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INSTITUTO SUPERIOR DE TECNOLOGIAS E

GESTÃO
Ensino Superior a Distância

MÓDULO DE INTRODUÇÃO AO ESTUDO DO


DIREITO

Curso de Gestão de Empresas e Liderança

Moçambique
FICHA TÉCNICA

Maputo, Julho de 2013

© Guia de Estudo para o Curso de Gestão de Empresas e Liderança


(Ensino a Distância)

Todos os direitos reservados ao Instituto Superior de Tecnologias e


Gestão
Título do módulo: Introdução ao Estudo de Direito
Edição: 1ª

Organização e Edição
Instituto Superior de Tecnologias e Gestão (Ensino Superior a Distância)
Autor: António Caetano de Sousa
Revisor de EaD: Castelo Mário Maluleque
Revisor científico: Vasco Laquiço Siquice Matchoco
Revisor linguístico: Emília Morais

ii
ÍNDICE Página
FICHA TÉCNICA .......................................................................................................................... ii

Apresentação ................................................................................................................................. xii

Introdução ao módulo ..................................................................................................................... 1

Objectivos do Módulo..................................................................................................................... 1

Recomendação para o estudo .......................................................................................................... 2

Ícones da Actividade ....................................................................................................................... 3

Dicas de Apoio ................................................................................................................................ 4

Tempo para o estudo ....................................................................................................................... 4

Testes/Avaliações ........................................................................................................................... 5

Unidade Didáctica nº 1: Sentido geral do direito - ordem natural e ordem social, o direito e
realidades afins e conexas, o direito patural e o direito positivo e a ordem Jurídica como ordem
normativa ........................................................................................................................................ 5

Introdução ....................................................................................................................................... 5

Objectivos da Unidade .................................................................................................................... 6

Desenvolvimento do conteúdo ........................................................................................................ 7

1. O Estudo do Direito .................................................................................................................... 7

1.1 O Homem Como Um Ser Social ............................................................................................... 8

1.2 Necessidade de existência das normas ...................................................................................... 9

1.3 Necessidade De Existência Do Direito ..................................................................................... 9

2. A problemática da ordem social: .............................................................................................. 10

3. Conceito De Direito .................................................................................................................. 11

3.1. Sentidos do termo direito ....................................................................................................... 11

Definições importantes ................................................................................................................. 11

3.2. Valores fundamentais do Direito ........................................................................................... 13

a) A justiça ................................................................................................................................. 13

iii
b) A Segurança ........................................................................................................................... 14

3.3 Alguns princípios gerais do direito ......................................................................................... 14

a) Princípio da não retroactividade da lei .................................................................................. 14

b) Princípio do caso julgado ...................................................................................................... 15

3.4 Fins Do Direito ....................................................................................................................... 15

3.5 Origem, Elementos e Função do Estado ................................................................................. 16

3.6 Elementos ................................................................................................................................ 16

3.7 Poderes e funções do estado ................................................................................................... 18

3.8 Fins do estado ......................................................................................................................... 19

3.9 Funções do estado ................................................................................................................... 19

3.9.1 Função Política ou Governativa ........................................................................................... 19

3.9.2 Função Legislativa ............................................................................................................... 20

3.9.3 Função Administrativa ......................................................................................................... 20

3.9.4 Função Jurisdicional ............................................................................................................ 20

4. Direito e realidades afins e conexas .......................................................................................... 20

4.1 A ordem jurídica e outras ordens sociais normativas ............................................................. 20

4.2 A Ordem religiosa ................................................................................................................... 21

4.3 A ordem moral ........................................................................................................................ 21

4.4 Ordem do trato social, etiqueta ou cortesia ............................................................................. 22

5. A ordem jurídica e ordenamento jurídico ................................................................................. 23

5.1 O direito e a ordem jurídica .................................................................................................... 23

5.1.1. As relações entre as diversas ordens normativas ................................................................ 23

5.1.1.1 Moral / Direito .................................................................................................................. 24

5.1.1.2 Religião / Direito............................................................................................................... 24

5.1.1.3 Trato Social/Direito .......................................................................................................... 25

5.1.1.4 As Instituições e o Direito................................................................................................. 26


iv
6. A Norma Jurídica ...................................................................................................................... 27

6.1 Conceito de Norma Jurídica.................................................................................................... 27

6.2 Caracteristicas ......................................................................................................................... 27

6.2.1 Imperatividade ..................................................................................................................... 28

6.2.2 Generalidade e Abstraçäo .................................................................................................... 28

6.2.3 Coercibilidade ...................................................................................................................... 28

6.3 Estrutura .................................................................................................................................. 29

6.4 Classificação ........................................................................................................................... 29

6.4.1 Classificação das normas quanto à imperatividade ............................................................. 29

6.4.2 Normas Quanto à Sancionalidade ........................................................................................ 32

Tarefas........................................................................................................................................... 33

Auto-avaliação .............................................................................................................................. 34

Chave-de-correcção ...................................................................................................................... 34

Resumo ......................................................................................................................................... 37

Bibliografia ................................................................................................................................... 37

Unidade Didáctica nº 2:Fontes do Direito, Interpretação e aplicação da Lei ............................... 38

Introdução ..................................................................................................................................... 38

Objectivos da Unidade .................................................................................................................. 38

