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Aviso: Esta é uma tradução não autorizada realizada com fins


estritamente didáticos para a turma de Sociologia I da UFS
(2020.1) considerando as dificuldades de acesso a textos em língua
inglesa. O tradutor não é um especialista e a versão apresentada
resulta de um nível intermediário de domínio da língua inglesa.
Quando houve dúvidas, na tradução de algumas palavras e/ou frases,
mantive o original entre parênteses. Tabelas, referências
bibliográficas e notas devem ser procuradas na versão original do
livro.

LENGERMANN, Patricia Madoo, NIEBRUGGE, Gillian. The women


founders. Sociology and Social Theory: 1830 - 1930. 1. ed.
Illinois, USA: Long Grove, 1998.
Introdução: Presente na criação: mulheres na história da
Sociologia e da Teoria Social.

Este é um livro sobre teoria social e sobre e história da


Sociologia. Ele faz três afirmações: Que as mulheres sempre
estiveram significativamente envolvidas na criação da Sociologia;
Que as mulheres têm sempre feito distintivas e importantes
contribuições para a Teoria Social; e que as contribuições das
mulheres para a Sociologia e Teoria Social tem estado fora dos
registros das disciplinas históricas. Nossa primeira afirmação
deve-se ao esforço contemporâneo de feministas em reconstruir a
contribuição de mulheres para a história da Teoria Social
(Broschart, 1991a,b; Collins, 1990; Costin, 1983; Deegan, 1988;
1991; Fish, 1981, 1985; Fitzpatrick, 1990; Hill, 1989; Hoecker-
Drysdale, 1994; Keith, 1991; Lemert, 1995; Lengermann and
Niebrugge-Bratley, 1996; McDonald, 1994; Reinharz, 1992, 1993;
Rosenberg,1982; Terry, 1986). Nossa segunda afirmação se refere
ao foco particular deste livro: a explicação da Teoria Social das
mulheres fundadoras. Nossa terceira afirmação é o tema deste
capítulo, o qual explora como a escrita das mulheres fundadoras é
parte da política de gênero e de uma política do conhecimento
dentro da disciplina.
Nossa análise foca na vida e na teoria social de quinze mulheres
que estiveram presentes e atuaram na criação da Sociologia.
Harriet Martineau (1802 – 1876); Jane Addams (1860 – 1935);
Charlotte Perkins Gilman (1860-1935); Anna Julia Cooper (1858 –
1964); Ida B. Wells-Barnett (1862 – 1931); Marianne Weber (1870 –
1954); Beatrice Potter Webb (1858 – 1943); e o grupo intitulado
“Mulheres da Escola de Sociologia de Chicago”: Edith Abbott (1876
– 1957); Grace Abbott (1878 – 1939); Sophonisba Breckinridge (1866
– 1948); Florence Kelley (1859 – 1932); Frances Kellor (1873 –
1952; Julia Lathrop (1858 – 1932); Annie Marion MacLean (ca. 1870
– 1934; e Marion Talbot (1858 – 1947). Estas mulheres, todas
participantes significativas no desenvolvimento da Sociologia,

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emergem em nosso estudo como iniciadoras de uma história que


inclui muitas outras mulheres.
Uma das maneiras de uma disciplina ou uma profissão socializar
novos membros é falando sobre sua história por meio de seus textos
com maior autoridade, descobertas, pensamento e ideias, isto é,
definindo o cânone das disciplinas. Os sociólogos da história
falam deles mesmo porque isto reafirma sua identidade tanto para
quem fala quanto para quem ouve: quem são os sociólogos? O que os
sociólogos fazem? Para quais aspectos da vida social os sociólogos
olham? (Halbwachs, 1992). Diferentes nações produzem diferentes
histórias da sociologia ocidental (Donald Lavine, 1995). Ao
desenvolver o tema deste capítulo e deste livro, nós focamos
preliminarmente como a Sociologia americana tem construído sua
história da disciplina, o foco que reflete nossa própria
localização dentro da tradição americana. Mas nós argumentamos
que toda tradição nacional é uma escrita em que as mulheres estão
ausentes e que esta escrita distorce e diminui o entendimento
sobre a Sociologia e sobre o que ela faz. Ao recuperar a presença
das mulheres na criação da Sociologia e da teoria social, nós
descobrimos o papel da sociologia na formação de várias sociedades
ocidentais, a direção que isto teve, os caminhos que isto pode
ter escolhido.
A história da Sociologia é tipicamente contada como a história de
seus teóricos e de suas teorias. Isto poderia ser contada como a
história da maioria dos trabalhos empíricos (veja, por exemplo,
Bulmer, Bales, and Skalar, 1991; Kent, 1981; Madge, 1963; Platt,
1996; Reinharz, 1992) ou do desenvolvimento de campos
especializados tais como criminologia ou comportamento coletivo.
Mas há razões para escolher estudar a Sociologia como a história
de suas teorias, até onde possamos recordar, nós temos feito uma
escolha. A “teoria” – a palavra vem do verbo grego “ver” – pode
ser entendida como uma lente que dirige nosso olhar para uma
direção dada, de modo que dá um foco sobre alguma de suas
características enquanto desconsidera outras. Se nós não temos
uma teoria para guiar nossa atenção, todas as coisas podem se
apresentar para nós como se tivessem a mesma importância “uma
realidade bagunçada e barulhenta” em uma frase de William James.
A teoria social sistematicamente dirige nossa atenção certas
características das relações sociais humanas; as teorias sociais
podem ser distinguidas entre si pelas características que
enfatizam.
A história das teorias sociológicas é convencionalmente contada
como uma história da agência do homem branco – um conjunto de
contribuições teóricas de uma geração de homens “fundadores”,
Auguste Comte, Hebert Spencer and Karl Marx, escrevendo em meados
do século XIX, expandido por um segundo grupo, a geração dos
homens “clássicos”, Emile Durkheim, Max Weber, George Simmel,
George Hebert Mead, and Robert Park, que escreveram entre 1890 e
1930. Esta história é contada como um conjunto de coisas que
teriam ocorrido naturalmente, uma crônica para além da capacidade

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humana de mudá-la. Em contraste, nós retratamos esta história como


uma construção social surgindo dos arranjos das disciplinas do
poder, e como toda história, refletindo um contínuo conflito entre
a inclusão e a exclusão de valores e práticas (Becker, 1971;
Lemert, 1995; D. Smith, 1987). Neste capítulo, primeiro vamos
estabelecer o fato de que as mulheres tiveram uma significante
presente na criação da Sociologia. Depois vamos explorar como
foram excluídas da história da Sociologia. Nós concluímos com a
exploração das razões de sua reintrodução contemporânea entre os
cânones da Sociologia.

