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Antiguidades Indigenas do Ceara Carlos Studart Filho OBJECTIOS DE PEDRA (Continuagéio) Proseguinde na tarefa ha annos iniciada e logo de- pois interrompida (1), tarefa que consiste em enumerar e estudar os artefactos indigenas colhidos em territorio cearense, trataremos aqui de certos utenseis que serviam, segundo toda a evidencia, para esmigalhar cereaes, fru- ctas e tuberculos. Mais tarde, exeminaremos as pontas de flechas, os cachimbos e os diversos adornos honorificos. A analyse da ceramica sera, como ficou dito, reser- vada para um capitulo especial. MOS (meule fixe ou dormente, de De Mortillet). Forme. As més cearenses, quer as recolhidas ao Museu Rocha (fig. 5, n.° 352), de Fortaleza, quer as pertencen- tes 4 Colleccéo Baltar (fig. 2, n.° 3), do Acarali, sao sempre pequenas e de feitura rudimentarissima. A’ scmelhanca de instrumentos de identica nature- za, procedentes da provincia de Cordova, na Argentina, GQ) Véde “Revista do Instituto do Ceara’. Tomo XLI, anno de 1927, 106 Revista TRIMENSAL e cuidadosamente descriptos pelo snr. Francisco de Apa- ricio, em interessante trabalho sobre archeologia sul-a- mericana, (2) sdo constituidas por um simples pedago de lage grosseiramente desbastado e deprimido na parte media de uma ou de ambas as faces. Use. O modo de trabalhar com as més era dos menos complicados, conforme se péde deduzir das obser- vacées feitas entre numerosas tribus sul-americanas. O selvicola tomava primeiramente uma pedra de superficies planas e sobre uma dellas collocava os graos, que cram, & seguir, esmagados com a ajuda de um calhau qual- quer. O calhau agia no caso como um mero pistillo, a rolar sobre o gral, num movimento rythmico de vaivém. Do attrito, necessario 4 trituragio da substancia depo- sitada na m6, resultava corroerem-se a pouco € pouco ambas as pedras; na inferior, creava-se uma depressdo, que crescia e aprofundava com o tempo; na superior — meule mobile, de De Mortillet —- desappareciam todas as arestas, adquirindo ella uma forma ovoide ou cylin- Grica, de certo modo caracteristica. ALMOFARIZES DE FUNDO DE CANOA — Os al- mofarizes de fundo de canéa (3), descobertos no Ceara, sho, conto alias todos os outros artefactos de igual proce- dencia, producto de arte ainda muito incipiente. Seu lavor é, porém, bem mais apurado que o das més. Sob o n." 3, fig. 3, acha-se representado um almo- fariz desse genero; foi encontrado no municipio de Aca- rahu e faz hoje parte da Collecgao Baltar. (2) Fr gieas en la ne 1, 1985, (3) A denominagdo de almofariz de fundo de canéa, aqui empregada, no nos pertenee originariamente. Q primeiro a usala foi o Pe, Tastevin om referencia a utensilios de madeira, de férma semelhante, feitos pelos indios do Amazonas. Della nos servimos agora, por julgal-a perfeitamente adequada av objecto deseripto, anciseo de Aparicio — “Investigaciones arqueolé- gién serrana de la Provineia de Cordova’, “Gaca” po INsTITUTO DO CEeaRA 107 Sua semelhanga com os almofarizes figurados por Ladislau Netto, no vol. VI dos “Archivos do Museu Na- cional” (pags. 508 e 509), é flagrante, Trata-se de um pequeno bloco de granito, no qual se vé, feita artificio- samente pelo indio, uma cavidade de superficie perfei- tamente polida e regular e de seccdes transversaes elli- pticas. Muitos ethnographos, ao estudarem as més, ¢ og almofarizes a que chamamos de fundo de canda, usam descrevel-os conglobadamente, levados, talvez, pelo facto de apresentarem ambos uma depressiio e de se destinarem ao mesmo fim, sendo seu manejo identico. N&o julgamos acertado semelhante modo de proceder. A mé é, coma dissemos, mais grosseira sempre do que o almofariz; é um fragmento de lage arrancado a qualquer rocha aflo- rada e que se pode confundir facilmente com uma sim- ples pedra de amolar. O almofariz, ao contrario, denun- cia, na gua feitura, o labor humano cuidadosamente o- rientado, A area de distribuigao dos almofarizes e das més é, no