Desenvolvimento do conteúdo ...................................................................................................... 39

1. Fontes de direito ........................................................................................................................ 39

1.1 Evolução do direito e das fontes de direito ............................................................................. 39

1.1.1 Conceito de fonte ................................................................................................................. 39

2. A lei ........................................................................................................................................... 43

2.1 Conceitos e espécies .............................................................................................................. 43

2.2 Pressupostos ............................................................................................................................ 43

Definições Importantes ................................................................................................................. 44


v
2.3 Hierarquia da lei ...................................................................................................................... 44

2.3.1 Leis constitucionais .............................................................................................................. 45

2.3.2 Leis ordinárias ...................................................................................................................... 45

2.3.3 Sumário da hierarquia das leis ............................................................................................. 46

3. Processo de feitura das leis ....................................................................................................... 46

4. Vícios da lei .............................................................................................................................. 47

4.1 Ineficácia jurídica.................................................................................................................... 47

4.2 Inexistência jurídica ................................................................................................................ 47

4.3 Invalidade jurídica .................................................................................................................. 48

5. Modos de cessação da eficácia das leis..................................................................................... 48

6. A Aplicação da lei ..................................................................................................................... 49

6.1 A Interpretação da lei .............................................................................................................. 49

6.2 Formas de interpretação .......................................................................................................... 50

6.2.1 Interpretação autêntica ......................................................................................................... 50

6.2.2 Interpretação Oficial ............................................................................................................ 50

6.2.3 Interpretação Judicial, .......................................................................................................... 51

6.2.4 Interpretação doutrinal ou particular .................................................................................... 51

6.3 Finalidades da interpretação ................................................................................................... 51

6.3.1 Interpretação Subjectiva e Interpretação Objectivista. ........................................................ 51

6.3.2 Interpretação Histórica e Interpretação Actualista. .............................................................. 51

6.4. Elementos da interpretação .................................................................................................... 52

6.5 Elemento sistemático .............................................................................................................. 53

6.6 Elemento histórico .................................................................................................................. 54

6.7 Elemento teleológico .............................................................................................................. 55

7. Os resultados da interpretação .................................................................................................. 55

8. A lacuna jurídica ....................................................................................................................... 56


vi
8.1. Noção ..................................................................................................................................... 56

8.1.1 Espécies de lacunas .............................................................................................................. 57

8.1.2 Formas de integraçãode lacunas .......................................................................................... 57

9. Aplicação das leis no tempo e no espaço .................................................................................. 59

9.1 A aplicação das leis no tempo ................................................................................................. 59

9.2 A aplicação das leis no espaço ................................................................................................ 61

Tarefas........................................................................................................................................... 62

Auto-avaliação .............................................................................................................................. 62

Chave-de-correcção ...................................................................................................................... 63

Resumo ......................................................................................................................................... 64

Bibliografia ................................................................................................................................... 65

Legislação ..................................................................................................................................... 65

Unidade Didáctica nº 3: Ramos do direito, codificação e sistemas jurídicos ............................... 66

Introdução ..................................................................................................................................... 66

Objectivos da Unidade .................................................................................................................. 66

Desenvolvimento do conteúdo ...................................................................................................... 67

1. Ramos do direito e razões da divisão ........................................................................................ 67

2. Critérios de distinção ................................................................................................................ 68

2.1 Critério da natureza dos interesses .......................................................................................... 68

2.2 Critério da qualidade dos sujeitos na relação jurídica ............................................................ 69

2.3 Critério da posição dos sujeitos na relação jurídica ................................................................ 70

3. Aplicação das normas de direito privado e direito público....................................................... 70

4. Ramos do direito público .......................................................................................................... 71

4.1 Direito constitucional .............................................................................................................. 71

4.2 Direito administrativo ............................................................................................................. 72

4.3 Direito Financeiro ................................................................................................................... 72


vii
4.4 Direito Fiscal ........................................................................................................................... 73

4.5 Direito criminal ou penal ........................................................................................................ 73

4.6 Direito processual ................................................................................................................... 74

4.6.1 Direito processual civil ........................................................................................................ 74

4.6. 2. Direito processual criminal ou penal ................................................................................. 74

5. Ramos do direito privado .......................................................................................................... 74

5.1. Direito civil ............................................................................................................................ 74

5.1.1 ParteGeral ............................................................................................................................ 75

5.1.2 Direito das Coisas ................................................................................................................ 75

5.1.3 Direito das Obrigações ......................................................................................................... 75

5.1.4 Direito da Família ................................................................................................................ 76

5.1.5 Direito das Sucessões ........................................................................................................... 76

5.2 Direito Privado Especial ......................................................................................................... 76

5.2.1 Direito Comercial................................................................................................................. 76

5.2.2 Direito do trabalho ............................................................................................................... 77

6. Codificação ............................................................................................................................... 77

6.1 Génese da codificação............................................................................................................. 77

6.2 Conceito de Código................................................................................................................. 79

Definições Importantes ................................................................................................................. 80

6.3 Código das Compilações e das Consolidações ....................................................................... 80

6.4 Vantagens e Desvantagens da Codificação............................................................................. 81

6.4.1 Vantagens da codificação: ................................................................................................... 81

6.4.2. Desvantagens da codificação: ............................................................................................. 81

7. Principais códigos existentes em moçambique ......................................................................... 82

