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A IFLUÊCIA CULTURAL A SOCIEDADE BRASILEIRA ATRAVÉS

DA PUBLICIDADE A TELEVISÃO

THE CULTURAL INFLUENCE IN BRAZILIAN SOCIETY THROUGH TELEVISION


ADVERTISEMENT

Paulo Renato Farias Borges


Mariceia Benetti - orientadora

Resumo
O presente artigo visa à analise da publicidade brasileira na televisão e a sua influência
na sociedade como agente modificador de comportamento cultural e de valores, estimulando o
consumo e propondo tendências e comportamentos. Faz-se um estudo histórico desde a
origem da televisão e sua implantação no Brasil, os programas mais populares, a publicidade
neste novo meio e as implicações decorrentes da mudança do rádio para a Televisão como
meio de comunicação de massa.
Palavras-chave: Televisão. Publicidade. Comportamento. Consumo.
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Abstract
This paper analyzes the Brazilian advertisement in the television and its influence on society
as agent of cultural, moral and values behavior changing, leading to consume behind proposes
tendency and behaviors’. It is necessary to do an historic analyze, since the begin of television
and its implantation in Brazil, the most popular programs and the advertisement as mean of
mass communication, as well the implications from this changing.

Key words: Television – Advertisement – Behaviors – Consume - Brazil


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Nesse artigo, observa-se a influência que a publicidade na televisão causou na


sociedade brasileira. Com este objetivo, são analisados os principais comerciais veiculados e
as programações de maior audiência de 1950 até os dias atuais.
Em seu processo histórico, a publicidade brasileira começou a se tornar profissional
em 1914, quando surgiu a primeira agência de propaganda no Brasil – a Eclética. No início,
os trabalhos eram dirigidos somente aos jornais e só mais tarde, na década de 30, surge o
rádio como meio publicitário.
Em 1950, começa a despontar a televisão, que se torna muito popular a partir da
década de 70. Com a televisão e sua publicidade de massa, ocorre uma mudança na cultura
brasileira, nos seus hábitos e seus objetos de desejo. A publicidade influenciou essa mudança
cultural através de suas criações, introduziu novos conceitos e estabeleceu padrões de
comportamento que incentivaram toda uma sociedade para o consumo. Além do estímulo de
compra, surgem também a quebra de tabus e a criação de uma ideologia baseada no status, em
conceitos e valores aceitos e seguidos por uma grande parcela da população, ou seja, a
publicidade, mais do que nunca, começa a definir o que é certo e o que é errado, o que pode e
o que não pode ser usado, pensado e desejado.
Utilizou-se como referencial teórico para este estudo os seguintes artigos: O sistema
simbólico da sociedade sob a perspectiva dos Estudos Culturais, de Raquel Ditz Ribeiro e
Eugênia Mariano da Rocha Barrichello; Audiência e Recepção – Perspectivas, de Antônio
Carlos Ruotolo; A Publicidade e o Mundo Social: uma Articulação pela Ótica dos Estudos
Culturais, de Elisa Piedras e Nilda Jacks; Primórdios da Publicidade na Cidade de São Paulo
e o Pioneirismo de João Castaldi, de Adolpho Queroz e no livro, A Teve e a Criança que te
Vê, de Ana Lucia M. de Rezende.
A relevância do tema está na percepção de que a sociedade brasileira sofreu uma
transformação muito grande em sua cultura com a chegada da televisão, sendo que a
publicidade contribuiu de maneira decisiva para essa mudança ao apresentar novos conceitos,
despertar desejos que antes não existiam e trabalhar com temas considerados fortes, como os
preconceitos e questões morais, assuntos esses antes não questionados.
Com o estudo, verifica-se como a publicidade na televisão contribuiu, de modo
determinante, para a transformação cultural da sociedade brasileira nos últimos 50 anos e o
que exatamente foi alterado, em comparação ao período em que a mesma não fazia parte dos
lares brasileiros.
Como já observado, a partir de 1914, com a criação da Agência de Publicidade
Eclética, a publicidade passou a ter um caráter mais profissional. Os anúncios começaram a
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ser elaborados de forma mais técnica, com a criação de contas e instituição de novos
procedimentos de trabalho, comissão de 20% e padronizações de anúncios. Nesta época,
predominava a publicidade em jornais, com algumas peças em outdoors, feitas a mão. Os
comerciantes ainda relutavam em anunciar seus produtos e, em alguns estabelecimentos, até
havia o aviso: “Não atendemos agentes de propaganda, nem damos esmolas”.
Na década de 30, com o advento do rádio, surgiram os programas ao vivo, nos quais
os locutores também eram encarregados de fazer chamadas comerciais. A sociedade buscava
no rádio seus momentos de lazer e de informação sobre o que se passava ao seu redor. Na
década de 40, surgiu o “Repórter Esso”, programa de notícias líder de audiência.
Em 1950, desponta no Brasil a televisão. Num primeiro momento, ela teve que fazer
publicidade de si mesma, uma vez que tinha equipamentos instalados, mas as pessoas ainda
não possuíam aparelhos receptores em casa, o que obrigou as emissoras a realizarem uma
campanha de popularização da nova mídia.
A maioria das emissoras de televisão, dos jornais e periódicos em atividade nos anos
60 não sobreviveria sem pesados investimentos, alguns inclusive vindos do exterior. Depois
desse crescimento inicial e com a instalação de empresas estrangeiras no país, as quais
proporcionaram maior circulação da informação, as mudanças culturais vividas, a partir do
século XX, demonstram a importância dessa forma de comunicação na análise da cultura
contemporânea.
Ao definir o termo “publicidade”, Schudson explica que ela está enraizada na cultura
popular devido a sua natureza e estimula uma cultura de consumo de bens e serviços:

