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Monografia apresentada
à Escola de Formação da
Sociedade Brasileira de
Direito Público – SBDP,
sob a orientação do
Professor Rodolfo da
Costa Arruda Silva.
SÃO PAULO
2021
RESUMO
1
Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente:
não aceiteis o que é de hábito como coisa natural.
Pois em tempo de desordem sangrenta, de confusão organizada,
de arbitrariedade consciente, de humanidade desumanizada,
nada deve parecer natural.
Nada deve parecer impossível de mudar.
Bertold Brecht
2
AGRADECIMENTOS
Agradeço, antes de tudo, aos meus pais Ana Luiza e Francisco, que
sempre me motivaram e me incentivaram a olhar o mundo de um modo
crítico. Sem eles, a minha paixão pelo direito público não teria florescido e
esta pesquisa nunca teria sido feita.
Agradeço, por fim, a quem também dedico este trabalho, meu melhor
amigo e companheiro, que está sempre ao meu lado, Rafael Priolli.
3
LISTA DE ACÓRDÃOS ANALISADOS
4
LISTA DE ABREVIAÇÕES
art. – artigo
arts. – artigos
MC – Medida Cautelar
Min. – Ministro
MS – Mandado de Segurança
PET – Petição
RE – Recurso Extraordinário
Rp – Representação
5
SINPAIT – Sindicato Paulista dos Auditores Fiscais do Trabalho
6
LISTA DE TABELAS
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................... 9
I. METODOLOGIA DE PESQUISA ...................................................... 12
II. IDEIAS E CONCEITOS PRELIMINARES SOBRE O TEMA................... 19
1. Breves notas sobre o controle de constitucionalidade brasileiro .... 19
2. As competências constitucionais dos Tribunais de Contas ............ 22
III. O INÍCIO DO PROBLEMA: CRIAÇÃO DA SÚMULA nº 347 PELO
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL .......................................................... 25
IV. A JURISPRUDÊNCIA DO STF APÓS A EDIÇÃO DA SÚMULA nº 347 ... 28
1. A judicialização da Súmula nº 347: primeiros casos ................... 28
2. Controle de Constitucionalidade pelo CNJ: casos decididos em
comparação às competências dos Tribunais de Contas ........................ 32
3. A natureza jurídica dos Tribunais de Contas: uma nova leitura da
Súmula nº 347? ........................................................................... 41
4. A permanência da Súmula 347 ............................................... 45
5. Resumo da jurisprudência do STF acerca do tema ..................... 48
V. CONCLUSÕES E O DESTINO DA SÚMULA nº 347 .......................... 49
REFERÊNCIAS................................................................................. 54
8
INTRODUÇÃO
1
MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 21ª Edição. Belo Horizonte: Fórum, 2018.
9
leitura do art. 972 da Constituição Federal, bem como dos seus artigos 102,
inciso I, alínea “a”, inciso III, alínea “c”3 e 125, parágrafos 1º e 2º.4
2 “O CAPÍTULO III, DO PODER JUDICIÁRIO, Art. 97. Somente pelo voto da maioria absoluta
de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar
a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.
3 Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição,
10
Em razão disso, os Tribunais de Contas de todo o país, mas
principalmente o Tribunal de Contas da União – TCU, têm realizado controle
de constitucionalidade de leis e atos normativos, fundamentando sua
competência na Súmula supracitada.
5SUNDFELD, Carlos Ari e ARRUDA CÂMARA, Jacintho. Competências de controle dos Tribunais
de Contas – possibilidades e limites. In: SUNDFELD, Carlos Ari. Contratações Públicas e seu
Controle. São Paulo: Malheiros, 2013.
11
Assim, não saber se os Tribunais de Contas podem ou não realizar
controle de constitucionalidade gera indesejável insegurança jurídica para a
atuação do Poder Público e dos próprios administrados.
Por outro lado, sob a ótica dos impactos na atuação de cada um dos
Poderes constituídos, avalia-se a interferência inconstitucional a que estaria
submetido o Executivo, na medida em que seus atos fossem subordinados ao
exame de constitucionalidade por Tribunais de Contas, sem que se saiba o
posicionamento do STF quanto à eventual chancela para essa atuação,
especialmente com relação à extensão da Súmula nº 347.