8. Sistemas jurídicos ..................................................................................................................... 82

Definições Importantes ................................................................................................................. 83


viii
8.1 Sistema Romano-germânico ................................................................................................... 83

8.1.1 Origem e Desenvolvimento ................................................................................................. 83

8.1.2 Expansão .............................................................................................................................. 85

8.1.3 Características ...................................................................................................................... 85

8.1.4 Fontes ................................................................................................................................... 85

8.2 Sistema Common law ............................................................................................................. 85

8.2.1 I Origem e Desenvolvimento ............................................................................................... 86

8.2.2 Expansão .............................................................................................................................. 87

8.2.3 Características ...................................................................................................................... 87

8.2.4 Fontes do Common Law ...................................................................................................... 88

8.2.5 A Jurisprudência .................................................................................................................. 89

8.2.6 O Costume ........................................................................................................................... 89

8.2.7 A Lei .................................................................................................................................... 89

8.3 O Sistema Socialista ............................................................................................................... 89

8.3.1 Origem e Desenvolvimento ................................................................................................. 90

8.3.2 A Doutrina Marxista ............................................................................................................ 90

8.3.3 A Doutrina Marxista-leninista ............................................................................................. 90

8.3.4 Bolcheviques e Mencheviques ............................................................................................. 91

8.3.5 O Estado Socialista e a Passagem para o Comunismo ........................................................ 91

8.3.6 Fim da URSS ....................................................................................................................... 92

8.3.7 Expansão .............................................................................................................................. 93

8.3.8 Características ...................................................................................................................... 93

Tarefas........................................................................................................................................... 93

Auto-avaliação .............................................................................................................................. 94

1. Sobre os ramos do direito ......................................................................................................... 94

2. Sobre a Codificação .................................................................................................................. 94


ix
3. Sobre os sitema jurídico: ........................................................................................................... 94

Chave-de-correcção ...................................................................................................................... 95

Resumo ......................................................................................................................................... 96

Bibliografia ................................................................................................................................... 97

Legislação ..................................................................................................................................... 97

Unidade Didáctica nº 4:Relação Jurídica ...................................................................................... 98

Introdução ..................................................................................................................................... 98

Objectivos da Unidade .................................................................................................................. 98

Desenvolvimento do conteúdo ...................................................................................................... 99

1. Relação social: noção e espécies............................................................................................... 99

2. A relação jurídica ...................................................................................................................... 99

2.1 Noção ...................................................................................................................................... 99

Definições Importantes ............................................................................................................... 100

2.2 Elementos da relação juridica ............................................................................................... 100

2.2.1 Sujeitos............................................................................................................................... 100

2.2.2 A Garantia .......................................................................................................................... 101

3. Direitos e deveres jurídicos ou sujeições ................................................................................ 101

Definições Importantes ............................................................................................................... 102

3. 1 Os Sujeitos ........................................................................................................................... 102

3.2 Pessoas Singulares ................................................................................................................ 103

3.3.1 Começo e termo de personalidade ..................................................................................... 103

3.3.2 Direitos de Personalidade .................................................................................................. 104

3.4 Capacidade Juridica .............................................................................................................. 105

3.4.1 As incapacidades de exercicio ........................................................................................... 107

3. 5. Pessoas Colectivas .............................................................................................................. 110

3.5.1 Personalidade Jurídica ....................................................................................................... 110


x
3.5.2 Capacidade Jurídica ........................................................................................................... 110

4. O objecto ................................................................................................................................. 111

4.1 Modalidades de objecto da relação jurídica .......................................................................... 111

4. 2. Possíveis objectos da relação jurídica ................................................................................. 112

4.2.1 Pessoas ............................................................................................................................... 112

4.2.2 Prestações ........................................................................................................................... 113

4.2.3 Coisas ................................................................................................................................. 113

5. O Facto Jurídico ...................................................................................................................... 113

5.1. Classificação dos factos jurídicos ........................................................................................ 113

5.1.1 Factos jurídicos voluntários ou actos jurídicos .................................................................. 113

5.1.2 Factos jurídicos involuntários ............................................................................................ 114

Tarefas......................................................................................................................................... 115

Auto-avaliação ............................................................................................................................ 116

Chave-de-correcção .................................................................................................................... 117

Resumo ....................................................................................................................................... 117

Bibliografia ................................................................................................................................. 118

Legislação ................................................................................................................................... 118

xi
Apresentação

Caro(a) estudante!

Está nas suas mãos o módulo de Introdução ao Estudo do Direito que integra a grelha curricular
do Curso de Gestão de Empresas e Liderança, oferecido pelo Instituto Superior de Tecnologias e
Gestão na modalidade de Educação a Distância.

Este módulo que serve de guia de estudo, coadjuvado com outros saberes vinculados nas outras
disciplinas do seu curso, irá dotá-lo de conhecimentos, habilidades, valores e atitudes
fundamentais para o seu sucesso na carreira estudantil e profissional.

Caro estudante!

Lembre-se sempre que o sucesso na aprendizagem depende de si. Desta forma, deve planificar-se
para estudar todos os dias, do período lectivo, para que possa alcançar os resultados da
aprendizagem pré-determinados no módulo.

