipóteses que vão sendo testadas,
interagindo com o professor, argumentando, questionando em
A educação e sua função social fim trocando ideias que produzem inferências.
Mudanças legais – Uma nova realidade O papel da família nesse contexto, está ligado ao nível
Ao delimitar a função da educação e da escola como social e educacional, que a escola oferece através da
complexas, amplas, diversificadas, ampliam a necessidade de socialização. O professor surge como agente de socialização,
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significando o elo entre a família e a sociedade. Pois são necessários à socialização do indivíduo, sendo necessário
construídos a partir do desenvolvimento da moralidade, os que a escola propicie o domínio dos conteúdos culturais
hábitos e responsabilidade social, devido uma situação de básicos da leitura, da escrita, da ciência das artes e das letras,
mudança e de resultados das convivências familiares, em um sem estas aprendizagens dificilmente o aluno poderá exercer
meio que o estimula ou impede. seus direitos de cidadania.
Para o sucesso cognitivo do aluno e êxito no Neste sentido a escola por ser uma instituição que
desenvolvimento do trabalho do professor, o planejamento é transmite o saber, essa função de formar cidadãos para atuar
como uma bússola que orienta a direção a ser seguida, pois na sociedade, deve contribuir para a mudança de uma
quando o professor não planeja o aluno é o primeiro a sociedade desigual, injusta. A escola deve dar condições, para
perceber que algo ficou a desejar, por mais experiente que seja preparar o indivíduo na construção sólida da sua identidade,
o docente, e esse é um dos fatores que contribuem para a inserindo valores e pressupostos que possa fazer com que o
indisciplina e o desinteresse na sala de aula. mesmo conviva em sociedade e na sociedade com autonomia,
É importante que o planejar aconteça de forma solidariedade, capacidade de transformação e ética.
sistematizada e contextualizado com o cotidiano do aluno, A escola deve oferecer situações que favoreçam o
para desperta seu interesse e participar ativamente no aprendizado, onde haja sede em aprender e também razão,
resultado, que será aulas dinâmicas e prazerosas. entendimento da importância desse aprendizado no futuro do
Para que a escola exerça sua função como local de aluno. Se ele compreender que, muito mais importante do que
oportunidades, interação e de encontro e o saber, para que possuir bens materiais, é ter uma fonte de segurança que
haja esse paralelo tão importante para o sucesso do aluno o garanta seu espaço no mercado competitivo, ele buscará
bom desenvolvimento das atribuições do coordenador conhecer e aprender sempre mais. E para o sociólogo francês
pedagógico tem grande relevância, pois a ele cabe organizar o Émile Durkheim, a principal função do professor é formar
tempo na escola para que os professores façam seus cidadãos capazes de contribuir para a harmonia social. Dessa
planejamentos e ainda que atue como formador de fato. forma, Durkheim acreditava que a sociedade seria mais
Conforme que ensina Libâneo55, as características beneficiada pelo processo educativo. Para ele, "a educação é
positivas eficazes para o bom funcionamento de uma escola: uma socialização da jovem geração pela geração adulta". E
professores preparados, com clareza de seus objetivos e quanto mais eficiente for o processo, melhor será o
conteúdos, que planejem as aulas, cativem os alunos, através desenvolvimento da comunidade em que a escola esteja
de um bom clima de trabalho, em que a direção contribua para inserida.
conseguir o empenho de todos, em que os professores aceitem Assim, a função social da educação e da escola tem como
aprender com a experiência dos colegas. objetivo de incluir o indivíduo ao saber histórico, ao
Os coordenadores por sua vez precisam assumir sua conhecimento científico, de forma eficaz e com qualidade,
responsabilidade pela qualidade do ensino, atuando como também cumpre com sua função social de preparar o sujeito
formadores do corpo docente, promovendo momentos de para o trabalho, o pleno exercício da cidadania e seu
trocas de experiências e reflexão sobre a prática pedagógica, o desenvolvimento de pessoas solidárias, cooperativas,
que trará bons resultados na resolução de problemas autônomas, capazes de conviver com as diferenças, precisa ser
cotidianos, e ainda fortalece a qualidade de ensino, contribui um espaço de socialização, que possibilite a construção do
para o resgate da auto-estima do professor, pois o mesmo conhecimento, tendo em vista que esse conhecimento não é
precisa se libertar de práticas não funcionais, e para isso a dado a priori. Pois, trata-se de conhecimento vivo e que se
contribuição do coordenador será imprescindível, o que caracteriza como processo em construção.
resultará no crescimento intelectual dos alunos. E o papel da educação num contexto democrático, está
Essa clareza no plano de trabalho do Projeto pedagógico- previsto no artigo 3º da LDB:
curricular que vá de encontro às reais necessidades da escola, Artigo 3º. O ensino será ministrado com base nos seguintes
para sanar problemas como: falta de professores, princípios:
cumprimento de horário e atitudes que assegurem a XI - vinculação entre a educação escolar, o trabalho e as
seriedade, o compromisso com o trabalho de ensino e práticas sociais.
aprendizagem, com relação a alunos e funcionários e seu As políticas que fortaleçam laços entre comunidade e
profissionalismo conquista o respeito e admiração da maioria escola é uma medida, um caminho que necessita ser trilhado,
de seus funcionários e alunos, há um clima de harmonia que para assim alcançar melhores resultados. O aluno é parte da
predispõe a realização de um trabalho, onde, apesar das escola, é sujeito que aprende, que constrói seu saber, que
dificuldades, os professores terão prazer em ensinar e alunos direciona seu projeto de vida, assim sendo a escola lida com
prazer em aprender. pessoas, valores, tradições, crenças, opções e precisa estar
A escola enquanto espaço de reflexões sobre a preparada para enfrentar tudo isso.
comunidade, passa a reconstruir alguns elementos de Ao analisarmos toda esta conjuntura verificamos que,
desenvolvimento de uma escola para a formação da cidadania, apesar da tendência para limitar a educação ao contexto
precisa formar profissionais que conheçam quais as funções escolar e familiar, trabalho e as práticas sociais, a educação
sociais da escola brasileira em diferentes momentos, para que assume um sentido muito mais amplo e complexo. Não se
em seguida possa discutir a função pedagógica, política e do reduz apenas a uma etapa, mas trata-se sim de um processo
trabalho em relação à escola cidadã. gradual e contínuo, vivido ao longo da vida, que promove a
consciencialização, desenvolvimento e libertação do ser
A função social humano.
Ao se falar em educação devemos estar atentos ao contexto Podemos afirmar que a educação assume um papel
social ao qual a escola se configura. É uma instituição social determinante na formação associada à capacidade de
com objetivo explícito, através do desenvolvimento das transformação e mudança do indivíduo e consequentemente
potencialidades físicas, cognitivas e afetivas dos alunos, da própria realidade em que este está inserido.
capacitando-o a tornar um cidadão, participativo na sociedade
em que vivem, tendo como função básica de garantir a
aprendizagem de conhecimento, habilidades e valores
55 LIBÂNEO, J. C.; OLIVEIRA J. F.; TOSCHI M. S.; Educação escolar: políticas estrutura
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Questões (B) O ensino deve ser planejado a partir de propósitos
claros sobre a sua finalidade, tendo em vista que os alunos
01 . (Minas Gerais Administração e Serviços S.A - MGS estão sendo preparados para viverem em sociedade.
– Pedagogo – IBFC) A escola é uma instituição social, que (C) As questões de ordem social sempre prevalecem sobre
mediante sua prática no campo do conhecimento, dos valores as de ordem pedagógica.
e atitudes, contribui para a constituição dos processos (D) Os planejamentos indicam a necessidade de serem
educativos. Assim, a escola, no desempenho de sua função neutros e escolarizados.
social de formadora de sujeitos históricos, precisa ser um (E) Os estudantes são vistos enquanto seres passivos, daí
espaço de sociabilidade que possibilite a construção do porque a facilidade de aprendizagem.
conhecimento produzido. Com esse contexto, assinale a
alternativa correta a seguir: Respostas
(A) Em nossa sociedade, a escola é um lugar privilegiado
para o exercício da democracia indireta com a escolha dos seus 01. Resposta: B
dirigentes. A alternativa b está correta, é a função social da Escola, em
(B) A escola tem como função social formar o cidadão, termos governamentais, a função social da escola pública é
construir conhecimentos, atitudes e valores que tornem o formar o cidadão, isto é, construir conhecimentos, atitudes e
estudante solidário, crítico, ético e participativo. valores que tornem o estudante solidário, crítico, ético e
(C) A escola, em sua função social, contribuirá participativo.
efetivamente para afirmar os interesses individuais das
pessoas no processo educativo. 02. Resposta: C
(D) A função social da escola é irrelevante para a A alternativa c está correta, dispõe o artigo 1º § 2º da
administração civil e os órgãos governamentais. LDB: A educação escolar deverá vincular-se ao mundo do
trabalho e à prática social.
02. (CETAM – Analista Técnico Educacional –
Psicologia – FCC) 03. Resposta: CERTO
Para responder à questão, considere a Lei de Diretrizes e A alternativa é a certa, porque a função de integração social
Bases da Educação Nacional − LDB (Lei nº 9.394/1996). A Lei pode confundir, mas é importante perceber que a integração
destaca um entendimento amplo da função social da educação, social existe em qualquer modelo de sociedade, é fundamental
quando: seja para modificá-la ou para manter seu status quo.
(A) determina que a mesma deve ser organizada em
período integral. 04. Resposta: CERTO
(B) propõe a reflexão crítica da prática educacional. A alternativa está correta, porque a educação é
(C) explicita que deverá vincular-se ao mundo do trabalho comprometida com a formação integral do ser humano deve
e à prática social. adotar procedimentos facilitadores que permitam a
(D) destaca o entendimento da função social de uma construção de identidades crítico reflexivas portadoras de
educação preparatória. autonomia intelectual, política, social e cultural fortemente
(E) vincula a vida social à vida cultural a partir do ensino alicerçadas nos princípios de igualdade, de justiça e de
na escola. solidariedade humana. Isso pressupõe que todas as crianças,
jovens, adultos, homens e mulheres ao buscarem a escola
03. (FUB- Pedagogo – CESPE) encontrem um contexto que os permita construir
A respeito dos fundamentos da educação e da relação competências e habilidades, qualificando-os para o trabalho,
educação/sociedade em suas dimensões filosófica, mas, sobretudo, preparando-os para a vida.
sociocultural e pedagógica, julgue o item subsequente.
A educação, em uma abordagem funcionalista, é, 05. Resposta: B
essencialmente, um meio de socialização dos indivíduos a A alternativa b está correta, porque o papel do ensino é de
fim de torná-los membros de uma dada estrutura social preparação intelectual e moral dos alunos para assumir um
preestabelecida, exercendo, portanto, a função de papel na sociedade.
integração social.
( ) CERTO ( ) ERRADO
2. O pedagogo na escola: 2.1
04. (SEDU-ES – Professor –Pedagogo – CESPE) Concepção e papel do
Considerando o desenvolvimento histórico das
concepções pedagógicas e a função social atribuída à escola, pedagogo na escola;
julgue o item que se segue.
A perspectiva progressista, sustentando as finalidades 56Para que o pedagogo exerça de forma satisfatória as suas
sociopolíticas da educação, define que a escola tem a função
funções, ele deverá trabalhar de maneira determinada, para
social de formar o cidadão mediante um processo de
que possa identificar a realidade de cada problema,
construção de conhecimento, de atitudes e de valores que o
solucionando-o de forma favorável, conseguindo assim
tomem um sujeito solidário, crítico, ético e participativo.
resultados que auxiliem de forma eficiente o corpo docente. De
( ) CERTO ( ) ERRADO
acordo com o desenvolvimento de seu trabalho podemos
salientar algumas funções, como seguem:
05. (SAP-SP – Analista sociocultural - VUNESP)
1) desenvolver projetos educacionais de modo a contribuir
De acordo com Libâneo, a didática trata dos objetivos,
com a profissionalização e crescimento dos educadores.
condições e meios de realização do processo de ensino, unindo
2) liderar em sistemas educacionais, em níveis de
meios pedagógico-didáticos a objetivos sócio-políticos. Neste
coordenação, supervisão ou ensino.
sentido,
3) implementar, planejar, e acompanhar a qualidade e o
(A) Os conteúdos devem ser trabalhados de forma acrítica
desenvolvimento do ensino.
e inflexível para não intervir no produto.
56https://pedagogiaaopedaletra.com/o-papel-do-pedagogo-na-escola/
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4) auxiliar o corpo docente conferindo-lhe maior Nesse processo de ensinar-aprender, o pedagogo possui
criatividade na aplicação das disciplinas, implementar técnicas diferentes objetivos e entre eles, organizar o processo de
de estudo, buscar a integração da escola com a comunidade. aplicação do currículo pela sua equipe escolar. Mas isso não é
5) organizar os métodos de ensino, sempre almejando tão simples quanto parece, pois a aprendizagem se faz além
inovar, formar grupos de professores competentes e dos processos didáticos e fora das regras metodológicas, ou
motivados, tendo como consequência uma instituição de seja, a aprendizagem acontece no aluno de dentro para fora
ensino moderna e referencial. por meio de experiências externas possibilitadas pelo
6) identificar áreas mais “fracas” ou com resultados professor na aplicação de atividades interativas que permite o
pobres, entrando com medidas apropriadas para sanar tais contato, a reflexão e a tomada de consciência do objeto a ser
problemas. apreendido.
7) construir e qualificar equipes de ensino. Portanto, acredita-se que o “sujeito cognitivo passa a ser
8) orientar estudantes em processo de aprendizagem, entendido não apenas como um sujeito racional, mas também
utilizando-se de métodos psicológicos e pedagógicos. como um sujeito psicológico, social, político, isto é, relacional
9) orientação vocacional, ou seja, orientar jovens na haja vista que é fruto do processo entre subjetividade e
escolha da profissão objetividade”57. Isso estende ainda mais as funções do
10) desenvolver programas de treinamento empresarial pedagogo diante da realidade curricular para que esta possa
em recursos humanos possibilitar a abertura do ser em busca de novas visões, de
11) assessorar pedagogicamente em serviços de novos conhecimentos para que novas dúvidas sejam postas
comunicação de massa (jornais, revistas, etc.) e difusão nesse ser a fim que a sua curiosidade não se feche, mas abra
cultural (museus, feiras) oportunidades para novas descobertas e novas conclusões.
12) atuar no terceiro setor (ONG’S), na coordenação de
programas em saúde, trânsito, meio-ambiente, etc. O papel do pedagogo
Frente à diversidade cultural, política e subjetiva que cada
Formação aluno traz consigo, assim como cada professor também
O profissional que deseja ingressar como pedagogo na área carrega enraizada em seu ser, o pedagogo é o profissional
de ensino, deverá cursar o ensino superior em Pedagogia, com responsável por abrir caminhos frente a essas diversidades de
duração de quatro anos. É recomendável na hora da escolha da modo que elas sejam expostas ao mundo como processos
instituição à cursar que seja de primeira linha, pois isso fará conscientes de são elementos constituintes do ser e que por
diferença no concorrido mercado de trabalho. Após esse isso não podem ser descartados nas relações humanas, nem
período tem-se como opção as especializações em várias áreas. mesmo entre os pequeninos aprendizes dos anos iniciais de
Educação e pedagogia são comumente confundidos, ou escolarização.
vistos, como a mesma coisa. Por isso, para tratarmos do papel Mas para isso o pedagogo atenta-se para o currículo, ou
do pedagogo faz-se necessário abordar, ainda que em linhas seja, para aquilo que se deve ser ensinado como ponto
gerais, a diferença existente entre educação e pedagogia. principal e também para a metodologia, ou seja, para o como
Educação consiste em um processo amplo, assistemático de se deve ensinar.
ensino-aprendizagem, natural à condição humana, por isso Assim agindo, o pedagogo proporá à sua equipe uma
educação se dá nos mais diferentes momentos e espaços, como possibilidade de ação que considere a utilização de “técnicas
na rua, em casa, entre amigos, de pai para filho e assim por adequadas que permitem o estudo de alternativas e tomadas
diante. Já a pedagogia constitui-se na ciência que se ocupa das de decisão. […] Uma metodologia que permite a apropriação
questões da educação. É ela quem faz o estudo organizado e do conhecimento e seu manejo criativo e crítico58.
sistemático dos problemas da educação, traçando métodos e O papel do pedagogo desse modo é mais do que dar vistos
didáticas que venham a qualificar o processo educativo. nos planejamentos dos professores ou de simplesmente
Nesse sentido, o pedagogo é aquele que estuda, conhece e assinar fichas exigidas pela burocracia da regência escolar,
se ocupa da educação tendo como papel central organizar e mas sim de “derrubar paredes” da escola de “saltar seus
sistematizar os diversos conhecimentos advindos do processo muros”59.
naturalmente humano de ensino e aprendizagem. Transpondo Em outras palavras, o papel do pedagogo é de quebrar
essa ideia, o pedagogo terá a responsabilidade de acompanhar velhos paradigmas que retardam ou diminuem a capacidade
todas as questões educacionais visando direcionar e qualificar de interação entre alunos e professores e buscar outras
esse processo. possibilidades de interação por meio de tecnologias modernas,
É de responsabilidade do pedagogo, portanto, ter uma boa por meio de recursos gratuitos que convoquem todos (alunos
fundamentação teórica, conhecer a legislação educacional e ter e professores, funcionários e comunidade escolar) a interagir
uma capacidade aguçada de planejamento, pois é através de com a escola. Isso mostra que o pedagogo está atualizado com
um bom planejamento que a garantia de um trabalho mais as novas interações sociais, novas formas de contatos socais,
qualificado ocorrerá. novos conhecimentos que podem ser apreendidos com essas
Além disso, o pedagogo em uma instituição de ensino situações.
necessita saber trabalhar em equipe, pois seu trabalho Guirro também pensa assim e diz claramente: “diante das
necessariamente se dá na interlocução com as demais pessoas novas possibilidades, a educação não pode mais viver do
e setores, assim como se envolver com a elaboração e/ou passado, negando a existência das tecnologias, pois formaria
reestruturação permanente de documentos que registrem e pessoas desconectadas da realidade em que se inserem”.
organizem o fazer pedagógico. Cabe então, ao pedagogo, aprender a manusear essas
Em suma, o papel central do pedagogo é criar e recriar tecnologias modernas e com elas mostrar novos caminhos
instrumentos que qualifiquem o contexto educacional. para a educação usando-as como ferramentas de
Discutir a função do pedagogo frente à diversidade aprendizagem.
curricular é fundamental quando se pretende ter uma postura Um exemplo que ilustraria esse contexto:
crítica diante do processo ensino aprendizagem que acontece No estado de Minas Gerais, assim como em muitos outros,
dentro da escola. existe uma lei que proíbe o uso de celular dentro das escolas.
57 SANTOS,Adriana Regina de Jesus. Currículo, conhecimento e cult ura escolar. São 59GUIRRO, Antonio Benedito. Administração de benefícios e remuneração: RH. São
Paulo: Pearson Prentice Hall, 2009. Paulo: Pearson Prentice Hall, 2009.
58 GUIRRO, Antonio Benedito. Administração de benefícios e remuneração: RH. São
48
Se a função do pedagogo é quebrar paradigmas isso significar epistemológicos, antropológicos, políticos e institucionais /
correr riscos e mudar posturas para que a aprendizagem seja administrativos. […] nele está imbricada a questão política da
feita e o aluno tenha maior consciência de sua racionalidade da ação. Ele concerne, também, às decisões
responsabilidade enquanto cidadão. educativas sendo, portanto, afeto a questões de planejamento
Ao invés de proibir celulares os professores usassem (concepção) e operacionalização / desenvolvimento (processo).
tais aparelhos para enviar mensagens aos seus alunos sobre a
correria na hora do recreio, que com toda certeza o aluno Ou seja, a construção de um currículo não se deve estar
pararia de correr para atender ao telefone e assim veria que pensando apenas nos conteúdos a serem trabalhados
mesmo estando distante o professor está perto; se ao invés de didaticamente dentro da sala de aula, mas também nas
fazer lembretes de reuniões pedagógicas e murais poluídos possibilidades desses conteúdos serem levados para a
visualmente de tantos panfletos, recados, lembretes e outros ampliação social do espaço extraescolar do aluno,
assuntos, o diretor enviasse Msn para cada um de seus proporcionando a este novas possibilidades de sucesso dentro
professores comunicando o dia e a hora da reunião? O da comunidade em que esteja inserido.
professor em sala de aula, ao invés de falar oralmente para Por isso é comum a existência de diferentes tipos
chamar a atenção em sala de aula enviasse um “emoticons” curriculares, mas aqui não serão postas em evidência estas
para aquele aluno que está atrapalhando a aula. Pelo simples distinções porque não mais se pode pensar em um currículo
fato de ele interromper a conversa para pegar o celular ou para preso a dogmas ou a regras rígidas.
ler a mensagem já esfriaria um pouco a conversa e o colega Como já foi mostrado, a educação necessita de novas
também ficaria mais atento. Ao invés de proibir o uso de possibilidades de interação e de novos investimentos
calculadoras dentro de sala de aula, que tal o professor ensinar cognitivos por parte dos professores e pedagogos para que as
os alunos a usarem as funções MRC, M- e M+? Que tal o aluno aulas se tornem mais atrativas e que as relações humanas
receber todas as informações de um trabalho e dica de estudo sejam aquecidas com o uso de tecnologias modernas.
para a próxima prova no e-mail, Facebook ou Orkut? Que tal o A diversidade curricular também deve estar atenta a essas
professor postar seus planos de aula em blog e assim o aluno questões, às questões do relacionamento afetivo por meio de
poderia ter acesso a ele e poder até adiantar os conteúdos que tecnologias que privilegiam a distância, mas que podem
serão trabalhados em sala de aula e lá postar suas dúvidas e despertar o interesse para o aprendizado e para a interação
críticas e dar sugestões para a aula que ainda será dada? social mais calorosa.
Ao pedagogo cabe discutir todas essas novidades O currículo ainda deve pensar nas diferenças encontradas
tecnológicas com seus professores e, mais do que isso, o dentro das escolas e essas diferenças tendem a ser diminuídas
pedagogo deve estar preparado para ensinar seus colegas de quando se tem um educador consciente de seu papel, que nos
trabalho a usarem essas tecnologias, pois muitos dos dias atuais as informações são rapidamente repassadas e
professores não as usam porque não sabem usá-las. Talvez a assim não se pode ser dono absoluto das verdades, mas sim
falta de conhecimento e de prática entre os professores no reconhecer-se como “um educador-educando” que
manuseio dessas tecnologias esteja atrapalhando o Permite que o educando, enquanto aprende, também
desenvolvimento curricular das disciplinas e impedindo que ensine, tornando-o um educando-educador. […] Isso implica
as aulas sejam mais criativas e modernas, que as aulas estejam em todo educando e educador como sujeitos de saberes,
mais ao gosto dos alunos que dominam razoavelmente bem inacabados como seres humanos, com possibilidades de
essas tecnologias sejam porque já possuem computadores em formarem-se como sujeitos críticos, reflexivos, capazes de
casa sejam porque frequentam Lan house. refletirem sobre sua própria prática, no sentido de
Sendo assim o papel do pedagogo não se restringe às transformá-la. (Santos)
condições de aprendizagem dos alunos, mas também de toda Então não se vê mais a necessidade de distinção entre os
a equipe de funcionários da escola que deve se manter currículos, pois todos acabam se unindo quando se considera
atualizada com as novas tecnologias e capaz de se interagir o ser humano como cidadão capaz de ser livre e na sua
com os alunos de modo eficiente, prático e com as atualizações liberdade ousa pelos caminhos da autenticidade fundindo
tanto de linguagem quanto de ambientes propícios à saberes científicos aos conhecimentos empíricos e do senso
comunicação e desse modo aproveitando melhor as comum para que sua prática social busque uma atuação real
oportunidades para coordenar e apresentar novas por meio da eficiência, mas respeitando as regras éticas,
possibilidades de comportamentos considerados mais éticos, morais e da boa convivência.
morais e políticos dentro do contexto escolar. O pedagogo deve estar atento ao currículo escolar para que
este, ao ser registrado, mostre apenas os saberes
A diversidade curricular cientificamente consagrados em depreciação dos saberes
Se o pedagogo possui em suas obrigações zelar pela popularmente considerados parte da cultura de uma região.
ampliação das relações humanas dentro da escola, o currículo Cultura e currículo, costumes locais e disciplinas escolares,
também deve proporcionar as mesmas condições. dogmas de fé e ciência, cabem todos no planejamento de bom
Isso quer dizer que a escola deve possuir uma grande currículo escolar que preza pela diversidade e pela integração
curricular flexível e capaz de se adequar às realidades do aluno como membro de uma comunidade. E a comunidade
cotidianas para que a interação e a troca de informações sejam é dicotômica em muitos pontos e nem por isso perde o seu
fortes aliadas do processo educativo para a “interação caráter de unidade mesmo sendo formada por indivíduos
construtiva constitua o pressuposto do discurso e da prática particularmente independentes, mas que no conjunto formam
de ralações democráticas na escola” (Santos) fazendo com que um todo bem articulado.
a grade curricular deixe de ser grade para se tornar um leque
de opções de conhecimentos que abre em torno de um tema Conclusão
comum. Pode-se então fechar esse texto dizendo que o pedagogo
Mas isso não é tão simples quanto parece, pois segundo possui uma responsabilidade social, uma responsabilidade
Santos diz que no currículo: pedagógica, uma responsabilidade tecnológica, uma
responsabilidade política e uma responsabilidade
Encontra-se impregnado o problema da relação teoria- metodológica com cada um dos seres humanos que estão
prática, pois conceber o currículo demanda que se tenha uma dentro da escola.
concepção de mundo, sociedade e educação e, considerar os Para que esse profissional dê conta de todas essas
fundamentos filosóficos, ideológicos, sociológicos, responsabilidades com mais eficiência e praticidade deve
49
contar com os recursos tecnológicos e com a sua capacidade conhecimentos e experiências para um produto que é a relação
de agir frente ao grupo para propor mudanças nas estruturas de qualidade das pessoas.
educacionais de modo que os alunos possam se envolver mais Logo se as competências técnicas podem ser adquiridas
com os assuntos escolares e assim se tornarem mais através de cursos, seminários, leituras e experiência ou
participativos. prática, a competência interpessoal necessita de treinamento.
Todas essas mudanças podem estar no currículo escolar E em que consiste esta competência?
que a partir do núcleo comum podem se estender a discussões
mais reais da vida local onde a escola está inserida e ao fazer Segundo Moscovici competência interpessoal é a habilidade
isso o currículo tomará dimensões que ultrapassarão os muros de lidar eficazmente com relações interpessoais, de lidar com
da escola e envolverão toda a comunidade. outras pessoas de forma adequada às necessidades de uma e ás
Ao mudar o foco do currículo das realidades científicas exigências da situação... é a habilidade de lidar eficazmente de
universais para o contexto social e histórico local o pedagogo acordo com três critérios: percepção acurada da situação
envolve a todos na tentativa de descobrir soluções para interpessoal de suas variáveis relevantes e respectiva inter-
problemas locais por meio de recursos e técnicas universais. relação; habilidade de resolver realmente os problemas
Com isso o pedagogo deve estar atento para que a interpessoais, de tal modo que não haja regressões; solução
diversidade curricular não seja abafada pelos saberes alcançada de tal forma que as pessoas envolvidas continuem
científicos; nem que as novidades tecnológicas sobreponham juntas tão eficientemente, pelo menos, como quando começaram
as interações sociais afetivas na escola. Mas buscar um a resolver seus problemas.
caminho pedagógico que vise a democratização do ensino é
seu principal objetivo. Alguns componentes da competência interpessoal são
importantes, estes são: a percepção que está relacionada ao
autoconhecimento, a habilidade propriamente dita e o
2.2 Liderança e relações relacionamento em si que compreende a dimensão
humanas no trabalho: tipos de emocional-afetiva. Portanto a competência interpessoal é
resultado da percepção realística das situações e de
liderança; mecanismos de habilidades especificas comportamentais que conduzem a
participação; formas consequências significativas no relacionamento para as
organizativas facilitadoras da pessoas envolvidas.
integração grupal; 2.3 Atuação Empatia – Compreendendo a si próprio e aos outros
do pedagogo e sua articulação Cultivar a habilidade de compreender as pessoas é uma das
com os demais profissionais tarefas mais difíceis que um homem jamais poderia se propor.
Mesmo fazendo o maior esforço, somente é possível
da escola na perspectiva da compreender em parte as necessidades sentidas pelo homem;
qualidade da educação; e, menos ainda, os sentimentos da vida interior. Isto porque a
habilidade de compreender abrange mais do que ser capaz de
perceber, entender, identificar e interpretar as comunicações
Desenvolvimento interpessoal60 ou expressões captadas pelos sentidos.
60 PESSOA: J. Relacionamento Interpessoal: Desenvolvimento Pessoal e Profissional. 61 MOSCOVICI,F. Desenvolvimento Interpessoal: Treinamento em grupo, 13°ed. RJ:
Jose Olympio,2003.
50
Neste pensamento está intrínseco que o cultivo da Dicas para Facilitar a Comunicação Interpessoal:
habilidade de compreender não é obra do acaso. É a 1. Escolha de vocabulário: escolher palavras condizentes
combinação ativa de qualidades e habilidades pessoais de com o momento, evitar gírias ou palavras evasivas.
ajustamento emocional, de amor ao próximo, de possuir senso 2. Facilidade de expressão: emitir as palavras de uma
equilibrado de autoestima e autocrítica, e de avaliar forma correta, demonstrando segurança naquilo que fala.
inteligentemente as necessidades das outras pessoas. 3. Compreensão: empatia, saber entender o que muitas
Entretanto, assim como há fatores que influenciam a vezes não é dito de forma explícita.
disposição para ser mais compreensivo, por outro lado há 4. Cortesia: tato nas relações humanas, ou seja, não ser
outros que dificultam igualmente. Um destes é o egocentrismo ofensivo, descortês. Há um ditado popular que afirma: "A
ou egoísmo pessoal, o excesso de preocupação consigo primeira imagem é a que conta" e há grande verdade nisso. Se
próprio, ou a dificuldade de discernimento do conceito de que o primeiro contato for cordial, alegre, expansivo, este será a
é "certo " ou "errado" que pode bloquear as tentativas de imagem que cada um fará do outro. Mas, mesmo isso
empatizar-se com os outros. sucedendo, se, no futuro, passarmos a adotar um
comportamento hostil, grosseiro, mal educado, com certeza
A Comunicabilidade aquela imagem que havíamos construído será destruída.
Trabalho em equipe = Relacionamento Pessoal 5. Entusiasmo: irradiar entusiasmo natural, estimulante e
contagiante.
Para falarmos de trabalho em equipe primeiramente, 6. Imparcialidade: evitar tomar partido, não debater com o
temos que definir o que vem a ser a comunicação. outro, mesmo que certos comentários não sejam simpáticos a
quem quer que seja.
Comunicação é: 7. Paciência: jamais apressar o seu colega de trabalho ou
1. Ação, efeito ou meio de comunicar; cortá-lo no meio de um desabafo.
2. Aviso, informação; transmissão de uma ordem ou 8. Humildade: não ser o "dono da verdade". Por mais que
reclamação. soubermos e estudarmos sobre um dado assunto, qualquer
que seja, se vivermos 100 anos, ainda haverá uma enormidade
A comunicação é eficaz quando tanto o transmissor quanto de aspectos que desconhecemos.
o receptor interpretam a mensagem da mesma forma. 9. Atualização e Desenvolvimento: buscar sempre se
manter com um bom nível de conhecimentos de sua área e
Para que serve a comunicação? outros ramos que você possa aprender. Se valorize enquanto
A comunicação serve para que as pessoas se relacionem profissional.
entre elas, trocando ideias, sentimentos e experiências. Estas
pessoas são chamadas de interlocutores, ou seja, são as Comportamento Intergrupal e Grupal62
pessoas que estão se comunicando de alguma forma, logo o Conceituando grupo
maior segredo da vida pessoal e profissional é saber ouvir. Para Bowditch e Buono63, um grupo consiste em duas ou
mais pessoas que são psicologicamente conscientes umas das
Atitudes para uma boa comunicação outras e que interagem para atingir uma meta comum. Para
A escuta precisa ser ativa, atenta aos detalhes e disposta a esse autor, os passageiros de um avião não seriam
entender o que o outro está trazendo; Saber ouvir transcende considerados um grupo, porém os participantes de uma
o ato de escutar. É compreender a pessoa que se expressa, é excursão aérea seriam um grupo, pois preenchem as condições
entender a mensagem que ela transmite, é assimilar o que é necessárias para sê-lo, tais como: consciência mútua e
dito por palavras, atitudes, gestos ou silêncio. interação para atingir uma meta comum.
Vamos promover a cultura do diálogo? E o que vem a ser a Os diferentes tipos de grupos...
cultura do diálogo? Você já tentou caracterizar o seu grupo da escola, do bate-
É a disposição para se relacionar e compartilhar bola no fim de semana ou da balada na sexta-feira? No nosso
informações, conhecimento, opiniões, emoções e sentimentos dia-a-dia fazemos parte de vários grupos, do grupo da família;
em busca de melhores resultados naquilo que fazemos em dos amigos íntimos, dos colegas da escola e do trabalho, da
nossas dimensões pessoal e profissional. igreja e de tantos outros grupos que fazem parte da nossa vida.
Mas como diferenciar um grupo do outro? Quais os critérios
- Qual o maior benefício de se promover uma cultura do para classificar um grupo e outro? Os estudiosos sobre
diálogo? comportamento em grupo definiram os grupos em categorias
Qualidade de vida no trabalho e nas demais áreas da vida. distintas, as quais são as seguintes: grupos primários e
secundários; grupos formais e informais; grupos homogêneos
- Qual o segredo para uma comunicação bem-sucedida? e heterogêneos, grupos interativos ou nominais; grupos
Antes de tudo, é necessário um estado de espírito favorável permanentes e temporários.
à interação humana. Daí em diante, a comunicação bem-
sucedida será resultante da postura de saber ouvir e dar Grupos primários e secundários
retorno ao interlocutor, ter interesse pela opinião dos outros, Lembra do grupo da família e dos amigos mais íntimos,
compartilhar informações e ideias e respeitar as diferenças, citados anteriormente? São classificados como grupos
bem como promover feedback. primários, pois estes são voltados para os relacionamentos
interpessoais diretos, enquanto os grupos secundários são
Para que a comunicação ocorra, é preciso que haja: voltados principalmente para atividades ou metas definidas.
Como exemplo dos grupos secundários, podemos pensar nos
Emissor – Mensagem – Receptor colegas da escola, com os quais nos reunimos para realizar
atividades escolares. Embora os grupos primários sejam
A boa comunicação depende da harmonia destes diferentes dos secundários, os primeiros podem surgir do
elementos. segundo. Um exemplo disso é um grupo de escola que é um
62 OLIVEIRA, A. C. F. de. Comportamento intergrupal e grupal. 63 BOWDITCH, James L., BUONO Anthony F. Elementos de comportamento
organizacional. São Paulo: Pioneira, 1999.
51
grupo secundário, tendo em vista ter metas e estar voltado Grupo em que há relação entre você, aluno, e o professor a
para realização de atividades. Desse grupo com objetivos distância constitui um grupo nominal, pois o contato é
definidos pode surgir uma relação mais próxima entre alguns indireto, não existe contato presencial, a não ser através da
colegas de sala de aula, os quais se reúnem todas as vezes em figura do monitor das aulas e, se existir, será apenas em alguns
que é solicitada alguma atividade em grupo. Ou seja, esse encontros. E grupos como o do seu ambiente de trabalho, no
grupo surgiu com o objetivo de concluir um curso, mas pode qual os colegas têm contato frequente e constante são grupos
naturalmente criar laços de amizade os quais irão além desse interativos.
curso. Os colegas de sala podem se transformar em grandes
amigos e assim continuar por toda a vida. Grupos permanentes e temporários
Na verdade, é muito provável que isso tenha acontecido Sua família é um grupo permanente ou temporário? E seus
com você ainda na sua infância, quando você era uma criança amigos de infância? E aquele grupo que se reuniu apenas para
ou já adolescente. Na escola, iniciamos com um grupo ajudar no combate à dengue no seu bairro ou escola?
secundário e espontaneamente vamos formando grupos De acordo com Bowditch e Buono, um grupo temporário é
menores, de acordo com a afinidade e identificação e, quando aquele formado com uma tarefa ou problema específico em
menos esperamos, esses simples colegas de sala de aula mente e cuja dispersão é algo esperado assim que o grupo
passam a ser grandes amigos. concluir a tarefa. Já os grupos permanentes são aqueles de
quem se espera continuidade ao longo de diversas tarefas e
Grupos formais e informais atividades. Então, podemos chegar à conclusão de que a sua
Você, como aluno de uma determinada escola ou família e seus amigos fazem parte de grupos permanentes, e o
funcionário de uma empresa pertence a que tipo de grupo? grupo de combate ao dengue constituem um grupo
Formal ou informal? Você escolheu as pessoas com as quais temporário.
estuda na mesma sala de aula que você? Se você trabalha, pode
dizer com quem gostaria de trabalhar? Sabemos que existem Atributos básicos dos grupos
alguns grupos com os quais nos sentimos muito bem, Os grupos de trabalho não são multidões desorganizadas.
transmitem-nos paz, segurança e até nos identificamos com as Eles possuem uma estrutura que modela o comportamento de
pessoas que o formam. Já em outros grupos ocorrem conflitos seus membros e torna possível a explicação e a previsão de boa
e às vezes não temos identificação com ele, nem gostamos das parte dos indivíduos, bem como o desempenho do grupo em
pessoas que compõem o grupo. Então, como definir esses si. Quais são essas variáveis estruturais? Podemos citar entre
grupos? elas os papéis, as normas, o status, o tamanho do grupo e o seu
Os grupos formais são aqueles que têm metas grau de coesão.
estabelecidas, voltadas para objetivos, e que são Para entender melhor a estrutura do grupo proposta por
explicitamente formados como parte da organização, tais Robbins vamos estudar sobre cada uma das variáveis citadas
como grupos de trabalho, departamentos, equipes de projeto. por ele.
E os grupos informais são aqueles que surgem com o passar do
tempo, através da interação dos membros da organização. Papéis
Embora esses grupos não tenham quaisquer metas O que você está fazendo agora? Estudando? Este é o seu
formalmente definidas, eles têm metas implícitas, que são papel no momento: você é um estudante. Mas ainda hoje você
frequentemente recreativas e interpessoais. assumirá outros papéis como o de filho, irmão, neto, mãe, pai,
se você já tem filhos, e se é casado(a), o papel de marido ou
Grupos homogêneos e heterogêneos mulher. Perceba a quantidade de papéis que temos ao longo da
Você tem a mesma idade dos colegas da escola? Ou dos nossa vida.
seus amigos mais íntimos? Tem os mesmos gostos que eles? Para Bowditch e Buono, a definição de papel se refere aos
Provavelmente você está na mesma faixa etária que os seus diferentes comportamentos que as pessoas esperam de um
colegas de sala ou seus amigos, mas quanto às suas indivíduo ou de um grupo numa certa situação.
preferências em relação a eles, até podem ter gostos em
comum, assim como pensamentos e desejos, mas vocês Vamos a um estudo de caso...
também têm suas diferenças, seja em pequenas coisas, como Bill Patterson é gerente da fábrica da Electrical Industries,
preferir macarrão e não arroz, como seu melhor amigo, ou um grande fabricante de equipamentos elétricos situado em
tomar Coca-Cola e não guaraná. Você deve estar se Phoenix, no Estado do Arizona. Ele desempenha diversos
perguntando: quais os critérios para ser homogêneo ou papéis em seu trabalho: é funcionário da Eletrical Industries,
heterogêneo? membro da gerência de nível médio, engenheiro eletricista e o
É muito relativa essa classificação, pois quando falamos em principal porta-voz da empresa junto à comunidade. Fora do
homogeneidade ou heterogeneidade estamos pensando em trabalho, Bill desempenha ainda outros papéis: marido, pai,
uma característica especificamente e não na totalidade das católico, membro do Rotary Clube, jogador de tênis, sócio do
características. Para dizer se um grupo é homogêneo, Thunderbird Country Club e síndico do condomínio onde mora.
precisamos primeiro deixar claro qual a característica que está Muitos desses papéis são compatíveis entre si; outros geram
sendo observada. Um exemplo disso pode ser o seu grupo da conflitos. Por exemplo, de que maneira sua postura religiosa
sala de aula, pois dizemos que um grupo é homogêneo afeta suas decisões administrativas em assuntos como
observando a faixa etária, já que todos os alunos estão na demissões, artifícios de contabilidade ou informações para os
mesma faixa etária. Mas esse mesmo grupo pode ainda ser órgãos governamentais? Uma recente oferta de promoções
chamado de heterogêneo quanto ao gosto pelo esporte, pois o exige que ele mude de cidade, embora sua família goste de
grupo é dividido: alguns alunos gostam de jogar futebol, já morar em Phoenix. Como conciliar as demandas de sua
outros, de jogar basquete, e um grupo menor adora nadar. carreira profissional com as demandas de seu papel como
chefe de família?
Grupos interativos ou nominais Normas
Para Bowditch e Buono, os grupos interativos são aqueles Você segue normas? Na sua escola ou no seu trabalho você
nos quais os participantes se envolvem diretamente, com é obrigado a usar uniforme? Caso utilize, esse comportamento
algum tipo de intercâmbio entre si. E os grupos nominais são é decorrente de uma norma estabelecida pela organização e
aqueles cujos membros interagem indiretamente entre si. você, como membro dela, deverá segui-la.