A publicidade como uma instituição que tem um papel no mercado de bens


de consumo, publicidade como uma indústria que manufatura produtos
culturais denominados campanhas e comerciais, e publicidade como um
sistema de símbolos onipresente, uma penetrante, nua e crua, propaganda
da cultura de consumo. (SCHUDSON, 1984, p. 5).

Assim, conforme ressaltam Elisa Piedras e Nilda Jacks1, verifica-se a emergência da


publicidade como uma instituição de produção cultural marcada por um forte caráter
econômico e seu papel central e institucionalizado nos sistemas de comunicação e na
sociedade.
Já no final do século XX, a propaganda atingiu áreas sociais, econômicas e políticas
como instituição cultural empresarial (WILLIANS, 1992). Considerada como um sistema, ao

1
PIEDRAS, Elisa e JACKS, Nilda. Contemporânea , Revista de Comunicação e Cultura, Journal of
Communication and Culture, p. 208.
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mesmo tempo, comercial e “mágico”, a publicidade, importante na organização e reprodução


do capitalismo, não mais vendia apenas bens e serviços, mas também se envolve com o
ensinamento de valores pessoais e sociais (WILLIANS, 1995). Assim, os bens materiais, com
a intervenção da publicidade, são associados a aspectos simbólicos, o que constitui um novo
padrão cultural:

Pela associação entre os bens materiais e os aspectos simbólicos, ela


constitui um padrão cultural no qual os objetos não são suficientes, mas
precisam ser validados, mesmo que só em fantasia, pela associação com
significados pessoais e sociais. (WILLIANS, 1995, p.335).

