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1. DEFINIÇÕES

Segundo a União Vegetariana Internacional (IVU), vegetarianismo é uma prática alimentar composta de
alimentos vegetais, podendo incluir cogumelos, algas e sal, e excluindo qualquer tipo de carne animal (ex.: boi,
porco, aves, peixes, frutos do mar etc.), com ou sem o uso de produtos lácteos, ovos e/ou mel [1].

O ponto comum a todos os tipos de dietas vegetarianas é a exclusão absoluta de qualquer tipo de
carne. De acordo com a exclusão de outros grupos alimentares ou de elementos ligados ao estilo de vida,
a alimentação vegetariana recebe diferentes nomenclaturas:

— Ovolactovegetariano: vegetariano que utiliza ovos, leite e laticínios.


— Lactovegetariano: vegetariano que não utiliza ovos, mas faz uso de leite e laticínios.
— Ovovegetariano: vegetariano que não utiliza laticínios, mas faz uso de ovos.
— Vegetariano estrito: vegetariano que não utiliza nenhum derivado animal na sua alimentação. É também
conhecido como vegetariano puro. O nome vegetariano ”restrito“ não é correto, pois a dieta é
estritamente vegetal, e não ”restritamente“ vegetal.
— Vegano: indivíduo que adota uma alimentação vegetariana estrita, mas também tem a prática de não
utilizar produtos oriundos do reino animal com outros fins, como vestuário (lã, couro, seda etc.) ou
cosméticos testados ou que contêm ingredientes de origem animal, nem usar animais para
entretenimento, esporte e pesquisa.

A IVU recomenda uma dieta sem nenhum derivado animal (vegetariana estrita ou
vegana), como uma excelente forma de prover muitos benefícios aos animais, às
pessoas e ao meio-ambiente.

O termo “dieta ou alimentação vegana” é utilizado nas publicações científicas como sinônimo de
“vegetariana estrita”. Apesar de a dieta ser vegetariana estrita e o veganismo envolver também aspectos
não alimentares, do ponto de vista médico e nutricional, quando se avalia o tipo de alimentação adotada,
essa nomenclatura é válida.

Assim, manteremos na descrição dos artigos dessa obra o termo “dieta vegana”,
como já se faz na literatura médica e nutricional.

No entanto, do ponto de vista do atendimento clínico individual, a IVU recomenda que o profissional
de saúde conheça a diferença entre veganismo e vegetarianismo estrito para abordar melhor as questões
de vida do paciente que atende.

Com a industrialização de alimentos, encontramos produtos altamente processados com seus


componentes oriundos exclusivamente do reino vegetal sendo, portanto, produtos aceitos e muitas vezes
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consumidos com frequência por muitos vegetarianos estritos que não têm a preocupação com a saúde
como o primeiro motivo para a adoção do vegetarianismo. Para auxiliar essa avaliação da saúde com a
adoção de um sistema dietético vegano, temos o termo plant-based diet.

Cuidado com o termo plant-based

— Plant-based diet (dieta baseada em plantas): o termo original, whole food, plant-based diet
(dieta baseada em plantas com alimentos integrais), foi criado em 1980 pelo Dr. Thomas Colin
Campbell para diferenciar a alimentação vegetariana estrita saudável da não saudável (com
cereais refinados e alimentos processados) [2]. Para alguns autores, a alimentação plant-based é
uma dieta vegetariana estrita com uso de alimentos naturais e minimamente processados, à base
de frutas, hortaliças, cereais integrais, leguminosas, oleaginosas, sementes, ervas e especiarias,
excluindo todo e qualquer tipo de produto animal (carne, ovos e laticínios) [3, 4].

A IVU define o termo plant-based diet, ou whole food plant-based diet, como uma
alimentação baseada em alimentos em sua forma integral, ou minimamente
processados, podendo conter mínimas quantidades de sal e óleo vegetal adicionado,
e que exclui o uso de qualquer produto de origem animal (como carnes, ovos,
laticínios e mel).