52
Para Robbins, todos os grupos estabelecem normas, ou 2- Estimular a concordância sobre os objetivos do
seja, padrões aceitáveis de comportamento que são grupo.
compartilhados por todos os membros do grupo. As normas
norteiam o comportamento dos componentes, indicando o que
deve ou não ser feito em grupo.
O tamanho do grupo
Na visão de Robbins, o tamanho do grupo afeta o
desempenho deste, mas o efeito depende de quais variáveis
dependentes você vai considerar. Na concepção do autor
citado, os grupos menores são mais rápidos na realização das 7- Isolar fisicamente o grupo.
tarefas. Mas se a questão for resolução de problemas, o mesmo
autor afirma que grupos maiores conseguem melhores
resultados.
Coesão
O conceito de coesão nos remete à ideia do grau de desejo
que os membros de um grupo têm em permanecer juntos e à
força de seus compromissos para com o grupo e suas metas.
Porém, como os grupos são muito diferentes, a coesão também
pode ser maior ou menor em cada grupo, ou seja, a sintonia Mas afinal o que são os processos intergrupais? 64
estabelecida entre seus componentes não é uniforme. E para Sempre que houver uma interação entre dois grupos,
isso, Robbins faz as seguintes sugestões para aumentar a forma-se uma interface, a qual cria um novo contexto dentro
coesão: do qual os grupos precisam ser compreendidos.
1- Reduzir o tamanho do grupo. Thompson identifica 3 tipos de interdependência:
Conjunta
- Dois ou mais grupos funcionam paralelamente,
executando o mesmo conjunto de tarefas, sendo coordenados
por um grupo superior
- Pouco probabilidade de conflito
53
Sequencial maneira variada, dependendo da concepção e preferências
- Um grupo depende da conclusão da tarefa para iniciar a metodológicas adotadas. Para os autores, provavelmente, o
sua aspecto mais controverso nesse campo de pesquisa se refere
- Alta probabilidade de conflito aos diferentes e, em parte, contraditórios fundamentos
epistemológicos que recortam e embasam seus estudos.
Recíproca
- O trabalho de um grupo é necessário para manter a Entre os conceitos observados na literatura acerca do
continuidade do outro, e este processo tem o efeito de tema liderança, de certa forma todos destacam o líder
feedback sobre o primeiro como sendo aquele indivíduo capaz de exercer influência
- Probabilidade máxima de conflito sobre os outros. Exercer liderança, portanto, seria ter a
Conflito intergrupal capacidade de tomar iniciativa em situações sociais, de
Divergências entre os membros de dois ou mais grupos, planejar, de organizar e conduzir ação e de suscitar
quanto a autoridade, metas, territórios ou recursos. colaboração.
O conflito não é necessariamente ruim
- A falta pode indicar exclusão sistemática de certas Para Soto, o líder e sua forma de atuar vão refletir
informações diretamente na construção da cultura organizacional, ou seja,
- Pode levar a novas ideias nos valores, crenças, hábitos, normas e condutas que dão
- Problemas antigos podem ser resolvidos identidade, sentido e destino a uma organização para a
- Por a prova a capacidade, interesse e criatividade realização de seus objetivos.
É negativo quando: Keith e Newstron, por sua vez, argumentam que estilo de
- Quando as pessoas se sentem derrotadas liderança pode ser concebido como o padrão global das ações
- Se põem na defensiva do líder que são percebidas por seus subordinados,
- Desenvolve clima de desconfiança representando a filosofia, as habilidades e as atitudes do
- Resistência passa a ser a norma e a cooperação exceção. dirigente em sua prática de trabalho. Já Maximiano define
estilo de liderança como a forma do líder se relacionar com os
Diversos níveis de conflito integrantes de sua equipe em interações individuais e grupais.
Latente
- Devido a certas condições anteriores o conflito deveria A principal teoria que explica liderança por meio de estilos
ocorrer de comportamento sem se preocupar com características de
personalidade do líder é a que se refere a três estilos:
Percebido autoritária, democrática e liberal, sendo esta a teoria mais
- Conclusão de que há conflito, nenhuma das partes se conhecida para Chiavenato.
incomoda
Tendo à frente o pesquisador Kurt Lewin, estudos
Sentido buscaram, a partir de 1950, identificar conjuntos de
- Uma das partes sente e se incomoda – gera tensão e stress comportamentos que pudessem configurar aquilo que passou
a se chamar “habilidade de liderança”. Não é importante o que
Manifesto o líder é, mas sim o que ele faz. Essa teoria
- Envolve comportamentos declaradamente agressivos concentrava‑ se mais especificamente no modo como os
líderes tomam decisões e o efeito que isso produzia nos
Desfecho índices de produtividade e satisfação geral dos
- Se solucionado o conflito - leva a satisfação e harmonia trabalhadores.
- Se não solucionado – pode retornar No texto realizado, a opção por adotar esta abordagem
mais clássica sobre liderança, enfocando os três estilos citados
Equipe Multidisciplinar acima em detrimento de outras abordagens mais atuais sobre
A equipe multidisciplinar é formada por um grupo de o tema, decorre basicamente por duas razões:
profissionais de uma área qualquer (saúde, administração,
etc.) que trabalham em conjunto a fim de chegar a um objetivo (1) muitas organizações baseiam‑ se nela para melhor
comum. Desta maneira, cada um profissional vai fazer o que compreensão das interações entre líder e liderados, e a
estiver dentro de sua área de formação para alcançar este influência que eles – os três estilos de liderança – exercem nas
objetivo em comum. relações grupais, individuais e organizacionais;
Liderança e Estilo de Liderança65 (2) entende‑ se que esses três estilos caracterizam
A liderança sempre foi objeto de interesse e estudos pelos uma conduta dos dirigentes que influencia no “clima”
diversos pesquisadores do comportamento humano. De Santo interno das organizações e nas relações de trabalho em geral,
argumenta que as teorias sobre o assunto estiveram atreladas estando mais adequados para se efetuar checagem sobre
às teorias de administração e que ambas esses estilos e uma possível associação com o
desenvolveram‑ se paralelamente, ressaltando ainda que, desenvolvimento do stress em professores. Essa opção
apesar dos esforços para elucidar esse “fenômeno”, a corrobora com Guerra, quando afirma que os estudos
liderança é um dos processos menos compreendidos, ou pelo conduzidos por Lewin e sua equipe sobre os três estilos de
menos, que menor concordância possui entre os conceitos liderança têm grande aceitação nos meios organizacionais
criados pelos pesquisadores. nos dias atuais.
Segundo Davel e Machado66 a liderança como campo Principais características dos estilos Autocrático,
teórico e empírico de pesquisa tem se desenvolvido de Democrático e Liberal de Liderança
Uma breve síntese dessas características apontadas por
autores indica que a conduta autoritária do líder
65 Textoadaptado de GOULART JUNIOR, E.; LIPP, M. E. N. Estilo de liderança e
stress: uma pesquisa em escolas estaduais de ensino fundamental. caracteriza‑
54
66 DAVEL, Eduardo and, MACHADO, Hilka Vier. A dinâmica entre
liderança e identificação: sobre a influência consentida nas organizações
contemporâneas. Rev. adm. contemp. [online]. 2001.
55
se basicamente pela centralização do poder e da determinação
de políticas em torno dele, sem a participação do grupo. O
dirigente determina as providências a serem tomadas,
distribui as tarefas entre a equipe e aponta quem deve
executá-las e a sequência mais adequada. Estudos apontam
que esse estilo de liderar pode produzir elevada tensão,
frustração e até comportamentos agressivos entre os
membros do grupo. Para muitos autores, esse estilo dificulta
as relações de amizade, podendo acarretar sentimentos
generalizados de insatisfação e dificilmente haverá espaços
para iniciativas pessoais. Argumentam que, dentre as
vantagens originadas por esse tipo de conduta do líder,
destacam‑ se o favorecimento de decisões rápidas, a
obtenção de resultados favoráveis de funcionários menos
competentes e o oferecimento de segurança e bases
estruturais para os membros do grupo de trabalho. Figura. Configuração de trabalho em grupo numa IES.
(A) grupos flexíveis.
Em relação à conduta democrática do líder, afirmam que (B) grupos integradores.
é a antítese da liderança autocrática, ou seja, sua principal (C) grupos informais.
característica é a descentralização do poder, sendo as (D) grupos interpessoais.
decisões tomadas coletivamente, com a participação e (E) grupos formais.
envolvimento do grupo de trabalho. É o grupo que define as
políticas e diretrizes; ocorrem debates e discussões e as 02. (FUB- Administrador- CESPE) A respeito do processo
tarefas podem ganhar novas perspectivas e dimensões; esse grupal nas organizações, julgue os itens seguintes. Comitê e
estilo de liderar favorece a formação de grupos de amizade e força-tarefa são exemplos de grupos temporários informais.
de relacionamentos cordiais entre os membros da equipe. O ( ) Certo ( ) Errado
líder atua como facilitador e apoiador das decisões tomadas no
coletivo, oferecendo feedback constante ao grupo e aos seus 03. (FUB- Pedagogo- CESPE) Julgue o item que se segue,
membros, encorajando a participação e delegando a respeito das relações humanas no trabalho e dos tipos de
responsabilidades, mas nunca perdendo de vista que é ele o liderança.
responsável pelo bom andamento das atividades de trabalho e Devido ao fato de que o estilo de liderança depende da
pelo sucesso em busca de objetivos e metas organizacionais. situação, os requisitos do exercente da liderança democrática
são variáveis.
A conduta liberal (laissez‑ faire) do líder, segundo os ( ) Certo ( ) Errado
autores, caracteriza‑ se principalmente pela omissão
deste, pois transfere sua autoridade para os liderados, 04. (SEDU-ES- Professor P- Pedagogo- CESPE/2010)
Quanto à liderança e às relações humanas no trabalho, julgue
conferindo‑ lhes o poder de tomar decisões.
o item a seguir.
Argumentam ainda que a divisão de tarefas e os critérios
A liderança democrática contrapõe-se à liderança
para execução ficam a cargo do grupo, sem ou com a mínima
autoritária, sobretudo pela forma de condução compartilhada
participação do líder, que não avalia ou regula o curso dos
do processo decisório.
acontecimentos; são os membros da equipe que treinam a si
( ) Certo ( ) Errado
mesmos e promovem suas próprias motivações. Esse tipo de
dirigente tem pouco controle sobre o grupo, deixando os 05. (SEDUC-AM- Merendeira- CESPE/2011) Julgue o
participantes estabelecerem suas próprias regras e o ritmo de item a seguir, relativos a desenvolvimento interpessoal.
trabalho. Ele também não se envolve com as emoções e Identifica-se relação de empatia quando, por exemplo, o
sentimentos do grupo, deixando‑ os com pouca direção, o merendeiro atende com mal humor os alunos.
que pode desencadear falta de motivação para o alcance ( ) Certo ( ) Errado
de metas e objetivos organizacionais. Quanto mais o líder
delega e abdica de suas responsabilidades, mais liberal é o Respostas
seu comportamento.
As características sucintamente apresentadas, originadas 01.E
dos diferentes estilos de comando, representam posições Os grupos formais são aqueles que têm metas
extremas e que dificilmente ocorrerão de forma plena no estabelecidas, voltadas para objetivos, e que são
exercício do trabalho do gestor. explicitamente formados como parte da organização, tais
como grupos de trabalho, departamentos, equipes de projeto.
Questões
02. Errado
01. (IF-PB - Administrador- IF-PB) Os _______ são criados Comitê e força-tarefa são exemplos de grupos temporários
e delineados para alcançar objetivos específicos e realizar porém, formais.
tarefas específicas para a organização, buscando atingir
seus objetivos. Esses grupos se estabelecem com base na 03. Errado
racionalidade, lógica e eficiência, e são projetados para A liderança situacional está envolvida com o líder
realizar funções específicas dentro da organização. autocrático pois decisões necessitam ser tomadas de forma
Essa configuração está presente no organograma rápida, uma vez que o ambiente está em constante mudança.
institucional. Analise a figura a seguir, identificando o O líder democrático, por sua vez, é contra indicado na
modelo de trabalho em grupo e marque a alternativa que teoria situacional pois isto envolve uma tomada de decisão
preenche CORRETAMENTE a afirmação. maior. O líder democrático escuta todos os seus membros para
tomarem a decisão em conjunto ou ouvi-los para tomar uma
decisão.
56
04. Certo abordagem de questões relativas aos Direitos Humanos. Isso
Em relação à conduta democrática do líder, afirmam que se justifica pelo fato de que, hoje, essas questões ocupam lugar
é a antítese da liderança autocrática, ou seja, sua principal importante tanto nas agendas políticas nacionais e
característica é a descentralização do poder, sendo as internacionais, como em organismos de alcance mundial.
decisões tomadas coletivamente, com a participação e Por causa da relevância dos Direitos Humanos para a
envolvimento do grupo de trabalho. É o grupo que define as educação, torna-se necessário que os Conselhos Escolares
políticas e diretrizes; ocorrem debates e discussões e as conheçam a trajetória de sua construção no fazer histórico do
tarefas podem ganhar novas perspectivas e dimensões; homem, entendendo como os mesmos foram se configurando
até o presente momento e sendo capazes de reconhecer que a
05. Errado garantia de sua aplicação se impõe como uma condição básica
Empatia significa a capacidade psicológica para sentir o para que as nações estejam situadas no campo das novas
que sentiria uma outra pessoa caso estivesse na mesma democracias.
situação vivenciada por ela. Consiste em tentar compreender O processo de democratização a que hoje assistimos na
sentimentos e emoções, procurando experimentar de forma maioria dos países que, na sua história recente, foram
objetiva e racional o que sente outro indivíduo. marcados por regimes autoritários, abre espaços não apenas
para a afirmação de direitos, como também assume
publicamente a pretensão de reparar as violações de Direitos
Humanos cometidas nos anos de autoritarismo que
2.4 O Conselho Escolar: aconteceram no Brasil e no conjunto dos países da América
propósitos e funcionamento; Latina, assim como as violações cometidas ao longo da história
do país, legitimadas pela cultura escravocrata, machista e
patriarcal, que atingem principalmente as pessoas negras,
indígenas e as mulheres.
Conselho Escolar e Conselho de Classe
Esse avanço se observa no Brasil, especialmente a partir da
Antes de adentramos especificamente nos aspectos
última década, à medida que governos de tradição
encontrados nesses dois assuntos, vale fazermos a
democrática se tornaram signatários dos pactos
conceituação de Conselho Escolar, passando as suas
internacionais de Direitos Humanos. Pretende-se que os
especificidades, passando posteriormente ao Conselho de
Direitos Humanos deixem de ser uma questão de governo e
Classe.
passem a ser uma questão de Estado.
Assim, educação e Direitos Humanos possuem uma íntima
I - O que é Conselho Escolar?67
e estreita relação, cabendo aos Conselhos Escolares serem
Para responder a essa pergunta, iremos nos valer dos
agentes motivadores de sua reflexão, difusão e implementação
apontamentos trazidos pelo Estatuto do Conselho Escolar:
nas práticas educativas escolares.
O Conselho Escolar é um órgão colegiado de natureza
O papel do Conselho Escolar é imprescindível, tanto no
deliberativa, consultiva e fiscal, não tendo caráter político-
aspecto administrativo, quanto na dimensão pedagógica.
partidário, religioso, racial e nem fins lucrativos, não sendo
Neste caderno, estamos o tempo todo reforçando a
remunerados seu Dirigente ou Conselheiros.
importância e urgente necessidade de fortalecer, cada vez
Tem como objetivo efetivar a gestão escolar, na forma de
mais, o Conselho Escolar, introduzindo uma questão que,
colegiado, promovendo a articulação entre os segmentos da
historicamente, tem sido vital para a humanidade: a Educação
comunidade escolar e os setores da escola, constituindo-se no
em Direitos Humanos. Difundir essa cultura por meio das
órgão máximo de direção.
escolas constitui passo importante, pois torna conscientes
Feitas essas considerações sobre sua formação,
alunos (as), trabalhadores (as) em Educação e representantes
conceitualmente tratamos o Conselho Escolar como sendo um
de comunidade na luta pela garantia de direitos e pela
processo que regula o funcionamento da escola, englobando a
conquista de novos direitos. Lefort69 nos ensina que a garantia
tomada de decisão, planejamento, execução,
de direitos implica na luta pela conquista de novos direitos.
acompanhamento e avaliação das questões administrativas e
Desse modo, pensar em Direitos Humanos implica instalar e
pedagógicas, efetivando o envolvimento da comunidade, no
difundir uma cultura em Direitos Humanos na escola. Nessa
âmbito da unidade escolar, baseada na legislação em vigor e
tarefa, o Conselho Escolar pode e deve contribuir como
nas diretrizes pedagógicas administrativas fixadas pela
protagonista, ao exercer ação mediadora nos processos de
Secretaria de Educação.
articulação entre a escola e outras organizações da sociedade
As partes que compõem o Conselho Escolar visam o
na defesa e proteção dos Direitos Humanos.
interesse dos alunos, para cumprimento da função escolar, que
Nesse sentido, o Conselho Escolar, ao assumir papel
traz como foco, o ensino na escola.
decisivo na vivência da proposta curricular e na construção e
Segundo o artigo Art. 9º do Estatuto do Conselho Escolar:
implementação do projeto político-pedagógico da escola, deve
fazer com que a Educação em Direitos Humanos seja
Art. 9º - A autonomia do Conselho Escolar será exercida com
contemplada. A criação de espaços para a promoção de
base nos seguintes compromissos:
estudos, reflexões e discussões no cotidiano da escola deve
a) A legislação em vigor;
constituir uma ação inovadora do Conselho Escolar, ação essa
b) A democratização da gestão escolar;
que necessita do envolvimento de todos os segmentos da
c) As oportunidades de acesso, permanência e qualidade de
comunidade escolar, criando condições para a formação da
ensino na escola pública de todos que a ela têm direito.
consciência crítica acerca da importância da instalação de uma
cultura de Direitos Humanos.
Relação do Conselho Escolar com os Direitos
Na condição de um organismo de base, o Conselho Escolar
Humanos68
é espaço da prática da democracia participativa. E essa,
Os Conselhos Escolares, como espaços de reflexão de
quando bem exercitada, concorre, efetivamente, para a
temáticas que se acham diretamente ligadas ao cotidiano da
ampliação e para o fortalecimento dos diferentes segmentos
ação educativa escolar, devem ter, entre seus compromissos, a
que compõem a escola e a comunidade. A atuação articuladora
67 http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Consescol/pr_lond_sttt.pdf
69 LEFORT, Claude A invenção democrática: os limites do totalitarismo. São Paulo:
68 Programa Nacional de Fortalecimento dos Escolares Conselhos Conselho Escolar Brasiliense, 1987.
e Direitos Humanos. Ministério da Educação. Brasília – DF. Novembro de 2008
57
entre a escola, a comunidade e outras instituições sociais determina os caminhos das ações políticas, sociais, culturais e
confere ao Conselho Escolar poder social, possibilitando-lhe pedagógicas da escola.
agir como interlocutor de diferentes instâncias da educação e A nova forma de organização dos conselhos escolares,
da própria sociedade. Enquanto força social, o Conselho decorrente da concepção de gestão democrática, é, ainda,
Escolar pode influenciar nas políticas educacionais e nos incipiente e encontra obstáculos em práticas tradicionais que
projetos da escola, propondo ações inovadoras que consideram os conselhos como órgão assessor de atividades
contribuam para melhoria da qualidade do ensino, para a recreativas e financeiras da escola. Essa concepção
democratização da gestão e para a garantia dos Direitos assistencialista em nada contribui para a constituição da vida
Humanos. escolar como um espaço de respeito às diferenças, porque
Nessa perspectiva, além das funções que lhe vêm sendo atua, precisamente, no sentido contrário: ao estabelecer que a
atribuídas - deliberativa, consultiva, fiscalizadora e participação de todos seja limitada à esfera do trabalho, não
mobilizadora – o Conselho Escolar deve assumir uma nova consolida um espaço de decisões e permite que poucos
função: propositiva, mediante a qual poderá exercitar a sua continuem tendo o privilégio de determinar o destino dos
capacidade de criar, de inovar e de ter uma atuação mais demais.
decisiva na prática educativa escolar. Ao exercer papel A concepção de gestão democrática da educação está,
propositivo, o Conselho Escolar estará, de fato, assumindo a indissociavelmente, vinculada ao estabelecimento de
condição de um sujeito político coletivo, ou seja, um ator social mecanismos legais e institucionais de participação política e à
capaz de interagir e intervir, como uma força coletiva, na organização de ações voltadas para a participação social. A
construção de projetos sociais. Nesses termos, o Conselho participação política da população tem papel fundamental na
Escolar, como espaço privilegiado da prática da participação e formulação das políticas educacionais, em seu planejamento,
da vivência de experiências democráticas, é local, por no processo de tomada de decisões ou ainda na definição de
excelência, de promoção e exercício de cidadania e, por onde, quando e como utilizar os recursos públicos com o
conseguinte, de Educação em Direitos Humanos. objetivo de implementar as deliberações coletivas.
A participação da comunidade na gestão da escola
Conselhos escolares e a valorização da diversidade: constitui um mecanismo que tem como finalidade não apenas
uma dimensão mais democrática na escola a garantia da democratização do acesso e da permanência com
vistas à universalização da educação mas também a
Maria Cecília Luiz propagação de estratégias democratizantes e participativas
Sandra Aparecida Riscal que valorizem e reconheçam a importância da diversidade
José Roberto Ribeiro Junior política, social e cultural na vida local, regional ou nacional.
Democracia e respeito ao diferente Constitui, portanto, elemento fundamental da propagação das
Os conselhos escolares são parte de um esforço que visa à concepções de diversidade e direitos humanos. A escola é
implantação e implementação de processos de parte da sociedade, e nela podem-se iniciar práticas
democratização das decisões nas escolas públicas, através da democráticas e igualitárias.
participação da comunidade escolar e local na vida da escola. O grande problema é que tal concepção tem se firmado
Na perspectiva da legislação atual, eles têm como foco a como um discurso e tem revelado que o conceito de
constituição de uma sociedade democrática por meio da democracia equivale a um produto exposto nas prateleiras da
participação da comunidade nas instituições públicas. A gestão mídia. Como mercadoria, a democracia está pronta para ser
democrática, princípio sobre o qual se assenta o processo de consumida, seja em projetos governamentais, seminários ou
democratização da educação no país e, particularmente, na propostas de trabalho. Ela é apresentada como algo que pode
escola, tem nos conselhos escolares sua pedra angular, porque ser adquirido, assimilado e posto em uso imediatamente. Nos
é pela participação da comunidade escolar nos processos meios de comunicação televisivos, jornais e revistas
decisórios da escola que se implementa a democratização das especializados, a democracia é vendida como um remédio
relações escolares. miraculoso, capaz de solucionar todas as dificuldades da vida
Se, por definição, a gestão democrática é o resultado de um escolar. Longe de ser apresentada como um processo que
trabalho coletivo que tem os conselhos escolares como sua deveria se constituir pelas mudanças das práticas cotidianas
principal instância, a possibilidade de participação coletiva da escola, a democracia tornou-se uma fórmula ou um
deve se apresentar, necessariamente, como um dos aspectos receituário que, ao ser seguido, deve garantir o sucesso social
fundantes da vida escolar. Seu princípio deve nortear o dia a da escola.
dia da escola, em suas relações cotidianas e na valorização das É como se bastasse vestir as escolas com uma roupagem
especificidades e singularidades do contexto histórico e social democrática para que toda a estrutura e os educadores
dessa instituição, de sua comunidade e de suas expectativas de escolares se tornassem, desse ponto para frente,
futuro. Por esse motivo, não se pode pensar que seja possível democráticos. É frequente escutar afirmações como:
estabelecer um modelo de conselho escolar para todas as Implantaremos a democracia a todo custo, A partir de agora,
escolas. Cada escola é única, sua comunidade é única, e o seremos todos democráticos, ou Agora, que sabemos como
debate que subsidiará as decisões relativas aos diferentes funciona, fica mais fácil. A democracia deixa de ser um
aspectos de cada escola é único, não podendo ser reproduzido processo que, de maneira gradual, conquista espaço por meio
em outro ambiente. de mudanças das práticas cotidianas para se tornar,
A escola constitui um espaço privilegiado para a ironicamente, objeto de imposição.
implementação de práticas que combatam todos os tipos de A democracia e, em particular, a gestão democrática na
discriminação e preconceito, porque abriga, em seu interior, educação tornaram-se um cobiçado produto de moda, algo que
todas as formas de diversidade étnico-racial ou cultural, todas as escolas e secretarias municipais e estaduais de
origem social, gênero, sendo o conselho escolar uma instância educação almejam adquirir para que possam, publicamente, se
que representa os segmentos da escola, mas não toda a apresentar como democráticas. Se continuarmos nesses
diversidade da escola. Ele deve ser a instância que garante a passos, logo teremos selos que certificarão as escolas
participação e a manifestação dessa diversidade na escola. É democráticas, permitindo que se estabeleça um ranking das
necessário, por isso, que se estabeleça uma clara definição do escolas mais democráticas. O sucesso da democracia como
campo de ação dos conselhos escolares, colocando-os, de fato, produto social acabou por contaminar todas as esferas sociais
como uma instância de caráter deliberativo, normativo, fiscal, e, hoje, dificilmente se aceita que um diretor de escola ou
mobilizador e inclusive pedagógico na vida escolar, que
58
autoridade educacional afirmem que não adotam a processo os procedimentos tradicionais de análise e síntese,
democracia como prática em sua escola. mas o estabelecimento pragmático de relações entre a
Como a estrutura do pensamento é, também, a estrutura informação acessada e sua utilidade, no conjunto de
da ação, todos os aspectos simbólicos de que se revestem os possibilidades.
discursos sobre a democracia revelam as práticas
intersubjetivas do campo escolar. As manifestações A diversidade e a cultura escolar
discursivas permitem compreender a estratégia de integração O direito às diferenças se constitui da desnaturalização das
e a busca de incorporação de uma estrutura simbólica aceita desigualdades, que devem deixar de ser percebidas como uma
coletivamente. Por isso, para a compreensão do caráter do perversão às leis da natureza e passar a ser enxergadas como
discurso veiculado acerca da democracia, é necessário que se uma constituição legítima da vida social. Essa compreensão
entenda o tipo de estratégia social que constitui. exige uma concepção transdisciplinar, algo que não rotule, que
O consenso representado pela democracia como forma de passe por cima dos estereótipos e estigmatizações, que separe
ação política vem exigindo que os diferentes agentes sociais cada segmento em um campo disciplinar próprio e que
demonstrem publicamente sua adesão. A adoção da recolha, nas diferentes ciências, o saber necessário para
democracia parece significar, de maneira pública, um modo de compreender a correlação entre as formas de discriminação e
acumulação de prestígio que confere status àqueles que se estabelecer jeitos para sua superação, construindo maneiras
mobilizam muito mais para cumprir um ritual do que para igualmente transdisciplinares de promover a igualdade.
exercitar a interação democrática. O conhecimento das diferentes possibilidades de
Assumindo caráter cerimonial, o efeito mobilizador e manifestação cultural e de comportamentos sexuais é a
unificador do discurso democrático, quando voltado para as maneira mais eficiente de demonstração da falência do
massas, tende, frequentemente, a tornar-se catarse coletiva, discurso conservador naturalizado. A disseminação do
passando a ter a forma de populismo. Quando proferido para conhecimento acerca dessas manifestações é um contraponto
autoridades, significa a demonstração de adesão ao modelo aos meios de comunicação de massa, que têm se constituído
político adotado e constitui uma espécie de propaganda em um dos principais instrumentos de propagação do
pessoal de quem o faz. O discurso democrático pode remeter, preconceito
assim, à necessidade de reconhecimento dos agentes É possível compreender o importante papel da educação e
escolares, quer por parte do coletivo da escola, quer por parte da escola tanto na constituição dos preconceitos e na
das autoridades superiores. Corresponde, portanto, a uma reprodução de práticas sociais preconceituosas quanto na luta
espécie de marketing pessoal constituído do consenso pela superação desses preconceitos. O predomínio de livros
representado pela opinião geral. Isso significa que é preciso didáticos e paradidáticos nos quais a figura da mulher é
distinguir o discurso democrático, que visa a atender à opinião ausente ou caracterizada como menos qualificada que o
pública, da ideia de democracia, como processo que instaura a homem contribui para uma imagem de inferioridade feminina,
livre e autônoma participação coletiva. por um lado, e de superioridade masculina, por outro. A
A maneira como a opinião pública se constitui pode ser escolha das cores, o rosa e o azul, os papéis representados nas
concebida atualmente como o resultado da circulação dessas brincadeiras, a ausência das crianças negras nas salas de nível
opiniões pelos meios de comunicação amplificados pelas mais avançado vão, entre outras questões, demarcando e
novas tecnologias. A sociedade em que vivemos é referendando as posições machistas e racistas que persistem
homogeneizante e burocratizada, em um mundo cujas em nossa sociedade.
fronteiras e espaços se contraem com a aceleração da Ao identificarmos o cenário de discriminações e
capacidade de comunicação e informação. À medida que preconceitos, vemos no espaço da escola as possibilidades de
aumenta o contato entre uma quantidade cada vez maior de particular contribuição para a alteração desse processo. A
pessoas, mais sensíveis elas se tornam à opinião umas das escola abriga em seu interior todas as diferentes formas de
outras. Riesman70 chama esse tipo social, próprio da sociedade diversidade, quer sejam de origem social, sexual, étnico-racial,
contemporânea, de alterdirigido (other-directed). cultural ou de gênero. É, portanto, um espaço privilegiado na
Segundo Riesman, o que caracteriza o tipo social construção dos caminhos para a eliminação de preconceitos e
alterdirigido é que seus contemporâneos são fonte da de práticas discriminatórias. A escola democrática deve
orientação para o indivíduo – tanto aqueles que lhe são educar para a valorização da diversidade e formar indivíduos
conhecidos quanto aqueles que eles conhecem indiretamente, capazes de exercer a cidadania com dignidade.
através de amigos e dos meios de comunicação de massa. Essa Ressalta-se que esse papel não cabe somente às escolas
fonte, naturalmente, é ‘internalizada’, no sentido de que se mas também às políticas públicas, que precisam prevenir,
implanta bem cedo no indivíduo a dependência em face dela, investigar, estimular o debate e punir crimes de ódio baseados
para a orientação da vida. As metas rumo às quais a pessoa em orientação sexual ou identidade de gênero. Questões de
alterdirigida se conduz mudam com essa orientação: apenas o gênero, religião, raça/etnia ou orientação sexual direcionam
processo mesmo de empenhar-se e o de prestar muita atenção práticas preconceituosas e discriminatórias da sociedade
aos sinais dos outros é que permanecem inalterados através contemporânea. Se o estereótipo e o preconceito estão no
da vida. campo das ideias, a discriminação está no da ação, ou seja,
O tipo de caráter descrito por Riesman como alterdirigido trata-se de uma atitude.
parece permitir que se estabeleçam algumas características A superação das discriminações implica a elaboração de
dos sujeitos que nascem do mundo interativo, dos meios de políticas públicas específicas e articuladas. Os exemplos
comunicação de massa, da internet e da informação relativos às mulheres, aos homossexuais masculinos e
globalizada. Esse processo contínuo e infinito é tão rápido femininos, às populações negra e indígena tiveram a intenção
quanto superficial, pois a finalidade é a informação, a não apenas de explicitar que as práticas preconceituosas e
familiarização, não o aprofundamento nem a análise ou a discriminatórias – misoginia, homofobia e racismo – existem
crítica. A voracidade com a qual se procuram e se consomem no interior da nossa sociedade mas também de mostrar que
as informações tem a rapidez da leitura dos textos virtuais, que essas mesmas práticas vêm sofrendo profundas
logo são substituídos por uma nova página acessada e transformações em função da atuação dos próprios
esquecidos no espaço virtual informe. Não cabem nesse movimentos sociais, feministas, LGBT, negros e indígenas. Tais
59
movimentos têm evidenciado o quanto as discriminações se demandas, que devem encontrar na escola uma possibilidade
dão de formas combinadas e sobrepostas, refletindo um de expressão.
modelo social e econômico que nega direitos e considera
inferiores mulheres, gays, lésbicas, transexuais, travestis, Diversidade: conselho escolar e inclusão do aluno
negros, indígenas. com deficiência
A desnaturalização das desigualdades exige um olhar Anderson de Lima
transdisciplinar, que convoca as diferentes ciências, Walkiria Gonçalves Reganhan
disciplinas e saberes para compreender a correlação entre Conselho escolar e diversidade: por uma escola mais
essas formas de discriminação e construir maneiras democrática
igualmente transdisciplinares de enfrentá-las e de promover a As discussões envolvendo os direitos das pessoas com
igualdade. deficiência no Brasil ganharam impulso significativo na década
Durante muito tempo, a escola foi encarada como local de 1980. Desse processo de mobilização, resultou um conjunto
onde deveria prevalecer a homogeneidade cultural. Questões de direitos estabelecidos pela Constituição de 1988, alguns
como direitos individuais, diferenças étnicas, culturais, sociais deles expressos na Lei 7.853/89 – posteriormente
ou de gênero não eram objeto de atenção. Na sala de aula, regulamentada pelo Decreto 3.298/99.
prevalecia a autoridade inquestionável do professor; na No artigo 4o, inciso III, da Lei de Diretrizes e Bases da
escola, a autoridade do diretor. Tendendo a ignorar as Educação, fica garantido “III - atendimento educacional
diferenças, a cultura escolar se estabeleceu por meio de um especializado gratuito aos educandos com deficiência,
jogo de pressupostos preconceituosos jamais explicitamente transtornos globais do desenvolvimento e altas
enunciados, mas carregados de violência simbólica, cujo habilidades ou superdotação, transversal a todos os
resultado era incutir em toda a comunidade escolar práticas níveis, etapas e modalidades, preferencialmente na rede
sociais impregnadas de preconceitos. regular de ensino; (Redação dada pela Lei nº 12.796, de
Embora se constituíssem como espaço público, muitos dos 2013)
problemas eram considerados tabus, porque, acreditava-se,
pertenceriam à vida privada, como o racismo, a sexualidade ou A aquisição de instrumentos variados para o ensino
o assédio, portanto eram do âmbito da família. A escola, por também foi apontada pela Lei Federal n o 9.394, de 20 de
sua vez, positivista desde sua origem, deveria ser uma dezembro de 1996, no artigo 59, inciso I, que assegura aos
instituição ascética que, imaginava-se, privilegiaria a educandos com deficiência, transtornos globais do
propagação de conhecimentos objetivos e neutros. desenvolvimento e altas habilidades ou superdotação
Ignorando as diferenças, a escola tornou-se um dos “currículos, métodos, técnicas, recursos educativos e
sustentáculos da propagação dos preconceitos. Nos conteúdos organização específicos para atendê-los”
escolares, encontravam-se subjacentes padrões identitários Segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
de etnia, cultura ou gênero, que excluíam (e ainda excluem) os currículos deverão ajustar-se, em todos os locais de ensino,
aqueles que não se encontravam na concepção cultural às condições do educando com necessidades educacionais
ocidental tradicional. O espaço escolar sempre foi elemento especiais. Cabem aos estabelecimentos de ensino a
essencial dos processos sociais de estigmatização e organização e a operacionalização dos currículos escolares em
discriminação, que devem e podem ser combatidos em seu projeto pedagógico, incluindo as devidas disposições para
benefício de um ambiente mais respeitoso com relação à o atendimento das necessidades especiais dos alunos. Mais
diversidade e aos direitos humanos. uma vez, o conselho escolar, como lugar do debate e da
A concepção adotada aqui baseia-se no princípio de que a decisão, ganha relevância na perspectiva da adequação
possibilidade de criação de um espaço escolar plural passa curricular e da escola como um todo, ajustando-a ao aspecto
pelo direito de todos, em suas diferenças, serem reconhecidos legal e às demandas que surgem da comunidade na qual se
como iguais. A diversidade é um dos aspectos fundamentais da insere.
atual concepção de direitos humanos.
Característica daquilo que é diverso e, portanto, diferente, Não há por que haver dois sistemas paralelos de ensino,
a diversidade é um dos aspectos fundamentais da existência mas um único que seja capaz de prover educação a todo o seu
humana, e ser diferente constitui um direito de todos os seres alunado.
humanos. Na esfera escolar, é um tema ainda incipiente e Conselho escolar no contexto inclusivo
permeado de tensões, rejeições e recusas. A busca por uma escola de todos e para todos traz consigo
A escola é um espaço de saber-poder que veicula a ideia de inclusão e valorização do humano. A inclusão, como
significados e práticas; o reconhecimento do direito a ser forma de construção de cidadania, passa pelo acesso à escola e
diferente exige a compreensão de que não existe o diferente pela permanência nela enquanto principal instituição
em si; a diferença é o resultado da comparação com o que não responsável pela educação, requisito para o exercício do papel
é considerado diferente e constitui a norma ou o padrão. cidadão. Trata-se de um direito garantido
Assim, afirmar diferença significa eliminar o padrão constitucionalmente, que abarca o ser humano de modo
homogeneizante, que impõe a negação da diferença. indistinto e amplo.
A noção de diversidade remete, no espaço escolar, quase A escola verdadeiramente voltada à formação do
sempre às questões de gênero e etnia ou aos direitos de indivíduo-cidadão se vê, hoje, inserida em um contexto social
minorias, como indígenas ou pessoas com deficiência. mais amplo, de reivindicação de direitos e de consolidação de
Entretanto, o reconhecimento do diferente deve ultrapassar uma sociedade que se faz cada vez mais responsável pelos
essas distinções, abarcando outras possibilidades de ser e rumos sociopolítico-econômico-ambientais que a
viver, na diversidade de expressões culturais, linguísticas, determinam. A cidadania torna-se, portanto, condição da
artísticas ou nas diferenças físicas, que vão desde peso ou própria existência humana, e a participação, enquanto prática,
altura até modos de vestir e falar. Trata-se de questões que não assume papel de alta relevância na perspectiva de efetivação
têm encontrado acolhimento na escola e apenas agora têm do exercício da cidadania. Implica, assim, a tomada de decisão,
experimentado alguma repercussão, com discussões sobre a deliberação, a construção coletiva.
bullying ou assédio. São expressões não sistematizadas e não A escola – espaço primeiro de convivência e de vivência de
institucionalizadas e, por isso, se encontram marginalizadas regras, de organização social coletiva – oferece, por sua
nas representações da sociedade; constituem novas própria dinâmica, a possibilidade de experimentação e
60
efetivação da cidadania via participação democrática de todos Conselho Municipal de Educação, conselho escolar e
aqueles que a compõem. formação continuada: democratização, participação e
O conselho escolar, nesse contexto, assume relevância qualidade de ensino
significativa para a viabilização dessa prática de cidadania ao Flávio Caetano da Silva
agregar a representatividade dos segmentos que constituem o Maria Cecília Luiz
universo escolar e dar a eles a voz e a vez no processo de Ana Lucia Calbaiser da Silva
construção de uma educação mais democrática, porque
cidadã, porque, essencialmente, participativa. Levando em conta a atual conjuntura mundial e o
O deficiente, ao ser incluído, ao se tornar partícipe do dia a delineamento das políticas públicas no que se refere à
dia da escola, toma seu lugar e se faz ouvido nesse processo, educação brasileira, este texto tem como objetivo refletir
que, além de político, é social, é transformador da realidade sobre alguns aspectos presentes na formação continuada a
que encontramos hoje na escola pública. distância em conselhos escolares e de conselheiros municipais
É no conselho escolar que a democracia e a cidadania se de educação, principalmente quanto às formas de participação
complementam e se consolidam pela participação igualitária no processo de democratização da educação com qualidade de
de todos (profissionais, comunidade, alunos), no esforço da ensino.
construção de uma escola de qualidade. Para tanto, nos utilizamos do conceito de gestão
É considerando a força do poder local no processo de democrática e participação para uma melhor compreensão da
construção das políticas públicas e, portanto, de afirmação do formação continuada. Nossa análise tem como base
Estado Democrático e de Direito que o conselho escolar acontecimentos e situações de aprendizagem que ocorreram
representa instância privilegiada de discussão de questões em ambos os cursos.
que dizem respeito à vida das pessoas, da escola, da O curso de conselheiros municipais de educação foi
comunidade e, num plano mais amplo, da própria sociedade. ofertado para membros do Conselho Municipal de Educação
O conselho escolar abriga, no contexto da inclusão e da (CME) de municípios do Estado de São Paulo; e o de conselhos
garantia de direitos do cidadão, o papel fundamental de escolares, aos técnicos das secretarias municipais e estadual
alicerçar ações que assegurem, no interior da escola, uma de educação dos seguintes estados: São Paulo, Paraná, Rio
educação de qualidade, socialmente referenciada, capaz de Grande do Sul, Espírito Santo, Bahia, Pernambuco e Piauí. Essa
democratizar o conhecimento e possibilitar que todas as análise permitiu o entendimento da importância da formação
necessidades decorrentes da inclusão do deficiente possam continuada e a observação dos problemas existentes nessas
ser, de fato, atendidas e trabalhadas a fim de lhe assegurar as duas formações.
melhores possibilidades de aprendizado e desenvolvimento.