Segundo Rocha (1995), a publicidade funciona como geradora de necessidades. Os


produtos entram nas vidas das pessoas por meio de anúncios, especialmente os de televisão,
que não colocam aos consumidores problemas que o próprio produto anunciado não possa
resolver. Para a cultura representada pela propaganda, os bens de consumo suprem as
necessidades na forma como elas são projetadas para serem supridas. Existem ainda as
necessidades ditas “abstratas” – amor, carinho, afeto, alegria e outras – que também são
supridas dentro da publicidade (ROCHA, 1995).
Essas referências mostram que a publicidade, quando associada à televisão, começa a
fazer parte do modo de vida da sociedade, criando padrões de comportamento, tendências e
despertando desejos. Com os primeiros programas, surgem as garotas-propaganda, que
informavam, ao vivo, sobre produtos e serviços. Idalina de Oliveira, Meire Nogueira, Maria
Rosa, Odete Lara, entre outras, improvisavam diante das câmeras de televisão, enquanto
vendiam mensagens de empresas como a Antárctica, Moinhos Santistas, Pratas e Sul América
Seguros.
Nos primeiros anos da televisão, os patrocinadores decidiam sobre tudo,
determinavam os programas que deveriam ser produzidos e veiculados, além de contratar
diretamente os artistas e produtores. Exatamente por isso, durante as primeiras duas décadas,
os programas eram identificados pelos nomes dos patrocinadores: “Repórter Esso”,
“Telejornal Pirelli”, “Telenotícias Panair”, “Reportagem Ducal”, “Teatrinho Trol”, “Gincana
Kibon”, “Sabatina Maizena”, entre outros. Em 1969, 16 das 24 novelas produzidas e
veiculadas no Brasil tinham o patrocínio de empresas multinacionais: Gessy-Lever, Colgate-
Palmolive, Kolynos-Van-Ess.
Para Sérgio Mattos (2002), nos últimos 50 anos a televisão tornou-se um sinalizador
para vários setores da sociedade. Um exemplo disso, no que diz respeito ao comportamento,
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as gírias, a moda e o sotaque, quando usados em novelas, acabam sendo copiados em todo o
país.
Em relação ao telejornal, como é a maior fonte de informação da maioria da
população, torna a televisão também responsável pela má informação desta população, pois
em 30 minutos é impossível colocar todos os pontos de vista e informações necessárias. O
noticiário de televisão é, portanto, parcial e incompleto e, mesmo assim, tem influenciado
alguns jornais tanto na linguagem jornalística quanto na forma de apresentar os conteúdos.
Os telejornais, ao se tornaram nacionais, em 1969, contribuíram para ligar o país de
norte a sul, mantendo a unidade da língua portuguesa num país de dimensões continentais.
Muitos são os estudos de casos da influência do telejornalismo na população. Esta
influência é grande, ainda mais quando se tem no jornalismo a única fonte de referência da
realidade. Algumas emissoras utilizam a dramatização das notícias nesses telejornais com o
objetivo de causar mais impacto no público–alvo, como, por exemplo, o programa “Brasil
Urgente”, apresentado pelo jornalista José Datena, na Rede Bandeirantes.
Os programas de auditório que são produzidos no Brasil têm por objetivo atingir as
camadas menos favorecidas da população. Esses programas são, em sua maioria, de baixo
nível. A partir dos nos 90, as emissoras de televisão brasileira voltaram a lançar mão de
programações destinadas às classes C e D, devido a uma acirrada briga por audiência, em
função da estabilização econômica, o que fez surgir um público de 24 milhões de novos
telespectadores, o qual representava cerca de 20% do antigo total da audiência.
No começo do plano real, na década de 90, foram vendidos no Brasil cerca de 28
milhões de aparelhos televisores. Estima-se que cerca de seis milhões foram comprados por
famílias que estavam adquirindo o seu primeiro aparelho, todas elas integrantes das camadas
mais baixas da população.
Estes novos telespectadores eram o motivo das disputas de audiência com programas
de baixo nível a exemplo dos exibidos: Ratinho, Leão, Domingão do Faustão e Gugu, que ao
longo do tempo procuraram a se tornar menos apelativos, em função das críticas que vinham
recebendo. Estes programas, por serem de massa, faziam, e ainda fazem, com que a emissora
receba uma verba astronômica das empresas patrocinadoras.
Ao se fazer um estudo das telenovelas produzidas no Brasil desde a segunda metade
da década de 60, percebe-se as produções como sendo produto típico da cultura de massa, o
estereótipo, as questões semânticas e o papel de transformação social ou de introdução de
novos hábitos através das telenovelas têm sido, entre outros, alguns dos principais aspectos
que são estudados.
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A teledramaturgia sempre esteve presente na nossa televisão. Em 1951, a primeira


