Explorar E-books
Categorias
Explorar Audiolivros
Categorias
Explorar Revistas
Categorias
Explorar Documentos
Categorias
Foram os autos com vista ao eminen- Devo acentuar que êste caso é impar
te Dr. Procurador-Geral da República e que, a meu ver, não envolve prôpria-
e S. Exa., pelo parecer de fls. 3.239 mente uma questão de ordem moral,
sustentou que não existe, no caso, di- como tão brilhantemente sustentou da
reito liquido e certo a amparar a pre- tribuna o ilustre Doutor Joaquim Mo-
ten9ão do ora impetrante. reira Rabelo. Penso que envolve mais
um problema de comando, um problema
Não vou ler o parecer substancioso de govêrno, um problema de politica go-
e brilhante do eminente Dr. Procurador- vernamental, um problema de govêrno
-~ral, de vez que S. Exa. vai sus- nOvo, um problema de govêrno reno-
tentar, em réplica à oração do advo- vador, um problema de govêrno que não
gado, os motivos que tem para iínpug- se detém, impassivel, sereno ou pacato,
nar o pedido. diante das questões que se avolumam,
às quais êle terá de dar solução. Um
Veio juntar ao parecer do eminente problema de govêrno tão-sômente.
Dr. Procurador-Geral, um parecer do
Dr. Caio Mário de Silva Pereira, Con- Devo dizer, embora como juiz, que o
sultor-Geral da República, que é do co- nosso pais há alguns anos estava es-
nhecimento dos eminentes colegas: perando ver-se jogado ao campo das
"Poder de Exonerar. Implicito no de soluções.
Nomear". O Sr. Mirnistro Ari FrQflf/OO - V. Exa.
por ser juiz não deixa de ser brasileiro.
Antes de me serem os autos conclu-
sos, o impetrante, pela petição de fls. O Sr. Ministro RiboEMo da Costa
41, fêz juntar a êstes autos um douto Perfeitamente. lD por isso mesmo.
parecer da lavra do nosso eminentissi-
mo e insigne colega Sr. Ministro O~ Os governos podem ser pacatos, in-
81mbo Nonato. diferentes, anódinos, ou confiar .. seus
lWnl.tro. o lado dinAmico da gover-
• O rtlat~rlo, nang&j mal O governo pode .er, .le
- 214-
mesmo, dinâmico, êle mesmo vivõ, nos dos sob a direção pessoal do Presidente
seus atos executivos. 1!'l o que o nosso da República. Os Presidentes da Repú-
pais está nesses dias experimentando, blica entregavam êsses setores a pes-
não se sabendo bem para onde seremos soas que representavam o interêsse po-
conduzidos. A sorte do Pais está jogada, litico, de momento, inexpressivo, que
tendo à frente da sua direção um ho- agiam discricionàriamente, sem progra-
mem temperamental, um homem renova- ma governamental. Não sei se é bem
dor, um homem pessoal nas suas ações, isto, mas é o que senti, no exercicio
um homem que não se detém nos seus do Poder Executivo dos governos ante-
atos, que possui qualidades, espirito pú- riores, com muita lástima.
blico, que possui vontade de determi-
nação, que possui vontade de resolver A quem entregava o Govêrno a di-
as coisas. Isto nos parece inegável! reção de todos os institutos de previ-
dência, e de outros aparelhos acessórios
Vê-se que o Presidente se move da que são uma fôrça econômica poderosa?
Capital do Pais para os Estados, onde Vimos, por exemplo, a situação passa-
reúne Governadores de certa região, da entregar ao Senhor João Goulart,
coon os quais traça os problemas rela- apregoadamente um grande politico, um
tivos a essa região, procurando dar-lhes homem de inteligência luminosa, extra-
diretivas, soluções e medidas de am- ordinário, dinâmico, que deveria reali-
paro. zar a grandeza do Partido Trabalhista
Brasileiro, criando o bem estar do nosso
Penso, Senhor Presidente, que deve- povo e fazendo feliz esta Nação tão
mos ter em vista o lado politico da desgraçada. '. O que foi essa influência
questão, político no sentido de medida desastrosa a Nação tomará conheci-
que atende ao interêsse da Nação, de mento pelos resultados dos inquéritos em
medida propiciadora da regulação dos andamento, se tiverem andamento ...
atos administrativos do Pais. PoUtica
neste sentido. Isto me conduz a admi- Ora, compete ao Supremo Trfbunal
tir que, em relação a certos setores Federal, no julgamento das magnas
desmembrados da administração públi- questões pontificar, Com elevação, com
ca, o Presidente da República, o· Chefe serenidade, com superioridade, nesses
do Poder executivo, não se pode fazer grandes problemas ou ajudando o Po-
sentir prêso. rue há de ter liberdade der Executivo a lhes dar soluções pre-
de ação, e essa liberdade de ação se- cisas ou impedindo que o Podé"r Exe-
ria negativa inteiramente, se, ao pre- cutivo, nas soluções dos problemas, atue
tender realizar, o Presidente não tives- de maneira arbitrária, exorbitando dos
se, para a execução dos atos que ima- podêres que a Constituição lhe traçou.
gina ou quer empreender, servidores
em cuja ação possa confiar. Assim, pois, o problema é êste: saber
se, neste caso, o Presidente da Repú-
Penso que o problema é êste. 1!'l um blica exorbitou das faculdades constitu-
problema a respeito do qual todos nós, cionais.
brasileiros, devemos compreender que a
ação governamental executiva não se O Tribunal ouviu a brilhante oração
pode fazer sentir sem que isso se rea- do ilustre advogado do impetrante. Sinto
lize. que fiz bem em não ler o parecer do
Dr. Procurador-Geral da República, por-
Nos governos anteriores, todos sen- que seria pálida a minha leitura. Oral-
timos que êsses setores importantissi- mente S. Exa. nos deu uma agrada-
mos da administração, setores que di- biliS'Sima e substanciosa lição de Direito
zem com a miséria, com o amparo à Constitucional e de Direito Civil.
população pobre, infeliz, doentia e so-
fredora, setores que são uma fôrça ele- Resta saber se delegado do govêrno
1Jlentar do Pais, não estavam enfeixa- da União perante quaisquer· dQ!! tnstl-
- 215 ~
lutos . ou caixas econômicas, investido elementos para dizer-se que a tese ago-
para exercer o cargo por penodo certo ra discutida foi a mesma nêles resol-
de . quatro anos, tem direito a perma- vida. Data vania, não é exato.
nência no exercicio dessa função duran-
'te os quatro anos seguidos, por todo o No caso do Dr. Demócrito Barreto
'curso do penodo, ou se o Presidente da Dantas, julgado por êste Tribunal, em
República pode removê-lo, nofneando que fui impedido, o que se decidiu foi
outra pessoa para exercer o cargo. Se que, investido o Dr. Demócrito Barreto
o ato do Presidente da República, nesse Dantas no cargo de Diretor de um dos
caso destituindo o servidor anterior- serviços da Caixa Econômica, se não me
mente nomeado, importa em ofensa a engano, a Carteira de Penhores, o ato
'algum preceito constitucional: ao di- do então Presidente da República, Sr.
o reito adquirido ao exerci cio daquele General Dutra, era insustentável, por-
mandato até o fim do mesmo, ou se o que a investidura fOra por quatro anos.
.Presid~nte da República é livre de no- Garantiu-se ao Dr. Barreto Dantas a
mear e desnoonear, como bem entender, remuneração pecuniária pelos restantes
~ na suposição, sempre, de que agirá no meses ou anos do exercicio do mandato
interêsse permanente da Nação. que lhe fOra atribuido. Mas há de se ter
em vista que êsse caso foi julgado antes
Entendo que o Presidente pode prati- da vigência da atual Constituição, quan-
car êsse ato, pode e deve praticá-lo do, então, a investidura 68ta.va gOA'YJfll,-
tOda vez que julgar necessário fazê-lo. tida pekJ, lei. A Constituição de 1937,
Não posso compreender que, ao fim do corno a de 1934, contém ressalvas s0-
exercicio do Poder Executivo, quando bre as quais farei ligeira referência,
. estava próximo a inaugurar-se um ou- porque sôbre elas já falou suficiente-
tro penodo governamental, o Presiden- mente, com tôda a clareza, o eminente
te anterior pudesse nomear certos fun- Dr. Procurador-Geral da República.
cionários de sua confiança para exer-
cerem aquêles cargos, invadindo a área A Constituição de 1937 que regia
'de ação do nôvo Presidente da Repú- aquêle ato, subordinava o exercicio do
blica, impedindo que o nôvo Presidente mandato àquilo que a lei dizia. E a lei
pudesse descortinar o seu programa ad- conferia o exercicio do mandato por
ministrativo, dispondo dos meios neces- quatro anos. De sorte que o Presidente
'sários a isso, entre os quais avulta, evi- de então, destituindo o diretor, feria o
dentemente, a ação diriAmica dos seus preceito da lei, ao passo que êste esta-
mandatários, que são êsses conselheiros, va com a garantia da lei.
presidentes de institutos, membros de No caso do Embaixador Batista Lu-
diretorias, etc. zardo, a hipótese é diferente. Exercia
Esta é a questão mais importante êle a função de Presidente da Caixa
que se apresenta ao Supremo Tribunal Econômica Federal do Rio de Janeiro
Federal. e fOra destituido dêsse cargo. Mas era,
ao mesmo tempo, membro do Conselho
Entre os motivos que fundamentam o Administrativo da Caixa Econômica. O
pedido, sobressaem dois argumentos de Tribunal decidiu que, absolutamente,
grande relêvo: é que o Supremo Tribu- não restava ao Embaixador Batista Lu-
nal, examinando precisamente questão zardo nenhum direito liquido e certo ao
idêntica, já teria dado solução ao pro- exercicio da presidência daquela insti-
blema. Foram lembrados, então, os ca· tuição, cargo que exercia em comissão.
sos do Embaixador Batista Luzardo e Isto é que ficou decidido por voto do
do Dr. Demócrito Barreto Dantas. eminente Ministro Afrânio Costa., que
consta aqui, e dos demais colegas no
Quero esclarecer que, a respeito da mesmo sentido.
