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O CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO NO

DIVA DA HISTORIA
Índice
1. Evoluçao do Contencioso Administrativo em Portugal.
1.1. Traumas que originam o nascimento do contencioso administrativo.
1.1.1 Primeiro trauma.
1.1.1.1 Controversia Dicey-Hauriou.
1.1.2 Segundo trauma.
1.2 Evoluçao da Justiza Administrativa.
1.2.1 Primeiro momento: Pecado original: Séculos XVIII e XIX.
1.2.2 Segundo momento: Batismo: Do século XIX para o XX.
1.2.3 Terceito momento: Crisma: Finais século XX.
1.2.3.1 Contitucionalizaçao do CAT: Portugal, Francia, Reino Unido e
Italia.
1.2.3.2 Europeizaçao do CAT.
2.Evoluçao do Contencioso Administrativo em Espanha.
3. Comparaçao entre ambos os processos Espanhol e Português.
EVOLUÇAO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO EM PORTUGAL
Antes de comezar é importante definir o que se entende por contencioso administrativo;
quando falamos de contencioso administrativo estamos a falar do estudo do processo
administrativo, isso é, as regras de conducta a observar pelos sujeitos processuais na
propositura e desenvolvimento da sequência encadeada de atos jurídicos (ação), cujos
termos correm perante uma estrutura específica de tribunais (Tribunais
Administrativos).
De acordo com o professor catedrático Mário Aroso de Almeida ``sao aplicados ao
Processo administrativo todo um conjunto de conceptos fundamentais que, embora
tenham sido historicamente elaborados no âmbito e por referência ao Processo Civil, se
devem hoje entender como conceitos fundamentais da Teoria Geral do Processo´´.
Entrando propiamente no tema a falar, vamos facer uma analise do contencioso
administrativo no diva da historia para comprender os condicionantes que tem devido ao
seu nascimento traumático.
A figura da administraçao acompanha todas as figuras históricas do Estado, mas
soamente podemos falar de direito administrativo trás a Revoluçao Francesa do ano
1789, tras o surgimento da separaçao de poderes no ambito do constitucionalismo
moderno.
Como ja foi apontado anteriomente, o nascimento do contencioso administrativo e
devido a uma serie de traumas:

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PRIMEIRO TRAUMA
O primeiro dos traumas que orixinan o direito administrativo surge pela via
jurisprudencial da atuaçao do conselho de Estado.
O Direito Administrativo não foi decretado por via legislativa, se nao que surgiu como
uma resposta a necessidades históricas. Tem uma profunda importancia que se
mantiveram os Parlamentos (Tribunais compostos por nobreza) em que os
revolucionários não confiavam (já se opunham ao rei, ir-se-iam opor a esta nova ordem
social com as suas ideias de classe dominante) pois não iriam reconhecer os direitos de
todos os cidadãos. Por isso criam uma nova estrutura em que coloca os litígios da
Administração com civis. Assim surge o primeiro o direito processual/adjetivo e, da
jurisprudência, cria-se o direito material/substantivo – com as sucessivas decisões surge
um corpo de regras sólidas que se autonomiza.
Apos a Revoluçao Francesa do século XVIII os tribunais comuns ficam proibidos de
``perturbar´´ a Administraçao Publica, de modo que ficam proibidos de julgar a
Administraçao. Neste contexto os revolucionarios claman estar a facer uma divisao de
poderes devido à conceção de Montesquieu de que o poder judicial “julga os diferendos
dos particulares”; mas a realidade e que estao a fomentar a promiscuidade entre
administraçao e justiça.
Assim a administraçao comeza a autoanalizarse, pervendo a separaçao de poderes e
dando lugar ao processo de introspeçao administrativa.
CONTROVERSIA DICEY-HAURIOU
Em quanto o proceso de instrospeçao administrativa encontrase controvérsia Dicey-
Hauriou sobre os sistemas de controle jurisdicional da Administração Pública que trata
sobre a controvérsia jurídica entre inglês A. V. Dicey e o francês Maurice Hauriou
acerca de qual o melhor modelo de controle jurisdicional da Administração Pública.
Ao contrário do sistema francês, que prevê a existência de uma justiça administrativa
separada do Poder Judiciário e unida ao Executivo, o sistema britânico de jurisdição
única sujeita os agentes e órgãos da administração pública aos mesmos tribunais
comuns (courts of law) e ao mesmo direito comum em que são julgados os particulares
do país, sem qualquer privilégio, prerrogativa ou “poder exorbitante”.
Assim, no que respeita à separação de poderes, os britânicos adotaram uma
interpretação distinta da dos franceses e que está, por sua vez, mais em consonância
com o presente na formulação original feita por Montesquieu, onde o Judiciário tem
legitimidade para julgar os atos da Administração.
A controvérsia Dicey-Hauriou diz respeito a estes dois sistemas distintos, e engloba em
seu bojo outras questões acerca do Direito Público daqueles dois países. Passamos,
agora, a analisá-la.
Por um lado, Albert Venn Dicey (1835 – 1922), renomado constitucionalista inglês,
publicou em 1885 um de seus livros mais importantes, “Introduction to the Study of the

