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FORMAÇÃO DE
PROFESSORES
Uberlândia, MG
2015
Revisão
Organizadoras
Diagramação
Adriana Cardoso
Impressão e acabamento
Composer
Conselho Editorial
APRESENTAÇÃO.....................................................................................................7
CAPÍTULO I
FORMAÇÃO DOCENTE: CONCEPÇÕES, VOZES E PERCEPÇÕES DE
PARTICIPANTES DO CURSO DE ATENDIMENTO EDUCACIONAL
ESPECIALIZADO PARA ALUNOS SURDOS
Introdução.................................................................................................................11
Formação de Professores para a Educação de Surdos................................................12
Organização do curso e sujeitos da pesquisa.. .........................................................20
A Formação de Professores para atuar com alunos surdos: concepções, vozes e
percepções.................................................................................................................21
Algumas considerações.............................................................................................25
Referências bibliográicas.........................................................................................25
CAPÍTULO II
A EDUCAÇÃO, O JECA E A COMPLEXIDADE DA CULTURA BRASILEIRA
Introdução.................................................................................................................29
A ilmograia e a educação não escolar.....................................................................30
Considerações inais..................................................................................................42
Referências...............................................................................................................43
CAPÍTULO III
POLÍTICA DE FORMAÇÃO DOCENTE DO CURSO DE PEDAGOGIA -
PARFOR: CONSTRUINDO NOVAS POSSIBILIDADES
Caminhos formativos e perspectivas inovadoras da prática docente.........................45
As Políticas de Formação: Breves apontamentos......................................................51
A formação de professores em serviço e o curso de Pedagogia do PARFOR/ Câmpus
de Tocantinópolis......................................................................................................55
Algumas Considerações...........................................................................................56
Referências...............................................................................................................56
CAPÍTULO IV
EDUCAÇÃO EM TEMPO INTEGRAL E FORMAÇÃO DE EDUCADORES
Palavras iniciais: as concepções e atendimento da Educação em Tempo Integral .....59
A Educação Integral e pressupostos para a formação docente....................................63
Iniciativas de formação docente em Educação Integral: Curso de Especialização
Educação Integral em Direitos Humanos da Universidade Federal da Paraíba...........66
Referências...............................................................................................................70
CAPÍTULO V
PROJETO DE FORMAÇÃO PARA A DOCÊNCIA: CONTRIBUIÇÕES DAS
EXPERIÊNCIAS DE VIDA NA FORMAÇÃO INICIAL NOS CURSOS DE
LICENCIATURA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBERLÂNDIA – MG.
Introdução.................................................................................................................73
Escritas relexivas sobre si........................................................................................74
A formação docente compartilhada...........................................................................80
Considerações Finais................................................................................................86
Referência Bibliográica............................................................................................87
CAPÍTULO VI
FORMAÇÃO DE PROFESSORES E DIVERSIDADE: SEXUALIDADE E
GÊNERO NAS ESCOLAS DO BICO DO PAPAGAIO
Analisando os dados.................................................................................................90
O PNE e a ‘ideologia de gênero’ – o papel do professor..............................................97
Perspectivas... ...........................................................................................................98
Referencias bibliográicas.......................................................................................100
Sites consultados.....................................................................................................101
CAPÍTLO VII
GÊNERO, SEXUALIDADES E FORMAÇÃO DOCENTE: OLHARES SOBRE A
PRÁTICA PEDAGÓGICA DE PROFESSORAS BRASILEIRAS
Introdução...............................................................................................................103
Nuances da educação não formal como espaço de formação docente.....................106
Gênero e sexualidades: indícios de uma formação docente queer.........................109
Considerações.........................................................................................................116
Referências..............................................................................................................116
CAPÍTULO VIII
FORMAÇÃO DE PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL PARA
ALTAS HABILIDADE/SUPERDOTAÇÃO: TRAJETÓRIA DO MUNICÍPIO DE
UBERLÂNDIA
Introdução...............................................................................................................119
Contribuições do curso e da pesquisa e seus desdobramentos..................................123
Considerações inais, ainda que preliminares.........................................................129
Referências.............................................................................................................130
CAPÍTULO IX
POLÍTICA DE FORMAÇÃO CONTINUADA DE PROFESSORES DA
EDUCAÇÃO BÁSICA NO ÂMBITO DA UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
Introdução...............................................................................................................133
O programa de formação continuada de professores na educação especial no âmbito
da Universidade Aberta do Brasil – UAB...............................................................134
O Programa de Formação Continuada de Professores na Educação Especial na
Universidade Federal de Uberlândia.......................................................................139
Discutindo o conceito de Inclusão no Fórum de Discussão................................140
Considerações inais................................................................................................145
Referências.............................................................................................................146
CAPÍTULO X
AS TRANSFORMAÇÕES NO MUNDO DO TRABALHO E A GESTÃO DO
TRABALHO DO PROFESSOR - UTOPIA E A SAÚDE DO TRABALHADOR.
O trabalho do professor do Ensino Superior e a educação no capitalismo
contemporâneo........................................................................................................149
Os mecanismos de avaliação de programas e a educação a distância: fatores impactantes
na gestão do trabalho do professor..........................................................................153
Considerações inais...............................................................................................158
Referências.............................................................................................................159
Artigos....................................................................................................................159
Documentos e Legislação.......................................................................................160
Livros......................................................................................................................160
CAPÍTULO XI
REFLEXÕES SOBRE O ENSINO DE LITERATURA NA VALORIZAÇÃO DA
ESCRITA EPISTOLAR: ANÁLISE DE UMA CARTA DE OLGA BENARIO
Introdução...............................................................................................................161
A carta.....................................................................................................................163
Considerações inais................................................................................................173
Referências .............................................................................................................174
7
sobre a educação integral e pressupostos para a formação docente, com
ênfase nas iniciativas de formação docente em educação integral do
Curso de Especialização em Educação Integral em Direitos Humanos da
Universidade Federal da Paraíba (UFP).
Prosseguindo a discussão sobre formação docente, o capítulo V:
“Projeto de Formação para a Docência: Contribuições das Experiências
de vida na Formação Inicial nos Cursos de Licenciatura da Universidade
Federal de Uberlândia – MG”, de autoria de Vanessa T. Bueno Campos
e Fernanda Duarte Araújo Silva, aborda a discussão e relexão sobre o
uso de Projetos de Formação enquanto um instrumento auto formativo
no âmbito da formação inicial de professores. Trata-se de um relato de
experiências, contemplando apontamentos sobre as vivencias nas aulas
de Didática Geral oferecida nos cursos de licenciatura da Universidade
Federal de Uberlândia (UFU), desde 2011.
Dando continuidade à discussão sobre a formação de professores,
o capítulo VI: “Formação de Professores e Diversidade: Sexualidade e
Gênero nas Escolas do Bico do Papagaio”, de autoria de Eliseu Riscaroli
apresenta uma pesquisa desenvolvida com adolescentes e jovens que teve
como objetivo principal discutir sobre as representações desses jovens
sobre suas sexualidades, e como o tema tem sido, ou não, abordado
pela escola e pelos professores, sobretudo tendo presente a premissa do
Parâmetro Curricular Nacional (PCN) – Tema Transversal.
Ainda nessa relação entre sexualidade e formação docente, no
capítulo VII: “Gênero, Sexualidades e Formação Docente: Olhares Sobre
a Prática Pedagógica de Professoras Brasileiras”, os autores Neil Franco
e Nilce Vieira Campos Ferreira apresentam uma pesquisa realizada entre
2010 e 2014, que objetivou contextualizar a prática docente de professoras
trans brasileiras no sentido de ressaltar como as temáticas de gênero e
sexualidades entrelaçam seu cotidiano proissional, buscando indícios do
processo de formação docente no qual estiveram/estão imersas.
No capítulo VIII, intitulado: “Formação de Proissionais da
Educação Especial para Altas Habilidade/Superdotação: Trajetória do
Município de Uberlândia”, as autoras Maria Isabel de Araújo, Marta
Emídio Pereira Oliveira e Márcia Arantes Buiatti Pacheco apresentam
uma investigação que teve como objetivo relatar os primeiros passos
do município de Uberlândia/MG no processo de formação docente de
proissionais da Educação Especial para identiicação e implantação do
Serviço de Atendimento Educacional Especializado (AEE) para Alta
Habilidade/Superdotação.
O capítulo IX: “Política de Formação Continuada de Professores
da Educação Básica no Âmbito da Universidade Aberta do Brasil”, das
8
autoras Vanuza Aparecida de Souza, Vanilda Aparecida de Souza e Vilma
Aparecida de Souza apresentam resultados de uma pesquisa que teve
como objetivo analisar os desdobramentos da atual política de formação
continuada de professores da educação básica iniciada no governo Lula,
a partir da Universidade Aberta do Brasil (UAB). Tal estudo procurou
discutir os desdobramentos dessa política de formação continuada
a partir das percepções dos professores que participaram do Curso de
Aperfeiçoamento Educação Especial e Atendimento Educacional
Especializado (EEAEE), proposto pela Universidade Federal de
Uberlândia (UFU), no período de 2009/2010.
No penúltimo capítulo: “As Transformações no Mundo do Trabalho
e a Gestão do Trabalho do Professor - Utopia e a Saúde do Trabalhador”,
de autoria de Aparecida Carneiro Pires e Inayá Maria Sampaio, abordam
um debate sobre o trabalhador docente, nas novas formas de gestão do
seu trabalho, permeada pela atual política de avaliação de agências de
inanciamento no ensino superior, pela expansão da educação a distância,
pelos questionamentos em relação à precarização na sua atuação
proissional, intensiicação, e “produtivismo acadêmico”.
O último capítulo: “Relexões sobre o Ensino de Literatura na
Valorização da Escrita Epistolar: Análise de uma Carta de Olga Benario”
da autora Mariana Bisaio Quillici discute a importância da escrita
epistolar na transmissão de experiências signiicantes dentro da história
universal, para tanto, analisaremos uma das epístolas escritas por Olga
Benario enquanto esteve presa na Prisão feminina Barnimstraße, em
Berlim. Traçando este percurso, salientaremos, ainda, a criação de uma
memória coletiva que envolve a participação do Brasil na Shoah
Em suma, este livro reúne resultados de estudos envolvendo o tema
formação de professores para os diferentes níveis de ensino e demarca
esse processo a partir de percursos repletos de lutas e de conlitos, de
hesitações e de recuos.
9
CAPÍTULO I
Introdução
13
Vigotski (2007) destaca a língua de sinais como acesso das pessoas
surdas no convívio social e na aprendizagem escolar. Para o autor, as leis
gerais do desenvolvimento são iguais para todas as crianças, porém, é
necessário considerar que a criança com deiciência necessita de recursos
especiais e caminhos alternativos. Góes (2007, p.99) defende que “não
é o déicit em si mesmo que traça o destino da criança. Esse “destino” é
construído pelo modo como a deiciência é signiicada, pelas formas de
cuidado e educação recebidas pela criança, enim, pelas experiências que
lhes são propiciadas”.
Bueno (1999) aponta os cuidados que emergem a proposta de
educação inclusiva, denunciando que a presença física do aluno com
deiciência não garante a inclusão, é necessário o preparo da instituição
para trabalhar com as diferenças e promover capacidades, potencialidades
e construção de conhecimentos. Nesta perspectiva, são necessários
projetos diferenciados e não apenas pequenos ajustes.
O decreto 5.626/05 demarca a formação docente para atuar
na educação de pessoas surdas, incluindo a LIBRAS como disciplina
curricular, como se lê no artigo 3º:
14
licenciatura plena em Letras: LIBRAS ou em Letras:
LIBRAS/Língua Portuguesa como segunda língua.
Art. 5o A formação de docentes para o ensino de
LIBRAS na educação infantil e nos anos iniciais do
ensino fundamental deve ser realizada em curso de
Pedagogia ou curso normal superior, em que LIBRAS
e Língua Portuguesa escrita tenham constituído
línguas de instrução, viabilizando a formação bilíngue
(BRASIL, 2005, p. 4).
15
c) o ensino da Língua Portuguesa, como segunda
língua para pessoas surdas;
V - garantir o atendimento às necessidades educacionais
especiais de alunos surdos, desde a educação infantil, nas
salas de aula e, também, em salas de recursos, em turno
contrário ao da escolarização (BRASIL, 2005, p.7).
18
existe obrigatoriedade da parte dos alunos para cursá-
las (MARTINS, 2008, p.83).
19
Organização do curso e sujeitos da pesquisa...
20
no Atendimento Educacional Especializado e/ou Sala de Recursos
Multifuncionais de instituições escolares públicas.
De modo geral, temos como objetivo conseguir, por meio dos
fóruns, identiicar as concepções desses sujeitos sobre a formação de
professores para a educação de surdos; assim a questão proposta no fórum
foi: O processo de educação das pessoas surdas exige muita dedicação
e uma formação adequada dos proissionais envolvidos no cotidiano
escolar. O que você conhece e pensa sobre este processo? O espaço
buscou então apreender as opiniões, medos e expectativas dos cursistas.
A seguir, apresentaremos algumas das análises realizadas no trabalho.
21
surdas não é fácil, ainal, temos que aprender uma
nova língua e ainda sendo a estrutura gramatical da
LIBRAS diferente do português, além de existirem
palavras no português que não existe na LIBRAS.
Eu como a Fátima, tive um semestre de LIBRAS na
faculdade que foi muito básico (Sujeito 2).
Concordo com vocês, penso que a base de LIBRAS
que recebemos na Pedagogia não é suiciente para
desenvolver um trabalho efetivo com alunos surdos
(Sujeito 4).
23
Quero acrescentar que mesmo ultrapassando a
formação inicial (muito falha), temos que ter
consciência da grande responsabilidade em atuar no
atendimento a clientela surda.
Sou professora de alunos surdos desde 2000 ,quando
iniciei os trabalhos nessa determinada comunidade
os surdos também estavam conhecendo a LIBRAS
e aprendemos juntos, no entanto até hj tenho que
aprender. Tenho o convívio direto com surdos, tenho
curso básico de 180 h, bacharelado pela FENEIS_CE,
e atualmente estou fazendo curso de conversação em
LIBRAS no centro de formação de professores do
Estado do Ceara e mesmo assim tenho diiculdade em
ensinar a língua (Sujeito 5).
É necessária uma formação continuada, para
que esse proissional esteja preparado para
lidar com todas as divergências existentes.
O proissional de LIBRAS precisa está buscando,
estudando, trocando experiências e fazendo cursos
sempre (Sujeito 7).
24
disponibilizar as funções de instrutor, tradutor/
intérprete de LIBRAS e guia intérprete, bem como
de monitor ou cuidador aos alunos com necessidade
de apoio nas atividades de higiene, alimentação,
locomoção, entre outras que exijam auxílio constante
no cotidiano escolar (BRASIL, 2008, p 17).
Algumas considerações...
Referências bibliográicas
27
CAPÍTULO II
Introdução:
30
ambientes sociais. Portanto, a educação é um processo, no qual está
presente a dinamicidade das ações e relações entre as pessoas e grupos o
que faz desse processo um mecanismo que pode produzir transformações
sociais. Podemos airmar, deste modo, que em todas as dimensões da
vida existem processos educacionais, como diz Luckesi:
32
Portanto, abordar esse tema requer que discorramos sobre pessoas,
englobando as suas identidades e culturas. De certo modo, a cultura e
identidade de um povo parecem se misturar.
A cultura inclui as formas de comportamento do povo, festas,
folclore, crença, religião, costumes, etc. Nas manifestações culturais,
estão de certa forma inseridos o pensamento do povo, o seu nível de
criticidade e sua tradição de luta ou não luta no que diz respeito à busca
pela liberdade. Essa libertação ou emancipação que apresentamos,
perpassa pela linguagem e pela capacidade de comunicação, uma vez que
libertar-se da opressão não é algo isolado, mas coletivo.
Na proposta da Educação Popular há uma busca pela emancipação.
A emancipação que garante aos aprisionados galgarem os degraus que
levam ao conhecimento e se libertarem através desses, daqueles que
detenham os privilégios sociais, econômicos e políticos. É preciso,
portanto, uma articulação dos que estão presos para que venham alcançar a
libertação das cadeias opressoras. É justamente a necessidade dessa união
entre os oprimidos como forma de alcançar a liberdade que Mazzaropi
apresenta em suas produções, de modo sátiro, cômico e muitas vezes
dramático.
Neste processo, a habilidade em comunicar-se tem papel
fundamental. A comunicação com os outros e consigo, em torno de
relexões sobre a situação atual e a que se pretende atingir, constrói
certa conscientização. Freire (1980) propõe uma educação popular a
qual tem por princípio a libertação dos indivíduos que, por meio de um
desenvolvimento da consciência, passam a atingir um nível de criticidade
e ação diferenciada.
Dessa forma, a Educação Popular é algo que se originou, ou ainda
desenvolveu-se, ligada a lutas e movimentos sociais, por mais anônimos
que estes possam parecer. Isso nos faz pensar acerca das mobilizações e
lutas populares.
33
conscientizados. O caipira, personagem emblemático criado por ele,
presente em todos os seus 32 ilmes, mesmo naqueles em que a narrativa
transcorre no meio urbano, é segundo Barsalini (2002, p. 19)
34
injustiçado pelo patrão (geralmente um mau patrão), mas, que, no inal da
história, conseguia superar as estruturas sociais. Isso é um grande sonho
na vida desses trabalhadores, submetidos ao processo de dominação.
Ao se discutir acerca de educação e os espaços em que esta ocorre,
compreendemos que a construção de saberes se tece numa relação de
espaços e grupos diferenciados, com conceitos, características e atributos
distintos. No entanto, a partir destas, cada processo educativo se
complementa e contribui de formas diferenciadas na formação do indivíduo.
Partindo da concepção que a educação deve ser vista como um
elemento democrático, capaz de possibilitar aos indivíduos uma participação
mais ativa e concreta na sociedade, compreendemos as produções
cinematográicas de Mazzaropi como instrumentos indispensáveis no
processo educativo, visto que “sua obra dialoga com a história artística,
social, política e econômica de nosso país, desde a Era Vargas até o
momento de abertura política dos anos 80” (BARSALINI, 2002, p. 25).
Os ilmes de Mazzaropi além de serem representações da
sociedade brasileira são o testemunho da sociedade no qual foram
produzidos. Airmamos isto, porque acreditamos que nenhuma produção
cinematográica, embora retrate a particularidade da vida, os sentimentos
e comportamentos dos indivíduos e a sua interioridade subjetiva, deixe
de expressar a sociedade de uma época. Suas imagens são repletas de
historicidade, tornando-se, por sua função social, testemunhos visuais de
uma dada época e lugar. Como tais, retratam o espírito de uma época,
permitindo-nos a compreensão de como os homens e mulheres constroem
a vida social, uma vez que estes expressam e deixam registrados para
a posteridade práticas sociais, modos de pensar, valores, símbolos,
sentimentos, comportamentos, tensões, expectativas, temores, próprios
de uma determinada sociedade, como também é fonte de informação
sobre determinadas mudanças. Isto nos permite considerar que a obra de
Mazzaropi pode se transformar numa importante fonte para que o povo
brasileiro conheça seu momento histórico, suas relações sociais, o como
e o porquê os homens se educam, subsidiando a reconstrução histórica do
objeto educação, e com isso constroem sua identidade nacional.
Sabemos que a construção de uma identidade nacional surge do
sincretismo de vários elementos: étnico, linguístico, religioso, social,
cultural, político e econômico. Portanto a identidade é a deinição de
um grupo sobre si mesmo e sua trajetória, social, cultural e histórica,
ressaltando suas diferenças sobre o outro. De acordo com Ortiz (1992),
como a memória nacional, a identidade de uma nação vincula-se a história
e pertence ao domínio da ideologia, simbolizado pelo Estado.
Desse modo, o cinema é essencial na mediação destas
representações, exerce o papel de uma poderosa ferramenta capaz de
35
promover a disseminação de práticas sociais e culturais. Além disso,
auxilia na criação da identidade nacional de um grupo e é produzido
através de uma visão de homem e mundo, que faz parte de uma sociedade.