I. METODOLOGIA DE PESQUISA
12
quais hipóteses os Tribunais de Contas poderiam não aplicar determinada lei
por considerá-la inconstitucional.
(i) Combinação I
6
Data de fechamento do projeto de pesquisa.
13
Processo Seleção
MS 35812 O
MS 35410 O
MS 35824 O
ADI 6529 MC X
ADI 2238 X
ADI 6329 TP X
ADI 6364 MC X
ADI 3977 X
MS 28924 AgR O
ADI 282 X
ADI 4174 X
MS 36190 AgR X
ADI 5215 X
MS 29002 O
ADO 25 X
ADI 5442 MC X
ADI 5316 MC X
ADI 119 X
MS 25116 X
ADI 2361 MC X
ADI 1873 X
Legenda:
O Selecionados
X Não selecionados
Fonte: elaboração própria.
(ii) Combinação II
Processo Seleção
PET 4656 O
ADI 1685 O
RE 106923 X
MS 20333 O
MS 20310 X
RMS 18655 O
Legenda:
O Selecionados
15
X Não selecionados
Fonte: elaboração própria.
Processo Seleção
ADI 2238 X
ADI 5175 X
MS 28924 AgR X*
ADI 282 X
ADI 3191 X
ADI 3628 X
ADI 5763 X
RE 704292 X
MS 26739 O
MS 30788 X
ADI 1923 X
RE 638115 X
16
ADI 4203 X
ADI 374 X
ADI 3599 X
ADI 2884 X
ADI 1140 X
RE 223037 X
ADI 1934 MC X
Rp 1313 X
Rp 1021 X
RE 69835 X
Rp 751 X
Rp 106 X
Legenda:
O Selecionados
X Não selecionados
X* Repetido
Fonte: elaboração própria.
Após a análise preliminar foi selecionado 1 (um) acórdão, que, por fim,
compôs o universo de acórdãos analisados nesta pesquisa. Este foi
selecionado, ainda que trate concretamente de caso que envolve o Conselho
Nacional de Justiça, porque o julgamento de mérito foi construído com base
na Súmula nº 347 do STF, bem como na possibilidade de tribunais de contas
realizarem controle de constitucionalidade.
17
da pertinência dos acórdãos para os objetivos pretendidos por esta pesquisa,
a partir do refinamento da amostra.
MS 35812 13/04/2021
MS 35410 13/04/2021
MS 35824 13/04/2021
MS 35836 13/04/2021
18
MS 35490 13/04/2021
MS 35494 13/04/2021
MS 35498 13/04/2021
MS 35500 13/04/2021
MS 29002 07/08/2018
MS 26739 01/03/2016
MS 20333 23/09/1982
19
compreendido como um dos controles aos quais os atos do Poderes da
República estão subordinados.
7 A expressão “Poderes do Estado” não é a mais correta, uma vez que o Poder do Estado é
uno e indivisível. No entanto, ela é amplamente utilizada e por isso foi citada.
8 Entende-se como controle político ou não judicial aquele realizado por órgão que tenha
natureza política, não integrante do Poder Judiciário. Este é o modelo adotado pelos franceses.
9 O controle misto é caracterizado por apresentar concomitantemente traços do controle
20
também é chamado de “abstrato”, vez que este termo caracteriza bem a falta
de incidência da norma no caso concreto.
Como se disse, este critério de controle só pode ser realizado pelo STF
ou pelos Tribunais de Justiça dos Estados. Nesse sentido, para o STF, o
julgamento de compatibilidade deverá ser feito entre a Constituição Federal
e leis ou atos normativos federais, estaduais ou distritais e municipais10,
editados antes11 ou depois da própria Constituição Federal. Já para os
Tribunais de Justiça, o julgamento de compatibilidade deverá ser feito entre
a Constituição Estadual e leis ou atos normativos estaduais ou distritais e
municipais.
da Constituição Federal só podem ser objeto de ADPF, e não das demais ações de controle
concentrado.
