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INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof.

Rogério Sanches30

LEI DE DROGAS – Lei n.º 11.343/06


Retrospectiva no combate ao tráfico no Brasil. Nós temos três
momentos importantes:

Lei 6.368/76 Lei 10.409/02 Lei 11.343/06


 Crimes relacionados  Crimes relacionados  Crimes relacionados
ao tráfico ao tráfico ao tráfico
 Procedimento especial  Procedimento especial  Procedimento especial

1º Momento: Lei 6.368/76 - É o momento que nasceu a lei especial,


que é a Lei 6.368/76 (e eu lembro que eu estava em Garapava e tinha um
traficante cujo número de celular era: 9763-6876, disque-drogas, Você
acredita?). Essa lei trazia os crimes relacionados ao tráfico e o procedimento
especial.

2º Momento: Lei 10.409/02 – Essa lei queria substituir a Lei


6.368/76. Ela trouxe os crimes relacionados ao tráfico e o procedimento especial
na apuração e punição de um traficante. O problema é que o Presidente da
República vetou o Capítulo – Dos Crimes. A Lei 10.409 só foi sancionada com o
procedimento e a conclusão foi a de que a Lei 10.409 trouxe um procedimento
revogando o anterior, mas os crimes continuam sendo da lei anterior. Então, os
delegados, promotores juízes, trabalhavam com duas leis: no direito material a
gente usava a Lei 6.368/76 e quanto ao direito material, a gente usava a Lei
10.409/02. Colcha de retalho. Por isso, veio a Lei 11.343/06:

3º Momento: Lei 11.343/06 – Tratou dos crimes e do procedimento.


Então, finalmente, a 10.409 e a 6.368/76 estão revogadas. Então, a partir de
2006, a gente nem pensa mais nessas duas outras leis. Tudo que se relaciona a
drogas, seja crime, seja procedimento, seja política de combate, Lei 11.343/06.

E essa lei nova trouxe características importantes? Trouxe! Vamos


analisar as importantes alterações trazidas por essa lei nova. O que a Lei
11.343/06 fez?

1. DROGA em vez de SUBSTANCIA ENTORPECENTE

Primeira coisa importante: Ao invés de falar substância entorpecente,


Pedro C. Canellas

substituiu pela expressão droga – então, a primeira coisa que ela fez: desaparece
substância entorpecente. Hoje, a expressão é droga! Você vai prestar concurso
para o MP? Denuncia tráfico de droga! Não tráfico de substancia entorpecente. A
sua denúncia tem que trazer a expressão legal. E o que vem a ser droga?

Olha que importante: as leis anteriores eram complementadas por uma


portaria. Por isso, eram chamadas de norma penal em branco. Quem dizia o que
é ou não droga é uma Portaria do Ministério da Saúde, Agência de Vigilância
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Sanitária. Então, era uma norma penal em branco porque era complementada
por uma portaria.

E a lei nova, manteve a sistemática da norma penal em branco ou


mudou? Vocês sabem que Vicente Greco Filho, por exemplo, fala o seguinte: a
gente deveria acabar com essa história de norma penal em branco. O juiz, com
base em perícia, tem que saber se a substância é ou não psicotrópica. Análise do
caso concreto. Por que? Porque a portaria está sempre defasada com relação à
criatividade do homem. O homem cria drogas que a portaria não prevê e aí rola o
tráfico solto. Temos que esquecer essa história de portaria. Quem tem que dizer
se é ou não droga é um perito e o juiz tem que analisar na perícia se a substancia
causa ou não dependência. Essa lição de Vicente Greco é perigosa? Sim, porque
fere o princípio da taxatividade. E cada juiz, uma sentença. Eu não sei o que o
juiz da comarca A entende a respeito do ANADOR, do VICK VAPORUB. Minha mãe
depende, é viciada no Vice Vaporo mais do que do meu pai. Não vivem sem
aquilo. Imagine se o juiz conclui: mãe do Rogério você está usando drogas, Vick
Vaporo causa dependência! Eu estou fazendo essa brincadeira pra você perceber
o quanto é perigosa essa lição. Então, nós temos que continuar com norma penal
em branco porque ela, com segurança nos diz o que é ou não drogas para fins de
tráfico. E o Brasil manteve a sistemática de norma penal em branco.

Então, o que é droga? É aquilo que assim estiver rotulado na


Portaria da Secretaria de Vigilância Sanitária do Ministério da Saúde,
344/98.

Você quer saber se a substância que você comercializa ou usa é ou


não droga? Consulte a Portaria SVS/MS 344/98. Lá vocês vão encontrar, por
exemplo, lança-perfume.

Qual é o procedimento para você colocar ou retirar substância da


Portaria do Ministério da saúde? Em princípio, potencialidade de dependência da
substância. O malefício da substância. Ah, Rogério, mas por que o lança-perfume
está lá? Porque eles entendem que lança-perfume, dependendo do grau, pode
trazer dependência maléfica. Destruidora. Agora, cá entre nós, o critério é
político.

Fato curioso: A substância lança-perfume foi abolida da Portaria do


Ministério da Saúde numa de suas últimas edições por dois dias. Aí devolveram.
Mas nesses dois dias em que ela ficou fora, ela gerou abolitio criminis e,
Pedro C. Canellas

coincidentemente, tinha o filho de um empresário muito famoso que tinha sido


preso por tráfico de lança-perfume.

Eu era promotor em Garapava e o juiz, na audiência, decretou a


preventiva de um vadio. A pessoa era vadia, não compareceu na audiência. E
ele: “é a terceira vez que essa pessoa não vem. Decreto a preventiva.” Eu falei
pra ele: mas, juiz, você acha necessário mesmo? “Acho! Minha autoridade está
sendo afrontada pelo vadio!” E eu: mas vadiagem é contravenção penal! “E daí”
E daí que não cabe preventiva! “No meu código cabe!”. O que eu fiz? Impetrei
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um habeas corpus, via fax porque Garapava fica a 500 km. Eu não ia pegar o
meu carrinho, pra ir até SP, pra impetrar um HC para um vadio. Não! Então,
impetrei via fax. Liguei no tribunal, confirmaram o recebimento, mandei o
original por sedex. Antes mesmo, de acabar o dia, já veio a liminar pro fax do
juiz. Ele veio na minha sala: “Pô, que absurdo!” Eu contei essa história e um
aluno mandou um e-mail pra mim: “Professor eu sou de Garapava e esse vadio é
o meu tio.”

Então, vejam o que acontece: tiraram o lança-perfume da Portaria do


MS. Ao tirarem por dois dias, ocorreu a abolitio criminis. Todos os que estavam
sendo processados ou executados pelo tráfico de lança perfume foram
beneficiados, inclusive esse jovem milionário. “Soltou? Então devolve o lança-
perfume para a Portaria.”

2. PROPORCIONALIDADE

PROPORCIONALIDADE
LEI 6361/76 LEI 11.343/06

3 a 10 ANOS (MESMA PENA): PENAS DIFERENTES:

a) Traficante de drogas
b) Traficante de matéria-prima Exceção Pluralista à Teoria
c) Induz outrem a usar Monista
d) “Mula” primário
e) Utiliza seu imóvel

A Lei 6.368/76 foi corrigida pela Lei 11.343/06. Por quê? Porque a Lei
6.368/76 punia com 3 a 10 anos o traficante de drogas, punia com 3 a 10 anos o
traficante de matéria-prima, punia com 3 a 10 anos aquele que induz outrem a
usar drogas, punia com 3 a 10 anos o tal do mula primário e de bons
antecedentes, punia com 3 a 10 anos o avião primário e de bons antecedentes.
Todo mundo, punido com 3 a 10 anos. Então, punia com 3 a 10 anos o traficante
de drogas, o traficante de matéria-prima, aquele que não trafica, mas induz
outrem a usar, punia com 3 a 10 anos, por exemplo, aquele que utilizava seu
imóvel para servir a traficante. Reparem que todos esses comportamentos eram
punidos com 3 a 10.
Pedro C. Canellas

O que a lei nova fez? Considerou isso desproporcional! Você está


punindo condutas desiguais com pena igual. A lei nova, então, pune esses
comportamentos com penas diferentes, obedecendo o princípio da
proporcionalidade. E como é que ela consegue obedecer o princípio da
proporcionalidade? Ela usa e abusa de exceção pluralista à Teoria Monista. Vocês
vão ver comigo. Crimes, que na lei anterior tinham uma pena de 3 a 10, na lei
atual tem pena de 1 a 3. Induzir alguém a usar, na lei anterior era de 3 a 10. Na
lei atual, de 1 a 3. O mula, na lei anterior, 3 a 10, na lei atual, ele pode até ter
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uma redução de 2/3 da pena. Então, ela trabalha com proporcionalidade, dá


penas diferentes para comportamentos diferentes e faz isso de que modo? Pela
exceção pluralista à Teoria Monista.

3. INCREMENTO DAS MULTAS

3ª Característica importante: A lei nova claramente incrementou as


multas. Vocês vão ver que as multas passam de mil dias-multa. Ela incrementou
as multas, ou seja, ela quer atingir o patrimônio do traficante. Tem penas que
ultrapassam dois, três mil dias-multa. Então, ela incrementou as penas de multa.

Eu gosto sempre de fazer essa introdução. Saibam vocês que a Lei de


Drogas foi dissertação do último concurso do MP/SP. E olha só quanta coisa você
tinha para falar na introdução: mostrar a evolução da lei, as características da lei
nova, dizer se é norma penal em branco ou não, falar a crítica de Vicente Greco
Filho. Tudo isso, como introdução. O que vou fazer agora? Vou entrar no primeiro
crime, que é o porte para uso próprio.

4. CRIME DE PORTE DE DROGAS PARA USO PRÓPRIO

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em


depósito, transportar ou trouxer consigo, para consumo
pessoal, drogas sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar será submetido às
seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a
programa ou curso educativo.
§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem,
para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe
plantas destinadas à preparação de pequena
quantidade de substância ou produto capaz de causar
dependência física ou psíquica.
§ 2º Para determinar se a droga destinava-se
a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à
quantidade da substância apreendida, ao local e às
condições em que se desenvolveu a ação, às
Pedro C. Canellas

circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta


e aos antecedentes do agente.
§ 3º As penas previstas nos incisos II e III do
caput deste artigo serão aplicadas pelo prazo máximo
de 5 (cinco) meses.
§ 4º Em caso de reincidência, as penas
previstas nos incisos II e III do caput deste artigo serão
aplicadas pelo prazo máximo de 10 (dez) meses.
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§ 5º A prestação de serviços à comunidade


será cumprida em programas comunitários, entidades
educacionais ou assistenciais, hospitais,
estabelecimentos congêneres, públicos ou privados
sem fins lucrativos, que se ocupem, preferencialmente,
da prevenção do consumo ou da recuperação de
usuários e dependentes de drogas.
§ 6º Para garantia do cumprimento das
medidas educativas a que se refere o caput, nos incisos
I, II e III, a que injustificadamente se recuse o agente,
poderá o juiz submetê-lo, sucessivamente a: I -
admoestação verbal; II - multa.
§ 7º O juiz determinará ao Poder Público que
coloque à disposição do infrator, gratuitamente,
estabelecimento de saúde, preferencialmente
ambulatorial, para tratamento especializado.
Art. 29. Na imposição da medida educativa
a que se refere o inciso II do § 6º do art. 28, o juiz,
atendendo à reprovabilidade da conduta, fixará o
número de dias-multa, em quantidade nunca inferior a
40 (quarenta) nem superior a 100 (cem), atribuindo
depois a cada um, segundo a capacidade econômica do
agente, o valor de um trinta avos até 3 (três) vezes o
valor do maior salário mínimo.
Parágrafo único. Os valores decorrentes da
imposição da multa a que se refere o § 6º do art. 28
serão creditados à conta do Fundo Nacional Antidrogas.
Art. 30. Prescrevem em 2 (dois) anos a
imposição e a execução das penas, observado, no
tocante à interrupção do prazo, o disposto nos arts. 107
e seguintes do Código Penal.

Rogério, primeira dúvida que eu tenho: o art. 28 é crime? Quando


nasceu o art. 28, logo a doutrina começou a se questionar: “peraí, mas que coisa
diferente...” Olha as “penas” do art. 28: “I - advertência sobre os efeitos das
drogas; II - prestação de serviços à comunidade; III - medida educativa de
comparecimento a programa ou curso educativo.” Será que isso aqui continua
crime?! Bom, nós temos três correntes discutindo a natureza jurídica do art. 28.
Pedro C. Canellas

Vou colocá-las e depois dizer qual prevalece.

NATUREZA JURÍDICA DO ART. 28


1ª CORRENTE 2ª CORRENTE 3ª CORRENTE
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Não é crime!
Não é crime!
É crime! É infração penal sui
É fato atípico.
generis
Fundamentos:
O nome do capítulo, nem Lei 11.343/06 fala em
O capítulo que abrange o
sempre corresponde ao medida educativa, que é
art. 28 é intitulado “Dos
seu conteúdo. Ex.: DL- diferente de medida
Crimes”.
201/67 punitiva.
Reincidência aqui é O descumprimento da
O art. 28, § 4º fala em
repetir o fato (sentido “pena” não gera
reincidência.
vulgar do termo) consequência penal.
Ilícitos civis e
O art. 30 fala em administrativos Princípio da intervenção
prescrição prescrevem, ato mínima
infracional prescreve.
Crime: reclusão e
O art. 5º, XLVI permite
detenção A saúde individual é um
outras penas que não
Contravenção: prisão bem jurídico disponível.
reclusão ou detenção.
simples
É A POSIÇÃO DO STF Art. 48, § 2º
Art. 28 trata-se Não é crime
de crimes com medidas pois o usuário deve ser
assecuratórias preferencialmente
conduzido ao juiz
São três correntes.

1ª Corrente - A corrente que diz que é crime, fundamenta o seguinte:


o capítulo que abrange o art. 28 é intitulado “Dos Crimes.” Pronto. Então, só
pode ser crime. Está no capítulo Dos Crimes, só pode ser crime. Essa primeira
corrente para dizer que é crime, lembra também do seguinte: o art. 28, § 4º fala
também em reincidência e se fala em reincidência só pode estar se referindo a
crime. E tem mais: o art. 30 fala em prescrição. Ora, se trata da prescrição é
porque prescreve pena e pena é consequência de crime. Mais um argumento
para dizer que o art. 28 é crime. Aí você pode estar pensando... “Rogério, mas
que pena esquisita que tem o art. 28! Pena não é reclusão e detenção?” Eles
dizem: não! O art. 5º, XLVI, da CF permite outras penas que não reclusão ou
detenção. Esta é a posição do STF. E sabe por que ele adotou essa primeira
Pedro C. Canellas

posição? Pelo seguinte: “Se eu entender que não é mais crime, eu perco o ato
infracional, porque só é ato infracional aquilo que corresponde a crime ou
contravenção. Se eu entender que não é mais crime, eu não posso mais punir o
menor infrator ou reeducar o menor infrator.”

2ª Corrente - A segunda corrente diz que não é crime. Que é infração


penal sui generis. Como que essa corrente rebate a primeira? Ela diz: o nome do
capítulo, nem sempre corresponde ao seu conteúdo. E vocês conhecem leis que
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chamam de crimes infrações político-administrativas, por exemplo, o DL-201/67,


chama de crimes de prefeitos, infrações político-administrativas. Então, você
querer justificar que é crime por conta do nome do capítulo, é algo muito pobre,
considerando que o capítulo nem sempre espelha o seu conteúdo. O fato de falar
em reincidência também não significa crime porque reincidência foi utilizado no
seu sentido julgar, querendo dizer repetir o fato. Prescrição? Prescrição não é
próprio de crime. Ilícito civil prescreve e ilícito civil não é crime, assim como
ilícito administrativo. Ato infracional prescreve, de acordo com o STJ e não é
crime. Então, querer justificar que o art. 28 é crime porque o art. 30 fala em
prescrição é absurdo. Então, é argumento muito pobre. Para essa corrente, crime
é punido com reclusão e detenção. Contravenção penal é punida com prisão
simples. Ora, se o art. 28 não traz reclusão, não traz detenção, não traz prisão
simples, só pode ser uma infração penal que não é crime, que não é
contravenção. Só pode ser uma infração penal sui generis. A Lei de Introdução ao
Código Penal diz isso: crime: reclusão e detenção. Contravenção penal: prisão
simples. Senão tem nada disso, não é infração penal comum. É uma infração
penal sui generis. Tanto não é crime, para esta segunda corrente, tanto é
infração penal sui generis que o usuário não é levado para a delegacia, a lei diz
que ele tem que ser levado ao juiz. Vamos ao art. 48, § 2º:

§ 2º Tratando-se da conduta prevista no art.