telenovela brasileira: “Sua Vida Me Pertence”, exibia dois capítulos por semana. A primeira
telenovela em capítulos diários só foi ao ar no ano de 1963, com o título: “25-499 –
Ocupado”, produzida pela TV Excelsior, que também produziu a mais longa telenovela
brasileira até agora: “Redenção”, que ficou no ar de 1966 a 1968, apresentando um total de
596 capítulos. A partir daí, a televisão brasileira se especializou na produção de telenovelas e,
na década de 70, passou a exportá-las.
A primeira novela a fazer sucesso no exterior foi “O Bem Amado”, que era vendida já
dublada para o espanhol. Outra novela sucesso de venda em todos os tempos foi “Escrava
Isaura”, exportada para inúmeros países. Por serem bem produzidas, as novelas prendem a
atenção de todos, tanto telespectadores, anunciantes, como emissoras de televisão de todo o
mundo interessados nesse gênero.
As novelas não são meramente entretenimento, elas traçam um raio-X da sociedade e
constroem uma verossimilhança em cima das pseudo-necessidades das pessoas, estabelecendo
novos padrões, levando-as a desejar aquilo que de outra forma jamais desejariam. A mansão
de determinada família, o vestido daquela atriz bem cotada, o corte de cabelo da outra, o carro
do personagem “mauricinho”, estilos de roupa, os produtos que aparecem em forma de
merchandising, enfim, tudo faz parte de uma realidade que é falsa ao mesmo tempo, mas
também estará à disposição do consumidor.
Percebe-se aí a fusão entre as tramas televisivas e as grandes empresas que querem
anunciar seus produtos por meio de uma história interessante. Um exemplo disso, foi o
personagem Bartolo, vivido por Antonio Calloni na novela Terra ,ostra (GLOBO, 2000),
que foi criado apenas para divulgar o vinho da empresa Cidra que surgiu à mesma época em
que se passava a trama.
É indiscutível a influência das novelas na mudança de conceitos sociais. Elas
estimulam a violência entre os jovens por meio de cenas de brigas e assassinatos, abusam do
erotismo e incentivam a sexualidade precoce. Certos comportamentos problemáticos são
encarados como sendo naturais. No entanto, atualmente na novela Paraíso Tropical e Sete
Pecados (Rede Globo), atitudes socialmente reprovadas estão sendo criticadas, como dirigir
embriagado, que é utilizado com publicidade institucional durante toda a programação. Ainda
assim, as novelas abusam de merchandising , (Natura, Banco Itaú, Renner) cenas de nudez,
sexo e temas considerados fortes e polêmicos para o horário de exibição.
Como diagnosticado, as telenovelas têm um papel crescente na imposição de ações
para a sociedade. Este papel específico do melodrama na cultura brasileira indica a
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necessidade de se explorar sua influência no processo de formação de cidadãos