21
No entanto, esta declaração tem eficácia limitada quando comparada
à eficácia da decisão proferida no julgamento de constitucionalidade pelo
critério concentrado. Em outras palavras, a lei ou o ato normativo só deixa
de produzir efeitos sobre aquelas partes, em relação àquela demanda e,
portanto, continua plenamente válida no ordenamento jurídico — salvo se o
Senado Federal suspender a executoriedade nos termos do art. 52, X, da
Constituição Federal —, diferente do controle abstrato. É o que chamam de
eficácia interpartes.
O controle externo, como bem diz o nome, é exercido por ente ou órgão
externo à estrutura da Administração Pública. É o caso dos Tribunais de
12 A modulação de efeitos pode ser entendida como a relativização da regra de eficácia de uma
decisão proferida, com o intuito de garantir a segurança jurídica e/ou de proteger o interesse
social. É o que dispõe o art. 27 da Lei nº 9.868/1999: “Art. 27. Ao declarar a
inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, e tendo em vista razões de segurança jurídica
ou de excepcional interesse social, poderá o Supremo Tribunal Federal, por maioria de dois
terços de seus membros, restringir os efeitos daquela declaração ou decidir que ela só
tenha eficácia a partir de seu trânsito em julgado ou de outro momento que venha a ser
fixado”.
13 Para uma explicação detalhada de cada tipo de controle, ler: MEDAUAR, Odete. Controle
22
Contas, órgãos administrativos auxiliares do Poder Legislativo no controle
externo.
23
Os Tribunais de Contas são órgãos administrativos que auxiliam o
Poder Legislativo de seu respectivo ente federativo16 na realização do controle
externo da Administração Pública direta e indireta. Embora figurem como
órgãos auxiliares, é importante frisar que os Tribunais de Contas, de acordo
com os arts. 71 e 7517 da Constituição Federal, possuem autonomia
administrativa, financeira, operacional e decisional, com competência
atribuída expressamente para julgar contas, aplicar sanções administrativas
aos responsáveis pela gestão ilegal ou irregular de recursos públicos e exigir
a reparação financeira consequente destes atos.
16 Para propiciar uma organização de controle mais célere, essas instituições são divididas a
nível federal, estadual e distrital, e ainda, municipais, e por fim, municipal, quando, apenas
neste último caso, o Tribunal de Contas do Município for anterior à data de promulgação da
CF-88.
17 Art. 75. As normas estabelecidas nesta seção aplicam-se, no que couber, à organização,
composição e fiscalização dos Tribunais de Contas dos Estados e do Distrito Federal, bem como
dos Tribunais e Conselhos de Contas dos Municípios.
18 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 21ª Edição. Belo Horizonte: Fórum, 2018,
p. 387. Como exemplo, a autora pontua: “Criado por iniciativa de Ruy Barbosa, em 1890, o
Tribunal de Contas é instituição estatal independente, pois seus integrantes têm as mesmas
garantias atribuídas ao Poder Judiciário (CF, art. 73, §3º). Daí ser impossível considerá-lo
subordinado ou inserido na estrutura do Legislativo. Se a sua função é de atuar em auxílio ao
Legislativo, sua natureza, em razão das próprias normas constitucionais, é a de órgão
independente, desvinculado da estrutura de qualquer dos três poderes”.
19 Nesse sentido, as decisões proferidas nos julgamentos da ADI nº 2420/ES, da ADI nº
gestores públicos em serem responsabilizados por tomadas de decisão. Neste sentido, ler:
PEREIRA, Flávio Henrique Unes. Direito administrativo do medo, apagão das canetas e
improbidade administrativa. Belo Horizonte, Fórum, v. 19, n. 224, p. 15–22, out., 2019.
24
É o que parece acontecer quando os Tribunais de Contas realizam
interpretação equivocada da Súmula nº 347 do STF, que assim dispõe “o
Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a
constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público” e interpretam a
Constituição Federal de maneira controversa, sem que o Poder Judiciário já
tenha se pronunciado sobre o tema em questão.