28 desta Lei, não se imporá prisão em flagrante,
devendo o autor do fato ser imediatamente
encaminhado ao juízo competente ou, na falta
deste, assumir o compromisso de a ele comparecer,
lavrando-se termo circunstanciado e providenciando-se
as requisições dos exames e perícias necessários.

Não vai para a delegacia, que é o local aonde você encaminha crimes.
É pro juiz, do mesmo jeito que acontece com menor infrator. Menor infrator não
pratica crime, então, não vai para a delegacia. Menor infrator, quando pratica
crime, vai para o MP e para o juiz. Ele pratica ato infracional... Então, a segunda
corrente diz: se ele fosse criminoso, ele não teria que ir para o juiz, ele teria que
ir para a delegacia. E o art. 48, §2º diz que ele é encaminhado ao juiz. É um outro
argumento para defender a tese de que crime não é! É uma infração penal sui
generis.

“Rogério, naquilo que o Ministro Sepúlveda Pertence falou, ele tem


razão. Se você defender a tese de que o art. 28 não é crime, não é contravenção
Pedro C. Canellas

penal, como é que você vai punir o menor infrator?” Primeira coisa: ninguém
quer punir menor infrator, você quer reeducar, socioeducar menor infrator. Mas
você não precisa de medida socioeducativa neste caso. Basta aplicar ao menor
infrator, nesse caso, medida de proteção, do art. 101, do ECA, que vocês vão ver
que são muito parecidas com as “penas” do usuário. Vamos ao art. 101, do ECA:

Art. 101. Verificada qualquer das hipóteses


previstas no Art. 98 (situações de risco, e o vício é
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situação de risco), a autoridade competente poderá


determinar, dentre outras, as seguintes medidas:
I - encaminhamento aos pais ou responsável,
mediante termo de responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento
temporários;
III - matrícula e frequência obrigatórias em
estabelecimento oficial de ensino fundamental;
IV - inclusão em programa comunitário ou
oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente;
V - requisição de tratamento médico,
psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou
ambulatorial;
VI - inclusão em programa oficial ou
comunitário de auxílio, orientação e tratamento a
alcoólatras e toxicômanos;
VII - abrigo em entidade;
VII - acolhimento institucional; (Alterado pelo
L-012.010-2009);
VIII - colocação em família substituta;
VIII - inclusão em programa de acolhimento
familiar; (Alterado pelo L-012.010-2009);
IX - colocação em família substituta.
(Acrescentado pelo L-012.010-2009)

Então, vejam, são medidas muito parecidas com as do imputável.


Você, na verdade, vai acabar punindo mais severamente o menor infrator do que
o maior. Então, não tem essa “ah eu perco a punição do menor”, você não tem
que punir o menor, você tem que proteger o menor nessa situação de risco. Já
deu para perceber que eu concordo com a segunda corrente, né? Não tem tesão
algum ficar processando usuário de droga. É ridículo! Eu tenho mais o que fazer!
É ridículo você usar o aparato policial, usar a estrutura do Judiciário para, no final,
o juiz apontar o dedo e dizer: “droga faz mal”. Advertência. É um absurdo, é
questão de saúde pública! Pega o usuário e vai tratá-lo como você trata o
bêbado! O usuário que pratica crime, aí tudo bem. Vai responder pelo crime que
praticou, mas só pelo fato de ser usuário? Direito penal, querendo punir usuário?
É questão de saúde pública! Não vem pro fórum! Já pensou você, delegado,
doido para combater o crime, vai lá e dá de cara com o usuário? Que não pode
ser nem levado para a delegacia, tem que ser levado ao juiz? “Eu não posso ser
Pedro C. Canellas

preso em flagrante!” Ele já conhece a lei.

3ª Corrente - A terceira corrente diz que o fato é atípico. Ela diz o


seguinte: a Lei 11.343/06 fala em medida educativa, que é diferente de medida
punitiva. Segundo argumento para dizer que não é crime: o descumprimento da
“pena” não gera consequência penal. Isso é o que é mais absurdo na lei. Sabe o
que mais absurdo nessa lei? Vamos supor: o juiz impõe ao usuário prestação de
serviços à comunidade. Ele fala: “juiz, não vou cumprir.” Aí o juiz: “não vai
cumprir? Então, de 5 meses, vai perdurar 10 meses!” E o juiz: “ah, não? Então eu
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches38

vou impor uma multa porque a lei autoriza uma multa cominatória, sabe aquela
do direito civil, astreinte? Tem aqui! Enquanto você não cumprir, essa multa vai
ter incidência.” E eu não vou cumprir, você vai executar essa multa e eu não
tenho bens. O juiz vai falar o quê para ele? “Some da minha frente, que eu não
tenho mais o que fazer.” Não tem como converter em privativa de liberdade, não
tem o que fazer! Na verdade é um crime em que o condenado escolhe se quer ou
não cumprir a pena. Ridículo! Essa corrente do fato atípico trabalha com o
princípio da intervenção mínima, falando: “direito penal não tem que intervir
nisso aqui! O direito penal tem que combater o traficante!” E, por fim, eles dizem
que a saúde individual é um bem jurídico disponível. Se eu quero usar maconha,
eu uso maconha, não estou oferecendo para ninguém... Tem até uma decisão
interessante de um juiz de Campinas e ele disse o seguinte: “o art. 28 é
inconstitucional. Fere o princípio da isonomia porque você não pune o bêbado
dessa maneira. Por que o usuário?” ele disse que, mais do que em droga, o ser
humano é viciado em açúcar. Ele cita vários vícios na sentença que fazem tão ou
mais mal do que a droga e que não são punidos.

Eu fiz esse gráfico para quem for prestar prova que tenha questão
subjetiva, que tenha questão que você possa discorrer sobre isso. Primeira fase:
vocês não vão pestanejar. Qual é a resposta? Crime! É a posição do Supremo. O
Supremo decidiu, concurseiro tem que baixar a cabeça.

Explicando o art. 28:

Bem jurídico tutelado: saúde pública colocada em risco pelo


comportamento do usuário.

Não se pune o porte de drogas para uso próprio em função da proteção


à saúde do agente, pois a autolesão não é punível.

Sujeito ativo: qualquer pessoa.

Sujeito passivo: aqui, é a coletividade ( sujeito passivo


despersonalizado. Crime vago) porque o bem jurídico tutelado não é a saúde
individual, mas a saúde coletiva, pública. Então, quem é a vítima? A coletividade.
E por quê? Porque o bem jurídico protegido é a saúde pública. É o risco que o
usuário gera à saúde pública.
Pedro C. Canellas

Não se pune o agente se for surpreendido usando drogas sem


possibilidade de se encontrar a substância em seu poder, pois não se provará a
materialidade do delito.

Art. 28. “...sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou


regulamentar: elemento normativo indicativo da ilicitude do comportamento.

Nós temos seis núcleos no art. 28: adquirir, guardar, ter em


depósito, transportar ou trazer consigo drogas para consumo pessoal. Então,
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches39

são 6 núcleos. Eu vou ser bem rápido nesse crime porque ele quase não cai e
quando cai, diz respeito às discussões que nós já travamos.

É punido a título de dolo e se consuma com a prática de qualquer


um desses núcleos. Seis núcleos típicos e, punido a título de dolo se consuma
com a prática de qualquer um desses núcleos. A lei não pune o fumar passado.
Se você já fumou você não pode ser punido. Será punido quem adquirir, quem
guardar, quem tiver e depósito, quem transportar ou trouxer consigo. Se você já
fumou você não incide em nenhum desses núcleos. Fumar pretérito, fato atípico,
até porque desaparece a materialidade delitiva. Por isso, o usuário, quando era
surpreendido, o que ele fazia com a droga? Engolia.

Para Nucci, o art. 28 descreve infração de “ínfimo potencial ofensivo”,


tendo em vista que, mesmo sendo inviável, no caso concreto, a transação penal,
ainda que reincidente o agente e com maus antecedentes ou com péssima
conduta social, jamais será aplicada pena privativa de liberdade, mas penas
alternativas com medidas assecuratórias.
Tipo subjetivo: dolo acrescido de uma finalidade especial que é PARA
CONSUMO PESSOAL ( elemento subjetivo do tipo)
A maioria admite tentativa, no tentar adquirir.
Consumação: com a prática de qualquer um dos núcleos do tipo.
Guardar – crime permanente.
Consequências:
Penas, medidas educativas
- advertência
- prestação de serviços à comunidade
- comparecimento a programas ou cursos educativos
Configuram penas alternativas não substitutivas, ou seja, não precisa
substituir penas privativas de liberdade para chegar a essas penas.

Vejam que eu fui rápido na explicação do art. 28, porque ele é bem
simples e cai pouco. Agora, olha o detalhe das penas. Reparem que são penas
alternativas de natureza principal. Não são substitutivas da privativa de
liberdade. Por que você está dizendo isso? Vamos ao art. 44, do CP:

Art. 44 - As penas restritivas de direitos (e


essas que estamos estudando são restritivas de
direitos) são autônomas e substituem as privativas
de liberdade, quando:
Pedro C. Canellas

Olhe o sublinhado. No seu concurso vai cair: “doutor, me dá exemplo


de uma pena restritiva de direito que não substitui a privativa de liberdade. Ela é
principal!” É o art. 28, da Lei de Drogas. Esse artigo traz penas restritivas de
direito que não são substitutivas. No art. 28, da Lei de Drogas você tem penas
restritivas de direitos que são principais.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches40

Vocês sabem que a prescrição de crimes depende da sua pena. E a


depender da pena máxima em abstrato, o prazo prescricional muda. Vamos ao
art. 28.

Art. 28. Quem adquirir, guardar, tiver em


depósito, transportar ou trouxer consigo, para
consumo pessoal, drogas sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar
(ELEMENTO NORMATIVO INDICATIVO DA
ILICITUDE) será submetido às seguintes penas:
I - advertência sobre os efeitos das drogas;
II - prestação de serviços à comunidade;
III - medida educativa de comparecimento a
programa ou curso educativo.

Como é que eu vou calcular a prescrição, que varia conforme a


pena máxima privativa de liberdade, se o art. 28 não tem pena privativa de
liberdade? Por isso, o art. 30, que percebeu que o art. 28 não pode se valer da
prescrição comum. Então, o art. 30 diz:

Art. 30. Prescrevem em 2 (dois) anos a


imposição e a execução das penas, observado, no
tocante à interrupção do prazo, o disposto nos arts. 107
e seguintes do Código Penal.

O art. 30 diz: Esse crime prescreve em dois anos, sempre! Seja


prescrição punitiva, seja prescrição executória. Isso tem caído! O prazo
prescricional do art. 28. O candidato não tem como procurar isso no art. 109, do
CP. Está no art. 30 da Lei de Drogas: 2 anos.

Não se aplica o princípio da insignificância no art. 28, especialmente


quando ocorre em ambiente sob administração militar.

5. CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS

Art. 33, da Lei de Drogas. O art. 33, caput, pune o tráfico


propriamente dito.
Pedro C. Canellas

Art. 33. Importar, exportar, remeter,


preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à
venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer
consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a
consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente,
sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar:
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches41

Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze)


anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa.

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem


(TRÁFICO EQUIPARADO):
I - importa, exporta, remete, produz, fabrica,
adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem
em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda
que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar, matéria-
prima, insumo ou produto químico destinado à
preparação de drogas;
II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem
autorização ou em desacordo com determinação legal
ou regulamentar, de plantas que se constituam em
matéria-prima para a preparação de drogas;
III - utiliza local ou bem de qualquer natureza
de que tem a propriedade, posse, administração,
guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se
utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou
em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.

São tráficos equiparados. Até agora, tudo com a mesma pena. A partir
do § 2º a pena já fica diferente.

Art. 33, caput: 5 a 15 anos Tráfico propriamente dito.


Art. 33, § 1º: 5 a 15 anos Tráfico por equiparação
Art. 33, § 2º 1 a 3 anos
Formas especiais do crime
Art. 33, § 3º 6 meses a 1 ano
Art. 33, § 4º Privilégio

O propriamente dito e o tráfico por equiparação, ambos são punidos


com 5 a 15 anos. E as formas especiais, vocês vão ver, que o § 2º é punido com 1
3 anos e o § 3º é punido com 6 meses a 1 ano. O §4º vai trazer um privilégio.
Pedro C. Canellas

Vejam como está estruturado o art. 33 com a lei nova. Agora vocês entenderam
porque a lei nova trabalha com proporcionalidade. Na lei anterior, tudo isso
estava sujeito à mesma pena. Na lei anterior, tudo isso estava exatamente na
mesma pena.

5.1. TRÁFICO PROPRIAMENTE DITO (art. 33 caput)


INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches42

Art. 33. Importar, exportar, remeter,


preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender,
expor à venda, oferecer, ter em depósito,
transportar, trazer consigo, guardar, prescrever,
ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas,
ainda que gratuitamente, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze)
anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa.

Bem jurídico tutelado: Temos um bem jurídico primário e um bem


jurídico secundário:

 Imediato / Primário – saúde pública


 Mediato / Secundário – saúde individual de pessoas
que integram a sociedade

Sujeito ativo do tráfico: em regra, o tráfico é um crime comum.


Pode ser praticado por qualquer pessoa. Mas em regra! Porque no núcleo
prescrever, ele é crime próprio. Só pode ser praticado por médico ou
dentista. Então, se te perguntarem quem é o sujeito ativo do tráfico você vai
dizer que o crime é comum, que pode ser praticado por qualquer pessoa, salvo
no núcleo prescrever. No núcleo prescrever o crime é próprio. Só pode ser
praticado por médico ou dentista.

Sujeito passivo do tráfico: quem é a vítima? Basta lembrar o bem


jurídico!

 Vítima primária: a sociedade, podendo com ela


concorrer
 Vítima secundária: alguém prejudicado com a ação
do agente. Por exemplo, o inimputável que usou droga. O inimputável
é vítima secundária.

Vender droga para menor de idade, para criança e adolescente: é o


art. 33, da Lei de Drogas, ou é o art. 243, do ECA? Vamos ao art. 243, do ECA:

Art. 243. Vender, fornecer ainda que


Pedro C. Canellas

gratuitamente, ministrar ou entregar, de qualquer


forma, a criança ou adolescente, sem justa causa,
produtos cujos componentes possam causar
dependência física ou psíquica, ainda que por utilização
indevida:
Pena - detenção de 2 (dois) a 4 (quatro)
anos, e multa, se o fato não constitui crime mais grave.
(Alterado pela L-011.764-2003)
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches43

Vender drogas para menor é a Lei de Drogas do art. 33, ou é o


art. 342 do ECA?

• O art. 33 da Lei de Drogas tem como objeto material exatamente a


droga (5 a 15)
• O art. 243 do ECA, tem como objeto material produto causador de
dependência (2 a 4).

E aí, pessoal, vender droga para menor é o art. 33, que tem uma pena
de 5 a 15, ou é o art. 243, do ECA, que tem uma pena de 2 a 4. Princípio da
especialidade! Só configura o art. 243, do ECA se esse produto não corresponde
a uma droga da Portaria do Ministério da Saúde. Produtos causadores de
dependência são produtos diversos da Portaria 344/98. Se o produto está na
Portaria 344/98, é o art. 33, da Lei de Drogas.

Exemplo de um produto que causa dependência, não está na Portaria e


não configura o art. 33? Cola de sapateiro. É produto causador de dependência,
não está na Portaria como droga, logo, é o art. 243, do ECA. Se amanhã incluírem
a cola de sapateiro na Portaria 344, vender cola de sapateiro é tráfico.