Com a esperança de que este módulo constitua um verdadeiro guia de estudos, a equipa de
professores que se dedicou à sua elaboração, adaptação e organização deseja a si muita
aprendizagem activa, que poderá materializá-la através de diálogos e debates nos foruns e nas
sessões presenciais, visto que o desenvolvimento do País depende da qualidade de serviço de
cada um de nós, nos diferentes sectores sócio-económicos.

Seja muito bem-vindo(a) ao nosso convívio.

A Equipa do EaD

xii
Introdução ao módulo

Bem-vindo ao módulo deIntrodução Estudo do Direito, integrado no curso de Direito.

Caro estudante, o presente módulo visa permitir que você adquira as noções jurídicas
fundamentais que servem de base às disciplinas subsequentes do curso bem como compreender o
Direito como ordem da sociedade através da análise crítica e delimitação conceitual dos seus
elementos permanentes, identificar a ordem jurídica, suas divisões, classificações e fontes e
iniciar-se na metodologia juridica e na estruturação da sua capacidade judicativa

O módulo é composto por quatro unidades nomeadamente a:

Unidade I, que irá abordar aspectos introdutórios como o sentido geral do Direito, Ordem
Natural e Ordem Social, o Direito e realidades afins e conexas, o Direito Natural e o Direito
Positivo e a Ordem Jurídica como Ordem Normativa.

Unidade II, que irá se debruçar sobre as fontes do Direito,e Interpretação e aplicação da Lei.

Unidade III, que irá englobar os aspectos inerentes aosRamos de Direito, Codificação,
Sistemas jurídicos e Direito Comparado; e a

Unidade IV, que versará sobre a relação Jurídica.

Objectivos do Módulo

Quando terminar o estudo do módulo de Introdução ao Estudo do Direito você será capaz de:

 Situar o Direito no universo do conhecimento e estabelecer uma relação entre ele e as


ciências afins, reflectindo criticamente, sobre esses conhecimentos;

 Perceber a grandeza e a importância dos estudos jurídicos, e encará-los como directrizes;

1
 Ter noções da evolução da temática do direito e conhecer sua estrutura organizacional
básica;

 Conhecer o carácter polémico que é a definição da origem, dos conceitos, objetivos e


métodos do direito, situando-se na realidade atcual e suas exigências ético-jurídicas.

Recomendação para o estudo

Lembre-se de que você será um autodidacta e vai estudar sozinho, segundo suas oportunidades,
convivência e ritmo de trabalho. Para você alcançar os objectivos deste módulo precisa de:

1. Ler o módulo e todos os materiais complementares


2. Resolver todas as tarefas e exercícios de auto avaliação;
3. Resolver os trabalhos em grupo ou individual;
4. Participar nos fóruns de debates;
5. Verificar e registar o seu progresso;
6. Ser auto responsável;
7. Programar todas as suas actividades em função dos objectivos;
8. Estude uma uma coisa de cada vez.

Preste atenção às palavras novas cujo significado lhe é vagamente familiar. Não prossiga até ter
entendimento completo da mesma, pois pode ser que exactamente essa palavra envolva a idéia
principal ou pormenores importantes;

Tenha o hábito de fazer anotações e esquemas, ao longo da leitura de seu texto.


A bibliografia no final de cada unidade é uma boa indicação para a actualização permanente e
continuada.

2
Ícones da Actividade

Ao longo deste móduloirá encontrar uma série de ícones nas margens das folhas. Estes ícones
servem para identificar diferentes partes do processo de aprendizagem. Podem indicar uma
parcela específica de texto, uma nova actividade ou tarefa, uma mudança de actividade, etc.

Pode ver o conjunto completo de ícones deste manual já a seguir. Cada um com uma descrição
do seu significado e da forma como nós interpretámos esse significado para representar as várias
actividades ao longo deste Módulo.

Introdução Desenvolvimento de conteúdo

Resumo
Objectivos

Definições importantes
Tempo para completar a lição

3
Tarefas Auto-avaliação

Para investigar Texto de leitura

Dicas de Apoio

Se tiver dificuldades poderá consultar ao seu tutor, usando vários meios que serão definidos no
início do curso.

Tempo para o estudo


Este Módulo tem a duração de 8 semanas e tem uma carga horária de 150 horas, o que significa
que deve estudar de forma independente 118 horas e ter contacto com o docente em média 8
horas presencialmente e 24 horas virtualmente.

4
Testes/Avaliações

Nesta disciplina você vai realizar duas avaliações presenciais (AP’s) e várias avaliações a
distância (AD’s).

Unidade Didáctica nº 1: Sentido geral do direito - ordem natural e ordem


social, o direito e realidades afins e conexas, o direito patural e o direito
positivo e a ordem Jurídica como ordem normativa

Introdução

Caro estudante, o Direito é esse algo conhecido por todos, mas desconhecido por muitos, que
anda intrinsicamente ligado a estas duas figuras e realidades, o homem e a sociedade que importa
analisar em primeiro lugar por forma a nos introduzir nesta vasta realidade que é o Direito. Da
necessidade de regular a vida do homem na sociedade, no meio social deu azo a origem, ao ser e
a utilidade do direito.

O Direito, enquanto sistema de normas coactivas, é criado pelo Estado, razão pela qual nos
iremos deter na análise dos elementos e funções do Estado e na relação entre a Ordem Jurídica e
as outras ordens normativas da sociedade, como a religião, moral e trato social, na medida em
que o Direito não constitui um meio exclusivo de regulamentação da vida na sociedade.