. questão agora a ser decidida pelo Tri-
o bunal, nem nwn caso nem no outrQ há Assim termina o voto:
- 216
"Se o Presidente da Caixa, cujo man- Contreras de Carvalho (Estatuto doa
dato se extinguiu, não fOr ... (lê) ... 1i1uttciond~ PúbZicos) referindo-se a08
a que conduziria a interpretação". cargos em comissão a que alude o § 1·
do art. 82, do Estatuto, ressalta a des-
O que decidiu êste Tribunal foi, por- necessidade da exclusão ali prevista,
tanto, isto: é que não era possivel con- pois a exclusão já decorre dos próprios
ceder ao Embaixador Batista Luzardo textos dos incisos I e n do mencionado
a permanência no exercicio da presidên- dispositivo legal, em que estão deter-
cia por uma questão de coincidência de minadas as duas formas de aquisição
mandatos e que, além disso, S. Exa. de estabilidade para o servidor público,
era membro do Conselho Administra- que são: dois anos para os que fizeram
tivo. concurso e cinco anos ininterruptos para
aquêles nomeados para cargo efetivo
Não podem, pois, êsses dois casos ser de carreira ou isolado, sem concurso.
tomados como paradigma para esta de-
cisão. Temistocles Cava1cAnti, nos Ooment4-
rios à Oonstituiçdo, voI. VI, pâg. 168,
O ilustre advogado do impetrante, referindo-e ao problema do serviço pú-
logo de inicio, em sua oração, timbrou blico, diz que a regra deve ser a esta-
em afirmar que o impetrante não era bilidade para os que servem bem. A
funcionário público, nem funcionário de compensação do Estado manifesta-se
autarquia, mas que era mandatário do precipuamente, diz êle, pela estabilil1a.de
Presidente da República. Coincide essa do funcionário, pela segurança da sua
afirmação precisamente com o que tam- permanência no serviço público. Essa
bém entendo. O impetrante exercia o permanência, porém, acrescenta, depen-
cargo de membro do Conselho do IAPI, de da vontade do Estado e, salvo os
na qualidade de mandatário do Presi- casos expressos em lei, nenhuma outra
dente da República. Posta a questão garantia pode ser reconhecida ao fun-
nestes têrmos, não teriamos de indagar cionário. A regra legal é a demissibili-
se, como mandatário do Presidente da dade ad tllUtum, principio que se aplica
República, não estaria o impetrante ga- aos interinos, aos que ocupam cargo em
rantido por algum dos casos de estabi- comissão, a certas categorias de extra-
lidade previstos na Constituição. Os ca- numerários, aos nomeados por concurso
sos previstos não se aplicam à função com menos de dois anos de serviço e
por êle exercida. Não ingressou por con- aos demais, com menos de cinco anos
curso, não era funcionário efetivo cuja de serviço.
estabilidade galgasse após cinco anos
continuos de exercicio. Não era interino. Vem, agora, a propósito, saber se o
Exercia, a meu ver, uma comissão, era Presidente da República, neste caSo,
demissivel ad nutum, não tinha garan- pode ou não nomear outra pessoa de
tia de permanência no cargo. A Consti- sua confiança para exercer êsse cargo,
tuição federal, o Estatuto dos Funcio- destituindo o que nêle está investido
nários Públicos, o nosso Direito Admi- a prazo certo, por tempo determinado.
nistrativo, desconhecem caso de esta-
O eminente Dr. Procurador-Geral da
bilidade a tempo determinado, salvo
República debateu o tema com todo o
caso de contrato de trabalho. No meca-
brilho, como foi ouvido pelo Tribunal,
nismo administrativo brasileiro, essa
mas devo dar minha contribuição.
modalidade inexiste. Eu desconheço-a.
A estabilidade, segundo a Constituição, A Constituição de 1891 dizia, no ar-
é assegurada em têrmos relativos e não tigo 48, n 9 V:
abrange a modalidade dos demissiveis
ad 1IIUtum, assim denominados os ser- "Compete privativamente ao Presi-
vidores que podem ser demitidos sem a dente da República: V - prover OI
formalidade do proc(!sBQ adnUntetrativo. cargos civis e militarei de caráter te-
- 217-
deral, salvo as restriçõe8 expressas na interinos, nomear por concurso, nomear
Constituição" . para cargo isolado, para cargo defini-
tivo etc., os funcionários, mas com as
A signlficaçâo é que cabia, nesse caso, ressalvas contidas na Constituição. Ex-
ao Presidente da RepObHca prover os clusivamente!
cargos pOblicos civis e militares, livre-
mente, salvo nos casos em que a Cons- Ora, a Constituição não possui ne-
tituição não o permite. Quer dizer: com nhuma ressalva impeditiva à desnomea-
as restrições previstas na Constituição. ção daqueles mandatários do anterior
Presidente da RepOblica que estavam
As Constituições de 34 e 37 dispuse- exercendo funções por prazo detennina-
ram diferentemente. A de 34 dispunha: do. Assim, o nOvo Presidente da RepO-
"Compete ao Presidente da RepOblica blica podia livremente desnomear e in-
prover cargos federais, salvo as exce- vestir naqueles cargos pessoas de sua
ções previstas na Constituição e nas exclusiva confiança. E entendo que êsse
leis". dispositivo da Constituição é sábio, me-
rece meu aplauso. Não digo o dos meus
A de 37 repetiu: eminentes colegas, mas o meu aplauso
irrestrito, porque não posso compreen-
"Compete privativamente ao Presiden- der que o alto dirigente de urna em-
te da RepOblica prover os cargos fede-
prêsa, como é o de um pais, possa exer-
rais, salvo as exceções previstas na cer os atos mais delicados que lhe cum-
Constituição e nas leis". pre pOr em prática, com os braços cru-
O que se entende e se deve compreen- zados, peados, sem ter os mandatários
der, em face dessas duas ressalvas é em que confie, principalmente num pais
que, na vigência dessas Constituições, o como o nosso, em que sabemos muito
Presidente da RepOblica poderia nomear bem que os apaniguados da politica an-
e desnomear, respeitando as restrições terior são aferrados, são homens que
constitucionais e também aquelas pre- não compreendem nada senão aquela
vistas na lei. admiração pelo sol, que já caiu no oca-
so. Aquêle queremismo irremoviveI. ..
Foi êste o caso do Dr. Demócrito êles acham que só pode ser aquilo. Nos-
Barreto Dantas, que, nomeado sob o so Pais é de gente temperamental, apai-
império da lei, na Constituição de 37, xonada. O Presidente da RepOblica pas-
estava garantido com aquilo que a lei sa então, a ser, em certos setores, um
outorgara: mandato de quatro anoa. verdadeiro pau mandado, porque nada
~ mandato não podia ser abolido, do que êle manda que se faça se faz.
ab-rogado, por ato do Presidente da Re- Fica ao sabor da pasmaceira e da sa-
pOblica. botagem.
~Ie não tinha, a êsse tempo, a facul- Estamos examinando o problema de
dade de fazê-lo, teria de respeitar a lei. natureza politica, mas com olhos claros,
O Presidente não respeitou a lei, a Jus- vendo a realidade. Não estou no mundo
tiça garantiu os proventos do servidor do sonho, mas no da realidade. Não sou
até o término do prazo do mandato. administrador. Se o fôsse, só o seria
Mas a atual Constituição voltou ao prin- pessoalmente, para exercer a adminis-
cipio estatutário da Constituição de tração com tOda a responsabilidade, mas
1891, prescrevendo que compete priva- eu mesmo! E em certos setores só po-
tivamente ao Presidente da. RepOblica deriam agir por mim pessoas em que
prover na for.ma. da lei e com as res- eu confiasse. Seria então um adminis-
salvas estatuídas nessa Constituição, os trador. Eu quero e mando! Só assim o
cargos pOblicos federais. Na forma da entendo e admito.
lei, quer dizer: prover para determi-
nado fim, para êsse cargo de tal cate- Aqui, neste Tribunal, por exemplo,
goria .tc, Nomear vit&l1ctOl, nomear Sr. Preeldtnte, há. uma IIltua.glo com a
- 218
qual de modo algum estou de acôrdo Chegamos a verificar que o caso,
Mas de forma alguma! Vou dar o exem- como acentuou o eminente Sr. Presi-
pio: O eminente Sr. Ministro Barros dente da República, simplesmente era
Barreto, Presidente desta Casa, é quem mandato a prazo certo, cuja revogabili-
manda, quem dirige êste Tribunal. Pois dade não encontra empeços na Consti-
bem, o Presidente do Supremo Tribunal tuição, ao passo que encontra encômios
Federal tem um Secretário que é efe- no senso comum.
tivo titular do cargo. ~ uma pessoa que
foi nomeada efetiva para um cargo que Meu voto é, pois, negando o man-
devia ser em comissão. Se há algum dado.
cargo que deverá ser de confiança é
êsse! Mas é efetivo! Não compreendo VISTA
dislate maior.
o Sr. Mittistro Vitor Nwne.s Leal
o Aliás,
Sr. Mi-ttistro Luis Gallotti - Peço a palavra, Sr. Presidente.
já era assim quando Sua Excelência
veio ocupar a Presidência, mas é um Conforme havia antecipado a alguns
absurdo! dos eminentes colegas, era minha in-
tenção pedir conselho na forma do Re-
o Sr. Ministro Barros Barreto (Pre- gimento. Havia tomado essa decisão,
sidente) - Estou de acôrdo com Vossas porque o assunto ora em debate é de
Excelências. tal modo delicado, penetra tão fundo no
mecanismo dos podêres constitucionais,
o Sr. Ministro Ribeiro da Costa - oferece tantos aspectos à nOSSa consi-
Estou exemplificando com aquilo que
deração, que me parecia mais vanta-
ocorre dentro da nossa Casa. Pois então
josa, para nossa decisão, que houvesse
o Presidente do Supremo Tribunal Fe-
um prévio e amplo debate entre todos
deral, cuja atribuição em certos casos
os Ministros, antes da tomada dos votos.
é das mais delicadas, há de ter um Se-
cretário efetivo? Entretanto, Sr. Presidente, êsse meu
O Sr. Ministro Latayette de A-ndrada propósito baseava-se na suposição de
- Nada desabona êsse Secretário. que a parte expositiVa e os debates pu-
dessem concluir-se na primeira fase dos
O Sr. Milttistro Ribeiro da Costa - nossos trabalhos, porque, então, nos reu-
Diga-se e consigne-se que a sorte do niriamos no intervalo da sessão e con-
Sr. Presidente é que tem como secretá- cluiriamos o julgamento na segunda
rio efetivo impôsto a S. Exa. um fun- fase. Agora, já estamos no fim do ho-
cionário exemplar, funcionário excelen- rário regimental.
te, dignissimo, um funcionário sôbre
cuja dignidade e moralidade não há a Continuo, entretanto, a achar a ma-
menor dúvida. Sou o primeiro a reco- téria extremamente delicada, pois vimos,
nhecê-lo! Mas não estou de acôrdo com aqui, a administração defender-se, di-
isso! zendo que a Constituição democrática
de 1946 dá mais podêres ao Presidente
Assim também não posso compreen- da República, em certos setores do que
der que o Senhor Presidente da Repú- a Constituição autoritária de 1937.
blica esteja peado a ter entre seus man-
datários funcionários que êle não co- Sr. Presidente, com vênia e o devido
nhece, que ignora o que são, quem se- respeito ao eminente Relator, peço vista
jam, o que fazem, o que podem fazer dos autos.
ou não fazer, o que podem sabotar em
seus atos de administrador! DECISÃO
Assim, Sr. Presidente, o meu voto já
está longo e se espraiando sôbre maté- Como consta da Ata, a decisão foi a
.rias mais delicadas. seguinte: Adiado por pedido de' vista
- 219
do Sr. Ministro Vitor Nunes após votar II
pela denegação da segurança o Sr. Mi-
nistro Relator. Argúi-se, em primeiro plano, que, lm-
plicito no poder de nomear, a Constitui-
Presidência do Exmo. Sr. Ministro ção de 1946 confere ao Presidente da
Barros Barreto. Relator, o Exmo. Sr. República o poder de demitir, com am-
Ministro Ribeiro da Costa. plitude muito maior do que o haviam
feito as Constituições republicanas an-
VOTO teriores, inclusive a outorgada, de 1937.