22TRISTÃO, Conrado Valentini. Controle do Tribunal de Contas da União pelo Supremo Tribunal
Federal: uma análise a partir dos julgamentos de mandados de segurança. Tese de Mestrado
em Direito e Desenvolvimento na FGV São Paulo. São Paulo: 2020.
25
A Ata da Sessão de 13.12.196323, apenas sinaliza que os votos
submetidos pelos demais Ministros foram positivos, embora o teor destes
sejam desconhecidos. À época, o Presidente do STF, Min. Ribeiro da Costa,
teceu louvores ao trabalho da Subcomissão de Jurisprudência, a qual teria
elaborado uma súmula que “prestará relevantes serviços às letras jurídicas
do país, sendo do maior interesse para os Tribunais do País, advogados, juízes
e cultura da Ciência do Direito”.
Ainda que a moção apresentada pelo Min. Victor Nunes Leal proponha
que a Súmula a ser criada indicaria uma jurisprudência dominante do STF,
esta só representa o resultado do julgamento do Recurso em Mandado de
Segurança nº 8.372/CE. Isso significa que a interpretação mais fiel da Súmula
nº 347 há de ser feita em compatibilidade à análise do Acórdão do Recurso
em Mandado de Segurança nº 8.372/CE.
23
A ata da sessão foi adquirida através de pedido de informação ao Supremo Tribunal
Federal e pode ser acessada pelo seguinte link:
https://drive.google.com/file/d/1qMDRAgoj0BgTVm3rmlnfsDzClq_S0SXz/view?usp=sharing.
26
Tribunais de Contas. Mas há que distinguir entre
declaração de inconstitucionalidade e não aplicação de
leis inconstitucionais, pois este é obrigação de qualquer
tribunal ou órgão de qualquer dos poderes do Estado”
(BRASIL, 1961).
27
como a autorização aos Tribunais de Contas de não aplicar lei ou ato que já
tenha sido objeto de controle difuso de constitucionalidade pelo STF.
Ou seja, que a criação da Súmula nº 347 não deve ser entendida como
a “concessão” de poderes judiciais, pelo STF, aos Tribunais de Contas, mas
como uma interpretação ampliativa, realizada pelo STF, dos efeitos das suas
próprias decisões em um momento histórico em que não havia controle
concentrado de constitucionalidade.
28
controle de constitucionalidade difuso realizado pelo TCE-CE, já que não havia
sequer entendimento do STF acerca dessa lei.
29
objetivo da Resolução era estabelecer as providências necessárias quanto à
integração do pessoal do TCM ao TCE-GO.
30
exatamente por conta do comando do art. 169 da Constituição Federal, que
estabelece a impossibilidade de a despesa com pessoal de um órgão exceder
ao que a Lei Complementar determinar, o que ocorria no caso do TCM.
31
o TCE-GO preferiu o caminho da recusa ao cumprimento das normas
embutidas na Emenda Constitucional, seguindo a orientação plasmada na
Súmula nº 347 do STF.
Isso significa, por fim, que ainda que a Ação tenha sido julgada
prejudicada por conta da perda superveniente do objeto, o Min. Relator
Maurício Côrrea entendeu que (i) a recusa ao cumprimento de normas sob o
fundamento de inconstitucionalidade é legítima; (ii) a orientação da Súmula
nº 347 é o da possibilidade de recusa à aplicação de normas; (iii) o STF não
poderia apreciar a constitucionalidade da Resolução, por considerá-la
concreta; mas que (iv) o caminho mais correto seria a representação do TCE-
GO a um agente autorizado pelo art. 103 para atacar a Emenda Constitucional
nº 19 no STF.
32
O primeiro caso trata de Mandado de Segurança impetrado pelo
Sindicato dos Servidores da Justiça de 2ª Instância de Minas Gerais
(SINJUS/MG) contra o Pedido de Providências nº 885/2006 do CNJ, que
declarou a inconstitucionalidade e ilegalidade do art. 102 da Resolução nº
12/1962, que fixa férias coletivas de 60 dias para os servidores da 2ª
Instância do TJMG.