Uma presença significante: mulheres como sociólogas, 1830-1930.


A afirmação de que as mulheres foram “excluídas” da história é
diferente da afirmação de que o grupo tem sido invisível.
“Invisibilidade” sugere não ser vista, isto é, nunca teve a
presença como significativa – um conceito muito utilizado por
afro-americanas para suas experiências de marginalização (ex.,
Collis, 1990; Cooper, 1892; Du Bois, 1903; Ellisson, 1952; Lorde,
1984; Rollins, 1985). “Ser excluída”, sugere ter sido vista em
algum momento pela comunidade e então ser apagada destes
registros. Por muitas razões, o caso das 15 mulheres sociólogas
tratadas neste capítulo é mais um exemplo de “apagamento” do que
“invisibilidade”. Primeiro, quase todas estas mulheres foram
figuras públicas bem conhecidas em seu tempo. Mais do que novatas,
elas ajudaram a criar a disciplina da Sociologia, tal como os
trabalhos Marx, Max Weber ou Durkheim, seus trabalhos tinham
relevância para todas as ciências sociais. Segundo, elas criaram
a teoria social e fizeram Sociologia ao mesmo tempo e no mesmo
lugar que os homens fundadores (ver figura 1 e 2 no texto
original). Terceiro, elas foram largamente reconhecidas por seus
contemporâneos, incluindo sociólogos homens, como importantes
analistas sociais. Quarto, todas atuaram como membros da
comunidade sociológica como parte de uma associação de sociólogos,
publicações enquadradas em uma preocupação explícita com os
princípios da Sociologia, auto identificadas como sociólogas e
reconhecidas por seus contemporâneos como sociólogas (Käsler,
1981; Deegan, 1991). Nós introduzimos algumas das evidências para
estas afirmações em uma breve descrição destas mulheres a seguir.
Nós desenvolvemos estas evidências mais profundamente nos
capítulos subsequentes.
Martineau (Cuja obra Illustration of Political Economy (1832 –
1834) superou as vendas de Charles Dickens (Hoecker-Drisdale,
1992)- foi uma brilhante e proeminente mulher das letras até sua
morte. Escreveu sobre análise social, jornalismo, história,
novelas, estórias infantis e livros de viagem. Há muito
identificada na história da Sociologia por sua tradução e síntese
de 1853 sobre Comte, ela mesma já escrevia sociologia já em 1934,
esboçando o que poderia se tornar o primeiro estudo sobre o método:
Como observar a moral e os costumes (1838b) e testando seu método

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em seu clássico estudo Sociedade na América (1836). Addams foi a


fundadora da Hull-House, famoso estabelecimento social de Chicago;
uma importante porta voz da Reforma progressista ao lado dos
imigrantes, sindicatos, mulheres, crianças, pessoas da classe
operária e afro-americanas (Davis, 1973; Daniel Lavine, 1971). Na
Hull-House, ela administrou a maior pesquisa institucional,
aproveitando suas experiências nesta condição para formular uma
teoria social em oito grandes livros e aproximadamente 200
artigos. Ela se auto identificava como socióloga, ensinava
Sociologia, era um membro da Sociedade Americana de Sociologia
(ASS) – cujo nome até 1959 era Associação Americana de Sociologia
(ASA); publicou no Jornal Americano de Sociologia (AJS), mantinha
boas relações com Mead, Park, W.I. Thomas, Albion Small, and
Ernest Burgess (Deegan, 1988). Gilman foi amplamente considerada
com a principal intelectual feminista de seus dias. Seu “Mulheres
e economia” (1898) foi impressa nove vezes até 1920 e traduzida
em sete línguas, e foi a bíblia para muitos grupos de mulheres
estudantes universitárias (Ceplair, 1991). Além da clássica novela
feminista “The Yellow Wallpaper” (1892) e mais de 2 mil textos
publicados em jornais, poesia e prosa, ela escreveu seis
importantes trabalhos de teoria social formal, incluindo
“Economics and womens”, “Human work” (1904)e “Man-Made World”
(1911). Ela também publicou no AJS e foi membro da ASS e manteve
relações intelectuais com Lester Ward and E.A. Ross
Wells-Barnett, líder nacional e internacional em campanhas anti
linchamentos, escreveu a maior análise sobre o assunto – Southern
Horrors (1892) e “A Red Record” (1895 – e
Página – 4 – Figura 01 – Linha do tempo de mulheres e homens
fundadores da Sociologia (ver no texto original)
Página 05 do original
E levando a batalha para a Inglaterra, onde ela com frequência
falava para milhares de pessoas. Ela foi uma ativa organizadora
dos direitos dos Afro-Americanos, ajudando a fundar “Associação
Nacional para o avanço das Pessoas de Cor” (NAACP). O principal
livro de Cooper é “The voice from the South (1892) recebeu
comentários positivos em publicações tanto de negro quanto de
brancos, o que a fez uma proeminente intelectual e porta-voz para
mulheres afro-americanas. Ela foi uma das duas mulheres a
participar da Primeira Conferência Pan-Africana em Londres em
1900. Cooper e Wells-Barnett criaram uma genuína teoria americana
do conflito “não-marxista” na qual discorreram sobre um quadro
sociológico de seu argumento, mas o racismo americano fez a
tentativa de desvinculá-las da Sociologia profissional branca.
Além disto, ambas conheciam e trabalharam com a socióloga negra
W.E.B. Dubois. Marianne Weber viveu no centro do círculo da
Sociologia na Alemanha e debateu as ideias tanto de Simmel quanto
as de seu marido Max in seus próprios escritos. Ela foi uma líder
no movimento feminista germânico, a primeira mulher a ser eleita
para o parlamento e foi autora de nove livros de análise social e