O termo vem sendo cada vez utilizado na literatura, com uma certa licença como exceção nutricional,
nos trabalhos científicos, para a inclusão de pequenas quantidades de produtos de origem animal com o
objetivo de comparação de padrões dietéticos e intervenções, já que, do ponto de vista da nutrição e da
saúde, pequenas inclusões desses produtos podem não afetar o resultado final dessas análises.

E apesar de o termo plant-based diet ter sido cunhado como sinônimo de alimentação vegetariana
estrita saudável, a indústria alimentar já incorpora o termo dentro do contexto do veganismo, definindo
como "alimentos feitos de plantas que não contêm ingredientes de origem animal" [5]. Dentro desse
conceito, há margem para a produção de produtos destituídos de fibras, fitoquímicos e adicionados de
gordura hidrogenada, açúcar e óleo de adição, assim como corantes e demais aditivos alimentares.

Dessa forma é importante, ao desenhar um estudo científico ou interpretar os existentes, verificar o


conceito utilizado pelo pesquisador, para poder verificar os efeitos da intervenção frente ao que de fato
se usa num perfil plant-based. É possível que, num futuro próximo, do ponto de vista científico e da
saúde, tenhamos que utilizar o termo whole food plant-based diet para não haver dúvidas quanto à
escolha pelo uso de alimentos em sua forma intacta e sem aditivos.
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— Semivegetariano, pescovegetariano, flexitariano, reducitariano, polovegetariano: se refere ao


indivíduo que tem uma alimentação praticamente vegetariana, mas que utiliza carnes brancas em
até 3 refeições por semana, segundo a maioria dos autores, e essa frequência pode variar de
acordo com os critérios de cada estudo. Pela definição correta, esse indivíduo não é vegetariano,
mas a nomenclatura é utilizada na busca de dados científicos de associação entre os grupos
estudados, já que esse indivíduo apresenta consumo baixo de carne e se comporta como um
grupo intermediário entre o onívoro e o vegetariano.

— Macrobiótica: designa uma forma de alimentação que pode ou não ser vegetariana. O
macrobiótico tem um tipo de alimentação específica, baseada em cereais integrais, com um
sistema filosófico de vida bastante peculiar e caracterizado. A dieta macrobiótica, diferentemente
das vegetarianas, apresenta indicações específicas quanto à proporção dos grupos alimentares a
serem utilizados. Essas proporções seguem diversos níveis, podendo ou não incluir as carnes
(geralmente brancas). A macrobiótica não recomenda o uso de leite, laticínios ou ovos.

Macrobiótica

Além dessas denominações, encontramos indivíduos que seguem um padrão de alimentação crua
(crudivoristas), podendo ser ou não vegetarianos. Esses indivíduos aceitam o aquecimento até 42°C e
também se diz que praticam uma alimentação viva.

Os frugivoristas utilizam frutas e vegetais crus ou cozidos, além de oleaginosas. No contexto das
frutas, a visão é botânica, e não nutricional. O frugivorista é vegano.

O padrão mais comum ainda hoje no mundo é do indivíduo onívoro, que é aquele que, teoricamente,
come qualquer tipo de alimento, seja animal ou vegetal.

A nomenclatura utilizada pode trazer a falsa ideia de que, por ela, é possível saber o estado
nutricional individual da pessoa que a segue. Encontramos onívoros que não comem verduras e frutas,
ovolactovegetarianos que raramente utilizam laticínios e ovos e vegetarianos estritos que fazem uso de
alimentação processada ou totalmente integral, dentre diversas outras possibilidades.

Assim, do ponto de vista populacional, as nomenclaturas podem auxiliar no


rastreamento de possíveis deficiências e excessos de grupos com perfil alimentar
semelhante, mas jamais definem o estado nutricional individualizado. Uma dieta
vegetariana estrita pode ser mais variada que uma onívora ou vice-versa [6].
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2. MOTIVOS QUE LEVAM AO VEGETARIANISMO

São diversos os motivos que levam os indivíduos a se tornarem vegetarianos. Aqui citamos os mais
comuns.