Assim, com base no Voto do Min. Relator Dias Toffoli e do Min. Gilmar
Mendes, iniciou-se uma linha de entendimento no STF de que estes órgãos
autônomos não estariam autorizados a declarar a inconstitucionalidade de
leis ou atos normativos, a não ser quando o tema já estivesse pacificado no
STF.
34
considera inconstitucional. A mim, parece-me que talvez
agora possamos já fazer uma interpretação, um adendo,
para dizer toda vez que estiver simplesmente aplicando,
desenvolvendo a jurisprudência já pacífica sobre uma
dada temática constitucional”.
Quando o Min. Gilmar Mendes cita “a nossa Súmula”, ele está fazendo
referência à Súmula nº 347. O Ministro sugere que o STF aplique
interpretação conforme o mérito e entendimento desse caso específico. Ou
seja, de que a Súmula nº 347 deve permanecer em vigor e que deve ser
aplicada normalmente quando os Tribunais de Contas declararem
inconstitucionais leis ou atos normativos cujas matérias já sejam entendidas
pelo STF como inconstitucionais.
35
nº 4.656 e ampliou o entendimento do julgamento do Mandado de Segurança
no Plenário do STF.
Entendeu a Ministra, seguida por todos os seus colegas, que o CNJ atua
dentro do limite de suas prerrogativas, nos moldes do art. 103-B, §4º, II, da
Constituição Federal, quando deixa de aplicar lei inconstitucional, mesmo sem
o pronunciamento anterior do STF.
36
sua atuação fiscalizadora a invalidade de ato
administrativo pela inaplicabilidade do texto legal no qual
se baseia por contrariar a Constituição da República.
(...)
37
constitucional que este Tribunal já reconheceu em
diversos precedentes”.
24 A Lei Maior é a Constituição Federal. De há muito, o Supremo assentou que órgão algum da
Administração Pública está compelido a observar lei conflitante com a Carta da República.
Reporto-me a precedente da lavra do ministro Victor Nunes Leal, no qual envolvido ato do
Tribunal de Contas da União. Partindo dessa premissa, o Conselho Nacional de Justiça, órgão
estritamente administrativo, atuou à luz do disposto no artigo 37 da Constituição Federal e
procedeu a glosa, não em processo objetivo, alusivo a controle de constitucionalidade de certa
lei, mas de nomeações realizadas pelo Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. Atuou em
sintonia com o Diploma Maior. Isso leva a julgar improcedente não a ação, que entendo ser o
ato de vir ao protocolo do Tribunal, mas o pedido formalizado na inicial.
25 Trecho do Acórdão da PET nº 4.656, páginas 78 e 79: “A SENHORA MINISTRA CÁRMEN
38
inconstitucional – e voltou a aplicar apenas a tese de matérias já pacificadas
no próprio STF, como ocorreu no julgamento do MS nº 26.739.
(...)
39
Admite-se exceção a essa regra apenas na hipótese de
jurisprudência já pacificada nesta Suprema Corte acerca
do tema, conforme já tive oportunidade de consignar”.
40
“Não constitui demasia assinalar, por pertinente,
que esta Corte Suprema tem igualmente adotado essa
mesma diretriz jurisprudencial em relação ao E.
Tribunal de Contas da União (TCU), enfatizando que
não se inclui na esfera de competência dessa Corte de
Contas a possibilidade de exercer o controle difuso de
constitucionalidade, sob pena de usurpação da função
jurisdicional (MS 27.743-MC/DF, Rel. Min. RICARDO
LEWANDOWSKI – MS 29.123-MC/DF, Rel. Min.
GILMAR MENDES – MS 35.490-MC/DF, Rel. Min.
ALEXANDRE DE MORAES, v.g.)” (grifos e itálicos
originais).