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Sociologia incluindo seu monumental trabalho sobre a posição legal


das mulheres “Marriage, Motherhood and Law” (1907) sua coletânea
de ensaios “Ensaios sobre mulheres e sobre os problemas das
mulheres” (1919). Ela, também, ajudou a manter a posição de Max
Weber dentro da Sociologia depois de sua morte editando e
publicando 10 volumes de seu trabalho e escrevendo uma importante
biografia dele.
Webb foi discípula de Spencer, auto identificada como uma
socióloga, ensinou Sociologia, trabalhou como uma investigadora
social na maioria dos trabalhos empíricos de sua época (Charles
Booth’s Life and Labour of the people of London), e fez suas
próprias investigações independente, liderando a clássica reforma
socialista “The Co-operative Moviment in Great Britain (1891).
Com seu marido Sidney, ela pesquisou em co-autoria onze volumosos
trabalhos da Sociologia empírica que deu a base para a social-
democracia britânica. Todas as membros da Escola de Mulheres de
Chicago, Mulheres de Chicago, escreveram proficuamente como
analistas sociais, todas publicaram na AJS. Muitas foram
proeminentes figuras públicas: Kelley liderou a Liga Nacional de
Consumidores (1899 – 1932); Lathop (1912-20), e depois Grace Abott
(1920-34), serviram como chefes do Comitê de Crianças, a mais alta
posição de uma mulher no governo federal daquele tempo. Edith
Abbot e Breckinridge fundaram a Escola de Serviço Social e
Administração da Universidade de Chicago (1922); Talbot foi a
reitora de mulheres (dean of women) da Universidade de Chicago
(1893 – 1925); Keller foi a fundadora e a oficial executiva da
Liga Americana de Arbitragem (1926-1953). Kelley conhecia
Friedrich Engels, manteve correspondência com ele até a morte dele
e fez a primeira tradução inglesa de “The Condition of the Working
Class in England” em 1844. MacLean estudou com Small, Mead e
Charles Henderson. Kellor também estudou com Henderson. Edith
Abbott, Grace Abbott e Breckinridge são todas referencias em
“Introduction of the Science of Sociology” de Park e Burgess.
Talbolt serviu como editora associada da AJS desde a sua fundação
por Small até sua aposentadoria em 1925.
Estas mulheres conheciam-se ou conheciam os trabalhos de cada uma
delas. Gilman, Webb, Weber e Wells-Barnett, todas visitaram a
Hull-House, que foi, claro, a base de trabalho para Addams e a
maioria das “Chicago Women”. Muitas delas leram “Women and
Economic” de Gilman – Webb, Weber, Addams, Kelley, Lathrop e
Talbot. Addams publicou com Wells-Barnett sobre
Ver quadros das páginas p. 6, 7, 8 e 9 no texto original
------------------------------------------------------- p. 10
linchamentos ao menos em duas ocasiões, uma das quais foi sobre
uma questão central da Survey realizada em fevereiro de 1913 na
qual Addams, Wells-Barnett e Beckinridge participaram na fundação
da NAACP. Hull-House residentes, incluindo Addams, Lathrop, and
Kelley, usaram o “The co-operative Movement in Great Britain” de
Webb em preparação de seu próprio empreendimento dentro da casa

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para mulheres trabalhadoras. As principais pessoas fora desta rede


era Martineau, uma geração mais nova do que as demais mulheres e
Cooper, cujo curso da vida raramente a levou a Chicago. Já Edith
Aboot conhecia e respondeu sobre o trabalho de Martineau sobre
emprego de mulheres na América e Gilman se refere a luta de
Martineau para superar as barreiras de gênero para sua carreira
como analista social. Cooper falou em Chicago em 1893 no Congresso
de Feministas Brancas, foi ativista, como foi Wells-Barnett, na
Federação Nacional de Clubes de Mulheres Negras, casa do movimento
e escreveu uma simpática resposta ao suicídio de Gilman.
Estas mulheres sabiam que elas eram parte de um grande movimento
para criar a ciência da sociedade e tinhas suas próprias ideias
de como esta ciência deveria ser: um projeto de crítica social na
qual pesquisa e teoria tinham como um foco moralmente necessário
a descrição, análises e correção das desigualdades sociais. O foco
nas desigualdades variava conforme a mulher fundadora: gênero,
classe e raça – tudo aquilo que poderia se tornar uma empresa
acadêmica formal, a província de homens brancos educados. Mas, no
momento em que estas mulheres eram escritoras, a Sociologia era
um projeto intelectual tanto delas quantos dos homens; é apenas
na história da Sociologia que elas desaparecem.

GÊNERO E CONHECIMENTO: A POLÍTICA DA APAGAMENTO (ERASURE


Apesar de seus trabalhos em Sociologia e Teoria Social e de sua
visibilidade para seus contemporâneos, as mulheres fundadoras
desapareceram como uma presença significativa dos registros da
Sociologia, sobrevivendo apenas em posições marginalizadas.
Martineau é lembrada como tradutora de Comte; Weber, como a criada
para o gênio; Webb, como parceira de Sidney; Addams, como uma
santa secular; Gilman como a excêntrica gênia do “Yellow
Wallpaper”; e as Mulheres de Chicago, como trabalhadoras sociais
e reformadoras. Cooper é citada por Dubois mas é reconhecida
apenas como “a mulher da raça” (Washington, 1988). Este apagamento
pode ser entendido nos termos de uma série de processo de poder
envolvendo a conferência (conferral) ou negação da autoridade
entendida como “uma forma de poder que é uma capacidade de tornar
coisas em palavras.” (a form of power that is a distinctive
capacity to get things done in words)(D. Smith, 1987: 29). Quase
todas as mulheres fundadoras foram conscientes da importância da
autoridade, [...] como Smith fez, para uma habilidade para fazer
coisas em palavras e reconhecer seu entendimento como um problema
particular para mulheres. Nesta seção nós focaremos na autoridade
como um fator em duas intrincadas políticas interrelacionadas que
determinaram no destino destas mulheres: a política de gênero e a
política de conhecimento.
-----------------------------------------------------------p. 11
A fim de entender a precária relação das mulheres com a autoridade
neste contexto, é instrutivo dar uma olhada na carreira de Addams.

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Nós escolhemos Addams vários motivos. Primeiro, por sua estatura


como uma presença na Sociedade Americana; segund, porque sua
relação com sociólogos homens é bem documentada (Deegan, 1988);
terceiro, porque ela publicou trabalhos que foram reconhecidos
por seus contemporâneos como Sociologia e, quarto, porque ela se
auto identificava como socióloga. Seu caso é um exemplo do
processo de poder que apagou mulheres da história da Sociologia.

