Você está na página 1de 8

Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Número do 1.0000.17.108794-3/002 Númeração 5160472-


Relator: Des.(a) Joemilson Donizetti Lopes (JD Convocado)
Relator do Acordão: Des.(a) Joemilson Donizetti Lopes (JD Convocado)
Data do Julgamento: 10/02/0022
Data da Publicação: 17/02/2022

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE RESCISÃO CONTRATUAL -


COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - IPTU - TAXAS CONDOMINIAIS -
RESPONSABILIDADE A PARTIR DA POSSE - RESTITUIÇÃO EM DOBRO -
IMPOSSIBILIDADE.

A responsabilidade do comprador ao pagamento das despesas de IPTU é a


partir de quando este possui o efetivo uso e gozo do bem imóvel. A
restituição em dobro, prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC, somente é
devida se demonstrada a má-fé do credor na cobrança de encargos
indevidos. Hipótese não ocorrente no caso.

APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.17.108794-3/002 - COMARCA DE BELO


HORIZONTE - APELANTE(S): HERCULANO GHITA TAVARES DE SOUZA,
KASCHER ENGENHARIA E COMERCIO LTDA E OUTRO(A)(S) -
APELADO(A)(S): THUBAN EMPREENDIMENTO IMOBILIARIO LTDA E
OUTRO(A)(S), ODEBRECHT REALIZACOES IMOBILIARIAS E
PARTICIPACOES SA

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 15ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal de


Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos,
em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.

JD. CONVOCADO JOEMILSON LOPES

RELATOR

1
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

JD. CONVOCADO JOEMILSON LOPES (RELATOR)

VOTO

HERCULANO GHITA TAVARES DE SOUZA e KASCHER ENGENHARIA


E COMÉRCIO LTDA. ajuizaram "ação ordinária de rescisão contratual c/
tutela de urgência" em desfavor de THUBAN EMPREENDIMENTO
IMOBILIÁRIO LTDA. e ODEBRECHT REALIZAÇÕES IMOBILIÁRIAS E
PARTICIPAÇÕES S/A.

A sentença (doc. de ordem 162), integrada pela decisão que julgou os


embargos de declaração opostos pelas partes (doc. ordem 168 e 173), assim
encontra-se em sua parte dispositiva:

"Pelo exposto e por tudo mais que dos autos consta, julgo parcialmente
procedentes os pedidos contidos na exordial para declarar rescindido o
contrato firmado entre as partes, a partir da data da concessão da tutela
antecipada, e condenar a parte requerida a pagar aos autores a quantia de
R$ 258.018,16 (duzentos e cinquenta e oito mil e dezoito reais e dezesseis
centavos).

O referido valor deve ser acrescido de juros, desde a data da citação, e


correção monetária, desde a data da distribuição, conforme os índices da
Contadoria Judicial do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Minas
Gerais.

Tendo em vista que a parte autora decaiu de parte mínima do seu pedido,
condeno a parte ré a pagar as custas e demais despesas processuais, bem
como os honorários advocatícios ao patrono do autor, que fixo em 15%
(quinze por cento) sobre o valor da condenação, nos termos do artigo 85, §
2º, do CPC".

Parcialmente inconformados, os autores, ora apelantes, em suas

2
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

razões recursais (doc. de ordem 176), afirmam ter direito à restituição do


IPTU, das taxas condominiais e dos impostos referentes à propriedade do
imóvel, desde o mês de abril de 2016, uma vez que "o bem em questão,
NUNCA esteve disponível para o Autor para uso e fruição, até mesmo
porque, antes de terminadas as obras, o Autor manifestou o interesse na
rescisão contratual, de modo que, nunca tomaram posse ou usufruíram do
bem, tanto é verdade, que a Requerida colocou a sala à venda para
terceiros".

Alegam que "não há ônus tributários e/ou de condomínio sem exercício


de posse, pouco importando a existência de disciplina contratual diversa,
nitidamente abusiva, e/ou a obtenção do habite-se ou a instalação formal da
universalidade".

Sustentam que "as despesas de condomínio e IPTU são de


responsabilidade da construtora até a entrega do imóvel ao adquirente".

Aduzem que "tal prática trata-se de cobrança indevida que, se paga, gera
ao consumidor o direito a devolução por valor igual ao dobro do que pagou".