Com a votação não unânime dessas duas ações, conclui-se que duas
correntes teóricas foram formadas na Segunda Turma do STF, entre os anos
de 2018 e 2019. A primeira, focada na natureza jurídica administrativa do
CNJ, bem como do Tribunal de Contas da União e do Conselho Nacional do
Ministério Público, apoiada pelos Ministros Celso de Mello, Gilmar Mendes,
Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e Carmen Lúcia. E a segunda, de maneira
isolada, o Min. Edson Fachin, mantendo uma postura vinculada ao julgamento
da PET nº 4.656, no sentido de que ainda que a natureza jurídica destes
órgãos seja administrativa, a não aplicação de normas inconstitucionais é
legítima.
41
O Acórdão em referência afastou a aplicação a todos os casos do TCU,
dos §§ 2º e 3º dos arts. 7º e 17 da Lei nº 13.464/2017, que tratam do Bônus
de Eficiência, sob o argumento de incompatibilidade com o art. 40, caput e
§§ 1º e 3º, e com princípios da Constituição Federal.
42
tenham concedido a segurança. Por exemplo, a maioria do Plenário,
composta pelos Ministros Alexandre de Moraes, Nunes Marques, Ricardo
Lewandowski, Carmen Lúcia e Luiz Fux, seguiu uma ratio baseada na
natureza jurídica dos Tribunais de Contas, admitindo que, por não serem
órgãos jurisdicionais, o controle de constitucionalidade, seja na modalidade
difusa ou concentrada, não seria permitido.
26
O Ministro cita passagem de Marçal Justen Filho para justificar seu posicionamento. “Mais do que em
qualquer outro caso, é cabível aludir, a propósito do Tribunal de Contas, a uma atuação quase jurisdicional.
Essa fórmula se justifica pela forma processual dos atos e em vista da estrutura autônoma e independente
para produzir a instrução e o julgamento. A fórmula quase jurisdicional é interessante não para induzir o
leito a imaginar que a atuação do Tribunal de Contas é idêntica à do Judiciário, mas para destacar como
se diferencia do restante das atividades administrativas e legislativas. Nenhum outro órgão integrante do
Poder Executivo e do Poder Legislativo recebeu da Constituição poderes de julgamento equivalentes,
inclusive no tocante à relevância e eficácia, aos assegurados ao Tribunal de Contas”. JUSTEN FILHO,
Marçal. Curso de Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2018, p. 1132-1133.
43
propriamente dito. Nesse sentido, todo órgão administrativo poderia deixar
de aplicar uma lei que repute ser inconstitucional.
A tese mais arrojada é defendida pelo Min. Luís Roberto Barroso, que
afirma que toda autoridade administrativa de nível superior pode realizar
controle de constitucionalidade incidental. No caso em tela, o Ministro
entendeu ter ocorrido controle de constitucionalidade com efeitos erga omnes
e vinculantes, o que não seria permitido a órgãos administrativos.
44
Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, em
especial no julgamento da PET 4.656/PB (Relatora
Ministra Carmen Lúcia, Plenário, julgamento em
19.12.2016), em que se distinguiu a não aplicação da lei
reputada inconstitucional e a declaração de sua
inconstitucionalidade, reconhecendo a competência do
órgão correcional para, uma vez concluída a apreciação
da inconstitucionalidade de determinado diploma
normativo, determinar a inaplicabilidade de ato
administrativo regulamentador da lei inconstitucional”.
45
mecanismo de freios e contrapesos, atentando contra (i) o Poder Legislativo
como um todo, e principalmente o Senado Federal; e (ii) o Poder Judiciário e
principalmente o STF:
46
transmutação de seus efeitos, com patente usurpação da
competência exclusiva do SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL, não é admitida em nosso ordenamento
jurídico constitucional nem mesmo em âmbito
jurisdicional, quanto mais em âmbito administrativo”.
47
compete, precipuamente, a guarda da Constituição
Federal, é certo que a sua interpretação do texto
constitucional deve ser acompanhada pelos demais
entes federativos, em decorrência do efeito definitivo
absoluto outorgado à sua decisão. Tal interpretação deve
ser igualmente entendida pelos órgãos da Administração
Pública e também pelos tribunais de contas, como
indicativa do sentido normativo-constitucional, mesmo
no caso de se tratar de jurisprudência firmada sem
eficácia erga omnes e efeito vinculante. Isso porque, na
hipótese contrária, já há obrigatoriedade de observância
da jurisprudência, na forma do §2º art. 102 da CF”.