Neste contexto, deparo-me com a ilmograia Mazzaropi, um
gênero fílmico exclusivamente brasileiro, que teve seu início na década de
1950, se estendendo até a década de 1980. Esse diretor-autor, empresário,
ator, chamado Amácio Mazzaropi que durante mais de vinte anos foi
um dos principais produtores do cinema nacional, atuou em 32 ilmes e
personiicou uma das iguras mais marcantes da cinematograia brasileira:
o Jeca. Sua extensa obra contribuiu para a consolidação de uma memória
nacional sobre o caipira e constitui o registro da agressiva urbanização
brasileira, com consequências profundas na memória social.
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reprodução e circulação das expressões culturais identiicadas com a
cultura caipira, principalmente quanto ao deslocamento da população do
meio rural para as cidades. O trabalho no espaço urbano é antagônico
ao realizado no meio rural e o contato comunitário realizado em todas
as dimensões da vida social é substituído por relações fragmentadas
em grupos distintos em função do local de trabalho e de moradia, o que
provoca a separação entre a vida comunitária e a atividade produtiva,
que não ocorria no meio rural. As referências culturais da população
que participou do êxodo rural são diferentes em relação à sociedade de
consumo que era constituída no país. Não há como negar a habilidade
de Mazzaropi em produzir cinema mediante as injunções entre as
expectativas do público e a linguagem cinematográica mundializada,
adaptada aos tipos humanos e temas representados nos seus ilmes. Para
Barsalini (2002, p. 41) “Mazzaropi era um intelectual do povo, um homem
que compreendia perfeitamente a forma popular de enxergar o mundo,
que tinha organicidade com a forma com que o trabalhador vê o mundo”.
Foi nesse contexto político, econômico e social, que Mazzaropi
construiu seu personagem caipira e analfabeto, que acabou sendo
consagrado no ilme Jeca Tatu, mas que já vinha sendo formatado em
produções anteriores, como, por exemplo, em Candinho (1953) e em Chico
Fumaça (1958). Vale lembrar que, embora Mazzaropi fosse apreciado
pelo grande público em todo o país, seus ilmes com personagens caipiras
eram referências para os migrantes do interior do estado de São Paulo, que
passaram a morar, em geral, nas periferias da capital paulista, formando
o seu principal público-alvo. Vanilda Paiva (2003, p. 408) nos informa
que nos anos 1950 e 1960, a taxa de analfabetos absolutos de 15 anos ou
mais, em nosso país, aproximava-se dos 16 milhões, conforme podemos
veriicar na tabela a seguir:
37
esse trabalhador, rural ou urbano, um olhar sobre si mesmo. Acreditamos
que por vivenciarem um momento extremamente confuso gerado
pela modernização, pela imposição de um novo modo de vida, esses
trabalhadores ansiavam por meio das mais diversas manifestações
artísticas, culturais, gostos culinários ou do vestir, refazer sua identidade,
participando da legitimação dessa nação em construção.
Assim, por acreditarmos que a ilmograia de Amácio Mazzaropi
não pode ser compreendida apenas como um processo de comunicação
cinematográica, mas nos aspectos intrínsecos que a compõe, propomos
analisar duas de suas trinta e duas obras. Objetivando permitir ao leitor
traçar um paralelo entre o início e o im de suas produções cinematográicas.
Analisaremos os ilmes: “JecaTatu” (1959) e O Jeca e a Égua Milagrosa (1980).
Em Jeca Tatu (1959), o segundo longa da PAM Filmes, Mazzaropi
exerce as funções de ator, de argumentista e de produtor. Nesse ilme, o
artista sintetizou os tipos populares que havia feito até então e concebeu
o personagem que o tornaria famoso em todo o Brasil: o caipira ingênuo
e simples, mas esperto e malicioso. O Jeca Tatu não representa apenas
o homem do campo, mas o brasileiro de modo geral. Ele é branco, mas
é pobre. Não tem conhecimento, mas é esperto. Aproxima-se ainda dos
negros, compreendendo sua situação de subalternidade. Em alguns ilmes,
mora no campo; em outros, se muda para a cidade. O personagem expressa
ao mesmo tempo a nostalgia do que passou e a esperança do que virá.
Nesse ilme, Mazzaropi representa um caipira preguiçoso e visto
pela intelectualidade da época como símbolo do atraso. O aspecto de
maior evidência do ilme Jeca Tatu é o choque entre a sociedade do
trabalho racional, representada por Giovanni (fazendeiro capitalista), e
o comodismo de Jeca. O modo como às cenas são organizadas enfatiza
esse conlito: a câmera revela uma fazenda onde cedo os trabalhadores já
estão no campo desenvolvendo diversas atividades, sendo inspecionados
pelo proprietário italiano. Na próxima cena, Jerônima, a esposa de Jeca,
já está trabalhando (prepara o café, corta a lenha, soca o pilão) e a ilha do
casal, Marina, sai para buscar água. Enquanto Jeca, depois da insistência
de Jerônima, espreguiça-se, abre a janela com o pé (sem se levantar da
cama), lentamente senta, acende o cachimbo, cospe no chão e faz o sinal
da cruz olhando para a santa colocada na cabeceira, ao lado da cama.
Em outro momento do ilme, vemos a cena, em que o rancho do
Jeca é queimado pelos “homens do coronel”, como retaliação ao não
apoio político e, ele sem moradia ou qualquer perspectiva de sobreviver
naquela fazenda resolve migrar para Brasília. Os seus amigos camponeses,
que são também os empregados de Giovanni, solidariamente se unem e
decidem falar com o “coronel” da região (Florêncio) ligado à política,
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que por sua vez os encaminha a um deputado na capital, o Dr. Felisberto.
Este vai para o interior, e em um comício organizado por Florêncio,
num discurso demagogo e populista, promete publicamente doar terras e
equipamentos de trabalho, em troca dos votos. Destacamos, aqui, o papel
de Mazzaropi como educador popular, pois ao denunciar tal realidade, ele
a problematiza e sugere possibilidades. Assim, de acordo com a proposta
pedagógica freireana, que requer um educador problematizador, visto que
se trata de uma pedagogia da pergunta, uma vez que “[...] ensinar não é
transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para sua produção ou
sua construção” (FREIRE, 2004, p. 22).
Nessas cenas Mazzaropi revela ao seu público que o coronelismo,
não apenas ainda vigorava no campo, como existiam políticos nas
cidades, consideradas símbolos da democracia, que faziam uso dessas
práticas. Enfatizando a existência dessas práticas contraditórias no
estado de São Paulo ele nos diz que, enquanto a capital crescia com as
migrações (do interior e do nordeste) e a industrialização, modernizando-
se e incorporando-se ao capitalismo, no interior a troca de votos e o voto
de cabresto ainda eram comuns.
Na cena em que após ter ganhado as terras do deputado, todos os
companheiros de Jeca trabalham na construção de sua nova casa, vemos
a prática do mutirão, uma das principais características da cultura caipira.
De acordo com Antônio Candido (2001), em sua obra Os parceiros do
Rio Bonito, tanto as atividades da lavoura, como as domésticas, eram
as ocasiões ideais para a reunião dos caipiras, essa necessidade de
cooperação teria gerado intensa sociabilidade entre eles. Curiosamente,
durante o mutirão não havia uma divisão de tarefas, todos desenvolviam
a mesma atividade de forma conjunta, ou seja, era a cooperação simples.
São as palavras de um velho caipira, entrevistado por Candido, que melhor
explicam o sentido do mutirão: “não há obrigação entre as pessoas, e sim
para com Deus, por amor de quem serve o próximo; por isso, a ninguém
é dado recusar auxílio pedido”. (CANDIDO, 2001, p. 89).
No inal do ilme, o caipira deixa de ser um Jeca Tatu vira “coronel”,
afastando-se ainda mais das práticas capitalistas. Deste modo, percebemos
que o discurso fílmico associa-se à ideia de uma modernização na qual
sobrevivem de forma estrutural às marcas de um Brasil oligárquico.
Invertendo a lógica da modernização, o caipira mais uma vez atravessa a
noção de arcaico no projeto do desenvolvimentismo brasileiro. E isso é
feito associando, de forma irônica e muito bem humorada. Nesse ponto
estão presentes as características da ilmograia de Mazzaropi: de um
riso marcado pelos códigos de inversão que pontuam as contradições das
regras e das hierarquias sociais.
39
Assim o roteiro dessa obra critica principalmente as condições de
vida em um interior castigado pelo subdesenvolvimento, a má distribuição
de renda (economia do Brasil) e os impactos nos menos favorecidos. Nela
a resistência e crítica social que Mazzaropi apresenta não é uma proposta
elaborada e politizada, ele o faz de uma forma ingênua e sutil, muitas
vezes espontânea e contraditória. Todavia, “Como um insatisfeito com o
mundo de injustiças que vivencia, ao qual o discurso pragmático sugere
que simplesmente se adapte, Mazzaropi, assim como Freire, está desperto
e atuante para as relações entre a tática e estratégia”, no eterno movimento
de se fazer história. (FREIRE, 2007, p.91). Nesse sentido, é importante
considerar que, mesmo o discurso conservador e repressor, muitas vezes
utilizado pelo cineasta revela as contradições sociais que permeavam o
Brasil na década de 1950.
O último ilme de Amácio Mazzaropi (1912 - 1981), Jeca e a Égua
Milagrosa (1980), nos apresenta dois fazendeiros em busca de votos, para
se elegerem prefeito numa cidade do interior. Um deles honesto e sem
recursos inanceiros para subsidiar uma campanha eleitoral, e o outro,
um homem sem caráter que enriqueceu explorando a fé de um povo e
alicerça sua campanha em favoritismo e presentes para a população.
(BARSALINI, 2002).
Nessa obra Mazzaropi promove um rico debate acerca da abertura
política que o Brasil vivenciava, além da vinculação entre a religião e
o debate político, num país como o nosso, em que 92% dos brasileiros
se declaram religiosos. Conirma em suas cenas a existência de uma
fronteira relativamente luida entre as esferas sociais, religiosa e política,
em razão de aproximações e passagens existentes entre elas que, no
entanto, têm ocorrido de forma diferenciada segundo as expressões
religiosas e os momentos históricos e políticos. Além disso, chama a
atenção do expectador para as generalizações estabelecidas acerca das
religiões Afro-Brasileiras.
Os dois coronéis, Libório e Afonso, têm terreiros de umbanda
e candomblé e utilizam os espaços para inluenciar os moradores,
arrebanhando iéis para seus cultos e votos nas próximas eleições.
Raimundo (personagem interpretada por Mazzaropi) é amigo do coronel
Afonso. O fazendeiro Libório tem em seu “terreiro”, como atração, uma
égua a quem os iéis atribuem poderes de cura. Os milagres feitos pela
égua correm pela cidade e contribuem para indispor Afonso e Libório.
Raimundo gosta muito do animal, mas sua amizade com o coronel Afonso
o afasta do pessoal do Libório. Diante desses fatos, o Coronel Libório,
cria todo um conjunto de artimanhas para obrigar o Jeca a casar com a
chamada Égua Milagrosa. Pois ele acredita que a aliança com Raimundo,
40
os agitados comícios que antecedem as eleições e outros mecanismos
escusos que utiliza como a compra de votos e o terror imposto as pessoas
por meio da exploração da crença ingênua lhe garantirão a prefeitura.
Mazzaropi, nesse ilme, chama-nos a atenção para a “Indústria
de exploração da fé”, através da qual os “religiosos” atraem os “féis”,
com a promessa, por exemplo, de livrá-los do inferno, se doarem certa
quantia à casa de Deus, que eles representam, evidenciando-se o processo
de manipulação que conduz à massiicação do indivíduo. A manipulação
é “apresentada como forma de dirigismo, que explora o emocional dos
indivíduos, inculca neles aquela ilusão de atuar ou de que atuam na
atuação de seus manipuladores” (FREIRE, 1982, p.42).
Além de denunciar a Indústria de exploração da fé, Amácio
Mazzaropi chama a atenção de seu público para o fato de que, em 1979,
ano de aprovação da Lei de Anistia, os vícios que permeiam a democracia
em nosso país estão mais vivos do que nunca. O diálogo a seguir denuncia
essas práticas.
Considerações inais
Referências
43
_______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. 30 ed. São Paulo: Paz e Terra, 2004 (coleção Leitura).
_______. Pedagogia da esperança: um reencontro com a pedagogia do
oprimido. 14 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007
_______. Extensão ou Comunicação?, 6 ed., Rio de Janeiro, Paz e Terra,
1982.
_______. Política e Educação, 2 ed., São Paulo: Cortez, 1995
GOHN, Maria da Glória Marcondes. Educação não-formal, participação
da sociedade civil e estruturas colegiadas nas escolas. 2006. Disponível
em: <http://www.scielo.br/pdf/ensaio/v14n50/30405.pdf>. Acesso em:
12 jan 2013.
LUCKESI, Cipriano C. Filosoia da Educação. São Paulo: Cortez, 2001
ORTIZ, Renato. Cultura brasileira e identidade nacional. São Paulo:
Brasiliense, 1992.
PAIVA, V. (org.). Educação popular e Educação de adultos. São Paulo:
Edições Loyola, 1987.
SILVEIRA, M. Jeca-Mazzaropi, uma síntese de culturas. Folha de São
Paulo, São Paulo, Ilustrada, p. 30, 19 de junho de 1981. (acervo do Museu
Mazzaropi disponível em http://www.museumazzaropi.com.br/ Acesso
em 03/09/2010.
SIMON, Olga R. de M. Von; PARK, Margareth B.; FERNÁNDEZ,
Renata S. (Org.).
Educação não-formal: cenários da criação. Campinas: UNICAMP, 2001.
44
CAPÍTULO III
46
e a extensão, um proissional dotado de uma postura investigativa e que
se revele um pesquisador de sua própria ação docente” (PEREIRA, 1999,
p.118). Esse modelo enfatiza a importância de os educadores assumirem
uma postura de investigação em relação às próprias práticas, com vistas a
problematizar a realidade em busca de soluções inovadoras.
Assim, os modelos que estruturam a formação docente sofrem a
inluência tanto do paradigma de ciência tradicional, conservador, quanto
daquele que se inspira na perspectiva da transformação. Neste caso, os
docentes são produtores de conhecimento e não simples mediadores entre
a ciência, o conhecimento, os produtos da pesquisa e o licenciando.
No entanto, não há mais sentido em tratar a formação docente na
universidade como aquela que propicia o domínio do conteúdo e a aquisição
de habilidades básicas a serem conferidas aos futuros proissionais, como
tem sido marcado o trabalho docente na universidade. O domínio de
conteúdos e de técnicas passou a constituir o pano de fundo da prática
educacional na universidade, ou seja, um proissional, um especialista na
área de conhecimento pela qual optou em sua carreira. Assim, participa e
ensina a partir da sua experiência como aluno inspirado nos modelos de
seus antigos professores.
Entendemos que uma formação docente que se inspira nesses
modelos está fundamentada na manutenção dos processos de reprodução
cultural (paradigma conservador) absorvidos das visões de mundo,
das concepções epistemológicas, das posições políticas e experiências
vivenciadas, fortalecidas, conscientemente ou não, nos esquemas
cognitivos e afetivos.
Cunha (2006) argumenta que a carência da relexão na formação
docente deixa os proissionais mais suscetíveis e voltados para a reprodução
cultural e a manutenção das práticas de repetição. Esse movimento
certamente os distancia da problematização e do questionamento do
conhecimento, propiciando que os processos de alienação tendam a se
repetir. Assim ocorrendo, realimentam o aligeiramento da formação e da
apropriação supericial dos conhecimentos. Para esse autor, uma formação
que teve por base uma visão reducionista, herdada da modernidade, leva
os docentes a enfrentarem diiculdades de dialogar com outras áreas do
conhecimento, de perceber a multidimensionalidade do processo de ensino
e de superar a lógica da fragmentação à qual se contrapõe um ensino
concomitante com a produção do conhecimento, numa visão de totalidade.
De fato, na formação docente, o difícil é superar a visão
reducionista, dissociada da percepção de que o conhecimento tem
diferentes dimensões e estas se inter-relacionam. Destarte, contra esse
reducionismo metodológico faz-se necessária a busca de alternativas
47
para a proissionalização e para as atuais práticas pedagógicas, além de
conferir-lhes pressupostos teórico-metodológicos que lhes dariam um
novo sentido, a im de que o docente possa intervir de forma consciente
e coerente na realidade educacional, bem como realizar a contento a
inalidade precípua de sua prática, que é o ensino.
Sob essa ótica, a formação docente reconhece a existência de
múltiplos saberes e a necessidade da articulação entre eles, buscando-se a
compreensão e a interpretação desses fundamentos epistemológicos para
modiicar, sobretudo, a relação do sujeito conhecedor com o objeto a ser
conhecido. Por isso, as práticas inovadoras inserem-se nessa perspectiva
estreitando a relação entre a formação pessoal e a proissionalização docente.
Julgamos importante reconhecer nesse contexto que a formação
docente e as práticas pedagógicas de ensino não têm sido objeto de
relexão na maioria das instituições. Além de a prática pedagógica não
ser neutra ela não se refere apenas a uma ação individual. Trata-se, na
verdade, de uma prática social situada, em que estão presentes as relações
sociais que servem aos interesses humanos, sociais, culturais e, portanto,
políticos, produtos de relações de força que têm pendido para a dominação
de classes. A relexão guarda, pois, estreita relação entre o pensamento e
a ação, serve à transformação das situações reais e históricas em que os
docentes se encontram. Nessa direção, leva a um compromisso com a
transformação social e a busca por práticas inovadoras, a im de tornar
possível um ensino no qual se insiram os processos emancipatórios.
Vale ressaltar que a formação que se ancora na relexão consciente
possibilita ao docente desconstruir sua experiência vivida, tendo em vista
favorecer a emancipação e a autonomia proissional de modo a não fazer
do seu próprio trabalho simples reprodução, mas criação de um espaço de
práxis. Somente na ação reletida com outra consciência pode o docente
redimensionar sua prática, transgredir as fronteiras das disciplinas e,
intencionalmente, romper com o paradigma da ciência moderna.
Nesses termos, a formação inicial de professores, considerando-se
a complexidade do real, requer saberes de diferentes naturezas e espaços
para que as conexões entre os diversos conhecimentos propiciem práticas
inovadoras. Estabelecem-se, dessa forma, novas relações entre teoria e
prática que vão além da mera transmissão e aplicação. Assim, defendemos
que o exercício da docência não pode ser estático, “ao contrário, é
sempre processo, é mudança, é movimento, é arte, são novos ares, novas
experiências, novo contexto, novo tempo, novo lugar, novas informações,
novos sentimentos e novas interações” (CUNHA, 2006, p. 24).
Com base nesses novos pressupostos teórico-metodológicos, o
processo de formação docente considera as situações de emergência que
48
acontecem nos ambientes educativos e esclarece que todo objeto, mesmo
isolado, precisa ter decifrado o seu sentido, uma vez que este não se
encontra à parte no mundo. Esses pressupostos podem auxiliar o docente a
perceber que a educação, a cultura e a sociedade são sistemas complexos,
envolvem diferentes áreas do conhecimento e exigem um olhar mais
amplo e abrangente sobre as situações que aloram no contexto da prática
educativa, isto é, uma base teórico-metodológica sólida propicia que o
docente relita conscientemente para aprender a buscar novos caminhos,
sabendo para onde ir e aonde quer chegar.
A formação docente apresenta ainda inúmeras diiculdades, entre as
quais a questão básica, é a predominância do paradigma da reprodução do
conhecimento nos currículos de formação, o que leva o professor a considerar
a prática docente de forma isolada e desarticulada. Com isso, vemos que
“O mesmo paradigma tradicional que temos criticado nas duas últimas
décadas continua presente nas salas de aula e nos processos de formação
docente em que predominam os esquemas decisórios verticais, a alienação,
o conformismo, o individualismo” (MORAES e VALENTE, 2008, p.210).
Tais proposições, para serem modiicadas, demandam a introdução de
um novo paradigma de produção do conhecimento, como propôs Cunha.
As ideias das autoras supracitadas enfatizam uma formação docente
com base no paradigma da produção do conhecimento, sob a luz do
pensamento complexo como possibilidade de superar a visão dicotômica
e dualista de ensino e aprendizagem que separa o processo do produto,
a dimensão cognitiva da afetiva e a teoria da prática. Esses elementos
tomados de maneira não-dicotômica são imprescindíveis à reconstrução do
conhecimento, assim como são igualmente importantes as transformações
acontecidas no interior dos sujeitos. As percepções que decorrem das
interações entre docente e discente permitem expandir novos olhares
e desenvolver uma prática educativa em que o educador e o educando
estejam abertos ao diálogo e sejam partícipes do processo histórico.