Para regular e proteger as relações jurídicas o Direito emana normas, cujo estudo se mostra
pertinente de forma a conhecer a sua essência, elementos, estrutura e classificação que nos irá
permitir distinguir dasoutras normas não jurídicas, mas, que têm o seu próprio papel e lugar na
regulação da sociedade.

5
Objectivos da Unidade

Ao completar esta unidade, você deverá ser capaz de:

 Identificar a natureza do homem;


 Conhecer o modo e razão pela qual o homem vive em sociedade;
 Identificar a origem, razão de ser e a utilidade do direito;
 Distinguir os sentidos da palavra direito;
 Identificara origem, função e as características do estado;
 Distinguir: direito/religião, direito/moral,direito/tracto social; direito/ética e
direito/justiça;
 Caracterizar o direito natural;
 Caracterizar o direito positivo;
 Estabelecer a distinção entre o direito natural e o direito positivo;
 Distinguir a ordem jurídica de outros sistemas de normas sociais através dos seus traços
característicos;
 Caracterizar a norma jurídica e diferencia-la de outras espécies de normas;
 Decompor as normas jurídicas segundo os seus elementos estruturais, a luz das teorias
sobre as matérias;
 Identificar os meios privativos de tutela dos direitos e as circunstancias em que as pessoas
podem se valerem desses mesmos meios para a defesa dos seus direitos ou de terceiros,
quando violado ou em risco de violação;
 Distinguir as várias classificações das normas jurídicas e;
 Saber como se conjugam a norma no processo da sua aplicação em casos concretos.

6
Desenvolvimento do conteúdo

1. O Estudo do Direito

O Prof. José de Oliveira Ascenção, autor de uma das mais recomendadadas obras de Introdução
ao Estudo do Direito, O Direito - Introdução e Teoria Geral, a páginas 9, (obra indicada no
número da nossa Bibliografia,) ao introduzir-nos sobre a realidade chamada “Direito”, diz-nos
que a mesma, tanto se pode dizer que é conhecida de toda a gente, como é desconhecida do
homem comum.

Prossegue dizendo, que até o leigo, por mais iletrado que seja, consegue orientar-se na percepção
do fenómeno jurídico. Recordar, antes de mais, que os seus direitos, o que lhe é devido e o que
deve aos outros; Menciona Juízes, Advogados, Escrivãs; pensa em tribunais e prisões. Este
mesmo leigo, no entender deste ilustre professor terá do Direito uma noção muito mais
aproximada do que sobre Astronomia ou Biologia, ou até Física se nestes não forem
particularmente versados.

Continuando, o ilustre professor diz que, quando se passa da impressão corrente à compreensão
verdadeira, verificamos pelo contrário, que só os especialistas ou as pessoas cultas sabem o que é
Direito. Sobre a Medicina ou da Agronomia pode-se dar uma noção assente na experiência, que
resiste longamente: do Direito não. O Direito surge-nos logo como uma realidade abstracta, que
transcende os exemplos com que o queiramos captar. O Direito não está em Artur ter transferido
uma coisa a Bartolomeu, não se esgota na descrição deste facto social: tem um prolongamento
que vai para além dele. A passagem da pré - compreensão, para usar um termo muito em voga,
para o conhecimento exacto é já obra da Ciência do Direito.

As páginas 10, o mesmo autor chama-nos a particular atenção de que o “ O Direito é uma Ordem
da Sociedade. Uma Ordem e não a Ordem, repare-se, porque na sociedade outras ordens se
encontram.”Quer quer dizer que não é tarefa exclusiva do Direito a de regular a vida na
sociedade, há que ter em consideração outras ordens normativas como a Moral, a Religião e a do
Trato Social, auxiliam o Direito na regulação da vida na sociedade.

O Direito é uma realidade muito vasta, foram-se por isso desenhando dentro dele algumas partes
ou divisões, que se chamam ramos do Direito, como é o caso do Direito Administrativo, Direito
Criminal, Direito da Família, por exemplo.

7
A abordagem que iremos fazer neste módulo é de levar à compreensão do Direito nos seus
elementos permanentes. Pretendemos realizar uma introdução ao Direito que desemboque numa
teoria geral do fenómeno jurídico.

1.1 O Homem Como Um Ser Social

A História demonstra que, desde os primórdios, o homem sempre viveu em comunidade com os
seus semelhantes. A razão da sua sociedade corresponde as tendências mais profundas do
homem, pois que este, por instinto e por necessidade, sempre procurou na convivência a melhor
satisfação das suas necessidades.

Viver é necessariamente conviver, isto é só através da interacção com os outros homens ele
conseguirá a sua plena realização, daí dizer-se que o homem é um ser eminentemente social.
Porque a convivência em sociedade traduz-se na inter - ajuda, na solidariedade e na divisão do
trabalho, a mesma só é possível se existir um elenco mínimo de princípios ou regras porque se
pautem as condutas humanas.

A existência de normas capaz de definir as condutas, é um dado inerente à própria vida em


sociedade.