Motivos que levam ao vegetarianismo

Ética

A percepção de que os animais são seres sencientes (capazes de sofrer ou sentir prazer e
felicidade) leva muitos indivíduos a não quererem participar de nenhuma forma de prática que
cause dor ou sofrimento animal, o que pode incluir sua utilização como alimento, vestuário,
cosméticos etc.

Saúde

Diversos estudos associam efeitos positivos à saúde à maior utilização de produtos de origem
vegetal e restrição de produtos oriundos do reino animal. A adoção da dieta vegetariana por esse
motivo também inclui a sensação de bem-estar que alguns indivíduos relatam ao não utilizar
alimentos cárneos ou derivados animais. No tópico da saúde, abordaremos brevemente os
resultados dos estudos controlados e metanálises.

Meio ambiente, sustentabilidade

As informações sobre o tema ganham cada vez mais espaço nas publicações científicas. Pela
importância do tema, aprofundamos o assunto ao final desse tópico (Ameaça à Saúde Global).
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Familiares

Pela adoção desse tipo de dieta pelos pais, cônjuges e familiares, algumas pessoas são
influenciadas e a adotam.

Espirituais e religiosos

Religiões como Adventismo, Espiritismo, Hinduísmo, Jainismo, Zoroastrismo e Budismo


preconizam, em muitos casos, a adoção de uma dieta vegetariana.

Yoga

Indivíduos que praticam yoga adotam muitas vezes a dieta vegetariana com base em princípios
energéticos, éticos ou de saúde. Dentre os princípios yogues, há o Ahimsa, a não violência, que se
aplica também aos animais.

Filosofia

Alguns indivíduos, por motivos filosóficos diversos, optam por não consumir carnes e muitas vezes
seus subprodutos (ovos, leite e queijos).

Não aceitação por paladar

Não é incomum a recusa do consumo de carne por não aceitação do paladar.

3. AMEAÇA À SAÚDE GLOBAL: IMPACTO DO


CONSUMO DE ALIMENTOS DE ORIGEM ANIMAL

No contexto atual de saúde global, em que a demanda por alimentos é crescente e os recursos se
tornam mais escassos, publicações da área de saúde apontam para a necessidade de a prescrição médica
e nutricional não ser desvinculada das questões ambientais.

"Devido à relação intrínseca entre a ciência ambiental e ciências da nutrição, é


imperativo que a pesquisa em saúde pública e a prática comecem a ter um foco na
nova disciplina da nutrição ambiental, que busca abordar de forma abrangente a
sustentabilidade dos sistemas alimentares" [7].
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Dentro desse contexto, foi criada a comissão EAT-Lancet sobre Alimentos, Planeta e Saúde, que reuniu
37 cientistas para responder à pergunta: como alimentar uma futura população de 10 bilhões de pessoas
com uma dieta saudável dentro dos limites do planeta [8].

EAT Lancet

Nesse relatório, ficou explícito que uma dieta saudável para as pessoas e para o planeta precisa ter a
sua base pautada no consumo de alimentos de origem vegetal, minimizando o uso de produtos de origem
animal. Foi recomendado que, para atingir esse objetivo até 2050, necessitamos dobrar o consumo de
alimentos vegetais e reduzir o consumo de alguns alimentos, como carne vermelha e açúcar, em mais de
50%. Uma dieta baseada em plantas com baixo consumo de alimentos animais confere melhoras à saúde
humana e traz benefícios ambientais [8].

A comissão do EAT-Lancet recomenda, num perfil de dieta de 2.500 kcal, que os grupos alimentares
de laticínios e de fontes proteicas animais se disponham na ingestão [8]:

— Laticínios (como leite integral ou equivalentes): 0-250 g/dia.


— Carne de vaca, cordeiro e porco: 0-28 g/dia.
— ou carne de frango ou aves: 0-58 g/dia.
— ou ovos: 0-25 g/dia.
— ou peixes: 0-100 g/dia.

Essa recomendação de olhar para a saúde integrada (planeta e seres humanos) tem surgido de forma
cada vez mais frequente nas publicações científicas da área da nutrição, já que, na condição atual do
crescimento populacional da humanidade, não há como desconsiderar o impacto sobre a nossa saúde e
a saúde global das nossas escolhas alimentares.