Uma política de gênero


O apagamento das mulheres fundadoras é basicamente explicada em
termos da tênue sustentação da autoridade das mulheres na cultura
produzida pelo homem; esta tenuidade é entendida por meio de uma
análise de como uma pessoa está “presente” ou é conhecida na
consciência de outra pessoa. Nós desenvolvemos esta análise por
meio da revisão feminista da teoria fenomenológica da teoria de
Alfred Schutz (Lengermann and Niebrugge-Brantley, 1995; Schutz,
1967; Schutz and Luckmann, 1973).
For Schutz a capacidade para conhecer outra pessoa é aprendida em
uma situação face-a-face, a relação essencial da vida humana, na
qual uma consciência reconhece o outro como “ele mesmo”. Schutz
chama isto de “thou-orientation” ou “consociete”, relation (5).
Quando os indivíduos saem da relação face-a-face, ou relação
“consociate” eles entram no que Schutz genericamente categoriza
como uma relação “contemporary”. Não mais presentes fisicamente
para o outro, indivíduos estão presentes na consciência do outro
– se conhecem – por meio de construções mentais ou “tipificações”.
Uma tipificação pode estar em uma experiência prévia, informações
advindas de conhecimento mútuo, documentos produzidos ou por
conversas sobre o outro, ou ações realizadas pelas quais o outro
é conhecido. Quando uma pessoa morre, ele se torna um predecessor
no esquema de Schutz ainda mais rígido e duradoura de tipificação.
Com o passar do tempo, como aqueles que conheciam um indivíduo
também morrem, o predecessor é lembrado cada vez mais por meio de
artefatos – coisas que as pessoas pensam ou escrevem, ou coisas
de outras coisas feitas ou escritas sobre a pessoa. Em uma
profissão academicamente baseada, como a Sociologia, os artefatos
chaves para tipificarem seus predecessores são seus escritos, os
quais podem se tornar parte de um cânone.
Fatorando o gênero o altera de diferentes maneiras. Como muitas
estudiosas feministas demonstram, mulheres tornam-se presentes
para a consciência masculina nas relações face-a-face não como
“Eu-você” um ser como eu mesmo, mas como Eu-outro (ex.: Anzaldua,
1990; Benjamin, 1988; Chodorow, 1978; Collins, 1990; DeBeauvoir,
1947/1963; Keller, 1985; Lengermann and Beibrugge-Brantley, 1995;
Minnich, 1990; Olsen, 1972; Smith, 1972). As mulheres fundadoras,
embora tivessem forte presença individuais, foram vistas seus
colegas homens através do véu do privilégio masculino como “o ser
que não precisa ser levadas a sério” (less-than-being”) – o que
lhes tirava a autoridade. As mulheres fundadoras tiveram a

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consciência de como elas foram lembradas nas relações face-a-face


com os homens. Martineau na introdução para Society in America,
destaca: “Isto era frequentemente lembrado para mim, que sendo
uma mulher, estava em desvantagem” ao fazer pesquisa social
(1936/1937: I, XII). Cooper escreve sobre um encontro com uma
autoridade masculina no qual sua decisão de “ir para a
universidade ... foi recebida com uma certa com a mesma
incredibilidade e desânimo [...].
----------------------------------------------------------p. 12.
Ver figura 1-3 “Uma visão geral da carreira de Addams na
Sociologia” – no texto original.
----------------------------------------------------------p. 13.
(1892: 77-78. Mesmo Webb, que tipicamente escolheu negar a
discriminação de gênero, dedica páginas de seu diário de 1889 e
sua autobiografia de 1926 para apresentar uma conversa na qual o
professor Alfred Marshall de Cambridge tentou desencorajá-la de
escrever The Co-operative Movement “Eu posso pedir para minha
esposa ler para mim a noite enquanto penso no tempo, mas eu não
vou prestar nenhuma atenção sobre isto” (Webb, 1926: 352).
Quando uma mulher é contemporânea mas sem a presença direta do
outro, sua reivindicação por autoridade se torna sempre mais
frágil, por ela não poder contrapor a tipificação de “mulher” pela
qual ela é estereotipada e dinimuída na consciência masculina.
Marianne Webber relata como em 1893 antes de seu casamento com
Max que foi enviada por sua família para a escola de economia
doméstica e ela escreveu para Weber perguntando por livros para
ler. Ele respondeu com preocupação que ela deveria procurar um
lugar doméstico pela ela própria. “Minha mente diz-me ... você
terá uma posição mais segura ... se [seu] ponto de foco não estiver
em um pueril reino intelectual-filosófico... mas [no] domínio da
atividade prática ... Para ... na esfera intelectual, eu tenho
naturalmente maiores recursos. (Weber, 1926/1975: 186/187). Em
1899, Kelley actively lobbied Governador Theodore Roosevelt pela
posição de inspetora de fábricas do Estado de Nova York (um
trabalho similar que ela tinha realizado em Illinois). Ela
escreveu para Roosevelt, enviou para ele cópias de suas
publicações, pediu Lilian Wald (a fundadora do Estabelecimento
Henry Street na cidade de Nova York) para pressionar o seu caso,
e tinha Addams vindo de Chicago para encontrar com o govenador.
Mas Roosevelt, decidiu que o momento “não estava maduro” para
encontrar uma mulher e no lugar encontrou um homem que, embora
admitiu ele não conhecer nada sobre o trabalho solicitado, este
homem também sido ativamente pressionado pela posição. Roosevelt
avisou este homem para conversar com Kelly “Ela conhece sobre
aplicação das leis das fábricas mais do que qualquer homem que eu
conheço, e eu quero que você mantenha contato com ela”. (Sklar,
1995: 293-294). Apesar de sua ligação próxima com os sociólogos
da Universidade de Chicago, os trabalhos de Addams, como mostra a
figura 1-3, foi marginalizado por eles desde o início. Em sua