comprometidos eticamente.
Desta forma, é possível perceber que a publicidade não é somente o reflexo dos
comportamentos e dos valores de uma determinada cultura. Ela também cria condutas e
influencia no que a televisão transmite, com o objetivo de criar determinados padrões de
comportamento de massa. Isso pode ser observado, por exemplo, no caso do slogan “Brasil:
ame-o ou deixe-o”, da época da Ditadura Militar, ou “liberdade é uma calça velha, azul e
desbotada”, utilizado pela US TOP, criando uma mudança cultural entre os jovens.
Na década de 80, com a abertura política e o fim da censura, associados às inovações
tecnológicas, alta qualidade dos comerciais e criação de slogans marcantes, a publicidade
começou a ter maior poder sobre a sociedade. Assim, surgem o slogam do cigarro Free –
“questão de bom senso” – que vendia à juventude uma autonomia de pensamento e atitudes
independentes, e do Gelol – “Não basta ser pai, tem que participar, não basta ser remédio, tem
que ser Gelol!”, reforçando a idéia da participação do pai nos melhores momentos da vida de
seu filho.
Em 1985, no Brasil, com o Plano Cruzado, a televisão, aliada à publicidade, criou a
campanha “Fiscal do Sarney”, na qual a população em geral, especialmente as donas de casa,
fiscalizava os preços nos supermercados e armazéns para evitar o seu aumento. Esta
campanha tomou conta do país inteiro e mobilizou toda a sociedade com a utilização de
bottons, faixas e camisetas.
Nos anos 90, cresceu a comercialização de horários na grade de diversas emissoras de
televisão para a exibição de programas de vendas diretas ao consumidor e para exibição de
programas religiosos. A Igreja Católica e as várias congregações evangélicas criaram suas
próprias redes de transmissão televisiva, iniciando uma catequese eletrônica sem precedentes.
O poder das instituições religiosas conquistou empresas de comunicação, como a
Record, modificando culturalmente a relação da religião com as pessoas, principalmente as
mais pobres, que, pela influência da nova mídia, tornavam-se adeptas dessas religiões.
Em 1990, a televisão, aliada à publicidade, criou a campanha “Cara-pintadas”, na qual
os jovens brasileiros foram às ruas para pedir a saída do então presidente Fernando Collor de
Mello, acusado de corrupção. Deve-se observar, no entanto, que os próprios meios de
comunicação, que estavam aliados aos “cara-pintadas”, haviam criado todas as condições
favoráveis para a eleição de Collor alguns anos antes.
Ao analisar o grande impacto da publicidade na mídia dos países em desenvolvimento,
o que o chamado “imperialismo” causava na mídia, bem como sobre a homogeneização
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cultural, foi constatada a dependência cultural dos veículos de comunicação, que tentaram
explicar, por exemplo, o grande número de programas americanos e europeus e a crescente
influência das agências de publicidade multinacionais sobre os veículos de massa localizados
nestes países.
Atualmente, percebe-se que a televisão brasileira está mais diversificada, o
consumidor, mais atento, conta com vários recursos disponíveis, como o Código de Defesa do
Consumidor, o Conselho Nacional de Auto Regulamentação Publicitária (Conar), o
Ministério Público e denúncias às próprias emissoras, para evitar que propagandas firam a sua
moral, sejam preconceituosas ou prejudiquem a imagem de pessoas ou produtos. Mesmo com
essa visão, ainda se observa em publicidade de cerveja o culto ao erotismo, figuras femininas
sendo utilizadas por praticamente todas as marcas; os afro-descendentes são pouco utilizados
em campanhas publicitárias; a mulher, na condição de profissional e de consumidora, ainda
não é valorizada, aparecendo sempre como coadjuvante. ( JORDÃO, 2005)
Apesar do consumidor estar mais consciente, a televisão ainda continua a influenciar
com a sua publicidade. A exemplo disso tem-se a obesidade infantil, que vem crescendo de
forma acelerada; e as peças publicitárias, dirigidas ao público infantil, são um dos fatores que
mais contribuem para este problema. É o que revela um estudo realizado pelo nutricionista
Rodrigo Martins de Vargas, do curso de pós-graduação Qualidade em Alimentos, do Centro
de Excelência em Turismo da Universidade de Brasília (CET/UnB), ele observa que a
publicidade utiliza uma estratégia de marketing, associando produtos à personagem infantil,
celebridades, filmes, desenhos ou a própria figura dos pais.
Segundo Vargas, a publicidade de tais alimentos contribui para a formação de um
“ambiente obesogênico”, uma vez que os alimentos veiculados na TV são, em sua maior
parte, industrializados e de alto teor calórico, sal, gordura e óleo elevados. O estudo observa
que entre as décadas de 30 a 70 eram raros os casos de adultos e de crianças obesas,
demonstra também que, mesmo sem a tecnologia que existe hoje, a vida era mais saudável, as
crianças desenvolviam diversas atividades lúdicas fora do ambiente doméstico, se
exercitavam, praticavam esportes e tinham uma alimentação mais saudável, com poucos
produtos industrializados, refinados e gordurosos.
A televisão é o veículo publicitário mais utilizado para atingir o público infantil
porque este público não tem o hábito de leitura de jornais e revistas. Além disso, as crianças
não são capazes de fazer um julgamento crítico da intenção da publicidade televisiva e das
suas técnicas persuasivas. Em seu estudo, o nutricionista informa que a exposição de uma
criança a apenas 30 segundos de comerciais de alimentos é capaz de influenciá-la na escolha
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de produtos. Outra pesquisa mencionada no estudo de Vargas revela que as crianças que
passam mais de cinco horas por dia assistindo televisão apresentam 5,3 vezes mais chances de
serem obesas do que as que assistem até duas horas por dia. Alguns países europeus criaram
normas específicas para controlar a propaganda para o público infantil. No Brasil, porém,
informa Vargas, só há regulamentação para produtos destinados a lactantes e a crianças da
primeira infância – até os três anos de idade.
Um dado alarmante é que pesquisas têm indicado que os programas preferidos pelas
crianças são os voltados ao público adulto, como novelas, filmes e reality shows, como o Big
Brother Brasil.
O filósofo alemão Jürgen Habermas (1960) considerava que existia uma espécie de
conflito entre o jornalismo crítico e a publicidade jornalística que tinha como objetivo
principal a manipulação, e ao invés de informar, a imprensa, controlada pelos interesses dos
poderosos grupos políticos e econômicos, estava tentando “fazer a cabeça das pessoas”.
Fica a questão: se a publicidade pode gerar nas pessoas a vontade de consumir um
produto, não poderá criar opiniões sobre fatos de interesse público e sobre a política?