Destacamos ainda que, para o pensamento complexo, a formação
docente tem como objetivo essencial a evolução da consciência do sujeito
docente. Este comporta, segundo Morin (2005), um caminhar para uma
concepção mais enriquecida e transformada de ciência (que evolui,
como todas as coisas vivas e humanas). Para tanto, faz-se indispensável
desintegrar falsas certezas e pseudo-respostas, esquecer que a descoberta
de um limite ou de uma carência em nossa consciência já constitui
progresso fundamental e salutar para essa consciência. Isso implica dizer
que a formação docente necessita mobilizar todos os estruturantes do
pensamento e da ação, o que requer a transformação do sujeito e de seu
modo de pensar. Requer, inclusive, modiicação de suas atitudes e, ao
49
mesmo tempo, foco no objeto da formação, considerando-o como um
olhar que aponta os aspectos da proissionalização e da prática docente
que precisam ser modiicados, além de outras ações com esse im que
necessitam ser desenvolvidas na instituição.
Nesse contexto, acreditamos que as práticas inovadoras na
formação docente possam assumir papel signiicativo no sentido de
ajudar o professor universitário a modiicar e a transformar os rumos da
docência. A difusão e as proposições inovadoras se contrapõem à posição
de centralidade e domínio do conteúdo, à dicotomia entre teoria e prática,
enim, suas posições metodológicas e, inconscientemente, praticam um
exercício descontextualizado, como tem sido caracterizado o trabalho
docente na universidade.
Sem dúvida, um princípio capaz de unir o pensamento e a ação
requer que a formação docente seja tratada por meio de um processo de
formação integral, conforme apontam Torre e Barrios (2002) e Moraes e
Torre (2004). Esses autores recomendam um modelo de ensino integrador
em suas propostas, adaptado aos diferentes contextos, e polivalente em
suas estratégias e sistemáticas de avaliação. O pressuposto da formação
integral é a mudança
50
desaio estimulante. Essa base conceitual reconhece a existência de outros
tipos de conhecimento e realidades que visam contribuir para a evolução
da consciência como condição fundamental para atender os desaios e a
reforma do pensamento na universidade, conforme esclarece Edgar Morin.
1
A Teoria do Capital Humano proposta por Schultz é, em sua essência, uma teoria econômica que
exerceu grande inluência, a princípio, no período desenvolvimentista. Defende que a educação é um
bem econômico a ser consumido, admitindo-se uma relação direta do grau de conhecimento com o
grau de desenvolvimento de cada país. Em razão disso, é correto airmar que as orientações de cunho
neoliberal determinam um redirecionamento educacional amplo em todos os níveis educacionais
balizados nessa teoria.
51
assumiu na Carta de Jomtien2, passaram a ser programadas políticas
para a educação em todos os aspectos, como na aprovação da LDBEN
nº. 9.394/96 que previa inicialmente, em seu Artigo 87, que todos os
professores deveriam ter formação em nível superior em apenas dez anos.
Com tais prerrogativas, a formação docente no Brasil foi colocada
em pauta com grande centralidade. Para alcançar esse im, os governos,
um após outro, têm implementado políticas voltadas para a formação
em serviço. Desse modo, destacamos a seguir alguns documentos que
fundamentam essa política, os quais, a nosso ver, ajudarão o leitor a
entender o PARFOR / Plano Nacional de Formação de Professores da
Educação Básica.
A Resolução CNE/CP Nº 2, de 26 de junho de 1997 que Dispõe
sobre os programas especiais de formação pedagógica de docentes para
as disciplinas do currículo do ensino fundamental, do ensino médio e da
educação proissional em nível médio aponta a necessidade de formação, em
nível superior, em cursos regulares de licenciatura e em programas especiais
de formação pedagógica a quem já possua diploma de nível superior.
Esse documento aponta a necessidade de regulamentação desse grupo de
professores a im de suprir um déicit histórico imenso existente no Brasil.
Outro documento que merece destaque é a aprovação do Parecer
CNE – CP Nº 9, de 08 de maio de 2001, que estabelece as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação
Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena. O
documento pontua que é “preciso fazer uma formação de proissional
de alto nível” (CNE p. 29). Para tanto, tornava-se necessário que
o professor em formação realizasse ações, tais como: adquirir ou
desenvolver competências e compromissos relacionados com os valores
inspiradores da sociedade democrática, compreender o papel social da
escola, ter domínio do conhecimento pedagógico e dos conteúdos a
serem socializados, adquirir competências referentes ao conhecimento de
processos de investigação que possibilitem o aperfeiçoamento da prática
pedagógica, bem como competência em relação ao gerenciamento do
próprio desenvolvimento proissional. Por outro lado, o Parecer CNE-CP
Nº 5, de 04 de abril de 2006 na perspectiva da lexibilização possibilitada
pela LDB 9394/96, destaca que:
52
de educação superior que mantenha no mínimo um
curso de licenciatura já reconhecido no mesmo campo
de conhecimento [...] (CNE-CP Nº 5, de 04 de
abril de 2006, p.03).
55
Convém salientar que, para o sucesso desse trabalho, a colaboração
de todos os que compõem a UFT foi fundamental, Incluem-se aqui os
terceirizados, os técnicos e os professores que, desde o início do curso,
estiveram envolvidos na formação. Desvelamos a força de vontade dos
alunos envolvidos e que chegam ao im desse curso enfrentando os mais
diversos problemas de ordem material, familiar e proissional.
Algumas Considerações
Referências
57
MORAES, Maria Cândida; VALENTE, José Armando. Como pesquisar
em educação a partir da complexidade e da transdisciplinaridade? São
Paulo: Paulus, 2008.
MORIN, Edgar. Introdução ao pensamento complexo. Trad. Eliane
Lisboa. Porto Alegre: Sulina, 2005.
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In:_____. (Org.). Proissão professor. Porto: Porto Editora, 1995, p.1-33.
PEREIRA, Julio Emílio Diniz. As licenciaturas e as novas políticas
educacionais para a formação docente. Educação e Sociedade, ano XX,
nº. 68, p. 109- 125, dez./1999.
PINHO, Maria José de. Políticas educacionais de formação de professores
no Estado do Tocantins: intenção e realidade. 2004. 194 p. Tese (Doutorado
em Educação) – Programa de Pós-Graduação em Educação – Currículo,
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Sã Paulo, 2004.
SHIROMA, Eneida Oto; MORAES, Maria Cecília Marcondes de;
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2000.
TORRE, Saturnino da la e BARRIOS, O. Curso de formação de
educadores. São Paulo: Madras, 2002.
WACHOWICZ, Lílian Anna. Avaliação e aprendizagem. In: VEIGA,
Ilma Passos Alencastro. (org.). Lições de Didática. São Paulo: Papirus,
2006, p. 133- 160.
58
CAPÍTULO IV
59
Em nosso contexto, e como pretendido por uma luta histórica em
defesa da educação pública e popular, a Educação em Tempo Integral
parte da preocupação central de ressigniicar a escola enquanto espaço
de formação de sujeitos em sua integralidade, priorizando a formação
humana em todas as suas dimensões (cognitiva, afetiva, ética, estética,
social, cultural, política). De acordo com Moll (2012), esse é um legado
que foi iniciado com Anísio Teixeira e as Escolas Parque, na década de
1950 e Darcy Ribeiro e os Centros Integrados de Ensino Público (CIEP),
da década de 1980, e é retomado, no contexto atual, devido à urgência de
reconstrução e fortalecimento da escola pública e da percepção de que um
período parcial é insuiciente para garantir a formação integral.
Entender de forma ampliada a educação realizada em tempo
integral, não signiica apenas a ampliação do tempo de permanência
dos estudantes na ‘mesma’ escola, sem as necessárias transformações
de tempos, espaços e atividades, o que representaria, segundo Arroyo
(2012), a precarização dos tempos-espaços do viver e uma violência
contra a infância e adolescência das pessoas das camadas populares.
Reclamamos, portanto, com essa ressigniicação do conceito de educação,
a defesa de uma escola que amplia seus tempos e espaços à comunidade,
que consiga incorporar as dinâmicas, as atividades e as necessidades
formativas de seus sujeitos. Que reconstrua o currículo escolar na direção
de um reconhecimento da importância da diversiicação das atividades
e da inclusão de outros agentes sociais na educação, o que garante
dialogicidade epistemológica, territorial e temporal.
Nos últimos anos, presenciamos a construção de propostas de
educação integral em tempo integral em diferentes municípios pelo o
Brasil, fazendo emergir iniciativas pedagógicas inovadoras que ajudam
nesse movimento de renovação da escola. Nesse tempo, iniciativas de
formação também foram se desenhando no sentido de contribuir para esse
novo momento. Pesquisa realizada pelo Ministério da Educação ilustra
bem esta realidade (BRASIL, 2010).
A Educação Integral não se apresenta, ainda, em nosso país enquanto
uma política pública consolidada, mas existem diversas estratégias
para induzir a construção dessa política, dentre essas, o Programa Mais
Educação, do Ministério da Educação, compondo as ações do Plano
de Desenvolvimento da Educação (PDE), para induzir a ampliação da
jornada escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação
Integral. Criado pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e regulamentado
pelo Decreto 7.083/10, estava voltado inicialmente para escolas urbanas.
Em 2012 a proposta é ampliada para as populações e escolas do campo. A
inserção e ampliação do Programa Mais Educação para escolas do campo
60
aparece como demanda do Programa Nacional de Educação do Campo
(PRONACAMPO), lançado em 20 de março de 2012.
A ampliação do atendimento da Educação em Tempo Integral
existência
se deve ao fato da existência do Programa Mais Educação, que em
atendimento de 12,5%
seus primeiros seisdoanos
público matriculado
garantiu na Educação de
o atendimento Básica em escolas
12,5% públic
do público
segundo dados na
matriculado do Inep em 2013.
Educação Ainda conforme
Básica em escolasos dados do Educasenso
públicas, segundo2013dados do
Inep em 2013. Ainda conforme os dados do Educasenso 2013 é possível
vislumbrar o percentual da população matriculada que recebeu Educação
em Tempo Integral, ver gráico na sequência.
61
educadores para a educação integral, a exemplo da Associação Cidade
Escola Aprendiz, o Centro de Referência em Educação Integral e o
Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária
(Cenpec), com a promoção de seminários, cursos, publicações e
assessorias pedagógicas aos sistemas estaduais e municipais de ensino.
A Universidade Federal da Paraíba (UFPB), através do Núcleo de
Cidadania e Direitos Humanos (NCDH), iniciou essa colaboração em
2009, a partir da participação de professores em um Seminário em Brasília,
promovido pelo Ministério da Educação, tendo como tema a Educação
Integral. A contribuição da UFPB no campo da formação docente para a
Educação Integral se realiza tendo como referência os direitos humanos e
a Educação Popular. Ou seja, “buscamos a base conceitual na Educação
Popular, como io que costura as redes de inter-relações entre a Educação
Integral e Educação em Direitos Humanos”. Historicamente, a UFPB
tem desenvolvido ações no campo dos direitos humanos, já com uma
produção relevante nesse campo, tendo como principal referência o NCDH
(ZENAIDE e DIAS, 2006). Da mesma forma, a Educação Popular, com
uma produção importante no Programa de Pós-graduação em educação,
em especial na linha de pesquisa em Educação Popular (RODRRIGES,
et.al., 2007). Perspectivas que orientaram a proposta pedagógica da
formação do curso de especialização em Educação Integral em Direitos
Humanos.
63
no processo de formação continuada e que elegemos como pressupostos
centrais para nossa análise do processo de formação para proissionais
da Educação em Tempo Integral: a práxis; a interdisciplinaridade;
a educação pela pesquisa; visão ampla do processo formativo.
A práxis no processo de formação docente diz respeito a interrelação
da teoria e da prática, da relexão e ação, buscando a autorrelexão da
atuação como docente a im de avaliar e reconstruir o sentido da prática.
A práxis é um conceito que remete a necessária dialogicidade do processo
educativo, um conceito que Freire revela desde que escreve a Pedagogia
do Oprimido, quando ressalta a necessidade de a prática educativa nem se
constituir de ativismo (ações descoladas da relexão) nem de verbalismo
(palavras sem ações que a sustentem). Essa consciência revela o
entendimento de que a transformação da educação é processual, e que
depende do amadurecimento teórico-metodológico dos que a vivenciam.
A interdisciplinaridade busca superar a visão linear da construção
do conhecimento, da aprendizagem e do ensino, buscando alicerces de
contextualização e cotidianidade para dar sentido as aprendizagens a serem
construídas. Interdisciplinaridade signiica, segundo Fazenda (2008) um
rompimento epistemológico que altera não só a relação disciplinar, mas
quando agrega sentido na dinâmica que ultrapassa a simples busca de
conexões de conteúdos entre as disciplinas, mas incorpora à interação
professor-aluno, aluno-aluno e escola-família, para criação de signiicados
aos conteúdos da realidade (relação teoria/prática). A dinâmica de
integração de conteúdos pode ser um dos primeiros passos na interação
entre pessoas, condição para a transformação do ambiente escolar.
A educação pela pesquisa diz respeito a superação da
unilateralidade do processo de ensino em que a aprendizagem se
constrói pela memorização e associacionismo, sem a vinculação com
conhecimentos prévios que permitam que o saber construído e tenha
sentido. Segundo Demo (1996) educar pela pesquisa prescinde do
fortalecimento do papel da indagação como motor para o processo de
ensino-aprendizagem, de onde se estimula a criatividade e o compromisso
social, tanto no levantamento de problemas atrelados a cotidianidade,
quanto na superação dos mesmos pela investigação e ação na realidade.
A educação perde seu falso caráter de neutralidade e as aprendizagens
passam a ter sentido, ampliando não apenas os horizontes culturais dos
educandos, mas também as capacidades de enxergarem soluções.
A visão ampla do processo formativo é um pressuposto fundamental
para a Educação em Tempo Integral, superar a visão usual de aula, com
espaço deinido, autoritarismo docente e do conhecimento livresco. A
ampliação da noção de formação, vem acompanhada da ampliação dos
64
tempos e espaços formativos, a diversiicação das atividades envolvidas
e dos agentes, permitindo maior interação entre escola e comunidade, a
reconstrução em relação ao papel educativo da comunidade. A educação
integral sinaliza para um repensar a escola, exigindo um novo paradigma
que ajude a reconigurar o modelo tradicional. A escola precisa romper
o seu isolamento e construir pontes, no sentido de ampliar os espaços
educativos para além da instituição escolar, assim como a ampliação dos
tempos educativos, o que signiica romper com uma escola de meio turno
(ARROYO, 2012).
Tal perspectiva pedagógica exige dos educadores e educadoras
um processo de formação que os possibilite e os ajude a reletir sobre
a escola e suas práticas pedagógicas nesse novo cenário educacional
contemporâneo, o qual requer dos professores/as outras capacidades para
o desempenho de suas funções nos espaços de gestão, no cotidiano da
prática docente e pedagógica e na articulação da escola com outros atores
e espaços educativos.
Nesse novo contexto, a formação dos/as educadores/as merece uma
atenção especial, de modo a proporcionar capacidades educativas que
contribuam para a descontinuidade de uma escola que prioriza o sujeito na
sua dimensão cognitiva, passando a proporcionar a formação das crianças,
adolescentes e jovens outros saberes, fundamentais para a formação
humana. Portanto, uma nova perspectiva de escola articulada com o seu
território. A airmação de Verônica Branco reforça esse novo momento:
65
Freire. Nesse sentido, construir uma escola ampliada para além dos seus
muros exige de seus educadores a capacidade de diálogo com outros
atores e espaços. Ou seja, pensar a escola articulada com o seu território,
dialogando com os diferentes saberes existentes, além do conhecimento
escolar. (FREIRE, 1996).
66
A proposta de formação que norteia o Curso de
Especialização em Educação Integral em Direitos
Humanos parte da necessidade de repensar, com
os proissionais que vivenciam e materializam a
proposta do Programa Mais Educação, o acesso e
permanência das crianças da escola pública, em um
período estendido de atividades, não como doação da
escola e assistencialismo do Estado, mas como direito
conquistado de Educação Básica para todos em tempo
e formação integral (PROJETO PEDAGÓGICO DO
CURSO, 2012).
67
O curso teve duração de 12 meses de forma presencial. As disciplinas
buscaram contemplar, além dos conteúdos acerca das temáticas centrais
do curso, o debate sobre os sujeitos envolvidos nas práticas educativas
e a realidade de seus territórios, bem como, as orientações teóricas e
metodológicas propostas no projeto pedagógico do curso: a relação teoria
e prática, as crianças como protagonistas, a escola enquanto possibilidade
histórica, o diálogo como princípio e im da educação e a relação escola-
comunidade (PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO, 2012).
Participaram do curso 50 proissionais da educação, distribuídos
entre gestores/as de escolas, professores comunitários, oicineiros,
coordenadores, monitores e professores. Público com inserções
diferenciadas nas ações de ampliação da jornada escolar, na perspectiva
da educação integral, o que possibilitou visões plurais sobre ações
educativas desenvolvidas pelos diversos programas.
A participação dos educadores no curso foi uma oportunidade
para a relexão de suas práticas, ao mesmo tempo em que possibilitou a
ampliação e produção do conhecimento sobre problemáticas vivenciadas
no cotidiano das escolas. A partir dessa observação e do envolvimento
direto dos cursistas com os problemas e situações nas escolas, foram
surgindo os temas e objetos de analises para a elaboração de suas pesquisas
e produção das monograias.
As temáticas de estudo das monograias foram bem diversas, mas
todas em sintonia com a problemática central do curso. Trinta e duas
monograias foram concluídas e apresentadas de forma pública, como
demonstra o quadro a seguir.
68
8 As oicinas do Programa Mais Educação e a motivação dos estudantes para a
aprendizagem integral
9 A formação do monitor do programa Mais Educação
10 Violência domestica: suas implicações diante do processo ensino aprendizagem
na comunidade da Ilha do Bispo
11 A lei 10.639/03 e a sua aplicabilidade no ensino de história na EMEF professora
Antônia do Socorro Machado
12 Trilhas e experiências que chegam à escola municipal Monsenhor João Coutinho
e a associação cultural império do samba: um olhar sobre a educação integral
13 Educação integral no bairro João Paulo II na cidade de João Pessoa/PB: limites
e possibilidades
14 Efetivação dos direitos das crianças e adolescentes através do programa Mais
Educação
15 Educação integral: contribuições para a aprendizagem signiicativa e o
desenvolvimento social do estudante
16 Contribuição do programa Mais Educação para a efetivação dos direitos da
criança e do adolescente
17 As interfaces do professor comunitário que atua no programa mais educação da
rede municipal de ensino de João Pessoa
18 Diversidade na educação integral: um estudo sobre o bullying em razão da
orientação sexual e/ou da identidade de gênero
19 O processo de aprendizagem dos alunos no projeto Mais Educação a partir da
oicina de rádio escolar
20 Saberes populares na escola: uma articulação necessária
21 A contribuição do Programa Mais Educação para o protagonismo Infanto-juvenil
22 Educação em direitos humanos e o processo participativo de educandos (as) no
espaço escolar e comunitário: desaios e perspectivas da vivencia da educação
integral
23 Violência e mídia: a inluência da mídia na formação de cidadãos críticos
24 Escola integral: professor integrado
25 Currículo, educação integral e o programa Mais Educação
26 Educação integral – Do prescrito ao concretizado: relexões sobre uma
experiência em João Pessoa
27 Empoderamento discente frente à violência escolar pela educação em direitos
humanos no programa “mais educação”
28 O papel da dança na promoção do protagonismo: um olhar para a educação
integral e os direitos humanos
29 Os direitos humanos através do programa mais educação
30 Violação dos direitos do docente no âmbito escolar
31 O livro paradidático: uma ferramenta no processo ensino-aprendizagem numa
perspectiva do letramento
32 Inclusão digital no Programa Mais Educação
Fonte: Relatório inal do curso
69
Os trabalhos monográicos, como podem ser observados a partir dos
títulos, buscaram reletir sobre temas presentes no cotidiano das escolas,
em especial questões inerentes às atividades desenvolvidas através das
ações educativas dos programas que trabalham com a ampliação da
jornada escolar na perspectiva da educação integral. O Programa Mais
Educação foi a temática mais analisada nos trabalhos, cada um com uma
problemática especíica, tendo como foco alguma ação desenvolvida
através dos macrocampos, a exemplo do teatro, inclusão digital, cultura,
letramento, esporte, etc. Outro aspecto muito presente nas monograias
foi temas relacionados aos direitos humanos, em especial aos direitos das
crianças e adolescentes e a violência na escola. Além de trabalhos que
avaliaram a contribuição do programa Mais Educação no contexto escolar
de aprendizagem, de inclusão social, e construção de uma educação em
direitos humanos.