E bebida alcoólica? Não está na Portaria. Configura o art. 243, do


ECA? Tem divergência no STJ sobre se cerveja configura produto causador de
dependência. Tem jurisprudência discutindo isso. Uns dizem: a cerveja, por si só,
não causa. É o uso exagerado que pode causar.

O que punimos no art. 33, da Lei de Drogas? Quais os


comportamentos punidos? São vários os núcleos. São 18 núcleos. Aliás, para
delegado de polícia aqui em SP caiu uma pergunta que deixou todo mundo
embasbacado. O examinador chegou para o candidato na fase oral e perguntou:
“doutor, quantos núcleos tem o art. 12 da Lei de Drogas (na época era o art.
12)”? O candidato falou: 18. “Quais são?” O candidato começou a responder e
ele falou: “doutor, um momento, eu quero na ordem.” É! Do mal!

Art. 33. Importar, exportar, remeter,


preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à
venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer
consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a
consumo ou fornecer drogas, ainda que
Pedro C. Canellas

gratuitamente, sem autorização ou em desacordo


com determinação legal ou regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze)
anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa.

Dos 18 núcleos, um chama a nossa atenção. Os núcleos são:


INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches44

Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir,


vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo,
guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas.

Vou tratar do núcleo mais importante: fornecer drogas, ainda que


gratuitamente. Cessão gratuita de drogas. Esse é o núcleo mais importante.

a) Cessão gratuita de drogas

A doutrina discute o seguinte: como fica a cessão gratuita para juntos


consumirem? Fornecedor e consumidor? Aqui temos que analisar sob a ótica
antes e depois da Lei 11.343/06:

LEI 11.343/06
ANTES DEPOIS
1ª Corrente – art. 12, da Lei Art. 33, da Lei 11.343/86 caput
2ª Corrente – art. 12, da Lei (habitualmente ou objetivo de lucro
6.368/76 ou pessoa fora do relacionamento)
3ªCorrente – art. 16, da Lei ou
6.368/76 Art. 33, § 3º da Lei 11.343/86
(prevalecia) (oferecer droga e eventualmente +
sem objetivo de lucro + a pessoa de
seu relacionamento)

Antes da lei, a cessão gratuita para juntos consumirem, para uma


primeira corrente, configurava o art. 12, da Lei 6.368/76. Essa corrente falava: “o
que importa é que você cedeu droga para alguém! Se você fez isso, você é
traficante, deve responder nas penas do art. 12. pouco importa se era para
consumir com essa pessoa ou não. Ponto e acabou.” Uma segunda corrente
dizia: “tudo bem, é o art. 12, da lei, porém, não equiparado a hediondo porque
não havia finalidade de lucro, não havia mercancia.” E a terceira corrente dizia:
“não, se você entregou droga para junto consumir, você não é traficante. Você
deve ser considerado usuário, apenas e tão-somente.” E esta terceira corrente
era a que prevalecia.
Pedro C. Canellas

Hoje, com a Lei 11.343/06, a questão está resolvida. Cessão gratuita


de drogas para juntos consumirem pode configurar ou o art. 33, caput, ou o art.
33, § 3º. Vamos ver o que diz:

§ 3º Oferecer droga, eventualmente e sem


objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento,
para juntos a consumirem:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um)
ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches45

quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas


previstas no art. 28.

Olha a pena: 6 meses a 1 ano! Hoje, oferecer drogas, eventualmente,


para alguém de seu relacionamento, para juntos consumirem, vale o art. 33, § 3º.
Se faltar algum requisito do art. 33, § 3º, como nós já vamos ver, aí cai no caput.
O § 3º diz: oferecer droga e diz eventualmente. Isso significa que se você
oferecer droga habitualmente, você cai no art. 33, caput. O crime é oferecer
droga eventualmente! Sem objetivo de lucro! Se houver objetivo de lucro, você
cai no 33, caput. E além de oferecer droga + eventualmente + sem objetivo de
lucro, tem que ser a pessoa de seu relacionamento. Se você ofereceu droga a
pessoa que não é do seu relacionamento, art. 33, caput.

Se te perguntarem, hoje, como punir a cessão gratuita de drogas para


juntos consumirem, você vai dizer: ou é o art. 33, caput, ou é o 33, §3º.

Quantos são os verbos do art. 33, caput? 18! Nós estamos diante de
um crime de ação múltipla, ou conteúdo variado. Por que é importante saber que
estamos diante de um crime de ação múltipla ou conteúdo variado? Crime de
ação múltipla ou crime de conteúdo variado também é conhecido como
crime plurinuclear, com vários comportamentos descritos no tipo. O art. 33, da
Lei de Drogas é um crime de ação múltipla genuíno. São 18 núcleos. É
importante saber que ele é crime plurinuclear de ação múltipla? Sim. Por quê?
Porque se o sujeito ativo praticar mais de um núcleo no mesmo contexto fático, o
crime continua sendo único. O juiz é que vai considerar a pluralidade de núcleos
na fixação da pena.

Então, se ele importar, guardar, conduzir e entregar a droga, ele


praticou quatro verbos. Não significa que ele praticou quatro tráficos. Os verbos
foram praticados no mesmo contexto fático. O crime continua único. Vamos
anotar isso?

“Sendo um crime de ação múltipla, na hipótese de o agente


praticar mais de um verbo no mesmo contexto fático, não desnatura a
unidade do crime.”

Significa o quê? Que o crime continua único. Continuando: olha o que


vai cair:
Pedro C. Canellas

“Todavia, faltando proximidade comportamental entre as


várias condutas, haverá concurso de crimes, material ou continuado,
dependendo da circunstância do caso concreto..”

Eu falei que o crime é único, se os crimes são praticados no mesmo


contexto fático. Aquilo que eu importei eu guardo, aquilo que eu guardei eu
transportei, aquilo que eu transportei, eu vendi. Faltando proximidade
comportamental, aí estaremos diante de um concurso de delitos.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches46

Voltando ao art. 33, é imprescindível a presença da elementar


indicativa da ilicitude do comportamento. É imprescindível que o agente pratique
esses núcleos: “sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar” (art. 33). Eis aqui o elemento indicativo da ilicitude do
comportamento.

O promotor, quando denuncia, tem que colocar na denúncia que o


agente agiu em desacordo com determinação legal ou regulamentar, ou sem
autorização. O juiz, quando condena, tem que deixar claro que o réu agia assim.
Pessoal, é elemento indicativo da ilicitude do comportamento. Então, quer dizer
que tem pessoas que podem, eventualmente, ter autorização legal? Tem: os arts.
2º e 31, da Lei de Drogas, trazem hipóteses de autorização especial, trazem
hipóteses em que, excepcionalmente, pessoas podem manejar drogas. Cuidado
que esses dispositivos permitem a algumas pessoas, em algumas situações, o
armazenamento de drogas.

Uma questão importante é a seguinte: eu falei que o agente tem que


praticar esses núcleos sem autorização legal, não é isso? Cuidado! Equivale à
não autorização, o desvio da finalidade da autorização que tem. Vamos anotar
isso:

“Equivale à ausência de autorização o desvio de autorização,


ainda que regularmente concedido.”

Agora, vejam, prestem atenção: vocês acham que é um argumento


convincente na Lei de Drogas o estado de necessidade? Saibam que não é
incomum! Não raras vezes eu denunciei traficantes que, em sua defesa dizem:
“juiz, eu tinha que traficar porque eu não tenho dinheiro para sustentar a minha
família, eu tenho quatro filhos e se não traficar, não consigo colocar dinheiro
dentro de casa e minha família morre de fome.” É argumento convincente? Não
há argumento convincente! A jurisprudência não reconhece o estado de
necessidade no tráfico. Eu vou até colocar uma passagem de jurisprudência
que achei interessante:

“Dificuldade de subsistência por meios lícitos não justifica


apelo a recurso ilícito, moralmente reprovável e socialmente perigoso.”

A quantidade da droga não é indicação suficiente para definir


se o crime é de tráfico ou porte para uso próprio. O art. 52, da Lei de
Pedro C. Canellas

Drogas diz que você, delegado, deve considerar, mais do que a quantidade,
outras circunstâncias. O promotor, quando vai denunciar, por um ou outro crime,
não pode se prender somente à quantidade. Idem o juiz na sentença.

Art. 52. Findos os prazos a que se refere o


art. 51 desta Lei, a autoridade de polícia judiciária,
remetendo os autos do inquérito ao juízo:
I - relatará sumariamente as circunstâncias
do fato, justificando as razões que a levaram à
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches47

classificação do delito, indicando a quantidade e


natureza da substância ou do produto
apreendido, o local e as condições em que se
desenvolveu a ação criminosa, as circunstâncias
da prisão, a conduta, a qualificação e os
antecedentes do agente; ou

O art. 52, I diz que um rol de circunstâncias que deve ser considerado
pelo delegado no momento do indiciamento, e essas circunstâncias têm que
ser consideradas pelo promotor no momento da denúncia, e pelo juiz,
no momento da sentença. Então, você não vai se prender somente à
quantidade. Mas é claro que se você prendeu numa rodovia alguém
transportando 500 quilos, pode ser o mais primário dos primários, não adianta
ele falar que era para uso próprio.

O crime de tráfico do art. 33, é claro, é punido a título de dolo. “Sem


querer eu importei droga”. Não! O crime é punido a título de dolo. É
imprescindível que ele saiba que a substancia que ele mantém em depósito é
droga, é imprescindível que ele saiba que é substancia proibida.

Quando que este crime se consuma? (Pergunta da Polícia Federal)


O crime do art. 33 se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos,
independentemente de obtenção de lucro. Tem núcleos que a consumação se
protrai no tempo. Alguns núcleos, a consumação se prolonga no tempo, em
alguns núcleos o crime é permanente.
Quais são as hipóteses de crime permanente na Lei de Drogas?

• Guardar,
• Manter em depósito,
• Trazer consigo

São núcleos permanentes. A consumação se protrai durante todo o


tempo em que você guardava, durante todo o tempo em que você mantinha em
depósito, durante todo o tempo em que você trazia consigo a droga.

Conclusões:
α ) Nessas hipóteses, admite flagrante a qualquer tempo.
β) Prescrição só começa a correr depois de cessada a permanência
χ) Superveniência de lei mais grave incide no caso (Súmula 711, STF)
Pedro C. Canellas

São núcleos que admitem flagrante a qualquer tempo. A qualquer


tempo do guardar, do manter em depósito, do trazer consigo admite flagrante.
Enquanto você guarda, mantém em depósito e traz consigo, não corre a
prescrição.

Se durante o guardar sobrevier lei mais grave, esta lei será aplicada ao
crime (Súmula 711, STF):
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches48

STF Súmula nº 711 - DJ de 13/10/2003 - A


lei penal mais grave aplica-se ao crime continuado ou
ao crime permanente, se a sua vigência é anterior à
cessação da continuidade ou da permanência.

Esse crime admite tentativa? Prevalece que a quantidade de


núcleos tornou inviável a tentativa. Eu falei que é unânime? Não. Eu disse que
prevalece! Esses 18 núcleos tornaram inviável a tentativa. Aquilo que poderia ser
considerado tentativa foi elevado à categoria de consumação. Prevalece que os
18 núcleos inviabilizaram a tentativa.

OBS.: Caiu na Polícia Federal essa questão e a resposta foi que admite
tentativa! Tem uma doutrina que admite tentativa, principalmente na
modalidade tentar adquirir. Parece claro que é uma modalidade tentada. Tem
uma minoria que admite a tentativa sim! Em qual núcleo? Tentar adquirir.

Resumindo e concluindo: para a maioria não admite tentativa porque


os núcleos inviabilizaram o conatus e para uma minoria é possível tentativa no
“tentar adquirir”.

O crime de tráfico é de perigo abstrato ou de perigo concreto?


Que é de perigo, ninguém dúvida. Mas qual perigo? Abstrato ou concreto?

a) Crimes de perigo abstrato – Nestes, o perigo é absolutamente


presumido por lei.
b) Crimes de perigo concreto – O perigo precisa ser comprovado.

O tráfico é crime de perigo abstrato ou crime de perigo


concreto? Prevalece que o tráfico é crime de perigo abstrato. Isto é, o perigo
advindo desse comportamento é absolutamente presumido em lei. O que eu
quero analisar? Quero analisar essa questão, observação importante, sob a ótica
do STF.

Para LFG trata-se de crime de perigo concreto indeterminado, não


exigindo uma vítima concreta, bastando a idoneidade lesiva da conduta para o
bem jurídico protegido

Como prevalece que o tráfico é crime de perigo abstrato, o perigo


Pedro C. Canellas

advindo desse comportamento é absolutamente presumido em lei. Mas eu quero


analisar essa questão sob a ótica do Supremo. Vamos dividir o Supremo em 3
etapas: Até 2005 (mais ou menos), 2005-2008 e depois de 2008 (mais ou
menos).

STF
Antes de 2005 Entre 2005 e 2008 Depois de 2008
Admitia crime de perigo Passa a repudiar crime de Admite, em casos
abstrato perigo abstrato – Ofende excepcionais, o crime de
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches49

o Princípio da Lesividade perigo abstrato. E a Lei


de Drogas é um caso
excepcional.

Antes de 2005, o STF admitia crime de perigo abstrato. Resolvi fazer


uma análise minuciosa dos julgados do Supremo e eu conseguir apurar esses
divisores de água. Até 2005 o Supremo admitia tranquilamente crime de perigo
abstrato. A partir de 2005, o STF passa a repudiar crime de perigo abstrato. E por
quê? Porque de acordo com o STF, ofende o princípio da lesividade. Então, até
2005, o Supremo vinha admitindo crime de perigo abstrato. A partir de 2005,
principalmente no estatuto do desarmamento, passa a repudiar crime de perigo
abstrato e, por conta dessa decisão, o Supremo diz que arma desmuniciada não
é crime. A partir de 2008, o Supremo começou a ser cutucado no seguinte
sentido: “Ô, Supremo, se você está falando que não existe crime de perigo
abstrato, você está falando que drogas é crime de perigo concreto? Tem que
comprovar que aquela quantidade de drogas apreendida pelo traficante colocou
em sério risco a sociedade? Aí o Supremo agora vem dizendo o seguinte: O STF
admite, em casos excepcionais, o crime de perigo abstrato. Num julgado recente,
até o Ministro Gilmar Mendes falou: “em casos excepcionalíssimos, vá lá.” E a Lei
de Drogas, tráfico, estaria nas exceções.

Olha só, vejam, como o Supremo, em 3 anos, de 2005 a 2008, está


oscilando. Tudo por que? Porque nesse período nós trocamos praticamente todos
os ministros do Supremo e cada ministro tem suas idéias. Dá para dizer que o
Supremo tem posição firmada? Não dá! No Estatuto do Desarmamento está
muito claro: o Supremo nega o crime de perigo abstrato, mas na Lei de Drogas,
eu não posso afirmar isso. Na Lei de Drogas, eu não posso afirmar isso.