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Introduction to the Science of Sociology, texto requerido por


estudantes de Sociologia entre 1921 e 1940, Park e Burgess reuniram
cerca de 800 páginas de leituras com aproximadamente 200 páginas de
seu próprio texto [Park e Burgess put together some 800 pages of
readings with approximately 200 pages of their own text]. Eles se
referem a dois livros de Addams mas não fazem referências a eles.
Em contraste há 43 referências a Simmel, incluindo 10 citações
[redings]. Este contraste entre Addams e Simmel é dado como certo
hoje porque a história da disciplina mostra como eles, por meio
desta introdução, criaram um rank entre os autores valorizando os
sociólogos homens em detrimento das sociólogas mulheres [has
taught that this how They should rank, but here in the
introduction]
Uma vez que uma mulher morre e se torna uma predecessora, ela é
realmente é submetida ao pressuposto do patriarcado: “O universo
de ideias, imagens e temas – os meios simbólicos que são a moeda
corrente do pensamento – foi também produzido pelo homem ou
controlado por ele. Se os trabalhos de mulheres e experiência
foram inseridos dentro dele, isto foi feito nos termos decididos
pelos homens” (D. Smith, 1987:19). Na Sociologia acadêmica, um
elemento chave na manutenção do predecessor é o cânone, e as
mulheres têm sido excluídas dos cânones da Sociologia (Sprague,
1997). Um simples teste pode ser feito aqui para o leitor: confira
novamente a lista apresentada no início deste capítulo e responda
você mesma quantas vezes você tem lido seus escritos ou discutido
suas ideias como tópico central de uma aula de Sociologia.
Incluindo no cânone – ou sob uma microescala, nas sílabas – é mais
que uma atividade de seleção, isto pede ao leitor para orientar
em direção de uma obra seriamente, isto é, para ver no trabalho a
qualidade da autoridade. A importância deste pedido que o
---------------------------------------------------------- p. 14
leitor oriente seriamente para um trabalho é demonstrado no
clássico estudo que descobriu que respostas espontâneas de
estudantes para obras literárias frequentemente produziu
classificações muito diferentes do cânone estabelecido. O autor
deste estudo, I.A. Richard concluiu “Sem o controle disto...
misterioso, autoridade tradicional, poetas dos estabelecimentos
mais renomados poderiam muito rapidamente e surpreendentemente
mudar seu lugar na aprovação geral.” (1929/1969: 297).
A marginalização da mulher como predecessora produzida pelo
patriarcalismo é ilustrado no destino profissional de Martineau e
Addams. Os textos de teoria social citados na Figura 1-3, todos
escritos por homens, todos marginalizaram Addams. Este processo é
também evidente ao longo poema que Burguess escreveu em homenagem
a Addams na ocasião de sua morte, um poema que efetivamente
trivializa as conquistas intelectuais de Addams
sentimentalizando-a por seu “espírito” maternal “Jane Addams, mãe
dos pobres e dos necessitados / e de toda a humanidade ... / ...
Ótima vizinha / Dos pobres, raramente presenteados pela simpatia,

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.../ o olhar pensativo em seus olhos, compaixão / Pela


desumanidade do homem para o homem / ... Seu espírito fica para
abençoar nosso espírito e trabalho ( as 93 linhas deste poema
podem ser encontrados em Deegan, 1988: 150-151)7. De modo similar,
o obituário de Martineau, borra, distorce, e, finalmente, apaga
sua contribuição. Jhon Morley, escrevendo para a geração que
poderia tê-la seguido, reconheceu “um olho seguro para a realidade
social”, mas escolheu em insistir em seu caráter, declarando que
ela possuía “qualidades finas, as quais poderiam ser descritas
como viris” – “indústria e energia ... uma esplendida sinceridade,
um magnífico amor à verdade.” (citado em Pichanick, 1980: 242). A
definição de gênero presente nesta avaliação de Morley, prenuncia
o destino de Martineau. Se “indústria e energia ... uma esplendida
sinceridade, um magnífico amor à verdade” são “viris”, que resta
às mulheres pesquisadoras.8

Uma política de conhecimento


A marginalização das mulheres fundadoras pela política de gênero
foi acelerada dentro da comunidade sociológica pelo resultado do
debate sobre objetivo da Sociologia e a função social da/o
socióloga/o – um objetivo determinado pelas relações de poder
profissionais que podem ser entendidas como uma política de
conhecimento. Este debate moveu-se entre posições em um continuum
descrito como “objetividade versus engajamento (advocacy)”
(FURNER, 1975); atemporalidade versus especificidade histórica
(Ross, 1991), ou “serviço intelectual objetivo” versus “propósito
reformista” (M. Smith, 1994). No período entre 1890 e 1947, a
elite da Sociologia acadêmica chegou ao consenso que as regras
apropriadas para a Sociologia era a do comprometimento com o rigor
intelectual, neutralidade e abstração formal (Aspecto desta
história da Sociologia americana pode ser encontrada em Bannister,
1987; Diner, 1980; Furner, 1975; Halliday and Janowitz, 1992;
Kuclic, 1973; Lemert, 1995; Lengermann, 1979; Donald Lavine, 1995;
Rosenberg, 1982; Ross, 1991; Silva e Slaughter, 1989; M. Smith,
1994; Turner e Turner, 1990; Wilner, 1985).
Nós podemos traçar a emergência deste consenso através de quatro
declarações representativas feitas por homens fundadores da
Sociologia acadêmica. Em 1895, no artigo principal da primeira
edição do AJS, o editor Albion Small assumiu um meio termo no
debate, chamando de conhecimento científico...
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ao endossar uma prática proposta para a nova revista e para a
Sociologia: “nenhum assunto que pertença às atividades dos homens
está abaixo da atenção da Sociologia”. Os colaboradores deveria
ser “homens e mulheres que estão recolhendo o material da
filosofia social das mais diversas fontes”, os conteúdos iriam
variar com base na “metodologia” para a “melhoria social”, para
as “condições sociais”; e a proposta era fazer que a compreensão

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das pessoas crescesse de maneira que elas pudessem desenvolver


