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IN MEMORIAM
Isidro, um rapaz da Beira
ISIDRO SOUSA
Não foi doutor, nem teve oportunidade de prosseguir estudos, fora as “Ciências
da vida”. Viveu a precariedade portuguesa e queer de crise em crise. No ano de
conclusão do 12º ano teve o primeiro trabalho de verão: “4 meses, abastecedor
de combustíveis de automóveis, numa bomba de gasolina. (…) o 12º ano termina
e consegui vir para Lisboa fazer uma formação de formador de informática, (…).
O curso termina, volta à terra, “(…) meio pequeno, Moimenta da Beira, no
interior do país, Portugal profundo, não há grandes oportunidades. Nunca
consegui trabalho nessa área, informática (…). (…) comecei a trabalhar no ramo
mais fácil: hotelaria. Foi nessa época que saí de casa da minha mãe”, disse em
entrevista a João Louçã, em 2011 ou 2012.
“Nunca mais tive qualquer possibilidade de trabalhar na área de informática, não
havia muitas possibilidades. As poucas empresas, todas elas eram familiares. O
primeiro trabalho foi num snack bar, em 1992.” Em meados de 1993, consegue
um trabalho de restauração em Lamego, fica por lá um ano, mas “(…) sempre
quis sair daquela terra (…)”. Depois, dois anos no Porto, “nos primeiros 6 meses
no Porto, trabalhei nos bares do aeroporto Francisco Sá Carneiro. (…) Também
tinha deixado de estudar, os meus grandes sonhos relacionados com letras, já os
tinha perdido todos (…).”
CARÊNCIAS
REVISTA KORPUS
“Foi mais ou menos nesse período, (…) em conversa com amigos em casa, de
repente, imaginei que era capaz de fazer uma revista. Os meus amigos julgavam
que eu estava a delirar, eu disse-lhes: "Vocês não acreditam em mim? Esperem
para ver". Bastaram duas semanas, eu desenvolvi um projeto, tudo muito
artesanal e rudimentar e consegui produzir uma revista, com aquelas
características muito modestas. Claro. Na altura mais porque gostava e, por
outro lado, para lhes provar que conseguia fazer. (…) mandei fazer 500 cópias –
e a temática fazia parte da minha natureza e do meio em que eu me envolvia,
daí a temática gay. Só depois de ter lançado este primeiro número é que caí em
mim e percebi a dimensão daquilo que fiz. A responsabilidade de tudo aquilo
que isso implicava nessa época, assustei-me.”.
Vocação confessa torna-se projeto a tempo inteiro, trabalhar “por conta própria”
na Korpus, que conseguiu publicar durante 12 anos, 9 dos quais viveu
“exclusivamente para a revista”.. O termo “lgbt” só seria criado e usado anos
mais tarde, havia “gays e lésbicas”, ou simplesmente “homossexuais”. Não
existiam telemóveis, nem acesso a internet. Em 1998, quando a Korpus, ou seja,
ele se muda para Lisboa, escreveu sobre a perceção de preencher um “grande
vazio na comunidade homossexual portuguesa” com uma publicação que era
“luz na escuridão para muitos leitores”.
À época não havia qualquer outra revista “gay” especializada. Era impressa em
papel, distribuída à pata pessoa a pessoa ou no balcão de um bar ou sauna,
discoteca, quiosque. No Porto, antes, queixava-se da falta de apoios e de
associações na cidade. Não tardariam. “Ao fim de 9 anos”, já em Lisboa há 7, “as
dificuldades – tocam-nos a todos. Tive dificuldades financeiras que me obrigaram
a procurar um trabalho complementar (…).
CALL CENTER
O Isidro Sousa era vox populi e classe precária. Era solidário e seguia uma ética.
Representou meticulosamente multidões, grupos e culturas, dinâmicas humanas,
sociais e políticas de um período especial. Editor solitário, por vezes
acompanhado. Por vezes crítico do ativismo, ou dando voz a críticas nem sempre
na linha das narrativas mais ativistas que acabariam por ganhar terreno.
FOTOS “PICANTES”
Não as abandonou, nem aos contos “eróticos” gay em nome de maior audiência,
como lhe sugeriam. A Korpus continuou a ser à imagem do Isidro Sousa.
Incorporou a correspondência do Clube amigo nos “correios do leitor” e
anúncios pessoais. Alargou as colaborações, evoluiu.
Escritor de contos, teve uma atividade editorial fervilhante que se prolongou até
aos anos recentes. Conheceu, reuniu e publicou imensas pessoas que conheceu
durante e após a Korpus. Coletâneas, edições de autorxs: “A Bíblia dos
Pecadores”, “Beijos de Vampiro”, “Devassos no Paraíso”, “Filhos de um Deus
Menor”, “Bendita Manjedoura!” ou “Anjos e Demónios”, “Ninguém leva a mal”
…
Deixou 2 caixotes, em princípio num bar de Lisboa, a saber com que amigo(s).
Desde que foi forçado a regressar ao Porto, veio a Lisboa uma única vez, era-lhe
difícil financeiramente. Mas tinha combinada uma vinda, que não chegou a
realizar, para abrir os famosos caixotes “de papelada”. Com sorte, neles, poderão
,p p p , ,p
ser encontradas e digitalizadas publicações que teimam não aparecer, como o 5º
boletim do Clube Amigo, talvez o verdadeiro número zero da revista Korpus.
Suplementos e Antologia
Revista Korpus
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