Ao exercer suas funções (consulta, mobilização, Gestão democrática: domínios legais e sociais
deliberação, fiscalização), o conselho escolar viabiliza e Se pensarmos na sociedade atual, em que o individualismo
potencializa a capacidade de reivindicação de uma escola para e a concorrência são características predominantes, fica difícil
todos e, nesse processo, canaliza a ação de todos os envolvidos concebermos um espaço no qual a democracia, a participação
para a construção de ações que possam gerar as condições e o diálogo se ressaltem. Sem aprendizado, o exercício da
necessárias ao acesso e à permanência – com aprendizado, participação e das tomadas de decisão não muda a realidade –
desenvolvimento, integração, sem restrições ou nenhum tipo trata-se de um processo que deve ser construído
de segregação – do aluno deficiente. coletivamente, por meio do diálogo igualitário.
A gestão democrática e sua efetiva implantação em
Como espaço de convivência e aprendizado, a escola estabelecimentos públicos de ensino sucederam-se sob a égide
compreende um pluralismo e um multiculturalismo que lhe de duas perspectivas: a primeira esteve pautada pelos
são próprios e fazem desse lugar o lugar do aprendizado do movimentos sociais e pelas políticas públicas da década de
respeito ao outro, ao diferente, do respeito à divergência e à 1980, resultando na Constituição de 1988; a segunda, por sua
compreensão da multiplicidade que envolvem o ser humano vez, moldada pelo neoliberalismo e denominada de gestão por
em suas relações pessoais e no mundo em que vive. A prática resultados, é conhecida como gerencialista ou managerialista.
da cidadania e a busca por uma escola e uma sociedade mais A respeito da primeira, verifica-se que, no começo da
democráticas passam por esse aprendizado, pela ética e pela década de 1980, tem início um processo de retomada da
ação solidária que nos caracterizam enquanto humanidade e democracia e da reconquista dos espaços políticos que a
que revestem o papel da escola de uma importância ainda sociedade civil brasileira havia perdido. Os movimentos
maior. Nela, serão construídas e estimuladas as possibilidades sociais centravam-se na consolidação e na conquista de novos
de um convívio harmônico entre as diferenças, as limitações e espaços de participação na esfera do Estado. Estes se
os anseios daqueles que dela fazem parte. fortaleceram com a Constituição de 1988, que estabeleceu a
No conselho escolar, dada sua constituição, estão postos, democracia participativa por meio de conselhos de cogestão
em princípio, todos os pontos de vista, representados por seus nos diferentes âmbitos de atuação do Estado (conselhos de
membros e expostos de modo a gerar, no debate, a busca por educação, de saúde, de assistência social, entre outros).
consensos que possam significar a procura pela qualidade do Os princípios defendidos – de igualdade de condições –
trabalho da e na escola. Nele, serão articulados meios capazes para o acesso dos estudantes à escola e sua permanência nela
de valorizar a pluralidade da escola em favor da constituição propiciaram um novo entendimento para a educação,
de uma educação que represente os anseios e necessidades possuindo, agora, um fator de realização da cidadania, com
que se colocam socialmente e que adentram seu universo no padrões de qualidade de oferta e produto na luta pela
dia a dia da sala de aula. superação das desigualdades sociais e da exclusão.
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) não só
Inclusão e conselho escolar ganham um valor único no confirmava como também materializava a garantia do direito
contexto da democratização da escola, complementam-se e público subjetivo à educação, determinando a eliminação de
revestem-se de sentido enquanto caminhos na busca pela toda e qualquer forma de discriminação para a matrícula ou
escola de qualidade para todos, que há tanto almejamos. permanência na escola. Isso garantiria ao estudante brasileiro
o direito de aprender e prosseguir seus estudos com um
ensino de qualidade.
Para tais alterações, teve-se como meta a descentralização
da administração escolar, por meio da gestão democrática,
61
assegurando, pelos colegiados, a participação de professores, Participação e diálogo
funcionários, alunos e pais nas decisões da escola. Destaca-se Sabemos que a modificação de um paradigma nem sempre
a importância do entendimento da sociedade civil, neste contempla o cotidiano escolar, por isso consideramos que a
momento histórico, de compartilhar as decisões na escola, concepção de gestão educacional ou mesmo o entendimento
garantindo a participação de todos. de gestão democrática não garantem, sozinhos, a
Em consonância com a Constituição Federal, outras leis e democratização dos sistemas de ensino.
decretos foram se regularizando para a implantação da gestão Podemos construir uma sociedade mais democrática por
democrática. Um exemplo disso é a Lei de Diretrizes e Bases da meio da participação, da discussão e do diálogo, mas, para isso,
Educação Nacional (9.394/96), que, no artigo 14, declara a é necessário que a escola abra caminho para a conscientização
relevância da “participação dos profissionais da educação na da população por práticas que levem à formação de uma
elaboração do projeto pedagógico da escola e da participação consciência crítica. Esse exercício se dá com a participação
das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou efetiva de vários segmentos da escola e da comunidade, com
equivalentes” (Brasil, 1996). eles opinando em decisões e tendo voz para argumentar o que
Na contramão dessas mobilizações, no início dos anos pensam – logo, não meros espectadores.
1990, não só por causa da crise econômica mas também pelo Garantir a participação de todos não significa ter os
esgotamento do modelo de Estado brasileiro, o pensamento conselhos escolares apenas funcionando de forma legal. De
neoliberal, alicerçado na defesa da sociedade de livre mercado, acordo com Luiz & Conti74, um dos grandes desafios, por
tornou-se referência para a redefinição do papel do Estado. exemplo, é a questão da representação. A falta de tempo e de
Assim, alguns termos aparecem associados à ideia de local para os representantes e representados se reunirem, a
participação, tais como empowerment e accountability.71 Nesse fim de acordar nos assuntos concernentes à escola, tem sido
novo contexto, também despontam as organizações não um problema real nessas representações. Geralmente, em
governamentais, o chamado Terceiro Setor. conselhos de escola, temos representantes que defendem
Nessa conjuntura, os ideais da Constituição de 1988 são somente os seus interesses, esquecendo-se do coletivo.
negligenciados, e surge o discurso da modernização educativa O conceito de participação fundamenta-se no de
e da qualidade do ensino. Essa proposta neoliberal discute a autonomia (capacidade das pessoas e grupos de conduzir sua
qualidade da educação do trabalhador com base na formação vida) e no de organização escolar, com objetivos coletivos e
de competências, imprescindíveis para a atuação desses compartilhados. Pode-se diferenciar uma escola por sua
trabalhadores em um mercado competitivo. autonomia e pelo modo como descentraliza sua gestão, como
Com esse novo discurso, a gestão é concebida de maneira delibera e como executa um planejamento compatível com as
gerencialista ou managerialista, aproximando a administração realidades locais, todos e todas devendo acreditar que o
empresarial da administração escolar. Tal lógica, a processo educacional seja algo a ser construído por meio de
gerencialista, entende que a educação deve ter como foco a participação ativa.
qualidade de resultados, compreendidos como fato de sucesso Quando existe esse diálogo, pessoas com diferentes
da aprendizagem (Casassus72). Em outras palavras, uma boa culturas possuem igual valor e dialogam entre si, dando forma
gestão escolar está relacionada ao fato de a escola ter bons a novos saberes a partir da inteligência cultural. Consideramos
índices de aprovação e baixos de evasão. que essa diversidade cultural é salutar, não havendo uma
Ao aproximar a concepção de qualidade da educação do cultura melhor que outra. A presença da diversidade humana
discurso de eficácia e eficiência administrativa, a figura do na sociedade resulta na multicultura, no sentido de que toda
diretor torna-se fundamental no gerencialismo, pois é ele o cultura é plural. Um comportamento multicultural significa
responsável pelos índices mensuráveis por meio de avaliações reconhecer o pluralismo cultural e aceitar a presença de ideias
externas. Atualmente, vemos esse tipo de controle de de diversas pessoas e, por conseguinte, de culturas distintas.
qualidade dentro das escolas públicas, que se empenham para Nessa perspectiva, entendemos que há inúmeras formas
liderar o ranking de qualidade com a intenção de receber de participação nas escolas, cujo exercício pleno possibilita à
“prêmios”, traduzidos em repasses financeiros. comunidade maior inserção nos processos democráticos de
Segundo Ferreira & Aguiar73, na década de 1990, apesar de nossa sociedade. Quando essa participação está pautada pela
as parcerias terem se multiplicado e de a preocupação com os ação comunicativa (HaBermas, 1987) e as pessoas têm a
índices e resultados ter sido exaltada, o projeto político- possibilidade de desenvolver um diálogo igualitário dentro
pedagógico das escolas e a qualidade do ensino nem sempre das escolas, há um ganho riquíssimo na aprendizagem das
apresentaram grandes modificações. Seu grande desafio diz crianças, pois a comunidade externa pode contribuir com seus
respeito à função social que elas exercem, que é a de assegurar saberes e experiências para a equipe escolar em busca da
a todos e todas permanência com a aquisição de promoção de uma educação de qualidade.
aprendizagens significativas e de oportunidades de exercício Freire75 nos alerta que a relação dialógica é percebida
da cidadania, com o desenvolvimento das potencialidades de como uma prática fundamental à natureza humana e à
cada um e com um preparo básico para o mundo do trabalho. democracia:
Para Ferreira & Aguiar, precisamos, juntos, pensar os A dialogicidade não pode ser entendida como instrumento
problemas de acesso e permanência, garantindo o sucesso dos usado pelo educador, às vezes, em coerência com sua opção
alunos na escola e ajudando a encontrar soluções que sejam política. A dialogicidade é uma exigência da natureza humana
mais adequadas às suas necessidades tão diversas – e é nessa e também um reclamo da opção democrática do educador
hora que entra a participação da comunidade. É preciso criar (Freire).
um ambiente acolhedor para ouvir o que a população tem a Urge a necessidade de processos emancipatórios de
dizer sobre o que espera do ensino. educação conduzidos pelo diálogo e pela reflexão; eles devem
permitir, segundo Beck, Giddens & Lash76, novas formas
organizacionais, mais democráticas.
71 Accountability é uma palavra recente no vocabulário político brasileiro. De 74 LUIZ, Maria Cecília; CONTI, Celso. Políticas públicas municipais: os conselhos
origem inglesa, é associada à transparência, à prestação de contas e à escolares como instrumento de gestão democrática e formação da cidadania. In:
responsabilização. Congresso de Leitura do Brasil, 16., 2007, Campinas, SP. Anais. Campinas, SP, 2007.
75 FREIRE, Paulo. À sombra de uma mangueira. 8ª Ed. São Paulo: Ed. Ollhos d’Água,
72 CISESKI, Â. A.Aceita um conselho? Teoria e prática da gestão participativa na
2006.
escola pública. São Paulo: USP/Faculdade de Educação, 1997. 76 BECK, U; GIDDENS, A; LASH, S. Modernização reflexiva. Política, transición y
73 FERREIRA, Naura Syria Carapeto. AGUIAR, Márcia Ângela da S. (Org.) Gestão da
estética em el orden social moderno. Barcelona: Ediciones Paidós Ibérica, 1997.
Educação: Impasses, perspectivas e compromissos. 3 ed. São Paulo: Cortez, 2001.
62
Faz-se necessária uma mudança na relação conflituosa oportunidades de reflexão a educadores e profissionais da
entre familiares e equipe escolar, de maneira a promover educação, bem como aos familiares de estudantes, acerca das
espaços para a participação ao estabelecer um diálogo ações do Estado, pretendendo enfrentar os grandes desafios
igualitário. Assim, a ideia é a de dar lugar a debates em que os que a educação representa em nossos dias.
sujeitos (independentemente de sua posição social), juntos,
construam os currículos, de modo que tanto educadores Conselho Escolar: incentivador da articulação
quanto educandos aprendam. escola/sociedade.77
Nessa perspectiva, o espaço escolar passa a ser um Aqui se pretende viabilizar aos diferentes segmentos que
ambiente de ação comunicativa (HaBermas, 1987), formando compõe a unidade escolar e a comunidade local,
indivíduos críticos e participativos e, portanto, fazendo parte, principalmente aos membros do Conselho Escolar, identificar
sendo parte e tomando parte de tudo o que concerne à na sociedade práticas emergentes que favorecem a construção
instituição. da cidadania. Práticas sociais as mais diversas, que são
Embora o discurso da gestão escolar seja relacionado, traduzidas numa intensa efervescência cultural e social,
algumas vezes, à gestão democrática, sabemos que os espaços passam despercebidas ou não são legitimadas ou apoiadas não
coletivos e dialógicos nos processos escolares estão se só pela escola, como também pelos sistemas de ensino, ou
constituindo a cada dia. Toda uma cultura brasileira de não mesmo, pela sociedade.
participação e medo está muito presente nas nossas relações O que mais se evidencia é a existência de um discurso
sociais. As famílias participantes da pesquisa afirmaram, em institucional que insiste em ignorar a capacidade de
sua maioria, não fazer parte de sindicatos nem ter ligação intervenção e as ações que estão em marcha, organizadas pelas
alguma com movimentos políticos. Os tabus e preconceitos comunidades, visando à construção de um mundo mais igual,
também são significativos, principalmente com relação aos ético, fraterno e solidário. Perceber, compreender, criticar e, se
sujeitos que se manifestam ou que questionam muito, fazendo necessário, alterar a sua prática pedagógica constitui um
pesar o histórico que possuímos: o de sermos um país que desafio para a escola, o que pode ser efetivado mediante um
permaneceu sob regime de ditadura militar e repressão por conjunto de ações norteadas pelo projeto político-pedagógico
mais de 20 anos. construído coletivamente. Nessa direção, pode-se considerar a
As escolas devem intencionar essa participação, multiplicidade de formas de atuação ao alcance das escolas e
provocando, nas pessoas envolvidas, a vontade de sempre de seus profissionais, tais como:
buscar mais, aprender mais, sonhar com uma escola melhor. a) mapear as organizações populares existentes no bairro;
Compreendemos, por meio das formações continuadas, que a b) promover assembleias externas, em parceria com as
participação está sendo construída de forma gradual, sendo entidades da sociedade civil, para analisar ou propor políticas
imprescindível a crença, por todos os componentes de dentro de desenvolvimento local;
e de fora da escola, de que a gestão democrática é viável e c) inventariar a situação do bairro com o objetivo de
produz resultados. compreender o contexto social, econômico e político, o que
Isso ficou evidente quando as pessoas envolvidas nessas significa entender o bairro, suas perspectivas, potencialidades,
unidades escolares perceberam resultados e, por isso, foram, projetos do setor público e do setor privado que modificarão a
aos poucos, aderindo a algumas condutas e modificando as vida local.
relações interpessoais entre todos os da equipe escolar e os da
comunidade local com mais respeito, responsabilidade e Há um razoável consenso entre os educadores que o
solidariedade. projeto político-pedagógico, construído de forma coletiva e
participativa, constitui o norte orientador das práticas
Processo formativo dos conselheiros do CME curriculares e pedagógicas na escola. O Conselho Escolar pode
O curso formativo dos conselheiros do CME compõe um exercer um papel relevante na gestão escolar (pedagógico-
conjunto de esforços da SEB/MEC direcionado à criação e ao administrativa) contribuindo para a construção e
fortalecimento de Conselhos Municipais de Educação, como implementação do projeto político-pedagógico da escola e
indicado no site oficial do MEC: para o alargamento do horizonte cultural dos estudantes.
O programa estimula a criação de novos Conselhos Nesse processo, o Conselho Escolar, ao atuar plenamente,
Municipais de Educação, o fortalecimento daqueles já no sentido de contribuir com a ampliação das oportunidades
existentes e a participação da sociedade civil na avaliação, de aprendizagens dos estudantes, não só se fortalece como
definição e fiscalização das políticas educacionais, entre outras instância de controle social como também auxilia a escola
ações. O Pró-Conselho tem como principal objetivo qualificar pública no cumprimento de sua função social.
gestores e técnicos das secretarias municipais de educação e
representantes da sociedade civil para que atuem com relação Conselho Escolar e a articulação com a comunidade
à ação pedagógica escolar, à legislação e aos mecanismos de A escola pode propiciar a organização de situações que
financiamento, repasse e controle do uso das verbas da favoreçam ao estudante efetivar aprendizagens que o leve a
educação. Os Conselhos Municipais de Educação exercem valorizar a história do seu bairro, dos líderes populares do seu
papel de articuladores e mediadores das demandas lugar, da sua raça, do seu gênero e da sua classe social.
educacionais junto aos gestores municipais e desempenham Incentivar no corpo discente o desenvolvimento de posturas
funções normativa, consultiva, mobilizadora e fiscalizadora solidárias, críticas e criativas e propiciar a organização de
(Brasil, 2013b). situações que induzam o estudante a lutar pelos seus sonhos
Consideramos que essa ação formativa aprofunda as são tarefas de uma escola comprometida com a formação
chances de experiências democráticas na escola básica na cidadã.
medida em que se direcionam àqueles que transformam as Nesse sentido, a escola pode realizar atividades que
políticas públicas educacionais em ações diretas à sociedade, despertem o senso estético, concorrendo, assim, para a
na medida em que nos permitem fazer que as políticas públicas vivência mais plena dos estudantes, como seres humanos
educacionais, originárias do governo federal, cheguem a sensíveis, mesmo que estes convivam em ambientes pouco
diversos municípios paulistas. estimuladores da beleza que a natureza e a produção cultural
Para garantir que tais ações sejam permanentes, da humanidade oferecem.
oferecemos o curso em questão com o objetivo de criar
77 http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/Consescol/cad%2010.pdf
63
Incentivar e desenvolver atividades pedagógicas que Até muito recentemente a questão da escola limitava-se a
permitam aflorar a sensibilidade e o bom gosto dos estudantes uma escolha entre ser tradicional e ser moderna. Essa
pode ser um objetivo relevante da escola. tipologia não desapareceu, mas não responde a todas as
É necessário atentar que para possibilitar um ambiente questões atuais da escola. Muito menos à questão do seu
favorável às aprendizagens significativas das crianças e jovens projeto78.
que se encontram em situação de maior vulnerabilidade A crise paradigmática também atinge a escola e ela se
(como bem evidenciam as manchetes que apontam para as pergunta sobre si mesma, sobre seu papel como instituição
estatísticas de violência, desemprego, gravidez indesejada e numa sociedade pós-moderna e pós-industrial, caracterizada
precoce e restritas oportunidades culturais e de lazer), a escola pela globalização da economia, das comunicações, da educação
depende, em boa par- te, da ação solidária e colaborativa da e da cultura, pelo pluralismo político, pela emergência do
comunidade local em relação às suas propostas pedagógicas. poder local. Nessa sociedade cresce a reivindicação pela
Crianças e jovens, habituados e fascinados pela vida livre das participação e autonomia contra toda forma de uniformização
ruas, sem limites e regras, têm dificuldade de adaptação à e o desejo de afirmação da singularidade de cada região, de
“estrutura tradicional” da escola. cada língua etc. A multiculturalidade é a marca mais
O que pode contribuir para alterar esse quadro de significativa do nosso tempo.
incertezas e de dificuldades de toda ordem é levar todas essas
questões ao debate no coletivo da escola, expor as Como isso se traduz na escola?
contradições que afloram permanentemente na prática Nunca o discurso da autonomia, cidadania e participação
pedagógica, não se deixar intimidar pelo volume dos no espaço Escolar ganhou tanta força. Estes têm sido temas
problemas e pela precariedade de recursos que poderiam ser marcantes do debate educacional brasileiro de hoje. Essa
acionados visando à sua superação. Debater as situações preocupação tem-se traduzido, sobretudo pela reivindicação
problemáticas, tomar decisões, desenvolver e avaliar as ações de um projeto político pedagógico próprio de cada escola.
pedagógicas e administrativas, nos colegiados, parecem ser Neste texto, gostaríamos de tratar deste assunto, sublinhando
formas bem-sucedidas de lidar com as inúmeras questões a sua importância, seu significado, bem como as dificuldades,
sociais e pedagógicas que emergem no cotidiano da escola. obstáculos e elementos facilitadores da elaboração do projeto
político pedagógico.
Começaremos esclarecendo o próprio título: “projeto
A participação nos projetos comunitários: político pedagógico”. Entendemos que todo projeto
Nessa perspectiva, a escola pode procurar interagir com os pedagógico é necessariamente político. Poderíamos
projetos comunitários, de natureza socioeducativa, que visem denominá-lo, portanto, apenas “projeto pedagógico”. Mas, a
promover o ingresso, o regresso, a permanência e o sucesso fim de dar destaque ao político dentro do pedagógico,
dos estudantes na escola. Estrategicamente, a escola e o resolvemos desdobrar o nome em “político pedagógico”.
sistema de ensino podem aproveitar a existência desses Frequentemente se confunde projeto com plano.
projetos para discutir, apreciar e avaliar as condições de Certamente o plano diretor da escola — como conjunto de
infraestrutura e pedagógicas locais, com o propósito de objetivos, metas e procedimentos — faz parte do seu projeto,
implantar de forma progressiva e criativa o tempo integral, já mas não é todo o seu projeto.
sinalizado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e, Isso não significa que objetivos metas e procedimentos não
de há muito tempo, uma realidade em países que alcançaram sejam Necessários. Mas eles são insuficientes, pois, em geral, o
melhores patamares na oferta da escolarização às suas plano fica no campo do instituído, ou melhor, no cumprimento
populações. mais eficaz do instituído, como defende hoje todo o discurso
Enfim, incentivar a constituição de projetos de vida dos oficial em torno da “qualidade” e, em particular, da “qualidade
estudantes articula- dos aos movimentos que visam à total”. Um projeto necessita sempre rever o instituído para, a
construção coletiva do projeto de bairro, da cidade e da nação partir dele, instituir outra coisa. Tornar-se instituinte. Um
é um desafio. Projetos de vida que significam crescimento projeto político-pedagógico não nega o instituído da escola
pessoal e profissional, considerando a sociedade complexa e que é a sua história, que é o conjunto dos seus currículos, dos
contraditória na qual o estudante se situa. Contribuir para que seus métodos, o conjunto dos seus atores internos e externos
o estudante se reconheça como ser histórico e que faz a e o seu modo de vida. Um projeto Sempre confronta esse
história em suas ações cotidianas e em interação com o outro instituído com o instituinte.
é papel da escola. Esse reconhecimento do estudante como ser Não se constrói um projeto sem uma direção política, um
histórico, capaz de, ao longo do tempo e em processos de lutas norte, um rumo. Por isso, todo projeto pedagógico da escola é
coletivas, mudar as condições de vida e as relações sociais de também político. O projeto pedagógico da escola é por isso
trabalho nessa sociedade, valoriza a ação da escola. mesmo, sempre um processo inconcluso, uma etapa em
Nessa direção, são variadas as atividades de cunho direção a uma finalidade que permanece como horizonte da
pedagógico que podem ser desenvolvidas na escola e na escola.
comunidade com a participação decisiva do Conselho Escolar.
São atividades propostas, discutidas, desenvolvidas e De quem é a responsabilidade da constituição do projeto da
avaliadas por docentes em sua relação com os estudantes, bem escola?
como por outras instâncias da escola e pelo Conselho Escolar. O projeto da escola não é responsabilidade apenas de sua
direção. Ao contrário, numa gestão democrática, a direção é
II. Conselhos de Classe escolhida a partir do reconhecimento da competência e da
Os Conselhos de Classe ocorrem em grande parte das liderança de alguém capaz de executar um projeto coletivo. A
escolas, guiados por modelos de avaliação classificatórios, com escola, nesse caso, escolhe primeiro um projeto e depois essa
o objetivo de conceder uma sentença ao aluno. Hoffman pessoa que pode executá-lo. Assim realizada, a eleição de um
entende que esta deve ser uma ação dirigida ao futuro, com diretor ou de uma diretora se dá a partir da escolha de um
caráter interativo e reflexivo, deliberando sobre novas ações projeto político pedagógico para a escola. Portanto, ao se
que garantam a aquisição de competências para à eleger um diretor de escola, o que se está elegendo é um
aprendizagem dos alunos. projeto para a escola.
78 Texto
extraído de GADOTTI, Moacir. “Projeto político pedagógico da escola:
fundamentos para sua realização”.
64
Como vimos, o projeto pedagógico da escola está hoje processo de avaliação, já que a nota, produto concreto dessa
inserido num cenário marcado pela diversidade. Cada escola é aferição, reflete apenas o resultado do desempenho cognitivo
resultado de um processo de desenvolvimento de suas do aluno e nunca o processo educativo que o levou a tal
próprias contradições. Não existem duas escolas iguais. Diante resultado.
disso, desaparece aquela arrogante pretensão de saber de É importante ressaltar que esta simples verificação não
antemão quais serão os resultados do projeto para todas as possibilita a melhoria do ensino e, consequentemente, da
escolas de um sistema educacional. A arrogância do dono da aprendizagem, pois ela é estática, somente constatando erros
verdade dá lugar à criatividade e ao diálogo. A pluralidade de e acertos que classificam os alunos em aprovados ou
projetos pedagógicos faz parte da história da educação da reprovados, provocando a exclusão e a evasão escolar.
nossa época. Repensar esta prática deve ser tarefa urgente e substituí-
Por isso, não deve existir um padrão único que oriente a la pela avaliação enquanto processo de formação humana é
escolha do projeto de nossas escolas. Não se entende, portanto, uma necessidade. A avaliação, enquanto atividade dinâmica
uma escola sem autonomia, autonomia para estabelecer o seu presente na escola, deve subsidiar decisões e
projeto e autonomia para executá-lo e avaliá-lo. reencaminhamentos da prática docente por intermédio da
A autonomia e a gestão democrática da escola fazem parte coleta, da análise e da síntese de dados resultantes da prática
da própria natureza do ato pedagógico. A gestão democrática pedagógica que considera a aprendizagem um processo onde
da escola é, portanto, uma exigência de seu projeto político a socialização do saber científico deve ser garantida,
pedagógico. contribuindo com a inclusão e a melhoria da qualidade da
Ela exige, em primeiro lugar, uma mudança de aprendizagem.
mentalidade de todos os membros da comunidade escolar.
Mudança que implica deixar de lado o velho preconceito de É necessário ver a aprendizagem como um processo e as
que a escola pública é apenas um aparelho burocrático do disciplinas curriculares como um meio para se chegar a ser um
Estado e não uma conquista da comunidade. A gestão cidadão e não como conteúdos que se dominam pela
democrática da escola implica que a comunidade, os usuários memorização. Daí a necessidade de um currículo centrado no
da escola, sejam os seus dirigentes e gestores e não apenas os desenvolvimento, na construção, na experiência que
seus fiscalizadores ou, menos ainda, os meros receptores dos oportuniza a autonomia e transformações sociais
serviços educacionais. Na gestão democrática pais, mães, significativas e de uma avaliação que contribua para a
alunas, alunos, professores e funcionários assumem sua parte formação humana. Nesta perspectiva, Lima80, afirma que a
de responsabilidade pelo projeto da escola. avaliação para formação humana contrapõe-se à noção
vigente, uma vez que seus objetivos são nortear o aluno,
Avaliação Escolar e Conselho de Classe79 informar ao professor o estágio de desenvolvimento em que
Quando se discute o Conselho de Classe, discutem-se as ele se encontra, e orientar os próximos passos do processo.
concepções de avaliação escolar presentes nas práticas Dessa forma, ela não classifica, mas situa. E situa para auxiliar
educativas dos professores. Neste sentido, a importância dos no processo de formação do aluno, decorrendo daí sua
Conselhos de Classe e dos processos avaliativos da escola está importância para a prática pedagógica, que deve sempre
nas possibilidades e capacidades de leitura coletiva da prática, propiciar ao educando novas possibilidades de
bem como diante do reconhecimento compartilhado das desenvolvimento e aprendizagem.
necessidades pedagógicas, de modo a mobilizar esse coletivo
no sentido de alterar as relações nos diversos espaços da O Papel do Conselho de Classe
instituição. Para a compreensão acerca do papel do Conselho de Classe
Avaliar é tarefa antiga das escolas, existe desde a sua faz-se necessário o conhecimento da história dessa instância
criação e, embora haja variedade nas formas da atividade colegiada conforme disposto pela legislação educacional
avaliativa, ela manteve, ao longo dos séculos, um certo caráter contemporânea.
punitivo, presente, ainda, hoje nas escolas que valorizam a
verificação em detrimento da avaliação, conforme afirma O Conselho de Classe francês tem, portanto, um caráter
Luckesi (2003). Assim o que hoje se observa é que a avaliação específico, encaminhando para a seleção e a distribuição do
está centrada no desempenho cognitivo dos alunos, sem aluno no sistema dualista implantado na França naquele
referência a um projeto de escola ou ao trabalho docente, período. Os pareceres dos Conselhos serviriam para orientar
objetos também de avaliação. os alunos às diversas modalidades de ensino (clássico ou
Os processos de avaliação escolar refletem os técnico) de acordo com as “aptidões” e o “caráter”
posicionamentos dos profissionais e são fundamentados pelas demonstrado pelos mesmos.
concepções de escola, de ensino, do papel do professor, do Essa experiência de Conselho de Classe foi trazida ao Brasil
papel do aluno, que cada um possui. A organização e as por educadores brasileiros que foram estagiários em Sèvres,
condições de trabalho do professor apresentam-se como em 1958, e sua implantação foi feita no Colégio de Aplicação
fatores determinantes no processo e orientam as diferentes da Universidade Federal do Rio de Janeiro (CAP).
práticas docentes. A transformação da prática pedagógica liga- Acredita-se que a importação das ideias trazidas pelo
se estreitamente à alteração da concepção de avaliação porque Conselho de Classe francês, como afirmado por Rocha, só foi
a construção do processo avaliativo expressa o conhecimento possível porque já teria havido um processo de
da e sobre a escola. desenvolvimento de um ideário pedagógico, que estaria
impregnando o meio educacional por meio da pedagogia
A concepção de avaliação que aponta para os atos de escolanovista que sugere uma organização que valoriza o
aprovar ou reprovar o aluno com base em um registro trabalho coletivo, a discussão, a busca e a criação de novos
numérico, são procedimentos nos qual o professor assume o métodos.
papel de juiz ao utilizar-se de provas, consubstanciado por Com base nesse pressuposto e retrocedendo no tempo, a
mecanismos de verificação da aprendizagem de conteúdos criação do Conselho de Classe encontra suas origens no cerne
específicos, num determinado momento do processo. Assim, das ideias que permearam a tendência escolanovista da
entende-se que existe uma visão reduzida e equivocada do
65
educação. Quando se lê o Manifesto dos Pioneiros da Educação as discussões para a formalização de instâncias de avaliação
Nova, expõe Dalben, percebem-se elementos do tipo: coletiva na escola, do tipo Conselho de Classe que deveria ser
implementado. Conclui-se que o novo modelo de escola foi
“O ensino de segundo grau começa por um ano de estudos formalmente implantado por meio dos novos regimentos
numa classe de orientação, depois da qual se divide em três escolares elaborados pelas escolas, que passaram a orientar
secções: clássica, moderna e técnica. O encaminhamento para seu funcionamento. Nesses regimentos, encontra-se o
essas secções faz-se tendo em conta os desejos das famílias e o Conselho de Classe como um dos órgãos instituídos.
interesse geral, segundo o gosto e as aptidões nas classes de
orientação e eventualmente nas classes seguintes”81 É legítimo dizer que a Lei 5692/71 deu abertura aos
Conselhos Estaduais de Educação para traçar as diretrizes de
Esses elementos apontam para o início da valorização das sua operacionalização, conforme o que diz o artigo 2º em seu
ideias de atendimento individualizado, de estudo em grupos e, parágrafo único: [...] “a organização administrativa, didática e
especificamente, de reunião dos profissionais para discussão disciplinar de cada estabelecimento de ensino será regulada
de um determinado tipo de atendimento ao alunado. no respectivo regimento, a ser aprovado pelo órgão próprio do
A ideia de uma nova organização de escola, como sistema, com observância de normas fixadas pelo respectivo
“organismo vivo”, de “comunidade palpitante pelas soluções Conselho de Educação”.
de seus problemas”, proposta no Manifesto dos Pioneiros da Entretanto, pode-se afirmar que do “PREMEN” emanavam,
Educação Nova, é contrária à centralização de poder e de de forma direta e indireta, as orientações necessárias para a
decisões, considerando necessária a adaptação da escola a operacionalização da lei. Essas orientações apresentavam uma
interesses e necessidades dos alunos. Essa nova concepção de relativa “abertura” às escolas, havendo, no entanto, pouca
escola sugere uma organização que valoriza o trabalho clareza à forma de execução.
coletivo, a discussão, a busca e a criação de novos métodos. No contexto de implantação da lei 5692/71 e da concepção
Entretanto, o Conselho de Classe instituído na organização de de ensino subjacente e essa organização, onde a referida lei
modo a operacionalizar essas ideias, ainda não aparece nesse estruturava o sistema educacional, num clima político pautado
momento. pelo autoritarismo, excluindo a participação de setores
representativos da sociedade, acarretou a desconfiança por
Os Conselhos de Classes só foram instituídos no Brasil a parte dos profissionais da escola nas possibilidades do
partir da lei 5692/71 –LDB do Ensino de 1º e 2º graus. Essa lei Conselho de Classe como um espaço capaz de intensificar a
veio para dirigir o sistema escolar por meio de um processo construção de processos democráticos de gestão. Assim sendo,
político pautado pelo autoritarismo, sem a participação de o objetivo fundamental da instância, que seria o de propiciar a
setores representativos da nacionalidade. Ela vem definir uma articulação coletiva dos profissionais num processo de análise
nova estrutura para o sistema educacional, reunindo os compartilhada, considerando a globalidade de óticas dos
diversos ramos existentes (secundário, comercial, industrial, professores, não foi atingido, perdendo assim sua importância
agrícola e normal) num só, além de propor a profissionalização e sua riqueza no trato das questões pedagógicas.
do educando (Dalben82). O Conselho de Classe, como uma instância coletiva de
Esse novo sistema educativo brasileiro introduzido pela avaliação do processo de ensino e aprendizagem, reflete essas
Lei 5692/71 tinha como um de seus propósitos fundamentais concepções, assim como as limitações e contradições próprias
a transformação do estudante em indivíduo treinável, a elas, já que o posicionamento dos profissionais é que dará
instrumentalizado nos valores do capital, na competição e na seu contorno político. No contexto (...), o Conselho de Classe
racionalidade deste. não conseguirá desempenhar seu papel original de mobilizar a
O PREMEN foi implantado, a partir de 1970, em vários avaliação escolar no intuito de desenvolver um maior
estados do Brasil, os quais realizaram convênios com as conhecimento sobre o aluno, a aprendizagem, o ensino e a
prefeituras dos diversos municípios atingidos por ele, para escola, e especialmente, de congregar esforços no sentido de
com isso executá-lo em larga escala. Para isso grupos de alterar o rumo dos acontecimentos, por meio de um projeto
professores eram treinados nesse programa para, pedagógico que visa ao sucesso de todos.83
posteriormente, implementar as chamadas escolas A ruptura da visão tradicional de ensino, que segregava os
polivalentes, já dentro dos modelos observados nos estados segmentos sociais, iniciou com a Lei de Diretrizes e Bases da
Unidos. Educação Nacional nº. 9394/96, gestada em um contexto no
qual a política estava voltada ao social. Em decorrência desta
A promulgação da Lei 5692/71 ocorreu após a Lei, todo conceito acerca do sistema educacional e suas
implantação desse programa nas escolas polivalentes e, a organizações foi revisto, com base em princípios
partir dela, foi possível a orientação normativa e legal desse democráticos.
tipo de escola para a estrutura e funcionamento de todo o
ensino de 1º e 2º graus. Principais diferenças entre Conselho Escolar e
É importante ressaltar que, segundo Dalben, Conselho de Classe
anteriormente à Lei 5692/71, o Conselho de Classe não se O Conselho Escolar é formado por professores, equipe
apresentava como instância formalmente instituída na escola, pedagógica de pais e alunos. É responsável pelas decisões em
acontecendo, como afirma Rocha (1982), de forma espontânea prol da escola, através de pintura, organização e outros
em escola que voluntariamente se dispusesse a enxergá-lo eventos.
como de importância pedagógica. Sua implantação, entretanto, O Conselho de Classe permite que os professores,
não se deu claramente por meio da nova lei, mas ocorreu coordenadores e diretores se reúnam para fazer
indiretamente, por intermédio de orientações vindas do apontamentos dos alunos, observar seus resultados,
modelo de escola proposto pelo PREMEN, que apresentava o andamentos.
Conselho de Classe como órgão constituinte da escola. Questões
Os Conselhos Estaduais de Educação com base em pedidos
de esclarecimento sobre a Lei 5692/71, produziram pareceres 01. (Prefeitura de Rio Branco/AC - Cuidador Pessoal –
e resoluções orientadores, que de certa forma encaminhavam IBADE/2017). A principal função do Conselho Escolar é:
66
(A) estudar os diversos campos sociais (econômico, partidário, religioso, racial e nem fins lucrativos, não sendo
político e cultural), refletindo sobre o sentido de qualidade remunerados seu Dirigente ou Conselheiros.
mais adequado à educação. Tem como objetivo efetivar a gestão escolar, na forma de
(B) refletir sobre as dimensões e os aspectos que colegiado, promovendo a articulação entre os segmentos da
necessitam ser avaliados, ao se construir uma escola cidadã e comunidade escolar e os setores da escola, constituindo-se no
de qualidade. órgão máximo de direção.
(C) conhecer parcialmente o trabalho que se desenvolve na
escola, em suas especificidades e na relação que existe entre 03. Resposta: A
essas partes. O Conselho de Classe permite que os professores,
(E) estar ligado, prioritariamente, à essência do trabalho coordenadores e diretores se reúnam para fazer
escolar. apontamentos dos alunos, observar seus resultados,
andamentos. Para melhoria e contribuição desses
02. (UFMA - Pedagogo – UFM/2016). Sobre o papel do profissionais, conta-se inclusive com a ajuda dos
Conselho Escolar e o lugar que ocupa na estrutura geral da representantes de turmas.
escola, especialmente entre os demais órgãos colegiados,
julgue a afirmativa correta.
(A) Dos órgãos colegiados com funções apenas 2.5 Gestão escolar e
fiscalizadoras estão a Associação de Pais, Mestres e participação da família na
Funcionários e o Grêmio Estudantil e os com funções
deliberativas e consultivas estão o Conselho de Classe e o vida escolar.
Conselho de Alunos.
(B) Os conselhos escolares são órgãos representativos da
Gestão democrática e a mobilização da equipe
sociedade que falam em nome do governo para os dirigentes
escolar84
das escolas.
E por falar em gestão, como proceder de forma mais
(C) O Conselho Escolar não tem nenhuma relação com a
democrática nos sistemas de ensino e nas escolas públicas?
prática educativa e nem com o desenvolvimento do processo
ensino-aprendizagem.
A participação é educativa tanto para a equipe gestora
(D) Dos órgãos colegiados, o Conselho Escolar, devido a
quanto para os demais membros das comunidades escolar e
sua formação e fins, é o mais importante porque congrega,
local. Ela permite e requer o confronto de ideias, de
além da direção, participantes dos demais colegiados e
argumentos e de diferentes pontos de vista, além de expor
representantes da comunidade na qual está inserida a escola.
novas sugestões e alternativas. Maior participação e
(E) Cabe ao Conselho Escolar na sua função deliberativa
envolvimento da comunidade nas escolas produzem os
emitir pareceres para dirimir as dúvidas e tomar decisões
seguintes resultados:
quanto às questões pedagógicas, administrativas e financeira,
no âmbito de sua competência.
- Respeito à diversidade cultural, à coexistência de ideias e
de concepções pedagógicas, mediante um diálogo franco,
03. (SEDUC/RO - Professor Classe C – Sociologia –
esclarecedor e respeitoso;
IBADE/2016). Sobre o conselho de classe, leia as afirmativas.
- Formulações de alternativas, após um período de
I. O conselho de classe, em uma visão democrática, é uma
discussões onde as divergências são expostas.
instância meramente burocrática em que se buscam
- Tomada de decisões mediante procedimentos aprovados
justificativas para o baixo rendimento dos alunos.
por toda a comunidade envolvida
II. O conselho de classe guarda em si a possibilidade de
- Participação e convivência de diferentes sujeitos sociais em
articular os diversos segmentos da escola e tem por objeto de
um espaço comum de decisões educacionais.
estudo o processo de ensino.
A gestão democrática dos sistemas de ensino e das escolas
III. Para maior eficácia do conselho de classe, seria
públicas requer a participação coletiva das comunidades
necessário o envolvimento de outros segmentos da
escolar e local na administração dos recursos educacionais
comunidade escolar, por exemplo, alunos representantes de
financeiros, de pessoal, de patrimônio, na construção e na
turmas.
implementação dos projetos educacionais.
Está correto o que se afirma apenas em:
Mas para promover a participação e deste modo
(A) II e III.
implementar a gestão democrática da escola, procedimentos
(B) I e II.
prévios podem ser observados:
(C) I e III.
- Solicitar a todos os envolvidos que explicitem seu
(D) I.
comprometimento com a alternativa de ação escolhida;
(E) III.
- Responsabilizar pessoas pela implementação das
alternativas acordadas;
Respostas
- Estabelecer normas prévias sobre como os debates e as
decisões serão realizados;
01. Resposta: E
- Estabelecer regras adequadas à igualdade de participação
O Conselho Escolar é formado por professores, equipe
de todos os segmentos envolvidos;
pedagógica de pais e alunos. É responsável pelas decisões em
- Articular interesses comuns, ideias e alternativas
prol da escola, através de pintura, organização e outros
complementares, de forma a contribuir para organizar
eventos.
propostas mais coletivas.