:m claro que a lei não pode dispor Por outro lado, o texto constitucional
tudo, porque estã, por sua vez, sujeita não diz nomea:T, mas prover os cargos,
às limitações constitucionais, mas não o que compreende outras mo<!alidades
é o art. 87, nO V, o dispositivo que re- de provimento além da nomeação, como
gula tais limitações, e sim, todo o con- sejam a transferência, a promoção, o
junto das normas constitucionais que aproveitamento, etc. (Estatuto, art. 11).
estruturam nosso regime político-juridi- Assim, a tese de que o legislador ordi-
co. O que transluz, portanto, do art. 87, nãrio não pode condicionar o exercicio
no V é que o poder, que tem o Presi- do poder previsto no art. 87, n~ V, da
dente da República, de prover os cargos Constituição, se aceita pelo Supremo
públicos federais se exercerã de con- Tribunal, poria por terra grande parte
formidade com a lei. Pode assim o Le- do Estatuto dos Funcionãrios e de tôdas
gislativo condicionar o exercicio dêsse as leis que regulam as diversas moda-
poder, em têrmos compatíveis com os lidades de provimento de cargos fede-
demais dispositivos da Constituição. A rais. Tôda a disciplina legal das promo-
sua competência não é apenas para es- ções. das transferências, das readmis-
tabelecer as formalidades aplicãveis, sões, etc., não poderia mais prevalecer
mas também os pressupostos do provi- diante do arbítrio do Presidente da Re-
mento dos cargos públicos. pública, que se exerceria incontrolàvel-
mente, promovendo, transferindo, rea-
A fórmula da Constituição atual é daptando quem quer que fôsse do seu
mais explicita, a êsse respeito, que a de agrado ou incidi'SSe na sua antipatia.
1891, a qual, no art. 48, atribui a, pri- Estaria, pois, restabelecido, em favor do
vativamente, ao Presidente da Repúbli- Presidente da República, um poderio in-
ca, "prover os cargos civis e militares comensurãvel, de que hã muito jã es-
de carãter federal, salvo as restrições tãvamos desacostumados, com a evolu-
expressas na Constituição". O texto de ção doutrinãria. em todo mundo, em fa-
91 não continha a clãusula na forma da vor do sistema do mérito e das garan-
1Iet; entretanto, os seus mais autorizados tias funcionais no serviço público civil
comentadores sempre entenderam legi- A tais conseqüências catastróficas leva-
tima a competência do legislador para ria a premissa constitucional que, dGtct
dacipl1nar, condicionar, regular o exer- wMJ, e.tamoe combatendo.
- 221-
A melhor doutrina sempre entendeu, tOda a naturalidade, no regims de ou-
porém, de modo contrãrio, isto é, que o tooomia administrativa atribuido, por
Congresso não invade as atribuições do lei, a certos órgãos. Visa a investidura
Executivo, quando disciplina as nomea- de prazo certo a garantir a contmui-
ções, as demissões, as promoções, as d!Jde de orientação e a ~ de
transferências de servidores públicos. ação de tais entidades autônomas, de
Esta sua competência resulta, em pri- modo que os titulares, assim protegidos
meiro lugar, do regime adotado pela contra as injunções do momento, pos-
Constituição, que é o da divisão de po- sam dar plena execução à polltica ado-
dêres, cujo pressuposto é a harmonia e tada pelo Poder Legislativo, ao instituir
não a guerra dos podêres (art. 36 ) . o órgão autônomo e deferir-lhe as atri-
Em segundo lugar, deriva essa compe- buições. No sistema polltico vigente em
tência de outra mais ampla, que a nosso pais é, reaLmente, ao Legislativo
Constituição confere ao Poder Legisla- que cabe traçar a orientação geral da
tivo, para organizar os serviços públi- politica econômica e administrativa do
cos. "Os cargos públicos - diz o art. pais, pois dêle depende a votação do
194 - são acessiveis a todos os brasilei- orçamento, a concessão de créditos espe-
ros, obsertXlldo8 08 requt.sit08 que a lei ciais, a aprovação de tratados com na-
esmbelelcer" . ções estrangeiras e o poder de votar leis
em tôda a extensa área da competência
O acesso ao cargo público se dá pelo legislativa da União.
prov;mento; se êste depende dos requi-
sitos que a lei estabelecer, parece intui- Não é, aliás, a investidura de prazo
tivo, que o poder de pro1)E'7" os cargos certo uma invenção brasileira. Ela tem
públicos, atribuido ao Presidente da Re- uso freqUente em outras nações e fre-
pública, não pode deixar de estar con- qUentlssimo nos Estados Unidos, cujo
dicionado ao que dispuser a lei. regime copiamos. Numerosos são os car-
gos, especialmente nas ~ re-
Idêntico argumento se pode extrair
gulalm-y com4sst0rn8, cuja investidura
do art. 188, parágrafo único, da Cons-
se faz a prazo certo. Citarei algumas:
tituição, que declara não aplicável a es-
Junta de Aeronáutica Civil (OtviZ Ae-
tabilidade aos cargos "que a lei declare
r<»lllUdics BOOIrd), cinco membros no-
de livre nomeação e demissão". Se a lei,
ao definir cargos de livre nomeação e meados com prazo de seis anos, sendo
demissão não pode contrariar a Cons- que não mais de três do mesmo parti-
tituição, porque seria inócua, claro está do; Serviço de Reaproveitamento da
que pode inovar na matéria, autorizada Terra do Distrito de Columbia (District
pela própria Constituição, o que signi- 01 OolN.mbi4 Redeoolopment Land Agen--
CY), cinco membros nomeados por cin-
fica regular o poder de nomear e de
demitir do Presidente da República. co anos; Organização Federal de De-
Aliás, que irrisória competência para a pósito e Seguro (Federal Depos1.t 1_-
nmoe Co-rporation), um membro nato e
organização do serviço público teria o
legislativo, se não pudesse disciplinar a dois nomeados por seis anos; Junta Fe-
investidura dos servidores, o seu acesso deral de Bancos de Financiamento de
na carreira, a transferência de um car- Casas (Federal Hume Poam Bamk
go para outro, a readmissão, enfim, se Board), três membros nomeados por
tOdas essas matérias tivessem de ser quatro anos, sendo dois, no máximo, do
deixadas à discrição do Chefe do Poder mesmo partido; Comissão Federal do
Executivo! O poder de organizar o ser- Comércio (Federal Trade ComnniBsion) ,
viço público pertenceria, em tal hipó- cinco membros nomeados por sete anos,
tese, ao executivo, e não ao legislador. não mais de três do mesmo partido;
Comissão de Titulos e CAmbio (Becuri-
Cuidando-se, em especial, da investi- fies QIPIà Exchange ComanisMon), cinco
dura de servidor público por prazo certo, membros nomeados por cinco anos, sen-
eis uma providência que se integra, com do três, no máximo, do mesmo partido;
- 222-
Junta de Contrôle de Atividades Sub- Presidente dos Estados Unidos. Fica-
versivas (Subversive Acttvities ControZ ram vencidos McReynolds e os dois lu-
Board), cinco membros nomeados por minares Holmes e Brandeis.
cinco anos, não podendo mais de três
pertencerem ao mesmo partido; Comis- Entretanto, em duas outras decisões,
são do Serviço Civil dos Estados Unidos igualmente famosas, posteriores àquela,
(Un4ted States CtviZ Service Comission) ,
uma de 27-5-1935, outra, de 30-6-1958,
três membros nomeados por seis anos, ficou decidido que a doutrina do Myers
não podendo mais de dois pertencer ao Case não se aplicava às nomeações de
mesmo partido; Comissão de Tarifas prazo certo para órgãos dorodos de au-
dos Estados Unidos (United State8 Ta- tonoonia administrativa, dos quais, nos
rift C071V71I4ss1.an) , seis membros nomea- Estados Unidos, se diz que exercem fun-
dos por seis anos, não mais de três do ções quase-legislativas, ou quase judi-
mesmo partido (Apud Un4ted Btates ciárias, entidades criadas por lei e que
Government Organization MIWn1.W.l, 1960- correspondem, lato OOn.8'U, às nossas au-
-1961) . tarquias, dotadas, nos limites da lei, de
funções normativas e jurisdicionais,
Na sessão em que se iniciou o julga- não obstante o seu caráter de órgãos
mento dêste caso, foi ironizada a invo- administrativos, integrantes da admi-
cação da experiência legislativa, admi- nistração descentralizada. Refiro-me ao
nistrativa e judiciária dos Estados Uni- Caso Humphrey (295 U. S., 602, 1935)
dos. A estranheza, entretanto, não pro- e ao Caso Wi6ner (357 U. oS. 349, 1958).
cede. Não é esta consulta ora aconse-
lhada pela identidade dos regimes polí- A doutrina que nos mesmos foi afir-
ticos, em seus traços essenciais, como mada pela Côrte Suprema, a propósito,
também pela circunstãncia de que os respectivamente, da Comissão Federal
norte-americanos estão praticando o do Comércio e da Comissão de Recla-
presidencialismo, que inventaram, des- mações de Guerra, destinou-se, conscien-
ele mais de cem anos antes de nós. te e deliberadamente, a restringir, pre-
Grandes juristas brasileiros, entre êles, cisar e circunscrever a doutrina do
Rui Barbosa, o maior dos que já plei- Myers Case, a qual, entendida ao pé da
tearam perante o Supremo Tribunal, letra, ampliaria desarrazoadamente os
nunca se pejaram de recorrer às fon- podêres do Presidente da República, no
tes norte-americanas. tocante à demissão dos servidores pú-
blicos. O objetivo da nova doutrina, que
Pois bem: ali, depois de muito estu- a Côrte Suprema enunciou de maneira
dado e debatido o assunto, pelos três explicita, foi justamente garantir o
podêres chegou a Côrte Suprema a uma exerci cio das funções e atribuições dos
fórmula bastante apropriada e de fér- mencionados órgãos autônomos com a
teis conseqüências. O significado e o al- necessária independência, em face do
cance juridico da investidura de prazo Poder Executivo, para que pudessem
certo ficou a depender da rnatureza do cumprir, a salvo de injunções, a pol1-
cargo ou função. No tocante aos que se tica de orientação traçada pelo Poder
situam, estritamente, na linha hierár- Legislativo, ao instituir tais entidades
quica do Poder Executivo, isto é, den- autônomas.
tro da estrutura a que chamamos, no
Brasil, a administração direta, enten- Note-se, aliás que a Chefia do Poder
de-se que a investidura de prazo certo Executivo, configurada no Presidente
apenas marca o seu têrmo final mas da República e considerada de maneira
não impede o Chefe do Govêrno de exo- impessoal, isto é, independentemente da
nerar o funcionário antes dêste têrmo. pessoa que a exerça, também participa
Esta foi a doutrina de um julgamento do processo legislativo, através da ini-
famoso, o Mye:rs Case (272 U. S. 52), de ciativa, da sanção ou do veto das leis
1926. Foi rela.tor o Chief Justice William que organizam êsses órgãos indepen-
Taft, que por coincidência tinha sido dentes.