Na opinião de José de Oliveira Ascenção, a páginas 17, da obra, O Direito - Introdução e Teoria
Geral, O Direito é um fenómeno social e humano = pois:

a) O Direito não é um fenómeno da Natureza, mas sim um fenómeno humano,


implicando necessariamente o factor espiritual. Coisas e animais podem ser contempladas
pelo Direito, como objectos, mas não se relacionam em termos de direito, nem o direito
estabelece para eles regras de conduta (há, sim, regras sobre condutas humanas referentes
a coisas ou animais, o que é diferente).

b) Sendo um fenómeno humano, direito não é um fenómeno do homem isolado, é um


fenómeno social, há uma ligação necessária, a constante entre o Direito e sociedade. Por
isso se diz: “UBI IUS IBI SOCIETAS” (onde há direito, há sociedade, onde há
sociedade, há direito).

8
1.2 Necessidade de existência das normas

Verificamos que em toda a sociedade há elementos de permanência que a subtraem ao regime do


arbitrário.

As pessoas e condutas têm entre si um lugar demarcado. Estão numa certa ordem. Isto permite à
sociedade sobreviver e atingir os seus fins. A ordem é assim um dado primário da observação
sociológica. Toda a ordem social implica um complexo de normas propostas a observância dos
seus membros.

É esta norma que demarca e harmoniza as condutas dos vários sujeitos, tornando possível atingir
em conjunto a finalidade pretendida.

Contudo, é preciso distinguir estas leis, que se dirigem à vontade humana e que se propõem a
nortear as condutas, das leis da natureza que são indissociáveis e exprimem uma relação
necessária entre dois seres.

A ordem natural, é assim, uma ordem de necessidade: tem de existir tal e qual, as suas leis não
são substituíveis. Se passarmos, porém, desta ordem da natureza para a ordem social,
verificamos que toda a norma exprime um dever ser e é essencialmente viciável. A violação só
atinge a norma na sua eficácia, não a atinge na sua validade. Por e xemplo: A regra “não matar”
– todos concordam em que esta norma deve ser acatada, mas isso não significa que alguém não
mate, no entanto, mesmo que os homicídios sejam numerosos, a norma não é abolida; a sua
validade não é afectada.

A ordem social pode ser, portanto, perturbada, porque o homem é livre, podendo rebelar-se
contra ela. No entanto, logo se reconstitui, pois sem ordem, nenhuma sociedade pode subsistir.

1.3 Necessidade De Existência Do Direito

O Direito é intrínseco, na própria ordem social. Se toda a sociedade tem uma ordem, ela tem
também, desde o início, uma ordem jurídica. Pode a determinação desta suscitar dificuldades, na
medida em que pode concorrer com outras ordens.

No entanto, é sempre possível distinguir o que é e não é Direito e confirmar que a vida social só
é possível porque os homens acatam regras que visam instituir a Paz, Segurança Jurídica e

9
dirimir os conflitos de interesses que, inevitavelmente, surgem nas relações sociais. É neste
âmbito que é direito foi e será sempre aceite.

2. A problemática da ordem social:

A natureza social do Homem: só através da interacção com outros homens, da conjugação dos
seus esforços, baseada na solidariedade e na divisão do trabalho, o Homem atingirá a sua plena
realização, contudo, a convivência, em sociedade, só é possível se existir um elenco mínimo de
princípios ou regras que pautem a conduta humana.

Ordem Social e Ordem Natural: A Ordem é um dado princípio da observação sociológica.


Toda a Ordem Social implica um complexo de normas propostas à observância dos seus
membros. É a norma que demarca e harmoniza as condutas dos vários sujeitos, tornando possível
atingirem, em conjunto, a finalidade pretendida. Contudo há que distinguir:

 Leis ou normas de conduta social: são leis feitas pelo Homem, propõem-se nortear as
suas condutas em sociedade e são violáveis.

A ordem Social: é uma ordem de liberdade, dado que, apesar das suas normas
exprimirem um “dever ser” e se imporem ao Homem, este pode violá-las, pode revelar-se
contra elas ou pode mesmo alterá-las, sendo certo que a violação destas normas só as
atinge na sua eficácia e não na sua validade.

 Leis físicas ou da Natureza:são aquelas que regem o funcionamento da Natureza, sendo


por isso inalteráveis e invioláveis:

A Ordem Natural: é uma ordem de necessidades, as suas leis não são substituíveis,
aplicam-se de forma invariável e constante, independentemente da vontade do Homem ou
mesmo contra a sua vontade. Tais leis não são fruto da vontade do Homem, mas sim
inerentes à própria natureza das coisas.

A necessidade de regras como condição de subsistência da vida social: a vida social só é possível
porque os Homens acatam regras que visam instruir a ordem, a paz, a segurança, a justiça, e
atenuar os conflitos de interesses que inevitavelmente surgem nas relações sociais. É, assim,
indispensável a existência de regras que imponham condutas aos membros da sociedade, com

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vista a evitar conflitos, desencadeados por diversos motivos, ou minimizar as suas
consequências.

3. Conceito De Direito

Muito se tem discutido a volta do conceito de Direito, e os autores divergem quanto a definição
do Direito, uns recusando-se em apresentar o seu conceito, com o fundamento de que qualquer
tentatativa definição nao iria abaranger em poucas palavras uma realidade tao vasta e complexa
que e a Ciencia chamada Direito.

Outros há , que entendem que mostra-se necesario definir o Direito, atá porque como é o nosso
caso, e necessário ao estudante que está introduzir –se ao direito, ter um conceito de Direito.

