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O Coletivo de Autores já mencionava a capoeira como conteúdo da EF escolar, porém


muito mais pelo seu valor histórico-mítico de combate dos escravos ao sistema de governo, do
que pela manifestação per se da cultura corporal.

As artes marciais, no Brasil, sempre foram sinônimo de lutas e de mecanismos de


autodefesa. Foi apenas a partir da elaboração de um documento oficial do Ministério da
Educação brasileiro, especificamente no ano de 1997, que as artes marciais passam a
engendrar a grade de conteúdos da disciplina de Educação Física escolar.

No entanto, deve-se ressaltar, que lutas e artes marciais são práticas distintas, ainda
que o campo da Educação Física as trate como iguais. As lutas, enquanto conteúdo da
Educação Física Escolar, se referem a quaisquer modalidades em que haja embate físico entre
os participantes, de modo que a segurança seja respeitada, principalmente por meio de regras
pré-definidas. Como exemplo de lutas, é possível citar o boxe, a luta livre e a luta greco-
romana.

Artes Marciais, ainda que se apresentem com as mesmas características das lutas,
apresentam um elemento específico que é distintivo: sua historicidade e seus preceitos
filosóficos. Essa marca das artes marciais é fundamental, pois define o seu objetivo: ao
contrário da luta em que se trata de derrotar o adversário como finalidade, nas artes marciais,
o ponto é o autodesenvolvimento, que se dá nos campos do físico, do mental e do espiritual. O
âmbito espiritual, embora pareça desnecessário aos olhos da Educação Física, enquanto
campo da ciência, é fundamental para a compreensão das artes marciais.

Em todo caso, no que se refere ao âmbito escolar, o primeiro documento que integra
as artes marciais ao currículo da disciplina de Educação Física são os Parâmetros Curriculares
Nacionais. O PCN agrega os conteúdos em blocos, e as artes marciais são localizadas no bloco
͞esportes, jogos, lutas e ginásticas͟:

͞Assim, consideram-se esporte as práticas em que são adotadas regras de


caráter oficial e competitivo, organizadas em federações regionais,
nacionaise internacionais que regulamentam a atuação amadora e a
profissional. Envolvem condições espaciais e de equipamentos sofisticados
como campos, piscinas, bicicletas, pistas, ringues, ginásios, etc. A divulgação
pela mídia favorece a sua apreciação por um diverso contingente de grupos
sociais e culturais. Por exemplo, os Jogos Olímpicos, a Copa do Mundo de
Futebol ou determinadas lutas de boxe profissional são vistos e discutidos
por um grande número de apreciadores e torcedores.
(...)
As lutas são disputas em que o oponente deve ser subjugado, mediante
técnicas e estratégias de desequilíbrio, contusão, imobilização ou exclusão
de um determinado espaço na combinação de ações de ataque e defesa.
Caracterizam-se por uma regulamentação específica, a fim de punir atitudes
de violência e de deslealdade. Podem ser citados como exemplo de lutas
desde as brincadeiras de cabo-de-guerra e braço-de-ferro, até as práticas
mais complexas da capoeira, do judô e do caratê.͟
Ainda que o trabalho com lutas seja interessante por se tratar de uma prática da
cultura corporal bastante distinta daquelas tradicionalmente trabalhadas em aula pelo
professor de Educação Física, trabalhar com artes marciais e lutas na escola não é tarefa fácil.
Isso porque essas práticas são comumente confundidas com violência. Logo, a pior tarefa
começa na conscientização dos funcionários da escola, desde o diretor até o faxineiro, de que
a atividade proposta na aula de Educação Física é um conteúdo legítimo, que faz parte do
currículo da disciplina, e cuja proposta se dá no sentido oposto a da violência. Outra
dificuldade enfrentada pelo professor é a preocupação da escola com a possibilidade de que os
alunos podem se machucar. Mas esse argumento é muito ruim, haja vista, que há embate
corporal em outras atividades em que os alunos realmente se machucam e ninguém acha
ruim, como é o caso do futebol.

Mas as dificuldades não são apenas contrárias ao exercício do professor de Educação


Física. Muitas vezes, é o próprio professor de Educação Física que não quer trabalhar novos
conteúdos em suas aulas, e seu argumento se assenta na falta de prática. Ora, a visão de que
uma aula de Educação Física deve ser centrada no !   ruiu após a década de 1980,
quando surgiram novas abordagens pedagógicas para pensar a disciplina escolar. Não cabe
aqui especificá-las, mas é possível afirmar que em nenhuma delas, se prima pela prática por si
só. A prática existe e é importante, mas ela á parte de um todo que inclui história, conceitos, a
compreensão de como esse esporte é apropriado e veiculado pelos meios midiáticos, os
valores envolvidos na prática, etc.