Trata-se, portanto de uma contribuição importante no campo da
formação docente na perspectiva de construção da educação integral em
tempo integral, ainda frágil, mas que tem provocado grande aprendizado,
seja por parte dos professores envolvidos, seja pelos interlocutores do
Programa Mais Educação. A participação nesse campo tem possibilitado
contribuir no processo de qualiicação da escola pública, trazendo para
o debate a necessidade de um compromisso social com os sujeitos, na
perspectiva de inserir nessa ação de educação integral uma visão crítica,
democrática e emancipadora, sendo a Educação Popular, os direitos
humanos e a cidadania eixos orientadores na formação docente.
Referências
Introdução
73
trama do próprio mundo vivido” e que possibilitasse aos graduandos
reverem-se em um cenário que transcende o tempo e o espaço no seu
processo de formação.
As observações e análises advindas das atividades em sala de aula
indicaram que a assunção da proissão docente pelos licenciandos pode
ser alcançada num movimento que contemple a relexão sobre a própria
vida. A esse respeito Nóvoa (1992, p. 26-27) considera que os cursos de
formação docente necessitam promover condições para que os futuros
proissionais se assumam como “produtores de sua própria proissão”.
Trabalhar na perspectiva da autobiograia é recuperar a dimensão de que o
professor é a pessoa; e parte importante da pessoa é o professor (ibidem).
O referencial teórico-metodológico utilizado – Walter Benjamin
(1994), Ecléa Bosi (1983), Cunha (1990), Christine Delory-Momberger
(2004), Pierre Dominicé (2000), Paulo Freire (2000), Selva Fonseca
(1997; 2006), Marie-Christine Josso (2005), António Nóvoa (1992 a; 1992
b), António Nóvoa e Mathias Finger (1988), entre outros – contribuiu
signiicativamente para ampliar a compreensão do processo de formação
a partir de interrogações sobre a imagem constituída pelo discente em
formação inicial.
A partir do referencial teórico adotado escolhemos um instrumento,
o qual nomeamos “Projeto de Formação: o discente como sujeito de sua
formação”. Com esse instrumento temos desaiado os discentes a se
posicionarem frente a escolha pela proissão docente.
Aprender com a própria experiência e questionarem-se sobre suas
escolhas foi a nossa proposta aos discentes, pois acreditamos tal como
propõe Cunha (1998, p.40), que esse é “um processo profundamente
emancipado em que o sujeito aprende a produzir sua própria formação,
autodeterminando sua trajetória”.
Acreditamos que o desenvolvimento dessa experiência tem
possibilitado ampliar as nossas relexões sobre os dilemas e desaios
enfrentados no território da formação inicial de professores, sobretudo,
no que concerne à inclusão de práticas de ensino alternativas que
promovam um olhar mais apurado sobre as interfaces das histórias de
vida – percursos pessoal e proissional – dos sujeitos em formação e suas
implicações na construção da identidade proissional docente.
74
A escrita de memórias implica em lembrar-se de acontecimentos
passados. O processo de recordar não é apenas sonho, mas sim um
exercício de compartilhamento de experiências vividas. A narrativa da
própria vida, considera Bosi (1983), é o testemunho mais eloquente
dos modos que a pessoa tem de lembrar. É a sua memória. Memória
compreendida não como sonho, porém como trabalho. Lembrar não é
reviver, mas refazer o percurso, repensando e reconstruindo, com imagens
e ideias de hoje, as experiências do passado. Ao recordar, reletimos sobre
como compreendemos nossa própria história e a dos que nos cercam.
Inscrevemo-nos cotidianamente na história que não está mais
distante e, sim, impregnada das memórias que nos tomam e da qual muitos
outros fazem parte. Essa concepção nos levou a formular a hipótese de que
se os alunos escrevessem suas histórias de vida retomariam o aprendido,
num movimento de expansão de suas formações que complementaria as
lacunas, preencheria os não-ditos, instigaria a busca de novas respostas,
explicaria, justiicaria suas ações e opções tal como propõe Souza (2005,
p. 53) “a escrita da narrativa remete o sujeito para uma dimensão de
auto-escuta de si mesmo, como se tivesse contado para si próprio suas
experiências e as aprendizagens que construiu ao longo da vida por meio
do conhecimento de si”.
De acordo com Josso (2005), o recurso biográico no devir
formativo permite o exercício do “autoformar-se”. A autora analisa
a abordagem biográica como metodologia de pesquisa-formação e
discute sobre o poder transformador das narrativas, à luz dos diferentes
papéis desempenhados na sua construção e interpretação. Airma que a
pesquisa sobre a “formação de si” implica necessariamente que façamos
questionamentos para que aprendamos a aceitar os desaios postos pelas
histórias de vida.
A ideia do Projeto de Docência teve origem em nossa experiência
acadêmica ao elaborarmos nosso Memorial no curso de graduação e pós-
graduação. O memorial (do latim memoriale) é a escrita de memórias
e signiica memento ou escrito que relata acontecimentos memoráveis.
O memento – que quer dizer ‘lembra-te’ – de modo geral pode ser
compreendido como uma marca que serve para lembrar qualquer coisa.
Ao contar as coisas lembradas, os acontecimentos passados
assumem vários matizes e nos dobramos sobre a própria vida. Ao recordar,
passamos a reletir sobre como compreendemos nossa própria história e a
dos que nos cercam. Essa concepção levou a formular a hipótese de que
se os alunos escrevessem suas histórias de vida retomariam o aprendido,
num movimento de expansão de suas formações que complementaria as
lacunas, preencheria os não-ditos, instigaria a busca de novas respostas,
75
explicaria, justiicaria suas ações e opções. Ao se encontrarem no passado
“de-senhariam-se”.
A partir dessa concepção consideramos que o estudante ao escrever
o Projeto de Formação para a Docência, tem a possibilidade de recuperar
em sua trajetória escolar as concepções pedagógicas, conteúdos, valores,
marcas que implícita e explicitamente inluenciam e/ou inluenciarão sua
prática docente.
Deinido o instrumento propomos, no início do semestre
letivo, a elaboração de um Projeto de Formação para a Docência aos
alunos, enquanto instrumento relexivo, cujo objetivo é a assunção da
proissão docente. Para instigá-los a lembrarem-se propusemos alguns
questionamentos:
— Se você tivesse a chance de encontrar com a criança que você era, com
mais ou menos oito anos de idade, você acha que você criança icaria feliz
em ver o que você se tornou?
— Você acha possível aprender algo com sua própria vida e com as
experiências compartilhadas com outras pessoas que passaram e ainda
estão presentes na sua trajetória? O que você aprendeu? O que você
ensinou? O que foi mais marcante e signiicativo?
— Quais são as lembranças mais recorrentes sobre o tempo vivido na
escola, como estudante?
— Como era a relação com a escola? Gostava de frequentá-la ou fazia
por obrigação?
— Quais as lembranças que mais lhes marcaram a respeito dos
professores? Relate tanto as memórias boas quanto as ruins e a relacione
com a imagem que construiu para si mesmo, ao longo do percurso escolar,
sobre o “bom” e o “mau” professor.
— Como a família percebia a importância do estudo em sua vida? A
escola era uma condição necessária ou um produto do acaso ou mesmo
escolha pessoal?
— Os pais e familiares próximos atribuíam importância ao chamado
“mundo letrado”? A escola chegou a ser uma via de mobilidade social
ascendente, ou seja, de possibilidade de um futuro melhor?
— Como se deu a escolha de sua proissão? O passado escolar interferiu
na decisão?
— O signiica a minha formação?
— Como eu dou sentido à minha própria história?
76
revelam o medo da exposição e a consequente avaliação e airmam que
lembrar tudo sobre suas vidas e responder aos questionamentos propostos
lhes parece uma tarefa impossível. Outros contestam a proposta por a
compreenderem subjetiva demais e questionam a pertinência da memória
individual como contributo no processo de formação.
Na primeira turma em que o Memorial de formação foi usado,
um dos alunos não apresentou o trabalho e um outro escreveu somente
uma folha, alegando que não sabia nada sobre sua infância, não lembrava
de seus professores. Outros, reencontrando-se com determinadas
passagens de sua história e com muitos de seus personagens, reavaliaram
situações vividas, surpreenderam-se com acontecimentos ressigniicados,
entusiasmaram-se com o que tinham para contar e reconheceram quão
signiicativo fora esse mergulho em suas respectivas histórias.
Atualmente, após alguns anos propondo esse trabalho às diferentes
turmas o acolhimento é signiicativo: os mais jovens anseiam por
contarem suas histórias e até ilustrá-las com fotos (um desejo de muitos
alunos negociado e acatado pela professora); alguns mais experientes
sentem-se sensibilizados ao falarem sobre suas vidas, mas a maioria dos
alunos dedica-se com satisfação e esmero a essa tarefa, pois a medida em
que entram em contato com o referencial teórico passam a redimensionar
a concepção da memória como produto de uma atividade meramente
subjetiva. Halbwachs (1956) considera que as lembranças são frutos de
uma atividade de reconstrução do vivido. Para compreender o presente
faz-se necessário pesquisar sobre o percurso vivido, identiicar, analisar
e conhecer as interações feitas. A memória revela, segundo o autor, e
acompanha as opções pelas mudanças ou a resistência a estas. Representa
uma arte não só do que aconteceu, como também do que deixou de
acontecer, aquilo que poderia ou deveria ter acontecido.
Constamos nos relatos dos licenciandos que, uma vez superadas as
diiculdades iniciais para realizar a narrativa de si, o mergulho em busca
de si é inevitável, porque a ação de “escrever sobre si” desaia os alunos
a (re)contarem o vivido e questionarem o sentido de “ser humano”, em
especial, o de ser humano na condição de formação para a docência e o
valor por eles atribuído a proissão docente e a própria vida. A palavra
narrar vem do verbo latino narrare, que signiica expor, contar, relatar.
Nessa perspectiva, ser professor, ser professora passa a ser uma
construção singular que vai tomando forma no processo da própria
existência, sobretudo porque a ação de ensinar suscita uma aprendizagem
permanente, contınua, marcada pela descontinuidade que implicará
na compreensão e assunção da passagem de aluno a professor. Nóvoa
(1992, p.26-27) também assinala essa relevância, ao dizer que os cursos
77
de formação necessitam promover uma formação em que os futuros
proissionais se assumam como produtores de sua própria proissão,
sinalizando como princípio de formação produzir a vida do professor.
Signiica a oportunidade de se perceberem como autores da própria vida.
Para tanto, na elaboração do Projeto de Formação para a
Docência os graduandos devem contemplar as seguintes etapas: uma
primeira parte introdutória contendo as impressões deles colhidas
em suas lembranças, recuperando as pessoas que inluenciaram sua
aprendizagem: pais, familiares, professores. A segunda parte deve
contemplar os posicionamentos dos discentes frente a fundamentação
teórica, indicada e discutida na disciplina. Por im, a terceira parte tem
caráter crítico-relexivo: (a) os limites e possibilidades de ser Professor
(a); (b) perspectivas após a disciplina; (c) contribuições para o exercício
da docência na sua área de formação. Com essas orientações objetivamos
que os alunos compreendam que o Projeto de Formação para a Docência
não visa somente o registro das reminiscências individuais, mas que ao
recuperarem, na escrita de si, apreenderão o próprio processo de aprender.
Para produzir a “escrita de si” é relevante saber sobre as condições
em que estão circunscritas as lembranças, assim como os acontecimentos
e personagens que predominaram segundo as escolhas feitas. Nesse
sentido, o Projeto de Formação para a Docência não é somente uma crítica
que forçosamente avalia as ações, ideias, impressões e conhecimentos do
sujeito narrador; é também autocrítico da ação daquele que narra, seja
como autor do texto ou como sujeito da lembrança e tem muito a ver
com as condições, situações e contingências que envolveram a ação do
narrador, protagonista das memórias. Além de ser crítico e autocrítico,
é também um pouco confessional, apresentando paixões, emoções,
sentimentos inscritos na memória.
O Projeto de Formação para a Docência é um gênero textual
predominantemente narrativo, circunstanciado e analítico, que trata do
processo de formação num determinado período. O passado lembrado
não é linear. A narração avança e recua sobre a linha do tempo, como
que transbordando a initude espaço-temporal que é própria dos
acontecimentos vividos (BENJAMIN, 1929, p.37).
A palavra narrar vem do verbo latino narrare, que signiica expor,
contar, relatar. E se aproxima do que os gregos antigos chamavam de
épikos – poema longo que conta uma história e serve para ser recitado.
Narrar tem uma característica intrínseca: pressupõe o outro.
A narrativa de formação oferece um terreno de implicação e
compreensão dos modos como se concebe o passado, o presente e, de forma
singular, as dimensões experienciais da memória de escolarização. Para
78
Souza (2006, p.59) “a escrita da narrativa da trajetória de escolarização
permite ao sujeito compreender, em medidas e formas diferentes, o
processo formativo e os conhecimentos que estão implicados nas suas
experiências ao longo da vida”.
As narrativas são instrumentos efetivos de recriação da realidade
social e possibilitam às pessoas terem não apenas um lugar na história,
mas, sobretudo, um papel importante na produção do conhecimento. A
realidade cotidiana é percebida por cada um de nós de um modo muito
particular, damos sentido às situações por meio do nosso universo de
crenças, elaborado a partir das vivências, valores e papéis culturais
inerentes ao grupo social a que pertencemos.
As representações das pessoas e suas inquietações vivenciadas
estão contempladas no interior das narrativas e nos permitem decodiicar,
interpretar as situações que vivemos; contudo, a narrativa de vida, como
propõe Josso (2005, p. 153), não tem em si poder transformador, mas,
em compensação, a metodologia de trabalho sobre a narrativa de vida
pode ser a oportunidade de uma transformação, segundo a natureza das
tomadas de consciência que aí são feitas e o grau de abertura à experiência
das pessoas envolvidas no processo. As narrativas, nesse caso, não dizem
respeito, necessariamente, à totalidade da vida das pessoas, porém
aos aspectos dessa vivência, os quais constituem informações para a
reconstituição de fatos e problemáticas.
Na interpretação e análise das narrativas, reletem-se as condições
construídas historicamente por esses sujeitos, com variações limitadas e
que permitem identiicar diferentes pontos de vista parciais, contradições
e tensões, leituras e interpretações diversas em permanente processo de
construção.
Catani, Bueno e Souza (1997) entendem que o trabalho com história
de vida, memória e autobiograia tem contribuído na pesquisa educacional
e na formação para a construção de uma “contra-memória”, através da
produção de relatos autobiográicos, os quais possibilitam desconstruir
imagens e representações sobre a prática docente, os fundamentos teóricos
da prática e, desta forma, contrapor-se à memória oicial disseminada pelas
políticas de formação e pela literatura pedagógica que vem estruturando
o trabalho docente.
O Projeto de Formação para a Docência no contexto da disciplina
Didática Geral converteu-se em um recurso valioso para a análise
da prática pedagógica: nele os alunos izeram uso de narrativa, foram
incentivados a escreverem e a reletirem sobre o percurso escolar,
sobre a trajetória de vida salientando o caráter histórico; compreendem
o papel de protagonistas que representam na História e, sobretudo,
sentiram-se instigados a buscarem nas diversiicadas inluências que, de
79
alguma forma, os levaram a escolherem a docência como proissão. Ao
escreverem sobre suas histórias e relembrarem as condições escolares
vivenciadas, ou mesmo ao reverem a própria prática como estudantes,
ou como professores, identiicam o próprio processo de aprendizagem.
80
O Projeto de Formação para a Docência, de forma geral, desaiou
os alunos a se posicionarem frente à escolha pela docência.
Para aqueles que já possuíam uma posição deinida pode não ser tão
relevante, mas foi fundamental para aqueles que precisavam se perguntar
sobre as razões de estar cursando a licenciatura e que im daria a esta fase
da vida acadêmica.
84
essa realidade que está por vir. Sem sobressaltos,
consigo perceber que a minha formação em História
passou a ter mais “substância”, os meus objetivos não
icam mais presos somente a própria História, mas
ao processo educativo de forma geral (Licenciatura
História, 2013).
Considerações Finais
Referência Bibliográica
88
CAPÍTULO VI
Eliseu Riscaroli
Questões iniciais
O tema da sexualidade é recorrente na vida escolar, seja porque
os alunos estão sempre interessados, pois ele “agrada”, seja porque
os professores em sua maioria não conseguem satisfazer o desejo de
informação dos adolescentes e jovens.
Se os estudos feministas e mais recentemente as teorias sobre
estudos de gênero contribuíram para que a sexualidade da mulher se
desvinculasse do papel de mãe/genitora; por certo essa contribuição
não surtiu muito efeito na formação de professores haja visto que os
sujeitos mais reticentes em fazer essa discussão na escola são os próprios
professores, a depender do nível, em sua maioria pelas professoras.
Desde a oicialização da Lei de Diretrizes e Base 9394/96 e dos
Parâmetros Curriculares Nacionais as questões ligadas a diversos temas
foram cunhadas como “temas transversais”, entre eles a sexualidade.
Discutir ou trabalhar este tema ou as questões relacionadas à sexualidade
na escola, tem se constituído num grande desaio, primeiro porque a
formação recebida pelos professores esta muito aquém dos anseios
da geração que frequenta a escola; segundo porque a escola, em seu
currículo, quando se propõe a realizar alguma atividade cujo objetivo
é ampliar a relexão sobre a sexualidade, cai no tradicional impasse de
relacionar este tema com as questões pequenas de macho/fêmea sob a
ótima do cristianismo e da biologia, com isso, desconsidera quase que
completamente as interfaces ligadas ao gênero e a complexa teia que
envolve a sexualidade que vai além da heterossexualidade.
Embora o tema do presente trabalho seja sexualidade na escola,
invariavelmente teremos que nos reportar às atitudes dos proissionais da
educação, o objeto central da nossa relexão são as questões colocadas
pelos alunos/as.
Desse modo, a discussão sobre a sexualidade na escola sempre
tem cruzado nosso caminho quando alunos do curso de pedagogia
manifestam interesse em realizar algum trabalho referente à sexualidade
89
de adolescentes e jovens, sua relação com gays, direitos relacionados
às minorias, comportamento de pais e professores ou personagens que
surgem nesse cotidiano. Diante disso compreendemos que, na verdade,
as crianças não têm ‘problemas com a sexualidade’, nós adultos é que
imaginamos que elas tenham os problemas que na verdade são nossos.
Também há certa rejeição de professores/as responderem questionários ou
doarem parte de seu tempo numa entrevista que aborde este tema. Assim,
a idéia mais sensata nos pareceu ir à busca de adolescentes e jovens e
tentar mapear suas angústias sobre o tema e de quebra colher dados sobre
o trabalho que a escola e professores têm realizado em relação a isso.
Os dados aqui utilizados foram coletados por uma acadêmica do
curso de pedagogia e serviu de base para a elaboração do Trabalho de
Conclusão de Curso. Inicialmente a intenção da aluna era trabalhar com
crianças da 3ª série do ensino fundamental, após uma conversa preliminar
decidimos que uma investigação com adolescentes e jovens poderia
colaborar sobremaneira com as próprias escolas e com o poder público
na proposição de políticas para este segmento da sociedade, visto que
os resultados poderiam ser apresentados nas escolas e nas secretarias de
educação e saúde do município.
O público da pesquisa foram alunos de uma turma 9º ano e um 2º
ano do ensino médio dos Colégios Dom Orione e Colégio Padrão. Ambos
são colégios estaduais, mas o Dom Orione é administrado pelos padres
orionitas. Esta pequena imersão na vida dos jovens tem por objetivo
colher informações preliminares sobre as representações deles acerca de
sua sexualidade, e como o tema tem sido, ou não, abordado pela escola
e pelos professores, sobretudo tendo presente a premissa do PCN – tema
transversal.