A IVU incentiva a prática da nutrição ambiental como forma de saúde integrada.

Os próximos quatro tópicos fornecem dados compilados pela professora doutora Cynthia Schunk,
coordenadora do Departamento de Saúde Global da IVU, para uma visão abrangente sobre o tema.

3.1. Escolhas alimentares e sustentabilidade


Os sistemas de produção alimentar estão intimamente relacionados à saúde humana e à
sustentabilidade ambiental; no entanto, atualmente tais sistemas representam uma ameaça para ambos
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[8]. Somos aproximadamente 8 bilhões de humanos neste planeta, mas criamos e abatemos quase 80
bilhões de animais terrestres e um número ainda maior de animais aquáticos todos os anos para
consumo. A atividade pecuária é, no entanto, uma forma extremamente ineficiente de produção de
alimento, já que os animais criados para consumo consomem muito mais calorias e nutrientes do que
disponibilizam sob a forma de carnes e derivados. Em média, aproximadamente dez vezes mais calorias
são usadas para alimentar animais de produção do que aquelas disponíveis em sua carne [9].
Biologicamente, essa ineficiência energética é esperada, já que a maioria das calorias, proteínas e outros
nutrientes que um animal consome não são convertidos em carne, mas usados para manter o animal vivo
(para locomoção, manutenção da temperatura corpórea, regeneração de tecidos, entre várias outras
funções metabólicas).

Devido à baixa eficiência energética típica da produção de carne, ovos e laticínios, grandes áreas de
terra são necessárias como pasto ou para produzir ração animal. Atualmente, quase dois terços de toda
a soja e milho e cerca de um terço de todos os grãos são usados como ração para animais [10]. Em geral,
a pecuária usa mais de 80% das terras cultiváveis do planeta, embora os alimentos de origem animal
forneçam apenas 18% das calorias consumidas globalmente [11].

Assim, uma consequência natural é que a pecuária exerça uma enorme pressão sobre todos os
ecossistemas da Terra, levando ao desmatamento, à extinção de espécies e ao desperdício de recursos
naturais que poderiam ser usados de forma mais eficiente. Não surpreende que o consumo de carne
(tanto de animais terrestres como aquáticos) seja considerado um dos principais motores da sexta
extinção em massa de espécies no planeta.

A drenagem de rios, lagos e outros corpos de água doce para irrigar terras usadas para cultivar
insumos usados como ração animal também tem um grande impacto sobre os recursos hídricos [12]. A
produção de carne em áreas com escassez hídrica compete com outros usos da água, incluindo aqueles
necessários para a manutenção adequada dos ecossistemas [13].

A poluição da água e do solo também são consequências naturais das atividades do setor pecuário.
Os animais, obviamente, geram resíduos. Em fazendas de produção intensiva, o enorme volume de
dejetos (fezes, urina) produzido por milhares de animais frequentemente não é tratado, já que o custo
do manejo adequado desses resíduos é proibitivo para muitos produtores ou é contornado pela existência
de legislação falha e fiscalização deficiente. Seja por descarga direta, seja por infiltração e escoamento,
os resíduos da pecuária contaminam o solo e as águas superficiais com patógenos, aditivos e níveis
excessivos de matéria orgânica. Por sua vez, isso pode favorecer a proliferação de algas e bactérias que,
ao consumir o oxigênio disponível nos habitats aquáticos, os tornam inadequados para outros
organismos. Da mesma forma, o grande impacto da produção pecuária na emissão de gases de efeito
estufa é bem estabelecido na literatura científica [14].
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3.2. Um futuro próximo


O crescimento populacional e a demanda ainda crescente por produtos de origem animal
intensificarão ainda mais as pressões existentes sobre o uso de terras, água e outros recursos naturais.
Estima-se que, se o padrão de consumo alimentar não mudar, serão necessários mais de 1 bilhão de
hectares de terras aráveis (o tamanho do continente europeu) [15], com aumento simultâneo da taxa de
desmatamento e perda de capital natural. Esse é um cenário insustentável.