- Esclarecer como a implementação das ações serão
02. Resposta: D
acompanhadas e supervisionadas;
O Conselho Escolar é um órgão colegiado de natureza
- Criar formas de divulgação das ideias e alternativas em
deliberativa, consultiva e fiscal, não tendo caráter político-
debate como também do processo de decisão.
67
Gestão democrática implica compartilhar o poder, central em torno do qual desenvolve-se o processo de trabalho
descentralizando-o. Como fazer isso? Incentivando a escolar" (DALBEN, 1995). Nesse sentido, entendemos que o
participação e respeitando as pessoas e suas opiniões; conselho de classe não deve ser uma instância que tem como
desenvolvendo um clima de confiança entre os vários função reunir-se ao final de cada bimestre ou do ano letivo
segmentos das comunidades escolar e local; ajudando a para definir a aprovação ou reprovação de alunos, mas deve
desenvolver competências básicas necessárias à participação atuar em espaço de avaliação permanente, que tenha como
(por exemplo, saber ouvir, saber comunicar suas ideias). A objetivo avaliar o trabalho pedagógico e as atividades da
participação proporciona mudanças significativas na vida das escola. Nessa ótica, é fundamental que se reveja a atual
pessoas, na medida em que elas passam a se interessar e se estrutura dessa instância, rediscutindo sua função, sua
sentir responsáveis por tudo que representa interesse comum. natureza e seu papel na unidade escolar.
Assumir responsabilidades, escolher e inventar novas
formas de relações coletivas faz parte do processo de Associação de pais e mestres
participação e trazem possibilidades de mudanças que A associação de pais e mestres, enquanto instância de
atendam a interesses mais coletivos. participação, constitui-se em mais um dos mecanismos de
A participação social começa no interior da escola, por participação da comunidade na escola, tornando-se uma
meio da criação de espaços nos quais professores, valiosa forma de aproximação entre os pais e a instituição,
funcionários, alunos, pais de alunos etc. possam discutir contribuindo para que a educação escolarizada ultrapasse os
criticamente o cotidiano escolar. Nesse sentido, a função da muros da escola e a democratização da gestão seja uma
escola é formar indivíduos críticos, criativos e participativos, conquista possível.
com condições de participar criticamente do mundo do
trabalho e de lutar pela democratização da educação. A escola, Grêmio estudantil
no desempenho dessa função, precisa ter clareza de que o Numa escola que tem como objetivo formar indivíduos
processo de formação para uma vida cidadã e, portanto, de participativos, críticos e criativos, a organização estudantil
gestão democrática passa pela construção de mecanismos de adquire importância fundamental.
participação da comunidade escolar, como: Conselho Escolar, O grêmio estudantil constitui-se em mecanismo de
Associação de Pais e Mestres, Grêmio Estudantil, Conselhos de participação dos estudantes nas discussões do cotidiano
Classes etc. escolar e em seus processos decisórios, constituindo-se num
Para que a tomada de decisão seja partilhada e coletiva, é laboratório de aprendizagem da função política da educação e
necessária a efetivação de vários mecanismos de participação, do jogo democrático. Possibilita, ainda, que os estudantes
tais como: o aprimoramento dos processos de escolha ao cargo aprendam a se organizarem politicamente e a lutar pelos seus
de dirigente escolar; a criação e a consolidação de órgãos direitos.
colegiados na escola (conselhos escolares e conselho de Articulado ao processo de constituição de mecanismos de
classe); o fortalecimento da participação estudantil por meio participação colegiada dentro da escola destaca-se também a
da criação e da consolidação de grêmios estudantis; a necessidade da participação e acompanhamento da aplicação
construção coletiva do Projeto Político-Pedagógico da escola; dos recursos financeiros, tanto na escola como nos sistemas de
a redefinição das tarefas e funções da associação de pais e ensino. A responsabilidade de acompanhar e fiscalizar a
mestres, na perspectiva de construção de novas maneiras de aplicação dos recursos para a educação é de toda a sociedade.
se partilhar o poder e a decisão nas instituições. Todos os envolvidos direta e indiretamente são chamados a se
Não existe apenas uma forma ou mecanismo de responsabilizar pelo bom uso das verbas destinadas à
participação. Entre os mecanismos de participação que podem educação. Nesse sentido, pais, alunos, professores, servidores
ser criados na escola, destacam-se: o conselho escolar, o administrativos, associação de bairros, ou seja, as
conselho de classe, a associação de pais e mestres e o grêmio comunidades escolar e local têm o direito de participar, por
escolar. meio dos diferentes conselhos criados para essa finalidade.
68
Em síntese, a gestão democrática do ensino pressupõe uma Pesquisas acerca dos elementos da organização escolar
maneira de atuar coletivamente, oferecendo aos membros das que interferem no sucesso escolar dos alunos mostram que o
comunidades local e escolar oportunidades para: modo como funciona uma escola faz diferença em relação aos
- Reconhecer que existe uma discrepância entre a situação resultados escolares dos alunos. Embora as escolas não sejam
real (o que é) e o que gostaríamos que fosse (o que pode vir a iguais, essas pesquisas indicam características organizacionais
ser). úteis para compreensão do funcionamento das escolas,
- Identificar possíveis razões para essa discrepância. considerados os contextos e as situações escolares específicos.
- Elaborar um plano de ação para minimizar ou solucionar Os aspectos a seguir aparecem em várias dessas pesquisas:
esses problemas.
85 LIBÂNEO, J.
C. Organização e gestão da escola: teoria e prática; 6ª edição, São
Paulo, Heccus Editora, 2013.
69
formas de coordenação e gestão do trabalho, ao sociais em que uma pessoa está envolvida influenciam o modo
estabelecimento de normas administrativas, ao provimento e de pensar dessa pessoa.
utilização dos recursos materiais e financeiros, aos
procedimentos administrativos, etc., que formam o conjunto A teoria da atividade, assim, possibilita compreender a
de condições e meios de garantir o funcionamento da escola. A influência das práticas socioculturais e institucionais nas
concepção técnico-racional reduz as formas de organização aprendizagens e o papel dos indivíduos em modificar essas
apenas a esses aspectos, prevalecendo uma visão burocrática práticas. De que práticas se trata? Elas referem-se tanto ao
de organização, decisões centralizadas, baixo grau de contexto mais amplo da sociedade (o sistema econômico, as
participação, separação entre o administrativo e o pedagógico. contradições sociais, por exemplo), quanto ao contexto mais
Abdalla indica os inconvenientes dessa concepção próximo, por exemplo, a comunidade em que está inserida a
funcionalista e produtiva: “A organização se fecha, os escola, as práticas de organização e gestão, o tipo de
professores se individualizam, as interações se enfraquecem, relacionamento entre as pessoas da escola, as atitudes dos
regras são impostas, potencializa-se o campo do poder com professores, as rotinas cotidianas, o clima organizacional, o
vistas a controlar as estruturas administrativas e material didático, o espaço físico, o edifício escolar, etc. Desse
pedagógicas”. modo, as práticas sociais e culturais que ocorrem nos vários
Na perspectiva da escola como organização social, para espaços da escola são, também, mediações culturais, que
além da visão “administrativa”, as organizações escolares são atuam na aprendizagem das pessoas (professores,
abordadas como unidades sociais formadas de pessoas que especialistas, funcionários, alunos).
atuam em torno de objetivos comuns, portanto, como lugares Tais práticas institucionais afetam significativamente o
de relações interpessoais. A escola é uma organização em significado e o sentido, ou seja, atuam, positivamente ou
sentido amplo, uma “unidade social que reúne pessoas que negativamente, na motivação e na aprendizagem dos alunos, já
interagem entre si, intencionalmente, e que opera através de que, de alguma forma, eles participam nessas práticas.
estruturas e processos próprios, a fim de alcançar os objetivos
da instituição”. O ensino é, portanto, uma atividade situada, ou seja, é uma
Destas duas perspectivas ampliou-se a compreensão prática social que se realiza num contexto de cultura, de
da escola como lugar de aprendizagem, de compartilhamento relações e de conhecimento, histórica e socialmente
de saberes e experiências, ou seja, um espaço educativo que construídos. Isso significa que não é apenas na sala de aula que
gera efeitos nas aprendizagens de professores e alunos. As os alunos aprendem, eles aprendem também com os contextos
formas de organização e de gestão adquirem dois novos socioculturais, com as interações sociais, com as formas de
sentidos: organização e de gestão, de modo que a escola pode ser vista
a) o ambiente escolar é considerado em sua dimensão como uma organização aprendente, uma comunidade
educativa, ou seja, as formas de organização e gestão, o estilo democrática de aprendizagem. As pessoas – alunos,
das relações interpessoais, as rotinas administrativas, a professores, funcionários - respondem, com suas ações, a um
organização do espaço físico, os processos de tomada de contexto institucional e pedagógico preparado para produzir
decisões, etc., são também práticas educativas; mudanças qualitativas na sua personalidade e na sua
b) as escolas são tidas como instituições aprendentes, aprendizagem.
portanto, espaço de formação e aprendizagem, em que as
pessoas mudam com as organizações e as organizações A noção de cultura organizacional é útil para compreender
mudam com as pessoas. melhor o papel educativo das práticas de organização e gestão.
Ela é constituída do conjunto dos significados, modos de
A organização escolar como lugar de práticas pensar e agir, valores, comportamentos, modos de funcionar
educativas e de aprendizagem que revelam a identidade, os traços característicos, de uma
A escola entendida como espaço de compartilhamento de instituição – escola, empresa, hospital, prisão, etc. - e das
idéias, práticas socioculturais e institucionais, valores, pessoas que nela trabalham. A cultura organizacional sintetiza
atitudes de modos de agir, tem recebido várias denominações, os sentidos que as pessoas dão às coisas e situações, gerando
com diferentes justificativas: comunidade de aprendizagem, um modo característico de pensar, de perceber coisas e de agir.
comunidade de práticas, comunidade aprendente, Isso explica, por exemplo, a aceitação ou resistência frente a
organizações aprendentes, aprendizagem colaborativa, entre inovações, certos modos de tratar os alunos, as formas de
outras. Adotaremos aqui a noção de ensino como “atividade enfrentamento de problemas de disciplina, a aceitação ou não
situada em contextos”. de mudanças na rotina de trabalho, etc. Segundo o sociólogo
Conforme a teoria histórico-cultural da atividade a francês Forquin “A escola é, também, um mundo social, que tem
atividade humana mediatiza a relação entre o ser humano e o suas características de vida próprias, seus ritmos e seus ritos, sua
meio físico e social. Esta relação é histórico-social, isto é, linguagem, seu imaginário, seus modos próprios de regulação e
depende das práticas sociais anteriores, de modo que a de transgressão, seu regime próprio de produção e de gestão de
atividade conjunta acumulada historicamente influencia a símbolos”.
atividade presente das pessoas. Ao mesmo tempo, o ser Essa afirmação mostra que, nas escolas, para além
humano, ao pôr-se em contato com o mundo dos objetos e daquelas diretrizes, normas, procedimentos operacionais,
fenômenos, atua sobre essa realidade modificando-a e rotinas administrativas, há aspectos de natureza sociocultural
transformando-se a si mesmo. Este entendimento decorre da que as diferenciam umas das outras, a maior parte deles pouco
lei genética do desenvolvimento cultural, segundo a qual perceptíveis ou explícitos, traço que em estudos sobre
“todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem currículo tem sido denominado de “currículo oculto”. Essas
duas vezes: primeiro, no nível social e, depois, no nível diferenças aparecem nas formas de interação entre as pessoas,
individual. Primeiro, entre pessoas (interpsicológica) e, nas crenças, valores, significados, modos de agir, configurando
depois, no interior da criança (intrapsicológica)”. Esse práticas que se projetam nas normas disciplinares, na relação
princípio acentua as origens sociais do desenvolvimento dos professores com os alunos na aula, na cantina, nos
mental individual, especialmente o peso atribuído às corredores, na preparação de alimentos e distribuição da
mediações culturais. Sendo assim, os contextos socioculturais merenda, nas formas de tratamento com os pais, na
e institucionais atuam na formação do pensamento conceitual metodologia de aula etc.
o que, em outras palavras, significa dizer que as práticas
70
As atividades compartilhadas entre direção, objetivos. Uma escola democrática tem por tarefa propiciar a
professores e alunos. todos os alunos, sem distinção, educação e ensino de
A cultura organizacional aparece sob duas formas: como qualidade, o que põe a exigência de justiça. Isto supõe
cultura instituída e como cultura instituinte. A cultura estrutura organizacional, regras explícitas e sua aplicação
instituída refere-se a normas legais, estrutura organizacional igual para todos sem privilégios ou discriminações, garantia de
definida pelos órgãos oficiais, rotinas, grade curricular, ambiente de estudo e aprendizagem, tratamento das pessoas
horários, normas disciplinares etc. A cultura instituinte é conforme critérios públicos e justificados. Por mais que tais
aquela que os membros da escola criam, recriam, nas suas exigências pareçam como excesso de “racionalidade”, elas se
relações e na vivência cotidiana, podendo modificar a cultura justificam pelo fato de as escolas serem unidades sociais em
instituída. Neste sentido, as escolas são espaços de que pessoas trabalham juntas em agrupamentos humanos
aprendizagem, comunidades democráticas de aprendizagem intencionalmente constituídos, visando objetivos de
onde se compartilham significados, criam-se outros modos de aprendizagem. As escolas recebem hoje alunos de diferentes
agir, mudam-se práticas, recria-se a cultura vigente, aprende- origens sociais, culturais, familiares, portadores vivos das
se com a participação real de seus membros. As ações contradições da sociedade. É preciso que o grupo de dirigentes
realizadas na escola nesta perspectiva implicam a adoção de e professores definam formas de gestão e de convivência que
formas de participação real das pessoas nas decisões em regulem a organização da vida escolar e as práticas
relação ao projeto pedagógico-curricular, ao desenvolvimento pedagógicas, precisamente para conter tendências de
do currículo, às formas de avaliação e acompanhamento da discriminação e desigualdade social e assegurar a todos o
aprendizagem escolar, às normas de funcionamento e usufruto da escolarização de qualidade.
convivência, etc.
c) A organização e a gestão implicam a gestão
Para uma revisão das práticas de organização e gestão participativa e a gestão da participação
das escolas A organização da escola requer atender a duas
Conclui-se que não é possível à escola atingir seus necessidades: a participação na gestão, enquanto requisito
objetivos de melhoria da aprendizagem escolar dos alunos democrático, e a gestão da participação, como requisito
sem formas de organização e gestão, tanto como provimento técnico. Por um lado, as escolas precisam cultivar os processos
de condições e meios para o funcionamento da escola, quanto democráticos e colaborativos de trabalho, em função da
como práticas socioculturais e institucionais com caráter convivência e da tomada de decisões. Por outro, precisam
formativo. Uma revisão das práticas de organização e gestão funcionar bem tecnicamente, a fim de poder atingir
precisa considerar cinco aspectos, que apresentamos a seguir: eficazmente seus objetivos, o que implica a gestão da
participação. A gestão participativa significa alcançar de forma
a) As práticas de organização e gestão devem estar colaborativa e democrática os objetivos da escola. A
voltadas à aprendizagem dos alunos. participação é o principal meio de tomar decisões, de
As práticas de organização e gestão, a participação dos mobilizar as pessoas para decidir sobre os objetivos, os
professores na gestão, o trabalho colaborativo, estão a serviço conteúdos, as formas de organização do trabalho e o clima de
da melhoria do ensino e da aprendizagem. Mencionou-se trabalho desejado para si próprias e para os outros. A
anteriormente que o que faz a diferença entre as escolas é o participação se viabiliza por interação comunicativa, diálogo,
grau em que conseguem melhorar a qualidade da discussão pública, busca de consensos e de superações de
aprendizagem escolar dos alunos. Desse modo, uma escola conflitos. Nesse sentido, a melhor forma de gestão é aquela que
bem organizada e gerida é aquela que cria as condições criar um sistema de práticas interativas e colaborativas para
organizacionais, operacionais e pedagógico-didáticas que troca de idéias e experiências para chegar a ideias e ações
permitam o bom desempenho dos professores em sala de aula, comuns.
de modo que todos os seus alunos sejam bem sucedidos em
suas aprendizagens. Já a gestão da participação implica repensar as práticas de
gestão, seja para assegurar relações interativas, democráticas
b) A qualidade do ensino depende do exercício eficaz da e solidárias, seja para buscar meios mais eficazes de
direção e da coordenação pedagógica funcionamento da escola. A gestão da participação refere-se à
Há boas razões para crer que a instituição escolar não pode coordenação, acompanhamento e avaliação do trabalho das
prescindir de ações básicas que garantem o seu pessoas, como garantia para assegurar o sistema de relações
funcionamento: formular planos, estabelecer objetivos, metas interativas e democráticas. Para isso, faz-se necessária uma
e ações; estabelecer normas e rotinas em relação a recursos bem definida estrutura organizacional, responsabilidades
físicos, materiais e financeiros; ter uma estrutura de claras e formas eficazes de tomada de decisões grupais. As
funcionamento e definição clara de responsabilidades dos exigências de gestão e liderança por parte de diretores e
integrantes da equipe escolar; exercer liderança; organizar e coordenadores se justificam cada vez mais em face de
controlar as atividades de apoio técnico-administrativo; problemas que incidem no cotidiano escolar: problemas
cuidar das questões da legislação e das diretrizes pedagógicas sociais e econômicos das famílias, problemas de disciplina
e curriculares; cobrar responsabilidades das pessoas; manifestos em agressão verbal, uso de armas, uso de drogas,
organizar horários, rotinas, procedimentos; estabelecer ameaças a professores, violência física e verbal. Os problemas
formas de relacionamento entre a escola e a comunidade, se acentuam com a inexperiência ou precária formação
especialmente com as famílias; efetivar ações de avaliação do profissional de muitos professores que levam a dificuldades no
currículo e dos professores; cuidar das condições do edifício manejo da sala de aula, no exercício da autoridade, no diálogo
escolar e de todo o espaço físico da escola; assegurar materiais com os alunos. Constatar esses problemas implica que não
didáticos e livros na biblioteca. pensemos apenas em mudanças curriculares ou
metodológicas, mas em formas de organização do trabalhado
Tais ações representam, sem dúvida, o primeiro conjunto escolar que articulem, eficazmente, práticas participativas e
de competências de diretores e coordenadores pedagógicos. colaborativas com uma sólida estrutura organizacional.
Falamos da escola como espaço de compartilhamento, lugar de
aprendizagem, comunidade democrática de aprendizagem,
gestão participativa, etc., mas as escolas precisam ser
organizadas e geridas como garantia de efetivação dos seus
71
d) Projeto pedagógico-curricular bem concebido e Na segunda concepção, a organização escolar se estabelece
eficazmente executado “basicamente como um sistema que agrega pessoas,
O projeto pedagógico-curricular é uma declaração de importando bastante a intencionalidade e as interações
intenções do grupo de profissionais da escola, é expressão da sociais, o contexto sócio-político etc., constituindo-se numa
coletividade escolar. Em sua elaboração, é sumamente construção social a ser construída pelos professores, alunos,
relevante levar-se em conta a cultura da escola ou a cultura pais e integrantes da comunidade próxima, caracterizada pelo
organizacional e, também, seu papel de instituidor de outra interesse público.
cultura organizacional. Para isso, uma recomendação inicial é A visão crítica da escola resulta em diferentes formas de
de que a equipe de dirigentes e professores tenha viabilização da...
conhecimento e sensibilidade em relação às necessidades (A) administração empresarial.
sociais e demandas da comunidade local e do próprio (B) administração escolar.
funcionamento da escola, de modo a ter clareza sobre as (C) gestão democrática.
mudanças a serem esperadas nos alunos em relação ao seu (D) gestão empresarial.
desenvolvimento e aprendizagem. Com base nos dados da (E) administração colegiada.
realidade, é preciso que o projeto pedagógico-curricular dê
respostas a esta pergunta: em que comportamentos 02. (IF-PB- Técnico em Assuntos Educacionais- IF-PB)
cognitivos, afetivos, físicos, morais, estéticos, etc., queremos Dentre os princípios e características da gestão escolar
intervir, de forma a produzir mudanças qualitativas no participativa, destaca-se a autonomia como o fundamento da
desenvolvimento e aprendizagem dos alunos? concepção democrático-participativa de gestão escolar. Com
Além disso, é necessário ter clareza sobre os objetivos da base nessa informação, a autonomia na concepção
escola que, em minha opinião, é o de garantir a todos os alunos democrático-participativa de gestão escolar está expressa
uma base cultural e científica comum e uma base comum de em:
formação moral e de práticas de cidadania, baseadas em (A) A faculdade de uma pessoa de autogovernar-se, decidir
critérios de solidariedade e justiça, na alteridade, na sobre o próprio destino, gerenciamento das ações e recursos
descoberta e respeito pelo outro, no aprender a viver junto. financeiros.
Isto significa: uma escolarização igual, para sujeitos diferentes, (B) A organização escolar depende exclusivamente de
por meio de um currículo comum a todos, na formulação de decisões do poder central.
Gimeno Sacristán. A partir de uma base comum de cultura (C) O êxito da gestão da escola está no controle emanado
geral para todos, o currículo para sujeitos diferentes significa pelo poder central.
acolher a diversidade e a experiência particular dos diferentes (D) A gestão da autonomia não implica
grupos de alunos, propiciando na escola e nas salas de aula, um corresponsabilidade dos membros da equipe escolar.
espaço de diálogo e comunicação. Um dos mais relevantes (E) A autonomia é um princípio que implica que um líder
objetivos democráticos no ensino será fazer da escola um lugar tome as decisões para que os demais membros possam
em que todos os alunos e alunas possam experimentar sua participar do processo de gestão.
própria forma de realização e sucesso. Para tudo isso, são
necessárias formas de execução, gestão e avaliação do projeto 03. (IF-MT- Auxiliar em Administração- UFMT)
pedagógico-curricular.
O novo gestor escolar
e) A atividade conjunta dos professores na elaboração e
avaliação das atividades de ensino Escrito por Roberta Braga
A modalidade mais rica e eficaz de formação docente Publicado em 03, Novembro de 2014.
continuada ocorre pela atividade conjunta dos professores na
discussão e elaboração das atividades orientadoras de ensino.
É assim porque a formação continuada passa a ser entendida
como um modo habitual de funcionamento do cotidiano da
escola, um modo de ser e de existir da escola. Para Moura, o
projeto pedagógico se concretiza mediante a realização de
atividades pedagógicas. Para isso, os professores realizam
ações compartilhadas que exigem troca de significados,
possibilitando ampliar o conhecimento da realidade. Desse
modo, “a coletividade de formação constitui-se ao desenvolver
a ação pedagógica. É essa constituição da coletividade que
possibilita o movimento de formação do professor”.
Questões
72
ao trabalho coletivo e às decisões tomadas em conjunto com
os envolvidos", observa Helena Machado de Paula 3. Organização do trabalho
Albuquerque, doutora em Educação e coordenadora do curso
de especialização em Gestão Educacional e Escolar da
pedagógico na escola pública:
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Para a 3.1 O processo de
especialista, o momento atual pelo qual o sistema de ensino planejamento: concepção,
passa é o de perceber as novas necessidades e migrar, pouco a
pouco, para esse tipo de gestão. “Nós ainda estamos
dimensões, níveis e
engatinhando para perceber a escola como ela está e atender importância; 3.1 O ano letivo e
às necessidades reais do processo educativo", considera [...]. o calendário escolar; 3.2 O
(Disponível em http://www.gestaoeducacional.com.br/.
Acesso em 13/07/2015.)
planejamento de ensino em
De acordo com o texto, qual é o modelo de gestão que seus elementos constitutivos:
possibilita a distribuição do poder e incentiva o trabalho objetivos e conteúdos de
coletivo e as decisões tomadas em conjunto com os
envolvidos?
ensino, métodos e técnicas;
(A) Gestão participativa multimídia educativa e
(B) Gestão autoritária avaliação da aprendizagem;
(C) Gestão por competência
(D) Gestão mecanicista
Planejamento escolar
educativa.
73
instituição. É um processo de organização e coordenação da planejamento a fim de que seja benfeito aquilo que se faz
ação dos professores. Ele articula a atividade escolar e o dentro dos limites previstos para aquela execução.
contexto social da escola. É o planejamento que define os fins
do trabalho pedagógico.” (MEC88) Mas esta não é a mais importante finalidade do
planejamento. Ele visa também a eficácia. Os dicionários não
Os conceitos apresentados têm por objetivo mostrar para fazem diferença suficiente entre eficácia e eficiência. O melhor
o professor a importância, a funcionalidade e principalmente é não se preocupar com palavras e verificar que o
a relação íntima existente entre essas tipologias. planejamento deve alcançar não só que se faça bem as coisas
que se fazem (chamaremos isso de eficiência), mas que se
Segundo Fusari89, “Apesar de os educadores em geral façam as coisas que realmente importa fazer, porque são
utilizarem, no cotidiano do trabalho, os termos “planejamento” socialmente desejáveis (chamaremos isso de eficácia).
e “plano” como sinônimos, estes não o são.”
A eficácia é atingida quando se escolhem, entre muitas
Outro aspecto importante, segundo Schmitz90 é que “as ações possíveis, aqueles que, executadas, levam à consecução
denominações variam muito. Basta que fique claro o que se de um fim previamente estabelecido e condizente com aquilo
entende por cada um desses planos e como se caracterizam.” em que se crê.
O que se faz necessário é estar consciente que:
Além destas finalidades do planejamento, Gandin introduz
“Qualquer atividade, para ter sucesso, necessita ser a discussão sobre uma outra, tão significativa quanto estas, e
planejada. O planejamento é uma espécie de garantia dos que dá ao planejamento um status obrigatório em todas as
resultados. E sendo a educação, especialmente a educação atividades humanas: é a compreensão do processo de
escolar, uma atividade sistemática, uma organização da planejamento como um processo educativo.
situação de aprendizagem, ela necessita evidentemente de
planejamento muito sério. Não se pode improvisar a É evidente que esta finalidade só é alcançada quando o
educação, seja ela qual for o seu nível.” processo de planejamento é concebido como uma prática que
sublime a participação, a democracia, a libertação. Então o
Conceito de Planejamento planejamento é uma tarefa vital, união entre vida e técnica
O Planejamento pode ser conceituado como um processo, para o bem-estar do homem e da sociedade.
considerando os seguintes aspectos: produção, pesquisa,
finanças, recursos humanos, propósitos, objetivos, estratégias, Elementos Constitutivos do Planejamento
políticas, programas, orçamentos, normas e procedimentos, Objetivos e Conteúdos de Ensino: Os objetivos
tempo, unidades organizacionais etc. Desenvolvido para o determinam de antemão os resultados esperados do processo
alcance de uma situação futura desejada, de um modo mais entre o professor e o aluno, determinam também a gama de
eficiente, eficaz e efetivo, com a melhor concentração de habilidades e hábitos a serem adquiridos. Já os conteúdos
esforços e recursos. formam a base da instrução.
A prática educacional baseia-se nos objetivos por meio de
O Planejamento também pressupõe a necessidade de um uma ação intencional e sistemática para oferecer
processo decisório que ocorrerá antes, durante e depois de sua aprendizagem. Desta forma os objetivos são fundamentais
elaboração e implementação na escola. Este processo deve para determinação de propósitos definidos e explícitos quanto
conter ao mesmo tempo, os componentes individuais e às qualidades humanas que precisam ser adquiridas. Os
organizacionais, bem como a ação nesses dois níveis deve ser objetivos têm pelo menos três referências fundamentais para
orientada de tal maneira que garanta certa confluência de a sua formulação.
interesses dos diversos fatores alocados no ambiente escolar. - Os valores e ideias ditos na legislação educacional.
- Os conteúdos básicos das ciências, produzidos na história
O processo de planejar envolve, portanto, um modo de da humanidade.
pensar; e um salutar modo de pensar envolve indagações; e - As necessidades e expectativas da maioria da sociedade.
indagações envolvem questionamentos sobre o que fazer,
como, quando, quanto, para quem, por que, por quem e onde. Métodos e Estratégias: O método por sua vez é a forma
É um processo de estabelecimento de um estado futuro com que estes objetivos e conteúdos serão ministrados na
desejado e um delineamento dos meios efetivos de torna-lo prática ao aluno. Cabe aos métodos dinamizar as condições e
realidade justifica que ele antecede à decisão e à ação. modos de realização do ensino. Refere-se aos meios utilizados
pelos docentes na articulação do processo de ensino, de acordo
Finalidade - Para que Planejar?91 com cada atividade e os resultados esperados.
A primeira coisa que nos vem à mente quando As estratégias visam à consecução de objetivos, portanto,
perguntamos sobre a finalidade do planejamento é a eficiência. há que ter clareza sobre aonde se pretende chegar naquele
Ela é a execução perfeita de uma tarefa que se realiza. O momento com o processo de ensino e de aprendizagem. Por
carrasco é eficiente quando o condenado morre segundo o isso, os objetivos que norteiam devem estar claros para os
previsto. A telefonista é eficiente quando atende a todos os sujeitos envolvidos – professores e alunos.
chamados e faz, a tempo, todas as ligações. O digitador, quando
escreve rapidamente (há expectativas fixadas) e não comete Multimídia Educativa: A multimídia educativa é uma
erros. estratégia de ensino e de aprendizagem que pode ser utilizada
por estudantes e professores. É imperativa a importância das
O planejamento e um plano ajudam a alcançar a eficiência, multimídias educativas com uso da informática no processo
isto é, elaboram-se planos, implanta-se um processo de educativo como uma ferramenta auxiliar na educação.
88 MEC – Ministério da Educação e Cultura. Trabalhando com a Educação de Jovens 90 SCHMITZ, Egídio. Fundamentos da Didática. 7ª Ed. São Leopoldo, RS: Editora
e Adultos – Avaliação e Planejamento – Caderno 4 – SECAD – Secretaria de Unisinos, 2000.
Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade – 2006. 91 GANDIN, Danilo. Planejamento. Como Prática Educativa. São Paulo: Edições
89 FUSARI, José Cerchi. O planejamento do trabalho pedagógico: algumas Loyola, 2013.
indagações e tentativas de respostas.
www.crmariocovas.sp.gov.br/pdf/ideias_08_p044-053_c.pdf.
74
Avaliação Educacional: É uma tarefa didática necessária programá-la. A revolução de 30 foi o desfecho das crises
e permanente no trabalho do professor, deve acompanhar políticas e econômicas que agitaram profundamente a década
todos os passos do processo de ensino e de aprendizagem. É de 20, compondo-se assim, um quadro histórico propício à
através dela que vão sendo comparados os resultados obtidos transformação da Educação no Brasil.
no decorrer do trabalho conjunto do professor e dos alunos,
conforme os objetivos propostos, a fim de verificar progressos, Em 1932, um grupo de educadores conseguiu captar o
dificuldades e orientar o trabalho para as correções anseio coletivo e lançou um manifesto ao povo e ao governo
necessárias. que ficou conhecido como “Manifesto dos Pioneiros da
A avaliação insere-se não só nas funções didáticas, mas Educação Nova”, que extravasava o entusiasmo pela Educação.
também na própria dinâmica e estrutura do Processo de O manifesto era ao mesmo tempo uma denúncia uma exigência
Ensino e de Aprendizagem. de uma política educacional consistente e, um plano científico
para executá-la, livrando a ação educativa do empirismo e da
Planejamento e Políticas de Educação no Brasil descontinuidade. O mesmo teve tanta repercussão e motivou
A formação da Educação Brasileira inicia-se com a uma campanha que repercutiu na Assembleia Constituinte de
Companhia de Jesus, em 1549, com o trabalho dos Jesuítas: 1934.
suas escolas de primeiras letras, colégios e seminários, até os
dias atuais. Nesse primeiro momento, a educação não foi um De acordo com a Constituição de 34, o conselho Nacional
problema que emergisse como um assunto Nacional, no de Educação elaborou e enviou, em maio de 37, um
entanto, tenha sido um dos aspectos das tensões constantes anteprojeto do Plano de Educação Nacional, mas com a
entre a Ordem dos Jesuítas e a Coroa Portuguesa, que mais chegada do estado Novo, o mesmo nem chegou a ser discutido.
tarde, levou à expulsão dos mesmos em 1759. A expulsão dos
jesuítas criou um vazio escolar. A insuficiência de recursos e Sendo assim, mesmo que a ideia de plano nacional de
escassez de mestres desarticulou o trabalho educativo no País, educação fosse um fruto do manifesto e das campanhas que se
com repercussões que se estenderam até o período imperial. seguiram, o Plano 37 era uma negação das teses defendidas
pelos educadores ligados àqueles movimentos. Totalmente
Com a vinda da Família Imperial, a educação brasileira centralizador, o mesmo pretendia ordenar em minúcias toda a
toma um novo impulso, principalmente com a criação dos educação nacional. Tudo estava regulamentado ao plano,
cursos superiores, no entanto a educação popular foi relegada desde o ensino pré-primário ao ensino superior; os currículos
em segundo plano. Com a reforma constitucional de 1834, as eram estabelecidos e até mesmo o número de provas e os
responsabilidades da educação popular foram critérios de avaliação.
descentralizadas, deixando-as às províncias e reservando à
Corte a competência sobre o ensino médio e superior. No entanto, os dois primeiros artigos dos 504 que
compuseram o Plano de 37, chamam atenção, no que se refere
Nesse período, a situação continuou a mesma: escassez de ao Planejamento Educacional a nível nacional, atualmente:
escolas e de professores na educação básica. Com a educação
média e superior, prevaleceram às aulas avulsas destinadas Art. 1°- O Plano Nacional de Educação, código da educação
apenas às classes mais abastadas. nacional, é o conjunto de princípios e normas adotados por
esta lei para servirem de base à organização e funcionamento
A Proclamação da República, também não alterou das instituições educativas, escolares e extraescolares,
significativamente a ordenação legal da Educação Brasileira, mantidas no território nacional pelos poderes públicos ou por
foi preciso esperar até a década de 20 para que, o debate particulares.
educacional ganhasse um espaço social mais amplo. Nesta Art. 2°- Este Plano só poderá ser revisto após vigência de
época, as questões educacionais deixaram de ser temas dez anos.
isolados para se tornarem um problema nacional. Várias
tentativas de reforma ocorreram em vários estados; iniciou-se Nesses artigos, há três pontos os quais convém destacar,
uma efetiva profissionalização do magistério e novos modelos pois repercutiram e persistiram em parte, em iniciativas e leis
pedagógicos começaram a ser discutidos e introduzidos na posteriores:
escola. - O Plano de Educação identifica-se com as diretrizes da
Educação Nacional;
Surgimento do Plano de Educação - O Plano deve ser fixado por Lei;
A primeira experiência de planejamento governamental no - O Plano só poderá ser revisto após uma vigência
Brasil foi executada no governo de Juscelino Kubitschek com prolongada.
seu Plano de Metas (1956/61). Antes, os chamados planos que
se sucederam desde 1940, foram diagnósticos que tentavam Segundo Kuenzer92 “o planejamento de educação também
racionalizar o orçamento. Neste processo de planejamento é estabelecido a partir das regras e relações da produção
convém distinguir três fases: capitalista, herdando, portanto, as formas, os fins, as
- a decisão de planejar; capacidades e os domínios do capitalismo monopolista do
- o plano em si; e Estado.”
- a implantação do plano.
Aqui no Brasil, Padilha93 explica que “Durante o regime
A primeira e a última fase são políticas e a segunda é um autoritário, eles foram utilizados com um sentido autocrático.
assunto estritamente técnico. Toda decisão política era centralizada e justificada
tecnicamente por tecnocratas à sombra do poder.” Kuenzer
No caso do Planejamento Educacional, essa distinção é complementa a citação acima explicando que “A ideologia do
interessante, pois foi preciso um longo período de maturação Planejamento então oferecida a todos, no entanto, escondia
para que se formulasse de forma explícita a necessidade essas determinações político-econômicas mais abrangentes e
nacional de uma política de educação e de um plano para decididas em restritos centros de poder.”
92 KUENZER, Acácia Zeneida, CALAZANS, M. Julieta C., GARCIA, Walter. 93 PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento dialógico: como construir o projeto
Planejamento e educação no Brasil. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2003. político-pedagógico da escola. 4ª Ed. São Paulo: Cortez, 2003.
75
No entanto, a LDB de 61, distanciou-se muito da clareza e
O regime autoritário fez com que muitos educadores da sensatez do anteprojeto original, e a lei que sucedeu e
criassem uma resistência com relação à elaboração de planos, substituiu em parte (Lei n° 5.692/71) agravou a situação.
uma vez que esses planos eram supervisionados ou Eliminaram substancialmente qualquer possibilidade de
elaborados por técnicos que delimitavam o que o professor instituição de políticas e planos de educação como
deveria ensinar, priorizando as necessidades do regime instrumentos efetivos de um desenvolvimento ideal da
político. “Num regime político de contenção, o planejamento Educação Brasileira, pois novamente foi consagrada a ideia de
passa a ser bandeira altamente eficaz para o controle e plano como distribuição de recursos.
ordenamento de todo o sistema educativo.”
Após a iniciativa pioneira de 1962 e suas revisões,
Apesar de se ter claro a importância do planejamento na sucedem-se, em trinta anos, cerca de dez planos. Em um
formação, Fusari94 explica que: estudo realizado nessa área até 1989, conclui-se que essa
sucessão de planos que são elaboradas, parcialmente
“Naquele momento, o Golpe Militar de 1964 já implantava executadas, revista e abandonada, refletem os males gerais da
a repressão, impedindo rapidamente que um trabalho mais administração pública brasileira. A educação, realmente não
crítico e reflexivo, no qual as relações entre educação e era prioritária para os governos. As coordenadas da ação
sociedade pudessem ser problematizadas, fosse vivenciada governamental no setor ficavam bloqueadas ou dificultadas
pelos educadores, criando, assim, um “terreno” propício para pela falta de uma integração ministerial.
o avanço daquela que foi denominada ‘tendência tecnicista’ da
educação escolar.” Em consequência disso e de outras razões, sobretudo
políticas, o panorama da experiência brasileira de
Mas não se pode pensar que o regime político era o único planejamento educacional é um quadro de descontinuidades
fator que influenciava no pensamento com relação à administrativas, que, fez dessa experiência um conjunto
elaboração dos planos de aulas; as teorias da administração fragmentado de incoerentes iniciativas governamentais que
também refletiam no ato de planejar do professor, uma vez nunca foram mais do que esquemas distributivos de recursos.
que essas teorias traziam conceitos que iriam auxiliar na
definição do tipo de organização educacional que seria Com esta visão podemos compreender o “porquê” do caos
adotado por uma determinada instituição. educacional em nosso país. Desde há muito a educação foi
relegada ao final das filas. O povo foi passando de governo em
No início da história da humanidade, o planejamento era governo sem perceber as perdas que lhe trariam o atraso
utilizado sem que as pessoas percebessem sua importância, educacional.
porém com a evolução da vida humana, principalmente no
setor industrial e comercial, houve a necessidade de adaptá-lo Níveis de Planejamento
para os diversos setores.
O setor de educação entrou no conjunto do Plano de metas Na esfera educacional o processo de planejamento ocorre
pressionado pela compreensão de que a falta de recursos em diversos níveis, segundo a magnitude da ação que se tem
humanos qualificados poderia ser um dos pontos de em vista realizar. O planejamento educacional é o mais amplo,
estrangulamento do desenvolvimento do país. geral e abrangente. Prevê a estruturação e o funcionamento da
totalidade do sistema educacional. Determina as diretrizes da
A primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional política nacional de educação.
(LDB) acabou surgindo com a Lei n° 4.024 de 1961, no entanto,
vale ressaltar a concepção do que deveria ser uma LDB. A seguir, temos o planejamento Escolar e depois o
Segundo o Relatório Geral da Comissão: Curricular, que está intimamente relacionado às prioridades
assentadas no planejamento educacional. Sua função é
Diretriz é uma linha de orientação, norma de conduta, traduzir, em termos mais próximos e concretos, as linhas-
"Base" é a superfície de apoio, fundamento. Aquela indica a mestras de ação delineadas no planejamento imediatamente
direção geral a seguir, não às minudências do caminho. superior, através de seus objetivos e metas. Constitui o
Significa também o alicerce do edifício, não o próprio edifício esquema normativo que serve de base para definir e
sobre o qual o alicerce está construído. A lei de Diretrizes e particularizar a linha de ação proposta pela escola. Permite a
Bases conterá somente os preceitos genéricos e fundamentais. inter-relação entre a escola e a comunidade.
76
1- Técnico Por utilizar metodologia
Logo após, temos o planejamento de ensino, que parte Enquanto de análise, previsão,
sempre de pontos referenciais estabelecidos no planejamento Processo programação e
curricular. Temos, em essência, neste tipo de planejamento, avaliação.
dimensões: 2- Político Por permitir a tomada
- filosófica, que explicita os objetivos da escola; de decisão.
- psicológica, que indica a fase de desenvolvimento do 3- Por coordenar as
aluno, suas possibilidades e interesses; Administrativo atividades
- social, que expressa as características do contexto sócio- administrativas.
econômico-cultural do aluno e suas exigências. Quanto aos 1- Curto prazo 1 a 2 anos
Prazos 2- Médio prazo 2 a 5 anos
Este detalhamento é feito tendo em vista os processos de 3- Longo prazo 5 a 15 anos
ensino e de aprendizagem. Assim, chegamos ao nível mais 1- Demanda Com base nas demandas
elementar e próximo da ação educativa. É através dele que, em individuais de educação.
relação ao aluno: Enquanto 2- Mão-de-obra Com base nas
- prevemos mudanças comportamentais e aprendizagem Método necessidades do
de elementos básicos; mercado, voltado para o
- propomos aprendizagens a partir de experiências desenvolvimento do
anteriores e de suas reais possibilidades; país.