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Law of the Constitution”, em cujo capítulo XII desenvolve um estudo comparativo entre
os sistemas administrativos inglês e francês.
É um verdadeiro confronto, um duelo de opostos inassimiláveis: e opõem-se a própria
matéria do Direito Administrativo e a rule of law inglesa. Para Dicey, o Direito
Administrativo opõe-se diretamente à noção de igualdade de todos perante a lei, central
para o sistema jurídico inglês.
Por ora, importa-nos dizer que, para Dicey, não restam dúvidas: são sistemas
decididamente incompatíveis, antagônicos e representam diferenças que vão muito além
do meramente jurídico, abrangendo a própria cultura dos países envolvidos. Isto fica
ainda mais claro quando ele aponta o problema da terminologia: a própria expressão
“direito administrativo” – que se traduziria por “administrative Law” em inglês – “não
tem um equivalente exato em inglês”, segundo ele.
Tendo em vista o vigor do ataque, pode-se dizer que a resposta francesa até demorou.
Veio apenas duas décadas depois, da pena de Maurice Hauriou, um dos maiores
juspublicistas franceses de todos os tempos. Uma resposta que impressiona pela
elegância e engenhosidade.

Hauriou põe em causa um ponto – talvez mesmo O ponto – central da discussão iniciada
por Dicey: o de que o fenômeno do Direito Administrativo seria uma exclusividade
continental - sobretudo francesa - e sem correspondente na Inglaterra.

Hauriou parte do conceito de função administrativa, que consistiria em ``prover a


satisfação das necessidades de ordem pública e assegurar o funcionamento de certos
serviços públicos para a satisfação de interesses gerais e a gestão dos assuntos de
utilidade pública´´ . Segundo Hauriou, tal função é exercida por todos os Estados
modernos, o que nem todos têm – e aí reside, para ele, o equívoco de Dicey – é
o regime administrativo, que consiste, segundo Hauriou, no seguinte: ``todas as
funções administrativas aí existentes foram fortemente centralizadas e confiadas a um
poder executivo´´. É essa centralização das funções administrativas e sua submissão
jurídica à autoridade do executivo que caracteriza este regime.

Finalmente, Hauriou aponta que os sistemas inglês e francês não são os únicos
existentes.

Continuando com o primeiro dos traumas do contencioso administrativo, produce-se


uma confusão total em que o órgão decisor julgava os atos que tinha praticado; mesmo
com a criação do Conselho de Estado de Portugal continua a ser a administração a que
se julga a si mesma.

Por conseguinte, as consequências deste trauma e a demora até o Direito do


Contencioso Administrativo ser uma realidade que foi apenas no início do séc. XX,
concretamente a partir de 1976 quando os Tribunais Administrativos entram na
estrutura judicial pois até lá eram meramente “órgãos da Administração”.

De igual modo, em Portugal só a partir de 2004 os tribunais é que os tribunais


administrativos passam a ter poder de ordenar e condenar a Administração, por tanto
como é recente, ainda é pouco utilizado.

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SEGUNDO TRAUMA

O segundo trauma surge como Direito produzido pelo contencioso privativo da


Administração, salvaguardando os interesses da Administração.

Reconhece-se e a autonomia do Direito Administrativo e necessidade de criar-se um


ramo do Direito distinto do civil a traves da sentença de Agnès Blanco de 1873. Trata-se
dum caso no que um vagão de uma empresa pública de trabalho atropela uma criança de
5 anos em Bordéus e os pais recorrem ao tribunal que se declara incompetente para
julgar pois tratava-se de uma entidade pública e o “Código de Napoleão” apenas se
aplicava para pessoas iguais (civil).