Nesta linha de pensamento está Joao Castro Mendes, que a paginas 11, da sua obra, Mendes,
João de Castro Mendes, Introdução ao Direito, Editora Pedro Ferreira, Lisboa,1994, define o
Direito como: “Sistema de normas de conduta social, assitido de protecção coactiva"

3.1. Sentidos do termo direito

Existem vários sentidos do termo “Direito”. Todavia, ir-nos-emos referir, a título


exemplificativo, aos mais comuns.

Definições importantes

1º - Sentido Comum, é tomado em termos genéricos, sem se atender o seu alcance. Qualquer
leigo em Direito, ao menos conhece alguns dos seus direitos, o que lhe é devido e o que deve aos
outros, menciona os juízes, advogados; pensa em tribunais, prisões, mas sem ter a consciência da
realidade abstracta e transcendente que é o Direito.

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2º - Sentido Fiscal, será o conjunto de normas que regulamentarão a incidência, recolha,
tributação e pagamento de imposto. O Estado para puder fazer face das suas inúmeras despesas,
no interesse da colectividade, carece de obter receitas, que geralmente são regulados no âmbito
do direito fiscal .

3º - Sentido Real, teremos os Direitos Reais como direitos absolutos e inerentes a uma coisa e
funcionalmente dirigidos à afectação desta aos interesses do sujeito; ou por outras palavras, é o
poder de exigir de todos os outros indivíduos uma atitude de respeito pelo exercício de
determinados poderes sobre uma coisa. De entre os direitos reais existentes, os principais são: A
Propriedade, o Usufruto e a Servidão.

4º - Sentido Epistemológico ou Científico que será o estudo das melhores formas de conseguir,
tecnicamente, a atribuição a cada um o que é seu.

5º - Sentido Objectivo, como conjunto ou sistema de normas, gerais, abstractas e hipotéticas,


emanadas pelo Estado e dotadas de protecção coactiva. Por outras palavras, é o corpo ou
complexo de regras gerais e abstractas que organizam a vida em Sociedade sob os mais diversos
aspectos e que, designadamente, o estatuto das pessoas e regulam as relações entre elas.

6º - Sentido Subjectivo, é o poder ou faculdade atribuído ao titular de um Direito Objectivo, de


agir ou não de acordo com o conteúdo daquele, ou de exercer ou não um direito juridicamente
relevante, por outras palavras, é o poder jurídico atribuído pela ordem jurídica a uma pessoa, de
livremente exigir ou pretender de outrem um comportamento positivo (acção) ou negativo
(omissão) ou por um acto de vontade, só de por si ou integrado por um acto de uma autoridade
pública, produzir determinados efeitos jurídicos que incontestavelmente se impõem a outra
pessoa - contraparte ou adversário. Só se nos depara um Direito Subjectivo quando o exercício
do poder jurídico respectivo está dependente da vontade do seu titular.

7º - Direito Natural, são certas normas de conduta que por serem inerentes à própria natureza
do homem, são anteriores e superiores ao Estado. É uma designação próxima da de «Direitos do
Homem», e com significado afim.

8º - Direito Positivo, é constituído pelas leis, com existência efectiva e que se formam na
sociedade em vista da organização desta e da pacífica convivência dos indivíduos. Ele provém da
vontade mais ou menos arbitrária dos homens que normalmente procuram criá-lo tão perfeito

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quanto possível, mas que, pela fraqueza e contingências das suas forças, fazem quase obra
precária. É o direito que a sociedade cria, com uma expressão exterior, sensível e tangível.

3.2. Valores fundamentais do Direito

Os valores fundamentais do Direito são:

a) A justiça

Justiça está repartida em três modalidades fundamentais. Estas modalidades


correspondem a três tipos de relações, conforme a Justiça se refere ao que a sociedade
como um todo, deve aos seus membros, ao que é devido pelos membros da sociedade uns
aos outros e ao que estes devem à sociedade. Sendo assim, temos as seguintes
modalidades:

A Justiça distributiva:repartição de bens comuns que a sociedade deve fazer por todos
os membros, segundo um critério de igualdade proporcional ou geométrica, que atende à
finalidade da distribuição e a situação pessoal de quem recebe.

Justiça comutativa ou correctiva: regula as relações dos membros da sociedade entre si,
visando restabelecer ou corrigir os desequilíbrios que surgem nas relações interpessoais.
Opera segundo um critério de igualdade simples ou aritmética, que se traduz na
equivalência das prestações e abrange, tanto as trocas voluntárias ou lícitas, como as
involuntárias ou ilícitas.

Justiça geral ou legal: foi elaborada posteriormente e preside às relações entre a


sociedade e os seus membros no que concerne aos encargos que são exigidos à sociedade
como contribuição para o bem comum e que devem ser repartidos por todos.

No entanto, meditando sobre estas três modalidades de Justiça, podemos constatar que
todas elas podem conduzir a situações injustas, quando não se pondere devidamente a
natureza e o valor inerente da pessoa humana e não se tenha uma visão adequada das
exigências individuais, dos fins da sociedade ou do bem comum. Porém, cabe ao Estado,
através de políticas apropriadas, corrigir as desigualdades ou desequilíbrios que surgem,
ou pelo menos, evitar que se agravem os já existentes.
13
b) A Segurança

Embora não tenha a projecção da Justiça, pois representa um valor de hierarquia inferior,
não deixa de ser indispensável à vida social, pois está directamente ligada à utilidade, às
necessidades práticas e às urgências da vida. Sendo assim, podemos encontrar diversos
sentidos para a Segurança:

Segurança com o sentido de paz social: aqui o Direito destina-se a garantir a


convivência entre os homens prevenindo e solucionando os conflitos que,
inevitavelmente, surgem na vida social.