“mais combinações efetivas para a promoção do bem estar geral”
(Small, 1895: 14). Mas a partir de 1916, no aniversário da vigésima
edição, Small falou sobre a mudança ocorrida na Sociologia
acadêmica distanciando das reformas sociais em direção a pesquisa
pura e ao conhecimento acadêmico. A comunidade sociológica estava
“crescendo mais e mais insatisfeita com o caminho no qual ...
homens estavam procedendo ... no interesse de melhoramento social”
como viúvas sociais alegres dos dois sexos que pensou que
resolveriam os problemas entre xícaras de chá”. A reputação da
Sociologia acadêmica estava agora sendo vista como dependente do
rigor científico. Se [sociólogas/os] mantém o reconhecimento
acadêmico que conquistaram, vai depender se elas/es forem tão
científicos quanto o mais responsável de seus colegas (Small,
1916: 768; 861-63). Em 1921, seu texto definitivo da Introduction
to the Science of Sociology, Park e Burgess, descreveu a
Sociologia como um projeto de investigação científica pura e
generalizada: “ uma ciência fundamental ... não mera semelhança
com programas e práticas do bem estar social... a Sociologia é
uma ciência abstrata da experiência humana e da natureza humana”
(1921: 42-43). Em 1947, no quinquagésimo aniversário a AJS, seu
editor, Luis Wirth consolidou a escolha pela expertise técnica,
abstração e neutralidade. Ele descreveu a Sociologia como tendo
início “com as migalhas que caíram da mesa... das disciplinas
acadêmicas mais bem estabelecidas ... tópicos tais como pobreza,
delinquência e crime, insanidade, casamento e divórcio, favelas e
outras patologias, aliados ao tema da comunidade, grupos
voluntários, classes e raças” (Wirth, 1947: 276). Ele
desqualificou muitos jovens sociólogos como “trabalhadores
sociais, reformadores sociais, profetas sociais e críticos sociais
que, por desejar um refúgio acadêmico, tinha se identificado com
a adolescente ciência da Sociologia” ((Wirth, 1947: 273). O ensaio
de Wirth é importante porque ele é essencialmente irrefletido
(unreflective); ele pressupõe (assumes) que qualquer um dos
leitores da AJS em 1947 poderia compartilhar deste ponto de vista.
Mas todas as mulheres fundadoras definiram como a maior
preocupação os tópicos que Wirth desqualificou como: pobreza,
classe e raça, isto é, a desigualdade social. Problemas de gênero
como casamento e divórcio e meios pelos quais comunidades e grupos
voluntários funcionavam. Muito sociólogos homens compartilhavam
deste ponto de vista.
A explicação inicial para o crescimento da ênfase na expertise
científica definiu a universidade como o espaço legítimo de
trabalho da Sociologia, um movimento que foi parte da busca pela
autoridade profissional, status social e trabalho e salários
seguros. Muitos espaços de trabalho potenciais foram abertos à
Sociologia na década de 1890 – agências de serviço social,
pesquisa e grupos políticos (policy make-groups), associações
(settlement house) políticas, religiosas; organizações de
trabalhadores e vários grupos progressistas de pressão. Estas

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possibilidades eram frequentemente esquecidas na história das


ciências sociais e da Sociologia, parcialmente porque o trabalho
das mulheres fundadoras neste período não era considerado e
parcialmente porque os historiadores escreveram a partir de seu
lugar na academia, e, portanto, de seus privilégios. Mesmo assim,
a educação superior era inquestionavelmente, uma indústria em
crescimento, abrangendo 2% de todas as pessoas em idade
universitária em 1890, e 15% em 1940 (Ross, 1991: 161). O efeito
desta expansão

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foi multiplicado pela duplicação da população do EUA naquele
período. Neste contexto, a Sociologia americana estabeleceu por
conta própria “como uma disciplina [com] sucesso” (Oberschall,
1972: 187), saindo de 4 professores oferecendo cursos em 1880,
para 225 professores e 59 departamentos em 1900 (Morgan, 1983:
43), ainda, para “quase a totalidade das maiores universidades e
faculdades tendo um departamento de Sociologia independente” em
1947 (Wirth, 1947, 279).
Assegurar e expandir neste contexto significava que a comunidade
sociológica se tornou permeada pela expectativa e arranjos de
poder. A universidade, seja pública ou privada, dependia do apoio
econômico de poderosas corporações e grupos governamentais
alinhados com o capitalismo. Sob estas circunstâncias, a
administração universitária, faculdades consolidadas, fundações
de pesquisa trabalham para manter a distância dos problemas
políticos. Mesmo no meio da reforma Progressiva (Progressive
reform), o professor Richard T. Ely referiu-se ao presidente da
Universidade de Chicago dizendo “o movimento dos trabalhadores
podem ter toda razão, mas nós recebemos dinheiro das corporações
e eu estou com os capitalistas a todo momento.” (citado por Sclar,
1995: 295). Muitas universidades pressionadas por seus membros
mais radicais, incluindo os cientistas sociais Henry Carter Adams,
Edward W. Bemis, John R. Commmos, Richard T. Ely, E.A. Ross, W.I.
Thomas e Thorstein Veblen (Deegan, 1988; Fitzpatrick, 1990; Ross,
1991; Sklar, 1995; M. Smith, 1994). Por exemplo, após ter sido
demitido da Universidade Cornell por apoiar abertamente os
trabalhadores no Massacre Haymarket (1886), Adams advertiu seus
seguidores cientistas sociais para “evitar assuntos controversos
e tornarem-se especialistas técnicos para legisladores e comissões
regulatórias” (M. Smith, 1994, 23). O economista Edward Bemis,
após sua demissão da Universidade de Chicago e da Faculdade
Agrícola do Estado do Kansas, se comprometeu com uma reforma com
o prefeito de Cleveland e desenvolveu um modelo de sistema de
águas para cidade (Campbell, 1988). Dentro da cultura acadêmica,
estas pressões foram retrabalhadas para formar um conjunto de
critérios pela academia legítima dentro da qual os sociólogos
acadêmicos tinham que se conformar: um objeto distinto de outras
disciplinas, uma expertise neutra, uma retórica consistente com o

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decoro acadêmico, uma rotinização dos meios de admissão de novos