Quando algum anúncio é taxado por dar mau exemplo aos consumidores
em potencial, os publicitários são os primeiros a jurar que a propaganda
não influencia o comportamento de ninguém. Se não influencia, por que é
que as empresas pagam caríssimo por uma inserção de comercial no
horário nobre da televisão? (AOL Notícias, 2003)

Com a expansão da mídia e da Internet, as agências de publicidade precisam se


esforçar muito mais para fazer com que os produtos sejam notados. Os anúncios se tornam,
por isso, cada vez mais elaborados, inteligentes, sutis e dispendiosos. Um exemplo disso: o
sabonete Dove, cuja campanha era “Pela Real Beleza”. O objetivo da campanha era mostrar à
população feminina que todas as mulheres possuem uma beleza própria e que não se pode
criar um padrão de beleza. O texto publicitário2 passa a ideia de que um novo comportamento
está sendo inserido em nossa sociedade e, devido à boa aceitação, a campanha continua com
sucesso.
No entanto, os publicitários são seletivos a respeito dos valores e dos comportamentos
que devem ser favorecidos e encorajados, promovendo alguns e ignorando outros. Esta
seleção opõe-se à afirmação que defende que a publicidade é unicamente o reflexo da cultura
duma região.
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“Por muito tempo a beleza tem sido definida por estereótipos limitados e sufocantes. Você nos disse que é hora
de mudar tudo isso. Nós concordamos porque acreditamos que a real beleza está em diversas formas, tamanhos e
idades. É por isso que iniciamos a campanha pela real beleza”.
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A publicidade reflete os valores existentes e respalda o ponto de vista


dominante, não pode ser tomada como responsável única pelas opiniões,
normas e valores dominantes, nem tampouco ser absolvida de toda a
responsabilidade por elas. (MELO, 1991, p.7)