Também é verdade que na atualidade a construção da sexualidade
da pessoa está muito imbricada naquilo que Bauman (2004) chama de
“modernidade líquida”, mudanças rápidas e confusas fazendo emergir
uma nova forma de relacionamento pautado na satisfação do desejo
imediato. Assim o “icar” soluciona os desejos, porém não cria/explica/
fomenta uma responsabilidade-compromisso.
Analisando os dados
90
Dos cerca de 150 questionários distribuídos, 120 foram devolvidos
e constituem a base de dados de nossa relexão, sendo 53 dos alunos do
nono ano e 67 dos alunos do ensino médio. O recorte dado à questão
escolar se deve ao fato de que a escola é um espaço onde as conversas
sobre o tema luem com mais frequência aparecendo explicitamente nas
relações entre colegas, muito embora seja desconsiderado do currículo
formal ou apenas tratado como um apêndice – tema transversal – sem
grande profundidade e na maioria das vezes com um viés teológico que
não contribui para o esclarecimento que a questão exige.
Essa falta de conhecimento dos professores ica evidenciada
quando perguntamos com que frequência os professores abordam o tema
na sala de aula, e temos os seguintes dados:
91
tornam-se argumentos apresentados para a não concretização de tal fato,
pois não estão preparados para a carga de responsabilidade que isso
acarreta na vida do sujeito.
Via de regra, a questão da sexualidade na escola e na
sociedade ganha relevância graças à ação dos movimentos sociais
– feministas, gays, direitos humanos, grupos e núcleos de pesquisas
nas universidades. Na escola, de modo particular, essa questão
timidamente se apresenta naquilo que se convencionou chamar de
tema transversal, inadequado a nosso ver, pois ica implícito que
a escola tem a função de contribuir na deinição do papel sexual
dos sujeitos e não reletir sobre as questões ligadas a sexualidade
– desejo, amor, casamento, namoro, “icar”, gravidez, entre outros
- fato que não se resume a opção sexual, geralmente culminando
numa admoestação moral sobre o comportamento dos adolescentes
e jovens.
‘Orientação sexual’ como tema de currículo, segundo Silva:
“surge como uma tentativa de preencher as lacunas de informação
deixada pelas famílias e preparar as crianças e jovens para a vivência de
sua sexualidade prazerosa e saudável” (2003. p.306).
Ora, a partir disso a autora deixa transparecer que a sexualidade
poderia ser prazerosa se a escola discutisse o tema. Resta saber se a escola
tem toda essa competência e disponibilidade. Mais ainda, se ela quer
fazer isso, já que quando os jovens tem sua primeira experiência, ou o
resultado dessa experiência resulta numa gravidez a primeira reação das
instituições é recriminação, sobretudo se os envolvidos não usaram um
método preventivo.
Isso se relete nas respostas dos sujeitos da pesquisa sobre com
quem foi seu parceiro nas relações sexuais: 33,9% responderam que a
relação foi com o/a namorado/a; 40,9% com amigo ou outra pessoa. Essa
primeira relação ocorreu quando eles/as tinham entre 12 a 14 anos. Vale
lembrar que estamos ‘falando’ de relações heterossexuais. Os outros
sujeitos, que expressam sua sexualidade e afetividade com parceiros do
mesmo sexo, são vistos pela escola como aqueles que fogem à regra. Alias,
o comportamento de uma travesti já afronta a escola, não precisamos
nem falar de sua sexualidade. Recentemente dois alunos se beijaram num
banheiro de uma escola, na cidade de Ribeirão Preto, e por isso foram
suspensos, ou seja, as pessoas se sentem afrontadas com um gesto de
carinho entre duas pessoas.
Assim, a questão da sexualidade no âmbito da escola ganha espaço,
mas perde em profundidade já que nas poucas vezes quando se discute
92
sobre o tema isso é feito numa abordagem que não interessa ao público,
muito embora alunos e professores defendam a importância dele como
assunto pedagógico. Restam então aos movimentos sociais, grupos gays/
GLBT e grupos de pesquisa nas instituições de ensino superior trabalhar
com a temática.
À escola coube, através dos temas transversais, a orientação sexual,
inadequadamente, ao nosso entendimento, uma vez que o papel da escola
não é orientar, já que o termo remete a escolha entre ser hetero, bi ou
homossexual, mas sim realizar o trabalho de elucidar, explicar, conversar
com adolescentes e jovens. Fato diicilmente enfrentado pelas questões já
postas. Melhor seria discutir sexualidade como um elemento próprio do
currículo já que este é um componente físico-biológico do sujeito; além
de propor ao menos uma disciplina nos cursos de formação de professores
para tratar do tema, uma vez que no roldão da interdisciplinaridade todos
os professores devem ter um conhecimento para poderem encaminhar
as discussões quando elas aparecem na sala de aula. Conforme relatório
da audiência publica na câmara federal de 2010, 60% dos professores
admitem não ter condições de trabalhar com o tema, pois não tiveram
formação para isso.
Deste modo, sexualidade não diz respeito apenas à escolha do tipo
de parceiro, mas também ao namoro, gravidez na adolescência, desejos,
casamento, “icar”, etc.. Nessa perspectiva discordamos de Silva (2003)
ao airmar que “o tema transversal orientação sexual, surge como tentativa
de preencher as lacunas de informação deixadas pelas famílias e preparar
as crianças e jovens para a vivência de uma sexualidade prazerosa e
saudável” (p.306). Ora, se o tema só aparece na escola, porque a família
não encontra tempo para fazê-lo, temos o entendimento de que a escola
abre mão de sua função social mais nobre conforme os art. 205 e 206 da
CF e o art. 2º da LDB para assumir uma função assistencialista.
A importância do tema está no fato que ele é parte constitutiva do
sujeito e não porque a família se nega a fazê-lo ou algo parecido.
Cremos que na sua função pedagógica a escola
pode contribuir na produção/construção de uma
subjetividade, de uma possibilidade desejante que, se
em muitos casos se mostra insubmissa, conlitante com
o pacto civilizatório, revela também, certo silêncio,
sobretudo das mulheres (KEHL. 1996. p.56-7).
93
Intimamente ligada à sexualidade dos
os alunos da 8ª série participantes da pesquisa 33% afirmaram que em suas famílias
dos 17engravidou
anos; já entre os jovens do 2º ano do ensino médio o índice sobe
antes dos 17 anos; já entre os jovens do 2º ano do ensino médio
para 41%. Isso pode ser relexo da pouca utilização do preservativo nas
o índicerelações,
sobe paraapenas
41%. Isso
30%pode ser reflexo
airmaram da pouca
usá-lo. Já em utilização
relação à do preservativo
gravidez nas
fora da
relações,família o índice
apenas 30% salta para
afirmaram usá 73% e 74% respectivamente, permanecendo
a idade de até 17 anos.
salta para 73% e 74% respectivame Embora o índice assuste, não houve tempo hábil
para um levantamento na secretaria de saúde onde poderíamos veriicar
dados mais precisos em relação ao pré-natal e condições de saúde dos
envolvidos, fato que demandará novas investigações, todavia, os dados
do Ministério da saúde nos oferecem um panorama, que tem diminuído,
mas ainda é preocupante.
Assim,
96
O PNE e a ‘ideologia de gênero’ – o papel do professor
97
universidade brasileira incorporou uma prática nefasta de priorizar bolsas
das mais diversas modalidades em detrimento das bolsas de Pibic que,
de fato, forma um estudante mais comprometido com método, conceitos,
disciplina de estudo, formação.
Perspectivas...
98
Esta nova caça às sexualidades periféricas provoca a
incorporação das perversões e nova especiicação dos
indivíduos. A sodomia – a dos antigos direitos civil
ou canônico – era um tipo de ato interdito e o autor
não passava de seu sujeito jurídico. O homossexual do
século XIX torna-se uma personagem: um passado,
uma história, uma infância, um caráter, uma forma
de vida; também, uma isiologia misteriosa. Nada
daquilo que ele é, no im das contas, escapa à sua
sexualidade. Ela está presentes nele todo: 5 subjacente
a todas as suas condutas já que ela é o princípio
insidioso e ininitamente ativo das mesmas; inscrita
sem pudor na sua face e no seu corpo já que é um
segredo que se trai sempre como natureza singular
[...] A homossexualidade apareceu como uma das
iguras da sexualidade quando foi transferida, da
prática da sodomia, para uma espécie de androginia
inferior, um hermafroditismo da alma. O sodomita era
um reincidente, agora o homossexual é uma espécie
(FOUCAULT, 1984, p. 43ss).
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STEARNS, P. N. História da sexualidade. Trad. Renato marques. São
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apos-beijo-em-banheiro-de-escola-em-rio-preto.htm acesso em abril
2015
http://educacao.uol.com.br/noticias/agencia-estado/2015/07/01/
universidade-federal-do-abc-apura-pichacoes-de-teor-homofobico.htm
acesso em julho 2015
http://educacao.uol.com.br/noticias/2015/04/17/alunos-promovem-
beijaco-contra-homofobia-na-ufmg.htm
http://www.felgtb.org acesso em abril 2015
http://observatoriodaimprensa.com.br/feitosdesfeitas/_ed840_sexo_
sexualidade_e_genero_na_formacao_de_professores/ acesso em abril
2015
101
CAPÍTLO VII
Neil Franco
Nilce Vieira Campos Ferreira
Introdução
104
passaram a identiicar a escola como um lugar de pertencimento,
apesar de diversos obstáculos enfrentados por esse segmento social
coninado ao universo da marginalidade.
Nessa linha de raciocínio, procuramos contextualizar a prática
docente de professoras trans brasileiras no sentido de ressaltar como as
temáticas de gênero e sexualidades entrelaçam seu cotidiano proissional,
buscando indícios do processo de formação docente no qual estiveram/
estão imersas.
Cabe-nos ressaltar que essas contextualizações integram as
problematizações de uma tese de doutorado em Educação cujo objetivo
foi identiicar e problematizar indícios de desestabilização que a presença
de professoras trans provocaria nas escolas nas quais atuam (FRANCO,
2014).
Metodologicamente, a pesquisa realizada entre 2010 e 2014
analisou fontes bibliográicas, documentos, entrevistas e questionários.
Doze professoras trans de cinco regiões do país compuseram o universo
investigado: duas da região sul, quatro da região sudeste, três da região
centro-oeste, duas da região nordeste e uma da região norte.
No ano de 2014, essas docentes se encontravam na faixa etária
de vinte e sete a quarenta e seis anos. Sete delas se identiicavam com
a identidade de gênero transexual, quatro como travestis e uma como
transgênero. Como identidades sexuais, sete se interpretaram como
heterossexuais; três como homossexuais; três não se identiicaram. A área
de formação nas ciências humanas e sociais era predominante entre as
professoras. A licenciatura em Letras foi o curso concluído por seis delas.
A atuação em escolas da rede púbica de ensino foi uma das características
marcantes do grupo. O tempo de experiência na docência formal variou
de um a vinte e um anos. A atuação na Educação Básica constituiu uma
experiência vivenciada por todos os sujeitos da pesquisa.
Teoricamente a pesquisa se sustentou nos princípios da teoria
queer por ancorar-se numa forma múltipla e dinâmica na proposição
de problematizações dos campos identitários. Com isso, possibilita-
nos visualizar, analisar e contextualizar o campo geral no qual todas as
identidades, sexuais, gêneros, raciais, classes, são construídas, percebendo-
as necessárias e inter-relacionadas, constituindo uma realidade complexa
e em constante movimento nas mais variadas dimensões: históricas,
sociais, políticas e educacionais (LOURO, 2004).
Marcado por confusões, conlitos e incômodos tanto no campo
identitário como no campo disciplinar, o termo queer sugere “uma
expansão politicamente volátil’ das categorizações identitárias que
procura incluir as mais diversas formas de outsiders do sexo e do gênero.
105
Queer marca uma identidade que, deinida como tal
por um desvio das normas relativas ao sexo e ao gênero
pelo eu interior ou por comportamentos especíicos,
está sempre mudando; a teoria queer e os estudos
queer propõem um enfoque não tanto sobre populações
especíicas, mas sobre os processos de categorização
sexual e sua desconstrução (GAMSON, 2007,
p.347).
107
relações estreitas com o movimento social organizado LGBT que, além
de oferecer subsídios para a construção de sua identidade de gênero trans,
possibilitava-lhes estabelecer relexões e questionamentos voltadas para
o contexto da escola, trazendo à tona indícios de uma pedagogia queer ou,
uma formação docente queer, destinando um olhar atento ao universo das
diferenças (SILVA, 2007; LOURO, 2004).
108
Gênero e sexualidades: indícios de uma formação docente queer
109
com aquele conteúdo, sobretudo, pela predominância dos princípios
católicos nos quais a disciplina ancorava-se.
Os questionamentos de Marina resultaram na convocação de uma
assembleia com a comunidade escolar para que reavaliassem o Projeto
Político Pedagógico e se rediscutisse a disciplina Ensino Religioso naquele
espaço. Apesar da resistência inicial da direção da escola, realizou-se uma
assembleia na qual os docentes, funcionários/as, pais e mães de alunos/as
decidiram pela alteração da disciplina. De Ensino Religioso a disciplina
foi redimensionada para Ética e Cidadania.
Com essa alteração, Marina conseguiu realizar diversas discussões
em temáticas que pouco adentravam ou não eram reconhecidas dentro
do contexto escolar. Dentre elas, destaca-se a criação do projeto “Diga
não à homofobia escolar: valorizando as singularidades e as diferenças”,
que foi classiicado e premiado ao concorrer ao Prêmio Educando para a
Diversidade Sexual/2010 promovido pela Aliança Global para Educação
LGBT (GALE)3. O projeto teve como objetivo desenvolver propostas
de Educação e Direitos Humanos, trazendo para o cotidiano da sala de
aula temas como gênero, sexualidade, orientação sexual, homofobia,
preconceito e cidadania, numa visão contemporânea em que o/a aluno/a é
sujeito das ações.
Ressalvamos que muitas são as razões que nos constituem
historicamente homofóbicos/as. Ao discorrer sobre essas razões Bruce
Hilton (1992) expôs a recusa do discurso religioso em considerar o sexo
como um de seus princípios sociais, o que tem se irradiado ao longo dos
séculos e de forma generalizada pela sociedade.
De acordo com os escritos da Igreja primitiva, ética sexual não
era foco de interesse desses documentos, incorporando-se nos discursos
religiosos a partir dos três primeiros séculos da Era Cristã, quando a
Igreja estendia suas relações com o Império Romano, absorvendo normas
rígidas que defendiam o antagonismo entre mente e corpo.
Marco Antônio Torres (2005) detalhou que essa concepção
antagônica entre mente e corpo que incide nas práticas sexuais refere-se
à vertente estoica do helenismo apropriada pelo Cristianismo na qual o
sexo se consagrou como sinônimo de procriação, recusando a dimensão
do prazer por ele proporcionada, independente da dimensão heterossexual
ou homossexual.
Os autores citados são unânimes na airmativa de que essas
ideias antigas são recorrentes no imaginário social atual. Mesmo com o
3
A GALE é uma comunidade internacional de aprendizagem para educadores/as que objetiva a
inclusão de pessoas que são prejudicadas em razão de sua orientação sexual ou identidade de gênero.
Visa produção e aprimoramento de conhecimento nesse campo. Informações disponíveis no site
www.lgbt-education.info.
110
transcorrer de tantos séculos, isso explica por que é tão problemático em
nossa sociedade lidar com as manifestações do gênero e das sexualidades
que contrariam os padrões normativos.
Interpretada dentro de uma perspectiva queer, a proposta de
Marina desencadeou processos de subversão de conteúdos considerados
imutáveis na prática docente ao propor a discussão sobre homofobia. Com
isso, conseguiu deslocar o foco hegemônico da prevenção de gravidez
na adolescência e DST/Aids para a possibilidade de contextualização
das múltiplas formas de constituição do gênero, das sexualidades e suas
vivências na dimensão social. Marina buscou desconstruir mecanismos
culturalmente estabelecidos que designem formas de valorização
hierárquicas de supremacia do ‘eu’ e submissão e desvalorização do/a
‘outro/a’ nas dimensões históricas, sociais e culturais.
Para Silva (2007) e Louro (2004), há uma exaltação da discussão
da diferença distante de uma concepção estabelecida por “programas
multiculturais bem-intencionados” em que o ser diferente se interliga
muito mais ao ser exótico.
111
os sujeitos envolvidos nos quais a recusa de atitudes homofóbicas foram
evidenciadas.
112
Primeiro ano, nós estamos trabalhando resumo e
resenha, “então, vamos lá, vamos fazer uma resenha
crítica sobre o ilme [Transamérica] assistido”. A
partir daquela resenha crítica eu direcionava a aula
para eles. O segundo ano, com o ilme “Orações para
Bobby”, trabalhando a tipologia textual. “Vamos
narrar num texto como foi o ilme.” Como se eles
fossem narrar para alguém, descrever para alguém o
ilme. (...) No terceiro ano, já estávamos trabalhando
um texto dissertativo-argumentativo para a redação do
vestibular. “Tratamos de um ilme, ‘O amor de Sião’, a
condição do amor, de relacionamento, mais o quê? (...)
E aí, eles acabavam dissertando em relação ao ilme
e trabalhava a temática sem nenhum problema
(Adriana, Aquidabã-SE, abril de 2013, sublinhado
nosso).
115
Considerações
Referências
116
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117
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Dissertação (Mestrado em Psicologia) - Programa de Pós-Graduação em
Psicologia, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte: 2005.
118
CAPÍTULO VIII
Introdução
119
Especial na perspectiva da Educação Inclusiva está articulada nas escolas
municipais deste município desde a década de 1990, ocasião em que
o país foi signatário e assinou os acordos internacionais advindos da
Educação para Todos por meio da Declaração de Jomtien na Tailândia em
1990 e da Conferência Mundial sobre Educação Especial, em Salamanca,
na Espanha, em 1994.
Atualmente o município oferece os serviços da Educação Especial
por meio do AEE nas salas de Recursos Multifuncionais – SRM para 1442
alunos, público alvo da Educação Especial nos níveis infantil e básica.
Mas o que nos chamou a atenção e nos instigou para esse estudo foi
o fato de o município, em certo aspecto, ser “pioneiro” no atendimento ao
público alvo da educação especial no contexto da escola comum regular,
porém, ainda não apresenta um trabalho sistemático no atendimento a AH/
SD. Apesar de iniciar, em meados de 2006, um processo de identiicação
para possível atendimento, por questões de concepções políticas e mitos
em relação à necessidade de AEE para Altas Habilidades, os responsáveis
pela Educação Especial, naquela época, não puderam prosseguir com
a implantação de um trabalho para essa categoria, conirmando o que
Araújo e Alencar (2013) nos airmam:
120
de ensino-aprendizagem, os educadores, em especial, os proissionais
em exercício devem ter acesso a ações de formação, favorecendo o
desenvolvimento pessoal e proissional.
Contudo, a escola brasileira tem se mostrado um pouco frágil no
reconhecimento das diferenças, em especíico, das pessoas público-alvo
da educação especial, no caso em questão os estudantes com AH/SD.
Acredita-se que essa fragilidade pode ser resultado do desconhecimento
quanto ao papel da Educação Especial, do seu público-alvo e seus
objetivos, o que tem se apresentado como entrave, diicultando o trabalho
do AEE no contexto da escola comum e de suas parcerias.
Essa fragilidade e desconhecimento sobre o público de AH/SD
tem trazido à educação especial discussões, relexões e debates entre
famílias e proissionais do contexto escolar, o que revela a necessidade de
expansão do tema no interior da escola e no processo de formação desses
proissionais, das informações, do conhecimento e relexões sobre qual
concepção prevalece a respeito de quem é o estudante com AH/SD e de
atendimento a sua diferença. Isto ocorre devido ao contexto do campo
educacional de hoje e também pela própria literatura (Guenther 2000;
Virgolim, 2007), que nos revela uma realidade quase invisível dessa
categoria no ambiente escolar.