Comentários após o 2º intervalo: O Supremo, ora fala que é de perigo


concreto, ora fala que é de perigo abstrato. Eu mostrei que estamos em um
período de transição. Agora, se você for nos mais recentes julgados do STF, o
crime é de perigo concreto. Tem um julgado recente que é de perigo abstrato?
Tem. Mas o mais recente de todos diz que é de perigo concreto. E ganhou por 3 a
2. Está tudo muito apertado. “Na minha prova, eu faço o quê?” Olha, a
experiência que estamos tendo em prova, a maioria está acompanhando que
arma sem munição é crime impossível. A maioria fica com essa jurisprudência. O
STJ, em agosto/2009, este mês, julgou que arma desmuniciada não é crime. O
STJ, que vinha resistindo! Eu trabalho com 56 juízes (atuo em 56 municípios) e
nenhum discorda que arma desmuniciada não é crime. Nenhum! Agora, concurso
Pedro C. Canellas

é f*, mesmo, se você pega um examinador que resolve adotar o mais recente
posicionamento do Supremo, tunga! Mas você recorre. Por isso não dá para cair
esse tipo de pergunta em primeira fase, para que você tenha como concordar ou
discordar da posição. Eu acho isso, mas o Silvio acha que o Supremo está
batendo na tecla do crime de perigo abstrato. E isso não é errado, mas nenhum
dos dois diz que o Supremo está definido. Não está. Pessoal, o STJ, que resistia a
isso, em agosto de 2009 decidiu nesse sentido!
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches50

Olha que questão boa para cair em concurso. Vamos imaginar


que eu tenha A, que traz consigo drogas. E ele está junto com B, que vigia se
algum policial aparece. A polícia foi avisada deste esquema criminoso. O policial
C simula ser consumidor e simula a compra. No momento em que A vende para
C, o que acontece? Casa caiu! Prende em flagrante! A, quando é preso diz? “Eu
não estou sozinho”. B, então, se ferrou junto! E com isso vêm junto D, E, F, G, H,
I, J, e por aí vai. Presos os dois. A tem que ser preso por qual crime? Vamos
às hipóteses:

1. Dá para denunciar A e B pela venda? NÃO. Porque a venda foi


provocada. Não foi espontânea. Era impossível de ser realizada. A venda era
crime impossível. Se o MP denuncia A e B pela venda, essa denúncia é rejeitada,
pois inepta. Está denunciando um fato atípico. Crime impossível!

2. Pode a denúncia falar que A e B traziam consigo? O trazer


consigo é o verbo correto porque o trazer consigo não foi provocado por
ninguém. Era um comportamento espontâneo, e mais, permanente! O trazer
consigo está certo. Está errado é você dizer que B trazia consigo. B não trazia. B
auxiliava A. Então, essa segunda hipótese também não está correta porque B,
não trazia. Ele era um partícipe.

3. A denúncia correta tem que dizer o seguinte: A, auxiliado por


B, trazia consigo. Agora está correto. Agora, você, promotor, falou que ‘A trazia
consigo”, corretíssimo porque o ‘trazer consigo’ é um comportamento
espontâneo e permanente, não foi provocado e B não trazia nada. Apenas
auxiliava. Era um partícipe.

Essa foi a pergunta da minha segunda fase do MP. Havia mais


detalhes, mas o problema, basicamente, exigia de vocês esse raciocínio. Um
monte de gente colocou que os dois venderam, outros que ambos traziam
consigo.

É possível tráfico em concurso de crimes? Quer dizer, é possível


tráfico em concurso com outros delitos? Perfeitamente possível! Por exemplo:
tráfico e furto em concurso. A pessoa que subtraiu a droga do traficante vai
responder por furto (subtraiu coisa alheia), mais tráfico (manter em depósito
substância proibida). Quem subtraiu a droga do traficante vai responder por
tráfico e furto.
Pedro C. Canellas

Outro exemplo: o traficante vende a droga e, em pagamento, recebe


um relógio que sabe ser produto de crime. Vendendo a droga, cometeu tráfico.
Recebendo coisa que sabe ser produto de crime, praticou receptação. É
perfeitamente possível tráfico e receptação.

Se vocês sabem que é possível concurso de crime no tráfico, eu quero


saber se é possível concurso de tráfico com sonegação fiscal. O declarante
não declarou no IR o lucro auferido com sua atividade ilícita. Vocês sabiam que o
Fernandinho Beira-Mar tem várias denúncias no Brasil inteiro? Alguns processos,
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches51

o FBM foi denunciado por tráfico + sonegação de IR porque não declarou a sua
renda anual, ainda que advinda da atividade ilícita. Está correto isso? Existe um
princípio do direito tributário que é o Princípio do Non Olet. O que significa
isso? “Dinheiro não tem cheiro”. Sua renda não tem cheiro. Pouco importa se
vem de atividade lícita ou ilícita, você tem que declarar. Mas esse é um princípio
de direito tributário. Para a maioria, aplicar esse princípio no direito penal é
obrigar o réu a produzir prova contra si mesmo. Olha que importante!

“Muitos negam a aplicação do non olet no direito penal porque


estaríamos obrigando o réu a produzir prova contra si mesmo.”

Então, nós que trabalhamos, podemos ser processados por sonegação


fiscal. Eles, que estão praticando atividade ilícita, não. Prevalece que a
maioria não admite o non olet no direito penal. Você, que trabalha
direitinho, sonega, para você ver!

Vamos ver a sanção penal do art. 33, caput:

Art. 33. Importar, exportar, remeter,


preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à
venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer
consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a
consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente,
sem autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar:
Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze)
anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e
quinhentos) dias-multa.

Na lei anterior, a sanção era de 3 a 15 anos. Então, estamos diante de


uma lei nova em prejuízo do réu.

Eu posso aplicar o princípio da insignificância no art. 33? O STF


só admitiu o princípio da insignificância no art. 28. No art. 33, não. O Supremo já
admitiu o princípio da insignificância na Lei de Drogas, mas para o usuário!

5.2. TRÁFICOS POR EQUIPARAÇÃO (art. 33, § 1º)


Pedro C. Canellas

Vamos para o art. 33, § 1º, que traz os tráficos por equiparação. Ele
diz: “nas mesmas penas incorre quem:”

§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:


I - importa, exporta, remete, produz, fabrica,
adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem
em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda
que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar, matéria-
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches52

prima, insumo ou produto químico destinado à


preparação de drogas;

Qual é a diferença do art. 33, caput, para o art. 33, § 1º, I? No


art. 33, caput, o objeto material nada mais é do que drogas. Aquilo assim
considerado na Portaria 344/98, da Portaria da SVS/MS. Já no art. 33, §1º, I, o
objeto material já não é droga. O objeto material é matéria-prima, insumo ou
produto químico destinado à preparação da droga. Então, a diferença de um para
o outro reside no objeto material do delito.

OBJETO MATERIAL: Drogas (Portaria 344/98


Art. 33, caput
SVS/MS)
OBJETO MATERIAL: Matéria-prima, insumo,
Art. 33, § 1º, I
produto químico (ex.: éter sulfúrico)

Exemplo: éter sulfúrico. Esta substancia não está na Portaria do


Ministério da Saúde, mas é uma substância apta a preparar drogas. Façam a
seguinte observação importantíssima:

“Não só as substâncias destinadas exclusivamente à


preparação da droga, mas abrange também as que, eventualmente, se
prestem a essa finalidade (exemplo: acetona).”

Esse crime, de manter em depósito, não droga, mas também é


indispensável agir sem autorização ou em desacordo com determinação legal.
Nas mesmas penas incorre quem:

I - importa, exporta, remete, produz, fabrica,


adquire, vende, expõe à venda, oferece, fornece, tem
em depósito, transporta, traz consigo ou guarda, ainda
que gratuitamente, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou
regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto
químico destinado à preparação de drogas;

Eis, aqui, novamente, o elemento indicativo da ilicitude. Você tem


que agir contrariando determinação legal ou regulamentar.
Pedro C. Canellas

Olha como eu não preciso explicar mais: e se a pessoa que tinha


autorização, desviou? Equivale à ausência de autorização, o desvio daquela
autorização.

A doutrina e a jurisprudência, sempre entenderam imprescindível, a


exemplo do caput, também aqui no § 1º, I, a perícia para saber se a substancia
era capaz de preparar droga. Mas vamos fazer uma observação. Eu falei que é
imprescindível que a perícia indique que a substância seja capaz de preparar
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches53

drogas. Eu falei que essa substância tem que ter o efeito psicotrópico? Não!
Então, anotem a observação importante:

“Não há necessidade de que as matérias-primas tenham, já de


per si, os efeitos farmacológicos.”

A substância não precisa, por si só, dar barato! Basta que ela sirva
para preparar drogas.

Obs.: Vocês viram que, finalmente, foi aprovado aquele tratado de


pessoas portadoras de deficiência, né? Com status de emenda constitucional. Foi
o primeiro tratado aprovado com status de emenda constitucional. Já está
aprovado e vai cair em concurso. O Brasil ratificou esse tratado e aprovou com
quorum de emenda constitucional.

Esse crime do inciso I, § 1º, é punido a título de dolo. E prestem


atenção no que consiste o dolo. O dolo consiste no seguinte: consiste em praticar
qualquer dos núcleos ali referidos (oferecer, fornecer, ter em depósito,
transportar, guardar consigo) sabendo que não tem autorização, sendo estes
produtos destinados à preparação de drogas. O que estou querendo dizer para
vocês? Prestem atenção: eu estou dizendo que o dolo consiste em você manter
em depósito éter sulfúrico, sabendo que o éter sulfúrico pode preparar drogas.
Em nenhum momento estou dizendo que o dolo consiste em manter em depósito
o produto para preparar drogas. Não. O dolo não é manter em depósito visando
preparar drogas. O dolo está em manter em depósito, sabendo que pode servir a
tal preparação. Entenderam a diferença? Uma coisa é você manter em depósito
para preparar a droga, então você tem que ter a finalidade da preparação. Outra
coisa é você manter em depósito sabendo que pode servir para preparar. Não
precisa ter a finalidade de empregá-la nesse fim.

“O crime é punido a título de dolo, devendo o agente, com


consciência e vontade, praticar qualquer dos núcleos do tipo, ciente de
que o objeto material pode servir à preparação de droga (dispensa a
vontade de querer empregar o produto na preparação da droga).”

Se consuma com a prática de qualquer um dos núcleos,


lembrando que alguns são permanentes. E aí vocês já sabem a consequência de
um crime permanente. A doutrina admite a tentativa!
Pedro C. Canellas

§ 1º Nas mesmas penas (5 a 15 anos) incorre


quem:
II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem
autorização ou em desacordo com determinação
legal ou regulamentar, de plantas que se constituam
em matéria-prima para a preparação de drogas;
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches54

Vejam que aqui não estou mais falando em drogas, não estou mais
falando em produtos que sirvam a preparação de drogas. Estou falando de
plantas que se constituem em matéria-prima. Vamos analisar com calma isso
aqui.

Reparem que esse crime também exige o elemento indicativo da


ilicitude: vejam que fala em “sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar”. Então, reparem que é imprescindível agir
sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

A planta não precisa apresentar o princípio ativo. A lei diz que


essa planta é matéria-prima, então, pode ser acrescentado à planta o princípio
ativo. Não precisa a semente já fazer brotar uma planta com princípio ativo.

Que crime pratica aquela pessoa que cultiva, aí colhe e prepara


a droga em casa? Ele responde pelos dois crimes? Cultivar + manter em
depósito drogas? Não. Aí o cultivo fica absorvido. Ele responde por um só crime.
Vamos supor que ele plantou um pé de maconha, colhe, guarda a maconha e
mantém em depósito. Ele não vai responder pelos dois crimes: cultivar e manter
em depósito a droga. O produto final absorve o cultivo. O art. 33, § 1º, II fica
absorvido.

Eu quero saber de vocês, que crime pratica uma pessoa que planta
para uso próprio. Temos que analisar antes e depois da Lei 11.343/06.

PLANTAR PARA USO PRÓPRIO


ANTES da LEI 11.343/06 DEPOIS da LEI 11.343/06
1ª Corrente: Art. 12, § 1º, I
(Pena: 3 a 15 anos)

O art. 33, § 1º, I


 A lei incrimina o cultivo ilegal,
não importando sua finalidade
ou
2ª Corrente: Art. 16

O art. 28, §1º,


 Analogia in bonam partem
3ª Corrente: Fato atípico
 Dependendo das
circunstâncias
 Não há finalidade de comércio
 O art. 16 não pune cultivar
Pedro C. Canellas

plantas

Antes da Lei 11.343/06, plantar para uso próprio, para uma primeira
corrente, configurava o art. 12, § 1º, II, da Lei de Drogas, com uma pena de 3 a
15 anos. Essa primeira corrente dizia o quê? Cultivar plantas. Para essa primeira
corrente, a lei discrimina o cultivo ilegal, não importando sua finalidade. Vejam
que jogava quem plantava para si ou quem plantava para terceiro nas mesmas
penas de 3 a 15 anos. Uma segunda corrente dizia, não! Ele vai responder pelo
art. 16, fazendo uma analogia in bonam partem. Uma terceira corrente falava
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches55

que o fato era atípico. Ela dizia o seguinte: não há finalidade de comércio. Se não
há finalidade de comércio, não pode ser o art. 12. aí dizia ainda que o art. 16 não
pune cultivar plantas. Então, na verdade, essa analogia que você está fazendo é
em malam partem. Portanto, não pode ser o art. 16. Não tem previsão legal, o
fato é atípico. Então, para essa corrente, todo mundo poderia ter o seu pezinho
em casa. Cuidou dele, para uso próprio, o fato era atípico. Pessoal, essa última
era, tecnicamente, a corrente mais correta. Mas não era a que prevalecia.
Prevalecia a segunda.

Hoje, a questão está tranquila porque hoje pode configurar o art. 33, §
1º, I ou o art. 28, §1º, dependendo das circunstâncias. Vamos ver o que diz o art.
28, §1º:

§ 1º Às mesmas medidas submete-se quem,


para seu consumo pessoal, semeia, cultiva ou colhe
plantas destinadas à preparação de pequena
quantidade de substância ou produto capaz de causar
dependência física ou psíquica.

Se for uma pequena quantidade, é o art. 28, §1º. Se não for


pequena quantidade, é o art. 33, §1º, II, mesmo que para uso próprio.

Se você plantou para uso próprio, é a quantidade que vai determinar


se a incidência será do art. 33, § 1º, II ou se será a do art. 28, § 1º. Se você
plantou pequena quantidade, art. 28, § 1º. Se não pequena quantidade, art. 33, §
1º, II.

“O crime também é punido a título de dolo e se consuma com a


prática de qualquer uma das condutas.”

Na modalidade ‘cultivar’, que é manter a plantação, o crime é


permanente.

A doutrina admite a tentativa.

Art. 32, § 4º As glebas cultivadas com


plantações ilícitas serão expropriadas, conforme o
disposto no art. 243 da Constituição Federal, de acordo
Pedro C. Canellas

com a legislação em vigor.

O que o art. 32, § 4º, está prevendo para as pessoas que plantam
drogas na sua propriedade? A conhecida expropriação-sanção. O art. 243, da
CF, diz o seguinte:

Art. 243 - As glebas de qualquer região do


País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas
psicotrópicas serão imediatamente expropriadas e
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches56

especificamente destinadas ao assentamento de


colonos, para o cultivo de produtos alimentícios e
medicamentosos, sem qualquer indenização ao
proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas
em lei.

Então, aquela pessoa encontrada, mantendo na sua residência, na sua


propriedade cultivo de substancias ilegais, expropriação-sanção. Perde a
propriedade. Sem indenização e ainda vai responder pelo crime. O que quero
saber de vocês: e se for a única casa, e se for o único imóvel? Vocês sabem
que o único imóvel de uma pessoa é considerado por lei como bem de família e
vocês sabem que é impenhorável. Pode ocorrer expropriação-sanção? E se eu
falar que ele tem uma esposa e quatro filhos?

Vocês vão encontrar doutrinadores dizendo que se é o único imóvel,


não poderá ser objeto de expropriação. Mas eu pergunto: a Constituição
excepcionou alguma coisa? Não:

“É legítima a expropriação de bem de família pertencente ao


traficante, sanção compatível com a CF, e com as exceções previstas no
art. 3º da Lei 8009/90 (traz as hipóteses de penhorabilidade do bem de
família).”

O inciso III, do § 1º, do art. 33 também pune com 5 a 15 anos quem:

III - utiliza local ou bem de qualquer natureza


de que tem a propriedade, posse, administração,
guarda ou vigilância, ou consente que outrem dele se
utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou
em desacordo com determinação legal ou
regulamentar, para o tráfico ilícito de drogas.