Peço vênia aos eminente colegas para dade executiva, exceto na sua seleção, e
let'- alguns trechos das duas citadas de- livre para emitir o seu julgamentó inde-
cisões da COrte Suprema, a fim de do- pendentemente de permissão ou emba-
cumentar o que acabo de indicar resu- raço por parte de qualquer outro fW1-
midamente. cionário ou qualquer departamento do
govêrno. li: evidente que o Congresso foi
Consta da ementa do caso Hum- de opinião que a extensão da investidu-
ph:re'JI8 Executor versus Umted Btate8, ra e a certeza de nela permanecer con-
segundo a publicação da La;wyer'8 Edi- tribuiriam de maneira vital para a con-
tion (55 S. ct. 869) : secução dêsses objetivos. A afirmativa
"O Congresso tem competência para de que, não obstante isso, os membros
determinar que agências quase-legislati- da Comissão continuam na fW1ção pela
vas ou quase-judiciárias desempenhem simples vontade do Presidente poderia
suas fW1ções independentemente do con- frustrar em larga medida, os próprios
trOle do Executivo, bem como estabele- fins que o Congresso procurou alcan-
cer prazo para o exercício dos cargos çar pela fixação do prazo de duração
respectivos e proibir a demissão dos res- do exercício. Concluímos que o intuito
pectivos membros, pelo Presidente da da lei é imitar o poder de demitir do
República, durante o prazo da investi- Executivo às causas enumeradas, ne-
dura (during their term 01 oI/ice), salvo nhuma das quais é invocada neste
ocorrendo motivo legal. ( ... ) A ques- caso ( ... )".
tão de saber se o Presidente pode de-
Note-se que na lei não havia expressa
mitir servidor público, a despeito da li- proibição de demitir, pois que se limi-
mitação estabelecida pelo Congresso ao tava a permitir a demissão pelos moti-
seu poder de demissão, depende da na-
vos enumerados; e a Côrte Suprema in-
tureza do cargo, e da circW1stância de
terpretou a lei, ccmtTario sen.s'U, como
exercer o servidor funções quase-legis-
proibitiva de demissão por outros mo-
lativas ou quase-judiciárias. ( ... ) A lei tivos, ou não motivada.
que permite ao Presidente demitir mem-
bros da Comissão Federal do Comércio O Br. Ministro Ribeiro da Costa (Re-
por ineficiência, negligência no cum- lator) - Embora não me agrade per-
primento do dever ou má conduta no turbar a elaboração de V. Exa., eu me
exercicio da função, interpretada no sen- permito fazer uma observação: é que
tido de limitar o poder de demitir do V. Exa. está argumentando com um
Presidente à ocorrência dos motivos caso ocorrido nos Estados Unidos que
mencionados estabeleceu legitima res- não tem pertinência com a espécie que
trição à competência do Executivo. vamos apreciar. V. Exa. se refere aO
( ... ) O Poder do Presidente de demi- exercicio de fW1ções quase-legislativas
tir os membros da Comissão Federal de e quase-judiciárias. Ora, é evidente que
Comércio é limitado à demissão pelos o ato do Presidente, que demitisse um
motivos especificos enumerados na dêsses investidos atentaria contra dis-
lei ( ... )". positivo de ordem constitucional. No
caso que vamos julgar, trata-se de ser-
Lê-se, ainda, no corpo da decisão: vidor administrativo, representante do
Govêrno, mandatário do Govêrno. li: coi-
" ( ... ) a letra da lei, os anais legis- sa diferente.
lativos e as finalidades gerais dessa le-
gislação, tais como refletidas nos deba- O Br. Ministro Vitor Nwne8 - Não do
tes, tudo concorre para demonstrar a Govêrno, embora a lei o diga, impro-
intenção do Congresso de criar entida- priamente. A Constituição refere-se à
de de pessoas especializadas, que adqui- União, quando se refere à previdência.
rissem experiência através do prolon- Chegarei lá. O que pretendo demonstrar,
gamento do exercicio; um órgão coleti- por ora, é que, nos Estados Unidos, o
vo, que fOsse independente da autori- que se chamam fW1çôes quase-judiciá.-
-224-
rias e quase-legislativas é, precisamen- aspiração do definitivo. Menos de dez
te, o que nós chamamos, aqui, funções anos depois, uma COrte unânilhe, em
normativas e jurisdicionais de órgãos Humphrey's Executor v. United States
administrativos. O sistema previdenciá- ( ... ), delimitou restritamente o alcan-
rio brasileiro baseia-se em uma série de ce da decisão Myers para incluir sOmen-
conselhos, com recursos diversos, con- te "os servidores simplesmente executi-
selhos que decidem sõbre direitos das vos" (aU purely ~We offi,cers)
partes interessadas e expedem normas ( ... )".
reguladoras da aplicação das leis de O que os americanos chamam 63:6-
previdência. 1t precisa.mente, é exatlssi- outive department ou exooutive esw--
m8JIIlente o que fazem, cada qual no seu bli8htment é o que nós denominamos
campo de ação, as reguJatqry comi8- admIIinistTnção direta, conceito que ex-
Bions, no direito administrativo norte- clui a administração descentralizada,
-americano. No caso Myron Wieln.ter 'V. através das autarquias. São diferentes
U/tIoi.teà Btates, de 30-6-1958, relatado
as palavras, mas os conceitos se cor-
pelo eminentíssimo Felix Frankfurter, respondem, aqui e nos Estados Unidos.
fêz-se um elucidativo confronto entre E o que se discute, no momento, é se o
os casos Myers e H1JII1IIPhrey, que muito Presidente tem ilimitado poder de de-
contribui para dar maior precisão à mitir os membros de um corpo delibe-
doutrina da Suprema Côrte. Lê-se na rativo autOnoono, integrante da admi-
ementa da Lawyer's EdUicm (78 S. Ct. nistração descentralizada.
1275):
Continuo a ler a Wietner optn4.on: "A
"O Presidente pode demitir funcioná- COrte, explicitamente, ~ as
rios que fazem parte da administração expressões, contidas no julgado Myers,
direta (e:recutive establi8h1ment), mas o que sustentavam o inerente poder cons-
poder presidencial de demitir os mem- titucional do Presidente de demitir mem-
bros de um corpo deliberativo criado bros dos corpos quase-judiciários. ( ... )
para exercer seu julgamento sem obs- O caso Humphrey foi uma 00<U.ge célt-
táculo por parte de qualquer outro fun- bre, e não menos nos recintos do Con-
cionário só existe, se o Congresso lho gresso. Qual a essência da decisão do
conferir. ( ... ) Tendo a Lei de Reclama- caso Humphrey? 1tle estabeleceu uma
ções de Guerra de 1948 instituido uma nitida linha divisória entre funcionários
Comissão com competência para julgar que fazem parte da administração di-
as reclamações de guerra de acõrdo com reta ( tlalEICUtWe establishtment) e que
a lei, e sem recurso, e não contendo essa eram, portanto, demissiveis por fOrça
lei qualquer disposição relativa à de- dos podêres constitucionais do Presi-
missão dos conselheiros, não tem o Pre- dente, e aquêles que são membros de
sidente autoridade para demitir um con- uma. entidade criada "para exercer seu
selheiro sõmente para ter, na Comissão, julgamento sem dependência de per-
pessoal de sua própria escolha". missão ou embaraço de qualquer outro
E no contexto da decisão lemos o funcionário ou de qualquer departamen-
seguinte: to do govêrno" ( ... ), e em relação aos
quais o poder de exonerar só existe na
Afirmou-se "que o caso Myers reco- medida em que o Congresso haja por
nheceu o inerente poder constítucional bem conferi-lo. Essa nitida distinção de-
do Presidente de demitir servidores pú- riva da diferença funcional entre os que
blicos, qualquer que seja a sua relação fazem parte da administração direta e
com o Executivo para o desempenho de os que pertencem a órgãos cujas atri-
suas atribuições, e não obstante as res- buições exigem absoluta independência
trições que o Congresso possa ter esta- em face do Executivo. "Pois é inequi-
belecido com respeito à duração da in- vocamente evidente - para de nOvo
vestidura. A versatilidade das circuns- citar o caso de Humphrey - que quem
tAncias muita vêzes desilude a natural exerce o cargo sômente enquanto agra-
- 225-
da a outro, não pode, por isso mesmo, órgãos por pessoa de sua confiança. En-
manter uma atitude de independência tretanto, afirmou, na outra sessão, o
ante a vontade dêsse outro". eminente Procurador-Geral que elas se
referiam a funcionários dos podêres le-
Essas duas memoráveis decisões lan- gislativo e judiciário. lfl possivel mesmo,
çam muita luz sObre o tema ora em que eu tenha ouvido mal as palavras de
debate. S. Exa. porque os dois precedentes da
O Sr. Ministro Cdmdido Mota - lfl Côrte Suprema cuidam, explicitamente,
que, nesses casos, não é unüorme a. ju- de membros de órgãos de funções quase-
risprudência americana. Há acórdãos a -judiciãrias ou quase-legislativas, o que,
favor e acórdãos contra. de modo nenhum, os situa nos quadros
do Congresso ou dos Tribunais. Perten-
o Sr. Mirnistro Vítor Nwnes - Posso cem êles ao que chamamos administra-
afirmar que não, depois de 1935; de- ção descentralizada. Como observa Clau-
pois do caso Humphrey, não. dius C. Johnson, "o tipo de órgão
de administração direta (executive de-
O Sr. Ministro Cândido M<Yta - Eu part'm8nts) que tem recebido maior
posso citar um livro a respeito da Pre- soma de atenção é a chamada contissão
sidência nos Estados Unidos, onde se independente" (GO'OO7'n:mernt irn the
aponta um caso de 1937. UnÜ18 States, 1956, pâgs. 534).
O Sr. Mmi8tro Vitor N1IIIW8 - Supo- Tais entidades são os eqUivalentes
nho que há equivoco. das nossas autarquias econômicas e ad-
ministrativas, cuja criação depende de
O Sr. Mmistro Hah,namwnn Guimarães lei. E a lei que lhes dá autonomia, nos
- Nos casos em que o funcionãrio po- limites que o legislador considere con-
dia ser demitido, não se falava em re- veniente, tem por objetivo, não só faci-
presentante do Govêrno. Na espécie, há litar a administração dos serviços res-
um representante do Govêrno num ór- pectivos, pela adoção de normas dife-
gão colegiado. rentes das que vigoram para a adminis-
O Sr. Mmistro Vítor Nwnes - Pro- tração direta, mas também tornar os
curarei tratar dêste argumento mais seus dirigentes, nos têrmos da lei, in-
adiante. E peço permissão para lem- dependentes da miúda e cotidiana inter-
brar que, no caso Wiener, membro da ferência do Chefe da administração fe-
Comissão de Reclamações de Guerra, deral. A doutrina dos casos Humphrey
nem sequer havia disposição que defi- e Wiener tem, como se vê, inteira apli-
nisse os casos de demissibilidade; nem cação ao processo em exame, quer pela
havia mesmo prazo explicito para a in- semelhança do regime (ao tempo da
vestidura. A lei criou uma comiSsão impetração, quer por se tratar de en-
para funcionar por prazo determinado. tidades administrativas de atribuições
Entretanto, com lei tão omissa, a una- congêneres, do ponto de vista do direito,
nimidade da Côrte Suprema, se afirmou e cuja continuidade e independência de
no mesmo sentido da decisão Hum- ação o legislador quis proteger com a
phrey. investidura de prazo certo de alguns ou
de quase todos os seus dirigentes.