Ao final, requer o provimento do recurso, condenando a parte ré à


"restituição das despesas referentes à propriedade do imóvel, como IPTU,
taxas condominiais, e taxas e impostos referentes a propriedade do imóvel,
desde abril de 2016".

Em contrarrazões (doc. ordem 183), a parte apelada bate-se pelo


desprovimento do recurso.

É o relatório.

Kascher Engenharia E Comércio Ltda. e Thuban Empreendimento


Imobiliário Ltda. firmaram "Instrumento Particular de Promessa de Compra e
Venda e Outras Avenças de Unidade Autônoma do

3
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Condomínio Parque Avenida" (doc. de ordem 23/25) em dezembro de 2012,


cujo objeto é uma fração ideal de terreno e acessões que constituem o
"Subcondomínio Avenida", que é parte do Condomínio Parque Avenida,
situado em Belo Horizonte/MG.

Após o pagamento de 47 (quarenta e sete) parcelas, o promitente


comprador demonstrou interesse na realização do distrato, o que não foi
acatado pelo promitente vendedor (doc. ordem 21).

Os autores, portanto, ajuizaram a presente ação visando à rescisão


contratual e à restituição do percentual de 75% (setenta e cinco por cento) do
valor pago e dos impostos e taxas oriundas do uso e da propriedade
imobiliária em questão.

Julgados parcialmente procedentes os pedidos iniciais, a controvérsia


recursal cinge-se sobre a restituição do IPTU e das taxas condominiais e dos
impostos referentes à propriedade do imóvel, desde o mês de abril de 2016,
quando a parte ré foi notificada extrajudicialmente acerca do desinteresse da
parte autora na manutenção do contrato (doc. ordem 26).

Pois bem!

Inicialmente, destaca-se que a sentença estabeleceu a aplicação do


Código de Defesa do Consumidor ao caso em questão, o que não foi
impugnado pelas partes.

Ressalta-se que o promitente comprador nunca foi imitido na posse do


imóvel, conforme afirma a parte autora. A parte ré, inclusive, confirma tal
alegação em sede de contestação, ao afirmar que "os inadimplentes
pretendem se furtar da obrigação condominial até que lhe sejam entregues
as chaves, ato que só depende da quitação por estes da parcela final" e que,
"se posse não ocorre naquele momento, isso se deve à vontade do
adquirente ou pela existência de parcelas do preço ainda não quitadas, o que
permite o exercício do direito de retenção das chaves pelo incorporador" (f.
26, doc. ordem 50), nos moldes do que dispõe o artigo 52 da Lei 4.591/64 e a
cláusula 9.1 do

4
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

contrato firmado entre as partes.

Assim, os promitentes vendedores devem arcar com as despesas


referentes ao IPTU, às taxas condominiais e aos impostos referentes à
propriedade imobiliária até a entrega do bem, uma vez que o promitente
comprador não exerce a posse do imóvel até a entrega das chaves. A
responsabilidade do comprador ao pagamento dos referidos encargos é a
partir de quando este possui o efetivo uso e gozo do bem imóvel.

Ademais, o próprio Código Tributário Nacional em seu art. 34, referente


ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana, estabelece que:
"contribuinte do imposto é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio
útil, ou o seu possuidor a qualquer título". A parte autora, portanto, não se
configura como contribuinte do referido imposto.

A propósito:

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - RESCISÃO DE COMPROMISSO


PARTICULAR DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL - CULPA DOS
COMPRADORES - MULTA SOBRE O VALOR TOTAL DO CONTRATO -
INDEVIDA - PAGAMENTO DE IPTU E TAXAS CONDOMINIAIS PELOS
PROMISSÁRIOS-COMPRADORES - AUSÊNCIA DE IMISSÃO NA POSSE -
NÃO CABIMENTO - JUROS DE MORA SOBRE A RESTITUIÇÃO DOS
VALORES PAGOS - TRÂNSITO EM JULGADO DA SENTENÇA -
APLICAÇÃO DA LEI 13.786/18 - IRRETROATIVIDADE - DANOS MORAIS -
NÃO CONFIGURAÇÃO. I - Consoante entendimento consolidado pelo STJ, é
abusiva a cláusula que fixa a multa pelo descumprimento do contrato com
base não no valor das prestações pagas, mas, no valor do imóvel, onerando
demasiadamente o devedor. II - A jurisprudência é uníssona ao considerar
que o pagamento do IPTU e das taxas condominiais somente passar a ser
responsabilidade do promissário comprador quando este foi imitido na posse
no bem, o que sequer ocorreu no presente caso. III - Não há dúvidas de que
a obrigação da segunda apelante de restituir aos primeiros apelantes o valor
pago a título de sinal surgiu apenas com a prolação da sentença combatida,
que