- estimulamos a integração das diversas áreas de estudo.
3- Custo e Com base nos recursos
Benefício disponíveis visando a
Como vemos, o planejamento tem níveis distintos de maiores benefícios.
abrangência; no entanto, cada nível tem bem definido e
delimitado o seu universo. Sabemos que um nível particulariza
Fundamentos do Planejamento Educacional
- um ou vários - aspectos delineados no nível antecedente,
especificando com maior precisão as decisões tomadas em
relação a determinados eventos da ação educativa.
Concepções Características
A linha de relacionamento se evidencia, então, através de
escalões de complexidade decrescente, exigindo sempre um Clássica Divisão pormenorizada,
alto grau de coerência e subordinação na determinação dos hierarquizado verticalmente, com
objetivos almejados. ênfase na organização e
pragmático.
Vejamos cada um deles: Transitiva Planejamento seguindo
procedimentos de trabalho com
ênfase na liderança.
Planejamento Educacional
Planejamento educacional é aplicar à própria educação Mayoista Visão horizontal, com ênfase nas
àquilo que os verdadeiros educadores se esforçam por relações humanas, na dinâmica
inculcar em seus alunos: uma abordagem racional e científica interpessoal e grupal, na
dos problemas. Tal abordagem supõe a determinação dos delegação de autoridade e na
objetivos e dos recursos disponíveis, a análise das autonomia.
consequências que advirão das diversas atuações possíveis, a Neoclássica / por Pragmática, racionalidade no
escolha entre essas possibilidades, a determinação de metas objetivos processo decisório, participativo,
específicas a atingir em prazos bem definidos e, finalmente, o com ênfase nos resultados e
desenvolvimento dos meios mais eficazes para implantar a estratégia de cooperação.
política escolhida.
Tradição Características (do consenso /
O planejamento educacional significa bem mais que a Funcionalista positivista / evolucionista)
elaboração de um projeto contínuo que engloba uma série de
operações interdependentes. Burocrático Cumprimento de leis e normas.
Visa à eficácia institucional do
O Planejamento do Sistema de Educação é o de maior sistema. Enfatiza a dimensão
abrangência (enquanto um dos níveis de planejamento na institucional ou objetiva.
educação escolar), correspondendo ao planejamento que é Idiossincrático Enfatiza a eficiência individual de
feito em nível nacional, estadual ou municipal. Incorpora e todos os que participam do
reflete as grandes políticas educacionais. Enfrenta os sistema, portanto, dimensão
problemas de atendimento à demanda, alocação e subjetiva.
gerenciamento de recursos etc. Integradora Clima organizacional pragmático.
Visa o equilíbrio entre eficácia
Características do Planejamento Educacional institucional e eficiência
individual, com ênfase na
dimensão grupal ou holística.
Categorias Tipos Características
1- Global ou de Para todo o sistema Tradição Características (conflito /
Níveis conjunto Interacionista teorias críticas e libertárias)
2- Por setores Graus do Sistema
Escolar Estruturalista Ênfase nas condições estruturais
3- Regional Por divisões geográficas de natureza econômica do sistema.
4- Local Por escola Enfatiza a dimensão institucional
77
ou objetiva. Orientação - Avaliação periódica dos planos e adaptação constante
determinista. destes mesmos às novas necessidades e circunstâncias;
Interpretativa Ênfase na subjetividade e na - Flexibilidade que permita a adaptação do plano a
dimensão individual. O sistema é situações imprevistas ou imprevisíveis;
uma criação do ser humano. A - Trabalho de equipe que garanta uma soma de esforços
gestão é mediadora reflexiva entre eficazes e coordenados;
o indivíduo e o seu meio. - Formulação e apresentação do plano como iniciativa e
Dialógica Ênfase na dimensão grupal ou esforço nacionais, e não como esforço de determinadas
holística e nos princípios de pessoas, grupos e setores”.97
totalidade, contradição, práxis e
transformação do sistema Pressupostos Básicos do Planejamento Educacional
educacional. - O delineamento da filosofia da educação do país,
evidenciando o valor da pessoa e da escola na sociedade;
Enfoques Características - A aplicação da análise - sistemática e racional - ao
processo de desenvolvimento da educação, buscando torná-lo
Jurídico Práticas normativas e legalistas / mais eficiente e passível de responder com maior precisão às
sistema fechado. necessidades e objetivos da sociedade.
Tecnocrático Predomínio dos quadros técnicos
/ especialistas. Podemos, portanto, considerar que o planejamento
Comportamental Resgate da dimensão humana: educacional constitui a abordagem racional e científica dos
ênfase psicológica. problemas da educação, envolvendo o aprimoramento gradual
Desenvolvimentista Ênfase para atingir objetivos de conceitos e meios de análise, visando estudar a eficiência e
econômicos e sociais. a produtividade do sistema educacional, em seus múltiplos
aspectos.
Sociológico Ênfase nos valores culturais e
políticos, contextualizados. Visão
interdisciplinar. Planejamento Curricular
Planejamento curricular é o processo de tomada de
Fonte dos dois quadros: Padilha95
decisões sobre a dinâmica da ação escolar. É a previsão
sistemática e ordenada de toda a vida escolar do aluno. É o
Objetivos do Planejamento Educacional
instrumento que orienta a educação como um processo
São objetivos do planejamento educacional, segundo
dinâmico e integrado de todos os elementos que interagem
Joanna Coaracy96:
para consecução dos objetivos, tanto os dos alunos como os da
- “relacionar o desenvolvimento do sistema educacional
escola.
com o desenvolvimento econômico, social, político e cultural
O Planejamento curricular, enquanto um dos níveis dos
do país, em geral, e de cada comunidade, em particular;
planejamentos da educação escolar é a proposta geral das
- “estabelecer as condições necessárias para o
experiências de aprendizagem que serão oferecidas pela
aperfeiçoamento dos fatores que influem diretamente sobre a
escola, incorporada nos diversos componentes curriculares.
eficiência do sistema educacional (estrutura, administração,
financiamento, pessoal, conteúdo, procedimentos e
Enquanto um dos níveis do planejamento na educação
instrumentos);
escolar, o Planejamento curricular é a proposta geral das
- alcançar maior coerência interna na determinação dos
experiências de aprendizagem que serão oferecidas pela
objetivos e nos meios mais adequados para atingi-los;
escola, incorporada nos diversos componentes curriculares
- conciliar e aperfeiçoar a eficiência interna e externa do
desde as séries iniciais até as finais.
sistema”.
A proposta curricular pode ter como referência os
É condição primordial do processo de planejamento
seguintes elementos:
integral da educação que, em nenhum caso, interesses
- Fundamentos da disciplina;
pessoais ou de grupos possam desviá-lo de seus fins essenciais
- Área de estudo;
que vão contribuir para a dignificação do homem e para o
- Desafios Pedagógicos;
desenvolvimento cultural, social e econômico do país.
- Encaminhamento Metodológico;
- Propostas de Conteúdos;
Requisitos do Planejamento Educacional
- Processos de Avaliação.
- Aplicação do método científico na investigação da
realidade educativa, cultural, social e econômica do país;
Objetivos do Planejamento Curricular
- Apreciação objetiva das necessidades, para satisfazê-las a
- Ajudar aos membros da comunidade escolar a definir
curto, médio e longo prazo;
seus objetivos;
- Apreciação realista das possibilidades de recursos
- Obter maior efetividade no ensino;
humanos e financeiros, a fim de assegurar a eficácia das
- Coordenar esforços para aperfeiçoar o processo de
soluções propostas;
ensino e de aprendizagem;
- Previsão dos fatores mais significativos que intervêm no
- Propiciar o estabelecimento de um clima estimulante
desenvolvimento do planejamento;
para o desenvolvimento das tarefas educativas.
- Continuidade que assegure a ação sistemática para
alcançar os fins propostos;
Requisitos do Planejamento Curricular
- Coordenação dos serviços da educação, e destes com os
O planejamento curricular deve refletir os melhores meios
demais serviços do Estado, em todos os níveis da
de cultivar o desenvolvimento da ação escolar, envolvendo,
administração pública;
sempre, todos os elementos participantes do processo.
95 PADILHA, Paulo Roberto. Planejamento dialógico: como construir o projeto 97 UNESCO, Seminário Interamericano sobre planejamento integral na educação.
político-pedagógico da escola. 4ª Ed. São Paulo: Cortez, 2003. Washington. 1958.
96COARACY, Joanna. O planejamento como processo. Revista Educação, Ano I, no.
4, Brasília, 1972.
78
Seus elaboradores devem estar alertas paras novas a prevenir as vacilações do professor, oferecendo maior
descobertas e para os novos meios postos ao alcance das segurança na consecução dos objetivos previstos, bem como
escolas. Estes devem ser minuciosamente analisados para na verificação da qualidade do ensino que está sendo
verificar sua real validade naquele âmbito escolar. Posto isso, orientado pelo mestre e pela escola.
fica evidente a necessidade dos organizadores explorarem,
aceitarem, adaptarem, enriquecerem ou mesmo rejeitarem Planejamento Escolar
tais inovações. O Planejamento escolar é uma tarefa docente que inclui
O planejamento curricular é de complexa elaboração. tanto a previsão das atividades didáticas em termos da sua
Requer um contínuo estudo e uma constante investigação da organização e coordenação em face dos objetivos propostos,
realidade imediata e dos avanços técnicos, principalmente na quanto a sua revisão e adequação no decorrer do processo de
área educacional. Constitui, por suas características, base vital ensino. É um processo de racionalização, organização e
do trabalho. A dinamização e integração da escola como uma coordenação da ação docente, articulando a atividade escolar
célula viva da sociedade, que palmilha determinados caminhos e a problemática do contexto social.
conforme a linha filosófica adotada, é o pressuposto inerente a
sua estruturação. Planejamento global da escola é o nível do planejamento
O planejamento curricular constitui, portanto, uma tarefa que corresponde às decisões sobre a organização,
contínua a nível de escola, em função das crescentes exigências funcionamento e proposta pedagógica da escola. É o que o que
de nosso tempo e dos processos que tentam acelerar a mais requer a participação conjunta da comunidade.
aprendizagem. Será sempre um desafio a todos aqueles
envolvidos no processo educacional, para busca dos meios O Planejamento da escola, enquanto outro nível do
mais adequados à obtenção de maiores resultados. planejamento na educação escolar é o que chamamos de
“Projeto Educativo” - sendo o plano global da instituição.
Planejamento de Ensino Compõem-se de Marco Referencial, Diagnóstico e
Planejamento de ensino é o processo que envolve a programação. Envolve as dimensões pedagógicas,
atuação concreta dos educadores no cotidiano do seu trabalho administrativas e comunitárias da escola.
pedagógico, envolvendo todas as suas ações e situações o
tempo todo. Envolve permanentemente as interações entre os O Planejamento anual da escola consiste em elaborar a
educadores e entre os próprios educandos. estratégia de ação para o prazo de um ano - conforme a
realidade específica de cada escola - tomando decisões sobre o
Objetivos do Planejamento de Ensino que, para que, como e com o que se vai fazer o trabalho na
- Racionalizar as atividades educativas; escola o período proposto levando em conta as linhas tiradas
- Assegurar um ensino efetivo e econômico; no plano global.
- Conduzir os alunos ao alcance dos objetivos;
- Verificar a marcha do processo educativo. Planejamento Participativo
O Planejamento Participativo se constitui num processo
Requisitos do Planejamento do Ensino político onde há um propósito contínuo e coletivo onde se tem
Por maior complexidade que envolva a organização da a oportunidade de discutir a construção do futuro da
escola, é indispensável ter sempre bem presente que a comunidade, na qual participe o maior número possível de
interação professor-aluno é o suporte estrutural, cuja membros de todas as categorias que a constituem. Mais do que
dinâmica concretiza ao fenômeno educativo. Portanto, o um significado técnico, o planejamento participativo é um
planejamento de ensino deve ser alicerçado neste pressuposto processo político vinculado à decisão da maioria que será em
básico. benefício da maioria.
O professor, ao planejar o trabalho, deve estar
familiarizado com o que pode pôr em prática, de maneira que Genericamente o planejamento participativo constitui-se
possa selecionar o que é melhor, adaptando tudo isso às em uma estratégia de trabalho que se caracteriza pela
necessidades e interesses de seus alunos. Na maioria das integração de todos os setores da atividade humana social,
situações, o professor dependerá de seus próprios recursos dentro de um processo global para solucionar problemas
para elaborar seus planos de trabalho. Por isso, deverá estar comuns.
bem informado dos requisitos técnicos para que possa
planejar, independentemente, sem dificuldades. Planejamento de Aulas
Ainda temos a considerar que as condições de trabalho O Planejamento de aula é a tomada de decisões referentes
diferem de escola para escola, tendo sempre que adaptar seus ao trabalho específico da sala de aula:
projetos às circunstâncias e exigências do meio. Considerando - Temas
que o ensino é o guia das situações de aprendizagem e que - Conteúdos
ajuda os estudantes a alcançarem os resultados desejados, a - Metodologia
ação de planejá-lo é predominantemente importante para - Recursos didáticos
incrementar a eficiência da ação a ser desencadeada no âmbito - Avaliação.
escolar.
O professor, durante o período (ano ou semestre) letivo, Antes, porém de se planejar a aula propriamente dita deve
pode organizar três tipos de planos de ensino. Por ordem de ser executado um planejamento de curso para o ano todo. E
abrangência: este deve ser subdividido em semestre para que possa ser
- Plano de Curso - delinear, globalmente, toda a ação a ser visualizado com mais clareza e objetividade.
empreendida;
- Plano de Unidade - disciplinar partes da ação pretendida Dentro destes Planos anuais podem ser inseridas as
no plano global; unidades temáticas, temas transversais que ocorrerão com o
- Plano de Aula - especificar as realizações diárias para a desenvolvimento do Plano bimestral ou trimestral. Estes são
concretização dos planos anteriores. os marcos para que o professor e toda a equipe da escola não
Pelo significativo apoio que o planejamento empresta à se percam dentro de conteúdos extensos e, deixem de
atividade do professor e alunos, é considerado etapa ministrar em cada momento a essência, o significativo para
obrigatória de todo o trabalho docente. O planejamento tende
79
que o aluno possa prosseguir seu conhecimento e transformá- força que ele realmente pode assumir como contribuinte de
lo em aprendizagem. uma transformação social ampla em proveito do homem todo
e de todos os homens.
O centro do processo educativo não deve ser o conteúdo
preestabelecido como se tem feito nas escolas ainda hoje. A partir daí, a aproximação entre educação libertadora e
Qualquer professor estaria de acordo em dizer que o centro do planejamento educacional sublinha as mesmas ideias básicas,
processo não é o conteúdo, mas em sua prática, a grande de grupo, de participação, de transformação da realidade.
maioria faz dele todo o processo. Muitas vezes, isso acontece Tanto que, a partir desta dupla base de Medellín, e pensando
até contra a sua vontade. É que há uma cultura dentro da no que lhe é mais característico, a metodologia, pode-se definir
escola, junto com os pais dos alunos e em todo senso comum a educação libertadora assim: um grupo (sujeitos em
social, de que se vai para a Escola para memorizar alguma interação) na dinâmica de ação-reflexão, buscando a verdade
informação, normalmente até consideradas inúteis até pelas e tendendo ao crescimento pessoal e à transformação social.
mesmas pessoas que as exigem.
Projetos Educativos
O centro do processo educativo também não pode ser o É o primeiro grande instrumento de planejamento da ação
aluno. Este desastre é tão conservador como centrar o educativa da escola, devendo por isso, servir
trabalho no conteúdo. E que quando centramos o processo permanentemente de ponto de referência e orientação na
educativo somente no aluno convertemos todo o processo em atuação de todos os elementos da Comunidade Educativa em
um egoísmo e em um individualismo onde uns dominam os que a escola se insere, em prol da formação de pessoas e
outros. cidadãos cada vez mais cultos, autônomos, responsáveis,
solidários e democraticamente comprometidos na construção
Planejamento e Educação Libertadora98 de um destino comum e de uma sociedade melhor.
No planejamento, é fundamental a ideia de transformação
da realidade. Isto quer dizer que uma instituição (um grupo) Um Projeto Educativo é, segundo a definição de Costa99, um
se transforma a si mesma tendo em vista influir na “documento de caráter pedagógico que, elaborado com a
transformação da realidade global. participação da comunidade educativa, estabelece a
identidade da própria escola através da adequação do quadro
Quer dizer, também, que fez sentido falar em legal em vigor à sua situação concreta, apresenta o modelo
planejamento, acima e além da administração, como uma geral de organização e os objetivos pretendidos pela
tarefa política, no sentido de participar na organização na instituição e, enquanto instrumento de gestão, é ponto de
mudança das estruturas sociais existentes. Quer dizer, referência orientador na coerência da ação educativa”.
finalmente, que planejar não é preencher quadrinhos para dar
status de organização séria a um setor qualquer da atividade Isto é, um Projeto Educativo é um documento de
humana. orientação pedagógica que, não podendo contrariar a
legislação vigente, explicita os princípios, os valores, as metas
Isso nos traz à educação libertadora como proposta as estratégias através das quais a escola propõe realizar a sua
educacional apta a inspirar um processo de planejamento. função educativa.
Porque a educação libertadora é uma proposta de mudança.
Essa educação libertadora Gandin fala que tem sua base na II Barbier100 distingue dois tipos de projeto – o projeto de
Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano (Medellín, situação (“representações relativas ao estado final do objeto,
Colômbia, 1968). da identidade, da situação que se procura transformar ou
modificar”) e o projeto do processo (“representações relativas
Referindo-se a educação: ao processo que permite chegar a este estado final”).
- “a que converte o educando em sujeito do seu próprio
desenvolvimento”; O projeto é, por um lado, uma “antecipação” relativa a
- “o meio-chave para libertar os povos de toda a escravidão um estado, uma “representação antecipadora do estado
e para fazê-los ascender de condições de vida menos humanas final de uma realidade”, uma previsão ou prospectiva, um
a condições mais humanas”. objetivo ou fim a atingir, uma pequena utopia.
Há nisto uma dimensão pessoal e uma proposta social Seu conteúdo não é um acontecimento ou objeto
global bem claras, no texto apresentadas de forma não pertencente ao ambiente atual ou passado, mas um fato
separada, mas como um posicionamento apenas. possível, uma imagem ou representação de uma possibilidade,
uma ideia a se transformar em ato, um futuro a se “fazer”, uma
Sem entrar na discussão se o termo “meio-chave” é possibilidade a se transformar em realidade. Sua relação é com
exagerado e aceitando que a educação, mesmo a escolar, tem um “tempo a vir”, “um futuro de que constitui uma
uma dimensão política realizável, pode-se ver que esta dupla antecipação, uma visão prévia” (Barbier).
proposta leva em conta os dois grandes problemas da América
Latina de então, que perduram ainda hoje: a organização Por outro lado, a função do projeto não se reduz a simples
injusta da sociedade e a falta quase total do remédio para isso, representação do futuro. Barbier atribui-lhe ainda um duplo
a participação. efeito – o operatório ou pragmático e o mobilizador da
atividade dos atores implicados.
Ao propor que o educando seja sujeito de seu
desenvolvimento, está propondo a existência do grupo, da No entendimento de Boutinet101, o projeto implica um
participação e, como consequência, a conscientização que gera comprometimento com o futuro. A construção de um projeto
a transformação. Basicamente está dando ao pedagógico a já implica na vontade de fazê-lo acontecer. Daí, seu valor
98 GANDIN, Danilo. Planejamento. Como Prática Educativa. São Paulo: Edições 100 BARBIER, J.-M. (1993). Elaboração de projectos de acção e planificação. Porto:
Loyola, 2013. Porto Editora.
99 COSTA, Adelino Jorge: "Construção de projetos educativos nas escolas: traços de 101 BOUTINET, J. P. (1986). Le concept de projet e ses niveaux. Éducation
um percurso debilmente articulado." - Revista Portuguesa de Educação, Volume Permanente, nº 86.
17, nº 2.
80
pragmático. O projeto não age, pois, dizer não equivale interna à escola (projeto ritual) e a postura utópica ou
automaticamente a fazer, mas “dizer prepara o fazer”. intencional da comunidade escolar (projeto intencional).
O projeto expressa a representação da realização da ação, Dimensões do projeto educativo, citadas por Carvalho e
ou seja, a imagem do resultado da ação. “No caso de uma ação Diogo:
coletiva[...], escreve Barbier, é o projeto que fornece a
representação comum que permite a realização coordenada O projeto deve servir a incerteza, ter em conta o
das operações de execução”. Na sua função mobilizadora, o indeterminado, ser capaz de infletir de direção como resultado
projeto apresenta, no plano afetivo, efeitos dinamizadores da de uma avaliação permanente, incorporar o conflito, mas,
atividade dos atores implicados. sobretudo, devolver a cada indivíduo o seu espaço de
criatividade e ação de modo a que ele sinta reconhecida a sua
Nossas imagens ou representações constituem um atividade, compreenda as suas ações e as possa inscrever num
elemento dinamizador da mudança e, portanto, um fator de todo significativo.
concretização do projeto.
Neste sentido, o projeto educativo deve ser coletivo, mas
Para Vidal, Cárave e Florencio102, o projeto educativo é: favorecendo a interação; autônomo mas não independente.
- Um meio de adequação das intenções educativas da Uma tal concepção exige do projeto educativo:
sociedade às características concretas de uma escola; - explicitação de valores comuns;
- Elemento orientador do conjunto de atividades - coerência de atividades;
educativas de uma escola; - busca coletiva de recursos e meios para melhorar o
- Instrumento integrador das atividades educativas de uma ensino;
escola; - definição de ação;
- Garantia de coerência e de continuidade nas diferentes - definição de um sentido para uma ação comum;
atuações dos membros de uma comunidade escolar; - gestão participativa;
- Critério para avaliar e homologar os processos; - avaliação permanente, participada e interativa;
- Documento dinâmico para definir as estruturas e - implicação do conjunto dos atores;
estratégias organizacionais da escola; - apropriação de saberes e instrumentos de ação por parte
- Ponto de referência para a solução dos conflitos de dos implicados.
convivência.
Sobre o que não deve ser e o que deve ser o projeto
O projeto educativo traduz o engajamento da instituição educativo de escola, Vidal, Cárave e Florencio elaboraram um
escolar, suas prioridades, seus princípios. Ele define o sentido quadro-síntese que ajuda a clarificar seu entendimento
de suas ações e fixa as orientações e os meios para colocá-las adequado.
em prática. É formulado por um documento escrito que Não deve ser Deve ser
estabelece a identidade da escola (diz o que ela é), apresenta Uma enumeração Uma exposição clara, concisa
seus propósitos gerais (diz o que ela quer) e descreve seu detalhada dos elementos e breve das intenções
modelo geral de organização (diz como ela se organiza). que compõem um centro: educativas, estruturas,
planos, descrições, regulamentos e organização
Concebido como um projeto de longo prazo, ele visa professores, etc. curricular de uma
favorecer a continuidade e a coerência da ação da escola. comunidade escolar.
Embora não seja um documento inalterável, não deverá estar Um manual de psicologia, Uma adequação daqueles
sujeito a profundas e constantes alterações anuais. De modo pedagogia, sociologia, de princípios e estruturas
geral, “a sua duração dependerá fundamentalmente da organização escolar, etc. educativas que se
permanência em cada instituição das pessoas que o consideram adequados para
elaboraram e da estabilidade das suas convicções” (Costa103). uma comunidade.
Um documento destinado Um documento orientador e
Para Vidal, Cárave e Florencio e para Carvalho e Diogo104, o ao exercício burocrático guia de todas as atividades
projeto educativo de escola é um documento de planificação da educação. educativas.
da ação educativa, de amplitude integral, de duração de longo Um produto fechado, Um projeto dinâmico e
prazo e de natureza geral e estratégica. Assim, é mais amplo e acabado e inalterável. modificável em função da
abrangente do que o projeto pedagógico e o plano de Unidade prática educativa.
Didática que são meios em relação ao projeto educativo e têm Um “empenho” pessoal de Uma criação coletiva do
como objeto converter as finalidades deste em ações, pois são algum membro do corpo conjunto de membros da
documentos de planificação operatória. docente ou da Associação comunidade educativa do
de Pais de Alunos. centro.
O projeto educativo distingue-se também de outras Uma complicação a mais Um facilitador do trabalho
planificações escolares, como o Plano Trienal escolar, o Plano para o trabalho docente. docente.
anual de Escola, o Projeto curricular de turma e o Regimento Uma fórmula Um conjunto articulado de
interno da Escola, que estão destinados a concretizá-lo paradigmática que resolve princípios, orientações e
relativamente a aspectos mais operacionais e, portanto, têm todos os problemas do sistemas que servem de
um caráter tático, e instrumental. centro. Um regulamento marco às atividades
de funcionamento. educativas.
O projeto educativo é elaborado por toda a comunidade Um “panfleto” que diz Um projeto equilibrado,
escolar. O projeto educativo da escola é um conjunto de opções coisas muito “atrevidas” produto das intenções de
ideológicas, políticas, antropológicas, axiológicas e sobre a educação. toda a comunidade
pedagógicas resultantes da tensão entre o estabelecido ou educativa.
imposto pelo Estado (projeto vertical), a prática implícita
102 VIDAL, J. G., CÁRAVE, G. e FLORENCIO, M. A. (1992). Madrid: Editorial EOS. 104 CARVALHO, A. E DIOGO, F. (1994). Projecto educativo. Porto: Edições
103 COSTA,J. A. (1992). Gestão escolar: Participação, autonomia, projecto educativo Afrontamento.
da escola. Lisboa: Texto Editora.
81
Um documento que só Um projeto resultante da requisito a continuidade da ação sistemática para alcançar os
expressa o que se quer tensão entre o estabelecido fins propostos.
que se conheça. (imposto), a prática implícita ( ) Certo ( ) Errado
(ritual) e o intencional.
02. (SEDF - Professor de Educação Básica - CESPE/2017)
Em suma, concebendo-se como uma adaptação do “projeto Com relação a planejamento pedagógico,
educacional” do país (leis e diretrizes curriculares) ao nível transdisciplinaridade, avaliação e projeto político-pedagógico,
específico local, como uma programação geral da escola e julgue o item que se segue.
como um instrumento de autonomia didático-pedagógica e
organizativa da escola, o projeto educativo da escola se Os elementos constituintes, os objetivos e os conteúdos de
caracteriza por quatro categorias metodológicas (Baldacci105): um planejamento devem, obrigatoriamente, estar interligados,
- a intencionalidade; mas as estratégias, não, pois estas são flexíveis.
- a contextualização; ( ) Certo ( ) Errado
- a metodicidade; e
- a flexibilidade. 03. (SEDF - Professor de Educação Básica - CESPE/2017)
Com relação a planejamento pedagógico,
Pela intencionalidade, o projeto educativo estabelece transdisciplinaridade, avaliação e projeto político-pedagógico,
direção e metas precisas e explícitas, evitando a ação educativa julgue o item que se segue.
casual e extemporânea.
Os únicos níveis de organização da prática educativa que
A contextualização representa a adaptação do projeto influenciam no planejamento docente são o planejamento do
educacional do país à realidade sociocultural concreta de uma professor e o planejamento escolar, que devem ser articulados.
escola. A intencionalidade passa a ser “historicizada”, ou seja, ( ) Certo ( ) Errado
contextualizada num ambiente de referência específico, o que
permite a passagem de um projeto abstrato para um projeto 04. (IFB - Professor Pedagogia - IFB/2017) Em relação
concreto. aos aspectos do planejamento, assinale a opção que contenha
a CORRETA sequência hierárquica do mais amplo ao mais
A metodicidade valoriza o princípio de sistematicidade e restrito, em relação ao planejamento:
organicidade no processo didático, mesmo reconhecendo as (A) planejamento escolar; planejamento educacional;
diferenças de estilo de aprender e ensinar de alunos e planejamento de ensino; planejamento curricular;
professores, respectivamente. (B) planejamento curricular; planejamento educacional;
planejamento escolar; planejamento de ensino;
Finalmente, a flexibilidade assegura que o projeto (C) planejamento de ensino; planejamento curricular;
educativo seja tratado como uma mera hipótese de trabalho e planejamento escolar; planejamento educacional;
por isso está sujeito a retificações e revisões ao longo de sua (D) planejamento de ensino; planejamento educacional;
implementação. planejamento curricular planejamento escolar;
(E) planejamento educacional; planejamento escolar;
PPP – Projeto Político Pedagógico planejamento curricular; planejamento de ensino.
O PPP nasce da necessidade de organização do trabalho
pedagógico para os alunos, a escola é o lugar de concepção, 05. (SEDF - Professor de Educação Básica -
realização e avaliação dessa ação. Será um elo entre a escola e Quadrix/2017) Quanto ao planejamento e à organização do
a comunidade escolar, bem como com o sistema de ensino que trabalho pedagógico, julgue o item subsecutivo.
a compõe. Essa construção faz emergir a necessidade de
responsabilização de diversos atores na prática social. No processo de planejamento e organização do trabalho
pedagógico, as ações estão circunstanciadas no âmbito dos
É projeto porque significa lançar para diante. “Todo vários elementos que compõem o universo escolar, devendo
projeto supõe rupturas com o presente e promessas para o ser dada importância máxima àquelas circunscritas à prática
futuro” (Gadotti). pedagógica do professor e à sua formação.
( ) Certo ( ) Errado
É político, pois “a dimensão política se cumpre na medida 06. (Pref. Rio de Janeiro/RJ - Professor de Ensino
em que ela se realiza enquanto prática especificamente Fundamental - Pref./2016) José Carlos Libâneo, em seu livro
pedagógica" (Saviani). Didática, declara:
(...) A ação de planejar, portanto, não se reduz ao simples
É pedagógico porque traz a possibilidade de efetivação da preenchimento de formulários para controle administrativo;
intencionalidade da escola, que é a formação do cidadão é, antes, a atividade consciente de previsão das ações docentes
participativo, responsável, compromissado, crítico e criativo. (...)
A partir de ações educativas. (Ilma Veiga) LIBÂNEO, José Carlos. Didática. São Paulo: Cortez, 1990.
Pág.222
Questões Nesse trecho, o autor destaca uma das características do
planejamento pedagógico, que é:
01. (ANAC – Analista Administrativo - CESPE) No tocante (A) a flexibilidade
a conceitos e dimensões de planejamento, objetivos de ensino (B) a contextualidade
e avaliação no processo educativo, julgue o item subsecutivo. (C) a intencionalidade
(D) o rigor administrativo
O planejamento educacional tem como pressuposto a
análise da eficiência do sistema educacional e tem como
82
07. (Pref. Marcação/PB - Professor de Ciências - ( ) Expressa a proposta de trabalho do professor,
FACET/2016) Plano tem a conotação de produto do constituindo a previsão do desenvolvimento do conteúdo.
planejamento. Ele é na verdade um guia com a função de Corresponde ao nível de maior detalhamento do processo de
orientar a prática, é a formalização do processo de planejar, planejamento didático.
com esta informação responda a proposição abaixo. ( ) Sistematiza a ação do professor, pois expressa a
I. Planejamento educacional, planejamento escolar são previsão de conhecimentos e conteúdos que serão
tipos de planejamento essenciais à educação. ministrados, a definição dos objetivos e a seleção de
II. Os tipos de planejamento essenciais à educação são procedimentos e técnicas de ensino.
quatro. Assinale a alternativa que contém a ordem CORRETA de
III. O PPP Projeto Político-Pedagógico não faz parte do associação, de cima para baixo
planejamento, a sua construção deve envolver e articular (A) 3, 4, 1, 2, 6, 5
todos os que participam da realidade escolar: corpo docente, (B) 2, 4, 1, 3, 6, 5
discente e comunidade. (C) 3, 4, 2, 1, 6, 5
IV. Plano é a “apresentação sistematizada e justificada das (D) 2, 4, 1, 5, 6, 3
decisões tomadas relativas à ação a realizar”. Plano tem, a (E) 3, 1, 4, 2, 5, 6
conotação de produto do planejamento.
Marque a proposição que contém as alternativas corretas. 10. (IF/SC - Professor de Administração – IF/SC) A
(A) I, II, IV respeito dos elementos pedagógicos da capacitação, julgue o
(B) I, III, IV item subsecutivo.
(C) II, IV, III Em razão de sua importância para o bom andamento do
(D) I, II, III ensino, o planejamento deve ser pensado e executado pelos
(E) Todas estão corretas professores a partir de reflexões conjuntas com os alunos e a
comunidade escolar.
08. (Pref. Nova Friburgo/RJ - Professor de Ciências - ( ) Certo ( ) Errado
Exatus) Assinale (V) para as alternativas verdadeiras e (F)
para as falsas: Respostas
( ) O planejamento escolar não assegura a unidade e a
coerência do trabalho docente. 01. Certo.
( ) O planejamento escolar não inter-relaciona ao plano de O planejamento educacional tem como pressupostos
aula. básicos:
( ) O planejamento escolar é um processo contínuo e - o delineamento da filosofia da Educação do País,
dinâmico. evidenciando o valor da pessoa e da escola na sociedade;
( ) O planejamento escolar deve ser dialógico e flexível. - a aplicação da análise - sistemática e racional - ao
Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA processo de desenvolvimento da educação, buscando torná-lo
de cima para baixo: mais eficiente e passível de responder com maior precisão às
(A) V, V, F, V. necessidades e objetivos da sociedade; e
(B) F, F, V, V. - a análise da eficiência do sistema educacional.
(C) V, F, V, F.
(D) F, V, V, F. 02. Errado.
Os elementos constituintes, os objetivos, as estratégias e os
09. (IF/SC - Professor de Administração – IF/SC) Leia o conteúdos de um planejamento devem, obrigatoriamente,
texto. estar interligados, mas devem ser flexíveis, pois o
“O planejamento, em relação aos diversos níveis, deve ser planejamento não é algo estático, parado, e sim evolutivo em
o instrumento direcional de todo o processo educacional, pois constante desenvolvimento.
ele tem condições de estabelecer e determinar as grandes
urgências, de indicar as prioridades básicas e de ordenar e 03. Errado.
determinar todos os recursos e meios necessários para a Os planos e programas oficiais também devem ser levados
consecução de metas da educação." (Menegolla e Sant'Anna, em consideração, pois são diretrizes gerais, documentos de
2001, p.31) referência, que servem de alicerce para a elaboração dos
Considerando as características dos diferentes níveis de planos didáticos específicos.
planejamento, associe as colunas.
(1) Planejamento Educacional 04. E
(2) Planejamento da Escola
(3) Planejamento curricular
(4) Plano de curso
(5) Plano de disciplina
(6) Plano de aula
( ) É de fundamental importância para a escola e para o
aluno, pois determina os objetivos, relaciona as disciplinas, os
conteúdos, as atividades e experiências que possibilitarão o
alcance dos objetivos de aprendizagem.
( ) Define a organização de um conjunto de disciplinas que
serão ministradas e desenvolvidas em uma escola.
05. Errado.
( ) Torna-se necessário, tendo em vista as finalidades da
educação, constituindo o instrumento básico para que todo o É condição primordial do processo de planejamento
processo educativo se concretize. integral da educação que, em nenhum caso, interesses
( ) Constitui uma atividade que envolve o processo de pessoais ou de grupos possam desviá-lo de seus fins essenciais
reflexão, de decisões sobre a organização, o funcionamento e a que vão contribuir para a dignificação do homem e para o
proposta pedagógica da instituição. desenvolvimento cultural, social e econômico do país.
83
06. C projeto político-pedagógico (o PPP, ou simplesmente Projeto
“atividade consciente de previsão das ações docentes” Pedagógico).
(intencionalidade)
Pela intencionalidade, o projeto educativo estabelece No sentido etimológico, o termo projeto vem
direção e metas precisas e explícitas, evitando a ação educativa do latim projectu, particípio passado do verbo projicere, que
casual e extemporânea. A contextualização representa a significa lançar para diante. Plano, intento, desígnio. Empresa,
adaptação do projeto educacional do país à realidade empreendimento. Redação provisória de lei. Plano geral de
sociocultural concreta de uma escola. A intencionalidade passa edificação.
a ser “historicizada”, ou seja, contextualizada num ambiente de
referência específico, o que permite a passagem de um projeto Segundo Veiga106, ao construirmos os projetos de nossas
abstrato para um projeto concreto. escolas, planejamos o que temos intenção de fazer, de realizar.
Lançamo-nos para diante, com base no que temos, buscando o
07. A possível. É antever um futuro diferente do presente.
Alternativa errada: O PPP Projeto Político-Pedagógico
não faz parte do planejamento, a sua construção deve envolver Nas palavras de Gadotti107:
e articular todos os que participam da realidade escolar: corpo Todo projeto supõe rupturas com o presente e promessas
docente, discente e comunidade. para o futuro. Projetar significa tentar quebrar um estado
confortável para arriscar-se, atravessar um período de
08. B instabilidade e buscar uma nova estabilidade em função da
Alternativas falsas: promessa que cada projeto contém de estado melhor do que o
O planejamento escolar não assegura a unidade e a presente. Um projeto educativo pode ser tomado com a
coerência do trabalho docente. promessa frente a determinadas rupturas. As promessas tornam
O planejamento escolar não inter-relaciona ao plano de visíveis os campos de ação possível, comprometendo seus atores
aula. e autores.
09. A
Planejamento Educacional - também denominado Nessa perspectiva, o Projeto Político-Pedagógico vai além
“Planejamento do Sistema de Educação”, é o de maior de um simples agrupamento de planos de ensino e de
abrangência. atividades diversas. O projeto não é algo que é construído e em
Planejamento Escolar ou Planejamento da Escola - seguida arquivado ou encaminhado às autoridades
atividade que envolve o processo de reflexão, de tomada de educacionais como prova do cumprimento de tarefas
decisões sobre a organização, o funcionamento e a proposta burocráticas. Ele é construído e vivenciado em todos os
pedagógica da instituição (escola). momentos, por todos os envolvidos com o processo educativo
Planejamento Curricular - é o “[...] processo de tomada de da escola.
decisões sobre a dinâmica da ação escolar. É previsão
sistemática e ordenada de toda a vida escolar do aluno”. Nesse O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação
momento a preocupação é com a aprendizagem através dos intencional, com um sentido explícito, com um compromisso
diversos componentes curriculares. definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da
Planejamento de Ensino - é o processo de decisão sobre a escola é, também, um projeto político por estar intimamente
atuação concreta dos professores no cotidiano de seu trabalho articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses
pedagógico, envolvendo as ações e situações em constante reais e coletivos da população majoritária. É político no
interações entre professor e alunos e entre os próprios alunos. sentido de compromisso com a formação do cidadão para um
tipo de sociedade.
10. Certo.
O processo de planejamento nada mais é do que um “A dimensão política se cumpre na medida em que ela se
conjunto de princípios teóricos, procedimentos metodológicos realiza enquanto prática especificamente pedagógica”.
e técnicas de grupo que podem ser aplicados a qualquer tipo
de organização social que demanda um objetivo, que procura Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da
uma mudança situacional futura. efetivação da intencionalidade da escola, que é a formação do
Deve ser elaborado e executado em equipe. Os objetivos e cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e
as atividades podem ser alterados à medida que se criativo. Pedagógico, no sentido de definir as ações educativas
desencadeiem, pois a realidade pode oferecer surpresas não e as características necessárias às escolas de cumprirem seus
previstas, portanto, é necessário que a Unidade Escolar tenha propósitos e sua intencionalidade.
um planejamento claro e flexível.
Político e pedagógico têm assim uma significação
indissociável. Neste sentido é que se deve considerar o projeto
3.3 A proposta pedagógica político-pedagógico como um processo permanente de
da escola: concepção, reflexão e discussão dos problemas da escola, na busca de
alternativas viáveis a efetivação de sua intencionalidade, que
princípios, eixos norteadores, “não é descritiva ou constatativa, mas é constitutiva”.
construção, acompanhamento
e avaliação. 3.4 Os planos de Por outro lado, propicia a vivência democrática necessária
para a participação de todos os membros da comunidade
ensino; escolar e o exercício da cidadania. Pode parecer complicado,
Projeto Político-Pedagógico mas trata-se de uma relação recíproca entre a dimensão
Desde a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da política e a dimensão pedagógica da escola.
Educação Nacional (LDB), em 1996, toda escola precisa ter um
106 VEIGA,
Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: 107 GADOTTI,Moacir. "Pressupostos do projeto pedagógico". In: MEC, Anais da
uma construção possível. 14ª edição Papirus, 2002. Conferência Nacional de Educação para Todos. Brasília, 1994.
84
O Projeto Político-Pedagógico, ao se constituir em Em outras palavras, as escolas necessitam receber
processo democrático de decisões, preocupa-se em instaurar assistência técnica e financeira decidida em conjunto com as
uma forma de organização do trabalho pedagógico que instâncias superiores do sistema de ensino.
supere os conflitos, buscando eliminar as relações
competitivas, corporativas e autoritárias, rompendo com a Isso pode exigir, também, mudanças na própria lógica de
rotina do mando impessoal e racionalizado da burocracia organização das instâncias superiores, implicando uma
que permeia as relações no interior da escola, diminuindo mudança substancial na sua prática. Para que a construção do
os efeitos fragmentários da divisão do trabalho que reforça projeto político-pedagógico seja possível não é necessário
as diferenças e hierarquiza os poderes de decisão. convencer os professores, a equipe escolar e os funcionários a
trabalhar mais, ou mobilizá-los de forma espontânea, mas
Desse modo, o projeto político-pedagógico tem a ver com a propiciar situações que lhes permitam aprender a pensar e a
organização do trabalho pedagógico em dois níveis: como realizar o fazer pedagógico de forma coerente.
organização da escola num todo e como organização da
sala de aula, incluindo sua relação com o contexto social A escola não tem mais possibilidade de ser dirigida de cima
imediato, procurando preservar a visão de totalidade. para baixo e na ótica do poder centralizador que dita as
normas e exerce o controle técnico burocrático. A luta da
Nesta caminhada será importante ressaltar que o projeto escola é para a descentralização em busca de sua autonomia e
político-pedagógico busca a organização do trabalho qualidade.
pedagógico da escola na sua globalidade.