Brasil, extremamente ampla. Mais achadicgos no sul do que no norte da Republica, elles abundam nos sumbaquis de Santa Catharina (Ladislau Netto e Wie- ner), do Rio de Janeiro e Districto Federal (Ihering), de §. Paulo (Ihering e Rath), do Parand (Ch, Rath) e do Rio Grande do Sul (Ihering). Apparecem igual- mente no interior do Districto Federal (L. Netto), No norte do Brasil, tém sido descobertos no Amazonas (L, Netto), no Cearé e, finalmente, nog sertées da Bahia (Bernardino de Sousa). Fora do nosso paiz, ha-os tambem em numero bas- tante avultado nos Mounds da America do Norte, nos Pueblos, no Pert, Bolivia e Argentina, GRAES. Os artefactos indigenas a que nomeamos graes (n.° 187, fig. 2, e n.” 418, fig. 5) pertencem, como bem indica sua designagao, 4 classe dos almofarizes de 108 Revista TRIMENSAL pedra. S&o muito mais escavados do que os almofarizes de fundo de canéa e tém a bocca circular ou apenas ligeiramente elliptica. Figura 5, (4-1/6 ar. nat.) 120—Alguidar (2) de gneiss —- Russar, 352—MO escavada ho arenito pelo attrito do pilfo — Fortaleza. I—Diseo de gravito — Jaguarihe-Mirim. 418—Poqneno gral enpuliforme de diorito — Fortaleza. 420—-Moleta ou m&o de gral de granito — Fortaleza. © especimen n.° 418 € digno de interésse e de es- tudo, A regularidade de sua férma e a delgadeza ex- po InsTituTo po Ceard 109 trema de suas paredes, fazem delle uma peca de rara belleza. Suas dimensdes sio as seguintes: eixo maior ds beeen, 15 em.; eixo menor, 11 em., altura do fundo, 17 em. Comparado com os almofarizes cylindricos, encon- trados nos sambaquis do sul do paiz — o que figura com on.’ 508 nos “Archivos do Mugea Nacional”, por exem- plo —- e mesmo com os morteres oriundos da provincia de Cordova, na Argentina, o utensilio cearense psrece antes uma grande e artistica terrina. Dissemos, ¢ nao é demais accentuar novamente, que os almofarizes, os graes e as més serviam para esmagar cs gréos, os tuberculos e as fructas reservadas ao pre- paro de bebidas fermentadas e ao fabrico de farinhas e bolcs alimenticios. O uso desses artefactos ia, porém, mais longe. Os indios dellea se utilizavam tambem para triturar certas sementes oleaginosas e os corantes mi- neraes (peroxydo de ferro) e vegetaes (sementes de uruai, carvao vegetal, ete.), com que se pintavam nos dias de festividade da tribu. DISCOS. Uso. Para moer grios, tuberculos e fructas e pulverizsr corantes vegetaes e mineraes, og nos- sos sclvagens utilizavam tambem artefactos de pedra, semcelhantes avs que figuremos sob o n.° 427, da estampa 5, em." 1, da estampa 3. $6 assim é possivel explicar-se a existencia de taes objectos no Ceara. A’ meneira do que faziam certos gentios do Rio Negro, clles deviam superpér um ao outro dois discos e entre elles collocar o corante, que era reduzido a pd, pela pressko exercida sobre o disco superior. A pedra n, 427, de propriedade do director do Museu Rocha, me- de 5 cm. de espessura e 20 cm. de diametro. Provem do Jaguaribe-Mirim. O outro & oriundo do municipio do Acerahi. Discos iguacs aos cearenses foram encontrados nos sambaquis do Amazonas, por Carlos Hartt (4) e por Fer- (4) “Contribnigdes para a ethnologia do Valle do Ama- zonas”. “Archivos do Muscu Nacional”, vol. VI, pag. 7, Rio, 1885, 110 Revista TRIMENSAL reira Penna, e nos ostreiros de Iguape, Estado de S. Paulo (Ihering). No Museu Goeldi, do Pard, vimos, figurando com o n° 13348, um bellissimo disco de pedra, que pertenceu aos indios macuchys, do Rio Negro. PILOES. Férma e dimensdes. Os piles indige- has, que chegaram até nds, tém, em geral, a forma de um cylindro ou de um cone muito alongado e sio ta- Ihados em pedra extremamente rija. Medem de 7 a8 38 em. de comprimento, por 15 a 17 cm. de circumferencia, nas bases, O pilio n." 420, da fig. 5, pertencente a0 Museu Ro- cha, esté dentro das dimensdes apontadas; alcanga apro- ximadamente 37 em. de comprimento e¢ 17 cm. de cir- cumferencia. E’ feito de gneiss, ‘Uso. As moletas (5), sobretudo as de pequenas dimensies, deviam