Logo o presidente da câmara (primeira instância do contencioso administrativo) diz


mesmo que não há direito aplicável pois não está em causa uma decisão voluntária da
administração e sim uma operação material. Em conclusão o Tribunal de Conflitos
acaba por reconhecer que o caso tem de ser julgado num tribunal administrativo; no
entanto não há norma (pois tinham que ter as regras e princípios próprios que se
aplicavam só à Administração).

Esta situação do lugar a necessidade de criar legislação especial para proteger a


Administração Pública de forma a esta não estar sujeita à responsabilidade civil igual à
dos particulares.

Concluindo, devemos tratar as consequências deste trauma até aos dias de hoje. Em
primeiro lugar até 2004 fazia-se uma distinção entre gestão pública e gestão privada; em
segundo lugar o mesmo ano consagra-se no art. 4º ETAF que os tribunais
administrativos são competentes quando houver lugar a responsabilidade administrativa
e finalmente, em 2015 procurou resolver-se o problema do art. 4º ETAF dizendo que a
competência era sempre da justiça administrativa.

Em quanto o problema da distinção entre gestão pública e gestão privada, o artigo 1º da


Lei 67º/2007 utiliza a expressão “prerrogativas de poder público”, voltando à lógica da
gestão pública gerando problemas em quanto saber qual é o direito aplicável.
Evidentemente vários autores criticam esta lei, entre outros destaca Marcelo Rebelo de
Sousa que critica a lei, mas conforma-se e Vasco Pereira da Silva que critica a lei e
arranja uma solução ao referir “normas e princípios do Direito Administrativo”, a
referência aos princípios permite o controlo também das atuações de gestão privada
porque se diz no CPA que os princípios do Direito Administrativo se aplicam a toda a
atividade da administração, ainda que de gestão privada.

EVOLUÇAO DA JUSTIÇA ADMINISTRATIVA

Antes de falar do primeiro momento da evolução da justiça administrativa conhecido


como ``o pecado original´´ devemos ter em conta quatro circunstancias que marcaram
os traumas do Contencioso Administrativo e tributário. Em resumo são a separação de
poderes, o medo a aristocracia, a criação do conselho do rei (o medo dos tribunais leva a
que se crie este conselho que retira poderes ao juiz e dá-os à Administração) e a
continuidade das instituições (as pessoas que faziam parte do Conselho do Rei vão
continuar a fazer parte do Conselho de Estado).

Primeiro momento

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Segundo o Professor Vasco Pereira da Silva, a evolução do Contencioso administrativo
é caracterizada pela existência de três fases distintas. A primeira dessas fases é
denominada, pelo Professor, de “Pecado Original”.

No entanto existem mais duas fases, a do “baptismo”, caracterizada pela


jurisdicionalização do Contencioso Administrativo e a fase da “confirmação” do
Contencioso Administrativo em que se dá a constitucionalização e a europeização do
mesmo.
Quanto à fase do “Pecado Original”, inicia-se durante a Revolução Francesa e
caracteriza-se pela existência de confusão no seio dos poderes administrativos e
judiciais, sendo declarado pelos revolucionários franceses, com justificação no princípio
da separação de poderes, uma proibição aos tribunais judiciais de interferência na
Administração. Em vez da separação, aquilo que se gerou foi a confusão entre os dois
poderes devido ao sistema do Administrador-Juiz, sendo que o juiz é administrador e o
administrador é juiz.
É importante dizer que os revolucionários liberais tinham receio relativamente ao poder
judicial devido ao seu demasiado poder e hostilidade no Antigo Regime, sofrendo de
um sentimento geral de desconfiança quanto ao facto de o mesmo perturbar o bom
funcionamento da Administração Pública, isto é o que o Professor Vasco Pereira da
Silva chama “herança do Antigo Regime”.
Incluindo, o período do administrador-juiz durou bastante tempo, podendo ser
reconduzido a três fases distintas:
A primeira, de 1789 a 1799, em que o julgamento de litígios é remetido para a
Administração, originando-se uma situação de “isenção judicial” da Administração.
Com certeza não havia distinção entre quem atuava e quem julgava, pois era exatamente
o órgão ou o seu superior hierárquico que exercia essa função.

A segunda, entre 1799 e 1872, em que encontramos o sistema da “justiça reservada”, na


qual é criado o Conselho de Estado, ao qual incumbia o aconselhamento e a resolução
de litígios administrativos, emitindo pareceres que estavam sujeitos à homologação do
Chefe de Estado. Tratava-se de um instituto, segundo Napoleão Bonaparte, “meio-
administrativo, meio-judicial” pois juntava as duas funções. Naturalmente, sendo
consultivo, não podia ter a última palavra , logo o chefe de Estado tinha a última palavra
ao homologar os pareceres do Conselho de Estado.