Prestem atenção nesse crime. Ele é importantíssimo. Ele tem uma


redação extensa. Mas, em apertada síntese, o que ele está punindo? Com 5 a 15
anos aquela pessoa que utiliza o seu imóvel para que alguém lá realize o
comércio de drogas. Ele permite que alguém utilize o seu carro para com ele
realizar o comércio ilegal de drogas. Então, ele usa o local ou bem de qualquer
natureza de que tem a propriedade, posse, administração guarda ou vigilância,
Pedro C. Canellas

ou consente que outrem dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem


autorização legal para o tráfico de drogas. Pune aquele que diz: “você quer
vender drogas? Fique tranquilo. Vende na minha chácara. Os consumidores vão
até lá e lá você realiza o comércio ilegal.” Quem faz isso, incorre no art. 33, § 1º,
III. Caiu em concurso, do MP/RJ, em 16/08/09. Para vocês verem como o concurso
quando quer ser cruel, o que faz (já falo nisso!). Vocês viram que pode praticar
esse crime o proprietário, o possuidor, o administrador ou o gerente do imóvel,
por exemplo. Anotem aí:
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches57

“É irrelevante se o agente tem a posse do imóvel legítima ou


ilegitimamente, bastando que a sua conduta seja causal em relação ao
uso de drogas no local.”

Ele precisa ter a finalidade de lucro? Não! O sujeito ativo não


precisa visar lucro. Eu posso emprestar aminha propriedade simplesmente para
agradar o amigo que é traficante. Pronto e a acabou. Não preciso, com a minha
conduta, buscar lucro. Dispensa a finalidade de lucro.

Quando que o crime se consuma? Temos que diferenciar duas


situações. Temos dois tipos de comportamento punido:

1. Utilizar local ou bem de qualquer natureza de que tem a


propriedade, pose, administração, guará ou vigilância,
2. Consentir que outrem se utilize dele, ainda que gratuitamente.

Na primeira hipótese o crime se consuma com o efetivo proveito do


local.
Já na segunda hipótese, ou seja, o consentimento, basta a mera
permissão.

Admite tentativa? Sim! As duas hipóteses admitem tentativa. Até na


hipótese consentir? Sim. No consentimento por escrito.

UTILIZAR LOCAL ou CONSENTIR


ANTES da LEI 11.343/06 DEPOIS da LEI 11.343/06
Art. 12, § 1º, II - Utilizar local ou Art. 33, § 1º, III - Utilizar local
consentir ou consentir
a) Para o TRÁFICO α ) Para o TRÁFICO
b) Para o USO (Pena: 5 a 15 anos)
(Pena: 3 a 15 anos) β ) Para o USO – incide o art.
33,§ 2º
(Pena: 1 a 3 anos)

Antes da Lei 11.343/06 esse comportamento estava no art. 12, § 2º, II.
E, vejam, esse dispositivo punia quem utilizava local ou consentia para o tráfico
ou para o uso, ambos comportamentos punidos com pena de 3 a 15 anos.
Pedro C. Canellas

Com a Lei 11.343/06, o art. 33, §3º, III, pune quem utiliza ou consente
a utilização por outrem, visando o tráfico. Para tráfico. Vejam que a lei nova não
mais pune com pena de tráfico, agora 05 a 15 anos, para lá somente usarem.

Antes, se você emprestasse a sua chácara para alguém traficar ou se


você emprestasse sua chácara para alguém usar drogas, você respondia nas
penas do art. 12, § 2º, II, 03 a 15 anos. Hoje, você só responde nas penas do
traficante, 5 a 15 anos, se você utiliza ou consente que alguém utilize a sua
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches58

chácara para o tráfico. Não abrange mais o uso. Mas e se eu emprestar minha
chácara para alguém usar drogas, o que acontece? Hoje, se for para uso, passa a
ser o art. 33, § 2º, da Lei de Drogas e a pena é de 1 a 3 anos. Reparem a
mudança. Antes, emprestar a chácara para alguém usar, sua pena era de 3 a 15,
como se traficante fosse. Hoje, emprestar sua chácara para alguém, só usar, é o
art. 33, § 2º, da Lei de Drogas, com pena de 1 a 3 anos.

Vamos ver o 33, § 2º, o que pune:

§ 2º Induzir, instigar ou auxiliar alguém ao


uso indevido de droga:
Pena - detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos, e
multa de 100 (cem) a 300 (trezentos) dias-multa.

Esse dispositivo pune a pessoa que acaba induzindo, instigando ou


auxiliando alguém a usar drogas.

 Induzindo – fazendo nascer a idéia


 Instigando – reforçando idéia já existente
 Auxiliando – prestando assistência material

São três as formas de você praticar o art. 33, § 2º. No induzir você, “já
experimentou dar uns tapinhas?” Você fez nascer a idéia. No instigar, “estou
pensando a usar drogas, o que você acha?” E no auxiliar, você, por exemplo,
apresenta o usuário ao traficante, leva até o morro, empresta o seu imóvel para
o usuário usar drogas, empresta dinheiro para o usuário comprar drogas.

É imprescindível que o sujeito ativo, nesse comportamento, vise


pessoa certa e determinada. Se a conduta dele se direciona a pessoas incertas e
indeterminadas, aí você não tem mais esse crime, você tem apologia ao crime.

“O incentivo genérico, dirigido a pessoas incertas e


indeterminadas, caracteriza o delito do art. 287, do CP.”

E aí vocês estão entendendo por que o Ministério Público ingressa com


ação impedindo marcha para legalização das drogas. É que a jurisprudência
está questionando se essa marcha é mesmo apologia ao crime. Por que? Porque
na marcha, entende-se que você não está incentivando alguém a usar, mas
fomentar o legislador a legalizar. Então, a marcha não está dizendo “usem
Pedro C. Canellas

drogas”, mas está dizendo “legislador, pare de punir o uso”. Por isso que essa
marcha, em alguns Estados consegue habeas corpus. Os líderes obtém o habeas
corpus e a marcha sai normalmente. Uma coisa é você desfilar incentivando o
uso. Outra coisa é você desfilar incentivando o legislador a não mais punir. Coisa
totalmente diferente. É fato atípico.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches59

Esse crime de induzir, instigar, auxiliar, é punido a título de dolo, ou


seja, você empresta o dinheiro sabendo que ele vai comprar a droga. Você tem
que ter consciência de que está colaborando, de qualquer forma, para o uso.

Quando se consuma? Aqui que a coisa pega!

INDUZIR, INSTIGAR, AUXILIAR


DEPOIS da LEI
ANTES da LEI 11.343/06
11.343/06
Induzir alguém AO USO
Induzir alguém A USAR
 Crime FORMAL – dispensa o
 Crime MATERIAL – consuma-se
efetivo uso.
com o efetivo uso *
*Prevalece que o delito é MATERIAL

A lei anterior punia induzir alguém a usar. Agora, a lei pune: induzir
alguém ao uso. E aí? A redação com base na lei anterior fomentava a doutrina a
dizer que o crime é material, consumando-se com o efetivo uso. Se ela induzisse
alguém a usar, enquanto esse alguém não usasse, o crime não estava
consumado. Agora, é induzir alguém ao uso indevido. Particularmente, eu acho
que essa mudança repercutiu. O crime agora é formal. Dispensa o efetivo uso.

Porém, na doutrina, não é o que permanece. Prevalece que o delito


permanece material. Mesmo com essa mudança de redação, o delito permanece
material. Vicente Greco Filho.

É possível tentativa? Sim. No induzimento por escrito.


Exemplo: carta que induz ao uso indevido.

O art. 33, § 3º, reparem, está no delito de tráfico. A doutrina chama


isso de tráfico de menor potencial ofensivo. Está caindo em concurso como
se fosse uma figura do uso. Pessoal, não é uma figura do uso. É um tráfico com
consequências, eventualmente, do usuário. Se fosse caso de uso, não estaria no
33, mas sim no 28!! Mas prova do Cespe embaralhou isso daqui.

§ 3º Oferecer droga, eventualmente e


sem objetivo de lucro, a pessoa de seu relacionamento,
para juntos a consumirem:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 1 (um)
Pedro C. Canellas

ano, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.500 (mil e


quinhentos) dias-multa, sem prejuízo das penas
previstas no art. 28.

Quem é o sujeito ativo? Esse crime não pode ser praticado por
qualquer pessoa. Esse crime exige que o sujeito ativo e o consumidor tenham
uma relação especial. Os envolvidos têm que ser pessoas relacionadas. Devem
manter um relacionamento de qualquer ordem, familiar, amoroso, de amizade. É
imprescindível que o sujeito ativo ofereça a droga para alguém especial, ou seja,
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches60

de seu relacionamento. Se não for do seu relacionamento, é tráfico! Cai no 33,


caput. Aqui se exige uma relação jurídica ou de fato.

Qual é a conduta punida? É oferecer droga. Porém, vamos


enriquecê-la. Qualquer oferecimento de droga a pessoa de seu relacionamento
configura este crime? Não! Cuidado!
O oferecimento tem que ser:

1º) Oferecimento eventual – Se for um oferecimento habitual,


reiterado, cai no 33, caput, traficante! Pena de 5 a 15. Então, cuidado! O
oferecimento tem que ser eventual! E sem objetivo de lucro, se tiver, vai para o
caput, tráfico, equiparado a hediondo.

2º) A finalidade do agente tem que ser consumo conjunto –


Você tem que oferecer, eventualmente, mas para consumo conjunto. Se você
oferece eventualmente, mas não vai consumir com essa pessoa, esqueça o 33, §
3º. Você cai no caput. Tem que ser oferecimento para juntos consumirem. Se não
houver a elementar ‘para juntos consumirem’, esqueça o 33, §3º, vai cair no
caput. Esse ‘para juntos consumirem’, é um elemento subjetivo positivo do
tipo. Rogério, o que você quer dizer com isso? Ele tem que estar presente! E
temos um segundo elemento subjetivo do tipo:

3º) Sem objetivo de lucro – É o elemento subjetivo negativo do


tipo. Não pode estar presente! Se estiver presente o objetivo de lucro, 33, caput.
Então, para juntos consumirem, elemento subjetivo positivo. Sem objetivo de
lucro, elemento subjetivo negativo. Aqui o lucro pode ser direto ou indireto, se
houver lucro, é tráfico. Exemplo de lucro indireto: eu te dou a droga, se gostar,
volta para comprar. Elemento subjetivo negativo do tipo= “sem objetivo de
lucro”.

Quando que este crime se consuma? Com o efetivo uso? Não! Ele
se consuma com o oferecimento, dispensando o consumo.

É de menor potencial ofensivo, pena de 6 meses a 1 ano, sem


prejuízo das penas previstas no art. 28. Por isso que eu defendo que o art. 28 não
tem pena porque se tivesse pena, eu estaria diante de um bis in idem. Estaria
respondendo por duas penas em face do mesmo crime. Por isso, eu defendo que
o art. 28 é medida extrapenal. Mas tudo bem, não é o que prevalece. Prevalece
que o art. 28 é pena.
Pedro C. Canellas

Está errada a prova que chama o 33 de 28. Se fosse 28, ele teria as
penas do art. 28 e vejam que ele tem pena diferente. E é de menor potencial
ofensivo.

Agora, vejam, deixa eu falar o que caiu no MP/RJ, antes de ir para o


próximo parágrafo. Presta atenção como é concurso público! O MP/RJ, na
primeira questão, que valia só 5 pontos (de 100), falou o seguinte: no dia
06/08/09 (olha a data!), uma mulher, coagida pelo marido que estava preso,
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches61

levou para esse marido um celular e foi surpreendida entrando com o celular no
estabelecimento prisional. Que crime ela praticou? Pois é! A lei é do dia 06/08/09,
não tem vacatio. E o fato ocorreu no dia 06/08/09. Posso aplicar o crime novo
para ela? Não! É que a lei só foi publicada no dia 07! Sacanagem! Então, vejam,
o fato ocorreu dia 06. A lei é o dia 06, mas vem dizendo: “esta lei entra em vigor
na data da sua publicação” e foi publicada dia 07, então, ela não praticou crime
algum. Era fato atípico até então. Se fosse dia 07, ela teria praticado um crime.
Ela teria praticado um fato típico, ilícito, mas não culpável, pois sob coação moral
irresistível. E o marido teria praticado, não só esse crime, na condição de autor
mediato, como também tortura para fins de atividade criminosa.

É possível tentativa no art. 33, §3º? É possível, no oferecimento


por escrito.

§ 4º Nos delitos definidos no caput e no § 1º


deste artigo, as penas poderão ser reduzidas de um
sexto a dois terços, vedada a conversão em penas
restritivas de direitos, desde que o agente seja
primário, de bons antecedentes, não se dedique às
atividades criminosas nem integre organização
criminosa.

O art. 33,§ 4º traz o que a doutrina está chamando de tráfico


privilegiado. Traz uma causa especial de diminuição de pena. Para que
ocorra essa causa especial de diminuição de pena, é imprescindível que o
agente:

o Delito definido no art. 33 caput e § 1º (o privilégio não abrange


os §§ 2º e 3º)
o Seja primário
o Seja de bons antecedentes
o Não se dedique a atividades criminosas
o Nem integre organização criminosa

Os requisitos são cumulativos! Faltando um deles, acabou! Não tem


direito a redução. Presentes todos os requisitos, o juiz tem que reduzir a
pena, porque é direito subjetivo do réu( natureza jurídica).
Pedro C. Canellas

O quantum da diminuição:
O juiz pode reduzir a pena de quanto? 1/6 a 2/3. Pergunto: ele
varia de 1/6 a 2/3 com base no quê? Se o juiz for ficar olhando se ele é primário,
de bons antecedentes, o juiz vai ter que reduzir no máximo, porque é obrigatório
ser primário. Qual é o critério? Antecedente não, porque já é requisito do
privilégio.

o Tipo da Droga
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches62

o Quantidade da Droga
o Demais circunstâncias judiciais do art. 59, do Código Penal
A 2ª turma do STF, no julgamento do HC 106135, decidiu que a
variação da redução de pena prevista no §4º não deve
considerar a quantidade da droga, circunstância já analisada
na fixação da pena base, sob pena de incorrer em “bis in
idem”. ( decisão recente, abril de 2011)

O juiz varia a diminuição de 1/6 a 2/3 considerando o tipo e a


quantidade da droga e as demais circunstâncias judiciais do art. 59, do CP.

Qual é a pena mínima do tráfico? 5 anos. Se reduzido de 2/3, essa


pena chega a 1 ano e 8 meses. Se chegar a isso, cabe restritiva de direitos, mas
o que o legislador já está falando?

§ 4º (...) vedada a conversão em penas restritivas de direitos,


desde que o agente seja primário, de bons antecedentes, não se dedique às
atividades criminosas nem integre organização criminosa.

O STJ está discutindo se essa vedação é constitucional. Parece


inconstitucional. Crimes mais graves têm direito a restritiva de direitos. Por que
vedar para esse traficante privilegiado? O STJ submeteu ao seu órgão colegiado
máximo. O STJ está discutindo se a vedação à restritiva de direitos no tráfico é
constitucional. “Rogério, mas o STJ não pode analisar a inconstitucionalidade!”
Incidenter tantum, pode, né?