ter o prestimo de despedacar 0s grios cereacs. Seu manejo era certamente igual ao das maos de pilio ainda em uso entre nés. Depois de a ter agar- rado fortemente, o indio levantava-a em linha vertical, para, om seguida, fazer cair com forga uma de suas ex- tremidades sobre a substancia depositada no almofariz. Essa maneira de utilizar o pilao de pedra cylindrico, dada a sua singeloza, devia ser naturalmente a mais se- guida entre os indigenas brasileiros. © douto Theodoro Sampaio, vulto de incontestavel valor em assumptos referentes 4 prehistoria brasilica, opina differentemente. Com o peso de sua autoridade de observador de largo tirocinio, elle assegura que a mulher indigena, para se servir de um pilao triturador de pedra, tomava-o com a mio esquerda pela parte su- perior e, com a mio direita, segurando-o pelo meio, im- primia um movimento rotatorio 4 parte inferior, o que bastava, segundo elle, para, ao peso da propria pega, tri- turar o contetdo do pilao ou gral. Accrescenta ainda (5) Oa pildcs sfio tambem conhecidos por sucadores, mo- letag, trituradores, pistillos © mies de gral, po InsttruTo Do CARA it que com isso conseguiam as indias effeito t40 satisfato- rio como 0 oleiro com a m6 do moinho mais perfeito. O parecer emittido pelo sabio bahiano no tocante 4 excellencia da farinha obtida pelos selvicolas com a aju- da exclusiva de scus toscos utensilios de pedra, afigura- Se-nos um tanto exaggerado. Inclinamo-nos antes a pensar que, por processos tao primitivas, elles 36 pode- riam grangear um producto assaz imperfeito, no gencro do que é adquirido em nossas casas com o antiquado Ppilio de madeira. Parece-nos tambem duvidoso que 0 modo de mano- jar o pilao, assignalado por Theodoro Sampaio, fosse mesmo o seguido pelo gentio cearense. O esforgo con- tinuado para fazer girar circularmente a ponta da moleta, é bem maior e de rendimento inferior ao empregado para suspendel-a intermittentemente e deixal-a cair sobre og fr#0s cu sementes. Ora, o indio, indolente e perspicaz como 6, n&o iria, por certo, dar preferencia a um processo que demandasse delle maior somma de trabalho. Em favor da opiniao por nés acima enunciada, mi- lita ainda o facto seguinte: langada constantemente de encoatro 4s paredes do gral, pelo movimento rotatorio, que lhe imprimiria o indigena, a extremidade da moleta, roida pela rogadura, tomaria cedo uma forma arredon- dada, semelhante 4 dos pistillos de louga e de vidro usa- dos nos laboratorios chimicos e nas pharmacias. E essa forma de pilio — que deveria ser commum, se ver- dadeiro fosse 0 pensar de Sampaio — 6, a0 contrario, incxistente entre nés. Por mais cuidadosas e pacientes que fossem as indagacées feitas, nao logramos, com ef- feito, achar no Cearé um unico exemplar de pilao que tivesse a configuracdo dos pistillos de pharmacia. Distribuigao. Ha pil6es em grande copia por toda o Brasil. Muito communs ros museus de S. Paulo (Ihe- ring) e Rio de Janeiro (L. Netto), elles existem profu- semente disseminados na Bahia (Th. Sampaio e Bernar- dino de Sousa), no Rio Grande do Sul (Ihering, Paldaof e Schupp), nos sambaquis de S. Paulo e Parana (Ch. 112 REVISTA TRIMENSAL Rath e Wiener), e nos estados do Espirito Santo e Pa- rana (Simeens da Silva). Algumas dessas moletas so notaveis pelo seu ta- manho, O especime oriundo da Feira de Sant’anna, que Hermann von Ihering affirma ter visto na Collecgéo Bar- reto, mede 1m,38 de comprimento e 14 cm. de circum- ferencia. Outro pilio de dimensdées fora do commum existe no Museu Simoens da Silva, do Rio de Janeiro; tem 1m,39 de comprimento por 17 em, de circumferencia na parte mais grossa. Provem igualmente da Bahia e pesa 6 640 grs. Simoens da Silva descreveu o referido objecto em substanciosa memoria apresentada ao XX Congresso de Americanistas (6). JA que tratamos aqui de grandes pilées de pedra. parece interessante registar que o Museu Paulista pos- sue pildes até de 62 cm. e que na colleccado archcologica do Instituto Historico Brasileiro se