A terceira, de 1872, até ao fim do período do “Pecado Original”, em que se cria um


sistema de “justiça delegada”, sendo que nesta as decisões do Conselho de Estado
deixaram se ser meros pareceres e se tornam definitivas, devido à “delegação de
poderes” do executivo. Mas não é aqui que nascem os tribunais administrativos, uma
vez que o Conselho de Estado ainda é um órgão da Administração. Há transformações,
mas ainda estamos no sistema do administrador-juiz; em primeiro lugar nada muda na
natureza do Conselho de Estado pois não há distinção orgânica entre a secção de
julgamento e a secção administrativa, tudo era atribuído ao mesmo órgão; em segundo
lugar vigora a teoria do “ministro-juiz”, o Ministro era a primeira instância do
Contencioso Administrativo, obrigando-o a decidir sobre a sua ação e só depois se
recorria para o Conselho de Estado marcando a realidade até aos nossos dias; em
terceiro lugar o meio processual para controlar as decisões da Administração é o
Recurso sendo a primeira apreciação jurisdicional de um ato pelo juiz; em quarto lugar
encontramos a delegação de Poderes, continua a considerar-se o Conselho de Estado
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como um órgão da Administração, pois a delegação de poderes é um mecanismo
estadista através do qual um órgão competente transfere a outro órgão administrativo
competente o exercício da função. E o órgão delegante não perde a competência,
podendo revogar a delegação ou substituir os atos jurídicos.
A mudança de” justiça reservada” para “justiça delegada”, veio introduzir uma
importante alteração na questão da autonomia do instituto do Conselho de Estado, no
entanto o paradigma mantém-se, bem como o sistema do administrador-juiz.
Em jeito de conclusão, podemos admitir que a separação de poderes nesta fase é uma
ilusão devido à ligação contínua, existente neste período, entre os poderes
administrativo e judicial. Esta promiscuidade existente pode ser compreendida como
uma relação indecorosa entre dois diferentes poderes, o de julgar e o de administrar.
Segundo momento
O segundo momento tem lugar no século XIX para o XX. Esta etapa e conhecida como
o batismo e é marcada por uma subordinação da administração ao direito.
Esta mudança deveu-se ao início do estado social e de uma administração prestadora,
administração que chamou para si novas funções, levando assim ao crescimento do
chamado aparelho administrativo e dos litígios administrativos. Esta etapa trouxe então
“uma transformação progressiva de normas e instituições surgidas para proteger a
administração, em instrumentos de garantia dos particulares” e a “transformação de
um quase-tribunal num verdadeiro tribunal”, ou self made courts como o Professor
Vasco Pereira da Silva os denomina. 
Do mesmo modo a Administração tem a possibilidade de escolha quanto à forma de
atuação mais adequada para reagir e tomar uma decisão de natureza administrativa
“passa-se da farda única do ato administrativo ao moderno pronto a vestir das formas de
atuação da Administração”.

Além disso deixa de haver primazia do ato da Administração e passa a que haja uma
escolha de como agir para satisfazer necessidades coletivas surgindo novas formas de
atuação numa partilha da realidade jurídico-administrativa.

A Administração não diz o Direito nem o define se não que usa o Direito como meio
para satisfazer as necessidades coletivas.

Durante esta etapa vai existir uma aproximação entre os sistemas administrativos
francês e britânico, em França esta evolução é denominada de “milagre”
por Prosper Weil, e é em muito devido à atuação do Conselho de Estado desde o
acórdão “Cadot” de 1889, que considerou este órgão como a primeira instância do
contencioso administrativo; até aqui havia apenas uma delegação de poderes de
julgamento, não uma verdadeira atribuição destes. Quer isto dizer que o “milagre” não
se dá tanto pelo facto do Estado se submeter ao Direito, mas sim no facto de uma
instituição que nasceu com o objetivo de proteger a administração do controlo dos
tribunais, se ter transformado num verdadeiro tribunal pela sua atuação.

Neste ponto a dois questões a destacar: a primeira que a Administração foi-se


transformando num sujeito de Direito igual aos outros e que os quase-tribunais passam a
ser verdadeiros tribunais, de jeito que começa por autonomizar-se em termos orgânicos
(dividindo as secções), depois em termos formais (aplicando regras do poder judicial) e
vão surgindo vários Tribunais com o poder de executar as suas decisões.