O projeto político-pedagógico não visa simplesmente a um
A principal possibilidade de construção do projeto rearranjo formal da escola, mas a uma qualidade em todo o
político-pedagógico passa pela relativa autonomia da escola, processo vivido. Vale acrescentar, ainda, que a organização do
de sua capacidade de delinear sua própria identidade. Isto trabalho pedagógico da escola tem a ver com a organização da
significa resgatar a escola como espaço público, lugar de sociedade. A escola nessa perspectiva é vista como uma
debate, do diálogo, fundado na reflexão coletiva. instituição social, inserida na sociedade capitalista, que reflete
no seu interior as determinações e contradições dessa
Portanto, é preciso entender que o projeto político- sociedade.
pedagógico da escola dará indicações necessárias à
organização do trabalho pedagógico, que inclui o trabalho do Está hoje inserido num cenário marcado pela diversidade.
professor na dinâmica interna da sala de aula. Cada escola é resultado de um processo de desenvolvimento
de suas próprias contradições. Não existem duas escolas
Buscar uma nova organização para a escola constitui uma iguais. Diante disso, desaparece aquela arrogante pretensão de
ousadia para os educadores, pais, alunos e funcionários. E para saber de antemão quais serão os resultados do projeto. A
enfrentarmos essa ousadia, necessitamos de um referencial arrogância do dono da verdade dá lugar à criatividade e ao
que fundamente a construção do projeto político-pedagógico. diálogo. A pluralidade de projetos pedagógicos faz parte da
história da educação da nossa época. Por isso, não deve existir
A questão é, pois, saber a qual referencial temos que um padrão único que oriente a escolha do projeto das escolas.
recorrer para a compreensão de nossa prática pedagógica.
Nesse sentido, temos que nos alicerçar nos pressupostos de Não se entende, portanto, uma escola sem autonomia para
uma teoria pedagógica crítica viável, que parta da prática estabelecer o seu projeto e autonomia para executá-lo e avaliá-
social e esteja compromissada em solucionar os problemas da lo. A autonomia e a gestão democrática da escola fazem parte
educação e do ensino de nossa escola. da própria natureza do ato pedagógico. A gestão democrática
da escola é, portanto uma exigência de seu projeto político-
Uma teoria que subsidie o projeto político-pedagógico e, pedagógico.
por sua vez, a prática pedagógica que ali se processa deve estar
ligada aos interesses da maioria da população. Faz-se Ela exige, em primeiro lugar, uma mudança de
necessário, também, o domínio das bases teórico- mentalidade de todos os membros da comunidade escolar.
metodológicas indispensáveis à concretização das concepções Mudança que implica deixar de lado o velho preconceito de
assumidas coletivamente. Mais do que isso, afirma Freitas108 que a escola pública é apenas um aparelho burocrático do
que: Estado e não uma conquista da comunidade.
As novas formas têm que ser pensadas em um contexto de A gestão democrática da escola implica que a
luta, de correlações de força – às vezes favoráveis, às vezes comunidade, os usuários da escola, sejam os seus dirigentes e
desfavoráveis. Terão que nascer no próprio “chão da escola”, gestores e não apenas os seus fiscalizadores ou meros
com apoio dos professores e pesquisadores. Não poderão ser receptores dos serviços educacionais. Os pais, alunos,
inventadas por alguém, longe da escola e da luta da escola. professores e funcionários assumem sua parte na
responsabilidade pelo projeto da escola.
Se a escola nutre-se da vivência cotidiana de cada um de
seus membros, coparticipantes de sua organização do trabalho Há pelo menos duas razões, que justificam a implantação
pedagógico à administração central, seja o Ministério da de um processo de gestão democrática na escola pública:
Educação, a Secretaria de Educação Estadual ou Municipal, não
compete a eles definir um modelo pronto e acabado, mas sim 1º: a escola deve formar para a cidadania e, para isso, ela
estimular inovações e coordenar as ações pedagógicas deve dar o exemplo.
planejadas e organizadas pela própria escola. 2º: porque a gestão democrática pode melhorar o que é
específico da escola, isto é, o seu ensino.
108 FREITASLuiz Carlos. "Organização do trabalho pedagógico". Palestra proferida agosto de 1991.
no 11 Seminário Internacional de Alfabetização e Educação. Novo Hamburgo,
85
A participação na gestão da escola proporcionará um Além disso, explicita uma compreensão de escola para
melhor conhecimento do funcionamento da escola e de todos além da sala de aula e dos muros da escola, no sentido desta
os seus atores. Proporcionará um contato permanente entre estar inserida em um contexto social e que procure atender às
professores e alunos, o que leva ao conhecimento mútuo e, em exigências não só dos alunos, mas de toda a sociedade.
consequência, aproximará também as necessidades dos Ainda coloca, nos artigos 13 e 14, como tarefa de
alunos dos conteúdos ensinados pelos professores. professores, supervisores e orientadores a responsabilidade
de participar da elaboração desse projeto.
O aluno aprende apenas quando ele se torna sujeito da sua
própria aprendizagem. E para ele tornar-se sujeito da sua A construção do projeto político-pedagógico numa
aprendizagem ele precisa participar das decisões que dizem perspectiva emancipatória se constitui num processo de
respeito ao projeto da escola que faz parte também do projeto vivência democrática à medida que todos os segmentos que
de sua vida. compõem a comunidade escolar e acadêmica dele devam
participar, comprometidos com a integridade do seu
A autonomia e a participação - pressupostos do projeto planejamento, de modo que todos assumem o compromisso
político-pedagógico da escola, não se limitam à mera com a totalidade do trabalho educativo.
declaração de princípios consignados em alguns documentos.
Sua presença precisa ser sentida no conselho de escola ou Segundo Veiga109, a abordagem do projeto político-
colegiado, mas também na escolha do livro didático, no pedagógico, como organização do trabalho da escola como um
planejamento do ensino, na organização de eventos culturais, todo, está fundada nos princípios que deverão nortear a escola
de atividades cívicas, esportivas, recreativas. Não basta apenas democrática, pública e gratuita:
assistir reuniões.
Igualdade: de condições para acesso e permanência na
A gestão democrática deve estar impregnada por certa escola. Saviani110 alerta-nos para o fato de que há uma
atmosfera que se respira na escola, na circulação das desigualdade no ponto de partida, mas a igualdade no ponto
informações, na divisão do trabalho, no estabelecimento do de chegada deve ser garantida pela mediação da escola. O
calendário escolar, na distribuição das aulas, no processo de autor destaca: Portanto, só é possível considerar o processo
elaboração ou de criação de novos cursos ou de novas educativo em seu conjunto sob a condição de se distinguir a
disciplinas, na formação de grupos de trabalho, na capacitação democracia com a possibilidade no ponto de partida e
dos recursos humanos, etc. democracia como realidade no ponto de chegada. Igualdade de
oportunidades requer, portanto, mais que a expansão
Então não se esqueça: quantitativa de ofertas; requer ampliação do atendimento com
simultânea manutenção de qualidade.
1- O projeto político pedagógico da escola pode ser
entendido como um processo de mudança e definição de um Qualidade: que não pode ser privilégio de minorias
rumo, que estabelece princípios, diretrizes e propostas de ação econômicas e sociais. O desafio que se coloca ao projeto
para melhor organizar, sistematizar e significar as atividades político-pedagógico da escola é o de propiciar uma qualidade
desenvolvidas pela escola como um todo. Sua dimensão para todos. A qualidade que se busca implica duas dimensões
política pedagógica pressupõe uma construção participativa indissociáveis: a formal ou técnica e a política. Uma não está
que envolve ativamente os diversos segmentos escolares e a subordinada a outra; cada uma delas tem perspectivas
própria comunidade onde a escola se insere. próprias.
3- Para que o projeto seja impregnado por uma Nesta perspectiva, o autor chama atenção para o fato de
intencionalidade significadora, é necessário que as partes que a qualidade centra-se no desafio de manejar os
envolvidas na prática educativa de uma escola estejam instrumentos adequados para fazer a história humana. A
profundamente integradas na constituição e que haja vivencia qualidade formal está relacionada com a qualidade política e
dessa intencionalidade. A comunidade escolar então tem que esta depende da competência dos meios.
estar envolvida na construção e explicitação dessa mesma
intencionalidade. A escola de qualidade tem obrigação de evitar de todas as
maneiras possíveis a repetência e a evasão. Tem que garantir
Processos e Princípios de Construção a meta qualitativa do desempenho satisfatório de todos.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB 9394/96, no Qualidade para todos, portanto, vai além da meta quantitativa
artigo 12, define claramente a incumbência da escola de de acesso global, no sentido de que as crianças, em idade
elaborar o seu projeto pedagógico. escolar, entrem na escola. É preciso garantir a permanência
109 VEIGA,
Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: 110 SAVIANI, Dermeval. "Para além da curvatura da 'vara". In: Revista Ande no 3.
uma construção possível. 12ª edição Papirus, 2002. São Paulo, 1982.
111 DEMO Pedro. Educação e qualidade. Campinas, Papirus,1994.
86
dos que nela ingressarem. Em síntese, qualidade “implica escola, devemos pensá-la na relação entre administradores,
consciência crítica e capacidade de ação, saber e mudar”. professores, funcionários e alunos que aí assumem sua parte
de responsabilidade na construção do projeto político-
O projeto político-pedagógico, ao mesmo tempo em que pedagógico e na relação destes com o contexto social mais
exige dos educadores, funcionários, alunos e pais a definição amplo.
clara do tipo de escola que intentam, requer a definição de fins.
Assim, todos deverão definir o tipo de sociedade e o tipo de A liberdade deve ser considerada, também, como
cidadão que pretendem formar. As ações especificas para a liberdade para aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a arte e
obtenção desses fins são meios. Essa distinção clara entre fins o saber direcionados para uma intencionalidade definida
e meios é essencial para a construção do projeto político- coletivamente.
pedagógico.
Valorização do magistério: é um princípio central na
Gestão Democrática: é um princípio consagrado pela discussão do projeto político-pedagógico. A qualidade do
Constituição vigente e abrange as dimensões pedagógica, ensino ministrado na escola e seu sucesso na tarefa de formar
administrativa e financeira. Ela exige uma ruptura histórica cidadãos capazes de participar da vida socioeconômica,
na prática administrativa da escola, com o enfrentamento das política e cultural do país relacionam-se estreitamente a
questões de exclusão e reprovação e da não permanência do formação (inicial e continuada), condições de trabalho
aluno na sala de aula, o que vem provocando a marginalização (recursos didáticos, recursos físicos e materiais, dedicação
das classes populares. Esse compromisso implica a construção integral à escola, redução do número de alunos na sala de aula
coletiva de um projeto político-pedagógico ligado à educação etc.), remuneração, elementos esses indispensáveis à
das classes populares. profissionalização do magistério.
112 MARQUES, Mário Osório. "Projeto pedagógico: A marca da escola". In: Revista 113 RIOS,Terezinha. "Significado e pressupostos do projeto pedagógico". In: Série
Educação e Contexto. Projeto pedagógico e identidade da escola no 18. ljuí, Unijuí, Ideias. São Paulo, FDE,1982.
abr./jun. 1990.
87
Estratégia de Planejamento vivida, ou seja, discutir como de fato se dá a relação entre
Definição de marco/referência: é necessário definir o escola e a comunidade, como ela trabalha com os
conjunto de ideias, de opções e teorias que orientará a prática conhecimentos que os alunos trazem da sua prática social,
da escola. Para tanto, é preciso analisar em que contexto a como os conteúdos são escolhidos, como os professores
escola está inserida. Para assim definir e explicitar com que planejam o seu trabalho pedagógico da escola, como e quando
tipo de sociedade a escola se compromete, que tipo de pessoas se avalia o trabalho na sala de aula e o trabalho pedagógico da
ela buscará formar e qual a sua intencionalidade político, escola, quem participa desta avaliação, como a escola tem
social, cultural e educativa. Esta assunção permite clarear os definido a sua opção teórica no trabalho pedagógico, como se
critérios de ação para planejar como se deseja a escola no que dão as relações e a participação de alunos, professores,
se refere à dimensão pedagógica, comunitária e coordenadores, diretores, pais, funcionários e comunidade na
administrativa. organização do trabalho pedagógico escolar.
Estes dados precisam ser sistematizados e discutidos por
É um momento que requer estudos, reflexões teóricas, todos da equipe que elabora o projeto. Com a finalização do
análise do contexto, trabalho individual, em grupo, debates, diagnóstico da escola e de sua relação com a comunidade
elaboração escrita. Devem ser criadas estratégias para que pode-se definir um plano de ação e as grandes estratégias que
todos os segmentos envolvidos com a construção do projeto devem ser perseguidas para atingir a intencionalidade
político-pedagógico possam refletir, se posicionar acerca do assumida no marco referencial.
contexto em que a escola se insere. É necessário partir da
realidade local, para compreendê-la numa dimensão mais Propostas de Ação: este é o momento em que se procura
ampla. Então se deve analisar e discutir como vivem as pessoas pensar estratégias, linhas de ação, normas, ações concretas
da comunidade, de onde vieram quais grupos étnicos a permanentes e temporárias para responder às necessidades
compõem, qual o trabalho que realizam como são as relações apontadas a partir do diagnóstico tendo por referência sempre
deste trabalho, como é a vida no período da infância, à intencionalidade assumida. Assim, cada problema
juventude, idade adulta e a melhor idade (idoso) nesta constatado, cada necessidade apontada é preciso definir uma
comunidade, quais são as formas de organização desta proposta de ação.
comunidade, etc. Esta proposta de ação pode ser pensada a partir de grandes
metas. Para cada meta pode-se definir ações permanentes,
A partir da reflexão sobre estes elementos pode-se discutir ações de curto, médio e longo prazo, normas e estratégias para
a relação que eles têm no tempo histórico, no sentido de atingir a meta definida. Além disso, é preciso justificar cada
perceber mudanças ocorridas na forma de vida das pessoas e meta, traçar seus objetivos, sua metodologia, os recursos
da comunidade. Analisar o que tem de comum e tentar fazer necessários, os responsáveis pela execução, o cronograma e
relação com outros espaços, com a sociedade como um todo. como será feita a avaliação.
Discutir como se vê a sociedade brasileira, quais são os valores Com base nesses três momentos que devem estar
que estão presentes, como estes são manifestados, se as dialeticamente articulados elabora-se o projeto político-
pessoas estão satisfeitas com esta sociedade e o seu modo de pedagógico, o qual precisa também de forma coletiva ser
organização. executado, avaliado e (re)planejado.
88
que favoreçam o diálogo, a comunicação horizontal entre os contestação e a resistência à ideologia veiculada por
diferentes segmentos envolvidos com o processo educativo, a intermédio dos currículos escolares.
descentralização do poder.
Ensino, aprendizagem e avaliação: orientações didáticas
Histórico da instituição: sua criação, ato normativo, e metodológicas quanto à educação infantil, ensino
origem de seu nome, etc. fundamental, ensino médio, educação especial, educação de
jovens e adultos, educação profissional. Mecanismos de
Abrangência da ação educativa referente: acompanhamento pedagógico, de recuperação paralela, de
- Nível de ensino e suas etapas; avaliação: indicadores de aprendizagem, diretrizes,
- Modalidades de educação que irá atender; procedimentos e instrumentos de recuperação e avaliação.
- Aos profissionais, considerando: à área, o trabalho da
equipe pedagógica e administrativa; Programa de formação continuada: concepção,
- À comunidade externa: entorno social. objetivos, eixos, política e estratégia.
Objetivos: gerais, observando os objetivos definidos pela Formas de relacionamento com a comunidade:
instituição. concepção de educação comunitária, princípios, objetivos e
estratégias.
Princípios legais e norteadores da ação: a instituição
deve observar ainda os planos e Políticas (federal, estadual ou Organização do tempo e do espaço escolar: cronograma
municipal) de Educação. A partir da identificação dos de atividades.
princípios registrados nas legislações em vigor, deve explicitar - diárias, semanais, bimestrais, semestrais, anuais.
o sentido que os mesmos adquirem em seu contexto de ação. - estudo, planejamento, enriquecimento curricular, ação
comunitária.
Currículo: identificar o paradigma curricular em - normas de utilização de espaços comuns da instituição.
concordância com sua opção do método, da teoria que orienta
sua prática. Implica, necessariamente, a interação entre O tempo é um dos elementos constitutivos da organização
sujeitos que têm um mesmo objetivo e a opção por um do trabalho pedagógico. O calendário escolar ordena o tempo:
referencial teórico que o sustente. Na organização curricular é determina o início e o fim do ano, prevendo os dias letivos, as
preciso considerar alguns pontos básicos: férias, os períodos escolares em que o ano se divide, os
feriados cívicos e religiosos, as datas reservadas à avaliação, os
1º - é o de que o currículo não é um instrumento neutro. O períodos para reuniões técnicas, cursos etc.
currículo passa ideologia, e a escola precisa identificar e O horário escolar, que fixa o número de horas por semana
desvelar os componentes ideológicos do conhecimento escolar e que varia em razão das disciplinas constantes na grade
que a classe dominante utiliza para a manutenção de curricular, estipula também o número de aulas por professor.
privilégios. A determinação do conhecimento escolar, Tal como afirma Enguita114.
portanto, implica uma análise interpretativa e crítica, tanto da (...) As matérias tornam-se equivalentes porque ocupam o
cultura dominante, quanto da cultura popular. O currículo mesmo número de horas por semana e, são vistas como tendo
expressa uma cultura. menor prestígio se ocupam menos tempo que as demais.
2º - é o de que o currículo não pode ser separado do
contexto social, uma vez que ele é historicamente situado e A organização do tempo do conhecimento escolar é
culturalmente determinado. marcada pela segmentação do dia letivo, e o currículo é,
3º - diz respeito ao tipo de organização curricular que a consequentemente, organizado em períodos fixos de tempo
escola deve adotar. Em geral, nossas instituições têm sido para disciplinas supostamente separadas. O controle
orientadas para a organização hierárquica e fragmentada do hierárquico utiliza o tempo que muitas vezes é desperdiçado e
conhecimento escolar. controlado pela administração e pelo professor.
4º - refere-se a questão do controle social, já que o
currículo formal (conteúdos curriculares, metodologia e Em resumo, quanto mais compartimentado for o tempo,
recursos de ensino, avaliação e relação pedagógica) implica mais hierarquizadas e ritualizadas serão as relações sociais,
controle. Por outro lado, o controle social é instrumentalizado reduzindo, também, as possibilidades de se institucionalizar o
pelo currículo oculto, entendido este como as “mensagens currículo integração que conduz a um ensino em extensão.
transmitidas pela sala de aula e pelo ambiente escolar”.
Para alterar a qualidade do trabalho pedagógico torna-se
Assim, toda a gama de visões do mundo, as normas e os necessário que a escola reformule seu tempo, estabelecendo
valores dominantes são passados aos alunos no ambiente períodos de estudo e reflexão de equipes de educadores
escolar, no material didático e mais especificamente por fortalecendo a escola como instância de educação continuada.
intermédio dos livros didáticos, na relação pedagógica, nas
rotinas escolares. Os resultados do currículo oculto É preciso tempo para que os educadores aprofundem seu
“estimulam a conformidade a ideais nacionais e convenções conhecimento sobre os alunos e sobre o que estão
sociais ao mesmo tempo que mantêm desigualdades aprendendo. É preciso tempo para acompanhar e avaliar o
socioeconômicas e culturais”. projeto político-pedagógico em ação. É preciso tempo para os
estudantes se organizarem e criarem seus espaços para além
Orientar a organização curricular para fins emancipatórios da sala de aula.
implica, inicialmente desvelar as visões simplificadas de
sociedade, concebida como um todo homogêneo, e de ser Acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico:
humano como alguém que tende a aceitar papéis necessários parâmetros, mecanismos de avaliação interna e externa,
à sua adaptação ao contexto em que vive. Controle social na responsáveis, cronograma.
visão crítica, é uma contribuição e uma ajuda para a
89
Esses são alguns elementos que devem ser abordados no A análise da estrutura organizacional da escola visa
projeto pedagógico. identificar quais estruturas são valorizadas e por quem,
verificando as relações funcionais entre elas. É preciso ficar
Geralmente encontram-se documentos com a seguinte claro que a escola é uma organização orientada por
organização: apresentação, dados de identificação, finalidades, controlada e permeada pelas questões do poder. A
organograma, histórico, filosofia, pressupostos teóricos e análise e a compreensão da estrutura organizacional da escola
metodológicos, objetivos, organização curricular, processo de significam indagar sobre suas características, seus polos de
avaliação da aprendizagem, avaliação institucional, processo poder, seus conflitos.
de formação continuada, organização e utilização do espaço
físico, projetos/programas, referências, anexos, apêndices, Avaliar a estrutura organizacional significa questionar os
dentre outros: pressupostos que embasam a estrutura burocrática da escola
que inviabiliza a formação de cidadãos aptos a criar ou a
Finalidades modificar a realidade social. Para realizar um ensino de
Segundo Veiga115, a escola persegue finalidades. É qualidade e cumprir suas finalidades, as escolas têm que
importante ressaltar que os educadores precisam ter clareza romper com a atual forma de organização burocrática que
das finalidades de sua escola. Para tanto há necessidade de se regula o trabalho pedagógico – pela conformidade às regras
refletir sobre a ação educativa que a escola desenvolve com fixadas, pela obediência a leis e diretrizes emanadas do poder
base nas finalidades e nos objetivos que ela define. As central e pela cisão entre os que pensam e executam, que
finalidades da escola referem-se aos efeitos intencionalmente conduz a fragmentação e ao consequente controle hierárquico
pretendidos e almejados. que enfatiza três aspectos inter-relacionados: o tempo, a
Alves116 afirma que há necessidade de saber se a escola ordem e a disciplina.
dispõe de alguma autonomia na determinação das finalidades
e, consequentemente, seu desdobramento em objetivos Nessa trajetória, ao analisar a estrutura organizacional, ao
específicos. O autor enfatiza que: interessará reter se as avaliar os pressupostos teóricos, ao situar os obstáculos e
finalidades são impostas por entidades exteriores ou se são vislumbrar as possibilidades, os educadores vão desvelando a
definidas no interior do território social e se são definidas por realidade escolar, estabelecendo relações, definindo
consenso ou por conflito ou até se é matéria ambígua, finalidades comuns e configurando novas formas de organizar
imprecisa ou marginal. as estruturas administrativas e pedagógicas para a melhoria
Essa colocação está sustentada na ideia de que a escola do trabalho de toda a escola na direção do que se pretende.
deve assumir, como uma de suas principais tarefas, o trabalho
de refletir sobre sua intencionalidade educativa. Nesse Assim, considerando o contexto, os limites, os recursos
sentido, ela procura alicerçar o conceito de autonomia, disponíveis (humanos, materiais e financeiros) e a realidade
enfatizando a responsabilidade de todos, sem deixar de lado escolar, cada instituição educativa assume sua marca, tecendo,
os outros níveis da esfera administrativa educacional. no coletivo, seu projeto político-pedagógico, propiciando
A ideia de autonomia está ligada à concepção consequentemente a construção de uma nova forma de
emancipadora da educação. Para ser autônoma, a escola não organização.
pode depender dos órgãos centrais e intermediários que
definem a política da qual ela não passa de executora. Ela Processo de Decisão
concebe seu projeto político-pedagógico e tem autonomia para Na organização formal de nossa escola, o fluxo das tarefas
executá-lo e avaliá-lo ao assumir uma nova atitude de das ações e principalmente das decisões é orientado por
liderança, no sentido de refletir sobre as finalidades procedimentos formalizados, prevalecendo as relações
sociopolíticas e culturais da escola. hierárquicas de mando e submissão, de poder autoritário e
centralizador.
Estrutura Organizacional
A escola, de forma geral, dispõe de dois tipos básicos de Uma estrutura administrativa da escola adequada à
estruturas: administrativas e pedagógicas. realização de objetivos educacionais, de acordo com os
interesses da população, deve prever mecanismos que
Administrativas - asseguram praticamente, a locação e a estimulem a participação de todos no processo de decisão.
gestão de recursos humanos, físicos e financeiros. Fazem
parte, ainda, das estruturas administrativas todos os Isto requer uma revisão das atribuições especificas e
elementos que têm uma forma material como, por exemplo, a gerais, bem como da distribuição do poder e da
arquitetura do edifício escolar e a maneira como ele se descentralização do processo de decisão. Para que isso seja
apresenta do ponto de vista de sua imagem: equipamentos e possível há necessidade de se instalarem mecanismos
materiais didáticos, mobiliário, distribuição das dependências institucionais visando à participação política de todos os
escolares e espaços livres, cores, limpeza e saneamento básico envolvidos com o processo educativo da escola.
(água, esgoto, lixo e energia elétrica).
Contudo, a participação da coordenação pedagógica
Pedagógicas - que, teoricamente, determinam a ação das nesse processo é fundamental, pois o trabalho é garantir a
administrativas, “organizam as funções educativas para que a satisfação do bom atendimento em prol de toda a
escola atinja de forma eficiente e eficaz as suas finalidades”. As instituição.
estruturas pedagógicas referem-se, fundamentalmente, às
interações políticas, às questões de ensino e de aprendizagem Avaliação
e às de currículo. Nas estruturas pedagógicas incluem-se todos Acompanhar as atividades e avaliá-las levam-nos a
os setores necessários ao desenvolvimento do trabalho reflexão com base em dados concretos sobre como a escola
pedagógico. organiza-se para colocar em ação seu projeto político-
pedagógico. A avaliação do projeto político-pedagógico, numa
visão crítica, parte da necessidade de se conhecer a realidade
115 VEIGA,
Ilma Passos Alencastro. (org) Projeto político-pedagógico da escola: 116 ALVES José Matias. Organização, gestão e projeto educativo das escolas. Porto
uma construção possível. 12ª edição Papirus, 2002. Edições Asa, 1992.
90
escolar, busca explicar e compreender ceticamente as causas (B) planejamento global, com conteúdos selecionados por
da existência de problemas bem como suas relações, suas série.
mudanças e se esforça para propor ações alternativas (criação (C) ação intencional, com compromisso definido
coletiva). Esse caráter criador é conferido pela autocrítica. coletivamente.
(D) plano anual, com objetivos definidos pelos professores.
Avaliadores que conjugam as ideias de uma visão global, (E) instrumento técnico, com definição metodológica.
analisam o projeto político-pedagógico, não como algo
estanque desvinculado dos aspectos políticos e sociais. Não 04. (IFRN - Professor - Didática) A construção do projeto
rejeitam as contradições e os conflitos. A avaliação tem um político-pedagógico da escola exige a definição de princípios,
compromisso mais amplo do que a mera eficiência e eficácia objetivos, estratégias e, acima de tudo, um trabalho coletivo
das propostas conservadoras. Portanto, acompanhar e avaliar para a sua operacionalização. Numa perspectiva crítica e
o projeto político-pedagógico é avaliar os resultados da democrática, o projeto político-pedagógico da escola
própria organização do trabalho pedagógico. proporciona:
I - melhoria da organização pedagógica, administrativa e
Considerando a avaliação dessa forma é possível salientar financeira da escola, bem como o estabelecimento de novas
dois pontos importantes. Primeiro, a avaliação é um ato relações pessoais e interpessoais na instituição;
dinâmico que qualifica e oferece subsídios ao projeto político- II - redimensionamento da prática pedagógica dos
pedagógico. Segundo, ela imprime uma direção às ações dos professores e formação continuada do quadro docente.
educadores e dos educandos. III - planejamento a curto prazo para definir aplicação de
medidas emergenciais na escola, de modo a superar certas
O processo de avaliação envolve três momentos: a dificuldades, detectar outras e propor novas ações.
descrição e a problematização da realidade escolar, a IV - a superação de práticas pedagógicas fragmentadas e a
compreensão crítica da realidade descrita e problematizada e garantia total de um ensino de qualidade.
a proposição de alternativas de ação, momento de criação Assinale a opção em que todas as afirmativas estão
coletiva. corretas:
(A) I, II e III.
A avaliação, do ponto de vista crítico, não pode ser (B) I e IV.
instrumento de exclusão dos alunos provenientes das classes (C) I, II e IV.
trabalhadoras. Portanto, deve ser democrática, deve favorecer (D) I e II
o desenvolvimento da capacidade do aluno de apropriar-se de
conhecimentos científicos, sociais e tecnológicos produzidos 05. (Pref. Maceió/AL - Professor - Área 1º ao 5º ano -
historicamente e deve ser resultante de um processo coletivo COPEVE/UFAL/2017) Não se constrói um Projeto Político
de avaliação diagnóstica. Pedagógico sem norte, sem rumo. Por isso, todo projeto
pedagógico da escola é também político (GADOTTI e ROMÃO,
Questões 1997). Dadas as afirmativas,
01. (SEDUC-RO - Professor – História – FUNCAB) I. O Projeto Político Pedagógico deve ter como marco
Quanto ao Projeto Político-Pedagógico, é INCORRETO afirmar fundamental a participação democrática, o ser multicultural,
que ele: mantendo o convívio com base em hierarquias fixas.
(A) deve ser democrático. II. O Projeto Político Pedagógico deve registrar, orientar,
(B) precisa ser construído coletivamente. estabelecer ações, metas e estratégias que tenham como
(C) confere identidade à escola. objetivo o disciplinamento dos corpos e das mentes.
(D) explicita a intencionalidade da escola. III. O Projeto Político Pedagógico de uma escola é fruto de
(E) mostra-se abrangente e imutável. uma ação cotidiana e que precisa tomar decisões para o bem
de toda comunidade escolar.
02. (ABIN - Oficial Técnico de Inteligência – Área de
Pedagogia CESPE) Julgue o item a seguir, relativo a projeto Verifica-se que está(ão) correta(s)
político-pedagógico, que, nas instituições, pode ser
considerado processo de permanente reflexão e discussão a (A) I, apenas.
respeito dos problemas da organização, com o propósito de (B) III, apenas.
propor soluções que viabilizem a efetivação dos objetivos (C) I e II, apenas.
almejados. (D) II e III, apenas.
Os pressupostos que norteiam o projeto político- (E) I, II e III.
pedagógico estão desvinculados da proposta de gestão
democrática. 06. (Pref. São Luís/MA - Professor de Nível Superior –
( ) Certo ( ) Errado CESPE/2017) A partir da participação da comunidade escolar
e da reflexão a respeito da composição escolar, a organização
03. (Prefeitura de Palmas/TO - Professor - Língua da escola, desde os tempos e espaços do currículo até o
Espanhola – FDC) “O projeto político-pedagógico antecipa um relacionamento com a comunidade, é estabelecida
futuro diferente do presente. Não é algo que é construído e (A) no plano de aula anual.
arquivado como prova do cumprimento de tarefas (B) no plano de curso.
burocráticas.” (C) no conselho de classe.
(Ilma Passos) (D) na reunião de pais.
(E) no projeto político-pedagógico.
Segundo a autora, o projeto político-pedagógico,
comprometido com uma educação democrática e de 07. (Pref. Lagoa da Prata/MG - Especialista
qualidade, caracteriza- se fundamentalmente como: Educacional – FGR)
(A) atividades articuladas, com temas selecionados “A construção do Projeto Político-Pedagógico (PPP) é um
semestralmente. processo dinâmico e permanente, pois continuamente novos
atores se incorporam ao grupo, trazendo novas experiências,
91
capacidades e necessidades, assim como novo interesses e 02. Resposta: Errado
talentos, exigindo que novas frentes de trabalho se abram. A gestão democrática exige a compreensão em
É um eterno diagnosticar, planejar, repensar, começar e profundidade dos problemas postos pela prática pedagógica.
recomeçar, analisar e avaliar.” Ela visa romper com a separação entre concepção e execução,
entre o pensar e o fazer, entre teoria e prática. Busca resgatar
(VEIGA, Ilma Passos Alencastro (org.). Escola: espaço do o controle do processo e do produto do trabalho pelos
projeto político pedagógico. educadores.
Campinas, SP: Papirus, 1998, pág. 183) Neste sentido, fica claro entender que a gestão
Tendo como referência a construção do PPP, marque V democrática, no interior da escola, não é um princípio fácil de
para as alternativas VERDADEIRAS e F para as FALSAS. ser consolidado, pois trata-se da participação crítica na
( ) Eliminação das relações verticalizadas entre a escola e construção do projeto político-pedagógico e na sua gestão.
os dirigentes educacionais.
( ) Realização de trabalho padronizado, repetitivo e 03. Resposta: C
mecânico, desconsiderando as diferenças entre os agentes O Projeto Político-Pedagógico vai além de um simples
educativos. agrupamento de planos de ensino e de atividades diversas. O
( ) O currículo se restringe ao cumprimento das atividades projeto não é algo que é construído e em seguida arquivado ou
do livro didático, que passa a ser utilizado como um fim e não encaminhado às autoridades educacionais como prova do
um meio. cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é construído e
( ) A elaboração do PPP possibilita aos profissionais da vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos
educação e aos alunos a vivência do processo democrático. com o processo educativo da escola.
A sequência CORRETA, de cima para baixo é: O projeto busca um rumo, uma direção. É uma ação
(A) V, F, F, V. intencional, com um sentido explícito, com um compromisso
(B) F, F, F, V. definido coletivamente. Por isso, todo projeto pedagógico da
(C) V, F, V, V. escola é, também, um projeto político por estar intimamente
(D) F, V, V, F. articulado ao compromisso sociopolítico com os interesses
reais e coletivos da população majoritária. É político no
08. (IFBA - Professor - FUNRIO) O projeto educacional é, sentido de compromisso com a formação do cidadão para um
respectivamente, político e pedagógico, porque tipo de sociedade.
(A) perpetua valores da cultura da sociedade a que atende
e impõe as opções pedagógicas da unidade de ensino 04. Resposta: D
(B) reproduz os valores sociais e culturais e propõe opções Os processos e princípios do PPP são: Igualdade de
educativas que levam à construção de ideais pedagógicos. condições para acesso e permanência na escola; Qualidade
(C) favorece a formação dos sujeitos para um tipo de que não pode ser privilégio de minorias econômicas e sociais;
sociedade que se deseja e define as ações para que a escola Gestão Democrática: é um princípio consagrado pela
cumpra suas intenções educativas. Constituição vigente e abrange as dimensões pedagógica,
(D) responde às demandas da sociedade e organiza as administrativa e financeira (que valida a alternativa I);
estratégias pedagógicas traçadas pela direção e coordenação Liberdade: o princípio da liberdade está sempre associado à
pedagógica da escola. ideia de autonomia; Valorização do magistério (que valida a
(E) repete as estruturas sociais e especifica o trabalho alternativa II).
pedagógico em linhas científicas, acadêmicas e educativas. Já as alternativas III e IV, tornam-se inválidas devido às
palavras grifadas:
09. (DEPEN – Pedagogo - CESPE) São funções do projeto III - planejamento a curto prazo para definir aplicação de
político-pedagógico: diagnóstico e análise da realidade, medidas emergenciais na escola, de modo a superar certas
definição de objetivos e eixos norteadores, determinação de dificuldades, detectar outras e propor novas ações.
atividades e responsabilidades a serem assumidas, além da IV - a superação de práticas pedagógicas fragmentadas e a
avaliação dos processos e resultados previstos. garantia total de um ensino de qualidade.
( ) Certo ( ) Errado
05. Resposta: B
10. (SEEAL – Pedagogo - CESPE) Para evitar prejuízo à Grifo nas palavras que deixam as afirmativas I e II
autonomia escolar, não deve haver articulação do projeto incorretas:
político pedagógico das escolas com o sistema nacional de I. O Projeto Político Pedagógico deve ter como marco
avaliação. fundamental a participação democrática, o ser multicultural,
( ) Certo ( ) Errado mantendo o convívio com base em hierarquias fixas.
II. O Projeto Político Pedagógico deve registrar, orientar,
Respostas estabelecer ações, metas e estratégias que tenham como
objetivo o disciplinamento dos corpos e das mentes.
01. Resposta: E
O PPP deve ser democrático, construído de forma coletiva, 06. Resposta: E
conferindo a identidade da escola junto à comunidade, O Projeto Político-Pedagógico vai além de um simples
explicitando a intencionalidade da escola, de forma agrupamento de planos de ensino e de atividades diversas. O
abrangente. projeto não é algo que é construído e em seguida arquivado ou
“O projeto pedagógico da escola é, por isso mesmo, sempre encaminhado às autoridades educacionais como prova do
um processo inconcluso, uma etapa em direção a uma cumprimento de tarefas burocráticas. Ele é construído e
finalidade que permanece como horizonte da escola”. vivenciado em todos os momentos, por todos os envolvidos
(Gadotti117). Por isso, a questão com palavra imutável está com o processo educativo da escola.
incorreta.
92
07. Resposta: A
Grifo nas palavras que deixam as afirmativas II e III Falsas: 4. O processo de ensino-
Realização de trabalho padronizado, repetitivo e aprendizagem: 4.1
mecânico, desconsiderando as diferenças entre os agentes
educativos. Concepções e teorias da
O currículo se restringe ao cumprimento das atividades aprendizagem; 4.2 A interação
do livro didático, que passa a ser utilizado como um fim enão pedagógica na sala de aula: o
um meio.
aluno, o professor, os tempos,
08. Resposta: C os espaços e os conteúdos
“A dimensão política se cumpre na medida em que ela se escolares conceituais,
realiza enquanto prática especificamente pedagógica”.
Na dimensão pedagógica reside a possibilidade da procedimentais e atitudinais;
efetivação da intencionalidade da escola, que é a formação do 4.3 Mapeamento e análise de
cidadão participativo, responsável, compromissado, crítico e dificuldades, problemas e
criativo. Pedagógico, no sentido de definir as ações educativas
e as características necessárias às escolas de cumprirem seus potencialidades do cotidiano
propósitos e sua intencionalidade. escolar; 4.4 Comunicação e
interação com os professores
09. Resposta: Certo
O Projeto Político-Pedagógico, ao se constituir em no planejamento,
processo democrático de decisões, preocupa-se em instaurar assessoramento,
uma forma de organização do trabalho pedagógico que supere monitoramento e avaliação do
os conflitos, buscando eliminar as relações competitivas,
corporativas e autoritárias, rompendo com a rotina do mando processo pedagógico: técnicas
impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as e instrumentos.
relações no interior da escola, diminuindo os efeitos
fragmentários da divisão do trabalho que reforça as diferenças
e hierarquiza os poderes de decisão. PROCESSOS PEDAGÓGICOS – ENSINO E
APRENDIZAGEM
10. Resposta: Errado
Avaliadores que conjugam as ideias de uma visão global, 1. PRESSUPOSTOS PARA O PROCESSO DE ENSINO E
analisam o projeto político-pedagógico, não como algo APRENDIZAGEM
estanque desvinculado dos aspectos políticos e sociais. Não Através do seu próprio interesse, o aluno busca nos
rejeitam as contradições e os conflitos. A avaliação tem um conteúdos apresentados pelo professor, fazer relação com sua
compromisso mais amplo do que a mera eficiência e eficácia realidade, para assim tornar sua experiência mais rica. Dessa
das propostas conservadoras. Portanto, acompanhar e avaliar forma, o novo conhecimento se apoia numa construção
o projeto político-pedagógico é avaliar os resultados da cognitiva que já existe, ou o professor auxilia na construção
própria organização do trabalho pedagógico. conhecimento no qual o discente ainda não dispõe. O nível de
envolvimento na aprendizagem depende do interesse e
disposição do aluno, além do empenho do professor no
contexto da sala de aula.
A visão da pedagogia dos conteúdos desenvolve nos alunos
a capacidade de processar informações e transformar a
realidade em que vive. Assim, o professor precisa
compreender seus alunos, o que eles dizem ou pensam e os
alunos precisam fazer o mesmo em relação a ele. Essa
transferência de aprendizagem só se realiza no momento da
operação mental, isto é, quando o aluno supera sua visão
parcial e confusa e adquire uma visão mais nítida e ampla.
Ao fim do processo, o aluno já deve estar preparado para o
mundo adulto de modo a praticar todo o aprendizado
adquirido com a ajuda do professor, como a democracia, a
liderança, a iniciativa e a responsabilidade, assim como ter
formação ética no sentido de pensar valores, a saber,
competências do pensar no âmbito da educação moral da
tomada de decisões.
93
As contribuições da teoria construtivista de Piaget, sobre a ensino e aprendizagem é que ele é um processo neutro,
construção do conhecimento e os mecanismos de influência transparente, afastado da conjuntura de poder, história e
educativa têm chamado a atenção para os processos contexto social. O processo ensino e aprendizagem deve ser
individuais, que têm lugar em um contexto interpessoal e que compreendido como uma política cultural, isto é, como um
procuram analisar como os alunos aprendem, estabelecendo empreendimento pedagógico que considera com seriedade as
uma estreita relação com os processos de ensino em que estão relações de raça, classe, gênero e poder na produção e
conectados. legitimação do significado e experiência.