No dia 01/09/2010, o STF, julgando o HC 97.256, decidiu que a


vedação da substituição da pena privativa de liberdade em restritiva de direitos é
inconstitucional, pois quem deve analisar o cabimento ou não do benefício é o
juiz, na análise do caso concreto. O Pleno discordou de vedações de garantias
penais e processuais penais com base na gravidade do crime em abstrato. Não
pode o legislador substituir-se ao magistrado no desempenho de sua atividade
jurisdicional

PENAL – HABEAS CORPUS – TRÁFICO DE


DROGAS – CRIME PRATICADO SOB A ÉGIDE DA LEI
11.343?2006 – REDUÇÃO MÍNIMA DO ARTIGO 33, §
4º DA LEI 11.343?2006 – AUSÊNCIA DE
MOTIVAÇÃO – EXAME FAVORÁVEL DE TODAS AS
Pedro C. Canellas

CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS – AGENTE PRIMÁRIO


E POSSUIDOR DE BONS ANTECEDENTES –
REDUÇÃO MÁXIMA – SUBSTITUIÇÃO DA PENA
PRIVATIVA DE LIBERDADE EXPRESSAMENTE
PROIBIDA – ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.
1. Se o legislador da Lei 11.343?06 não
forneceu especificamente os requisitos para fixação do
quantum da diminuição prevista no seu artigo 33, § 4º,
impõe-se como critério a observância da análise das
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches63

circunstâncias judiciais, não só as constantes do artigo


59, do Código Penal, como as demais mencionadas na
Lei Antidrogas, e amplamente utilizadas como
referencial quando se trata de fixação das penas
previstas.
2. Reconhecidos em favor do paciente os
requisitos legais da causa especial de aumento, sendo-
lhe favorável o exame de todas as circunstâncias
judiciais, além de que pouca droga foi encontrada sob
sua responsabilidade e o laudo se refere apenas à
cocaína, afastada a diversidade da substância, ainda
que apresentada de formas diferentes, a redução da
pena pela minorante prevista no parágrafo 4º do artigo
33 da Lei 11.343?2006 deve ser realizada no patamar
máximo.
3. A Lei Antidrogas proíbe expressamente a
substituição da pena privativa de liberdade por
restritiva de direitos aos condenados pelo tráfico de
drogas, não se tratando de norma inconstitucional,
porquanto não contraria a Carta Magna, mas visa punir
com maior severidade os autores desse crime
hediondo.
4. Admite-se, tão-só, a substituição da pena
privativa de liberdade por restritivas de direitos quando
se tratar de crime cometido sob a égide da Lei 6368?
76, pois até então a restrição só alcançava os crimes
cometidos com violência ou grave ameaça à pessoa,
não se podendo ampliar o leque de restrição então
estabelecido naquela oportunidade.
5. Ordem parcialmente concedida para elevar
o quantitativo de diminuição em virtude da minorante
específica”.

A questão que pega é a seguinte. E aqui eu tenho dó, com toda


sinceridade do mundo. Eu prestei concurso numa época em que concurso não
dava bola para STF e STJ. Cada concurso se preocupava com a posição do seu
tribunal. A tendência hoje, notadamente nas provas do Cespe é STF e STJ. Tanto
que o Conselho Nacional do MP tem uma resolução rascunhada dizendo que na
Pedro C. Canellas

primeira fase de concurso não pode colocar divergência doutrinária e


jurisprudencial. Não pode! Se, eventualmente, quiser colocar uma questão que
traga divergência, a resposta tem que estar de acordo com a posição dos
tribunais superiores. Eu acho legal porque evita, como aconteceu com um
candidato na magistratura/SP, que o candidato defenda a posição do STF e erre a
posição do examinador, o que é absurdo. O problema é que os tribunais mudam
constantemente seu entendimento. Cuidado quem estuda com informativo! Tem
gente que só estuda com informativo. Cuidado! O aluno já me mandou: “Rogério,
você falou que porte de arma é crime de perigo concreto? O STF, no último
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches64

informativo, falou que é de perigo abstrato!” O STF ou uma turma do STF num
julgado que está destoando dos demais??? Você tem novos ministros que tentam
impor o seu entendimento e, por ausência de um ou outro ministro no dia da
votação, ficou 2 a 1. Se os outros dois ministros estivessem presentes virava 3 a
2. E você estuda aquele informativo como se fosse absoluto. Pessoal, prevalece,
no STF que o porte de arma (porte de arma só! Ninguém está falando de porte de
arma de uso proibido ou de porte de arma raspada, aí é outra história) exige
perigo concreto. Pronto e acabou. Cuidado para quem estuda por informativo. E
eu vou mostrar isso claramente para vocês agora.

TRÁFICO do primário e de bons antecedentes


ANTES da LEI 11.343/06 DEPOIS da LEI 11.343/06
Art. 12 – Pena: 3 a 15 anos
 Criminoso PRIMÁRIO + BONS Art. 33 – Pena: 5 a 15 anos
ANTECEDENTES: Considerava  Criminoso PRIMÁRIO + BONS
para fixação da pena-base (Art. ANTECEDENTES: Pena reduzida
59, CP)Era circunstância judicial de 1/6 a 2/3 (Art. 33, § 4º)
favorável.

Antes, o tráfico estava no art. 12, com pena de 3 a 15. Pergunto: e o


criminoso primário e de bons antecedentes. O que o juiz fazia com ele? Ele
considerava essas características na fixação da pena-base. Acabou. Agora, com a
Lei 11.343/06, o tráfico está no art. 33. A sua pena é de 5 a 15 anos. E no caso de
um criminoso primário e de bons antecedentes, ele tem direito a uma redução da
pena que varia de 1/6 a 2/3.

Será que essa redução que está no § 4º é retroativa, atingindo


os tráficos pretéritos? Retroage para alcançar fatos praticados na lei anterior?
Aquele traficante então condenado a três anos sem direito a redução, vai poder
reduzir a pena?

1ª Corrente: “Tratando-se de retroatividade benéfica, admite-se (art.


2.º, § único, do Código Penal). – 2ª Turma do STF.

2ª Corrente: “A diminuição retroage, mas deve respeitar o saldo


mínimo de 1 ano e 8 meses.” Essa segunda corrente fez o seguinte: a redução de
2/3 em cima de 5 anos vai dar 1 ano e 8 meses. Então, eu permito uma
Pedro C. Canellas

retroatividade sobre três anos, desde que fique um saldo mínimo idêntico, de 1
ano e 8 meses. Repetindo: por que ela quer um saldo mínimo de 1 ano e 8
meses? Reduzir 5 anos de 2/3 dá 1 ano e 8 meses. Então, ela pode reduzir 1/6 a
2/3 da pena aplicada anterior, mas deve respeitar o mesmo saldo, de 1 ano e 8
meses.STJ( observar antes de retirar)

1ª Corrente: “Não se admite a retroatividade, pois essa operação


implica combinação de leis., transformando o juiz em legislador” - STJ.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches65

2ª Corrente: admite-se combinação de leis STJ, e ai eles


discutem:

2.1 Corrente: Retroage sem a necessidade de se respeitar saldo


mínimo ( prevalece esta corrente no STJ)
2.2 corrente: admite retroatividade limitada a pena mínima de 1 ano
e 8 meses.

O STF :

1ª corrente: não é possível, negando combinação de leis.( prevalece


esta corrente no STF)
2ª corrente: é possível, admitindo combinação de leis.

Tudo o que vocês anotaram sobre o art. 33, tudo, foi dissertação do
MP/SP. No último concurso do MP/SP a dissertação foi: tráfico. Ponto. É pra falar
tudo. Vamos ao art. 34:

Art. 34. Fabricar, adquirir, utilizar,


transportar, oferecer, vender, distribuir, entregar a
qualquer título, possuir, guardar ou fornecer, ainda que
gratuitamente, maquinário, aparelho, instrumento ou
qualquer objeto destinado à fabricação, preparação,
produção ou transformação de drogas, sem autorização
ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar:
Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos,
e pagamento de 1.200 (mil e duzentos) a 2.000 (dois
mil) dias-multa.

Vejam que a quantidade de dias-multa aqui é pior do que para o


tráfico. O legislador conhece muito bem o princípio da proporcionalidade. Ele
diminui a privativa de liberdade, mas carca na pena de multa, brilhante! No
Brasil, vocês vão ver que é mais grave chamar o idoso de velho babão, do que
fazer uma rixa e matar esse idoso. Chamou de velho babão, sua pena é de 1 a 3.
Se você participar de uma rixa e matar o idoso, 6 meses a 2 anos, você paga
com cesta básica. Você ta com raiva do velho? Não xinga! Faz uma rixa e espeta!
É o nosso legislador!
Pedro C. Canellas

O art. 34 traz o tráfico de maquinários. O que significa isso? Que nós


mudamos o objeto material. No art. 33, caput, vocês viram que o objeto material,
nada mais é do que drogas. O 33, § 1º, I, o objeto material é matéria-prima. O
art. 31, § 1º, II, o objeto material é plantas. E agora, o art. 34, tem como objeto
material, maquinários.

DISPOSITIVO OBJETO
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches66

MATERIAL
Art. 33, caput
Drogas
Pena: 5 a 15
Art. 33, § 1º, I Matéria-prima
Art. 33, § 1º, II Plantas
Art. 34
Maquinários
Pena: 3 a 10

Nós mudamos o objeto material do delito. No art. 33, a pena é de 5 a


15. No art. 34, a pena é de 3 a 10. Detalhe: o art. 34 é um delito subsidiário.
Ou seja, se com os maquinários você produziu drogas, a conduta de manter em
depósito as drogas, configura o 33, ficando o 34 absorvido. Você só
responde pelo 34 se não praticou o 33. Se praticou o 33, o 34 fica absorvido. É
um delito subsidiário. Resumindo: se praticados no mesmo contexto fático, o art.
34 fica absorvido pelo art. 33 da Lei 11343, pois o art. 34 é delito subsidiário
( maquinário que produz cocaína)

o Quem é o sujeito ativo? Crime comum, pode ser praticado por


qualquer pessoa.
o Quem é a vítima? A coletividade!

Nós temos 11 núcleos no art. 34, não vou ficar explicando cada um
deles, mas o sujeito ativo, tem que agir sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, ou seja, elemento indicativo da
ilicitude. Eu estou batendo nessa tecla, porque você, quando for oferecer uma
denúncia, tem que constar isso da denúncia.

E você tem que praticar esses núcleos sobre “maquinário, aparelho,


instrumento ou qualquer objeto destinado à fabricação, preparação, produção ou
transformação das drogas.” Esse é o objeto material. Pergunto: quem me dá um
exemplo? Tem que ser um instrumento criado com a finalidade exclusiva de
preparar drogas ou pode ser qualquer instrumento, desde que aplicado pelo
traficante a esse fim, a esse destino? O que você acha?

“Não existem aparelhos de destinação exclusivamente a essa


finalidade. Qualquer instrumento ordinariamente usado em laboratório
químico, por exemplo, pode vir a ser utilizado na produção de drogas.”

Então, a balança de precisão não tem a finalidade só de produzir


Pedro C. Canellas

drogas, mas se destacada a esse fim, acabou. Configura o crime. Sabe o que vai
cair na sua prova? Lâmina de barbear. Configura o crime? A polícia entra na casa
e encontra uma lâmina de barbear com restos de cocaína, configura o crime? É
só você raciocinar. A lâmina de barbear serve para produzir droga ou para
separar droga já produzida? Separar droga já produzida. Então, cuidado! Lâmina
de barbear não configura esse crime, não se destina a essa finalidade, e sim,
separar droga.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches67

A doutrina entende imprescindível o exame pericial, para atestar


a capacidade do instrumento na produção de drogas. Os objetos apreendidos
têm que ser submetidos à perícia.

Tipo subjetivo: O crime é punido a título de dolo, e quando que


se consuma? Com a prática de qualquer um dos núcleos( lembrando que temos
núcleos que configuram crime permanente, por exemplo, guardar), sendo
perfeitamente possível a tentativa, pelo menos na teoria( crime
plurisubssistente) (posição da doutrina). Dispensa a produzir da droga! Se
produzir droga, o crime fica absorvido. Aliás, se produzir droga, responde só pelo
33, o 34 fica só absorvido.

Qual é a pena? 3 a 10 anos. Olha só que interessante! Presta atenção


nesse detalhe: o art. 33, caput que traz tráfico de drogas, é punido com 5 a 15
anos, já o art. 34, que pune o tráfico de maquinários, é punido com 3 a 10 anos.
Eu acho justa essa diferença de pena porque lá ele está trabalhando com a droga
pronta (mais perigoso) e aqui, ainda com os maquinários. Concordam que a
primeira conduta é mais perigosa? Mas olha o detalhe. Se no caput do art. 33
(tráfico de drogas), ele é primário + portador de bons antecedentes, ele tem
direito a quê? Redução de 1/6 a 2/3. Quer dizer que a pena mínima dele pode ser
de 1 ano e 8 meses. Tem essa redução no art. 34 (tráfico de maquinários)? Não
tem! E agora? Quer dizer, se ele é primário + bons antecedentes no art. 34, a
pena dele é 3 anos. E se é primário no 33 (tráfico de drogas), a pena dele é de 1
ano e 8 meses, o que vocês acham? Está certo isso? Se você é primário, para quê
ficar com a balança? Já fica com a droga! No art. 59, a pena não pode ficar menor
do que o mínimo. E aí? Sabe o que acontece? A doutrina já está pregando
analogia in bonam partem. Já está aplicando o art. 33, § 4º, no art. 34. Já está
estendendo o privilégio do 33 para o 34. Isso é doutrina! Na prática não há
jurisprudência sobre o tema. E nem todos os doutrinadores comentam isso.

Art. 33 (tráfico de drogas) Art. 34 (tráfico de maquinário)


PENA: 5 a 15 anos PENA: 3 a 15 anos
AGENTE: Primário + Bons AGENTE: Primário + Bons
antecedentes e não se envolve em antecedentes = Não reduz a pena.
organização criminosa = Reduz de 1/6
a 2/3 – pena mínima de 1 ano e 8
meses

Como o art. 34 não traz redução, acaba punindo o menos com mais e o
Pedro C. Canellas

mais com menos. A doutrina tem entendido que deve-se aplicar o § 4º do art. 33
ao art. 34, numa analogia in bonam partem.

Art. 35. Associarem-se duas ou mais


pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não,
qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §
1º, e 34 desta Lei:
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches68

Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos,


e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e
duzentos) dias-multa.

Esse artigo cai bastante em concurso. Ele traz uma modalidade


especial de quadrilha ou bando. A quadrilha ou bando está no art. 288, do CP
e exige, no mínimo, 4 pessoas reunidas, de forma permanente e duradoura,
estável. O art. 35, da Lei de Drogas exige, no mínimo, duas pessoas. No mais,
exige igualzinho a quadrilha ou bando, ou seja, reunidas de forma estável,
permanente e duradoura. Então,a única diferença do art. 288, para o 25 está no
número de integrantes.

Art. 288, CP Art. 35,caput, Lei de


Quadrilha/bando Drogas
Associação criminosa
Mínimo: 4
Mínimo: 2 Pessoas
Pessoas(+de 3)
Reunidas de forma: Reunidas de Forma:
 Estável  Estável
 Permanente  Permanente
Finalidade: cometer Finalidade: cometer,
crimes em geral reiteradamente ou
não( diz respeito aos
crimes que a associação
possa vir a praticar, e
não característica da
associação) tráfico de
drogas ou
maquinários. art.33
caput,§1º e 34
Obs.: Quadrilha é um Obs.: Associação
delito autônomo também é delito
autônomo (ou seja,
ocorrendo o 33 e 34,
concurso material de
delitos)
“Rogério, é por isso que o 288 chama de quadrilha, quatro e o 35 de
associação?” Muito bem! Mas não é todo mundo que percebe isso. Quantas
Pedro C. Canellas

vezes já ouvi e li, “quadrilha do 35”. 35 não é quadrilha porque quadrilha exige 4,
o 35 é associação, porque se contenta com 2!!

Agora, vejam, no art. 288, a finalidade da quadrilha é cometer crimes.


Já no art. 35, a finalidade da associação é cometer tráfico de drogas ou
maquinários. Vejam as finalidades como são diferentes! Lá, crimes em geral,
aqui, tráfico de drogas ou maquinários. Vocês já perceberam que não há
quadrilha para cometer contravenção? Vocês já não ouviram, “é uma quadrilha
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches69

do jogo do bicho”? Só se for o Ratinho falando isso. Não existe quadrilha do jogo
do bicho! Quadrilha tem que visar crimes, não contravenções!

Detalhe importante é que o art. 35, a exemplo, do art. 288 é um crime


autônomo, existe independentemente do cometimento dos crimes-fins. Você se
associou com alguém, de forma estável e duradoura, já configurou o art. 35 se a
finalidade é o tráfico de drogas e maquinários, independentemente, da prática do
tráfico. Se ele, efetivamente, traficou, vai responder pelos dois crimes em
concurso material, associação + tráfico. Cuidado! O art. 25 é um crime
autônomo, a exemplo do art. 288, independe do tráfico. Ocorrendo tráfico,
concurso material de delitos. Então, estamos diante de crime autônomo, existe,
independentemente do tráfico, ocorrendo o tráfico, concurso material de delitos.

O crime do art. 25 é punido a titulo de dolo e esse dolo é resumido


pelo seguinte: animus associativo, vontade de se associar, de forma estável e
permanente a alguém.