membros, um corpo de literatura estabelecido – um cânone – através
do qual novos membros eram socializados, e um respeito pela
classificação acadêmica e da publicação profissional (Furner,
1975; Donald Lavine, 1995; Minnich, 1990; D. Smith, 1987; 1990;
Stinchcombe, 1982).
O contexto acadêmico tornou mais difícil para a mulher interagir
com homens como profissionais iguais em relações face-a-face.
Entre 1890 e 1940, no que diz respeito a todas as disciplinas, as
mulheres constituíam, em média, por volta de ¼ das/os
profissionais (Bernard, 1964; Carte, 1981; Morgan, 1978; Misra,
Kennely, Karides, 1997. Esta taxa, está acima da realidade da
partição das mulheres na Sociologia Acadêmica porque ela inclui o
corpo docente em faculdade de mulheres, inclui o corpo docente de
disciplina para mulheres tais como economia doméstica, educação e
ciências liberais. Além disto, falta diferenciar os vínculos
regulares dos de meio período, cargos que as mulheres tipicamente
preenchiam 10. Nesta profissão como um todo neste período, nenhuma
mulher alcançou a classificação de sênior e nenhuma tornou-se
chefe de departamento de Sociologia. Nenhuma mulher serviu como
presidente da Associação Americana de Sociologia. Os artigos
escritos por mulheres representavam menos de 10% das publicações
da AJS e da American Sociological Review (Hugues, 1975)11.
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A tendência para o cientificismo na ciência social academicamente
situada tem sido ocasionalmente retardada ou redirecionada por
momentos de reforma na sociedade mais ampla. Um destes momentos
ajudou tornar possível a produção sociológica das mulheres
fundadoras: A mobilização libertadora Progressista entre 1890 e
1915 pelo trabalhador, grupos de imigrantes, afro-americanos,
formado por um educado segmento da classe média e o movimento das
mulheres da Primeira Onda do Feminismo (ver figura 1 – 2). Outro
momento ocorreu nas décadas de 1960 e 1970 sob os impactos do
movimento pelo Direitos Civis de Afro-Americanos, do movimento
contrário à Guerra do Vietnã e do movimento da Segunda Onda do
movimento feminista. Mas na maioria das vezes a tendência para o
cientificismo na Sociologia acadêmica foi encorajada pelo
conservadorismo generalizado na sociedade e na política americana.
A anomalia aparente nesta ligação da sociedade conservadora com o
cientificismo profissional é, claro, a década de 1930, um período
de crise econômica, militância de trabalhadores, oposição ao
capitalismo e o compromisso do governo nacional com a reforma –
compromisso caracterizado na campanha presidencial de Franklin
Roosevelt em 1932 quando declarou “O país precisa e, a menos se
eu me enganar, o país demanda de uma persistente experimentação”.
Este grito poderia ter parecido uma chamada para a Sociologia
engajada (Sociology of advocacy). De fato, muitos programas do
“New Deal” tinha sido antes defendidos pelas mulheres fundadoras
(ver capítulo 3 e 7). Mas em geral, foi a Sociologia acadêmica
que ofereceu o que ele tinha pedido: expertise técnica na

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avaliação e implementação das políticas do “New Deal”. Esta


resposta é evidenciada pela ausência de críticas na maioria dos
periódicos de Sociologia (Wilner, 1985), a expansão da Sociologia
estatística sob a liderança de Willian Ogburn da Universidade de
Chicago (Bannister, 1987), o trabalho feito por H.L. Henderson em
Havard para formatar a Sociologia e outras ciências sociais dentro
das práticas do conhecimento técnico (Buxton e Turner, 1992), o
movimento na ASS sob a liderança de L.L. Bernard para afirmar
totalmente a Sociologia científica (Bannister, 1987). Além disto,
houve o crescimento do número de sociólogos trabalhando para o
governo federal em Whashington na década de 1930 (Lengermann,
1979).
Na metade da década de 1930, as narrativas da Sociologia de si
mesma tinham passada por uma grande reformulação e marginalizou
muitos pensadores homens e apagou completamente as mulheres
fundadoras. Esta reformulação do registro intelectual da
Sociologia legitimou a combinação entre a teoria estrutural
funcionalista e a pesquisa survey desenvolvida por Talcott Parsons
na Havard e por Robert Merton e Paul Lazarsfeld na Columbia, uma
combinação entre a neutralidade, teoria universalizada e
metodologia para o estudo da sociedade. O trabalho central de
Parsons, The structure of Social Action (1937) defendia uma
natural convergência em direção à definição da Sociologia como o
estudo do consenso e da ordem no sistema social. Convergência
traçada a partir dos trabalhos de quatro pensadores historicamente
não relacionados: Durkheim, na França; Max Weber, na Alemanha;
Vilfredo Pareto, na Italia e Alfred Marshall, na Inglaterra. Em
1921, Parke and Burgees haviam feito apenas três pequenas
referências a Weber e a Marshall (ambos se saíram melhor do
Addams), não mencionou Paretto e deu apenas atenção moderada a
Durkheim. Suas principais referências – medidas pelas referências,
leituras e pela presença – tinham sido Simmel, o próprio Park,
W.I. Thomas, Small, Spencer, Charles Horton Cooley e Charles
Darwin.
Dois pontos emergem deste quadro geral (broad-brush)da política
do conhecimento dentro da Sociologia. Primeiro, o cânone operativo
da Sociologia moderna é uma construção e não um desenvolvimento
natural. Segundo, sua configuração legitima a padronização da
Sociologia que
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é conservada apenas em razão da marginalização das mulheres
fundadoras ter ocorrido muito cedo. Alguns não poderia olhar para
Martineau, Addams, Cooper, Wells-Barnett, Marianne Weber, Webb ou
as Mulheres de Chicago para os fundadores e exemplares
permanecerem seguros na definição de Sociologia que enfatiza o
consenso sobre a desigualdade social, análise objetiva sobre
ativismo engajado e abstração sobre a crítica.

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TRAZENDO AS MULHERES DE VOLTA


Os capítulos que seguem exploram as vidas e a importância das
mulheres fundadoras da Sociologia. Cada capítulo pode ser lido de
modo independente e na ordem que a/o leitora/or escolher. Nossa
sequência é guiada por três objetivos: 1) começamos com Martineau
(Capítulo 2) como uma representante da geração de fundadores da
Sociologia; 2) concluímos com as Mulheres de Chicago e Webb
(Capítulos 7 e 8) como representantes da tradição empírica da
Sociologia. 3) Introduzimos outras pensadoras na ordem na qual
elas poderiam ter sua reputação mais reconhecida e seus trabalhos
mais acessíveis para um estudo mais aprofundado: Addams (capítulo
3), Gilman (capítulo 4), Cooper e Wells-Barnett (capítulo 5) e
Weber (capítulo 6).
Nós começamos cada capítulo com um esboço de biografia, porque
todo o conhecimento é situado e as sociólogas desenvolveram suas
teorias a partir de localizações culturais dadas (McCarthy, 1996).
Enquanto a vida dos homens fundadores são parte da história e
lendas da profissão, quase não refletindo no enquadramento dos
estudos de suas teorias, as vidas das mulheres não são tão
conhecidas. As próprias mulheres foram conscientes de sua situação
e, muitas vezes, deixaram significativos relatos autobiográficos.
Este é o caso de Martineau, Addams, Gilman, Cooper, Wells-Barnett,
Weber, Webb, Kelley, Breckinridge, Talbot and MacLean.
Nós, então, analisamos a teoria, sumarizando seus pressupostos,
explicando seus principais temas e introduzindo seus vocabulários
base.