Assim, atender plenamente as necessidades desses alunos somente
será possível se houver por parte dos sistemas de ensino uma reestruturação
social capaz de valorizar o papel da escola e de seus proissionais,
qualiicando-os e propondo políticas públicas educacionais de formação
continuada que oportunize a participação das pessoas envolvidas
no contexto escolar, com elaboração de propostas pedagógicas mais
próximas das reais necessidades de cada escola e de cada estudante. Para
atender a cada um e a todos é preciso que estas políticas se multipliquem
e alcancem muitos olhares, saberes e pessoas no ambiente escolar.
É compreendendo o seu cotidiano que os professores poderão
minimizar as barreiras atitudinais e concepções positivistas que permeiam
as práticas educacionais atuais. Estas relexões são fundamentais para
promover a ruptura com os modelos tradicionais e rígidos de ensino-
aprendizagem, ao mesmo tempo em que favorecem o desenvolvimento de
uma prática inovadora, na qual tanto o professor quanto o estudante são
agentes e sujeitos de transformação do processo educacional. Conforme
airma NOVOA (1992)
121
no terreno proissional de espaços de auto-formação
participada. Os momentos de balanço retrospectivo
sobre percursos pessoais e proissionais são momentos
em que cada um produz a “sua” vida, o que no caso
dos professores, é também produzir a sua “proissão
NOVOA (1992, p.26)”.
122
Assim, consideramos de suma importância neste momento, relatar
os primeiros passos do município de Uberlândia no processo de formação
docente de proissionais da Educação Especial para identiicação e
implantação do Serviço de AEE para AH/SD.
O referencial teórico que subsidiou a elaboração do curso teve a
perspectiva do materialismo histórico dialético cultural que possibilita a
relatividade, a análise do concreto e a dialogicidade. Tendo em vista que
o método dialético implica sempre em uma revisão e em uma relexão
crítica e totalizante porque submete à análise toda interpretação pré-
existente sobre o objeto de estudo (LIMA E MIOTO, 2007).
Por se tratar de uma proposta de formação continuada para
os proissionais atuantes no AEE das escolas municipais, o local de
desenvolvimento do curso e da pesquisa foi o Centro Municipal de
Estudos e projetos educacionais-CEMEPE- unidade responsável pela
formação continuada de proissionais da educação na Rede Municipal
de Ensino, sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Educação.
Para desenvolver a proposta do curso de extensão/formação, nos
valemos da pesquisa qualitativa de caráter descritivo, pois ela proporciona
trabalhar e tratar os dados ou fatos coletados na própria realidade em suas
diferentes formas (GIL, 1997).
Para os procedimentos e metodologia no decorrer do curso de
formação, elegemos algumas categorias de análise, tendo em vista as
articulações existentes entre elas. Consideramos, principalmente, as
categorias da totalidade, do lógico e do histórico, da contradição, do
abstrato e o concreto. O processo de análise utilizado é o hermenêutico-
crítico, que consiste na abordagem crítica dos resultados obtidos pela
análise interpretativa.
Portanto, optamos por realizar uma pesquisa tendo em vista
procedimentos metodológicos de acordo com o contexto social em
constante movimento e transformação, marcado por contradições em seu
processo histórico e ontológico e dessa forma analisar todos os elementos
podendo fazer acréscimo nas observações e informações relativas aos
dados apresentados.
123
de matrículas, no atendimento e nas propostas de formação. Com a
deinição do público-alvo daquela modalidade de educação em 2006, em
Uberlândia, houve mais acréscimos de matrículas dessa demanda nesses
níveis de ensino e, consequentemente, na formação continuada para
atender os estudantes com deiciência.
Diante desse contexto, constatamos que, desde a década de 1990
até os dias atuais, o AEE e a formação continuada dos proissionais que
atuam nesse serviço deram maior ênfase para o atendimento aos alunos
com deiciência, havendo também uma ampliação do atendimento aos
alunos com Transtornos Globais do Desenvolvimento-TGD, excluindo os
estudantes com AH/SD dos atendimentos especiais.
Segundo Freitas e Pérez (2011), para conseguir tirar o preixo “in”
da invisibilidade (grifo nosso) de ações junto aos estudantes com AH/SD
é necessário formação docente e informação no contexto da sociedade
em geral.
Buscando mudar essa realidade, no ano de 2007 iniciaram-se
os estudos no município de Uberlândia e foram oferecidos 02 cursos
de formação continuada referentes à AH/SD para os proissionais que
atuam no AEE, sendo um de 80 horas (2007) e outro de 40 horas em
2008, segundo dados fornecidos pelo NADH. Também foram ofertadas
palestras inseridas nos seminários e simpósios da Educação Especial
do município e também pelo programa Educação Inclusiva: direito
à diversidade. Este, apesar de sua importância na disseminação de
conceitos e práticas referentes à Inclusão, não conseguiu contemplar com
profundidade a formação dos proissionais para a temática da AH/SD,
FREITAS e PÉREZ (2011).
Nesse sentido queremos salientar que ainda faltam ações voltadas
para identiicação de alunos que apresentam AH/SD e que também se
caracterizam como público-alvo da Educação Especial. Conforme dados
do NADH, o quantitativo de alunos com deiciência, atendidos em
escolas municipais é a maioria, sobrepondo-se em muito ao quantitativo
de alunos identiicados com características de AH/SD, que somam em 06
alunos em toda a rede. O que torna quase insigniicante a oferta do AEE
para essa demanda. Contudo é importante resgatar o dizer de (Virgolim,
2007), quando nos alerta que a identiicação da AH/SD só é signiicativa
se for realizada com o objetivo de oferecer atendimento especializado aos
estudantes conforme suas possibilidades e interesses.
Outro fator que parece ser impedimento ao AEE é o desconhecimento
em relação ao tema, o que ocasiona a falta de atendimento às suas
necessidades e muitas vezes olhares equivocados sobre os estudantes
com AH/SD rotulando-os como indisciplinados ou com algum transtorno
124
conforme nos mostra as respostas de questionário aplicado aos inscritos
no curso de formação continuada, implicando na pouca identiicação,
sendo prejudicados em suas necessidades conforme nos relata Freitas e
Peréz (2011):
125
existente. Tudo isso demanda signiicativo grau de transformação na sua
orientação pedagógica, na sua política e cultura escolar.
Mediante essa realidade, a formação continuada para
professores da rede municipal de ensino de Uberlândia-MG,
denominada: Reconhecendo os estudantes com altas habilidades
superdotação: saberes e fazeres teve seu conteúdo organizado em
três módulos com dois encontros mensais em cada turno (matutino
e vespertino) no decorrer do ano de 2014, totalizando 60 horas.
Apresentamos aqui, os desdobramentos de dois dos cinco
encontros do módulo 01 do curso em questão, o qual abordou
atividades sobre a temática: A educação das pessoas com Altas
Habilidades/Superdotação - história, concepção e deinições.
1º encontro- Apresentação do plano de curso pelos
componentes do GEPAHS, e concepções dos cursistas sobre os
estudantes com AH/SD.
No primeiro momento foi entregue, um questionário
estruturado enquanto instrumento de investigação com os objetivos
de: obter informações gerais sobre a formação acadêmica e
participação dos inscritos em cursos e outras atividades de
formação continuada; colher informações a respeito de ações
inclusivas relativas às AH/SD em suas escolas e/ou municípios;
veriicar a compreensão que os mesmos possuíam sobre AH/
SD e, por im, averiguar a existência de alguma ação pedagógica
que contemplasse os estudantes com AH/SD. O resultado dessas
informações foi o ponto de partida para subsidiar a retomada e
revisão do curso de formação, bem como orientar o processo de
implantação do AEE para Altas Habilidades.
Em relação a informações gerais, dos 35 inscritos para o
curso, 34 eram de Uberlândia e 01 de Prata-MG (município de
abrangência de Uberlândia). Desse total, 33 pessoas eram do sexo
feminino, a maioria estava na faixa etária de 40 anos. Foram 28
professores e 05 pedagogos que atuavam no AEE/Sala de Recursos
Multifuncionais - SRM, 01 inspetora de ensino da Secretaria
Municipal de Educação e 01 intérprete de LIBRAS atuante nas
escolas.
Quanto à formação acadêmica, todos os cursistas apresentaram
certiicado de especialização, dos quais 31 na Educação Especial e 04
na Psicopedagogia e Educação Especial, dos 35 com especialização,
126
07 eram mestres em educação com ênfase na Educação Especial/
pessoas com deiciência e 01 na área de Educação Digital. Os
dados nos mostraram que apesar de todos possuírem formação na
Educação Especial nenhuma estava relacionada à AH/SD.
Por esse questionário constatamos também que noventa por
cento dos cursistas atuavam no Ensino Fundamental, em média,
há 15 anos, portanto estavam na metade de sua vida proissional,
considerando a aposentadoria de 25 anos de trabalho. O que nos
apontou uma expectativa positiva de desenvolvimento pedagógico,
uma vez que esses proissionais ainda estariam por um período
relativamente longo em atuação na sala de aula e consequentemente
em contato com estudantes com AH/SD.
Dos 35 cursistas, 09 apontaram ter participado dos cursos e
outras atividades de formação continuada oferecidas pelo CEPAE/
UFU e CEMEPE/NADH, dentre eles o referente à AH/SD, de 80
horas em 2007 e outro de 40 horas em 2008. O restante (26 cursistas)
alegou nunca ter participado de cursos de formação na área.
Conirmando assim as estatísticas sobre a oferta e participação em
cursos para categoria das AH/SD. Conforme airmou AMARAL:
Embora haja a previsão legal de uma educação que
também contemple alunos com altas habilidades/
superdotação (artigo 59, inciso II da Lei de Diretrizes
e Bases, 1996), encontramos uma formação adequada
sobre o tema sendo oferecida aos futuros proissionais
de ensino, os quais lecionarão para alunos com altas
habilidades/superdotação em suas salas de aula.
Provavelmente, estes alunos passarão despercebidos
por seus professores devido à falta de formação
docente que propicie uma percepção mínima sobre
as características básicas de um educando com altas
habilidades/superdotação (AMARAL, 2013, p.17).
129
Referências
131
CAPÍTULO IX
Vanuza A. de Souza
Vanilda A. de Souza
Vilma A. Souza
Introdução
134
Saviani (2007) destaca o PDE como uma forma de controle,
com o intuito de criar uma educação padronizada a partir das avaliações
externas, o que faz com que a escola e a prática docente passem por
modiicações. Nesse sentido, o autor airma que:
135
– IDEB, criado para avaliar o nível de aprendizagem
dos alunos, tomando como padrão o rendimento dos
alunos no inal da 4ª e 8ª série do Ensino Fundamental
e 3ª série do Ensino Médio, nas disciplinas de
Língua Portuguesa e Matemática, juntamente com os
indicadores de luxo- taxas de promoção, repetência e
evasão escolar.
• Piso do Magistério, proposta de elevação gradativa
do salário dos professores da Educação Básica para se
atingir um piso nacional mínimo para a jornada de 40
horas semanais.
• Formação docente: o PDE propõe-se a oferecer
por meio da Universidade Aberta do Brasil – UAB –
cursos de formação inicial e continuada de docentes
da Educação Básica (SAVIANI, 2007, p. 1234-1237).
136
periodicamente;
IV – combater a repetência, dadas as especiicidades
de cada rede, pela adoção de práticas como aulas de
reforço no contraturno, estudos de recuperação e
progressão parcial;
V – combater a evasão pelo acompanhamento
individual das razões da não frequência do educando
e sua superação;
VI – matricular o aluno na escola mais próxima da sua
residência;
VII – ampliar as possibilidades de permanência do
educando sob responsabilidade da escola para além da
jornada regular;
VIII – valorizar a formação ética, artística e a educação
física;
IX – garantir o acesso e permanência das pessoas com
necessidades educacionais especiais1 nas classes
comuns do Ensino Regular, fortalecendo a inclusão
educacional nas escolas públicas;
X – promover a Educação Infantil;
XI – manter programa de alfabetização de jovens e
adultos;
XII – instituir programa próprio ou um regime de
colaboração para formação inicial e continuada de
proissionais da educação;
XIII – implantar o plano de carreira, cargos e salários
para os proissionais da educação, privilegiando o
mérito, a formação e a avaliação do desempenho;
XIV – valorizar o mérito do trabalhador da educação,
representado pelo desempenho eiciente no trabalho,
dedicação, assiduidade, pontualidade, responsabilidade,
realização de projetos e trabalhos especializados,
cursos de atualização e desenvolvimento proissional;
XV – dar consequência ao período probatório,
tornando o professor efetivo estável após avaliação, de
preferência externo ao sistema ao sistema educacional
local;
XVI – envolver todos os professores na discussão e
elaboração do projeto político pedagógico, respeitadas
as especiicidades de cada escola;
XVII – incorporar, ao núcleo gestor da escola,
coordenadores pedagógicos que acompanhem as
diiculdades enfrentadas pelo professor;
XVIII – ixar regras claras, considerados mérito e
desempenho, para nomeação e exoneração de diretor
de escola;
137
XIX – divulgar na escola e na comunidade os dados
relativos à área da educação, com ênfase no Índice
de Desenvolvimento da Educação Básica – IDEB,
referido no art. 3º;
XX – acompanhar e avaliar, com participação da
comunidade e do Conselho de Educação, as políticas
públicas na área de educação e garantir condições,
sobretudo institucionais, de continuidade das ações
efetivas, preservando a memória daquelas realizadas;
XXI – zelar pela transparência da gestão pública na
área da educação, garantindo o funcionamento efetivo,
autônomo e articulado dos conselhos de controle
social;
XXII – promover a gestão participativa na rede de
ensino;
XXIII – elaborar plano de educação e instalar Conselho
de Educação, quando inexistentes;
XXIV – integrar os programas da área da educação
com os de outras áreas como saúde, esporte,
assistência social, cultura, dentre outras, com vista ao
fortalecimento da identidade do educando com sua
escola;
XXV – fomentar e apoiar os conselhos escolares,
envolvendo as famílias dos educandos, com as
atribuições, dentre outras, de zelar pela manutenção da
escola e pelo monitoramento das ações e consecução
das metas de do compromisso;
XXVI – transformar a escola num espaço comunitário
e manter ou recuperar aqueles espaços públicos da
cidade que possam ser utilizados pela comunidade
escolar;
XXVII – irmar parcerias externas à comunidade
escolar, visando a melhoria da infraestrutura da escola
ou a promoção de projetos socioculturais e ações
educativas;
XXVIII – organizar um comitê local do Compromisso,
com representantes das associações de empresários,
trabalhadores, sociedade civil, Ministério Público,
Conselho Tutelar e dirigente do sistema educacional
público, encarregado da mobilização da sociedade e
do acompanhamento das metas de evolução do IDEB
(BRASIL, 2007b, p.1. Destaque nosso).
138
Especial foi lançado por meio do edital n. 2, de 26 de abril de 2007,
cujo objetivo é oferecer cursos de extensão/aperfeiçoamento e/ou
especialização nas áreas do Atendimento Educacional Especializado
para os professores das escolas públicas. Esses cursos são oferecidos
na modalidade à distância, nas instituições públicas de educação
superior, em três modalidades: aperfeiçoamento ou especialização em
Atendimento Educacional Especializado (de 180 a 360 horas); extensão
ou aperfeiçoamento em Atendimento Educacional Especializado
(máximo de 180 horas); extensão ou aperfeiçoamento para docentes do
Ensino Regular, que trabalham com o público da Educação Especial na
sala de aula comum (máximo de 180 horas). O programa é desenvolvido
por meio de uma parceria com a Universidade Aberta do Brasil (UAB).
139
e professores formadores no acompanhamento dos cursistas ao longo
do curso. A plataforma Moodle disponibiliza ferramentas de interação
sincrônica, como chats e vídeo conferências, e de interação assincrônica,
como os fóruns de discussão, e-mails, diário de bordo, desenvolvidas na
modalidade de educação a distância, via Web.
Diante desse cenário, pode-se airmar que para que a inclusão seja
efetuada, não basta estar garantida na legislação, mas envolver outras
facetas, modiicações profundas e importantes no sistema de ensino, na
concepção de educação, de ensino, de aprendizagem e de ser humano.
Mazzotta (2005) destaca que a legislação garante a educação como direito
de todos, especialmente a Constituição Federal de 1988 e a LDB 9394/96,
mas, apesar de contempladas na legislação, a eicácia de tais conquistas
depende de ações mais efetivas como a inserção de mecanismos concretos
nos planos e ações educacionais que fazem parte da política educacional.
Nesse sentido o curso EEAEE, em sua segunda unidade
intitulada “Fundamentos e Princípios da Educação Especial”
propõe a discussão das mudanças ocorridas na organização das
políticas públicas brasileiras em uma atividade que tem como
objetivo discutir o conceito de inclusão, utilizando a ferramenta
FÓRUM DE DISCUSSÃO do ambiente virtual de aprendizagem.
140
Nesse fórum, um professor cursista da turma “Amazonas 1”,
quando solicitado a dar sua opinião sobre o processo de inclusão e as
diiculdades concernentes em seu processo de implementação, responde:
141
o paradigma da integração, “a escola não muda como um todo, mas os
alunos têm de mudar para se adaptar às suas exigências” (MANTOAN,
2003, p. 18).
Outra professora cursista apresenta uma relexão mais apropriada
acerca do conceito de inclusão:
142
faz-se necessário uma relexão dos vários aspectos essenciais para a
materialização do paradigma da inclusão, que exige da escola uma
reestruturação de seu modelo educativo e novos posicionamentos.
Uma reestruturação em busca de uma nova perspectiva que assegure a
qualidade de ensino nas escolas para atender às necessidades de cada um
de seus alunos, segundo suas especiicidades, abandonando as velhas
práticas de exclusão.
Para que a inclusão seja uma realidade, torna-se necessário superar
barreiras que envolvem a dimensão política e pedagógica. Política no
sentido de exigir do poder público assegurar as condições estruturais
para uma inclusão efetiva: recursos inanceiros, políticas de formação
continuada e permanente de professores, com ênfase na qualidade do
conhecimento e não na quantidade, aprofundando as discussões teóricas
e práticas, proporcionando subsídios com vistas à melhoria do processo
ensino aprendizagem e possibilitando alternativas que possam beneiciar
todos os alunos. Já a dimensão pedagógica, envolve a revisão de currículos
e metodologias, no sentido de considerar a singularidade de cada aluno,
respeitando seus interesses, suas idéias e desaios para novas situações.
Uma prática pedagógica que permita a diversiicação de conteúdos e
práticas que possam melhorar as relações entre professor e alunos.
Dentro dessa discussão acerca da dimensão política e pedagógica
envolvidas no processo e inclusão, foi realizada uma discussão sobre o
Projeto Político Pedagógico e sua interface com a inclusão escolar. Para
isso foi solicitado aos professores cursistas que entrevistassem um(a)
professor(a) de uma escola pública que possui alunos com deiciência nas
classes regulares.
Após as entrevistas, iniciou-se um movimento de relexão sobre o
Projeto Político-Pedagógico e sua interface com a inclusão escolar.
De acordo com essas relexões, M.I.N.P., da turma Amazonas 1,
destaca que
143
brincadeiras e que muitas deiciências não interferem
em nada na capacidade intelectual dos alunos. Nesse
sentido muito precisa ser feito no meio escolar por
esses alunos (M.I.N.P.-FÓRUM DE DISCUSSÃO-
TURMA AMAZONAS 1).
144
vez mais pelos alunos com deiciência. O movimento
da educação inclusiva fez vir à tona, a defesa dos
direitos das pessoas necessidades educacionais
especiais, dando visibilidade para sua situação de
exclusão no processo educacional. Dessa forma,
os avanços apresentados nas entrevistas mostram
que os sistemas educacionais estão em processo de
transformação e reletem uma nova visão do direito à
educação das pessoas com necessidades educacionais
especiais, exigindo uma mudança na formação de
professores e um planejamento para organização dos
recursos necessários para efetivar a educação inclusiva
(L.L.C.D. – FÓRUM DE DISCUSSÃO-TURMA
ALAGOAS 2)
Considerações inais
Referências
147
CAPÍTULO X
149
diversos conhecimentos, a im de poder corresponder às necessidades
geradas pela amplitude de sua função e ação.
Entretanto a educação deve ser pensada como “uma atividade
especiicamente humana cuja origem coincide com a origem do próprio
homem, e é no entendimento da realidade humana que devemos buscar o
entendimento da educação” (SAVIANI, 2007, p.224).