O Sr. Ministro Hahtnem.omm. Guima-
rães - No caso Humphrey, nenhum Encerrada esta longa referência à ju-
funcionãrio representava um órgão co- risprudência norte-americana, voltemos
legiado. às razões contrãrias à impetração. Tam-
bém se argUiu que o poder de demitir
O Sr. Ministro Vítor N1IIIW8 - A ra- deriva do de nomear, e concluiu-se que
zão pela qual dois Presidentes, Roose- são ambos co-extensivos; devendo pre-
velt e Eisenhower, demitiram os refe- valecer, para o poder de nomeação,
ridos funcionãrios foi que o Govêrno apenas as restrições expressas na Cons-
precisava estar representado naqueles tituição federal, o mesmo se deveria
- 226-
entender com relação aO poder de de- mitir. Outros exemplos, além do está-
mitir. gio probatório, poderiam ser lembrados.
Ocorre-me a doutrina dos motivos de-
11: realmente aceito, pelos especialis- terminantes, desenvolvida, na França
tas, que o poder de demitir resulta do por Gaston Jêze, e aceita, entre nós,
de nomear. Não hã, porém, concordân- em parecer de Francisco Campos. Essa
cia na tese de que o poder de demitir é doutrina foi recentemente, prestigiada
co-extensivo do de nomear, isto é, que pela 2' Turma do Supremo Tribunal Fe-
os dois podêl'es tenham as mesmas di- deral (e digo prestigiada, porque não
mensões ou se desenvolvam dentro da partIcipei do julgamento), no caso Vas-
mesma superfície. co Pezzi, pela palavra magistral do
O poder de demitir, em alguns casos, eminente Ministro Hahnemann Guima-
tem extensão maior que o de nomear, rães (ag. 24.715, de 10-10-61).
quando se dispensa, por exemplo, a con- Estou, pois, firmemente convencido
cordância do Senado para o afastamen- de que o Govêrno extraiu da regra, se-
to de titulares cuja investidura depende gundo a qual o poder de demitir deriva
da sua aprovação. A recíproca também do de nomear, conseqüências que a lei,
é verdadeira, segundo a nossa reiterada a doutrina e a jurisprudência têm re-
prãtica legislativa, judiciãria e adminis- pelido, com fundadas razões. A Cons-
trativa, coincidente com a de outros tituição não ampara a interpretação na-
países, no sentido da legitimidade das poleônica do Executivo no caso pre-
restrições legais ao poder de demitir. sente.
Uma das questões, cujo exame se tem
repetido illtimamente, envolvendo o pro- Ponderou-se, por outro lado, que a
blema em debate, é a do estãgio proba- pretensão do impetrante, de não ver re-
tório. Jã decidimos com o apoio do emi- duzido, sem justa causa, o prazo de sua
nente relator do presente processo, que investidura, equivale a criar um caso
não hã identidade entre o instituto do de estabilidade temporãria, que a Cons-
estãgio probatório e o da estabilidade. tituição não admite. O argumento, data
Ambos têm de comum serem garantias venia, não focaliza adequadamente o
contra a demissão arbitrãria ou imoti- problema em debate. A garantia ão
vada de servidores públicos. Entretanto, exercício do cargo, por certo prazo, de
uma diferença fundamental, que separa modo algum pode ser equiparada à es-
os dois institutos, consiste em estar o tabilidade. Cabem aqui, as mesmas ra-
servidor estãvel protegido contra a pró- zões jã desenvolvidas quanto à distin-
pria supressão do cargo, ficando, em tal ção entre o estãgio probatório e a esta-
caso, em disponibilidade, até ser apro- bilidade.
veitado em outro eqUivalente. Dessa
garantia não dispõe o estagiãrio, mas A investidura de prazo certo é apenas
êle estã resguardado de demissão arbi- uma, dentre vãrias técnicas admissíveis,
trária ou imotivada, porque, para seu para proteger o servidor público das
afastamento o Estatuto dos Funcionã- demissões arbitrãrias, ou imotivadas, e
rios exige processo administrativo. visa a um objetivo que transcende dessa
conseqüência imediata, o de garantir a
A prevalecer a doutrina, que a admi- continuidade de orientação e a indepen-
nistração sustenta no caso presente, de- dência dos órgãos administrativos que o
saparecerã da nossa legislação, por in- legislador dotou com autonomia. Esta é
constitucional o instituto do estãgio pro- que é, repita-se, a finalidade de ordem
batório. Na verdade, porém, assim como geral, a razão de serviço público que
o legislador pode condicionar o exercí- inspira a investidura de prazo certo.
cio da competência do Chefe do Go- Por isso mesmo, a doutrina formada
vêrno para prover cargos, também púde pela Côrte Suprema dos Estados Unidos
condicionar, sob a inspiração do interês- só lhe atribui a conseqüência de vedar
se público, o exerci cio do poder de de- a. demissão antes do têrmo, sem moU-
- 227-
vo legal, quando se trate de funcioná- fiança, que pressupõem, por definição,
rio de entidades autônomas, cuja inde- a demissibilidade ad nutum.
pendência de critério tenha de ser pre-
servada, e não de servidores integra- Além disso, são numerosos os exem-
dos na hierarquia ordinária da admi- plos de normas legais que protegem, in-
nistração direta. diretamente, os titulares de cargos de
Não há, pois, que invocar a disciplina confiança. Assim, a Lei n 9 1.741, de 22
constitucional da estabilidade para se de novembro de 1952, garante os venci-
negar validade à investidura de prazo mentos da comissão ao funcionário dela
certo, porque são noções diferentes. afastado depois de dez anos de exerci-
cio. Do mesmo modo, o Estatuto dos
Existe, aliás, uma situação bem pa- Funcionários ( artigo 180) garante os
recida com a investidura de prazo certo vencimentos da comissão, ou da função
nas relações de trabalho de natureza pri- gratificada ao servidor que se aposen-
vada. Refiro-me à imprôpriamente cha- tar depois de certo tempo de servi~o pú-
mada estabilidade temporária oú provi- blico e de exercício daquelas posições
sória dos dirigentes sindicais. 1!lles não de confiança.
podem ser afastados do emprêgo, sem
falta grave, enquanto durar o exercicio o cargo que a lei doutou com 11. inves-
da representação sindical. Essa garantia tidura de prazo certo não pode ser tido
foi estabelecida, pelo legislador, não em como função de confiança, porque é jus-
benefício do trabalhador, individualmen- tamente o oposto dela, sendo antinômi-
te considerado, mas no superior interês- cos os propósitos do legislador num e
se da função, que, por sua natureza, há noutro caso. Permitam-,me repetir um
de ser desmpenhada com independência. trecho da decisão da Côrte Suprema, no
caso Humphrey, repetida no caso Wie-
Também se disse, no caso dos autos, ner: "quem exerce o cargo sômente en-
qUe as funções dirigentes, como esta de quanto agrada a outro, não pode, por
que cuidamos, são de confiança; esta- isso mesmo, manter uma atitude de in-
riam, pois, pela própria Constituição, dependência ante a vontade dêsse
excluídas da proteção da estabilidade. outro".
Respondo a êsse argwnento, oota
1Jenia, em primeiro lugar, com as mes- o objetivo do legislador, Com a inves-
mas considerações já aduzidas a respei- tidura de prazo certo, é justamente tor-
to da estabilidade. A estabilidade é uma nar o titular do cargo independente das
coisa, e a investidura de prazo certo, injunções do Chefe do Poder Executivo.
outra, bem diferente, cada qual com os Pode errar o legislador, ao adotar êsse
seus pressupostos e objetivos. A estabi- critério, em relação a tal ou qual ser-
lidade visa, sobretudo, à proteção da viço a que concede autonomia, mas não
pessoa do servidor; a investidura de pra- cabe ao Judiciário corrigir a política do
zo certo, o que protege, através da per- Poder Legislativo. Se o que visa o Le-
manência do servidor no cargo, é o inte- gislativo é, justamente, tornar deter-
rêsse mais alto, da continuidadé e in- minado funcionário independente, no
dependência da função por êle exercida exercicio de suas atribuições, como po-
num órgão dotado de autonomia. demos nós dizer, ao contrário da lei,
Em segundo lugar menciona a Cons- que êsse funcionário exerce função de
tituição (art. 188, parágrafo único) os confiança, que o tornaria inteiramente
cargos de confiança, mas não os defi- submetido ao Chefe do Govêrno?
ne. Essa atribuição, ficou, portallto, de-
legada ao legislador ordinário (art. Concluída a discussão no plano cons-
184). Quando a lei cria um cargo com titucional, passemos aos argumentos de
investidura de prazo certo, evidente- natureza legal. Já aludimos a improprie-
mente o exclui da categoria dos de con- dade da denominação mamdato, que se
- 228-
tem dado à investidura administrativa gumento de lhes serem aplicáveis as re-
de prazo certo. Entretanto, essa errô- gras do direito privado relativas ao
nea extensão do vocábulo resultou da mandato. Nestas condições - prosse-
aproximação de tais situações, não com gue o argwnento - se pode o mandan-
o mandato de Ilireito co.mum, porém com te, salvo casos especiais, previstos em
o mandato de direito político, isto é, lei, revogar o mandato, poderia também
com o mandato político-representativo. o Presidente da RepúbliCa demitir o
E o ponto de afinidade consiste, justa- servidor nomeado com prazo certo.
mente, em que um e outro são de pra-
zo irredutivel. Data 1Xmia, o uso impróprio do vocá-
bulo mar1uW,to não pode mudar o prêto
Afirmou, na primeira assentada dêste em branco, para fazer surgir, em tais
julgamento, o eminente Procurador-Ge- casos, a figura juridica do mandato.
ral que o mandato político é revogável, Pelo art. 1.208 do Cód. Civil, tem-se o
ao arbítrio do mandante, pois a tanto mandato, "quando alguém recebe de
equivale o processo de ilmpeachment. outro podêres para em seu nome, pra-
Com a devida vênia, não é o impooch- ticar atos, ou administrar interêsses"
ment o instituto de direito político em Daí resulta, portanto, que a atividad~
que se traduz a noção de revogabilidade exercida pertence, originàriamente, ao
do mandato representativo; é o recall mandante e é por êle delegada ao man-
através do qual os próprios eleitores re- datário, ou por comodidade, ou por falta
tiram o mandato conferido ao seu repre- de habilitação legal.
sentante. Mas nunca se afirmou, ao que
eu saiba, pudesse o recatl ser admiti- Nada disso acontece nas nomeações
do como implícito na própria noção de de prazo certo. No caso dos autos, por
mandato político, isto é, que se pudesse exemplo, quem pode pretender que as
adotar, sem norma constitucional ou le- atribuições exercidas pelo nomeado fôs-
gal, o princípio da revogabilidade do sem, originàriamente, do Presidente da
mandato politico. República, de modo a constituir-se aquê_
le em mandatário dêste?