Quando que este crime se consuma? Com a formação da


associação criminosa, a mera reunião, dispensando as práticas dos crimes-fim. O
crime se consuma com a reunião, haja ou não o tráfico. Lembrando, se houver o
tráfico, você tem concurso material. Outro detalhe importante é que a associação
para o tráfico é delito permanente. A consumação se protrai ( prolonga) durante
todo o período da associação.

Tentativa: A maioria da doutrina não admite tentativa. Mandou uma


cartinha convidando uma pessoa para se associar. Ato preparatório. Agora, olha
a sanção penal: de 3 a 10 anos.

Pegadinha: Fulano e beltrano, associados de forma estável e


permanente são presos comercializando drogas. Fulano é primário e portador de
bons antecedentes. Beltrano é reincidente.
Beltrano: art. 33, caput + art. 35, em concurso material.
Fulano: Art. 33, caput+ art.35, em concurso material. Não cabe
redução de pena para ele? Não, porque ele pertence a uma espécie de
organização criminosa, não cabendo §4º.( posição pacífica nos tribunais
superiores)
. Vamos ao parágrafo único, a mais nova modalidade de associação
criminosa na lei de drogas!
Pedro C. Canellas

Art. 35. Parágrafo único. Nas mesmas


penas (de 3 a 10 anos) do caput deste artigo incorre
quem se associa para a prática reiterada do crime
definido no art. 36 desta Lei.

E o que pune o art. 36? “Financiar ou custear a prática de qualquer dos


crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 desta Lei”.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches70

288, CP 35, caput, LEI DE 35, § único, LEI DE


DROGAS DROGAS
Mínimo: 4 pessoas Mínimo: 2 pessoas Mínimo: 2 pessoas
União estável + União estável + União estável +
permanente permanente permanente
Finalidade: financiar,
Finalidade: cometer Finalidade: cometer
reiteradamente o
crimes, reiteradamente tráfico (drogas e
tráfico (configura o crime
ou não maquinários)
do art. 36)

Qual é a diferença básica, principal, do art. 35, § único, para o art. 35,
caput? A finalidade. No 35, caput, a associação quer traficar drogas e
maquinários; no 35, § único, a associação quer financiar o tráfico. Pronto. Lá,
duas pessoas se reúnem de forma estável e permanente para traficar drogas e
maquinários; aqui, duas pessoas se reúnem de forma estável e permanente
para financiar o tráfico, financiar um traficante.

O art. 35, § único, continua sendo um crime autônomo. Ele é punido


independentemente do art. 36, é punido independentemente do efetivo
financiamento. Se essa associação, efetivamente financia o traficante, além do
35, responderá também pelo 36.

Você é punido pelo art. 288 (formação de quadrilha),


independentemente dos roubos. Se você roubar, além do art. 288, responderá
por roubo. Você é punido pelo art. 35, caput, independentemente do tráfico. Se
você traficar, responderá pelos dois crimes em concurso material. Você é punido
pelo art. 35, § único, independentemente do financiamento. Se você,
efetivamente, financiar um traficante, aí você responde pelos dois em concurso
material. Acabou! Não tem erro! Vamos olhar o art. 36 agora.
Por que no art. 35,§único fala só “reiteradamente? Porque o art. 36 só
pode ser praticado reiteradamente.

Art. 36. Financiar (sustentar os gastos)


ou custear (prover as despesas) a prática de
qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §
1º, e 34 desta Lei:
Pena - reclusão, de 8 (oito) a 20 (vinte) anos,
e pagamento de 1.500 (mil e quinhentos) a 4.000
(quatro mil) dias-multa.
Pedro C. Canellas

Financiar o tráfico, tráfico equiparado ou tráfico de maquinário.

• Sujeito ativo: qualquer pessoa. Crime comum. Pode ser pessoa


isolada ou associada a outra. Se for isolada, responde pelo art. 36, se
for associada, responde pelos artigos 35§único + art. 36.
• Sujeito passivo: a coletividade ao lado do Estado. (crime vago).
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches71

Tipo objetivo: No que consiste o crime? São duas as maneiras de


praticar o crime:

• Financiar = sustentar os gastos. “Fica tranquilo que eu banco o


lugar para você armazenar as máquinas, eu pago o aluguel deste
lugar.” Financiar ou custear o art. 33, caput, o §º e o artigo 34.
• Custear = prover as despesas.

A doutrina critica isso, dizendo que não precisava ter colocado


financiar ou custear. Tudo seria sustentar o tráfico.

A pena do art. 36 é de 8 a 20 anos. Esse é o mega-thunder. Esse eu


costumo brincar que é o Wally, ninguém encontra. Quem poderia ter entrado
nesse crime hoje? O Belo. Sabe quem é? O Belo já traficava droga, já vendia
muito disco. A pena é de 8 a 20 anos. Significa o quê? É imprescindível a
relevância do sustento. Acho que está claro que para uma pena dessa, o seu
sustento tem que ser conditio sine qua non para o sustento do tráfico. “Ah, eu dei
10 reais para ajudar o traficante. Respondo por esse crime?” Não! Você é otário.
Aqui tem que ter a relevância do sustento. Não escreva latim na prova! Não
precisa! (animus ledendi = vontade de ferir; animus necandi = vontade de
matar; animus injuriandi = vontade de injuriar; animus furandi = é vontade de
furtar! Não é estupro!) Por isso eu falo, não escrevam latim. Falou em furandi o
cara pensa logo em estupro!

Tipo subjetivo: O crime do art. 36 é punido a título de dolo.

Quando que se consuma? o financiamento para o tráfico é um crime


instantâneo ou crime habitual? Não habitual ou habitual? Exige reiteração de
sustento ou não? Basta você dar um dinheiro e por maior que seja já houve o
crime? Temos duas correntes:

1ª Corrente: “O crime não é habitual, consumando-se com o efetivo


sustento, ainda que realizado através de uma só conduta( qualquer ato indicativo
do sustento).” Você entregou uma quantia relevante para um traficante para que
ele possa desenvolver a sua atividade criminosa, você já praticou o delito do art.
36, sua pena é de 8 a 20 anos. A maioria adota essa corrente. Quem adota essa
corrente, é possível a tentativa.

2ª Corrente: “O crime é habitual, exigindo comportamento reiterado


Pedro C. Canellas

para caracterização do delito.”. Aqui não admite tentativa.

Para quem quer Polícia Federal, na prova-teste está prevalecendo a


primeira corrente. Eu, particularmente, concordo com a segunda. Aliás, quando
essa lei ainda era um projeto, eu já tinha feito o livro e falado ‘o crime é
habitual’. E vou tentar demonstrar porque eu acho isso.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches72

Crime habitual, consumando-se com a reiteração de atos indicativos do


sustento – fundamentos:

1º Argumento – o primeiro argumento está no art. 40, VII, da Lei


11.343/06:

Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37


desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços,
se:
VII - o agente financiar ou custear a prática
do crime.

Se a lei pune com 8 a 20 anos quem financia ou sustenta, como é que


eu posso ter o aumento do inciso VII para o agente que financiar ou custear a
prática do crime? O art. 36 pune com 8 a 20 anos financiar ou custear o crime. O
art. 40, VII, aumenta a pena se o agente financiar ou custear a prática do crime.
Ou seja, bis in idem. E como é que você escapa do bis in idem? Assim: o art. 36
exige habitualidade (crime punido com 8 a 20 anos), já o art. 40, VII trata da não
habitualidade (é esse que emprega um dinheiro esporádico) e, neste caso, é
causa de aumento de pena. Aqui estou trazendo um argumento (tem mais) de
que o art. 36 é habitual, sim. Se o art. 36 não fosse habitual, você correria o risco
de um bis in idem. Como você evita o bis in idem? Simples: se houver um
financiamento habitual, é o art. 36, com 8 a 20 anos. Se o financiamento for
esporádico, aí é o tráfico acrescido desta causa de aumento.

2º Argumento – Esse fundamento nasce quando você lê o art. 35, §


único. Vamos comparar o art. 35, § único, com o art. 35, caput.

Art. 35. Associarem-se duas ou mais


pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não,
qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §
1º, e 34 desta Lei:

Art. 35, Parágrafo único. Nas mesmas


penas do caput deste artigo incorre quem se associa
para a prática reiterada do crime definido no art. 36
desta Lei.

Esse é o argumento principal. O art. 35, caput, pune a associação para


Pedro C. Canellas

o tráfico, pouco importando se essa associação visa à prática reiterada ou não


dos crimes dos arts. 33 e 34. Por quê? Porque os crimes desses artigos são não-
habituais. Já o art. 35, § único, pune com as mesmas penas quem se associa para
prática reiterada do art. 36. Por que exige prática reiterada? Porque o art. 36 é
habitual. Se o 36 não fosse habitual, estaria escrito aqui, reiterado ou não.

Quando você tem duas pessoas visando praticar o tráfico, sabendo que
esse tráfico não é habitual, é instantâneo, existe o crime, seja o prático praticado
reiteradamente ou não. Já no § único, quando você tem duas pessoas visando
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches73

praticar o sustento do tráfico, sabendo que o sustento é um crime habitual, logo,


só pratica associação quem visar à prática reiterada. Por que no 35 caput, ele
fala reiteradamente ou não? Porque o crime-fim não é habitual? E por que no art.
35, § único, ele fala reiteradamente? Porque o art. 36 é crime habitual. Senão não
teria sentido. Se fosse uma vez só, você seria partícipe do tráfico com uma causa
de aumento. Você participou de qualquer modo no tráfico, com a causa de
aumento do inciso VII. Pronto.

Prevalece a primeira corrente.

A doutrina, no art. 36 admite a tentativa.

Art. 37. Colaborar, como informante, com


grupo, organização ou associação destinados à prática
de qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e §
1º, e 34 desta Lei:
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e
pagamento de 300 (trezentos) a 700 (setecentos) dias-
multa.

Aqui no art. 37, estamos punindo aquele que a polícia chama de


papagaio, fogueteiro. O que ele faz? Ele avisa que o caveirão está vindo.
Cuidado! Eu vou fazer uma observação e não vou mais precisar explicar esse
crime porque ele é claro por si só (soltando foguete, gritando, correndo e
avisando que a polícia está vindo e você, com isso, colabora com essa
associação).

Sujeito ativo: crime comum, qualquer pessoa pode praticar.


Sujeito passivo: coletividade.
Este artigo está punindo a colaboração criminosa. E a colaboração é a
uma associação criminosa, e não a uma pessoa.

“Apesar de não expresso no dispositivo legal, a conduta do


informante colaborador necessariamente precisa ser eventual (se houver
vínculo associativo, permanente e estável, pratica o art. 35 da lei).”

O informante é aquele colaborador eventual porque se, na verdade, ele


tem como missão na associação só avisar quando a polícia vem, ele não é um
Pedro C. Canellas

colaborador eventual. Se ele tem uma missão e faz parte da associação, ele vai
responder pelo art. 35. Isso é interpretação doutrinária. Não está na lei. Caso
contrário, todos os presos vão querer dizer: “não, minha missão era só avisar que
a polícia estava chegando, só sou informante”. A expressão ‘colaborador’ diz
tudo.
Se o agente for funcionário publico incide o aumento do art. 40,II.
Tipo subjetivo: punido a título de dolo.
Consumação: qualquer ato indicativo da efetiva colaboração.
Tentativa: admite na cara interceptada.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches74

Agora vamos para o artigo 38, o único artigo culposo da lei.

Art. 38. Prescrever ou ministrar,


culposamente, drogas, sem que delas necessite o
paciente, ou fazê-lo em doses excessivas ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 2 (dois)
anos, e pagamento de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos)
dias-multa.
Parágrafo único. O juiz comunicará a
condenação ao Conselho Federal da categoria
profissional a que pertença o agente.

É o único crime culposo na lei de drogas. E é de menor


potencial ofensivo.

Art. 15, Lei 6.368/76 Lei 11.343/06


Sujeito Ativo: médico, dentista, Não fala mais em médico, dentista,
farmacêutico ou profissional de farmacêutico ou profissional de
enfermagem enfermagem. Silencia.

O que se adota:
1ª corrente: Mesmo com o silêncio da lei, continua sendo um crime
próprio ( os mesmos profissionais descritos na lei anterior), não pode ser
praticado por qualquer um. Se assim fosse o parágrafo único não teria previsto a
comunicação à categoria profissional.
2ª corrente: A nova redação do crime culposo, acaba por abranger
todos os que possam prescrever drogas, como o veterinário ou nutricionista.
(Vicente Greco Filho)
A doutrina tende a seguir a 2ª corrente. Mas na prática, não há nada.

Sujeito Passivo: Coletividade bem como a pessoa que recebe a


receita ou a droga, sofrendo risco para sua saúde.
O que o artigo está punindo? A negligência na prescrição ou aplicação
da droga. Compare a lei nova e a lei anterior:
Pedro C. Canellas

CONDUTAS NEGLIGENTES
Lei 6.368/76 Lei 11.343/06
Prescrever ou ministrar: Prescrever ou ministrar:
• Droga certa na dose errada, ou • Droga certa na dose errada;
• Droga errada na dose certa. • Droga errada na dose certa;
• Droga certa na dose certa para • Droga certa na dose certa para
paciente errado ( não havia paciente errado. (“sem que
esta hipótese, havia uma delas necessite o paciente”)
lacuna)
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches75

O crime é punido a título de culpa.

Quando o delito se consuma? Na modalidade prescrever, o crime


se consuma com a entrega da receita ao paciente. Na conduta ministrar,
consuma-se no momento da aplicação da droga.

Sofrendo, o paciente, danos à sua saúde física ou mental, ou mesmo a


morte, haverá crime de lesão culposa ou homicídio culposo em concurso formal
com o art. 38 da lei de drogas.

Admite tentativa? Não, trata-se de crime culposo. Crime culposo não


admite tentativa.

Vamos para o último crime da lei.

Art. 39. Conduzir embarcação ou aeronave


após o consumo de drogas, expondo a dano potencial a
incolumidade de outrem:
Pena - detenção, de 6 (seis) meses a 3 (três)
anos, além da apreensão do veículo, cassação da
habilitação respectiva ou proibição de obtê-la, pelo
mesmo prazo da pena privativa de liberdade aplicada,
e pagamento de 200 (duzentos) a 400 (quatrocentos)
dias-multa.

Sujeito Ativo: Crime comum, pode ser praticado por qualquer pessoa.
Sujeito Passivo: A coletividade (primário) e qualquer pessoa que for
colocada em risco pela conduta do agente (secundário)

Tipo objetivo: Pune conduzir Apenas embarcações e aeronaves. No


caso de veículo, tem-se o crime do art. 306, CTB. E após o consumo de drogas.
Mas cuidado, tem que ainda estar sob efeito da droga!
E ainda, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem. Estamos
diante de um crime de perigo concreto difuso, não precisa ter uma pessoa certa
e determinada exposta a perigo, basta a prova de que comprovada a condução
anormal.

É imprescindível o rebaixamento do nível de segurança. Se ele conduz


Pedro C. Canellas

normalmente , é mera infração administrativa.

Tipo subjetivo: O crime é punido a título de dolo.

Quando o crime se consuma? Com a condução anormal( rebaixando


o nível de segurança) gerando o perigo de dano. Trata-se de crime de perigo
concreto.
Tentativa: não admite tentativa, de acordo com a maioria.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches76

Parágrafo único. As penas de prisão e


multa, aplicadas cumulativamente com as demais,
serão de 4 (quatro) a 6 (seis) anos e de 400
(quatrocentos) a 600 (seiscentos) dias-multa, se o
veículo referido no caput deste artigo for de
transporte coletivo de passageiros.

Aqui a infração deixa de ser de médio potencial ofensivo e passa a ser


de grande potencial ofensivo.
A doutrina diverge se é ou não preciso haver passageiro.