Minhas análises partiram de dois relatos de experiências de professores, cujos projetos


de trabalho, centraram-se no tema Lutas e Artes Marciais. O primeiro relato, da professora
Natália Gonçalves, apresenta os passos para o trabalho com lutas na escola. O segundo relato,
do professor Fernando Vaghetti, enfoca os as dificuldades de adesão à esse conteúdo nas
aulas, por parte do gênero feminino.

͞Com o objetivo de fazer com que os alunos sejam capazes de identificar e


discutir, buscando modificar as ações preconceituosas referentes a questões
de gênero, idade e biotipo presentes nas lutas, levantei alguns
questionamentos com as turmas a respeito de colocações como, por
exemplo, no que diz respeito ao gênero ͞masculina͟ da manifestação e que,
no momento em que foi citada, causou muita indignação pois as meninas
também se sentem capazes, produtoras e praticantes desta manifestação e
não possuem este ͞olhar͟ exclusivamente masculino para esta manifestação
corporal.
Neste momento algumas alunas posicionaram-se dizendo que nos desenhos
animados existem meninas que lutam: Meninas Superpoderosas, Três espiãs
demais. Os meninos, a princípio, fizeram algumas colocações em tom de
deboche, porém, ao aprofundarmos nas questões, percebi que foram
concordando, aos poucos com os argumentos das colegas quando utilizaram
os desenhos como exemplo. (Gonçalves, p.1)͟

A experiência de Gonçalves foi construída em conjunto com os alunos. Em quatro


meses de aula, ela partiu de uma compreensão 
 dos alunos sobre o tema ͞lutas͟ e foi
construindo por meio de atividades coletivas, com o apoio de livros e da internet, o conteúdo.
A partir de uma listagem feita pelos alunos sobre tipos de lutas e artes marciais, eles próprios
selecionaram as que seriam trabalhadas. Capoeira, cabo-de-guerra, sumô e judô foram as
práticas escolhidas.

Aspectos gerais das Artes Marciais: diferentes objetivos para uma mesma finalidade.

Historicamente, a luta e a guerra foram componentes que alavancaram o


desenvolvimento das Artes Marciais.

Histórico das artes marciais. Elementos gerais: mecanismo de combate e


autodefesa/carrega um estigma cultural e de identidade com a sociedade em que foi
desenvolvida. Elementos particulares: luta de chão/em pé; uso acentuado de membros
superiores ou inferiores; uso excessivo de chutes...

Nascimento e Almeida (2006) apontam para a possibilidade de trabalhar com lutas na


escola, primeiro por meio de jogos introdutórios ao tema, no sentido de adequar o aluno ao
conteúdo a ser trabalhado. No entanto, ainda previamente, foram identificadas lutas e artes
marciais coletivamente. O segundo momento consistiu na eleição de lutas que utilizam
estratégias e técnicas de oposição, a imobilização (luta greco-romana), a exclusão do
adversário de um campo previamente delimitado (sumô) e o desequilíbrio (judô). A terceira
etapa abordou as lutas como um esporte institucionalizado e, portanto, assegurado por regras
regulamentadas por federações e confederações, o acesso à história e rituais que o envolve,
retirando a mística de violência dessas práticas. ͞No plano procedimental, a ênfase recai sobre
os jogos de lutas realizados em aula, destacamos o cabo de guerra, briga de galo, exclusão do
espaço com ombro, mãos, conquista da quadra do oponente e conquista de objetos com
oposição.͟

((cc
GONÇALVES, N. Tematizando lutas nas aulas de Educação Física. Disponível em
http://www.gpef.fe.usp.br/teses/natalia_03.pdf
MAZZONI, A., OLIVEIRA JÚNIOR, J.L. Lut ! dos primórdios à pós-modernidade, 2011. (mimeo).
MINISTÉRIO da Educação.  t
! u ul !  
 ! Educação Física. Brasília:
MEC/SEF, 1997.
NASCIMENTO, P.R.B., ALMEIDA, L. A tematização das lutas na Educação Física Escolar:
restrições e possibilidades. 
 t
. v.13, n.3, 2007.
VAGHETTI, F. C. Lutar é ͞coisa͟ de menina? Disponível em
http://www.gpef.fe.usp.br/teses/fernando_01.pdf

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