Nem quis o eminente Procurador-Ge-
ral, ao que parece, extrair essa conse- o Sr. Ministro Ribeiro da Costa (Re-
qilência das suas próprias palavras, por- lator) - V. Excia. pode transferir êste
que apelou para o ímq>e:rchment. Mas raciocínio para o plano político e verá,
êsse procedimento, de gravidade excep- então, que, realmente, êsse servidor in-
cional, não acarreta a revogação, e sim, vestido pela vontade do Presidente da
a perda do mandato. l!: uma sanção de República não é senão um mandatário
natureza político-criminal, que pressu- do Presidente da República, que perso-
põe a prática de crime de responsabili- nifica o Govêrno. Se quiser V. Excia.
dade. A invocação do impeac1vment, por- transpor o sentido jurídico do instituto
tanto, longe de favorecer a tese do Go- do mandato para o caso em aprêço, verá
vêrno, no sentido da livre demissibili- que o Presidente da República personi-
dade dos servidores nomeados com pra- fica o Govêrno e tem nesses órgãos, sem
zo certo, levaria antes à conclusão con- dúvida, um seu mandatário, o qual vai
trária. Assim co.mo, no plano politico, executar, no órgão para onde é nomea-
se exige crime de responsabilidade para do, a sua vontade, o seu programa as-
o impoochment, no plano administrativo, sistencial, o seu programa politico, o
para a demissão de servidor nomeado seu programa de amparo ao trabalha-
com prazo certo, se teria de exigir falta dor. Não podemos perder esta noção que
grave, a ser apurada em processo ad- é real para o caso que estamos apre-
ministrati vo. ciando.
Encerrada essa digressão, vemos que O Sr. Ministro Vítor N1JJI1e.S - Se me
a errônea denominação de 'ma;luW.to, permite V. Exa., quando as leis ins-
aplicada a êsses casos, deu lugar ao ar- tituem essas investiduras de prazo cer-
- 229-
to, o objetivo é precisamente o de reti- prio cargo; por isso não podem ser re-
rar do Presidente da República o poder tiradas do funcionário a não ser com
que V. Excia. lhe reconhece. E, quando a sua demissão. Mas nunCa se susten-
o legislador quer manter êsse poder, as- tou, no direito administrativo, que de-
sim dispõe expressamente. Por exem- missão de funcionário seja ato equiva-
plo, no Banco de Desenvolvimento Eco- lente ou equiparável à retirada de de-
nômico, o presidente é de livre nomea- legação de podêres. Nunca vi isso em
ção e demissão, enquanto que os demais livro nenhum: que seja a mesma coisa
diretores têm prazo certo de investi- retirar a delegação de podêres, ou de-
dura. ~ o próprio legislador quem dis- mitir o funcionário, para que não exer-
tingue as duas situações: se marca pra- ça as atribuições que lhe confere a lei.
zo para a investidura de alguns, é por- Retira-se a delegação, quando a auto-
que não quer permitir a livre demissão. ridade superior, que a conferiu, não
quer mais que o delegado a exerça.
o Sr. Ministro Ribeiro da Costa (Re-
lator) - Cabe à Côrte Suprema dar Não há que cogitar, portanto na apli-
essa definição para ajudar a obra go- cação, ao caso presente, das regras de
vernamental, para ajudar o programa direito civil sôbre revogação de manda-
que o Presidente da República tem de to, porque aqui não se cuida de nada. pa-
executar. recido com mandato de direito comum.
Se houvesse afinidade, seria com o man-
o Sr. Ministro Viro,. Nwte8 - Estou dato politico, e êste, em nosso direito,
procurando dar a minha modesta con- é irrevogável.
tribuição, para que o Tribunal chegue à
interpretação que julgue mais acertada. Abro agora um parênteses para consi-
Tais funções são criadas em lei, e esta derar, mais detidamente, um argumen-
as institui desde logo, como atribuições to dos eminentes Ministros Hahnemann
do próprio servidor nomeado para exer- Guimarães e Ribeiro da Costa, que me
cê-las. Não se pode receber, por trans- honraram com seus apartes.
ferência de outrem, aquilo que a lei já
conferiu diretamente. Não existe pois, o fato de dispor a Lei de Previdên-
aqui, a figura do mandato de direito cia Social que o Conselho se compõe de
~te8 da classe dos emprega-
comum nem se pode ter o ato de no-
meação como equivalente à procuração, dos, da classe patronal e de orepresen-
que, pelo citado art. 1.288, do Cód. Civil, tantes do Govêrno, não quer dizer, de
"é o instrumento do mandato".
modo nenhum, que se trata de mam,..
dato.
Também não se pode ver na nomea- O Sr. Mimistro Hanmemnmfl Gioumarães
ção um ato de delegação de podêres, - Trata-se do poder de "representa-
igual na esfera administrativa, porém ção"; há representação sem mandato; a
na linha da hierarquia. As nomeações representação é uma situação inerente
de prazo certo, de que estamos cogi- a várias situações juridicas.
tando, são para cargos integrantes de
órgãos dotados de autonomia, isto é, O Sr. Mimstro Vitor Nunes - Quero
com atribuições derivadas diretamente concluir o meu raciocinio, eminente
da lei. Mestre. Não há representação do Go-
vêrno em sentido próprio. A Previdên-
Basta recordar que a delegação de pc- cia Social está estruturada essencial-
dêres Se confere a Um funcionário, que mente, na própria Constituição; ba-
continua no exercicio do cargo próprio, seia-se em contribuição triplice: dos
mesmo depois de cessar a delegação, empregadores, dos empregados e da
pois esta cessão só se refere, õbviamen- União. Diz a Constituição federal (art.
te, aos podêres delegados. Entretanto, 157, n. XVI): "previdência, mediante
na investidura de prazo certo, as atri- contribuição da União, do empregador
buições são, por fôrça de lei, do pró- e do empregado." Porque a União, istQ
- 230-
é, o Estado Federal contribui com um sação do mandato de direito privado, é
têrço da receita que mantém a previ- instituída no beneficio pessoal do man-
dência social, êstes órgãos se estrutu- datário, tem caráter compensatório.
ram com pessoas, não só indicadas pela Mas o prazo da investidura, em C'dSOS
classe dos trabalhadores e pela classe como o dos autos, não é instituído em
patronal, mas também por pessoas razão da pessoa do servidor, mas ra-
nomeadas pelo Govêrno federal. tione rei publicae. Assim, a reparação
do afastamento do funcionário antes do
Se os eminentes Ministros Hahnemann têrmo - afastamento ilegal - não pode
Guimarães e Ribeiro da Costa estão ser de ordem privada, traduzível em
dado tanta atenção à palavra "repre- dinheiro, mas há de ser também de or-
sentantes" empregada noutro sentido, dem pública, com a volta do serviãor ao
e não no sentido de "mandatários", na cargo de que foi dispensado cõntra a
Lei Orgãnica da Previdência, lembrarei lei.
que também na lei de organização das
Juntas de Conciliação e Julgamento e Findo o exame do assunto sob o as-
dos Tribunais de Trabalho de instância pecto legal, vejamos os argumentos de
superior há Juizes representantes das natureza administrativa e poutica. Pon-
classes - empregadores e empregados derou-se que não seria justo ficar o
- nomeados pelo Presidente. Haverá nôvo Presidente vinculado às nomeações
quem sustente que êsses Juizes possam do antecessor; seria mesmo estranhável
ser desti tuidO'S ? que o Presidente, prestes a sair, pudesse
fazer nomeações, cuja duração se pro-
o S'1'. Ministro Hahm.emOh1Jn Guima- longasse pelo seguinte período presiden-
rã.es - As causas de destituição da cial, numa espécie de manobra política
função judiciária são determinadas e de ação retardada.
não há, na lei, causas de demissão fi-
xadas quanto aos representantes do o argumento, data 1JeIlia, é de natu-
Govêrno. reza puramente circunstancial. Coinci-
diu que as nomeações impugnadas foram
o Sr. Ministro Vitor Nw1t6s - Tam- feitas nos últimos tempos do Govêrno
bém não há, na lei, causas especificas anterior. Sendo, porém, o prazo em cau-
de demissão para os Juizes temporários sa de quatro anos, bem poderia ocorrer
da Justiça do Trabalho. que a investidura cruneçasse e terminas-
se na gestão do mesmo Presidente. Esta
o Sr. Ministro Hahllema,nn Guimarães possibilidade tira, portanto, ao argu-
- Sem dúvida há perda da função ju- mento, qualquer validez de ordem teó-
diciária, em casos determinados. rica.
o Sr. Ministro Vitor Nunes - Mas o que há, porém, a observar, a êste
está isto expresso na lei? Ninguém, no respeito (sem falar no reverso da me-
Brasil, já sustentou que êsses Juízes, dalha, que seriam as nomeações do nôvo
chamados repTes13ntcmtes das classes, Presidente, no fim do seu mandato, al-
pudessem ter o seu mandato interrom- cançando, assim, o periodo do sucessor),
pido antes do prazo legal. São repre- é que a cautela trunada pelo legislador,
sentantes, em sentido impróprio; neste ao instituir a investidura de prazo cer-
mesmo sentido impróprio é que aparece to, não se dirige, especificamente, con-
o vocábulo na lei de previdência. tra êste ou aquêle governante, parti-
cularmente considerado. :m uma garan-
Igualmente, não há que se cogitar de tia de independência do exercício das
reparação pecuniária pela revogação do funções dirigentes do órgão autônomo
mandato antes do têrmo. Tudo isto é contra qualquer ocupante da Chefia do
matéria estranha ao tema em liebate. A Poder Executivo, mesmo contra o Pre-
reparação de ordem econômica. pela ces- sidente que tiver feito as nomeações.
- 231-
Também se objeta que a permanência conveniência administrativa o principio
dêsses titulares nomeados pelo govêrno da independência do órgão dotado, por
anterior pode acarretar falta de entro- lei, de autonomia.
samento corn o nôvo govêrno, prejudi-
cando a sua ação administrativa. 1!:ste Sem dúvida, o bom entendimento en-
foi, aliás, o argumento usado pelo Pre- tre o Chefe do Govêrno e os dirigentes
sidente Roosevelt, para demitir Hum- e executores da política do Estado é,
phrey, da Comissão Federal de Comér- em tese. um bem para a administração
cio, e pelo Presidente Eisenhower, para pública. Mas isso é falar, não a lingua-
afastar Wiener, da Comissão de Recla- gem da lei, mas a da conveniência ad-
mações de Guerra. Eis corno o Justice ministrativa. O legislador há de ter pon-
Sutherland relata o primeiro episódio: derado a desvantagem do eventual de-
sencontro de pontos de vista, com o
"Em 25 de julho de 1933, o Presidente beneficio, por êle considerado mais re-
Roosevelt endereçou wna carta ao con- levante, de garantir continuidade e in-
selheiro ( commissioner) , pedindo sua dependência na execução das tarefas
resignação, com fundamento em que confiadas ao órgão autônomo. Quem há
"os objetivos e propósitos da adminis- de pesar as vantagens e inconvenientes
tração relativamente aos trabalhos da de cada uma das duas soluções, não
Comissão podem ser levados a efeito é o Judiciário, que não faz lei, mas o
mais eficazmente com pessoal de minha Legislativo. E êste manifestou a sua
própria escolha", solução que, todavia, opção nitidamente, quando instituiu a
"não signüicava qualquer restrição à investidura de prazo certo.
p1'!ssoa do conselheiro, nem aos seus
serviços." O conselheiro respondeu, so- O argumento, que ora examinamos,
licitando tempo para consultar os ami- por mais valioso que seja no plano da
gos. Depois de alguma correspondência ciência da administração, constitui, do
ulterior sôbre o assunto, o Presidente, ponto de vista juridico, uma razão exa-
em 31 de agôsto de 1933, escreveu ao tamente contrária à que terá inspirado
conselheiro expressando o desejo de que o legislador. Para bem interpretar a
a resignação fôsse apresentada a seguir lei, são as razões do legislador, e não
e disse: "Sei que o Senhor está cons- as que a elas se opuserem, que o apli-
ciente de que o seu pensamento e o meu cador deve levar em conta. São muito
não se ajustam, nem sôbre a politica, adequadas as palavras de Brandeis, vo-
nem sôbre a administração da Comis- tando vencido no Caso Myers: "A dou-
são Federal do Comércio e, falando trina da separação de podêres - disse
com franqueza, acho que será melhor êle - foi adotada pela Convenção de
para o povo dêste pais que haja plena 1787, não para promover a eficiência.
confiança em mim." O conselheiro não mas para prevenir o exercicio do poder
resignou e em 7 de outubro de 1933, o arbitrário."