48
da norma, desde que o STF já tenha
proferido entendimento no sentido da
inconstitucionalidade (matéria
pacificada no STF).
Admitiu-se o controle de
constitucionalidade difuso pelo tribunal
de contas/CNJ, através de afastamento
PET 4656 19/12/2016 Plenário
da norma a partir de interpretação
inovada (i.e., não proferida
anteriormente pelo Judiciário).
Admitiu-se o controle de
MS 29002 07/08/2018
constitucionalidade difuso pelo tribunal
de contas/CNJ, através de afastamento
Segunda Turma da norma, desde que o STF já tenha
MS 28924 proferido entendimento no sentido da
29/11/2019
AgR inconstitucionalidade (matéria
pacificada no STF).
MS 35500 13/04/2021
MS 35812 13/04/2021
49
Súmulas27, e, portanto, integre a primeira leva de Súmulas do STF, ela foi
editada com base em único precedente, o que revela, em si, uma deturpação
do próprio mecanismo de edição de Súmulas, uma vez que estas são
enunciados da jurisprudência dominante do Tribunal — que se forma a partir
de reiteradas decisões sobre determinado tema no mesmo sentido.
27
As Súmulas 01 a 370 foram todas aprovadas na Sessão Plenária de 13.12.1963. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumarioSumulas.asp. Acesso em: 22.11.2021.
50
controle de constitucionalidade difuso realizado pelo TCE-CE foi chancelado
pela Primeira Turma do STF, em 1968, transformando-se, portanto, em um
precedente para a atuação dos demais Tribunais de Contas, tornando-os
aptos a interpretar a Súmula n° 347 como permissão de realizar controle
difuso de constitucionalidade.
28
TRISTÃO, Conrado Valentini. Controle do Tribunal de Contas da União pelo Supremo Tribunal
Federal: uma análise a partir dos julgamentos de mandados de segurança. Tese de Mestrado
em Direito e Desenvolvimento na FGV São Paulo. São Paulo: 2020, pg. 81.
51
Assim, e em conjunto com a análise do MS nº 29.002 e do MS nº
28.924 AgR, é possível afirmar que o STF vinculou a autorização da atuação
dos Tribunais de Contas à sua própria atuação, já que prevaleceu o
entendimento de que apenas seria válido o afastamento de norma, por órgãos
administrativos, quando o STF já tivesse discutido a mesma matéria e
decidido pela inconstitucionalidade.
52
afirmar que não houve uma decisão final referente à possibilidade ou não de
os Tribunais de Contas continuarem a atuar dessa forma.
A grande dúvida que resta sobre este tema particular é o motivo pelo
qual a Súmula nº 347 não foi cancelada. Por um lado, se é pela certeza de
que não há maturidade do tema para que o STF possa decidi-lo
definitivamente, porquanto há imprecisão quanto ao posicionamento do
Tribunal ou até abrangência adotada por cada ministro(a), ou, por outro, se
é pela incerteza dos ministros quanto à definição do tema numa eventual
avaliação sobre a permanência ou não da Súmula, ou se esta deve ser
realmente cancelada.
Por fim, indica-se que há lacuna importante neste tema, qual seja,
saber como o Tribunal de Contas da União e os demais Tribunais de Contas
têm interpretado e aplicado a Súmula nº 347, o que deverá ser objeto de
pesquisas futuras.
53
REFERÊNCIAS
54
_______. Supremo Tribunal Federal. Mandado de Segurança nº 35.500.
Órgão julgador: Alexandre de Moraes. Relator: Min. Alexandre de Moraes.
Julgamento em 13.04.2021.
55
ROSILHO, André Janjácomo. Controle da Administração pelo TCU. Tese
de Doutorado em Direito na USP. São Paulo, 2016.
56