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Concluindo, em 1980 o Conselho Constitucional Francês reconhece que os Tribunais
Administrativos são autónomos e fundamentam essa concepção na lei da separação de
poderes de 1789.

De igual modo, no Reino Unido até ao final do século XIX não havia Direito
Administrativo e a administração subordinava-se ao common lá, sendo julgada por
tribunais comuns, esta realidade devia-se ao facto de o ordenamento britânico não ter os
traumas de infância do ordenamento francês, no entanto, com o estado social surgem os
chamados “tribunal”, que são tribunais administrativos com poder de execução de
decisões e de julgamento. O professor Vasco Pereira da Silva chama a esta criação
britânica ``senilidade precoce´´.

Além disso, surge despois uma Judicial Review, isto é, um meio processual para
apreciar atos administrativos e por fim um Administrative Court.

No caso da Alemanha a reconstrução pós-guerra do Estado de Direito deu origem à


constitucionalização da Justiça Administrativa destinada à proteção plena e efetiva dos
particulares, destacando a Lei fundamental de Bonn.

De igual modo, no resto dos países que receberam o Contencioso Administrativo por
lei, vão ser também transformados a traves da lei.

Terceiro momento

Com a crise do estado social nos anos 70 do século XX e com a chegada do estado pós-
social, houve a 3ª etapa da evolução, o denominado “crisma” caracterizada pela
reafirmação da natureza jurisdicional do contencioso administrativo, acompanhado da
respectiva dimensão subjetiva, destinada à proteção plena e efetiva dos direitos dos
particulares.

Nesta fase produzem-se transformações no Estado e uma forte reação contra o Estado
Providência. Por um lado, surgem novos direitos fundamentais como a ecologia, a
informática, a privacidade ou o patrimônio genético.

Por outro lado, o Estado Post-social trouxe consigo uma nova geração que inclui novos
direitos substantivos e novos direitos procedimentais e processuais, consagrando
direitos no domínio do Direito Administrativo como o direito de audiência ou o direito
de fundamentação.

Assim, surge um novo modelo de Estado regulador caraterizado por uma administração
agressiva (policia), uma administração prestadora (vida social e econômica), e uma
administração infraestrutura.

Por outras palavras, no modelo de Estado pós-social a Administração surge com novas
infraestruturas; a função administrativa é realizada, através de mecanismos cooperativos
e de colaboração, por uma multiplicidade de pessoas coletivas como a Administração
Pública e os particulares (multilateralidade), mesmo assim a realidade multilateral e que
os sujeitos na relação jurídica passam a ser todos os afetados pelas decisões.

A administração assume a dimensão privada, em vez de o Estado prestar ele próprio os


bens e serviços (a Administração não atua em todos os domínios), cria as

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infraestruturas, regula e legisla o modo de exercício de certo aspeto da função
administrativa.

Em quanto as constituições dos Estados modernos, estas vão consagrar um novo modelo
do contencioso administrativo (constitucionalização do contencioso administrativo),
plenamente jurisdicionalizado com um verdadeiro juiz (plenos poderes face à
administração) em que o contencioso administrativo está ao serviço dos direitos dos
particulares. Esta transformação vem de Alemanha que estabelece uma garantia de que
o Estado não ia intervir na vida dos cidadãos, podendo tornar-se uma realidade
totalitária.

Concluindo, esta última fase foi um importante e crucial momento da evolução do


contencioso Administrativo no que se confirma a natureza jurisdicional do contencioso
administrativo e há uma subjetivação do poder administrativo.

Dentro desta terceira fase podemos encontrar duas etapas: a constitucionalização do


CAT (Contencioso Administrativo e Tributário) e a europeização do CAT.

Constitucionalização do CAT

Começando por a primeira, no contexto ocidental se introduz na constituição um


modelo objetivo e subjetivo de Contencioso Administrativo. Neste modelo existia um
juiz pleno que pode condenar e dar ordens a administração não estando limitado a
anulação das decisões administrativas.

Por outro lado, neste modelo os particulares e a administração estão numa posição em
que estabelecem relações jurídicas paritárias, portanto há uma igualdade das partes no
Processo (identidade de posições processuais). É importante ter em conta que já não há
uma relação de poder e o particular tem direitos fundamentais (antes referidos) que
devem ser respeitados.