As contribuições dos estudiosos que dialogam com o materialismo
histórico dialético apontam para a compreensão da educação e de seus
processos como categoria de analise a partir do mundo do trabalho e
de suas contradições, buscando a superação da dimensão fenomênica e
aparente do objeto, procurando a sua concretude.
No contexto das transformações do mundo do trabalho sob o
processo de reestruturação produtiva e com a implantação das políticas
neoliberais a partir dos anos de 1990 na educação, perante o contexto
de crise gerencial do Estado, sendo que este reestrutura e reforma
a universidade pública. Depara-se com a intensiicação de políticas
internacionais e programas no contexto de uma educação mercadológica
voltada ao ideário capitalista.
A relação entre trabalho e educação sempre esteve atrelada às
modiicações na sociedade, provocadas por questões políticas, sociais e/
ou econômicas. As transformações, no mundo do trabalho, levaram às
reações de adaptação e reorganização nos modos e nos meios de produção,
assim como na relação entre as pessoas.
Assim, no âmbito caloroso das discussões sobre o papel da
educação as universidades têm um campo propício para exercer em
benefício para a sociedade suas três funções essenciais: a docência,
a pesquisa e a extensão. Contudo, a maior preocupação dos cursos de
formação de professores ministrados em universidades é a mudança da
visão de educação que deixa de estar centrada somente no processo de
ensino para estar centrada na aprendizagem.
As atuais discussões sobre o Ensino Superior se concentram na
diversiicação e diferenciação no sistema, na introdução de mecanismos
de mercado na gestão, na formação e no desenvolvimento da pesquisa
cientíica e na expansão acelerada da educação a distância (EaD).
Neste contexto, a formação do professor universitario é questionada
perante um quadro em que a sociedade se vê cercada pela diminuição do
salário e das frentes empregabilísticas, do aumento da taxa decrescente do
valor de uso das coisas, ou seja, as pessoas passam a valorizar e consumir
bens e trocá-los por outros mais modernos de forma arbitrária em sua
substituição. Para Lombardi,
150
é impossível entender a problemática educacional em si
mesma, pois metodológica e teoricamente é o contexto
e suas determinantes econômicas, sociais, políticas etc.
que fornecem a chave explicativa do conteúdo e do
formato que a educação assumiu (e assume) na história
das mais diferentes formações sociais e econômicas
(2001,p.219-220).
152
caracterizada pela relação com os mecanismos de controle, disciplina e
hegemonia, impostos pelo neoliberalismo à sociedade do tempo presente.
Dentre os principais fatores que explicitam a intensiicação do
trabalho do professor no Ensino Superior, na atualidade, estão: os novos
mecanismos de avaliação dos programas de pós-graduação e o processo de
expansão do ensino superior público por meio da educação a distância (EaD)
Em se tratando dos programas de avaliação, estes são denunciados
pelos impactos de uma avaliação hegemônica nos programas de pós-
graduação Stricto Sensu, com critérios homogêneos abrangendo áreas
heterogêneas, o predomínio de uma perspectiva contábil, em que se
priorizam os resultados em detrimento de processos; um sistema pautado
no produtivismo, provocando prejuízos à qualidade do trabalho acadêmico
e à saúde dos trabalhadores da educação.
Concomitante a este processo, ocorre à larga expansão de cursos
de graduação e pós-graduação Lato Sensu na modalidade a distância nas
universidades públicas brasileiras. Assim provoca uma reorganização da
gestão e do tempo, do ser professor que passa atuar de forma intensiicada
e muitas vezes desregulamentada.
Os professores que trabalham com a EaD, geralmente oriundos de
uma formação e atuação no sistema presencial, veem nela uma opção
de trabalho, cada vez mais intensiicado, pois a expansão da educação
a distância no país tem menos de uma década, mas já atinge muitos
daqueles que foram contra a sua implantação, pela diminuição de frentes
empregabilísticas no ensino presencial, muitos professores migram para
EaD, assumem as condições de estranhamento do seu trabalho e extensão
de jornada de trabalho, e com a utilização das TIC´s, este professor
realiza correções e orientações, muitas vezes de sua própria casa, por
meio de redes e ambientes virtuais de aprendizagem.
153
doutorandos. Dentre elas, pode-se destacar: o aligeiramento na formação
proissional; a intensiicação e precarização do trabalho docente; profundas
alterações das funções das universidades federais, que se transformam em
centros universitários, perdendo uma das principais características que
diferenciam e qualiicam este ensino: a indissociabilidade entre ensino,
pesquisa e extensão, o que decreta o im da autonomia universitária.
Machado e Bianchetti (2006) elucidam que no paradigma atual
da avaliação da CAPES, a meta é formar pesquisadores, os resultados
esperados estão além dos sujeitos capacitados, e eles próprios são medidos
pelo valor de troca que a “mercadoria” que são capazes de gerar conquista
no mercado internacional. O valor de um pesquisador está em leilão e se
mede pelo quanto “vende” seus produtos.
Discorrem ainda, que talvez, seja esse o sofrimento maior que a
era da produtividade que vivemos, atualmente, impõe aos pesquisadores,
numa lógica desumana que merece relexões e posições suicientemente
consistentes para pôr limites nos rumos que, em nome de supostos
progressos e sucessos internacionais, têm esquecido algumas perguntas
fundamentais: como, para quê e para quem queremos e devemos produzir?
Quais os destinos do conhecimento que geramos? Uma relexão de cunho
ético se impõe aos pesquisadores quanto à sua responsabilidade social,
cultural e nacional.
Kuenzer e Moraes (2009) relatam que as exigências concernentes
à produção acadêmica geraram um verdadeiro surto produtivista,
não importa qual versão requentada de um produto, ou várias versões
maquiadas de um produto novo, o importante é publicar. A quantidade
institui-se em meta e a avaliação qualitativa reclama a leitura de artigos e
livros, além de teses e dissertações. A qualidade da produção diicilmente
pode ser mensurada, principalmente em termos do impacto social e
cientíico dos produtos na qualidade de vida, na democratização social e
econômica da sociedade brasileira.
Bianchetti e Sguissardi (2009) questionam os principais
acontecimentos que marcaram o processo percorrido pelo modelo de
avaliação da pós-graduação implementado pela CAPES a partir do biênio
1996 – 1997 e consolidado nos triênios subsequentes (1998 – 2000 e
2001-2003), o qual aprofundou e solidiicou mudanças na concepção e
direcionamento das políticas de avaliação para tal nível de ensino.
Cury (2009) chama a atenção através de uma importante indagação:
como conseguir uma eiciência dos Programas de tal modo que sua
base seja um arranjo sob o signo de uma avaliação crítica, mensurável
e qualitativa sem ser submissa nem à busca de um sucesso próprio do
mercado competitivo e nem a uma versão corporativa que não reconheça
154
a necessidade de avaliação crítica, séria e compromissada, pautada numa
educação como bem público e não como serviço privado.
Horta (2009) airma que o Comitê Avaliador precisa compreender
mais as condições e o contexto de cada Programa, pois os Programas
estão em contextos socioculturais diferentes. O padrão do Centro-Sul do
país não pode e nem deve ser aplicado ao Norte-Nordeste. Nesse sentido,
ao analisar a política de pós-graduação o autor nas diversas regiões do
país, destaca muitos desaios nas regiões Norte-Nordeste que necessitam
ser superados: falta de cursos de qualidade em número suiciente nestas
regiões; o problema da ixação de doutores com dedicação ao ensino,
pesquisa e extensão, em especial, à pós-graduação; e a diiculdade de
fomentar uma política que possibilite a produção em forma de publicações
qualiicadas, atendendo aos critérios estabelecidos pela CAPES (Qualis
A e B Internacional) e essencialmente como meios de formação da
sociedade brasileira.
Outro autor que também traz estas relexões acerca da assimetria
regional é Robert Verhine. Ao discutir sobre “As recentes políticas da capes
e suas implicações para a área de educação”, o autor airma que o aspecto
mais evidente do problema de assimetria refere-se à grande disparidade
entre as regiões relativamente mais ricas do Brasil, o Sul e o Sudeste, e
as outras três regiões do país. Atualmente a Região Sudeste, que abrange
quatro estados e 42% da população brasileira, é responsável por 56% dos
mestrados e 66% dos doutorados no Brasil. Em contraste, a Região Norte,
composta de sete estados e 8% da população brasileira, conta com apenas
4% dos Mestrados e 2% dos Doutorados no país. Essa diferença apenas
retrata uma parte da história. Aproximadamente metade dos programas
de pós-graduação da Região Norte está localizada em um único estado,
o Pará, e, dentre eles, mais de 80% estão concentrados em apenas uma
instituição, a UFPA (Universidade Federal do Pará). Se considerarmos
apenas os doutorados, o grau de concentração é ainda mais agudo, uma
vez que 23 dos 24 programas de doutorado da região estão localizados
no Pará (14) ou no Amazonas (9). A gravidade dessa situação torna-se
ainda mais conspícua quando observamos a qualidade dos programas
disponíveis. Em todo o país, aproximadamente um terço de todos os
programas de pós-graduação é alocado nos níveis 5,6, ou 7. Na Região
Norte, dos 92 programas reconhecidos pela CAPES, apenas três foram
alocados nas faixas superiores da escala de avaliação, com dois programas
5 e um 6, todos na UFPA. Além disso, segundo o Diretor da CAPES, em
pelo menos algumas áreas, a tendência predominante na Região Norte
é, “para a maior parte dos programas, declinar, mais que ascender”.
155
Para Verhine (2008), no campo da Educação, a assimetria entre
regiões é forte, mas não tanto quanto no geral dos programas de pós-
graduação. 45% dos Mestrados e 55% dos Doutorados da nossa área
estão localizados na Região Sudeste (comparados com 56% e 66% para
todas as áreas em conjunto). Entretanto, na Região Norte há apenas três
programas reconhecidos, nenhum dos quais com oferta de doutorado.
Felizmente, a tendência de declínio que aparentemente caracteriza
programas em outras áreas não está claramente manifestada na área de
Educação. Os dois programas de educação da Região Norte, avaliados
no triênio passado (na UFMA – Universidade Federal do Maranhão e
na UFPA), obtiveram conceito 4 e vêm demonstrando melhorias dos
indicadores-chave nos anos recentes. Por estes motivos, ele advoga uma
postura pró-ativa por parte da CAPES no fornecimento de orientações aos
programas e instituições situadas nas regiões mais pobres do país.
Esta questão se torna importante de ser analisada, tendo em
vista a necessidade de uma formação qualiicada, compreendida aqui
como formação omnilateral, de um desenvolvimento total, completo,
multilateral em todos os sentidos das faculdades de desenvolvimento
humano. Na compreensão de um programa que se debruce efetivamente
para os reais problemas desta região e perspective o seu desenvolvimento
social, econômico e cultural.
Contudo, Machado e Bianchetti (2006) elucidam que no paradigma
atual da avaliação da CAPES, a meta é formar pesquisadores, em que os
resultados esperados estejam para além dos sujeitos capacitados, uma vez
que eles próprios são medidos pelo valor de troca, sendo considerados
“mercadorias”, capazes de gerar conquistas até mesmo no mercado
internacional, pois o valor de um pesquisador está em leilão e se mede
pelo quanto “vende” seus produtos.
A penetração da lógica taylorista, controle dos corpos na produção
cientíica da pós-graduação Stricto Sensu brasileira, uma vez que os
princípios do taylorismo emergem na atualidade de maneira extremamente
centralizadora e autoritária, pautando-se no aumento da produtividade do
trabalho com bastante “economia de tempo” (ideologia da produtividade),
no controle, na vigilância do trabalhador, na padronização das formas de
produzir e na avaliação da produtividade em que cada movimento necessita
ter um tempo ideal de duração, sendo premiados os mais produtivos e
punidos os “indolentes”; verdadeiras regras modernas de controle social
onde se tenta transportar modelos disciplinares tradicionais oriundos das
instituições militares objetivando a fabricação de indivíduos docilizados,
submissos e produtivos, sendo controlados em suas atitudes, e assim perdem
sua autonomia e são destituídos de valores humano-sociais, políticos
e culturais voltados a criticidade e emancipação dos corpos/sujeitos.
156
Outro fator de intensiicação do trabalho do professor no ensino
superior está em quando este passa a atuar na educação a distância,
dentro de um processo de expansão do ensino superior público, em que a
universidade pública vê a cada momento maior crescimento dos cursos a
distância e pouca preparação do professorado.
Mas o que evidencia maior expansão da EaD é a implantação de
programas, como a UAB3 nas universidades federais e demais programas
semelhantes nas universidades estaduais em todo território nacional.
No catálogo de apresentação da UAB, até 2010, previa-se o
estabelecimento de mil polos estrategicamente distribuídos no território
nacional. E até 2013, amplia sua rede de cooperação para alcançar a
totalidade das instituições brasileiras e atender a 800 mil alunos. (CAPES,
2013, p.1)
Pelo Censo da Educação Superior de 2011 há uma estimativa
de 105.850 matrículas de cursos na modalidade EaD nas instituições
públicas em todo país, um número bastante signiicativo de ingressantes.
Em comparativo com o número de vagas no mesmo ano, nas diferentes
categorias administrativas das IES e organização acadêmica. Contávamos
com 956.741 vagas na modalidade presencial para 1.224.760 vagas para
os cursos na modalidade a distância.
No âmbito das universidades, a implantação da EaD escancara
um processo de intensiicação e desqualiicação do trabalho e de uma
supostamente nova categoria de trabalhadores que são os professores.
A intensiicação se dá nas formas e condições de trabalho. Ademais, o
professor da EaD é marcado pelo grande contingente de alunos que estão
sob sua orientação. Estes alunos, atraídos por propostas de realizarem a
graduação, cursos de complementação e pós graduação - latu sensu, em
curto tempo, em baixos custos e sem ter que frequentar a universidade
diariamente, aderem a essa modalidade de ensino.
Contudo, ainda para este proissional, surgem novas
“nomenclaturas”, pois boa parte dos responsáveis por esse tipo de
ensino, sequer tem direito a status de professor. São chamados de
“tutores” (conteudistas ou presenciais), “orientadores”, “coordenadores”,
“facilitadores”. No contexto da EaD, esvazia-se o sentido entre o ensino,
pesquisa e extensão, ao mesmo tempo em que se amplia as vagas na
universidade pública, se amplia as vagas em instituições privadas, ao
mesmo tempo piora as relações de contratação desse professorado que
passa por regime de substituição, temporário, estagiário, bolsista etc.
O que determina a posição desses proissionais da EaD na
cadeia produtiva como subcontratados não é a formação, a qualiicação
3
Universidade Aberta do Brasil
157
proissional ou a titulação acadêmica que estes possam ter, mas como
airma Kuenzer (2007), as demandas do processo produtivo que
combinam diferentes necessidades de ocupação da força de trabalho, a
partir da tarefa necessária a realização da mercadoria.
Considerações inais
158
Referências
Artigos
Documentos e Legislação
Livros
160
CAPÍTULO XI
Introdução
3
As informações presentes nestes dois primeiros parágrafos foram retiradas da biograia de Olga
escrita por Fernando Morais (MORAIS, Fernando. Olga. 16ª ed. São Paulo: Companhia das Letras,
1994).
162
Holocausto se tornando um explícito objeto da cultura
de massa, as formas de representações literárias e
artísticas foram expandidas. Nesse momento, por
exemplo, quem passa a representar a Shoah é a segunda
geração (NASCIMENTO; SANTOS, 2012, p.98).
A carta
163
Berlim, 24/09/1937
Meu querido Carli!
Há alguns dias recebi tua carta de 18 de agosto e estou muito
triste porque tua carta de 31 de julho não me chegou às mãos.
Quem sabe se ainda a receberei. Um pedaço de papel pode trazer
tanta felicidade! Tuas queridas palavras me aquecem o coração.
Espero que entrementes tenhas recebido as minhas cartas de 28 de
julho, 9 de agosto, 22 de agosto e 7 de setembro, contendo grande
quantidade de notícias da nossa ilhinha.
Felizmente a Anita ainda pode permanecer comigo. Ainda
recentemente, o médico da prisão desaconselhou a separação,
tendo em vista que ainda estou em condições de amamentá-la.
Jamais pensei possuir tal faculdade de “vaca leiteira”. Podemos
nos felicitar com isso, pois até agora a pequenina não teve um
resfriado. Alegra-me saber que segues a curva do peso da
pequenina. Atualmente ela pesa 9.600 gramas. No que diz respeito
ao aumento de cada semana, imagina que, durante um trimestre, o
bebê aumentou 200 gramas por semana e, em três trimestres, 100
a 150 gramas, e agora ela aumentará menos. As crianças devem
pesar 10 quilos com um ano. Como vês, ela terá mesmo mais do
que isso. Podes, portanto, estar tranquilo a esse respeito.
Eu estava menos tranquila quanto aos seus ossos, pois ela
pôde sentar-se bastante tarde. Mas agora o seu desenvolvimento
transcorre muito depressa. Ela ica em pé sozinha em sua caminha
e corre (evidentemente de quatro). Quer sempre estar de pé e,
assim que tento fazê-la deitar, se levanta. Não se pode mais tirar
os olhos dela um minuto. Engatinha pelo chão por todos os lados
e ontem tentou seus primeiros passos segurando-me pela mão. Eu
chorei de alegria. A im de sustentar seus pés, comprei um par de
sapatos de couro, seus primeiros sapatos de verdade.
No que diz respeito à sua linguagem, o “gugel-gugel”
desempenha agora um grande papel. Então ela faz uma boquinha
pontiaguda e sopra como se quisesse assobiar. Quando quer ser
carinhosa, diz os “ai-daí-daí” e põe seus braços em volta do meu
pescoço. Não estão certo que ela te chame “Ba-ba”, mas não
sabemos dizer “p”. Sobretudo, isto demanda tempo. A Lyginha
quisera, por exemplo, que ela dissesse “Titia”; ela deve também
conhecer o teu retrato. Mas é ainda muito cedo; e, além disso, te
direi que sou contra tais métodos de adestramento, com os quais,
por exemplo, faz-se sofrer o cachorro “Stroblim” – lembras-te?
Quanto a cor de seus cabelos, eu mesmo não sei direito qual
virá a ser. Recebestes a ultima mecha, mas, quando todos os
cabelos estão juntos, mais parecem castanhos, mas mais claros
que os meus! De resto, tem no meio da cabeça um grande cacho
e sobre as orelhas também cachinhos. Como durante muito
tempo não conseguia manter-se sentada, os cabelos da nuca não
cresceram e ela tem uma nuca rala; às vezes a chamo também de
“Affenpapo”. Mas agora os cabelos começam também a nascer aí.
Tu perguntas como vivemos. O melhor é que eu te descreva um
164
dia na prisão. De manhã, às 5 ou 6 horas, a Anita se acorda e
começa a brincar. Até as 6 horas não me ocupo dela, pois não
quereria mais icar em sua cama. Às 6 horas, dou-lhe de mamar.
Depois disso tenho muito que fazer, pois às 7 horas devo estar
pronta e ter lavado o chão de minha cela. Às sete e meia tomo
o café e, nesse momento, a Anita dorme durante uma meia hora
ou uma hora. Aproveito esse repouso para ler os jornais, a menos
que tenha roupa para lavar ou outra coisa para fazer. Às 9 e meia
a pequenina já tomou banho e come uma segunda vez. Às dez e
meia vamos ao pátio. Se faz bom tempo, a Anita ica lá fora até
as 11 e meia e dorme, enquanto eu devo voltar para a minha cela
ao cabo de 45 minutos. Então almoço e, até a hora de receber de
volta a pequenina, leio ou faço um trabalho manual. Às 2 horas, a
Anita almoça e brinca. Às vezes, ela ainda dorme uma meia hora.
Às 5 e meia, recebo minha refeição da tarde e, entrementes, dou
ainda de mamar à pequenina. Fico me distraindo com ela até às 7
horas e a ponho na cama para dormir. Como já é noite a essa hora
e não disponho de iluminação, não me resta outra coisa a fazer do
que “fazer bons sonhos” e adormecer. Às 10 horas dou ainda de
mamar à pequenina (sempre no escuro) e as duas adormecemos até
o dia seguinte pela manhã. Posso assegurar-te que a pequenina me
ocupa de tal maneira que tirando os jornais não consigo ler mais
nada. Além disso, enviaram-me uma lã tão bonita, que emprego
muito tempo tricotando. É uma ocupação muito repousante: ica-
se sentada, tricota-se e pensa-se em todo o tipo de coisas ou em
nada, e faço lindas coisas para a pequenina. Já lhe iz um pullover
e um longo vestido combinando com ele.