Felizmente, é possível mitigar os desafios ambientais que temos pela frente com mudanças do padrão de
consumo, já que a área de terra e a quantidade de recursos naturais necessários para sustentar dietas
vegetarianas é substancialmente menor do que a necessária para sustentar o padrão alimentar existente
(onívoro). As dietas vegetarianas são mais sustentáveis por unidade de peso, por unidade de energia ou por
peso de proteína do que as dietas com alimentos de origem animal, em vários indicadores ambientais [8].

A IVU reconhece a grande pegada ambiental da produção de animais para consumo.


A mudança para uma nutrição vegetariana é uma das formas mais promissoras de
promover um futuro saudável, seguro e sustentável para todos.

3.3. Pandemias e epidemias


Ao longo do último século, as pandemias e as epidemias com potencial pandêmico tiveram origem
predominante no contágio de humanos por patógenos de animais silvestres abatidos para consumo ou
em patógenos silvestres “cultivados” em animais criados em sistemas intensivos modernos, de onde
provém atualmente a maior parte dos alimentos de origem animal do mundo. Foi o caso, por exemplo,
dos surtos de Ebola, da epidemia de SARS de 2002-2003, da pandemia de gripe suína (H1N1pdm) de 2009
e de vários surtos de gripe aviária. Nesses últimos casos, aves e suínos criados em granjas comerciais
fizeram a ponte genética entre o vírus que circulava na fauna silvestre e o vírus que se disseminou na
população humana.

Hoje em dia, os animais criados pela indústria pecuária representam uma biomassa superior à de
todos os mamíferos selvagens juntos, abrigando um número muito maior de vírus zoonóticos do que
seus parentes selvagens [16]. Espécies como galinhas, porcos e bois agem como hospedeiros
intermediários ou amplificadores de patógenos silvestres, possibilitando a evolução de grau maior de
patogenicidade e a transmissão para a população humana. Os porcos, em particular, por possuírem
receptores celulares para os vírus da gripe aviária, suína e humana, são considerados hospedeiros ideais
para a emergência de vírus da gripe com potencial pandêmico [17], como foi o caso na pandemia de
2009 (H1N1pdm). Da mesma forma, a avicultura intensiva abriu caminho para a disseminação da gripe
aviária altamente patogênica. Neste caso, a maioria dos eventos de conversão de cepas de gripe aviária
pouco patogênicas para altamente patogênicas (ou seja, cepas com letalidade mais alta) foi relatada em
granjas avícolas comerciais [18].
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Criação de animais em confinamento e pandemias

Muitas condições ideais para o surgimento de vírus altamente patogênicos estão presentes nos
sistemas modernos de criação intensiva de animais. Nesses sistemas, a manutenção de grande população
de animais em alta densidade em ambiente fechado facilita a transmissão rápida de várias cepas virais
de um animal para outro. Além disso, nesses sistemas os animais (hospedeiros) são altamente suscetíveis
à infecção, dada a imunossupressão (perda parcial da capacidade de resposta imunológica) induzida por
estresse crônico e pela seleção genética para produtividade, permitindo aos patógenos se multiplicarem
rapidamente em nível elevado [19]. Embora muitas instalações sigam protocolos de biossegurança, a
produção em larga escala, a dependência de múltiplos fatores na cadeia de produção, o transporte
nacional e internacional de animais vivos e a possibilidade de contaminação dos produtos tornam essas
medidas insuficientes. Além disso, as falhas na implementação de protocolos de biossegurança têm se
mostrado endêmicas na indústria [20]. A natureza sem fronteiras das doenças zoonóticas significa que
um risco de biossegurança num lugar seja um risco de biossegurança em qualquer lugar.