No entanto, esta igualdade em Portugal só acontece verdadeiramente em 2004 desde a


reforma de 1985 que já se falava em partes e já se estabelecia um princípio de
intervenção igual no processo, mas, a Administração ainda era tratada como uma
autoridade.

Em suma, o movimento de constitucionalização levou à tutela plena dos direitos dos


particulares, em que juízes protegem os seus direitos e as constituições vão impondo um
modelo de CAT que supera os traumas iniciais.

No caso de Portugal deve-se destacar os dois artigos, em primeiro lugar o art. 211º/3
CRP que dispo que os Tribunais Administrativos (integrando-se na lógica judicial)
julgam são relações jurídicas administrativas; e em segundo lugar o art. 268º/4 e 5 CRP
que trata o princípio da tutela efetiva e plena de todos os direitos.

No caso de Itália, a revisão Constitucional tem um papel decisivo do Tribunal


Constitucional (1998), por conseguinte a dualidade de jurisdições no seio da função
(teorização da distinção entre direitos subjetivos e interesses legítimos que depois deu
origem aquelas classificações tripartidas: direito subjetivo, interesse legitimo e interesse
difuso) deixa de existir.

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No caso de Reino Unido, a partir dos anos 70 os tribunais britânicos vão dizer que a
decisão pertence a um tribunal é um princípio geral de direito constitucional material
britânico. Também no Reino Unido, o controlo integral da administração passa a ser
uma realidade no sistema britânico e estabelece-se um mecanismo que tem um tribunal
especializado em razão da matéria, que é o “administrative court”.

Assim há um tribunal administrativo no Reino Unido que se ocupa da “judicial review”


de todas as decisões dos órgãos máximos e dos outros da administração; este tribunal
administrativo, passa a chamar-se assim nos finais dos anos 80, mas é um tribunal que
vem do chamado “tribunal do rei ou da rainha” que já existia desde do início século e já
controlava os atos do monarca com uma série de exceções.

Para finalizar, no caso de Francia, o contencioso mudou constitucionalmente a traves


das decisões do Conselho Constitucional francês.

Europeização do CAT

A União Europeia (UE) vem introduzir uma nova dimensão na superação dos traumas
iniciais passando a ser a principal fonte de Direito Administrativo produzindo conjuntos
de normas que o vêm modificar e uniformizar.

Em primeiro lugar, criou um sistema jurídico próprio que se impõe a todos os Estados-
membros e integra o Direito desses mesmos Estados-membros, assim traz um conjunto
de princípios essenciais na Europa em matéria de separação de poderes e garantia de
direitos fundamentais.

Em segundo lugar, criam-se estruturas administrativas a título europeu, que integram as


estruturas nacionais e aplicam o Direito europeu. Estas estruturas podem analisar-se
desde o ponto de vista da realidade dos tribunais (ponto de vista jurisdicional), desde o
ponto de vista do direito legislado e desde o ponto de vista da integração horizontal.

Em quanto as transformações que decorrem a atuação dos tribunais o Tribunal de


Justeza da União Europeia vem dizer que de um lado tem de estar a administração e do
outro a justiça, não sendo possível passar de uma para a outra. Produzem-se a
condenação ao tribunal de Luxemburgo e através desta condenação obriga-se a
mudança do sistema francês e de todos os outros que tinham Conselho de Estado.

Podemos afirmar que não há nenhum pais europeu que não tenha feito uma reforma do
Contencioso Administrativo, alargando os poderes do juiz e estabelecendo a tutela
cautelar, esta e a lógica da europeização. No caso de Portugal a reforma portuguesa de
2004 está associada a reformas europeias que reiterando o dito anteriormente tiveram
lugar em todos os países da UE que começam em 1996 no Reino Unida e acabam em
2010/2011.

Por outro lado, desde o ponto de vista do direito legislado, a europeização influenciou à
noção de transformação da administração, bem como os atos administrativos de hoje já
não têm de ser praticados por órgãos administrativos e podem ser entidades públicas ou
privadas.

As relações jurídicas administrativas transformaram-se em multilaterais, sendo uma das


transformações do Estado pós-social, ao terem uma multiplicidade de destinatários; já
não é apenas aquele que é referido expressamente no ato, mas sim todos aqueles que são
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afetados pelo ato são sujeitos da relação multilateral. Essa realidade vem conduzida
devido á legitimidade que foi alargada polo contencioso.

Por último lugar, a integração horizontal significa que os atos administrativos de um


Estado-membro sejam reconhecidos nos outros, reconhecimento que tem também
dimensão jurisdicional.