Agora, os últimos 2 artigos:

O art. 40 traz causas de aumento de pena. Vamos a ele:

Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a


37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois
terços( esta variação leva em consideração a
pluralidade e gravidade das majorantes), se:
I - a natureza, a procedência da substância
ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato
evidenciarem a transnacionalidade do delito;
II - o agente praticar o crime prevalecendo-
se de função pública ou no desempenho de missão
de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;
III - a infração tiver sido cometida nas
dependências ou imediações de estabelecimentos
prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de
entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas,
esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho
coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou
diversões de qualquer natureza, de serviços de
tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção
social, de unidades militares ou policiais ou em
transportes públicos;
IV - o crime tiver sido praticado com
violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou
qualquer processo de intimidação difusa ou
Pedro C. Canellas

coletiva;
V - caracterizado o tráfico entre Estados da
Federação ou entre estes e o Distrito Federal;
VI - sua prática envolver ou visar a atingir
criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer
motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de
entendimento e determinação;
VII - o agente financiar ou custear a prática
do crime.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches77

Incidência da causa de aumento: Caput – Essas causas de


aumento só se aplicam do art. 33 ao art. 37. Não se aplica ao crime culposo do
art. 38 e ele cai pouco. Então, não incidem essas majorantes no art. 38, não
incidem no art. 39 (que fala da condução de embarcação ou aeronave sob o
efeito de drogas). Elas só vão incidir dos arts. 33 a 37, nos crimes que já
estudamos.

Inciso I – Traz a primeira majorante. A transnacionalidade do delito.


Antes a lei falava em tráfico internacional. Agora, a lei fala em tráfico
transnacional. Qual é a diferença? Vamos colocar o que era conceituado como
tráfico internacional e o que é tráfico transnacional: A Lei 6368/76 falava em
tráfico internacional. Agora, por causa da Convenção de palermo, usa-se tráfico
transnacional:

 Tráfico Internacional – “Situação ou ação concernente a duas ou


mais nações.” – Quando se falava em tráfico internacional, você exigia
o tráfico ocorrendo entre duas nações. Eu não estou dizendo que para
configurar o tráfico internacional a droga saísse de um país e entrasse
em outro. Bastava a finalidade! Mas a finalidade de pegar a droga de
um país e levar para outro país. Isso era tráfico internacional. Agora, o
tráfico é transnacional, o que significa isso?

 Tráfico transnacional – “Situação ou ação além das fronteiras.”


Então, eu não preciso mais levar a droga de um país para o outro, ou
visar levar a droga de um país para o outro. Basta levar a droga para
fora do nosso país, mesmo que seja para o alto-mar. Quando se falava
em tráfico internacional, eu exigia dois países envolvidos. Não estou
dizendo que a droga precisava sair. Ela tinha que se “destinar para”.
Agora, o tráfico transnacional, não. A droga tem que extrapolar nossas
fronteiras. Ou entrando, ou saindo. Acabou! Ainda que o comércio seja
realizado em alto-mar, um navio em alto-mar. O tráfico transnacional
seguiu uma recomendação da Convenção de Palermo. A Convenção de
Palermo já falava: “vamos falar em transnacionalidade”.

“Na vigência da lei 6.368/76, não gerava o aumento o simples


fato de aquisição da droga na Bolívia, exigindo-se vínculo entre
nacionais e estrangeiros em atividade. Com a mudança, basta que a
infração tenha sua execução iniciada ou terminada fora dos limites do
Pedro C. Canellas

nosso território, dispensando vínculo entre nacionais e estrangeiros de


país soberano.”
A droga não precisa sair do país para configurar a transnacionalidade,
bastando a intenção. Se foi pego no aeroporto, é causa de aumento.

Detalhe importante: essa causa de aumento dispensa


habitualidade.
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches78

Outra observação quanto a esse inciso I – a competência será da


Justiça Federal. E onde não houver Justiça Federal? Tem que ser encaminhado
para a Justiça Federal mais próxima. A Justiça Estadual não tem mais
delegação para tráfico transnacional. Não existe mais a delegação que
existia na lei anterior.

Inciso II – O inciso II é muito simples. Polícia, por exemplo, praticando


tráfico, incide o inciso II. “No desempenho de missão de educação”, por
exemplo, professor traficando. Se quem trafica exerce função pública ( não
necessariamente ligada a prevenção ou repressão ao tráfico), incide o aumento.
Outra majorante: poder familiar: pai entregando droga para o filho. Teve uma
reportagem na Veja dizendo que 34% dos jovens que vão ao psiquiatra tratar
com remédio a dependência química, começaram graças ao pai, que ofereceu.
Missão de Guarda ou vigilância: por exemplo, se aquele que comercializou a
matéria-prima é quem cuida da farmácia ou almoxarifado de hospital. Ou de
depósito de hospital. Se você tem por função a guarda ou vigilância do depósito
e, em razão dela, começa a comercializar éter sulfúrico você responde pela causa
de aumento. Quem cuida da segurança de hospital.

Inciso III – Faltou alguma coisa no mundo? Só espaçonave! Olha que


interessante! Vocês perceberam que pode ser no local ou nas imediações, Né? Só
incide essa causa de aumento, se ela foi alcançada pelo dolo do agente. Ele tem
que saber que pratica o tráfico nesses locais ou nas suas imediações. É
imprescindível que esses locais façam parte do dolo do agente, ou seja,
ele tenha consciência de que ali funciona uma dessas localidades referidas no
inciso III. Agora, eu pergunto: o que são imediações? Quanto de proximidade?
Tem doutrina falando que é aquela que fica na distância de um braço. Vamos
anotar o que significa imediações (a doutrina deu um nome):

Imediações – “Abrangem a área em que poderia facilmente o


traficante atingir o ponto protegido, com alguns passos, em alguns
segundos, ou em local de passagem obrigatória ou normal das pessoas
que saem do estabelecimento ou a ele se dirige.” É o que a doutrina diz. Na
prática, a gente analisa o caso concreto. Esse rol é taxativo, diz a doutrina!

Inciso IV – Arma de fogo, grave ameaça ou violência, eu não preciso


perder tempo. Imaginem, num morro, onde os traficantes impõem lei do silêncio,
toque de recolher, etc. (“ou qualquer processo de intimidação difusa ou
coletiva”). O tráfico, quando domina o morro, está aqui. O traficante vai
Pedro C. Canellas

responder pelo inciso IV. O traficante quando trafica, valendo-se da lei do silêncio
do morro, toque de recolher do morro ou ele impõe a ajuda do morro, responde
com essa causa de aumento.

Inciso V – Existe o aumento quando o tráfico é caracterizado entre


Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal. Aqui, não é o tráfico
transnacional. Aqui, nada mais é do que o tráfico interno. Tráfico doméstico,
interestadual. Detalhe: competência da Justiça Estadual. No entanto, não
impede a investigação da Polícia Federal. Mas quem pode investigar
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches79

também é a Polícia Federal. É que a PF tem que remeter esse inquérito para a
Justiça Estadual, não para a Federal.
A competência é ditada pela prevenção do local da apreensão da
droga (art. 71, CPP)

Inciso VI – O artigo e claro por si só. Não vou perder tempo. Só alerto
para o seguinte: o traficante tem que saber que pratica o crime em face dessas
pessoas. Tem que saber que é criança, que é adolescente, que é pessoa sem
capacidade de entendimento.

Inciso VII – Não vou falar dele porque já falei (financiar ou custear o
tráfico).

OBS.: A lei nova aboliu o concurso de pessoas como causa de


aumento.

Lei 6.368 Lei 11.343


Associação permanente (art. 14) Art. 35.
Associação ocasional (art. 18, III) Foi abolida
Majorante

Vamos agora para o artigo mais importante:

Art. 44. Os crimes previstos nos arts. 33,


caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei são inafiançáveis e
insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e
liberdade provisória, vedada a conversão de suas
penas em restritivas de direitos.
Parágrafo único. Nos crimes previstos no
caput deste artigo, dar-se-á o livramento condicional
após o cumprimento de dois terços da pena, vedada
sua concessão ao reincidente específico.

Ele traz restrições próprias do crime hediondo, menos o


regime inicialmente fechado, mas por outro lado, veda
restritivo de direito e sursis.
Pedro C. Canellas

Quais crimes da lei de drogas são, efetivamente, equiparados a


hediondo? Vamos começar por essa pergunta e vamos para a Constituição
Federal, art. 5º, XLIII:

CF, 5º, XLIII - a lei considerará crimes


inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a
prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, o terrorismo e os definidos como
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches80

crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes,


os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem;

A CF, então, equiparou o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins


a hediondo, . E o que é equiparado a hediondo pela Lei 11.343/06? Abrangeria
apenas o artigo 33, caput e§º e artigo 36. Prevalece equiparar-se a hediondo o
art. 33,caput,e §1º, 34 e 36.

Vicente Greco diz: art. 33, caput; 33, § 1º; 34; 35; 36 e 37. Vicente
Greco. Ele diz o seguinte: todos os crimes referidos no art. 44, da Lei de Drogas.
Ele e uma autoridade no assunto e diz que equipara-se a tráfico, equipara-se a
hediondo, todos esses artigos. Ele acha que o art. 44, acabou, indiretamente,
equiparando esses artigos a hediondos.

LEI 8.072/90 LEI 11.343/06


Veda fiança Veda fiança
Veda sursis
XXXXX (Constitucionalidade
questionada)
Veda anistia, graça e indulto Veda anistia, graça e indulto
1ª Corrente: veda implicitamente
ao tolerar inafiançável
Veda liberdade provisória.
2ª Corrente: não veda liberdade
provisória
Veda restritiva de direitos
(Constitucionalidade
questionada)
Livramento Condicional Livramento Condicional
Qualificado Qualificado
Progressão:
Progressão:
2/5, se primário
2/5, se primário e
Lei 11.469/07
3/5, se reincidente.
3/5, se reincidente

Ambas vedam fiança – aqui estão em total sintonia com a Lei dos
Crimes Hediondos. A Lei de Drogas veda sursis. A lei de Crimes Hediondos veda
sursis? Vocês estudaram isso! Não. Não veda sursis. Por isso é que a vedação do
sursis já tem questionada a sua constitucionalidade. Por quê? Porque você veda
sursis para tráfico ou tráfico e equiparado e não veda para os demais crimes
hediondos e equiparados? É um tratamento desproporcional, desigual, sem
Pedro C. Canellas

razão. Ambas vedam anistia, graça e indulto. Agora, olha o detalhe: a lei de
drogas veda liberdade provisória. E a Lei dos Crimes Hediondos?

1ª Corrente: Veda implicitamente ao tolerar inafiançável.

2ª Corrente: Não veda liberdade provisória.


INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches81

Essa é a questão mais difícil para cair em concurso porque até agora o
STF não decidiu com certeza. O Ministro Celso de Mello diz que jamais a
liberdade provisória pode ser vedada em abstrato. O juiz tem que analisar o caso
concreto. Então, há decisões de Celso de Mello não admitindo a vedação
expressa na lei de drogas e nem a vedação implícita nos crimes hediondos.

A Lei 11.343 veda restritiva de direitos. A Lei dos Crimes hediondos


veda? Não. Então, por que só a Lei de Drogas veda? O STF acabou de decidir que
essa vedação é inconstitucional, com base na gravidade em abstrato.

STF HC-97.256/RS - Em conclusão, o


Tribunal, por maioria, concedeu parcialmente habeas
corpus e declarou, incidentalmente, a
inconstitucionalidade( o juiz, analisando o caso
concreto, é quem deve julgar possível ou não o benef
´cio) da expressão “vedada a conversão em penas
restritivas de direitos”, constante do § 4º do art. 33 da
Lei 11.343/2006, e da expressão “vedada a conversão
de suas penas em restritivas de direitos”, contida no
aludido art. 44 do mesmo diploma legal. Tratava-se, na
espécie, de writ, afetado ao Pleno pela 1ª Turma, em
que condenado à pena de 1 ano e 8 meses de reclusão
pela prática do crime de tráfico ilícito de entorpecentes
(Lei 11.343/2006, art. 33, § 4º) questionava a
constitucionalidade da vedação abstrata da substituição
da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos
disposta no art. 44 da citada Lei de Drogas (“Os crimes
previstos nos arts. 33, caput e § 1º, e 34 a 37 desta Lei
são inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça,
indulto, anistia e liberdade provisória, vedada a
conversão de suas penas em restritivas de direitos.”).
Sustentava a impetração que a proibição, nas hipóteses
de tráfico de entorpecentes, da substituição pretendida
ofenderia as garantias da individualização da pena (CF,
art. 5º, XLVI), bem como aquelas constantes dos incisos
XXXV e LIV do mesmo preceito constitucional — v.
Informativos 560, 579 e 597. Esclareceu-se, na
presente assentada, que a ordem seria concedida não
para assegurar ao paciente a imediata e requerida
Pedro C. Canellas

convolação, mas para remover o obstáculo da Lei


11.343/2006, devolvendo ao juiz da execução a tarefa
de auferir o preenchimento de condições objetivas e
subjetivas. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa,
Cármen Lúcia, Ellen Gracie e Marco Aurélio que
indeferiam o habeas corpus.” HC 97256/RS, rel. Min.
Ayres Britto, 1º.9.2010. (HC-97256)
INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches82

A Lei de Drogas prevê um livramento condicional qualificado e a Lei de


Crimes Hediondos também.

Crime hediondo ou equiparado Lei de drogas


Livramento condicional – Cumprir Livramento condicional – Cumprir
mais de 2/3, desde que não reincidente 2/3, desde que não específico
específico (reincidente em crime (reincidente específico nos delitos
hediondo ou equiparado) previstos no art. 44)

 A Lei dos Crimes Hediondos veda fiança, a Lei de drogas também


veda.

 A Lei dos crimes hediondos não veda sursis, a Lei de Drogas, veda.
Mas, Rogério, a Lei de Drogas é equiparada a hediondo! O tráfico é
equiparado a hediondo. Como é que pode ser equiparado a
hediondo e vedar o sursis, sendo que um crime genuinamente
hediondo não veda? Então, tem questionada a sua
constitucionalidade, da proibição na lei de drogas.

 Tanto a Lei dos Crimes Hediondos veda anistia graça e indulto.

 Discute-se se a Lei dos Crimes Hediondos veda ou não a liberdade


provisória. A certeza é que a Lei de Drogas expressamente veda.
Discute-se somente se isto é constitucional.

 Tanto uma quanto outra prevêem livramento condicional


qualificado.

 Agora, tem uma que a Lei dos Crimes Hediondos prevê e a Lei de
Drogas, não. O quê? Progressão de regimes. Na Lei dos Crimes
Hediondos, progressão com 2/5, se primário ou 3/5, se reincidente. E
na Lei de Drogas? A lei que introduziu a progressão diferenciada é a
lei 11.464/07. Ela é posterior à Lei de Drogas e faz menção ao
tráfico. Isso significa o quê? Que o tráfico segue a progressão de 2/5
ou 3/5. Cuidado! A Lei 11.464/07 é posterior à Lei de Drogas e sendo
posterior, ela diz: essa progressão é para qualquer crime hediondo
ou equiparado, abrangendo o tráfico. Apesar de ela estar na Lei dos
Pedro C. Canellas

Crimes Hediondos, ela se aplica a todos os crimes hediondos ou


equiparados, inclusive o tráfico. Vocês perceberam a data? A Lei de
Drogas é de 2006, a lei 11.464 é de 2007 e ela faz abranger todos
os crimes hediondos ou equiparados. Então, não adianta querer
aplicar o princípio da especialidade, hein? Aqui é o princípio da
posterioridade.

Pergunta do final da aula:


INTENSIVO II / Legislação Penal Especial – LEI DE DROGAS – Prof. Rogério Sanches83

Polícia Civil, ES, Janeiro/09, Cespe: “Se Y, imputável, ofereceu


droga a Z, imputável, sem objetivo de lucro, para juntos consumirem, a
conduta de Y se enquadrará na figura do uso e não da traficância.”
Gabarito: dado como certo. Está ERRADO o gabarito! A questão trata do tráfico
equiparado de menor potencial ofensivo. Se fosse a figura do uso não estaria no
art. 33. a posição topográfica diz muito! Estaria no art. 28. Pessoal, mas isso, eu
falei para vocês: direto está acontecendo, hein? O 33 de menor importância, eles
estão jogando como se fosse uso. Uso não é!

Pedro C. Canellas

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