3.4. Resistência antimicrobiana


O surgimento de bactérias resistentes a antimicrobianos é atualmente considerado uma das maiores
ameaças à saúde global. Patógenos que causam problemas médicos graves ou complicações decorrentes
dessas condições — como tuberculose, doenças sexualmente transmissíveis, infecções do trato urinário,
pneumonia e infecções hospitalares — agora se tornaram resistentes a uma ampla gama de antibióticos.
Já ocorrem mais de 700 mil mortes por ano devido a infecções resistentes a antibióticos; considerando o
nível atual de dependência de produtos de origem animal, estima-se que haverá 10 milhões de mortes
por ano devido a infecções resistentes a antibióticos em 2050 (mais do que câncer ou diabetes) [21].

Embora parte do problema seja o uso excessivo de antibióticos pela população humana, a maioria
dos antibióticos (mais de 70%) vendidos no mundo não são usados em humanos, mas em animais criados
para consumo, predominantemente em sistemas de criação intensiva. Nestes sistemas, os
antimicrobianos são amplamente administrados a todos os animais (independentemente do seu estado
de saúde) para promover o crescimento ou de forma profilática para garantir sua sobrevivência (dada a
grande susceptibilidade a doenças infecciosas) até o final do ciclo de produção [22]. Bactérias resistentes
a antimicrobianos foram isoladas em vários animais e seus produtos derivados (carnes, leite, ovos)
vendidos em redes de supermercados em vários países.
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A IVU reconhece que os sistemas de criação de animais representam um nível


inaceitável de ameaça à saúde pública global e defende que a transição para
métodos mais seguros de produção de alimentos é crucial para a proteção do bem-
estar das gerações atuais e futuras.

4. O VEGETARIANISMO NO MUNDO

Um estudo publicado em 2010 estimou o número de vegetarianos existentes no mundo e apontou


um total de 1,5 bilhão de pessoas, sendo que apenas 75 milhões o fizeram por escolha e 1.450 milhões,
por necessidade. Nessa estimativa, os que não comiam por não terem condições financeiras
provavelmente o fariam se a situação mudasse [23].

Dentre os diversos países, a Índia é o que apresenta a maior prevalência de vegetarianos, com 40%
da sua população assim definida [2].

De acordo com a pesquisa telefônica norte-americana realizada pelo Gallup, 5% de 1.033 adultos se
autodeclararam vegetarianos e 3% se declararam veganos. Dentre os indivíduos, o vegetarianismo era
mais adotado pelos que tinham menos de 50 anos de idade (7-8%) do que pelos mais velhos (2-3%) [24].

É estimado que o número de veganos nos Estados Unidos da América tenha crescido 600%, partindo
de uma população de cerca de 4 milhões de pessoas em 2014 para cerca de 19,6 milhões em 2017 [25].

Na Suíça, pelo menos 2,5% da população é vegetariana e 10% desse número corresponde a veganos
[26].

No Brasil, segundo dados de 2018 o IBOPE (Instituto de Opinião Pública e Estatística), avaliando
indivíduos com mais de 16 anos de idade, 14% deles se declaram vegetarianos e 55% dos brasileiros
consumiriam mais produtos veganos se isso estivesse indicado na embalagem. O crescimento da
população vegetariana, comparado com a avaliação prévia feita em 2012, foi de 75% nas regiões
metropolitanas [27].

Os produtos vegetais que substituem o consumo de animais têm crescido de forma constante nos
últimos anos. Esses dados não representam unicamente o aumento do número de vegetarianos, mas
também o de pessoas interessadas na redução do consumo de produtos animais e aumento dos
vegetais.

Os produtos à base de plantas são os principais impulsionadores atuais do mercado de varejo e


crescem 2,5 vezes mais que os alimentos em geral. Dados publicados em abril de 2021 nos Estados
Unidos, mostram que a venda desses produtos substitutos cresceu 27% no ano passado, saindo de 5,5
bilhões de dólares em 2019 para 7 bilhões de dólares em 2020. Além disso, as vendas em dólares de
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alimentos à base de vegetais cresceram 43% nos últimos 2 anos. As bebidas vegetais substitutas do leite
de vaca foram responsáveis por 15,2% de todas as vendas em dólares de leite. E as bebidas vegetais
sozinhas são responsáveis por 35% dos alimentos plant-based vendidos nesse mesmo mercado [28].

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