EVOLUÇAO DO CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO EM ESPANHA

No Antigo Régime antes da Revolução Francesa não existia divisão de poderes e por
tanto não existia uma clara distinção entre autoridades administrativas e judiciais o que
quer dizer que não existia distinção entre o poder administrativo e o poder judicial.

No último momento do Antigo Regime (chamado` `despotismo ilustrado´´) aparece o


precedente do que hoje e a administração pública, foi dotada de uns poderes
jurisdicionais especiais para não se someter aos tribunais ordinários e poder resolver
duma maneira mais clara os litígios particulares.

Em consequência, coa Revolução Francesa implantou-se o Estado Constitucional


Moderno e num primeiro momento aplicou-se uma concepção de divisão de poderes
muito rigorosa, de tal maneira que se proibiu aos tribunais ordinários de justiça tratar os
atos do poder executivo e da administração, de tal modo que o poder executivo não
podia influir no poder judiciário e ao poder judiciário influir no poder executivo.

Com efeito os controlos dos atos da administração foram atribuídos a própria


administração a traves dum sistema que foi chamado ``jurisdición retenida´´. Esse
controlo foi levado a cabo em duas fases:

A primeiras das fases foi por via jerarquica interna, de tal modo que as decisões dos
órgãos administrativos podiam recorresse ante o órgão superior jerarquico.

A segunda das fases caracteriza-se por a possibilidade de acudir ante órgãos


especializados de caráter colegiado que atuavam com certa autonomia respeito dos
órgãos da administração ativa. Esses órgãos de controlo são os que formavam a
chamada ``jurisdiccion administrativa´´ que se encontrava totalmente separada do poder
judiciário e formava parte da administração.

Com o passo do tempo, no século XIX o sistema inicial de ``jurisdiccion retenida´´


passou-se a um sistema de ``jurisdiccion delegada´´ porque esses órgãos de controlo
adquiriam independência completa com respeito da administração de maneira que as
suas garantias de independência fossem equiparadas aos dos tribunais ordinários,
mesmo que permanecem separados.

No caso de Espanha o primeiro intento de implantar o Estado Constitucional (coa


Constituição de Cádiz de 1912) foi diferente ao modelo francês, pelo contrário se previa
um sistema de controlo jurisdicional da administração polos tribunais ordinários (de tipo
anglo-saxão). Não obstante quando foi consolidado o Estado Liberal no reinado de
Isabel II esse modelo foi abandoado e se importou o modelo francês.

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Porém, em Espanha evolucionou de maneira diferente a Francia ou outros países que
também o importaram como e o caso de Itália, porque desde começos do século XX o
controlo jurisdicional da administração se foi atribuindo progressivamente ao poder
judiciário ordinário (ou seja, estava sendo judicializado).

Após a Constituição Espanhola de 1978 este processo foi concluído. Hoje já não existe
na Espanha uma jurisdição administrativa separada da jurisdição ordinária, mais sim
uma ordem jurisdicional especializada no controle da administração no âmbito do poder
judiciário ordinário, denominada ordem jurisdicional contencioso-administrativa.

Com tudo, apesar dessa judicializaçao no controle da administração no nosso


ordenamento jurídico a posição da administração perante a justiça não é a mesma do
cidadão mais continua apresentado fortes peculiaridades.

A posição que tem a administração perante a justiça já não se justifica pelo princípio da
divisão de poderes (porque esse princípio já não é entendido como na Revolução
Francesa). Em vez disso, é explicado por um privilégio que a administração pública
reconheceu como um poder do Estado em nosso ordenamento jurídico, que e chamado
privilegio de autotutela. Este privilegio da autotutela (em geral) e o poder reconhecido
ao sujeito para proteger a própria situação jurídica sem ter que recorrer à justiça e tem
um fundamento constitucional no princípio da eficácia da administração contido no
artigo 103 da CE.

COMPARAÇAO ENTRE AMBOS PROCESSOS, ESPANHOL E PORTUGUES.

O Processo Judicial Administrativo Português de 2002 e o Espanhol de 1998 tem moitas


similitudes, mas também uma seria de distinções.

O Processo Judicial Administrativo Espanhol de 1998 é o mesmo que o de 1956 , com a


interpretação que dos seus preceitos levou a cabo o Tribunal Constitucional , mais o
processo testemunha ou em massa , que também é usado pela Lei portuguesa, e o
procedimento abreviado, oral, que é um verdadeiro fracasso em Espanha. O que em
Portugal chama-se processo em massa (art. 48 la Lei do Processo nos Tribunais
Administrativos) é conhecido em Espanha como processo testemunha e a sua tramitação
e efeitos são muito parecidos.