Presidente lhe escreveu: "A partir desta Objeta-se, com razão, que poderão
data, o senhor está demitido do cargo tais titulares, garantidos contra sua de-
de Conselheiro da Comissão Federal de missão antes do têrmo, abusar das fun-
Comércio." ções. Essa possibilidade também há de
Do mesmo modo, o Presidente Ei- ter sido pesada pelo legislador; por isso
senhower, para afastar Wiener, assim a lei institui, ao lado da investidUra de
se expressou: "Considero de interêsse prazo certo, os mecanismos que a dou-
nacional completar a administração da trina denomina, genêricamente, de
Lei de Reclamações de Guerra de 1948 tutela (Marcelo Caetano, M<JIWIl4l, 4' ed.,
( ... ) com pessoal de minha própria § 93).
escolha."
E o legislador, certamente, teve por
Entretanto, a Côrte Suprema teve menos pernicioso êsse eventual desvio
por mais valioso do que eSSa alegada do que o poder incontrastável do Chefe
- 232
do Govêrno sôbre tôda a administração EXPLICAÇÃO
descentralizada, pois isso desvirtuaria a
própria razão de ser da descentraliza- O Sr. Ministro Ribetro da Oosta (Re-
ção. lator) - Sr. Presidente, tivemos a sor-
te, nem sempre comu.m, de ouvir um
A tese do Govêrno, no caso presente, douto pronunciamento acêrca de ques-
data vonia, consagraria, em têrmos de tão relevante, suscitada em pedido de
decisão judiciária e com a categoria de segurança a êste egrégio Tribunal, do
principio constitucional, os extremos qual sou relator, tendo o meu voto re-
co sistema dos despojos. Mas a atual cebido integral refutação do eminente
legislação, qUe em todos os países civi- Sr. Ministro Vitor Nunes, que solici-
lizados procura resguardar o serviço pú- tara vista dos autos.
blico civil da influência ilimitada da
política, foi precisamente uma conquis- Faz-se mister a minha réplica, a fim
ta, lenta e penosa, contra o spoil sys- de estabelecer em tôrno da controvér-
tmn. A prevalecer a opinião do Govêr- sia distinções que reputo necessárias,
no, todos os órgãos autônomos, ora exis- para que êste Tribunal se oriente, já
tentes em nosso Pais, criados em épo- que, pela primeira vez, deve pronunciar-
cas diversas, perderiam, de imediato, a se a respeito de tal problema.
sua autonomia. Reitores de universida-
des, diretores de escolas superiores, re- o eminente Sr. Ministro Vitor Nunes
presentantes das congregações nos con- entende que a disposição da vigente
selhos universitários, juízes trabalhis- Constituição, no art. 87, nq V, que in-
tas, representativos das classes operária veste o Presidente da República na fa-
e patronial, membros dos Conselhos de culdade de prover os cargos públicos fe-
Contribuintes e do Conselho de Tarifas, derais, deveria ser interpretada por êste
enfim, tôda uma série de altos titulares, Tribunal de forma dia.metralmente opos-
cujo desempenho carece de ser prote- ta àquela que me pareceu conscentânea
gido, em face do Poder Executivo tôda com o aludido preceito e com os pre-
essa gente que forma na cúpula da ad- cedentes aos quais me filiei. A atual
ministração descentralizada, poderia ser Constituição dispõe, realmente, no
mudada de u.m momento para outro, ao art. 87:
simples critério, arbítrio ou capricho do
soberano eletivo, que seria, entre nós, o "Compete privativamente ao Presi-
Presidente da República. dente da República:
Estou, portanto, convencido de que, V - Prover, na forma da lei e com
mesmo do ponto de vista da conveniên- as ressalvas estatuídas por esta Cons-
cia administrativa e política, seria um tituição, os cargos públicos federais."
mal, não um bem, o retôrno ao sistema
dos despojos, que ainda prevalece, lar- Entende S. Excia. que a expressão
gamente em nosso País, e que, neste "na forma da lei" se refere àquilo que
processo, se pretende reimplantar nas a lei dispõe quanto à investidura de re-
áreas reduzidas em que a lei procurou ferência ao tempo de sua duração, en-
cerceá-lo. quanto que não nos parece que assi.m
seja, e sim que a expressão "na forma
Estas considerações são feitas a pro- da lei" se refere à nomenclatura dos
pósito do regime presidencialista. Te- cargos, à discriminação das funções,
riam elas, porém, maior adequação no porque as Constituições anteriores dis-
parlamentarista, em que ora ingressa- punham de outra maneira em relação a
mos, porque, neste, à posição preemi- essa mesma faculdade concedida ao
nente que assume o Congresso, diante Chefe do Poder Executivo Federal.
do Executivo, há de corresponder maior
prestigio da lei. A Constituição de 1891 dizia:
- 233
"Compete privativamente ao Presi- Citei, por ocasião do meu voto, o caso
dente da República prover os cargos ci- do Dr. Demócrito Barreto Dantas, in-
vis e militares de caráter federal, salvo vestido na função de Diretor da Caixa
as restrições expressas na Constitui- Econômica Federal por quatro anos, por
ção." nomeação do govêrno do finado, saudo-
síssimo e nunca esquecido Ministro José
Ao Presidente cabia prover, 8IaJvo Linhares. O Sr. Presidente que o su-
aqwelct8 restrições. cedeu exonerou o Dr. Barreto Dantas.
A atual diz: "com as ressalvas es- Mas êste impetrou mandado de segu-
tatuidas por esta Constituição", mas rança para ser garantido no cargo ou
inclui aquela expressão: "na forma da para se lhe assegurarem os proventos
lei", intercaladamente, no seu texto. durante o período da investidura. E o
Supremo Tribunal garantiu êsses pro-
Então, no caso em aprêço o Presiden- ventos, porque tinha sido nomeado de
te pode prover e desprover, nomea.r e acôrdo com a lei, e o Presidente da Re-
desnomear, porque não há, na Constitui- pública não podia desnomeá-Io naquela
ção federal, em relação à investidura de ocasião.
que se trata, nenhuma restrição ao Pre- Ora, a situação dos atuais membros
sidente para fazer ou desfazer. Se é dos Institutos previdenciários não é
cargo em comissão o de que se cuida, é idêntica à do Dr. Barreto Dantas, que
cargo demissível ad nutwm. Não está fôra nomeado na vigência da Consti-
ínsito nos preceitos da Constituição a tuição de 1937 e demitido ainda na vi-
pretensa garantia de estabilidade, em- gência dela, prevalecendo em seu favor
bora a lei ordinária tenha estabelecido a exceção da lei. Os atuais estão com
que a in~stidura se dilatará por qua- os seus titulos de nomeação subordina-
tro anos. dos àquilo que expressamente dispõe a
As Constituições que se seguiram à vigente Constituição. O Presidente pode
de 1891, colocaram a questão de modo nomear ou desnomear, salvo as restri-
diferente. A de 1934 dispõe: ções contidas na Constituição, mas, em
relação a essa investidura, a Constitui-
"Compete ao Presidente da Repúbli- ção atual não cria nenhuma restrição
ca prover os cargos federais, salvo as para a desnomeação, antes a autoriza
exceções previstas na Constituição e porque se trata de cargo exercivel em
tIJa8 lei,s>'. comissão, como o é o de estrita con-
fiança do Govêrno, do qual o impetrante
Se na Constituição de 1934, a lei con- era mero representante na entidade au-
feria ao investido em cargo público a tárquica.
garantia, embora provisória, de o exer-
cer por quatro anos, o Presidente não Pensemos em têrmos de realidade. O
poderia desnomeá-Io nesse interregno, Govêrno, que tem o seu programa assis-
já que a lei federal lhe assegurava a tencial, econômico e político, ligado ao
outorga pelo penodo de quatro anos, problema de socorro ao trabalhador em
compreendida naquela exceção. geral, que traça o seu programa e n0-
meia para dirigir essas entidades pes-
O mesmo ocorreu com a Constituição soas que o vão representar ali, ficará
de 1937, que dizia: atado à investidura pelo prazo de qua-
"Compete privativamente ao Presi- tro ano, se tais pessoas descumprem
dente da RepÚblica prover os cargos fe- suas determinações, seu programa?
derais, salvo as exceções previstas na Isto seria admitir o absurdo, seria admi-
Constituição e na.s lei8." tir um Presidente da República inex-
pressivo e desarmado. :s: impossível que
:s: que a exceção da lei, prevista no a lei pretenda um dislate dessa ordem.
texto constitucional, obstava ao Presi- O que a lei visa é que as coisas corram
dente o uso de ato discricionário. dentro de um ambiente de compreensão,
- 234-
de obediência, de disciplina, de respeito parte Humphrey. A mím me parece que
a lIll'll programa governamental. Assim, os órgãos que cuidam no nosso Pais
caberia ao Presidente da República, de previdência 'Social estão diretamente
como coube ao Dr. Jânio Quadros, ti- vinculados ao Presidente da República,
rar essas funções àqueles que, nas à sua política assistencial, à sua políti-
vésperas de terminar o Govêrno an- ca econômica. Será que o Presidente da
terior, haviam sido nomeados. A meu República nêles não intervém indireta-
ver, datn veni.!;t, o Presidente da Re- mente através de representantes seus,
pública que tivesse diante de si dois me- Presidentes, Diretores, Conselheiros?