5
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

declarou rescindido o contrato celebrado entre as partes. Diante disso, a


segunda apelante não pode ser considerada em mora até o trânsito em
julgado do decisum, devendo os juros de mora incidirem a partir daí. IV - as
normas estabelecidas pela Lei 13.786/2018, que incluiu o artigo 32-A na Lei
6.776/79, não se aplicam aos contratos celebrados em momento anterior à
sua vigência, haja vista a vedação constitucional à retroatividade da lei e o
respeito ao ato jurídico perfeito. V - A meros aborrecimentos e insatisfações
cotidianos, por se tratarem de fatos corriqueiros e atinentes à vida em
sociedade, não se deve atribuir indenização. (TJMG - Apelação Cível
1.0000.21.162032-3/001, Relator(a): Des.(a) João Cancio , 18ª CÂMARA
CÍVEL, julgamento em 30/11/2021, publicação da súmula em 30/11/2021)
(grifos nossos).

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE PROCEDIMENTO COMUM -


CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA - IPTU -
LEGITIMIDADE PASSIVA PARA PAGAMENTO DO IMPOSTO. 1. Nos
termos do art. 34 do CTN, o contribuinte do imposto predial e territorial
urbano é o proprietário do imóvel, o titular do seu domínio útil, ou o seu
possuidor a qualquer título. 2. O IPTU é de responsabilidade do promitente
comprador a partir do momento de sua imissão na posse do imóvel, quando
passa a ter o efetivo uso e gozo do bem. (TJMG - Apelação Cível
1.0000.19.014001-2/001, Relator(a): Des.(a) José Flávio de Almeida , 12ª
CÂMARA CÍVEL, julgamento em 19/06/2019, publicação da súmula em
24/06/2019).

Em relação ao pedido de repetição de indébito, este não merece


prosperar.

A restituição em dobro, prevista no art. 42, parágrafo único, do CDC,


somente é devida se demonstrada a má-fé do credor na cobrança de
encargos indevidos. Neste caso, as cobranças efetivadas pela parte ré foram
feitas com base no contrato celebrado pelas partes, especificamente na
cláusula 9.1, não estando evidenciada a má-fé da parte requerida, de modo
que é incabível a restituição em dobro.

6
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

Por fim, conclui-se que, inexistindo dúvidas que o promissário comprador


jamais foi imitido na posse do imóvel, deverá a parte autora receber a
restituição pelos valores pelos autores pagos a título de IPTU, taxas
condominiais e dos impostos referentes à propriedade do imóvel a partir de
abril de 2016, conforme requerido. O valor a ser devolvido aos autores, no
que tange aos referidos encargos, deverá ser apurado em liquidação de
sentença, com atualização monetária a partir de cada desembolso.

Sobre o valor a ser devolvido incidirá juros de mora de 1% (um por cento)
ao mês a partir da citação.

DISPOSITIVO

Com tais considerações, DÁ-SE PARCIAL PROVIMENTO AO


RECURSO, apenas para determinar que a parte ré restitua à parte autora os
valores por esta pagos, a partir de abril de 2016, em relação ao IPTU, às
taxas condominiais e aos impostos referentes à propriedade do imóvel,
acrescidos de correção monetária a partir de cada desembolso e de juros de
mora de 1% (um por cento) ao mês a partir da citação.

Diante da sucumbência mínima recursal da parte apelante, condeno a


parte apelada ao pagamento das custas recursais e dos honorários desta
fase, que majoro para 16% (dezesseis por cento) sobre o valor da
condenação, nos termos do art. 85, §§2º e 11 do Código de Processo Civil.

DES. ANTÔNIO BISPO - De acordo com o(a) Relator(a).

DES. JOSÉ AMÉRICO MARTINS DA COSTA - De acordo com o(a) Relator

7
Tribunal de Justiça de Minas Gerais

(a).

SÚMULA: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO."

Você também pode gostar