Deve incluir-se que em Espanha temos no artigo 110 da Lei 29/1998 o que se chama,
em matéria fiscal y de pessoal, extensão de efeitos de uma sentença ou acórdão.

Em quanto as diferencias, em primeiro lugar em Espanha todos os processos judiciais


administrativos são regulados na própria lei contencioso administrativa, nenhum
procedimento judicial administrativo é processado pela lei do Processo Civil, assim
todas as matérias são regidas pelo princípio de autotutela administrativa, que tem como
fundamento, segundo o Tribunal Constitucional Espanhol e também do Tribunal de
Justiça da União Europeia (casos Dow Chemical Ibérica o Hoechst de 1989), o princípio
da eficácia.

Desta forma, sempre que há um processo judicial nos Tribunais Judiciais


Administrativos existe uma resposta prévia: expressa ou tácita da Administração;
logicamente, quando a Administração responde favoravelmente ao particular ou o
silêncio administrativo é positivo, poupasse, um processo judicial.

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Em segundo lugar, na legislação espanhola, os prazos para exercer as ações sobre a base
dos direitos são mais breves e iguais para todos. Nem o Ministério Fiscal (Ministério
Público) nem os advogados das Administrações ou dos cidadãos têm prazos diferentes.

Em quanto a lei Portuguesa é muito minuciosa na sua regulação e deixa menos


liberdade ao Juiz; tem mais garantias e é mais minuciosa, mas a lei espanhola dá maior
liberdade ao Juiz, que em legítimo exercício da sua discrição pode obter um
desenvolvimento mais rápido do processo. Também temos que ter presente que o
Tribunal Constitucional Espanhol utiliza apenas um artigo para resolver todas as
questões processuais.

Em terceiro lugar, em matéria tributária generalizou-se, em todas as Administrações


territoriais, o que tradicionalmente eram os TEAR, quer dizer, órgãos que ainda que
dependam organicamente da Administração estão desligados da Administração Gestora,
de maneira que ao confirmar os recursos administrativos e esgotar a via administrativa,
as suas resoluções gozam de uma maior imparcialidade.

Em 10-10-2011 ditou-se a Lei 37/2011 de medidas de agilização processual, que no


processo judicial administrativo levaram a imposição de costas processuais segundo o
critério de vencimento objetivo; o incremento das taxas judiciais para a segunda
instância e casación.

Igualmente, existe um projeto de Lei de 30 de março de 2012, em que voltam a subir as


taxas nestes recursos de forma importante, e estabelecem-se por primeira vez para a
primeira instância.

Concluindo, o direito espanhol, no processo ordinário quando a parte processual


descreve os factos, o direito aplicável e formula o pedido, já tem no seu poder, com
anterioridade, o processo da via Administrativa. O processo abreviado judicial, que era
desconhecido em Espanha até a Lei Processual de 1998, que é a Lei vigente, é muito
similar ao processo português dos artigos 78 e seguintes da Lei portuguesa de 2002.
A doutrina espanhola acha que o processo abreviado, pelo qual o mais grande número
de assuntos depois de 2011 vão-se resolver, é um verdadeiro fracasso na prática.

Como ponto final, no meu ponto de vista, uma reforma processual que aceleraria muito
o Processo Contencioso -Administrativo espanhol seria aquele em que a demanda e a
contestação pudessem fazer-se em vias administrativas, inclusive com um processo em
que, simplesmente, as partes pudessem remeter-se à sua escrita em via administrativa
para que o Juiz faça, diretamente, a resolução judicial, pois em Espanha a execução das
sentenças ou acórdãos é feita pela Administração com vigilância do Tribunal de Justiça
e por isso estes trâmites de que estamos a falar poderiam ser feitos também pela
Administração.

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BIBLIOGRAFIA

 SILVA, Vasco Pereira da, “O Contencioso Administrativo no Divã da


Psicanálise”, Almedina, Março 2009
 O contencioso administrativo no divã da psicanálise, 2013, Vasco Pereira da
Silva 
 Tese Manuel Pereira da silva-Universidade Atonoma de Lisboa.
 MÁRIO AROSO DE ALMEIDA, «Grandes Linhas da Reforma do Contencioso
Administrativo», 3ª edição (reimp.), Almedina, Coimbra, 2007.

Lucía Romeo Iglesias.

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