ses de mandato a terminar, deveria es- Assim creio qUe a objeção contida no
perar que viesse o seu substituto para voto do eminente Ministro Vítor Nunes
inaugurar o seu nôvo programa admi- a respeito da'S restrições da Constitui-
nistrativo e governamental e então no- ção ao Presidente da República para no-
mear seus funcionários. Mas sabemos, mear e desnomear, creio, e creio since-
ninguém o ignora: as nomeações foram ramente, não oferece consistência. Per-
feitas a toque de' caixa, ao fim do Go- mita o meu eminente colega, a quem
vêrno. Ora, a tramitação de uma lei tanto admiro, que eu assim o diga. Não
dessa ordem é rotineira, demorada. O é consistente, porque a Constituição su-
Sr. Presidente estava terminando o man- bordina a nomeação para os cargos e
dato porém muitos eram os interessa- a desncmeação, às restrições que ela
dos em que as coisas se fizessem ao sa- mesma estatui. Neste caso, não há res-
bor de suas ambições e conveniências. trições ao ato do Presidente da Repú-
Então a lei correu celeremente, o Pre-
blica para desnomear, ato que corres-
sidente sancionou-a e, logo depois, tra- ponde à iniciativa de bem governar o
tou de nomear... Os jornais falavam
País. E não podemos negar ao Presi-
disso todos os dias. Veio a avalancha de dente da República êsse objetivo. Qual
nomeações. a intenção do Presidente? Imprimir ao
Nós somos juízes, os mais altos ser- País o seu programa, e, para fazê-lo, é
vidores da Nação, os intérpretes respon- mister afastar certos elementos de re-
sáveis pelos seus maiores interêsses. Em presentações do Govêrno anterior no:;; ór-
nossas mãos estão os destinos do País, gãos de previdência, substituindo-os por
destinos tão mal cuidados por outros ór- pessoas de sua confiança. Trata-se de
gãos, aos quais se impunha maior des- cargos em comissão, cargos de estrita
vêlo pelo bem da coisa pública. Por que, confiança. E devo salientar que o ocor-
então vamos interpretar êste caso ape- rido no noS'So país, o drama que todos
gados, como o eminente Sr. Ministro nós lamentamos, da fuga do Chefe do
Vítor Nunes, a certas hipóteses que fo- Poder Executivo de seu pôsto, onde o
ram submetidas ao Tribunal norte-ame- colocaram seis milhões de brasileiros,
ricano e que, a meu ver, não têm vin- que aconteceu àquelas pessoas que êste
culação com êle? Presidente havia nomeado para êsses
S. Exa. citou o caso "Humphrey", órgãos? Tôdas elas saíram dessas fun-
membro de uma comissão de reparação, ções. Nenhuma impetrou mandado de
comissão esta, porém, de caráter autô- segurança, reconhecendo que era licito
nomo. Nem era possível que uma comis- ao nôvo Presidente da República no-
são julgadora não fôsse autônoma. Tê- mear os seus próprios representantes.
-lo-ia de ser forçosamente. O Sr. Ministro Vitor Nune::; - A opi-
Aqui, trata-se de um órgão previden- ruao de V. Exa., eu louvo e muito,
ciaI, nitidamente de caráter administra- mas a dêsses funcionários ....
tivo. O Sr. Ministro Ribeiro da Costa (Re-
Pretende o eminente Ministro Vítor lator) - O que ocorre, na realidade, é
Nunes que êsse órgão é autônomo e que isto: é que êsses nomeados e desnomea-
tem paridade com o órgão de que fazia dos compreenderam que o atual Presi-
- 235-
dente, tendo seu programa assistencial petrante como qualificar sua situação
a executar, cabia a êles ceder o lugar juridica: se a de fU:7liCWnário, servidor
às pessoas de sua confiança, que jã fo- público, ocupante de cargo público cria-
ram investidas e estão exercendo êsses do por lei, ou se a de mandatátrio, face
cargos. aos preceitos que o próprio impetrante
evoca, destacando-os da Lei Orgânica
Então do voto do eminente Ministro
da Previdência Social".
Vitor Nunes, eu teria de eliminar certa
proposição muito relevante e brilhante-
Vou continuar a leitura, porque en-
mente desenvolvida por S. Exa., mas
tendo que esta informação situou pre-
que, a meu ver, não tem paridade com
cisamente a situação do impetrante,
o caso em aprêço. E só por isto, Sr.
conforme a natureza da sua investidura.
Presidente, para fornecer elementos a
Senão, vejamos:
outros colegas que vão intervir no jul-
gamento na próxima sessão, quando o
"Pretende o impetrante não ser um
eminente Ministro Gonçalves de Olivei-
funcionãrio público, e sim um manda-
ra tiver de dar seu voto, para que te-
tãrio do Govêrno. Com êste objetivo
nham diante de seus olhos uma réplica
alega que a natureza do serviço presta-
ao que disse o eminente Ministro Vitor
do não lhe conferiria a qualidade de
Nunes, é que estou tomando tanto tem- funcionãrio público, razão pela qual lhe
po ao Tribunal. Verdadeiramente, o faltaria o laço do status com a Admi-
caso requer dêste Tribunal um grande nistração, buscando amparar-se o impe-
esfôrço e não estã em mim, de forma trante na lição do sempre admirãvel
alguma, pretender que a minha modes- Pontes de Miranda (C011IBntálrios à
ta opinião possa prevalecer a argumen- Constituição, vol. IV, fls. 137, inicial
tos mais convincentes que êste Tribu-
do pedido de mandado, item 80, fls. 6).
nal deverã recolher. O interêsse, no
caso, é que êste Tribunal profira uma Insurge-se o impetrante, nesse par-
decisão que tranqüilize a orientação ticular, contra expressa disposição le-
presidencial. gal, pois a mesma Lei Orgânica da Pre-
O então Ministro do Trabalho Doutor vidência Social, em seu art. 128, declara
Castro Neves, informando a êste Tri- que "o regime de pessoal dos represen-
bunal contra o pedido de segurança, tantes do Govêrno nos órgãos de deli-
pelo oficio de fls. 17 e seguintes, que, beração coletiva da Previdência Social
suponho, são de sua própria elaboração, serã o que vigorar para os funcionãrios
refutou, a meu ver com muita sereni- públicos civis da União, cabendo ao Mi-
dade, com absoluta segurança, o pedido nistro do Trabalho as sanções discipli-
inicial, até mostrando a incerteza com nares dêle decorrentes" (Lei n~ 3.807, de
que fôra postulado. E diz assim: 26 de agOsto de 19fO, art. 128).
"A incerteza da postulação, aliãs, é
Ora, não cabe nem dizer-se que a de-
perceptivel até na impropriedade do que
terminação legal permite alternativa,
pede. Solicita-se a segurança para que
pois a extensão pura e simples do re-
o "impetrante regresse (sic) ao cargo
gime do funcionalismo civil da União é
de que foi dispensado" (inicial - fls. 8).
expressa e sem limitações.
Pedindo o regresso lU) OO/T'go, ao invés
de adotar qualquer das fórmulas legais
Não ocupando cargo efetivo, óbvio se
de reconquista do cargo perdido -
toma ocupã-lo o impetrante em comis-
como reintegração ou reodnnissão - são, diante da explicita disposição da
mostra o impetrante que não se sente Lei (art. 128), afastando tOda e qual-
com direito a vindicar uma dessas so- quer dúvida quanto a qualquer peculia-
luções juridicas. ridade que se pretendesse atribuir aos
'1t que, e segundo deflui das próprias cargos de representantes governamen-
razões do pedido, não sabe bem o im- tais nos colegiados da previdência tão
- 236-
só pelo fato de constar do art. 103 a observância daquela faculdade de dire-
referência a um "mandato de quatro ção e contrôle que o Executivo Federal
anos", insuscetível de isoladamente mo- deve exercer em relação às Instituições
dificar a natureza do provimento". de seguro social".
Veja-se bem que a redação dêste pe- Lido êsses trechos e não desejando
riodo é perfeita, no sentido de traduzir prosseguir mais nesta leitura, porque
que o fato do mandato ser de quatro seria fastidioso ...
anos, segundo diz o dispositivo do art.
103, não implica que a função seja ga- o Sr. Mi>nistro Ari Franco - De modo
rantida por êsses quatro anos, porque nenhum.
tem de se distinguir a natureza do pro- o Sr. Ministro Ribeiro 00 Costa (Re-
vimento para o cargo, que define a ga- lator) - ... quando menos pelo meu
rantia da estabilidade, e não o fato do esclarecimento, não insistirei na leitura
art. 103 dizer que o mandato é de qua- do excelente ofício de informações do
tro anos. então Ministro do Trabalho.
E prossegue a informação:
Verifico, pelo estudo e meditação que
"Vinculando-se à mais ativa partici- êste caso exige, que não podemos filiar
pação de representantes dos contribuin- sua solução àquela que ocorreu com as
tes, escolhidos mediante eleição promo- hipóteses trazidas, brilhantemente, ao
vida no seio dos Sindicatos das respecti- debate pelo eminente Sr. Ministro Vitor
vas categorias econô.rnicas e profissio- Nunes Leal. Aqui, trata-se de órgãos
nais, processo de escolha realmente ca- vinculadcs à administração federal, vin-
racterizador de um mandato e por si culados e subordinados, diretamente, ao
mesmo exigindo a demarcação de um Presidente da República, que tem, nêles,
prazo de exercício, o preceito do art. seus representantes, pois são a l<m.ga
.103 não se estende por iguais razões mana do Presidente da República. Aliás,
aos representantes do Govêrno, cuja es- o programa governamental, muitas vê-
colha, aliás, é disciplinada de modo es- zes importantíssimo profundo e rele-
pecial no § 1'1 do mesmo artigo. vante, que nesses órgãos se deve incre-
mentar, não pode ser executado autô-
Dada a natureza do cargo ocupado nomamente, como, M·ta venia, pareceu
e em face da nenhuma limitação legal ao €illlinente Ministro.
ao respectivo provimento... (porque, Mas não parece, de forma alguma,
se houvesse uma lei que fizesse restri- que êsses órgãos possam ter um cará-
ções a êsse provimento, era possível ter autônomo, no sentido do interêsse de
respeitar, mas não há; enquanto que as administração pública; ao contrário,
restrições da Constituição também não acho que são órgãos cuja esfera de ação
impedem que o Presidente também no- deriva de programa governamental, re-
meie) ... cumpre distinguir-se entre a presentado, evidentemente, pelo Presi-
situação dos representantes do Govêrno, dente da República.
de um lado, e, de outro lado, a situa-
ção dos eleitos pelos contribuintes." Assim, data venia, do eminente Minis-
tro Vítor Nunes Leal, a quem louvo, em
Então, prosseguindo - depois de ex- nome do Tribunal. ..
plicar a situação dos representantes dos
contribuintes diz a informação: o Sr. Mi>nistro Ari Franco - Muito
bem.
"A remissão explícita que o art. 128 o Sr. Ministro Vitor Nwtes LetU -
da Lei faz à aplicação irrestrita do Es- V. Exa. muito me honra.
tatuto do Funcionário Civil da União
aos representantes do Govêrno, tal como o Sr. Mi.nistro Ribeiro da Costa (Re-
já se acentuou, decorre da Imperativa lator) - ... pela brilhante e alta con-
- 237-
tribuição que s. Exa. deu à apresen- solicitar adiamento, pelo que peço vista
tação do caso, a êle trazendo luzes que, dos autos.
certamente, virão elucidar o ponto de
vista dos eminentes colegas que sôbre o DECISÃO
assunto ainda não proferiram seus
votos. Como consta da ata, a decisão foi a
seguinte: Adiado por haver pedido vista,
Com estas considerações, mantendo o Sr. Ministro Gonçalves de Oliveira, de-
meu ponto de vista a respeito. pois dos votos do Sr. Ministro Relator
denegando a segurança e do Sr. Minis-
VISTA tro Vitor Nunes concedendo-a.