Os mecanismos de influência educativa têm um lugar no Tradicionalmente, este processo tem reproduzido as
processo de ensino e aprendizagem, como um processo onde relações capitalistas de produção e ideologias legitimadoras
não se centra atenção em um dos aspectos que o dominantes ao ignorarem importantes questões referentes às
compreendem, mas em todos os envolvidos. relações entre conhecimento x poder e cultura x política. O
Se analisarmos a situação atual da prática educativa em produto do processo ensino e aprendizagem é o
nossas escolas identificaremos problemas como: conhecimento. Partindo desse princípio, concebe-se que o
A) A grande ênfase dada a memorização, pouca conhecimento é uma construção social, assim torna-se
preocupação com o desenvolvimento de habilidades para necessário examinar a constelação de interesses econômicos,
reflexão crítica e auto crítica dos conhecimentos que aprende; políticos e sociais que as diferentes formas de conhecer podem
B) As ações ainda são centradas nos professores que refletir. Para que o processo ensino e aprendizagem possa
determinam o quê e como deve ser aprendido e a separação gerar possibilidades de emancipação é necessário que os
entre educação e instrução. professores compreendam a razão de ser dos problemas que
enfrentam e assuma um papel de sujeito na organização desse
A solução para tais problemas está no aprofundamento de processo. As influências sócio-político econômicas, exercem
como os educandos aprendem e como o processo de ensinar sua ação inclusive nos pequenos atos que ocorrem na sala de
pode conduzir à aprendizagem, assim o processo de ensino e aula, ainda que não sejam conscientes. Ao selecionar algum
aprendizagem tem sido historicamente caracterizado de destes componentes para aprofundar deve-se levar em conta
formas diferentes, que vão desde a ênfase no papel do a unidade, os vínculos e os nexos com os outros componentes.
professor como transmissor de conhecimento, até as O componente é uma propriedade ou atributo de um
concepções atuais que concebem o processo de ensino e sistema que o caracteriza; não é uma parte do sistema e sim
aprendizagem com um todo integrado que destaca o papel do uma propriedade do mesmo, uma propriedade do processo
educando. docente-educativo como um todo. Identificamos como
Nesse último enfoque, considera-se a integração do componente do processo de ensino e aprendizagem:
cognitivo e do afetivo, do instrutivo e do educativo como
requisitos psicológicos e pedagógicos essenciais. A) Aluno - devem responder a pergunta: "quem?"
A concepção defendida aqui é que o processo de ensino e B) Problema – elemento que é determinado a partir da
aprendizagem é uma integração dialética entre o instrutivo e o necessidade do aprendiz.
educativo que tem como propósito essencial contribuir para a C) Objetivo – deve responder a pergunta: "Para que
formação integral da personalidade do aluno. ensinar?"
O instrutivo é um processo de formar homens capazes e D) Conteúdo - deve responder a pergunta: "O que
inteligentes. Entendendo por homem inteligente quando, aprender?"
diante de uma situação problema ele seja capaz de enfrentar e E) Métodos - deve responder a pergunta: "Como
resolver os problemas, de buscar soluções para resolver as desenvolver o processo?"
situações. Ele tem que desenvolver sua inteligência e isso só F) Recursos - deve responder a pergunta: "Com o quê?"
será possível se ele for formado mediante a utilização de G) Avaliação - elemento regulador, sua realização oferece
atividades lógicas. informação sobre a qualidade do processo de ensino
Já o educativo, se logra com a formação de valores, aprendizagem, sobre a efetividade dos outros componentes e
sentimentos que identificam o homem como ser social, das necessidades de ajuste, modificações que o sistema deve
compreendendo o desenvolvimento de convicções, vontade e usufruir.
outros elementos da esfera volitiva e afetiva que junto com a
cognitiva permitem falar de um processo de ensino e A integração de todos os componentes forma o sistema,
aprendizagem que tem pôr fim a formação multilateral da neste caso o processo de ensino e aprendizagem. As reflexões
personalidade do homem. sobre o caráter sistêmico dos componentes do processo de
A eficácia do processo de ensino e aprendizagem está na ensino e aprendizagem e suas relações são importantes em
resposta em que este dá à apropriação do conhecimento, ao função do caráter bilateral da comunicação entre professor-
desenvolvimento intelectual e físico do estudante, à formação aluno; aluno-aluno, grupo-professor, professor-professor.
de sentimentos, qualidades e valores, que alcancem os
objetivos gerais e específicos propostos em cada nível de 3. O PROCESSO DE APRENDIZAGEM ORGACIONAL
ensino de diferentes instituições, conduzindo a uma posição A questão da aprendizagem tem sido amplamente
transformadora, que promova as ações coletivas, a discutida, ocupando um espaço considerável em discussões
solidariedade e o viver em comunidade. educacionais e profissionais da atualidade; porém não se trata
Todo ato educativo obedece determinados fins e de algo totalmente novo, nem mesmo em ambientes
propósitos de desenvolvimento social e econômico e em organizacionais.
consequência responde a determinados interesses sociais, As empresas aprendem a operar a produção e vão
sustentam-se em uma filosofia da educação, adere a melhorando os seus processos a partir de suas próprias
concepções epistemológicas específicas, leva em conta os experiências, alimentadas por informações advindas do
interesses institucionais e, depende, em grande parte, das mercado e da concorrência. De acordo com Bell (1984)119, este
características, interesses e possibilidades dos sujeitos tipo de aprendizado é passivo, automático e não implica
participantes, alunos, professores, comunidades escolares e custos adicionais, sendo porém limitado.
demais fatores do processo. A visão tradicional do processo
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Há, entretanto, outras formas de aprendizagem, que arranjos de situações ensino aprendizagem e diferentes ações
exigem determinação e postura ativa, envolvendo educativas em sala de aula, partindo-se do pressuposto de que
considerável esforço e investimento. São os processos de a ação educativa exercida por professores em situações
aprendizagem por meio da mudança, da análise do planejadas de ensino-aprendizagem é sempre intencional.
desempenho, do treinamento, da contratação e da busca, Subjacente a esta ação, estaria presente – implícita ou
detalhados a seguir: explicitamente, de forma articulada ou não – um referencial
teórico que compreendesse conceitos de homem, mundo,
A) A introdução de novas tecnologias ou qualquer outro sociedade, cultura, conhecimento, etc.
elemento que aponte a necessidade de mudança, estrutural ou O estudo acerca das diferentes linhas pedagógicas,
processual, impele as organizações à aprendizagem. As tendências ou abordagens, no ensino brasileiro podem
experiências e conhecimentos, positivos ou negativos, fornecer diretrizes à ação docente, mesmo considerando que a
adquiridos ao longo de processos de mudança são elaboração que cada professor faz delas é individual e
extremamente enriquecedores, conferindo à organização um intransferível. De acordo com Mizukami (1986) 120, algumas
plus que todos os processos de aprendizagem oferecem. abordagens apresentam claro referencial filosófico e
B) A análise do desempenho da organização em termos psicológico, ao passo que outras são intuitivas ou
produtivos também irá conduzir à aprendizagem, não só em fundamentadas na prática, ou na imitação de modelos. A
função da apreciação do comportamento de determinados complexidade da realidade educacional deve ser considerada
índices que indicarão a necessidade de manutenção do para não ser tratada de forma simplista e reducionista.
processo produtivo ou sua correção, mas também como Nesse estudo, deve-se ter em mente seu caráter parcial e
decorrência da necessidade de se buscarem índices de arbitrário, assim como as limitações e problemas decorrentes
desempenho confiáveis e expressivos. da delimitação e caracterização (necessárias) de cada
abordagem. A professora assim, não incluiu em seus estudos a
4. O CONTEXTO ORGANIZACIONAL ATUAL E O abordagem escola novista, introduzida no Brasil através do
IMPERATIVO DE UMA NOVA DINÂMICA DE Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (Anísio Teixeira,
APRENDIZAGEM Gustavo Capanema e outros), a partir da década de 1930. Ela
De fato as tendências do mundo atual têm influenciado as justifica sua opção por considerar que essa abordagem pode
organizações na busca da aprendizagem. A rápida ser tomada como didaticista, por suas atribuições aos aspectos
disseminação de informações e a própria renovação do didáticos, e por possuir diretrizes incluídas em outras
conhecimento, impulsionadas pelo avanço constante da abordagens. Argumenta ainda que, as demais abordagens,
ciência e da tecnologia, têm forçado as pessoas a renovar e a apresentadas por ela, apresentam justificativas teóricas ou
adquirir novos conhecimentos, sob pena de se tornarem evidências empíricas. Mas reconhece que trata-se de uma
obsoletas. abordagem com possível influência na formação de
A necessidade de aquisição e renovação dos professores no Brasil.
conhecimentos é percebida de modo individual e também
organizacional. As pessoas estão dispostas a desenvolver e A) Abordagem Tradicional
aumentar seus estoques de conhecimento, porque percebem Trata-se de uma concepção e uma prática educacionais que
as potenciais ameaças do ambiente sobre a passividade persistem no tempo, em suas diferentes formas, e que
intelectual, abalando principalmente questões de segurança passaram a fornecer um quadro diferencial para todas as
profissional. demais abordagens que a ela se seguiram. Como se sabe, o
As organizações precisam de capacidade criativa e de adulto, na concepção tradicional, é considerado como homem
competências para se tornarem mais ágeis. Não só em termos acabado, "pronto" e o aluno um "adulto em miniatura", que
de capacidade de resposta às mudanças, mas também em precisa ser atualizado. O ensino será centrado no professor. O
termos de capacidade para estar à frente delas. aluno apenas executa prescrições que lhe são fixadas por
Baseados na necessidade de transformar as organizações autoridades exteriores.
em organizações de aprendizagem, uma série de autores,
recomendam diferentes práticas para a promoção do - Homem: O homem é considerado como inserido num
aprendizado organizacional, todas destacando o papel da mundo que irá conhecer através de informações que lhe serão
mudança e inovação organizacional. fornecidas. É um receptor passivo até que, repleto das
Esta competência para mudar e inovar implica a informações necessárias, pode repeti-las a outros que ainda
necessidade de a organização possuir maior expertise. não as possuam, assim como pode ser eficiente em sua
Segundo Drucker “as dinâmicas do conhecimento implicam profissão, quando de posse dessas informações e conteúdos.
num imperativo claro: cada organização precisa embutir o
gerenciamento das mudanças em sua própria estrutura”. É, - Mundo: A realidade é algo que será transmitido ao
portanto, responsabilidade de cada organização tornar esta indivíduo principalmente pelo processo de educação formal,
expertise disponível. Em outras palavras, além das pessoas além de outras agências, tais como família, Igreja.
estarem forçosamente motivadas a aprender, é papel das
organizações contribuir e operacionalizar o aprendizado. - Sociedade/Cultura: O objetivo educacional
normalmente se encontra intimamente relacionado aos
5. AS ABORDAGENS DO PROCESSO DE ENSINO valores apregoados pela sociedade na qual se realiza. Os
O Conhecimento humano, dependendo dos diferentes Programas exprimem os níveis culturais a serem adquiridos
referencias, é explicado diversamente em sua gênese e na trajetória da educação formal. A reprovação do aluno passa
desenvolvimento, o que condiciona conceitos diversos de a ser necessária quando o mínimo cultural para aquela faixa
homem, mundo, cultura, sociedade, educação, etc. Dentro de não foi atingido, e as provas e exames são necessários a
um mesmo referencial, é possível haver abordagens diversas, constatação de que este mínimo exigido para cada série foi
tendo em comum apenas os diferentes primados: ora do adquirido pelo aluno. O diploma pode ser tomado como um
objeto, ora do sujeito, ora da interação de ambos. Diferentes instrumento de hierarquização. Dessa forma, o diploma iria
posicionamentos pessoais deveriam derivar diferentes desempenhar um papel mediador entre a formação cultural e
120 MIZUKAMI, Maria da Graça. Ensino as abordagens do processo. São Paulo: EPU,
1986.
95
o exercício de funções sociais determinadas. Pode-se afirmar auditório. O professor já traz o conteúdo pronto e o aluno se
que as tendências englobadas por esse tipo de abordagem limita exclusivamente a escutá-lo a didática profissional quase
possuem uma visão individualista do processo educacional, que poderia ser resumida em dar a lição e tomar a lição. No
não possibilitando, na maioria das vezes, trabalhos de método expositivo como atividade normal, está implícito o
cooperação nos quais o futuro cidadão possa experimentar a relacionamento professor - aluno, o professor é o agente e o
convergência de esforços. aluno é o ouvinte. O trabalho continua mesmo sem a
compreensão do aluno somente uma verificação a posteriori é
- Conhecimento: Parte-se do pressuposto de que a que permitirá o professor tomar consciência deste fato.
inteligência seja uma faculdade capaz de acumular/armazenar Quanto ao atendimento individual há dificuldades pois a classe
informações. Aos alunos são apresentados somente os fica isolada e a tendência é de se tratar todos igualmente.
resultados desse processo, para que sejam armazenados.
Evidencia-se o caráter cumulativo do conhecimento humano, - Avaliação: A avaliação visa a exatidão da reprodução do
adquirido pelo indivíduo por meio de transmissão, de onde se conteúdo comunicado em sala de aula. As notas obtidas
supõe o papel importante da educação formal e da instituição funcionam na sociedade como níveis de aquisição do
escola. Atribui-se ao sujeito um papel insignificante na patrimônio cultural.
elaboração e aquisição do conhecimento. Ao indivíduo que
está "adquirindo" conhecimento compete memorizar B) Abordagem Copormentalista
definições, anunciando leis, sínteses e resumos que lhes são O conhecimento é uma "descoberta" e é nova para o
oferecidos no processo de educação formal. indivíduo que a faz. O que foi descoberto, porém, já se
encontrava presente na realidade exterior. Os
- Educação: Entendida como instrução, caracterizada comportamentalistas consideram a experiência ou a
como transmissão de conhecimentos e restrita à ação da experimentação planejada como a base do conhecimento, o
escola. Às vezes, coloca-se que, para que o aluno possa chegar, conhecimento é o resultado direto da experiência.
e em condições favoráveis, há uma confrontação com o
modelo, é indispensável uma intervenção do professor, uma - Homem: O homem é uma consequência das influências
orientação do mestre. Trata-se, pois, da transmissão de ideias ou forças existentes no meio ambiente a hipótese de que o
selecionadas e organizadas logicamente. homem não é livre é absolutamente necessária para se poder
aplicar um método científico no campo das ciências. O homem
- Escola: A escola, é o lugar por excelência onde se realiza dentro desse referencial é considerado como o produto de um
a educação, a qual se restringe, a um processo de transmissão processo evolutivo.
de informações em sala de aula e funciona como uma agência
sistematizadora de uma cultura complexa. Considera o ato de - Mundo: A realidade para Skinner, é um fenômeno
aprender como uma cerimônia e acha necessário que o objetivo; O mundo já é construído e o homem é produto do
professor se mantenha distante dos alunos. Uma escola desse meio. O meio pode ser manipulado. O comportamento, por sua
tipo é frequentemente utilitarista quanto a resultados e vez, pode ser mudado modificando-se as condições das quais
programas preestabelecidos. As possibilidades de cooperação ele é uma função, ou seja, alterando-se os elementos
entre pares são reduzidas, já que a natureza da grande parte ambientais. O meio seleciona.
das tarefas destinadas aos alunos exige participação individual
de cada um deles. - Sociedade/Cultura: A sociedade ideal, para Skinner, é
aquela que implicarias um planejamento social e cultural.
- Ensino/Aprendizagem: A ênfase é dada às situações de Qualquer ambiente, físico ou social, deve ser avaliado de
sala de aula, onde os alunos são "instruídos" e "ensinados" pelo acordo com seus efeitos sobre a natureza humana. A cultura, é
professor. Os conteúdos e as informações têm de ser representada pelos usos e costumes dominantes, pelos
adquiridos, os modelos imitados. Seus elementos comportamentos que se mantém através dos tempos.
fundamentais são imagens estáticas que progressivamente
serão "impressas" nos alunos, cópias de modelos do exterior - Conhecimento: O conhecimento é o resultado direto da
que serão gravadas nas mentes individuais. Uma das experiência, o comportamento é estruturado indutivamente,
decorrências do ensino tradicional, já que a aprendizagem via experiência.
consiste em aquisição de informações e demonstrações
transmitidas, é a que propicia a formação de reações - Educação: A educação está intimamente ligada à
estereotipadas, de automatismos denominados hábitos, transmissão cultural. A educação, pois, deverá transmitir
geralmente isolados uns dos outros e aplicáveis, quase conhecimentos, assim como comportamentos éticos, práticas
sempre, somente às situações idênticas em que foram sociais, habilidades consideradas básicas para a manipulação
adquiridos. O aluno que adquiriu o hábito ou que "aprendeu" e controle do mundo /ambiente.
apresenta, com frequência, compreensão apenas parcial.
Ignoram-se as diferenças individuais. É um ensino que se - Escola: A escola é considerada e aceita como uma agência
preocupa mais com a variedade e quantidade de educacional que deverá adotar forma peculiar de controle, de
noções/conceitos/informações que com a formação do acordo com os comportamentos que pretende instalar e
pensamento reflexivo. manter.
96
- Metodologia: Nessa abordagem, se incluem tanto a facilitador da aprendizagem e nesse clima entrará em contato
aplicação da tecnologia educacional e estratégias de ensino, com problemas vitais que tenham repercussão na existência
quanto formas de reforço no relacionamento professor-aluno. do estudante. Isso implica que o professor deva aceitar o aluno
tal como é e compreender os sentimentos que ele possui. O
- Avaliação: Decorrente do pressuposto de que o aluno aluno deve responsabilizar-se pelos objetivos referentes a
progride em seu ritmo próprio, em pequenos passos, sem aprendizagem que tem significado para eles. As qualidades do
cometer erros, a avaliação consiste, nesta abordagem, em se professor podem ser sintetizadas em autenticidade
constatar se o aluno aprendeu e atingiu os objetivos propostos compreensão empática, aceitação e confiança no aluno.
quando o programa foi conduzido até o final de forma
adequada. - Metodologia: Não se enfatiza técnica ou método para
facilitar a aprendizagem. Cada educador eficiente deve
C) Abordagem Humanista elaborar a sua forma de facilitar a aprendizagem no que se
Nesta abordagem é dada a ênfase no papel do sujeito como refere ao que ocorre em sala de aula é a ênfase atribuída a
principal elaborador do conhecimento humano. Da ênfase ao relação pedagógica, a um clima favorável ao desenvolvimento
crescimento que dela se resulta, centrado no desenvolvimento das pessoas que possibilite liberdade para aprender.
da personalidade do indivíduo na sua capacidade de atuar
como uma pessoa integrada. O professor em si não transmite - Avaliação: Só o indivíduo pode conhecer realmente sua
o conteúdo, dá assistência sendo facilitador da aprendizagem. experiência, só pode ser julgada a partir de critérios internos
O conteúdo advém das próprias experiências do aluno o do organismo. O aluno deverá assumir formas de controle de
professor não ensina: apenas cria condições para que os sua aprendizagem, definir e aplicar os critérios para avaliar até
alunos aprendam. onde estão sendo atingidos os objetivos que pretende, com
responsabilidade. As relações verticais impostas por relações
- Homem: É considerado como uma pessoa situada no EU - TU e nunca EU - ISTO; As avaliações de acordo com
mundo. Não existem modelos prontos nem regras a seguir mas padrões prefixados, por auto avaliação dos alunos.
um processo de vir a ser. O objetivo do ser humano é a auto Considerando-se pois o fato de que só o indivíduo pode
realização ou uso pleno de suas potencialidades e capacidades conhecer realmente a sua experiência, está só pode ser julgada
o homem se apresenta como um projeto permanente e mau a partir de critérios internos do organismo.
acabado.
D) Abordagem Cognitivista
- Mundo: O mundo é algo produzido pelo homem diante de A organização do conhecimento, processamento de
si mesmo. O mundo teria o papel fundamental de crias informações estilos de pensamento ou estilos cognitivos,
condições de expressão para a pessoa, cuja tarefa vital consiste comportamentos relativos à tomada de decisões, etc.
no pleno desenvolvimento do seu potencial inerente. A ênfase
é no sujeito mais uma das condições necessárias para o - Homem/Mundo: O homem e mundo serão analisados
desenvolvimento individual é o ambiente. Na experiência conjuntamente, já que o conhecimento é o produto da
pessoal e subjetiva o conhecimento é construído no decorrer interação entre eles, entre sujeito e objeto.
do processo de vir a ser da pessoa humana. É atribuída ao
sujeito papel central e primordial na elaboração e criação do - Sociedade/Cultura: Os fatos sociológicos, pois, tais
conhecimento. O conhecimento é inerente à atividade humana. como regras, valores, normas, símbolos etc. De acordo com
O ser humano tem curiosidade natural para o conhecimento. este posicionamento, variam de grupo para grupo, de acordo
como o nível mental médio das pessoas que constituem o
- Educação: Trata-se da educação centrada na pessoa, já grupo.
que nessa abordagem o ensino será centrado no aluno. A
educação tem como finalidade primeira a criação de condições - Conhecimento: O conhecimento é considerado como
que facilitam a aprendizagem de forma que seja possível seu uma construção contínua. A passagem de um estado de
desenvolvimento tanto intelectual como emocional seria a desenvolvimento para o seguinte é sempre caracterizada por
criação de condições nas quais os alunos pudessem tornar-se formação de novas estruturas que não existiam anteriormente
pessoas de iniciativas, de responsabilidade, autodeterminação no indivíduo.
que soubessem aplicar-se a aprendizagem no que lhe servirão
de solução para seus problemas servindo-se da própria - Educação: O processo educacional, consoante a teoria de
existência. Nesse processo os motivos de aprender deverão ser desenvolvimento e conhecimento, tem um papel importante,
do próprio aluno. Autodescoberta e autodeterminação são ao provocar situações que sejam desequilibradoras para o
características desse processo. aluno, desequilíbrios esses adequados ao nível de
desenvolvimento em que a criança vive intensamente
- Escola: A escola será uma escola que respeite a criança (intelectual e afetivamente) cada etapa de seu
tal qual é, que ofereça condições para que ela possa desenvolvimento.
desenvolver-se em seu processo possibilitando a autonomia
do aluno. O princípio básico consiste na ideia da não - Escola: Segundo Piaget, a escola deveria começar
interferência com o crescimento da criança e de nenhuma ensinando a criança a observar. A verdadeira causa dos
pressão sobre ela. O ensino numa abordagem como esta fracassos da educação formal, diz, decorre essencialmente do
consiste num produto de personalidades únicas, respondendo fato de se principiar pela linguagem (acompanhada de
as circunstâncias únicas num tipo especial de desenhos, de ações fictícias ou narradas etc.) ao invés de o
relacionamentos. A aprendizagem tem a qualidade de um fazer pela ação real e material.
envolvimento pessoal.
- Ensino/Aprendizagem: Um ensino que procura
- Professor/Aluno: Cada professor desenvolverá seu desenvolver a inteligência deverá priorizar as atividades do
próprio repertório de uma forma única, decorrente da base sujeito, considerando-o inserido numa situação social.
percentual de seu comportamento. O processo de ensino irá
depender do caráter individual do professor, como ele se - Professor/Aluno: Ambos os polos da relação devem ser
relaciona com o caráter pessoal do aluno. Assume a função de compreendidos de forma diferente da convencional, no
97
sentido de um transmissor e um receptor de informação. 6. AS ABORDAGENS DO PROCESSO DE ENSINO,
Caberá ao professor criar situações, propiciando condições APRENDIZAGEM E O PROFESSOR
onde possam se estabelecer reciprocidade intelectual e Segundo Mizukami, a partir de análises feitas sobre as
cooperação ao mesmo tempo moral e racional. diferentes abordagens do processo ensino aprendizagem
pôde-se constatar que certas linhas teóricas são mais
- Metodologia: O desenvolvimento humano que traz explicativas sobre alguns aspectos em relação a outros,
implicações para o ensino. Uma das implicações fundamentais percebendo-se assim a possibilidade de articulação das
é a de que a inteligência se constrói a partir da troca do diversas propostas de explicação do fenômeno educacional.
organismo como o meio, por meio das ações do indivíduo. A Ela procura fazer uma sistematização válida de conceitos do
ação do indivíduo, pois, é centro do processo e o fator social ou fenômeno estudado. Mesmo com teorias incompletas por
educativo constitui uma condição de desenvolvimento. estarem ainda em fase de elaboração ou reelaboração, faltando
validação empírica ou confronto com o real. Lembrando ainda
- Avaliação: A avaliação terá de ser realizada a partir de as teorias não são as únicas fontes de resposta possíveis e
parâmetros extraídos da própria teoria e implicará verificar se incorrigíveis, pois (...) elas são elaboradas para explicar, de
o aluno já adquiriu noções, conservações, realizou operações, forma sistemática, determinados fenômenos, e os dados do
relações etc. O rendimento poderá ser avaliado de acordo real é que irão fornecer o critério para a sua aceitação ou não,
como a sua aproximação a uma norma qualitativa pretendida. instalando-se, assim, um processo de discussão permanente
entre teoria e prática.
E) Abordagem Sócio Cultural Mizukami ainda critica a formação de professores
Pode-se situar Paulo Freire com sua obra, enfatizando colocando que o aprendido pelos professores nada tinha a ver
aspectos sócio-político-cultural, havendo uma grande com a prática pedagógica e seu posicionamento frente ao
preocupação com a cultura popular, sendo que tal fenômeno educacional. A experiência pessoal refletiria um
preocupação vem desde a II Guerra Mundial com um aumento comportamento coerente por parte do educador, pondo fim
crescente até nossos dias. assim ao permanente processo de discussão entre teoria e
prática. Uma possível solução seria repensar os cursos de
- Homem/Mundo: O homem está inserido no contexto formação de professores, voltando as atenções principalmente
histórico. O homem é sujeito da educação, onde a ação para as disciplinas pedagógicas que analisam as abordagens
educativa promove o próprio indivíduo, como sendo único do processo ensino aprendizagem, procurando articulá-los à
dentro de uma sociedade/ambiente. prática pedagógica. Também é discutida uma forma de
aproximar cada vez mais as opções teóricas existentes
- Sociedade/Cultura: O homem alienado não se relaciona analisando e discutindo as vivências na prática e à partir da
com a realidade objetivo, como um verdadeiro sujeito prática, se pudesse discutir e criticar as opções teóricas
pensante: o pensamento é dissociado da ação. confrontando com a mesma prática. É tentar criar teorias
através da prática, analisando o cotidiano e questionando,
- Conhecimento: A elaboração e o desenvolvimento do evitando-se assim a utilização de Receituários pedagógicos,
conhecimento estão ligados ao processo de conscientização. que é o que a autora chama de seguir cegamente a teoria
ignorando a prática.
- Educação: Toda ação educativa, para que seja válida, Um curso de professores deveria possibilitar confronto
deve, necessariamente, ser precedida tanto de uma reflexão entre abordagens, quaisquer que fossem elas, entre seus
sobre o homem como de uma análise do meio de vida desse pressupostos e implicações, limites, pontos de contraste e
homem concreto, a quem se quer ajudar para que se eduque. convergência. Ao mesmo tempo, deveria possibilitar ao futuro
professor a análise do próprio fazer pedagógico, de suas
- Escola: Deve ser um local onde seja possível o implicações, pressupostos e determinantes, no sentido de que
crescimento mútuo, do professor e dos alunos, no processo de ele se conscientizasse de sua ação, para que pudesse, além de
conscientização o que indica uma escola diferente de que se interpretá-la e contextualizá-la, superá-la constantemente.
tem atualmente, coma seus currículos e prioridades. Alguns dados revelam que são preferidas pelos
professores as abordagens cognitivista e sociocultural
- Ensino/Aprendizagem: Situação de ensino- deixando as abordagens tradicional e comportamentalista em
aprendizagem deverá procurar a superação da relação segundo plano. E também que a abordagem que mais faz
opressor-oprimido. A estrutura de pensar do oprimido está sucesso neste momento histórico é a cognitivista. Na
condicionada pela contradição vivida na situação concreta, abordagem cognitivista piagetiana e a preferida pelos
existencial em que o oprimido se forma. Resultando professores, desde que o aluno se encontre em um ambiente
consequências tais como: que o solicite devidamente, e que tenha sido constatada a
A) Ser ideal é ser mais homem. ausência de distúrbios biológicos ligados
B) Atitude fatalista preponderantemente à atividade cerebral, ele terá condições
C) Atitude de auto desvalia de chegar ao estágio das operações formais. Não se justificam
D) O medo da liberdade ou a submissão do oprimido. nem se legitimam, por esta abordagem, desigualdades
baseadas nas potencialidades de cada um, tal como poderia
- Professor/Aluno: A relação entre o professor e o aluno decorrer dos princípios escola novistas. Estaria neste detalhe,
é horizontal. Professor empenhado na prática transformadora talvez de grande importância, já que o determinismo biológico
procurará desmitificar e questionar, junto com o aluno. age mais em função de determinar desenvolvimento, do que
de determinar máximos de desenvolvimento para cada sujeito,
- Metodologia: Os alunos recebem informações e analisam a ideia que despertaria maior interesse para um trabalho
os aspectos de sua própria experiência existencial, utilizando realizado por um profissional com as idiossincrasias de um
situações vivenciais de grupo, em forma de debate Paulo Freire educador.
delineou seu método de alfabetização. De forma genérica tanto o cognitivismo, humanismo e
Características: comportamentalismo apresentam aspectos escola novistas
A) Ser ativa que os colocam contra a escola tradicional. Um outro elemento
B) Criar um conteúdo pragmático próprio a ser considerado é a ligação entre o desenvolvimento
C) Enfatiza o diálogo crítico intelectual e os ideais apregoados pelo ensino tradicional
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elaborado através dos séculos. Concluindo, de todas as dirigir às causas reais, reduzindo seu esforço de expressar sua
abordagens analisadas obteve-se quase plenamente preocupação humanitária a um círculo vicioso de apontar
preferência dos professores pela abordagem cognitivista por apenas “os efeitos condenados”, dando assim prevalência aos
que esta abordagem se baseia numa teoria de limites objetivos da lógica do capital. Ao tratar da posição de
desenvolvimento em grande parte válida, e também a Robert Owen, reconhece sua posição de denúncia da
abordagem sociocultural que complementa o exploração e instrumentalização do empregado pelo
desenvolvimento humano e genético com aspectos empregador, mas condena no seu discurso – com marcas de
socioculturais e personalistas. Sendo que a abordagem parcialidade, gradualismo e circularidades – sinais de
sociocultural está impregnada de aspectos humanistas conformação aos debilitantes limites do capital.
característicos das primeiras obras de Paulo Freire. O ideário Neste caso, Mészáros observa que Owen “não pode escapar
pedagógico de alguns professores não segue nenhuma das à auto imposta camisa de força das determinações causais do
abordagens, e são classificados como tendência indefinida capital”. Numa conclusão ao tópico, o autor lembra que “[...] o
dentre as demais abordagens. sentido da mudança educacional radical não pode ser senão o
rasgar da camisa de força da lógica incorrigível do sistema”.
7. A EDUCAÇÃO PARA ALÉM DO CAPITAL A persecução de estratégias de rompimento com o
A educação para além do capital é um texto publicado a controle exercido pelo capital é explicitada na segunda seção
partir da conferência pronunciada por István Mészáros121, por do texto com a defesa de que as soluções devem ser buscadas
ocasião da abertura do Fórum Mundial de Educação, realizado não apenas na dimensão formal, mas no que é essencial. O
em Junho de 2004, em Porto Alegre. autor reconhece que a educação institucionalizada serviu, nos
O texto, partindo de três epígrafes atribuídas pelo autor a últimos 150 anos para fornecer condições técnicas e humanas
Paracelso, pensador do Século XVI, a José Martí, político, poeta à expansão do capital, ao mesmo tempo em que contribuiu
e pensador cubano, e a Marx, em Teses sobre Feuerbach, traz para instalar valores que legitimam os interesses dominantes
a análise com vistas à urgente necessidade de se instituir uma e que negam alternativas possíveis a esse modelo.
mudança que nos leve para além do capital, “no sentido Distanciando-se de uma posição reprodutivista, Assim advoga
genuíno e educacionalmente viável do termo”. que não basta simplesmente reformar o sistema escolar formal
O exame discute as relações íntimas entre processos estabelecido, porque isso traduziria apenas uma mudança
educacionais e processos sociais amplos de reprodução do institucional isolada. “O que precisa ser confrontado é todo o
capital em quatro aspectos básicos: Primeiro, no embate sistema de internalização, com todas as suas dimensões,
entre os parâmetros estruturais do capital – que se colocam visíveis e ocultas”. A internalização, entendida como o esforço
com uma lógica irreversível e incontestável – e a necessidade do capital em fazer com que cada indivíduo incorpore como
de romper com essa lógica para a criação de uma alternativa suas as metas de reprodução do sistema, legitimando sua
educacional diferente, mediante a natureza irreformável do posição na hierarquia social e conformando suas expectativas
capital como totalidade reguladora sistêmica; Segundo, na e sua conduta ao estipulado pela ordem estabelecida, insere-
clareza de que as possíveis soluções não podem ser formais, se como instrumento que conforma a totalidade das práticas
apenas como alterações superficiais, mas devem atingir o sociais, entre elas, a educação, ao interesse do capital.
patamar de mudança essencial, abarcando a totalidade das Romper com a lógica do capital na área de educação
práticas educacionais da sociedade e seus processos de equivale, portanto, a substituir as formas onipresentes e
internalização dos parâmetros reprodutivos gerais do sistema profundamente enraizadas de internalização mistificadora
do capital; Terceiro, na compreensão de que apenas uma por uma alternativa concreta abrangente. (MÉSZAROS,
ampla concepção de educação pode assegurar a luta pelo 2008)122.
objetivo de mudança radical requerida e a aquisição de A tarefa acima requerida aparece na terceira seção,
instrumentos de pressão capazes de provocar o rompimento condicionada ao fortalecimento de uma concepção de
com a lógica mistificadora do capital; Quarto, na defesa de que educação ampla e mais profunda, nos moldes de Paracelso,
o papel da educação é estratégico tanto para a mudança das vendo a “aprendizagem como nossa própria vida”.
condições objetivas de reprodução quanto para a auto Neste rumo, o autor se coloca, a exemplo de Gramsci,
mudança dos indivíduos envolvidos na luta pela construção de contra a visão tendenciosamente elitista e estreita de educação
uma nova ordem social metabólica radicalmente diferente. que pleiteia o domínio da instituição educacional formal como
Na primeira seção do texto, evidencia-se a ideia de que as único espaço de educação e define a educação e a atividade
reformulações que possam acontecer na educação são intelectual como possibilidade apenas dos que são designados
inconcebíveis sem a transformação também no quadro social. para “educar” e para governar, em detrimento da maioria, à
O autor recusa a noção de reforma que se proponha apenas a qual é reservado o papel de objeto de manipulação. Mészáros
correções marginais, mantendo intactas as estruturas assevera a posição profundamente democrática de Gramsci
fundamentais da sociedade e conformando-se às exigências da como o caminho mais claro para a concepção ampla de
lógica do capital. Para Mészáros, esta modalidade utiliza-se das educação, na qual todo ser humano contribui para a formação
reformas educacionais para apenas remediar os efeitos de uma concepção de mundo ao mesmo tempo em que pode
desastrosos da ordem produtiva, mas não elimina os contribuir para manter ou mudar esta concepção. A educação,
“fundamentos causais e profundamente enraizados”. Para o reconhecida, no seu entendimento amplo, é um processo
autor, “limitar uma mudança educacional radical às margens contínuo de aprendizagem. “Temos de reivindicar uma
corretivas interesseiras do capital significa abandonar de uma educação plena para toda a vida, para que seja possível colocar
só vez, conscientemente ou não, o objetivo de uma em perspectiva a sua parte formal, a fim de instituir, também
transformação social qualitativa”. (MÉSZAROS, 2008). aí, uma reforma radical”. A reforma significa, segundo o autor,
Exemplificando: Mészáros examina a experiência de Adam desafiar as formas atualmente dominantes de internalização
Smith, economista político, e de Roberto Owen, reformador existentes no sistema educacional formal, pôr em execução
social educacional utópico. Sobre Smith, atesta que mesmo que urgentemente uma atividade de “contra internalização”
este ilustre iluminista reconheça o impacto negativo do coerente e sustentada na direção da criação de uma alternativa
sistema sobre a classe trabalhadora, sua análise atribuindo ao ao que já existe. Significa que a educação formal precisa
“espírito comercial” a causa do problema é incapaz de se desatar-se do revestimento da lógica do capital e mover-se em
121 MÉSZAROS, István. A educação para além do capital. São Paulo: Boi Tempo 122 Mészàros –A educação para além do capital, 2ª. ed Boitempo, 2008
Editorial, 2006 (Mundo do Trabalho).
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direção a práticas educacionais mais abrangentes O bem quaisquer que fossem elas, entre seus pressupostos e
sucedido processo de redefinição da tarefa da educação formal implicações, limites, pontos de contraste e convergência. Ao
num espírito orientado para a construção de uma alternativa mesmo tempo, deveria possibilitar ao futuro professor a
hegemônica à ordem existente irá contribuir para romper com análise do próprio fazer pedagógico, de suas implicações,
a lógica do capital não somente em seu campo, mas em toda a pressupostos e determinantes, no sentido de que ele se
sociedade. conscientizasse de sua ação, para que pudesse, além de
No quarto tópico, Mészáros trata a educação como uma interpretá-la e contextualizá-la, superá-la constantemente”.
“transcendência positiva da auto alienação do trabalho”. A (MIZUKAMI, Maria da Graça Nicoletti. Ensino: as abordagens
análise atesta as condições desumanizantes da alienação em do processo. São Paulo: EPU, 1986. p. 109.)
que vivemos e afirma que, para a mudança dessa condição, Sobre as diferentes abordagens pedagógicas, aquela que
exige-se uma intervenção consciente em todos os domínios e considera a relação professor-aluno como não imposta, que
níveis da existência individual e social, “em toda a nossa permite que o educador se torne educando e a aprendizagem
maneira de ser”. O autor considera que estando na raiz de seja favorecida pela mediação é a:
todos os tipos de alienação a historicamente revelada (A) tradicional
alienação do trabalho, torna-se possível superar a alienação (B) humanista
com a reestruturação radical de nossas condições de vida (C) comportamentalista
estabelecida até então, já que o processo histórico se constitui (D) ambientalista
pelo próprio trabalho. Mas isso não pode ser apenas uma (E) sócio-histórico-cultural
questão de negação. Para Mészáros, “a tarefa histórica que
temos de enfrentar é incomensuravelmente maior que a Respostas
negação do capitalismo”123. Ir para além do capital significa a
realização de uma ordem social metabólica sem nenhuma 01. Resposta: Falso
relação nem ranços com a ordem anteriormente hegemônica. O processo de ensino é justamente o oposto, já que, é uma
Por essa razão, integração dialética entre o instrutivo e o educativo que tem
O papel da educação é soberano, tanto para a elaboração como propósito essencial contribuir para a formação integral
de estratégias apropriadas e adequadas para mudar as da personalidade do aluno.
condições objetivas de reprodução, como para a auto mudança
consciente dos indivíduos chamados a concretizar a criação de 02. Resposta: Falso
uma ordem social metabólica radicalmente diferente As características dadas remetem às características da
Para esse fim, a universalização da educação e a abordagem cognitivistas, por isso a questão é falsa. Sendo
universalização do trabalho são peças fundamentais, sem as características da abordagem comportamentalista, o
quais não pode haver solução para a auto alienação do conhecimento como uma descoberta nova realizada pelo
trabalho. Tal realização pressupõe necessariamente a indivíduo, assim para os comportamentalistas a experiência
igualdade verdadeira – substancial e não apenas formal – de ou a experimentação planejada como a base do conhecimento,
todos os seres humanos. Apenas na perspectiva de ir além do o conhecimento é o resultado direto da experiência.
capital essa universalização e igualdade podem ser vistas, 03. Resposta: Alternativa E
porque a educação para além do capital almeja uma ordem Para a autora Mizukami, o processo de ensino e
social qualitativamente diferente. aprendizagem ocorre através de uma abordagem
No nosso dilema histórico definido pela crise estrutural do sociocultural, dessa forma o professor e o aluno se colocam em
capital global, época onde se evidencia uma condição histórica uma relação horizontal, onde ambos se posicionam como
de transição, define-se também um espaço histórico e social sujeitos do ato de aprender, porém o educador tem a tarefa de
aberto à ruptura com a lógica do capital e à elaboração de conduzir o professor por meio da mediação.
planos estratégicos na direção de uma educação para além do
capital. Nesse ambiente, a tarefa educacional é uma tarefa de Educação e Novas Tecnologias124,
transformação social, ampla e emancipadora. A educação deve
ser articulada e redefinida no seu inter-relacionamento com as Muitas formas de ensinar hoje não se justificam mais.
condições cambiantes e as necessidades da transformação Perdemos tempo demais, aprendemos muito pouco, nos
social emancipadora e progressiva em curso. desmotivamos continuamente. Tanto professores como alunos
temos a clara sensação de que muitas aulas convencionais estão
Questões ultrapassadas. Mas, para onde mudar? Como ensinar e aprender
em uma sociedade mais interconectada?