conserva uma dessas pedras cylindricas de diabase, que pesa 5.850 ers. ¢ mede 61 cm. de comprimento. De proporgées avantajadas sio ainda os dois obje- ctos mencionados por Paldaof em um dos seus artigos relativos 4 archeologia do Rio Grande do Sul. Um delles, achado no sambaqui de Torres, tem 90 em. de compri- mento; € o outro, de origem incerta, attinge 67 cm. de comprimento e 30 cm. de circumferencia. No Ceara, grande é¢ 0 numero de utensilios desse genero, existentes em collecgdes ethnographicas e mes- mo em maos de simples particulares. S60 Museu Rocha possue cerca de 64 exemplares. (6) Ha um accentuado ar de familia entre o pistillo de propriedade do Snr, Simoeng da Silva ¢ as trés pecas lithieas descohertas em Hornandeiras, que Antonio Serrano representa, cm seu trabalho intitnlade “Un nuevo tipo de instrumento de pedra del littoral argentino”, vindo a lume na Revista de la Sociedad “Amigos de lu Arquesiogia”. Tomo LV, Montevideo, 3925, Isso vem mostrar, mais uma vez, a enorme diffusio dos sovadores na America, po Instituto po Ceard 113 Tal abundancia, que contrasta frisantemente com a escassez de gracs, almofarizes e més, aqui encontra- dos, induz-nos 2 acreditar que os nossos gentios utiliza- vam-se tambem, para fabricar suas farinhas, de graes feitos de madeira ou até de pildes simplesmente esca- vados nas faces planas dos lagedos, processo muito se- guido por algumas tribus primitivas da Guyana brasi- ieira, do Brasil nferidional (B. Calixto), e mesmo da Ar- gentina (Aparicio, Lehmann Nitsche e Ameghino). A hypothese acima enunciada, segundo a qual os in- dios cearenses se serviam de pilées escavados nas rochas afloradas, acha-se estribada nas descobertas archeologi- cas do Snr, Melchiades Borges. Esse pesquisador assegurou-nos ter encontrado na Serra de Baturité, no sitio chamado Pau d’Arco, ¢ em Cangaty, gracs abertos em morros de gneiss, sendo que, proximo a um delles, havia um socador de pedra. Tambem na Serra do Pindé, jogar denominado Mer- ro Furado, topou aquelle viajante com numerosos aori- ficios, trinta pelo menos, cavados na pedra bruta pela mao do homem, orificios que lhe pareceram destinados a receber qualquer substancia a ser triturada (7). Nao temos dados seguros para affirmar perempto- viamente que os indigenas cearenses usavam pildes de madeira. QO facto de ser o emprego desses utensilins muito diffundide entro amerindios (8) dé foros de grande ve- rosimilhanga & nossa supposicao. Para explicar a existencia de tao grande numero de nioletas no Ceara, deve admittir-se ainda que os primi- tivos sclvicolas delles se serviam tambem 4 guisa de arma de guerra. (7) As deseohertas de Sar, Melehiades Borges foram, ultimamente, comprovadas pela chegada a0 Museu Rocha de va- rios graces, semelhantes aos pilies de madeiras, entalhados em fragmentos do peacdos (as. 4, 5 @ 6, fig. 6 (8) Erland Nordenskiold, em seu ultimo livro sobre ar- cheologia comparada, cita nada menos de 46 tribus indigenas que possuiam pilées de madoira, Hd Revista TRIMENSAT. Em nenhum dos chronistas antigos, que se occupam da terra cearense, vimos, cabe confessal-o, referencias justificativas de tal opiniao, Ella é, todavia, plausibi- Figura 6 — Graes ¢ sucadores de pedra lissima e nos foi suggerida pelo exame de um pilao de dorito, pertencente 4 Collecgio Studart (n.” 1, fig. 6). Mecde a pedra em apreco 39 cm. de comprimento e tem uma das extremidades adelgada 4 feigio de empunhadu- ra, emquanto a outra se dilata como o bojo oval de uma clava. Instrumento semelhante ao nosso encontra-se entre os artefactos indigenas do museu do Collegio de N. S. da Conccigio, em S. Leopoldo. bo Instituto po Crand 115 Delle tratou o Pe. Schupp em trabalho publicado no “Annuario do Estado do Rio Grande do Sul”, de 1904. No alludido escripto, ventilando problemas de palethno- Jogia brasilica, affirma o padre que no Rio Grande os selvagens arranjavam facilmente seus almofarizes, ca- vando no chio pequenas covas e forrando-as de pedacos de couro (9). E’ possivel que os indios do Ceara usassem igual- mente pilées assim improvisados. Observe-se, todavia, que, se tal pratica existiu aqui, nenhum vestigio deixou nos hebitos dos caboelos, legitimos descendentes dos in- dios. PEDRAS ELLIPSOIDAES (ns. 337 e 122, fig. 7). © Museu Rocha possue, a enfeitar-lhe os mostruarios, dois artefactos lithicos extremamente raros (10) ¢ inte- ressantes. Sua analyse deve caber tambem no presente capitulo, pois se trata muito provavelmente de utensilios domesticos. Feitos ambos de gneiss, trabalhados com esmero admiravel, perfeitamente symetricos e bem polidos, tém elles a forma aproximada de um grande charuto cujo alargamento se achasse justamente na porc&o media. Um mede 72 em, de comprimento por 25 em. de circum- ferencia, na parte dilatada, e veio de Pacatuba; o outro tem 71 cm. por 25 cm. e foi achado em Sebastiiio de Lacerda. Para facititar nosso estudo, chamal-os-hemos pedras ellipsvidaes, em falta de nome mais apropriado. (9) Segundo Nordenskiold, 0 habito de preparar almofa- rizes eseavantdo o solo, se vé tambem entre on Ashlusley, tribu do Grau Chaco argentino, (10) So os unicos eapecimes de cuja existencia temos contecimento no Ceara, 116 Revista TRiMENSAt Uso. Precisar o emprego das pedras ellipsoidaes é empresa difficil, qui¢d mesmo impossivel de realizar-se, no estado actual dos nossos conhecimentos de archeo- logia prehistorica do Brasil. Figura 7. (+ 1/8 gr. nat.) Pedras ellipsoidaes e varias moletas da colleccio Rocha 122—Pedra ellipsvidal de gneiss — Pacatuba 337—Tdem de gneiss ~- Sehastiio de Lacerda As chronicas, mesmo as mais abalisadas, sio mu- das acerca de tio interessante questo, e as modernos bo Insriruto po CraRA 117 viajantes, que tratam dog usos e costumes dos nossos gentios, nada adiantam nesse particular. Uma obser- vacio attenta dos objectos cearenses — unico meio que temos para elucidar esse problema — nos faz propensos a admittir que ellas eram pacificas mfos de gral, des- tinadas a esmagar fructos, graos, etc. Provavelmente os indios dellas se serviam 4 maneira do que fazem as nossas pasteleiras com o rodo, isto é, faziam-nas rolar para diante e para tras por sobre uma superficie isa e horizontal, onde era collocado o alimen- to, A pedra inferior fazia entéo o papel de mé dormente ou fixa, Objectar-se-ha, talvez, que 4s mulheres da tribu eompetia o preparo dos alimentos e que o manejo de tio pesado instrumento cedo as estenuaria. A objecgao nao procede. Segundo consenso quasi unanime dos chronistas, os primitivos brasis eram extre- a.amente fortes e as mulheres nada lhes ficaram a dever em corpulencia e rebustez. Devemos accentuar que, em contrario ao nosso des- pretencioso parecer, ha um testemunho de nao pequena importancia, E’ o de Barbosa Rodrigues, escriptor pa- tricio, que por largos annog perlustrou a Amazonia, ob- servando os nativos e colhendo subsidios para o estudu da flora brasileira. Elle sustenta que alguns dos anti- gos aborigenes do Tapajds usavyam nos combates clavas de pedra de forma mais ou menos semelhante 4s nossas pedras ellipsoidaes: “Usavam para o corte de arvores de machados de varios tamanhos, assim como para a guerra, do arco, flechas hervadas, de massas de diorito com férma de dois cones, unidos pelag bases”. N&o nos sentimos com autoridade para pér em du- vida affirmativas tao cathegoricas, Todavia, o peso extraordinario das pedras ellipsoidaes e sua forma abso- lutamente impropria a desferir golpes nos levam a pen- 118 Revista TRIMENSAL sar que tal naéo era o fim principal desses utensilios. Talvez os indios tivessem manejado um objecto seme- lhante ao que ora estudamos, num desses momentos de aperturas em que tudo serve para a defesa pessoal, O facto, presenciado pelo illustre botanico brasileiro, o te- rin induzido em erro. Convem attentar-se ainda que a forma da pedra utilisada como arma de combate pelo gentio da Amazonia é um tanto diversa das nossas.

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