A publicidade tem um impacto indireto, mas poderoso, na sociedade, através da


influência que exerce sobre a mídia. Numerosas publicações e produções televisivas
dependem das receitas publicitárias. Os meios de comunicação devem elaborar os conteúdos
dos seus programas de modo a atrair o tipo de público que a publicidade visa em função do
seu número e da sua composição demográfica. Esta dependência financeira dos meios de
comunicação e o poder que ela confere aos publicitários comportam sérias responsabilidades
para os dois lados.
No aspecto positivo, surge a disponibilidade de novos produtos ou serviços desejáveis
e o aperfeiçoamento aos que já existem no mercado, ajudam os consumidores a tomarem
decisões bem informadas e prudentes. A publicidade contribui para a eficiência e a
diminuição dos preços, incrementando o progresso econômico através da expansão dos
negócios e do comércio, favorecendo a criação de novos postos de trabalho, o aumento do
rendimento e um nível de vida mais digno e humano para todos. Ela contribui, além disso,
para financiar publicações, programas e produções que ofereçam informação, divertimento e
inspiração às populações dos países.
Devido à importância que a publicidade tem nos meios de comunicação, que dela
dependem para as suas receitas, os publicitários podem exercer uma influência positiva sobre
as decisões acerca dos conteúdos a serem apresentados e têm a possibilidade de encorajar
programas televisivos que se destinam às minorias, que facilmente são ignoradas.
Na publicidade, nada é intrinsecamente bom ou mau. A publicidade é um meio, um
instrumento e os seus efeitos podem ser positivos ou negativos aos indivíduos e à sociedade.
Se os anúncios publicitários aconselham produtos nocivos ou totalmente inúteis, se fazem
promessas falsas acerca do produto a vender, seus responsáveis prejudicam a sociedade e
acabam perdendo o crédito e confiança.
Algumas vezes, o papel de informadores dos meios de comunicação pode até ser
alterado sob a pressão dos publicitários. Esta pressão é exercida nas publicações ou nos
programas, impedindo que sejam tratados assuntos incômodos ou inoportunos aos
publicitários, assim, a publicidade é muitas vezes usada não tanto para informar, persuadir e
motivar, mas para convencer as pessoas a agir de uma determinada maneira.
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Outras vezes, os comunicadores cedem à tentação de ignorar as exigências educativas


e sociais de algumas categorias do público — os mais jovens, os mais idosos, os pobres —
que não se enquadram nas normas demográficas (idade, educação, renda, hábitos em matéria
de compra e de consumo) do gênero de público ao qual os publicitários se dirigem. Neste
caso, a qualidade e o nível da responsabilidade moral dos meios de comunicação em geral
caem visivelmente.
A publicidade na televisão, nesses últimos 50 anos, é considerada fundamental para o
desenvolvimento tecnológico dos meios de comunicação de massa, pois a sua parceria e
investimentos captados de seus patrocinadores para o setor possibilitaram que estes veículos
se desenvolvessem. Neste acompanhamento de meio século, a publicidade tornou-se tão
responsável quanto os veículos pelos programas de lazer, entretenimento e informação
oferecidos à população.
Se a publicidade teve tal poder durante estes anos, muitas vezes não os utilizou nem os
utiliza de uma maneira ética, uma vez que permite que a programação apresentada pelos
meios televisivos seja de qualidade discutível, e as peças publicitárias sejam repletas de
preconceitos, indução ao consumo de produtos nocivos à saúde, criando estilo de vida falso e
oferecendo estímulos à juventude e à criança de uma maneira inadequada à sua capacidade
intelectual e etária.
A publicidade na televisão alcançou um grande crescimento tecnológico e suas peças
são de qualidade visual acentuada, agora precisa também repensar a sua qualidade ética. Os
publicitários são responsáveis pela inserção, na sociedade, de valores, tendências e modismos.
É conveniente que esses profissionais, conscientes de seu papel na construção de cultura,
percebam que tipos de valores estão transmitindo às crianças e aos adolescentes. Podem estar
contribuindo com a criação de uma sociedade cada vez mais artificial, imediatista e
depredadora, influenciando futuras gerações no desenvolvimento de sua potencialidade física
e intelectual:

A TV reproduzida pela sociedade tecnológica reproduz esta sociedade, cria


estereótipos, induz ao consumo, despolitiza. Não é possível assumir,
todavia, diante da programação da TV, a atitude paranóica persecutória.
Antes de desejar inculcar a ideologia dos grupos dominantes, os produtores
de TV querem vender imagens e ser bem-sucedidos. Na medida em que o
telespectador for um consumidor crítico, a pressão social se fará sentir.
Haverá a inevitável abertura de válvulas e mudanças na cadeia: produto
produzido para o consumidor e o consumidor que é produzido para o
produto. (REZENDE, 1989, p. 91).
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Neste sentido, a atividade de publicitário deve incluir idéias como responsabilidade


social, desenvolvimento sustável, honestidade com a sociedade. Os produtos devem ser
apresentados de uma maneira que não agrida aos consumidores, nem apenas os induza ao
consumo.
É possível constatar, a partir do que foi abordado, que a publicidade, aliada aos meios
de comunicação, influenciou, e continua a influenciar, padrões de comportamento social. A
partir da televisão, ela tornou-se um produto de massa, aperfeiçoou suas técnicas e se
organizou de uma maneira que conseguiu inserir na sociedade tanto os aspectos positivos de
esclarecimento, desenvolvimento intelectual e cultura,l como os aspectos negativos, como o
estimulo ao consumo desenfreado, concorrência desleal, violência, desigualdades, ideologias.
A televisão é o maior veículo publicitário do Brasil, ficando com 60% do bolo
publicitário do país, que gira em torno de 1%(um por cento) do nosso PIB.
Atualmente, a influência da publicidade é mais indireta, tendo em vista que a TV é
dependente de anúncios; e o anunciante, se algum programa não tiver audiência suficiente, ou
forem cancelados os anúncios que garantem a sua veiculação, pode determinar o seu fim,
mesmo que tenha alta qualidade educativa.
A publicidade na televisão precisa, enfim, repensar seus rumos, evitando que no futuro
estes aspectos negativos aqui mencionados se tornem tão graves e acentuados que influenciem
a sociedade de uma maneira tão intensa, tornando as relações sociais artificiais e
desassociadas de padrões éticos.

Referências
AOL notícias. Propaganda e as crianças. Disponível em http://www.aol.com.br. Acesso em
17 de jun de 2007.

MATTOS, S. Entrevista publicada no Jornal de Opinião. Belo Horizonte, 04 e 10 dez. 2000,


p. 4 e 5. Disponível em http://smattos.blog.com. Acesso em 18 set. 2007.

PIEDRAS, E. A publicidade e o mundo social, uma articulação pela ótica dos estudos
culturais. Contemporânea , vol.3, nº2, p. 197-216. Disponível em http://www.contemporanea.
poscom.ufba.br Acesso em 19 jun. 2007.

REZENDE, Ana Lúcia M de, REZENDE, Nauro Borges de. A tevê e a criança que te vê. 2º
ed, São Paulo, Cortez, 1989, 101p.

RIBEIRO, R. D. O sistema simbólico da publicidade sob as perspectivas dos estudos


culturais. Unirevista, Vol.1, nº3, julho 2006. Disponível em http://www.unirevista.unisinos.br
Acesso em 19 jun. 2007.

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