01. Pode-se afirmar que: “O processo de ensino e Avançaremos mais se soubermos adaptar os programas
aprendizagem não é uma integração dialética entre o previstos às necessidades dos alunos, criando conexões com o
instrutivo e o educativo que tem como propósito essencial cotidiano, com o inesperado, se transformarmos a sala de aula
contribuir para a formação integral da personalidade do em uma comunidade de investigação.
aluno”. Ensinar e aprender exigem hoje muito mais flexibilidade
( ) Verdadeiro ( ) Falso espaço temporal, pessoal e de grupo, menos conteúdos fixos e
processos mais abertos de pesquisa e de comunicação. Uma
02. Sobre a abordagem comportamentalista, é correto das dificuldades atuais é conciliar a extensão da informação, a
afirmar que: “A organização do conhecimento, processamento variedade das fontes de acesso, com o aprofundamento da sua
de informações estilos de pensamento ou estilos cognitivos, compreensão, em espaços menos rígidos, menos engessados.
comportamentos relativos à tomada de decisões, etc.”. Temos informações demais e dificuldade em escolher quais
( ) Verdadeiro ( ) Falso são significativas para nós e conseguir integrá-las dentro da
nossa mente e da nossa vida.
03. (CEFET/RJ – Pedagogo – CESGRANRIO) O trecho
indica amplos desafios para a prática docente. “Um curso de A aquisição da informação, dos dados dependerá cada vez
professores deveria possibilitar confronto entre abordagens, menos do professor. As tecnologias podem trazer hoje dados,
123 RABELO,
C. D. Educação Para Além do Capital. Revista Resenha: A Eletrônica 124 MORAN,J. M.; MASETTO, M. T.; BEHRENS, M. A. Novas tecnologias e mediação
Arma da Crítica. N.º 4. 2012. pedagógica. Ed. Papirus.2000)
100
imagens, resumos de forma rápida e atraente. O papel do “papagaios”, que repetem o que leem e ouvem, que se deixam
professor - o papel principal - é ajudar o aluno a interpretar levar pela última moda intelectual, sem questioná-la.
esses dados, a relacioná-los, a contextualizá-los. É importante termos educadores/pais com um
Aprender depende também do aluno, de que ele esteja amadurecimento intelectual, emocional, comunicacional e
pronto, maduro, para incorporar a real significação que essa ético, que facilite todo o processo de organizar a
informação tem para ele, para incorporá-la vivencialmente, aprendizagem. Pessoas abertas, sensíveis, humanas, que
emocionalmente. Enquanto a informação não fizer parte do valorizem mais a busca que o resultado pronto, o estímulo que
contexto pessoal - intelectual e emocional - não se tornará a repreensão, o apoio que a crítica, capazes de estabelecer
verdadeiramente significativa, não será aprendida formas democráticas de pesquisa e de comunicação.
verdadeiramente.
Avançaremos mais pela educação positiva do que pela As mudanças na educação dependem também de termos
repressiva. É importante não começar pelos problemas, pelos administradores, diretores e coordenadores mais abertos, que
erros, não começar pelo negativo, pelos limites. E sim começar entendam todas as dimensões que estão envolvidas no
pelo positivo, pelo incentivo, pela esperança, pelo apoio na processo pedagógico, além das empresariais ligadas ao lucro;
nossa capacidade de aprender e de mudar. que apoiem os professores inovadores, que equilibrem o
Ajudar o aluno a que acredite em si, que se sinta seguro, gerenciamento empresarial, tecnológico e o humano,
que se valorize como pessoa, que se aceite plenamente em contribuindo para que haja um ambiente de maior inovação,
todas as dimensões da sua vida. Se o aluno acredita em si, será intercâmbio e comunicação.
mais fácil trabalhar os limites, a disciplina, o equilíbrio entre As mudanças na educação dependem também dos alunos.
direitos e deveres, a dimensão grupal e social. Alunos curiosos, motivados, facilitam enormemente o
processo, estimulam as melhores qualidades do professor,
As dificuldades para mudar na educação tornam-se interlocutores lúcidos e parceiros de caminhada do
As mudanças demorarão mais do que alguns pensam, professor-educador.
porque nos encontramos em processos desiguais de Alunos motivados aprendem e ensinam, avançam mais,
aprendizagem e evolução pessoal e social. Não temos muitas ajudam o professor a ajuda-los melhor. Alunos que provêm de
instituições e pessoas que desenvolvam formas avançadas de famílias abertas, que apoiam as mudanças, que estimulam
compreensão e integração, que possam servir como afetivamente os filhos, que desenvolvem ambientes
referência. Predomina a média, a ênfase no intelectual, a culturalmente ricos, aprendem mais rapidamente, crescem
separação entre a teoria e a prática. mais confiantes e se tornam pessoas mais produtivas.
Temos grandes dificuldades no gerenciamento emocional,
tanto no pessoal como no organizacional, o que dificulta o Integrar os meios de comunicação na escola
aprendizado rápido. São poucos os modelos vivos de Antes da criança chegar à escola, já passou por processos
aprendizagem integradora, que junta teoria e prática, que de educação importantes: pelo familiar e pela mídia eletrônica.
aproxima o pensar do viver. No ambiente familiar, mais ou menos rico cultural e
A ética permanece contraditória entre a teoria e a prática. emocionalmente, a criança vai desenvolvendo as suas
Os meios de comunicação mostram com frequência como conexões cerebrais, os seus roteiros mentais, emocionais e
alguns governantes, empresários, políticos e outros grupos de suas linguagens. Os pais, principalmente a mãe, facilitam ou
elite agem impunemente. Muitos adultos falam uma coisa – complicam, com suas atitudes e formas de comunicação mais
respeitar as leis - e praticam outra, deixando confusos os ou menos maduras, o processo de aprender a aprender dos
alunos e levando-os a imitar mais tarde esses modelos. seus filhos.
O autoritarismo da maior parte das relações humanas A criança também é educada pela mídia, principalmente
interpessoais, grupais e organizacionais espelha o estágio pela televisão. Aprende a informar-se, a conhecer - os outros,
atrasado em que nos encontramos individual e coletivamente o mundo, a si mesmo - a sentir, a fantasiar, a relaxar, vendo,
de desenvolvimento humano, de equilíbrio pessoal, de ouvindo, “tocando” as pessoas na tela, que lhe mostram como
amadurecimento social. E somente podemos educar para a viver, ser feliz e infeliz, amar e odiar. A relação com a mídia
autonomia, para a liberdade com processos eletrônica é prazerosa - ninguém obriga - é feita através da
fundamentalmente participativos, interativos, libertadores, sedução, da emoção, da exploração sensorial, da narrativa -
que respeitem as diferenças, que incentivem, que apoiem, aprendemos vendo as estórias dos outros e as estórias que os
orientados por pessoas e organizações livres. outros nos contam. Mesmo durante o período escolar a mídia
As mudanças na educação dependem, em primeiro lugar, mostra o mundo de outra forma - mais fácil, agradável,
de termos educadores maduros intelectual e emocionalmente, compacta - sem precisar fazer esforço. Ela fala do cotidiano,
pessoas curiosas, entusiasmadas, abertas, que saibam motivar dos sentimentos, das novidades. A mídia continua educando
e dialogar. Pessoas com as quais valha a pena entrar em como contraponto à educação convencional, educa enquanto
contato, porque dele saímos enriquecidos. estamos entretidos.
O educador autêntico é humilde e confiante. Mostra o que Os Meios de Comunicação, principalmente a televisão,
sabe e, ao mesmo tempo está atento ao que não sabe, ao novo. desenvolvem formas sofisticadas multidimensionais de
Mostra para o aluno a complexidade do aprender, a nossa comunicação sensorial, emocional e racional, superpondo
ignorância, as nossas dificuldades. Ensina, aprendendo a linguagens e mensagens, que facilitam a interação, com o
relativizar, a valorizar a diferença, a aceitar o provisório. público. A TV fala primeiro do "sentimento" - o que você
Aprender é passar da incerteza a uma certeza provisória que sentiu", não o que você conheceu; as ideias estão embutidas na
dá lugar a novas descobertas e a novas sínteses. roupagem sensorial, intuitiva e afetiva.
Os grandes educadores atraem não só pelas suas ideias, Os Meios de Comunicação operam imediatamente com o
mas pelo contato pessoal. Dentro ou fora da aula chamam a sensível, o concreto, principalmente, a imagem em movimento.
atenção. Há sempre algo surpreendente, diferente no que Combinam a dimensão espacial com a cinestésica, onde o
dizem, nas relações que estabelecem, na sua forma de olhar, na ritmo torna-se cada vez mais alucinante (como nos
forma de comunicar-se, de agir. São um poço inesgotável de videoclipes). Ao mesmo tempo utilizam a linguagem
descobertas. conceitual, falada e escrita, mais formalizada e racional.
Enquanto isso, boa parte dos professores é previsível, não Imagem, palavra e música se integram dentro de um contexto
nos surpreende; repete fórmulas, sínteses. São docentes
101
comunicacional afetivo, de forte impacto emocional, que uma imagem me impressiona, é verdadeira"). Também é muito
facilita e predispõe a aceitar mais facilmente as mensagens. comum a lógica de generalizar a partir de uma situação
concreta. Do individual, tendemos ao geral. Uma situação
A eficácia de comunicação dos meios eletrônicos, em isolada converte-se em situação paradigmática, padrão. A
particular da televisão, se deve também à capacidade de televisão, principalmente, transita continuamente entre as
articulação, de superposição e de combinação de linguagens situações concretas e a generalização. Mostra dois ou três
totalmente diferentes - imagens, falas, música, escrita - com escândalos na família real inglesa e tira conclusões sobre o
uma narrativa fluida, uma lógica pouco delimitada, gêneros, valor e a ética da realeza como um todo.
conteúdos e limites éticos pouco precisos, o que lhe permite Ao mesmo tempo, o não mostrar equivale a não existir, a
alto grau de entropia, de interferências por parte de não acontecer. O que não se vê, perde existência. Um fato
concessionários, produtores e consumidores. mostrado com imagem e palavra tem mais força que se
A televisão combina imagens estáticas e dinâmicas, somente é mostrado com palavra. Muitas situações
imagens ao vivo e gravadas, imagens de captação imediata, importantes do cotidiano perdem força, por não ter sido
imagens referenciais (registradas diretamente com a câmara) valorizadas pela imagem-palavra televisiva.
com imagens criadas por um artista no computador. Junta A educação escolar precisa compreender e incorporar
imagens sem ligação referencial (não relacionadas com o real) mais as novas linguagens, desvendar os seus códigos, dominar
com imagens "reais" do passado (arquivo, documentários) e as as possibilidades de expressão e as possíveis manipulações. É
mistura com imagens "reais" do presente e imagens do importante educar para usos democráticos, mais progressistas
passado não “reais”. e participativos das tecnologias, que facilitem a evolução dos
A imagem na televisão, cinema e vídeo é sensorial, indivíduos. O poder público pode propiciar o acesso de todos
sensacional e tem um grande componente subliminar, isto é, os alunos às tecnologias de comunicação como uma forma
passa muitas informações que não captamos claramente. paliativa, mas necessária de oferecer melhores oportunidades
O olho nunca consegue captar toda a informação. Então aos pobres, e também para contrabalançar o poder dos grupos
escolhe um nível que dê conta do essencial, do suficiente para empresariais e neutralizar tentativas ou projetos autoritários.
dar um sentido ao caos, de organizar a multiplicidade de Se a educação fundamental é feita pelos pais e pela mídia,
sensações e dados. Foca a atenção, em alguns aspectos urgem ações de apoio aos pais para que incentivem a
analógicos, nas figuras destacadas, nas que se movem e com aprendizagem dos filhos desde o começo das vidas deles,
isso conseguimos acompanhar uma estória. Mas deixamos de através do estímulo, das interações, do afeto. Quando a criança
lado, inúmeras informações visuais e sensoriais, que não são chega à escola, os processos fundamentais de aprendizagem já
percebidas conscientemente. A força da linguagem audiovisual estão desenvolvidos de forma significativa. Urge também a
está em que consegue dizer muito mais do que captamos, educação para as mídias, para compreendê-las, criticá-las e
chegar simultaneamente por muitos mais caminhos do que utilizá-las da forma mais abrangente possível.
conscientemente percebemos e encontra dentro de nós uma
repercussão em imagens básicas, centrais, simbólicas, Preparar os professores para a utilização do computador e
arquetípicas, com as quais nos identificamos ou que se da Internet
relacionam conosco de alguma forma - O primeiro passo é facilitar o acesso dos professores e dos
alunos ao computador e à Internet. Procurar de todas as
É uma comunicação poderosa, como nunca antes a tivemos formas possíveis que todos possam ter o acesso mais fácil,
na história da humanidade e as novas tecnologias de frequente e personalizado possível às novas tecnologias. Ter
multimídia e realidade virtual só estão tornando esse processo salas de aula conectadas, salas ambiente para pesquisa,
de simulação muito mais exacerbado, explorando-o até limites laboratórios bem equipados. Facilitar que os professores
inimagináveis. possam ter seus próprios computadores. Facilitar que cada
A organização da narrativa televisiva, principalmente a aluno possa ter um computador pessoal portátil. Sabemos que
visual, não se baseia somente - e muitas vezes, não esta situação no Brasil é atualmente uma utopia, mas hoje o
primordialmente- na lógica convencional, na coerência ensino de qualidade passa também necessariamente pelo
interna, na relação causa-efeito, no princípio de não- acesso rápido, contínuo e abrangente a todas as tecnologias,
contradição, mas numa lógica mais intuitiva, mais conectiva. principalmente às telemáticas.
Imagens, palavras e música vão se agrupando segundo Um dos projetos políticos mais importantes é que a
critérios menos rígidos, mais livres e subjetivos dos sociedade encontre formas de diminuir a distância que
produtores que pressupõem um tipo de lógica da recepção separa no acesso à informação entre os que podem e os
também menos racional, mais intuitiva. que não podem pagar por ela. As escolas públicas,
Um dos critérios principais é a contiguidade a justaposição comunidades carentes precisam ter esse acesso garantido
por algum tipo de analogia, de associação por semelhança ou para não ficarem condenadas à segregação definitiva, ao
por oposição, por contraste. Ao colocar pedaços de imagens ou analfabetismo tecnológico, ao ensino de quinta classe.
cenas juntas, em sequência, criam-se novas relações, novos - O segundo passo é ajudar na familiarização com o
significados, que antes não existiam e que passam a ser computador, com seus aplicativos e com a Internet. Aprender
considerados aceitáveis, "naturais", "normais". Colocando, por a utilizá-lo no nível básico, como ferramenta. No nível mais
exemplo, várias matérias em sequência, num mesmo bloco e avançado: dominar as ferramentas da WEB, do e-mail.
em dias sucessivos - como se fossem capítulos de uma novela Aprender a pesquisar nos search, a participar de listas de
-, sobre o assassinato de uma atriz, o de várias crianças e discussão, a construir páginas.
outros crimes semelhantes, acontecidos no Brasil e em outros - O nível seguinte é auxiliar os professores na utilização
países, multiplica-se a reação de indignação da população, o pedagógica da Internet e dos programas multimídia. Ensiná-
seu desejo de vingança. Isto favorece os defensores da pena de los a fazer pesquisa.
morte; o que não estava explícito em cada reportagem e nem Começar pela pesquisa aberta, onde há liberdade de
talvez fosse a intenção dos produtores. escolha do lugar (tema pesquisado livremente) e pesquisa
dirigida, focada para um endereço específico ou um site
A televisão estabelece uma conexão aparentemente lógica determinado. Pesquisa nos sites de busca, nos bancos de
entre mostrar e demonstrar. Mostrar é igual a demonstrar, a dados, nas bibliotecas virtuais, nos centros de referência.
provar, a comprovar. A força da imagem é tão evidente que Pesquisa dos temas mais gerais para os mais específicos,
torna-se difícil não fazer essa associação comprovatória ("se pesquisa grupal e pessoal.
102
- A internet pode ser utilizada em um projeto isolado de Sala de aula interativa
uma classe, como algo complementar ou um projeto Outro termo bem utilizado para usos da tecnologia é o de
voluntário, com alunos se inscrevendo. A Internet pode ser um sala de aula interativa. Vem do iluminismo a crença na escola
projeto entre vários colégios ou grupos, na mesma cidade, de como lugar destinado a formar cidadãos esclarecidos,
várias cidades ou países. O projeto pode evoluir para a senhores do seu próprio destino. Entretanto a sala de aula
interdisciplinaridade, integrando várias áreas e professores. A convive tradicionalmente com um impedimento de base ao
Internet pode fazer parte de um projeto institucional, que seu propósito primordial de educar para a cidadania. Ela não
envolve toda a escola de forma mais colaborativa. contempla a participação do aluno na construção do
A escola pode utilizar a Internet em uma sala especial ou conhecimento e da própria comunicação. O grande discurso
laboratório, onde os alunos se deslocam especialmente, em moderno centrado na educação escolar sempre conviveu esse
períodos determinados, diferentes da sala de aula impedimento: o peso de uma tradição bem formulada por
convencional. A internet também pode ser utilizada na sala de Pierre Lévy quando diz: “a escola é uma instituição que há
aula conectada, só pelo professor, como uma tecnologia cinco mil anos se baseia no falar-ditar do mestre”.
complementar do professor ou pode ser utilizada também Nos livros Pedagogia do oprimido, Educação e mudança, e
pelos alunos conectados através de notebooks na mesma sala A importância do ato de ler, Paulo Freire faz críticas à
de aula, sem deslocamento. transmissão como sendo o modelo mais identificado como
prática de ensino e menos habilitado a educar. Cito algumas:
Alguns caminhos para integrar as tecnologias num ensino “O professor ainda é um ser superior que ensina a ignorantes.
inovador Isto forma uma consciência bancária [sedentária, passiva]. O
Na sociedade da informação, todos estamos reaprendendo educando recebe passivamente os conhecimentos, tornando-
a conhecer, a comunicar-nos, a ensinar; reaprendendo a se um depósito do educador. Educa-se para arquivar o que se
integrar o humano e o tecnológico; a integrar o individual, o deposita.”; “Quem apenas fala e jamais ouve; quem ‘imobiliza’
grupal e o social. o conhecimento e o transfere a estudantes, não importa se de
É importante conectar sempre o ensino com a vida do escolas primárias ou universitárias; quem ouve o eco, apenas
aluno. Chegar ao aluno por todos os caminhos possíveis: pela de suas próprias palavras, numa espécie de narcisismo oral;
experiência, pela imagem, pelo som, pela representação (...) não tem realmente nada que ver com libertação nem
(dramatizações, simulações), pela multimídia, pela interação democracia.”;
on line e off line. “Ensinar não é a simples transmissão do conhecimento em
Partir de onde o aluno está. Ajuda-lo a ir do concreto ao torno do objeto ou do conteúdo. Transmissão que se faz muito
abstrato, do imediato para o contexto, do vivencial para o mais através da pura descrição do conceito do objeto a ser
intelectual. Os professores, diretores, administradores terão mecanicamente memorizado pelos alunos.”
que estar permanentemente em processo de atualização P. Freire não desenvolveu uma teoria da comunicação que
através de cursos virtuais, de grupos de discussão dê conta de sua crítica à transmissão. No entanto, deixou seu
significativos, participando de projetos colaborativos dentro e legado que garante ao conceito de interatividade a exigência
fora das instituições em que trabalham. da participação daquele que deixa o lugar da recepção para
Tanto nos cursos convencionais como nos à distância experimentar a cocriação.
teremos que aprender a lidar com a informação e o A sala de aula presencial e à distância segue os três
conhecimento de formas novas, pesquisando muito e fundamentos citados anteriormente. Entretanto, é preciso
comunicando-nos constantemente. Isso nos fará avançar mais considerar que a distinção “presencial” e “à distância” será
rapidamente na compreensão integral dos assuntos cada vez menos pertinente quanto mais se popularizarem as
específicos, integrando-os num contexto pessoal, emocional e tecnologias digitais. As duas modalidades coexistirão: o uso da
intelectual mais rico e transformador. Assim poderemos web, dos suportes multimídia e a sala de aula tradicional com
aprender a mudar nossas ideias, sentimentos e valores onde professor e alunos frente a frente. O aluno terá a aula na escola,
se fizer necessário. na universidade, e terá também o site da disciplina com
exercícios e novas proposições configurando a sala de aula
Necessitamos de muitas pessoas livres nas escolas que virtual. Porém é certo que esteja apenas iniciando a
modifiquem as estruturas arcaicas, autoritárias do ensino – proliferação do “ensino exclusivamente à distância” via
escolar e gerencial - Só pessoas livres, autônomas - ou em Internet.
processo de libertação - podem educar para a liberdade,
podem educar para a autonomia, podem transformar a Para promover a sala de aula interativa o professor
sociedade. Só pessoas livres merecem o diploma de educador. precisa desenvolver pelo menos cinco habilidades entre
Faremos com as tecnologias mais avançadas o mesmo que outras:
fazemos conosco, com os outros, com a vida. Se somos pessoas 1. Pressupor a participação-intervenção dos alunos, sabendo
abertas, as utilizaremos para comunicar-nos mais, para que participar é muito mais que responder “sim” ou “não”, é
interagir melhor. Se somos pessoas fechadas, desconfiadas, muito mais que escolher uma opção dada; participar é atuar na
utilizaremos as tecnologias de forma defensiva, superficial. Se construção do conhecimento e da comunicação;
somos pessoas autoritárias, utilizaremos as tecnologias para 2. Garantir a bidirecionalidade da emissão e recepção,
controlar, para aumentar o nosso poder. O poder de interação sabendo que a comunicação e a aprendizagem são produção
não está fundamentalmente nas tecnologias mas nas nossas conjunta do professor e dos alunos;
mentes. 3. Disponibilizar múltiplas redes articulatórias, sabendo que
Ensinar com as novas mídias será uma revolução, se não se propõe uma mensagem fechada, ao contrário, se oferece
mudarmos simultaneamente os paradigmas convencionais do informações em redes de conexões permitindo ao receptor
ensino, que mantêm distantes professores e alunos. Caso ampla liberdade de associações, de significações;
contrário conseguiremos dar um verniz de modernidade, sem 4. Engendrar a cooperação, sabendo que a comunicação e o
mexer no essencial. A Internet é um novo meio de conhecimento se constroem entre alunos e professor como co-
comunicação, ainda incipiente, mas que pode ajudar-nos a criação e não no trabalho solitário;
rever, a ampliar e a modificar muitas das formas atuais de 5. Suscitar a expressão e a confrontação das subjetividades,
ensinar e de aprender. sabendo que a fala livre e plural supõe lidar com as diferenças
na construção da tolerância e da democracia.
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Estas são habilidades necessárias para o professor distância poderá ajudar os participantes a equilibrar as
aproveitar ao máximo o potencial das novas tecnologias em necessidades e habilidades pessoais com a participação em
sala de aula. Contudo não se destinam somente à sala de aula grupos-presenciais e virtuais.
“inforrica”. Pois, uma vez que interatividade é conceito de
comunicação e não de informática, tais habilidades são Alguns problemas no uso da Internet na educação
necessárias também para o professor que quer modificar sua O avanço e o desenvolvimento tecnológico impulsionaram
postura comunicacional na sala “infopobre”. e estão transformando a maneira de ensinar e aprender. Além
disso, o intenso ritmo do mundo globalizado e a complexidade
crescente de tarefas que envolvem informação e tecnologia
Alguns problemas no uso da Internet na educação fazem com que o processo educativo não possa ser
Os dados e informações são muitos, e, portanto gera uma considerado uma atividade primordial. Dessa forma, afirma-se
certa confusão entre informação e conhecimento. que a demanda educativa deixou de ser exclusivamente de
Na informação os dados organizam-se dentro de uma uma faixa etária que frequenta as escolas para ser necessidade
lógica, de uma estrutura determinada. do público em geral que necessitam estar continuamente
Conhecimento é integrar a informação no nosso atualizados para o competitivo mundo do trabalho.
referencial tornando-a significativa para nós. Alguns alunos Nos últimos anos, os Ambientes Virtuais de Aprendizagem
estão acostumados a receber tudo pronto do professor e, (AVAs) estão sendo cada vez mais utilizados no âmbito
portanto não aceitam esta mudança na forma de ensinar. acadêmico e corporativo como uma opção tecnológica para
Também há os professores que não aceitam o ensino atender uma demanda educacional. A partir disso, verifica-se
multimídia, porque parece um modo de ficar brincando de a importância de um entendimento mais crítico sobre o
aula.... conceito que orienta o desenvolvimento ou o uso desses
Na navegação muitos alunos se perdem pelas inúmeras ambientes, assim como, o tipo de estrutura humana e
possibilidades de navegação e acabam se dispersando. Deve- tecnológica que oferece suporte ao processo ensino-
se orientá-los a selecionar, comparar, sintetizar o que é mais aprendizagem.
relevante, possibilitando um aprofundamento maior e um
conhecimento significativo. Em termos conceituais, os AVAs consistem em mídias
que utilizam o ciberespaço para veicular conteúdos e
Mudanças no ensino presencial com tecnologia permitir interação entre os atores do processo educativo.
Muitos alunos já começam a utilizar o notebook para Dessa forma, a qualidade do processo educativo depende
pesquisa, para solução de problemas. O professor também do envolvimento do aprendiz, da proposta pedagógica,
acompanha esta mudança motivando os alunos através dos dos materiais veiculados, da estrutura e qualidade de
avanços tecnológicos. Teremos com esta atitude mais professores, tutores, monitores e equipe técnica, assim
ambientes de pesquisa grupal e individual em cada escola; ex: como das ferramentas e recursos tecnológicos utilizados
as bibliotecas transformam-se em espaços de integração de no ambiente.
mídias e banco de dados.
Com isto haverá mais participação no processo de Em consonância com essa evolução e realidade
comunicação, tornando a relação professor/aluno mais aberta educacional, e na tentativa de alinhar as produções de
e interativa, mais integração entre sociedade e a escola, entre materiais didáticos que servissem como referenciais para
aprendizagem e a vida. as mais variadas ofertas de cursos na modalidade em
Quando vale a pena encontrar-nos na sala de aula? educação a distância, o Ministério da Educação, conceitua
Aprendemos e ensinamos com programas que apresentam Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs) como:
o melhor da educação presencial com as novas formas virtuais; programas que permitem o armazenamento, a
porém há momentos que precisamos encontrar-nos administração e a disponibilização de conteúdos no
fisicamente, em geral no começo e no final de um assunto ou formato Web. Dentre esses, destacam-se: aulas virtuais,
curso. objetos de aprendizagem, simuladores, fóruns, salas de
bate-papo, conexões a materiais externos, atividades
Equilibrar o presencial e o virtual interativas, tarefas virtuais (webquest), modeladores,
Dificuldades no ensino presencial não serão resolvidos animações, textos colaborativos (wiki).
com o virtual. Unir os dois modos de comunicação o presencial
e o virtual e valorizando o melhor de cada um é a solução. Pode-se dizer que Ambiente Virtual de Aprendizagem
As atividades que fazemos no presencial como (AVA) consiste em uma excelente opção de mídia que está
comunidades, criação de grupos afins. Definir objetivos, sendo utilizada para mediar o processo ensinoaprendizagem a
conteúdos, formas de pesquisas e outras informações iniciais. distância. Segundo MCKIMM, JOLLIE e CANTILLON: consiste
A comunicação virtual permite interações espaço-temporais em um conjunto de ferramentas eletrônicas voltadas ao
mais livres, adaptação a ritmos diferentes dos alunos novos processo ensino-aprendizagem. Os principais componentes
contatos com pessoas semelhantes, mas distantes, maior incluem sistemas que podem organizar conteúdos,
liberdade de expressão à distância. acompanhar atividades e, fornecer ao estudante suporte on-
Com o processo virtual o conceito de curso, de aula line e comunicação eletrônica.
também muda. As crianças têm mais necessidade do contato Sendo assim, para que o processo ensino-aprendizagem
físico para ajudar na socialização, mas nos cursos médios e flua de forma significativa para as interações professor-aluno,
superiores, o virtual superará o presencial. Menos salas de pode-se dizer que o design do material consiste em um dos
aulas e mais salas ambientes, de pesquisa, de encontro, aspectos essenciais. Fatores como tecnologia, interação,
interconectadas. cooperação e colaboração entre aprendizes, professores e
tutores contribuem para a efetividade do ensino e,
Tecnologias na educação a distância consequentemente da aprendizagem.
Muitas organizações estão se limitando a transpor para o Os AVAs provêm recursos para dispor grande parte dos
virtual, adaptações do ensino presencial. Começamos a passar materiais didáticos nos mais diferentes formatos, podendo ser
dos modelos individuais para os grupais. A educação a elaborados na forma escrita, hipertextual, oral ou audiovisual.
distância mudará de concepção, de individualista para mais Pode-se dizer que os recursos digitais e impressos adequados
grupal, de isolada para participação em grupos. Educação a
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para AVAs devem ser cuidadosamente planejados pela equipe coletiva, desenvolver habilidade de construção de
de projeto considerando seu público-alvo. conhecimento, motivar a aprendizagem sem fim. Segundo
Maison e Rennie dão o exemplo de como se poderia usar a wiki
É interessante, portanto, observar algumas nessa direção:
recomendações para o desenvolvimento do material didático, (I) Desenvolver projetos de pesquisa – usando wiki para
entre elas: documentação em andamento do trabalho;
- utilizar hipertextos; (II) construindo uma bibliografia anotada, colaborativa –
- utilizar textos impressos em forma de apostilas, com usando links para prescrever leitura e também para notas
recursos gráficos e imagens; sumariadas na leitura;
- disponibilizar, previamente, um resumo auditivo do (III) publicar recursos do curso – professores podem
material para ajudar na recomendação de maneira a conduzir postar material de sala de aula e os estudantes podem postar
a formação de conceito; comentários sobre este material para serem compartilhados
- não subestimar o uso de CDs e DVDs por serem com todos;
tecnologias de mão única, pois esses possibilitam o controle (IV) mapear conceitos – ideias podem ser postadas e
total do aprendiz, além de facilitarem o acesso e serem de editadas para produzir uma rede conectada de recursos;
baixo custo; (V) como ferramenta de apresentação – fotos, diagramas e
- fazer uso da voz humana quando possível, pois essa é uma comentário podem ser apresentados na wiki, e depois
excelente ferramenta pedagógica; subsequentemente editados para produzir versão revisada;
- oferecer a opção de áudio junto com material textual a fim (VI) para autoria grupal – criando e editando um
de ativar mais de um canal sensorial no processo de documento único por muitos autores que represente as visões
aprendizagem, contemplando assim, diferentes perfis de de cada indivíduo, mas atinge um consenso.
aprendizes;
- disponibilizar videoconferência para possibilitar a Torna-se claro que o desafio formativo é a razão maior de
interação de pessoas e grupos dispersos geograficamente em ser deste recurso. O wiki é uma solução alternativa aos modos
tempo real; face a face tradicionais, com vantagem de ser assíncrona e
- utilizar simulações e animações de forma a facilitar o deixar rastro da participação dos usuários. É colaborativo,
ensino de conceitos abstratos e poucos conhecidos, além aberto, tendo como objetivo a construção coletiva de um texto
daqueles que necessitam de muito tempo de ensino, oferecem ou produção comum, de cuja autoria todos participam, não
perigo e são inacessíveis devido aos altos custos e à distância. existindo propriamente uma versão final. A premissa
fundamental na utilização da wiki é a crença na construção
Ainda reforçando os referenciais para a construção de compartilhada do conhecimento, algo fundamental para
Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVAs) e com a aprender bem, nesse sentido a proposta é centrada no
finalidade de atender as quatro fases para que o aprendizado aprendiz e no seu desenvolvimento cognitivo.
significativo aconteça, é necessário observar as estratégias de
atenção, relevância, confiança e satisfação. Segundo ALLY: Os blogs, em geral em formato de diário, com o último
- Atenção: colocar uma atividade inicial para registro sempre posicionado no topo, permite a divulgação de
desenvolver o processo ensino-aprendizagem; textos multimodais com a possibilidade de serem comentados
- Relevância: esclarecer a importância da lição, livremente. Seu uso é muito variado, indo desde apresentações
mostrar que essa pode ser benéfica para usar em pessoais e tópicas até propostas acadêmicas, o que vai
situações da vida real, visa contextualizar e ser mais variando os comentários postados. Pode servir facilmente
significativa de maneira a manter o interesse; para expor textos à avaliação de pares, provocando feedback
- Confiança: assegurar ao aprendiz que ele obterá êxito rápido e atualizado. Uma de suas particularidades mais
nas atividades através da organização do material do apreciadas é estender a discussão além da sala de aula, na qual
simples para o complexo, do conhecido para o vale a força sem força do melhor argumento. Talvez esse seja
desconhecido, informar o que se espera da lição, manter o o seu efeito pedagógico mais notável: empurrar os
acompanhamento e o estímulo; participantes para a autoridade do argumento, já que não há
- Satisfação: fornecer feedback do desempenho, como inventar autoridade indiscutível. Não se imagina chegar
estimular a aplicação do conhecimento na vida real. um ponto indiscutível, mas um processo aberto de discussão
Para auxiliar no processo do aprendizado significativo, é criativa. Todo blog interessante mantém-se atualizado, ou seja,
necessário que AVAs sejam dotados de várias mídias, como renova-se periodicamente.
vídeo, áudio, gráficos, textos, dos quais apresentam inúmeras
vantagens dentre elas, promover o desenvolvimento de Assim como todo recurso disponível na internet, o blog
habilidade e formação de conceitos, possibilitar inúmeras pode ser abusado ou inócuo. Dentre esses abusos pode-se
modalidades de aprendizagem, aumentar a interatividade, divulgar banalidades ou apresentações personalistas e os
facultar a individualidade, podendo o aluno administrar o seu comentaristas podem ser fúteis também. Mas também são
tempo, permitir aos alunos maior compreensão dos observáveis as virtudes desse recurso. Alguns professores
conteúdos, pois utiliza várias mídias e não apenas textos, utilizam para debater e divulgar as suas ideias, orientar seus
facilitar a aprendizagem por meio de palavras utilizadas alunos, participar de interações com outros colegas, informar
simultaneamente e ajudar no aprendizado, pois utiliza a comunidade interessada nos temas debatidos. Pode-se usar
animação e narração audível que é mais consistente do que o blog como lugar preferencial para testar ideias e textos, antes
animação e texto em tela. de serem publicados por outras vias. O blog é um recurso
Muitas são as ferramentas disponíveis para permitir a poderoso contra ideias fixas. Embora não precise substituir a
aprendizagem significativa em AVAs, das quais podemos citar: sala de aula, a complementa bem, à medida que pode inserir
blogs, wikis, podcasts, e-portfolios, social networking, social textos e informações adicionais, motivar os alunos a
bookmarking, photo sharing, second life, online forums, vídeo comentarem textos e produções, formar comunidades de
messaging, YouTube, audiographics, dentre outras. prática em torno de temas de interesse coletivo. O blog tem um
Dessa forma, é salutar discutir as propriedades lado mais individual, porque é conduzido pelo autor apenas,
pedagógicas possíveis que favorecem o desafio de aprender sem interferência do público, a não ser comentar. Nesse
bem. Em AVAs pretende-se fomentar nos alunos, habilidades sentido, fomenta a produção individual.
de aprendizagem autônoma, embora preferencialmente
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O podcasting fundamentalmente é um arquivo de áudio participantes. Tais fios ficam salvos para posterior uso e
que pode ser baixado e escutado num aparelho de iPod ou conferência.
MP3, permitindo estudo móvel, ou num computador ou laptop Com respeito a fins educacionais, o desafio é de motivar
para estudo localizado. O podcasting pode representar atividades questionadoras que se inspirem na autoridade do
oportunidade pertinente para subsidiar estudantes em termos argumento, em ambiente aberto, livre, mas civilizado. Não é
de criação multimodal de conteúdo em projetos únicos de fácil criar senso de comunidade, evitando-se os extremos das
aprendizagem. Os estudantes atingem níveis demais elevados adesões simplórias e das agressões predatórias. No entanto,
de participação ativa, tornando-se mais visivelmente atores de quando se consegue esse senso de comunidade, em geral os
suas propostas. Aparecem formas mais sofisticadas de autoria, estudantes confirmam aprender melhor. Há outros problemas,
não só porque se mesclam ferramentas e dinâmicas, mas como risco de dispersão (mensagens fora do lugar) e
principalmente porque exigem-se scripts mais elaborados e superficialidade, perdendo-se o tom de “questionamento” em
inteligentes. profundidade. Não há como propriamente garantir a
Os estudantes podem conduzir histórias orais e criar qualidade, porque depende do ambiente criado favorável, sem
produtos que podem ser usados em seus trabalhos escolares. falar que a participação tende a ser díspar: alguns participam
Podem envolver-se em reportagens, interpretação histórica ou muito (por vezes demais), enquanto outros se mantêm a
narrativas científicas. Podem-se fazer podcast de distância. Essas cautelas, entretanto, só fazem aumentar o
apresentações especiais de professores, não no sentido de interesse pedagógico por discussões bem feitas, aliando
gravar aulas, mas de montar cenários de registro eletrônico de capacidade de expressão e elaboração.
contribuições docentes consideradas excelentes. A
importância do podcast é em relação a possibilidade dos As possibilidades disponíveis para utilização em AVAs é
estudantes fazerem produções próprias multimodais cada vez numerosa. O importante é dar-se conta de suas
mais criativas. potencialidades em termos de aprimorar as chances de autoria
e as atitudes pedagógicas dos estudantes, dos professores e
O e-portfolios são coleções eletrônicas de documentos e das instituições educacionais e fazer o uso apropriado desse
outros objetos que sustentam necessidades individuais dos recurso que pode proporcionar a aprendizagem significativa
estudantes com respeito ao que está sendo transmitido no para qualquer usuário, independente de idade desde que bem
curso. Em grande parte, são usados para comprovar a programado por instituições educacionais. Convém ressaltar
trajetória de estudo e avaliação, em ritmo sempre atualizado, aqui a divisão entre comunicação assíncrona, ou seja, sem a
e como forma também pessoal em termos de curriculum vitae. participação simultânea ex. correio eletrônico, fórum, etc. e
Primeiro o desafio é envolver os estudantes no sentido que comunicação síncrona, ou seja, em tempo real. Ex. o chat e a
saibam manter e atualizar seus e-portfolios. videoconferência.
A ideia mais produtiva parece ser a construção de
ambiente que incite o estudante a tomar conta Muitos são os recursos e as estratégias utilizadas para
autonomamente de sua vida estudantil. Deve servir de tentar envolver os aprendizes em atividades
referência sempre aberta e provocativa de recriação da vida significativas: alguns preferem a noção de aprendizagem
acadêmica. por problematização, outros pela construção de hipóteses
de como funciona a realidade; outros ainda pela
O social bookmarking tem seus efeitos no uso educacional aprendizagem situada, usando para tanto simulações
sendo a primeira utilidade de permitir a grupos montarem virtuais: embora sejam simulações, podem simular a
uma rede para partilhar recursos considerados relevantes realidade de tal forma que pareça mais real que o real. O
durante a construção de algum projeto. Representa que se busca principalmente na utilização desses recursos
ferramenta ideal para processos de pesquisa, pois possibilita em AVAs é a autonomia para criação, a capacidade de ter
seguir pegadas de materiais e comentários online. proposta própria, saber desconstruir e reconstruir
Em termos educacionais, Flickr contém montanhas de conhecimento, argumentar e contra-argumentar, saber
imagens interessantes para todo possível uso escolar e ler e contra-ler. O que mais se busca, portanto, é
acadêmico, podendo aprimorar habilidades visuais em capacidade da construção do texto próprio, do individual
particular. O desafio é não restringir-se a transmissão de e ao mesmo tempo do coletivo.
conteúdos (repasse de fotos, imagens), mas optar para textos
multimodais que aliem texto impresso com imagem, Ambientes Virtuais de Aprendizagem favorecendo o ensino-
sobretudo imagem em movimento. aprendizagem nas variadas faixas etárias
O Second Life é constituído por um ambiente virtual de
multiuso em 3D. É um lugar virtual onde reside, se comunica e É uma casa muito engraçada, não tem teto, não tem nada.
se fazem negócios. Em termos educacionais, podem-se Ninguém pode entrar nela não, porque a escola não tem chão....
encontrar nessa plataforma muitas sugestões de atividades,
como exercícios de presença virtual, trabalho cooperativo em Com a evolução da modalidade de ensino a distância, há a
computador, novos estudos de mídia e inserção corporativa, tendência de que espaços eletrônicos sejam cada vez mais
em particular por conta da referência expressiva ao mercado. utilizados para facilitar a aprendizagem e promover
O Second Life pode ser usado em complementação ao sistema significado no que se aprende. Esses espaços eletrônicos
tradicional (aula), como meio de enriquecer as atividades para servem tanto como suporte para distribuição de materiais
além das curriculares formais, possuindo característica didáticos como complementos de espaços presenciais de
marcante de alta qualidade de interação, muito acima dos aprendizagem.
fóruns e games online. Sua utilização tem sido motivadora, ao O ambiente virtual de aprendizagem é um sistema rico que
proporcionar o uso de simulação em ambiente seguro para fornece suporte a qualquer tipo de atividade realizada pelo
aprimorar a aprendizagem experiencial, praticar habilidades aluno, isto é, em conjunto de ferramentas que são usadas em
de acesso de configurações em 3D, tentar ideias novas e diferentes situações do processo de aprendizagem.
aprender dos erros. Analisando pela construção de conhecimento pelo aluno
por meio da concepção de ambientes virtuais de
Os fóruns são websites compostos por vários números de aprendizagem, destaca-se a natureza construtivista da
fios encadeados. Cada fio encadeia uma discussão ou conversa aprendizagem: os indivíduos são sujeitos ativos na construção
sob a forma de uma série de postagens escritas pelos dos seus próprios conhecimentos. Segundo Ferreira, existem
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alguns pressupostos na forma como Piaget teorizou que aulas práticas não pode