Tu me perguntas se já pensei no que seria a nossa vida a três.
Imaginas bem, meu querido, que esse é o tema principal de meus
“lindos sonhos” noturnos. Nós teríamos sido muito felizes, mas
isso não devia ser. Tu pensas que a Mamãe me teria cuidado e que,
em retribuição eu também me teria ocupado dela, pois ela teria
realmente merecido um pouco de repouso e de felicidade.
É uma grande tranquilidade para mim saber que a tua situação
relativamente melhorou. Para mim será o contrário, se me tirarem
a pequenina, pois algumas considerações, de que me beneicio,
na medida em que amamento minha ilha, não terão mais razão
de ser.
Mas não te preocupes com minha saúde; tirando uns pequenos
achaques, não vou mal. No que se refere às tuas leituras sobre
Napoleão, recordo-me das cartas à sua mulher, que lemos juntos.
Quando li as cartas de Goethe à Mme. Von Stein, pensei muito
naquele tempo. Quanta gentileza de sua parte enviar-me a
tradução de “Heidröschens”! está bem feita e, ainda que a língua
portuguesa seja mais sonora de que a nossa, esses poemas de
Goethe, que são também canções, ao menos para mim, soam
melhor em alemão. Mas foi uma boa ideia para enriquecer meu
vocabulário em português e, após tanto tempo, foi a primeira
vez que vi tua letra. De resto icarias admirado com os meus
165
progressos em português que iz na prisão no Brasil. No inal, eu
falava quase correntemente. Para teus estudos de alemão, estou te
mandando uma canção infantil que, segundo penso é tão antiga
quanto a época a partir da qual as mães cantam para seus ilhos,
e que a pequenina também ouve com prazer. Tu me dirás se a
compreendeste!
A Lygia escreva que tomas mate. Na “Casa de Detenção”,
eu também era uma grande tomadora de mate. O Agildo Barata
fez o possível para isso e me mandou utensílios necessários.
Lamentavelmente, Carmen Guioldi icou com tudo isso, quando
fui transferida para o hospital. Quisera saber de ti se tens te
barbeado ou estás usando barba. Quanto aos meus cabelos, estão
tão compridos, que os uso amarrados. Mas devo terminar. Abracei
a Anita por ti, mas penso que gostaríamos muito mais de receber
os beijos pessoalmente, pois o papel é bem seco.
A pequenina te diz “ai-dai-dai” no ouvido e eu te abraço de todo
o coração. Tua
Olga.
Aqui, temos uma das poucas alusões de Olga sobre a vida na prisão.
É curioso pensar em como ela escreve suas cartas. De forma geral, não se
nota que sua escrita esteja inserida em um contexto de guerra – tal como
compreendemos, comumente, essa experiência –, ela parece estar alheia
ao fato de ser uma judia, comunista, presa pelos nazistas. Um leitor,
sem estas informações, que tivesse acesso à carta em questão, poderia
entender que Olga era uma mulher livre que estava passando um tempo
em uma colônia de férias. Sua escrita, tão desgarrada da realidade, chega
a incomodar, pois sabemos que a realidade era completamente diferente.
Mesmo ciente de que permaneceria na prisão apenas durante o tempo de
amamentação da ilha e, depois, seria levada aos campos de concentração,
sua postura nas cartas é de indiferença a isso.
Primo Levi (1988), em É isto um homem?, relata sua experiência
no campo de concentração de Auschwitz, desde o dia em que foi preso
pelos alemães até o im da Guerra e sua libertação. Aqui, Levi, narra:
166
mães não queriam separar-se dos ilhos; responderam:
“Está bem, icar junto com o ilho”. Sempre com a
pacata segurança de quem apenas cumpre com sua
tarefa diária (LEVI, 1988, p.21).
167
um valor muito maior do que possa transparecer. Um simples pedaço
de papel vem carregado de signiicados tão importantes que proporciona
felicidade e aquece o coração, mesmo o coração de uma mulher que
está a milhares de quilômetros do marido, vivendo sob o intenso frio
da Alemanha, que aqui interpretamos não apenas como circunstância
climática, mas também a frieza nas relações interpessoais, em razão da
ilosoia nazista de puriicação da “raça” alemã.
A carta segue com apontamentos sobre a ilha do casal, o fato de
ainda permanecer com a mãe, sua saúde e seu desenvolvimento. Sigmund
Freud (1996) diria, em “sexualidade feminina”, que “encontramos a
criança ternamente ligada ao genitor do sexo oposto, ao passo que seu
relacionamento com o do seu próprio sexo é predominantemente hostil”
(FREUD, 1996, p. 239). No caso de Anita, é interessante observar que
essa relação se estabeleceu de forma diferente. Nosso objetivo não é
desenvolver uma discussão que perpasse a psicologia, mas, sim, reletir
sobre o desenvolvimento de uma criança que, até os dois anos de idade,
só conviveu com a mãe, dentro de um cárcere nazista, portanto, tinha
apenas a ela como ideia de outro. É possível que isso justiique a insistente
referência de Olga em relação à ilha, além do mais, Anita representava a
união de um casal que não podia mais estar junto.
A carta também descreve a rotina de Olga e sua ilha na prisão.
A forma como o dia delas é sistematizado nos leva a reletir sobre a
desumanização das pessoas. Primo Levi escreve:
Estamos convencidos de que nenhuma experiência
humana é vazia de conteúdo, de que todas merecem
ser analisadas; de que se podem extrair valores
fundamentais (ainda que nem sempre positivos)
desse mundo particular que estamos descrevendo.
Desejaríamos chamar a atenção sobre o fato de que
o campo foi também (e marcadamente) uma notável
experiência biológica e social. Fechem-se entre cercas
de arame farpado milhares de indivíduos, diferentes
quanto à idade, condição, origem, língua, cultura e
hábitos, e ali submetam-nos a uma rotina constante,
controlada, idêntica para todos e aquém de todas as
necessidades; nenhum pesquisador poderia estabelecer
um sistema mais rígido para veriicar o que é congênito
e o que é adquirido no comportamento, do animal-
homem frente à luta pela vida (LEVI, 1988, p.127-
128).
169
(1988, p.22). A menina, de Milão, era ilha do engenheiro judeu, Aldo
Levi, “uma criança curiosa, ambiciosa, alegre e inteligente” (1988, p.22);
durante a longa viagem à Auschwitz, em meio ao vagão lotado, seus
pais tinham conseguido dar-lhe apenas um banho, “em água morna que
o degenerado maquinista alemão consentira em tirar da locomotiva que
nos arrastava para a morte” (1988, p.22). Emília foi morta na câmara de
gás simplesmente por descer do vagão pelo lado errado. Segundo Primo
Levi, chegando ao destino inal, as portas dos dois lados dos vagões
eram abertas, sem qualquer tipo de orientação, aqueles que desciam por
determinado lado eram levados aos campos para trabalhar, os outros,
como Emília, eram levados diretamente à câmara de gás.
Anita foi uma das crianças, ilhas de judeus, que teve a sorte
de escapar viva. No seu caso, isso aconteceu graças à campanha de
mobilização internacional, promovida por Leocádia, mãe de Prestes, para
tentar garantir o direito da nora de ter a ilha no Brasil, visto que o pai era
brasileiro. Tendo esse direito negado, a reivindicação passou a ser a de
que Olga permanecesse com a ilha durante o tempo de amamentação e,
depois, a criança fosse entregue à avó: algo que, por sorte, conseguiram.
Outras crianças tiveram que ser entregues, não nas mesmas
circunstâncias. No livro em quadrinhos Maus, Art Spiegelman (2009)
dá vida a animais que narram a história real de sua família, desde o
início da perseguição nazista aos judeus até a libertação dos campos de
concentração. Durante essa longa trajetória, o personagem Vladek, pai de
Art, conta que ilhos de judeus foram entregues a famílias não judias para
tentar garantir a vida de seus ilhos, uma vez que pressupunham, diante
da realidade de perseguição que viviam, que seriam presos a qualquer
momento. O próprio Richieu, ilho mais velho de Vladek, foi levado por
um judeu inluente para Zawiercie; no entanto, anos mais tarde, a Gestapo
acabou invadindo o gueto e quando a nova mãe de Richieu percebeu que
seriam levados para o campo de concentração, matou as crianças que
estavam com ela e depois se matou.
Tendo feito tais ponderações, retomemos a carta. Acreditamos que
um dos motivos que levavam Olga a tratar tudo com muita tranquilidade
foi a esperança de um futuro e provável reencontro com Prestes e a
possibilidade de, junto dele e da ilha, formar uma família. Esses, talvez,
seriam os temas de seus sonhos, como comenta no trecho: “Tu me
perguntas se já pensei no que seria a nossa vida a três. Imaginas bem, meu
querido, que esse é o tema principal de meus ‘lindos sonhos’ noturnos”
(BENARIO. [Carta] 24 set. 1937). Eram tais sonhos que lhe davam ainda
esperança. Sobre esperança, Maurice Blanchot comenta:
170
A esperança é esperança verdadeira pelo fato de
pretender dar-nos, no futuro de uma promessa, aquilo
que é. Aquilo que é, é a presença. Mas a esperança
é tão somente esperança. Existe esperança se ela se
relaciona longe de toda a apreensão presente, de toda a
possessão imediata com aquilo que está sempre por vir,
e que talvez não virá jamais; e a esperança proclama
a vinda esperada daquilo que não existe ainda senão
como esperança (BLANCHOT, 2010, p.84).
Era, ao que parece, o sentimento daquilo que está por vir que
movia o coração dessa mulher que, abruptamente, se viu sozinha, apenas
com a ilha que lhe seria retirada muito em breve, em uma realidade de
cárcere. Sonhar esperançosamente com o futuro, esperar aquilo que não
virá, era a situação de Olga ao escrever, não somente esta primeira carta
que estamos analisando, como todas as suas outras correspondências que,
a cada dia, mostram-se mais carregadas da certeza de que seus sonhos não
passam de esperança.
É interessante reletirmos, ainda, sobre a forma como Olga escreve,
valorizando o fato de que Prestes apresenta progressos em sua situação no
cárcere, e consciente de que a situação dela própria, ao contrário, tendia a
piorar. Como lemos no seguinte trecho:
171
casada em pleno século dezoito. No caso de Olga e Prestes, o amor era
proibido pela distância, mas também resistiu a este obstáculo e aconteceu
devido aos quatro anos de correspondência. Por esta ligação, presumimos
que ela tenha se remetido ao tempo em que esteve com Prestes lendo as
cartas de Napoleão.
O estudo das epístolas de Olga Benario, no contexto de guerra no
qual estão inseridas, faz-nos pensar sobre a importância do que Rosani
Ketzer Umbach (2012) chama de “A escrita como imortalização da
memória” (UMBACH, 2012, p.217). A autora assinala que, no antigo
Egito, a escrita era considerada “o meio mais seguro de conservação da
memória” (2012, p.217), por meio dos estudos que faziam das escrituras
do papiro, perceberam que, mesmo que suas grandes construções fossem
arruinadas pelo tempo, o papiro resistiria e continuaria sendo estudado,
de modo que ele imortalizaria a memória. Entretanto, posteriormente,
passaram a considerar a escrita suporte da memória, uma espécie de
veículo, que acabou se tornando, também, destruidora da memória,
uma vez que, “ixada pela escrita, não necessitava mais ser ativada,
operacionalizada” (2012, p.217).
O fato é que, quando transformamos a memória em algo escrito,
como a carta, que estabelece o princípio da troca, passamos a lidar com
a memória como transmissão de experiências; e tal transmissão implica
uma série de fatores que nos levam a reletir sobre a real veracidade das
memórias narradas, como nos apresenta Umbach:
172
própria não tivesse consciência de sua situação, na tentativa de recriar a
realidade para que fosse mais fácil lidar com ela mesma.
Nesse sentido, Umbach ensina que, no intervalo de tempo entre
a lembrança e a escrita, existe um processo de transformação, “sendo
inerente à psicomotricidade do rememorar que lembrança e esquecimento
sempre icam inseparavelmente engrenados” (2012, p.220). Assim,
não se consegue fazer a ligação entre experiências vivenciadas e a sua
narração, o que nos leva a perceber que os conteúdos da memória são
transformados. Pensando o caso de Olga, as cartas eram, possivelmente,
escritas à noite, depois de cumprir com todas as obrigações rotineiras da
prisão; dessa forma, ao resgatar o que passou, não somente naquele dia,
mas nos últimos dias, desde suas condições de saúde, o desenvolvimento
da ilha, até as obrigações do dia a dia, alguns acontecimentos foram de
fato esquecidos. Lembrando, mais uma vez, que devemos ligar a escrita
de Olga à memória de repressão, o que intensiica o fato de que alguns
acontecimentos sejam esquecidos, quase como um mecanismo de defesa
que a livraria de sofrer com determinadas lembranças.
Considerações inais
173
vida. Segundo Roland Barthes (1981), em Fragmentos de um discurso
amoroso, a carta é a igura que “visa à dialética particular da carta de
amor, ao mesmo tempo vazia (codiicada) e expressiva (cheia de vontade
de signiicar o desejo)” (BARTHES, 1981, p.32). Assim, acreditamos,
se constroe também a epístola aqui analisada. Aparentemente, são
mensagens sem grandes informações ou signiicados, mas trazem muito
mais do que se vê escrito, elas signiicam pelo que pretendem dizer.
São capazes de transmitir, por meio de discussões literárias e políticas,
poemas e descrições do cotidiano, mensagens que reportam à realidade
de censura que as permeia e ao sentimento de amor que por ali perpassa.
Olga, ao que parece, encontrou, na troca de cartas, uma forma de
se manter, não apenas viva, mas lúcida, no sentido de continuar buscando
forças para resistir e não se entregar àquela realidade. Seus estudos e
leituras lhe garantiam, de certa forma, a orientação, sabendo entender o
contexto em que vivia, suas limitações e restrições. Com isso, percebemos
que o signiicado da escrita epistolar depende da intenção e do objetivo
que o missivista tem sobre ela, pois, como bem entende Silvina Rodrigues
Lopes (2003), “há cartas para tudo” (2003, p.135). Já para Peter Gay
(1999), tanto os diários quanto as cartas “testemunham os desejos e as
ansiedades, os prazeres e os traumas, a discórdia interior descoberta ao
escrever, provocando às vezes uma luta íntima” (1999, p.373). Assim,
as cartas colaboram para o acumulo de experiências narráveis, que são
fundamentais na construção da memória e da educação, se forem utilizadas
nas salas de aulas, poderão despertar os jovens para uma relexão que
notadamente a escola atual não valoriza.
Referências
174
LEVI, Primo. É isto um homem?. Trad. Luigi Del Re. Rio de Janeiro:
Rocco, 1998.
LOPES, Silvina Rodrigues. Na margem do desaparecimento. In: _____.
Literatura defesa do atrito. Lisboa: Vendaval, 2003.
MORAIS, Fernando. Olga. 16ª ed. São Paulo: Companhia das Letras,
1994.
NASCIMENTO, Larissa Silva; SANTOS, Michelle dos. Questões sobre
(auto)biograia: as modernas representações do holocausto em Maus, de
Art Spiegelman, e em Os emigrantes, de W. G. Sebald. Santa Catarina:
Outra travessia, 2012.
PRESTES, Anita Leocádia; PRESTES, Lygia Prestes (Org.). Anos
tormentosos: Luiz Carlos Prestes: correspondência da prisão (1936-
1945). 3 v. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
SPIEGELMAN, Art. Maus: a história de um sobrevivente. Trad. Antonio
Macedo Soares. São Paulo: Companhia das Letras, 2009.
TIN, Emerson. Cartas e Literatura: relexões sobre pesquisa do gênero
epistolar. Disponível em: <http://www.unicamp.br/iel/monteirolobato/
outros/Emerson02.pdf> Acesso em 15 jan. 2015.
UMBACH, Rosani Ketzer. Violência, memórias da repressão e escrita.
In: _____. Escritas da violência, vol. I: O testemunho. Rio de Janeiro:
7Letras, 2012, p.217-228.
175
DADOS SOBRE AUTORES
Eliseu Riscaroli
Possui graduação em pedagogia pela Universidade Federal de Mato
Grosso (1994), mestrado em Educação pela Universidade Federal de
Mato Grosso (1998) e doutorado em Educação pela Universidade Federal
de São Carlos (2007). Realizou estudos de pós doutorado na Universidade
de Coimbra com a temática Direitos Humanos LGBT, entre 2012 e 2013.
Docente ingresso por meio de concurso de provas e títulos na Universidade
Federal do Tocantins. Tem experiência na área de Filosoia, Fundamentos
Epistemológicos, Direitos Humanos e Gênero. Desenvolve pesquisa e
orientação de trabalhos com ênfase em educação e infância, sexualidade,
fundamentos da educação, gênero, trabalho e currículo. Participa da
REGGSILA - Rede de Estudos de Geograia, Gênero e Sexualidade Ibero
Latino Americana.
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Fabíola Andrade Pereira
Possui graduação em PEDAGOGIA pela Fundação Universidade do
Tocantins - UNITINS (2001). ESPECIALISTA em Administração e
Supervisão Escolar, pela Universidade de Amparo em São Paulo. É
MESTRE em Educação pela Universidade Federal da Paraíba (2008).
Atuou como docente do curso de Pedagogia do Campus de Miracema do
Tocantins. Atualmente é professora Assistente do Curso de Pedagogia da
Fundação Universidade Federal do Tocantins no Campus Universitário
de Tocantinópolis. Tem experiência na área de Educação, atuando
principalmente nos seguintes temas: Educação de Pessoas Jovens e Adultas,
Alfabetização e Letramento na EPJA, Educação de Idosos, Educação e
Envelhecimento. Atuou ainda como Coordenadora Pedagógica da UMA
- Universidade da Maturidade no período de 2009 a 2011 e no ano de
2013. Atua desde julho de 2014 na coordenação do curso de Pedagogia/
PARFOR no campus de Tocantinópolis. É doutoranda em Educação
vinculada à linha de pesquisa Educação Popular do PPGE - Programa
de Pós Graduação em Educação da Universidade Federal da Paraíba.
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Juscimar Maria Paula
Possui graduação em pedagogia pelo Instituto Luterano de Ensino Superior
de Itumbiara (1999), graduação em História pela Universidade Estadual de
Goiás (2003), especialização em Docência Universitária, especialização
em Alfabetização e Mestrado em Educação pela Universidade Federal
de Uberlândia (2014). Atualmente é coordenadora pedagógica da
Prefeitura Municipal de Itumbiara - Secretaria de Educação e professora
titular da Faculdade Santa Rita de Cássia. Tem experiência na área de
Educação, com ênfase em História da Educação, atuando principalmente
nos seguintes temas: História da Educação, prática pedagógica, lúdico e
ensino/aprendizagem, identidade cultural, diiculdades de aprendizagem
e análise fílmica e relação da epistemologia do cinema com as outras
áreas (história, ilosoia, cultura e educação).
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do Colégio INEI-COC, na cidade de Uberlândia. É mestre em Teoria
Literária pela Universidade Federal de Uberlândia. Doutoranda em
Estudos Literários na Universidade Federal de Uberlândia. Trabalha como
Assessora Pedagógica de Língua Portuguesa na Secretaria de Educação
do município de Ituiutaba-MG.
Neil Franco
Graduado em Licenciatura Plena em Educação Física, Mestre e Doutor
em Educação, cursos concluídos em 1994, 2009 e 2014, respectivamente,
na UFU. Fundamentado nas teorias pós-críticas, investigo as relações
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estabelecidas entre Educação, gênero e sexualidade. Atua no Curso de
Educação Física da UFMT/CUA, mais especiicamente nas áreas de Dança
e Ginástica Geral, desenvolvendo, além do conteúdo disciplinar, projetos
de extensão e de pesquisa nesses campos de conhecimento. Colabora,
ainda, com as disciplinas de Estágio Supervisionado na Licenciatura e no
Bacharelado, Natação e Métodos e Técnicas de Pesquisa.
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