• O projeto de Martineau é desenvolver um método para estudar


as relações da “moral” da sociedade como seus “modos” para
encontrar indicadores sociais. As “coisas” que medem graus
de liberdade e dominação, de modo mais claro, ela acreditava
na melhoria (in the treatment) dos grupos desempoderados:
mulheres, os pobres, minorias raciais, crianças, e os
deficientes.
• Addams focou em como as pessoas alinham conduta ética com
interesses materiais e como a socióloga pode estudar este
alinhamento por meio de uma enfática participação na vida
dos desempoderados. Além disso, por meio da análise das
tendências sociais, e sobre como a sociedade americana em
seu próprio tempo pode se tornar uma “democracia
socializada” (socialized democracy).
• Gilman criou uma teoria crítica formal relacionada a
determinados aspectos da vida social (consciência, trabalho
e gênero) e demonstrou com a desigualdade de gênero (o sexo-
econômico / sexuo-economic) corrompe o potencial humano para
pensar e trabalhar cooperativamente, produzindo uma “cultura
androcêntrica” no lugar de uma cultura apenas. Ela
desenvolveu detalhado programa para conquistar a igualdade
de gênero.

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• Cooper e Wells-Barnett formularam uma Sociologia a partir da


do ponto de vista dos desempoderados, usando a combinação de
raça e gênero como uma dupla lente através da qual se
descobria as práticas sociais da dominação e para
desenvolver os princípios para uma sociedade baseada na
“justiça” social.
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• Webber descreve a vida social do ponto de vista da mulher,


utilizando sua experiência de “autonomia e autoridade”,
“trabalho” e “cultura” para criticar o “o lugar no mundo” e
a compreensão masculina universalizada deste mundo.
• As Mulheres de Chicago usaram a pesquisa social para dar
base a suas teorias de que há interesse público no
desenvolvimento de um planejamento de melhoria das políticas
sociais para categorias específicas de desempoderadas/os,
tais como: imigrantes, classe trabalhadora, crianças,
mulheres e afro-americanas/os.
• Webb procurou resolver o problema da “pobreza em meio a
riqueza” através do uso da “pesquisa social para subsidiar
a política pública”.
Nós concluímos a análise de cada capítulo com a discussão da
relação da teórica ou das teóricas para estabelecer o cânone e o
paradigma feminista contemporâneo. Cada capítulo, oferece então,
os escritos selecionados da teórica ou das teóricas discutidas.
Como o sumário de temas precedente demonstra, as Mulheres
Fundadoras criaram um leque de teorias. Mas estas teorias
compartilham o compromisso moral de que a Sociologia pode e deve
trabalhar para amenização da dor humana produzida socialmente. O
dever ético da/o socióloga/o é buscar [sound]do conhecimento
científico para refutar que o conhecimento é um fim em si mesmo,
para falar aos desempoderadas/os e para defender a reforma social.
Este senso de moral proposto não deve ser descaraterizado como um
o caminho (carryover) nas ciências sociais do século XIX como
“virtudes femininas” descrita na história social americana como o
culto da verdadeira feminilidade (ver Welter, 1966/1977). Pois em
aspectos chaves a Sociologia das Mulheres Fundadoras é guiada por
regras similares das feministas acadêmicas contemporâneas: que a
teoria e a pesquisa podem ser empiricamente fundamentada e
fortalecida no desempoderamento (should be empirically grounded
and empowering of the disemporwered), que a correta relação entre
pesquisadoras/es e temas é do reconhecimento mútuo, que as/os
teóricas deve monitorar-se reflexivamente como um ator socialmente
localizado e que a análise social deve construir a partir
situações locais para teoria da sociedade crítica e geral
(Benjamin, 1988; Fonow and Cook, 1995; Mies, 1983; Reinharz, 1983;
Haraway, 1988).
Ao escolhermos reivindicar estas mulheres como parte de nossa
tradição como sociólogas, nós reafirmamos que a Sociologia é uma

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disciplina que tem uma história de falar diretamente e pressionar


para a ação nos problemas mais imediatos confrontando qualquer
sociedade na qual é praticada. O significado da reintrodução
destas ideias é dupla. Primeiro, isto nos mostra que as ideias
das feministas contemporâneas têm um longa e genuína tradição na
disciplina. Segundo, isto nos confronta com um problema que está
no coração da disciplina: a tensão entre princípios exclusivos e
inclusivos com a prática. Estes problemas são tema do último
capítulo deste livro.
Este volume não o é o triunfo da verdade “per si”, ainda que
acreditemos que ele representa a verdade sobre história da
Sociologia da teoria social. O mesmo processo que operou para
excluir as mulheres, as interdeterminações (interworkings) da
política de gênero e a política do conhecimento, são operantes
agora para tornar possível sua reemergência. As mulheres
fundadoras estão sendo descobertas pelas/os sociólogas/os porque
um movimento social muito mais amplo para uma maior inclusão –
mais notavelmente o movimento feminista global de segunda, e
agora, de terceira ondas juntamente com a mobilização de pessoas
de cor (people of color), por gays e lésbicas. Este poder social
realinhado agora afeta o interior das dinâmicas da profissão da
Sociologia.
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Dentro da Sociologia, é esta ação do movimento feminista que torna
possível a redescoberta das Mulheres Fundadoras: a emergência de
sociólogas/os emergence de Sociológos pela Mulher em Sociedade
(Sociologists for Women in Society) em 1971, a criação da seção
sobre Gênero e Sociedade da ASA em 1986 e a organização da seção
Raça, Classe e Gênero em 1996. Um movimento em direção a uma
história mais inclusiva, assim, para além da boa vontade. Isto
deve permanecer como uma mobilização pelas excluídas, uma
mobilização que cria a possibilidade de diálogo entre iguais
empoderadas (Collins, 1996). Ao falar dos ganhos das mulheres na
sociedade contemporânea, sociólogas feministas “alertam para o
perigo de ignorar ... que tais realizações [são] o resultado da
ação feminista. Isto é fácil de esquecer (Ferree and Hess, 1985
in Robby, 1992: 20). A estória que se desenrola nos capítulos a
seguir demonstram como são tênues estas conquistas, o quão
implacáveis são as forças de exclusão, e sobretudo, que isto é
muito fácil de esquecer.

Uso estritamente didático – não compartilhar- Tradutor: Marcelo Ennes

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