Segurança com o sentido de certeza jurídica: a certeza corresponde a uma necessidade


de previsibilidade e estabilidade na vida jurídica, por isso, é necessário que cada um
possa prever as consequências jurídicas dos seus actos e saber aquilo que pode contar
para, com base em expectativas firmes, orientar a sua conduta ou estabelecer os seus
planos de vida. Para haver certeza e estabilidade nas relações jurídicas, as normas tem de
ser dadas a conhecer a todas as pessoas de forma clara.

Segurança no seu sentido mais amplo: pretende-se que o Direito proteja os direitos e
liberdades fundamentais dos cidadãos, assegurando condições materiais de vida dignas, e
os defenda das eventuais arbitrariedades dos poderes públicos ou abusos do poder. Surge
assim uma limitação do poder político em benefício dos direitos e liberdades
reconhecidos aos cidadãos.

3.3 Alguns princípios gerais do direito

O Direito persegue, entre outros, os seguintes princípios:

a) Princípio da não retroactividade da lei

Procura-se evitar que as leis venham a produzir efeitos imprevisíveis e alterar situações
ou direitos adquiridos porque, regra é a de que a lei só dispõe para o futuro. Uma lei não
pode ser aplicada num caso anterior à sua aprovação, se assim não fosse, haveria

14
incerteza e instabilidade nas relações jurídicas, visto que não se tinha a certeza das
consequências dos seus actos. Desta forma evita-se que qualquer pessoa venha a ser
punida por um facto que não era considerado crime até ao momento da sua prática, ou a
sofrer uma sanção mais grave que a prevista no momento em que cometeu o crime.

b) Princípio do caso julgado

Não há possibilidade de recurso ordinário contra decisões transitadas em julgado, isto é,


não pode haver recurso perante os tribunais sobre o caso objecto de decisão judicial, a
não ser em circunstâncias extraordinárias. Este principio tem como finalidade evitar que
se exteriorizem situações litigiosas assegurando assim a estabilidade e paz jurídicas. Se
não fosse este princípio, o processo poderia ser reavaliado sempre que uma das partes
entendesse.

3.4 Fins Do Direito


O Direito tem, entre outros fins, os da Justiça e a Segurança, que são considerados fins
primordiais do Direito. Porém, a compatibilização da Justiça com a Segurança não é fácil, pelo
que há que prever situações de tensão e conflito entre estes dois valores e tentar resolvê-las da
maneira mais adequada. Na verdade, concretizar, na prática, a realização da Justiça e da
Segurança, em simultâneo, apresenta grandes dificuldades, o que leva a que o Direito umas vezes
dê prevalência à Justiça sobre a Segurança e outras vezes o inverso. Em qualquer destes casos, o
sacrifício tem de ser parcial, o que significa que não se pode afastar totalmente qualquer desses
valores, já que a finalidade é a de conjugar ambos. Terá sempre de intervir a prudência a regular
o doseamento destes dois valores, procurando-se uma certa racionalidade na criação do Direito, a
fim de que este cumpra a sua missão de realizar a ordem segundo a Justiça.

O problema da Equidade:ela é considerada a justiça do caso concreto. As normas jurídicas são


gerais e abstractas, sendo-lhes impossível prever todos os casos singulares, extremamente
variáveis. Assim, podem preceituar soluções que não se mostrem as mais adequadas e justas, na
sua aplicação, a determinados casos concretos, consideradas as circunstâncias particulares que os

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acompanham. Seria então, segundo a Equidade, que se resolveriam esses casos, permitindo ao
juiz afastar-se da norma, para que, atendendo às particularidades de cada caso, encontrasse a
solução mais justa.

O recurso à Equidade, porque dá lugar a um largo campo de actuação dos julgados, poderia
implicar riscos de incerteza e insegurança, daí que os legisladores limitem a sua aplicação.

3.5 Origem, Elementos e Função do Estado

A vida em sociedade pressupõe a existência de múltiplos interesses individuais, colidindo uns


com os outros e muitas vezes com tendência a se sobreporem aos interesses colectivos. O Direito
aparece, como um instrumento capaz de regular as relações que se estabelecem entre os
membros da sociedade. Torna-se, pois, necessário o aparecimento de uma instituição que fosse
dotada de meios capazes de fazer cumprir a lei e que, ao mesmo tempo, possibilitasse a
realização do bem-estar social. Essa instituição é o Estado e representa a mais progressiva e
complexa forma de sociedade política. Há, assim, uma estreita interdependência entre o Estado e
o Direito, porque sendo o Estado uma necessidade, também o Direito o é. O Estado, ao ser ao
mesmo tempo autor e intérprete das leis, ao impor a lei e a ordem, é de facto um instrumento
indispensável para assegurar a vida do Homem em sociedade. Dentro do conceito de Estado
podemos definir:

 Estado comunidade: é uma sociedade politicamente organizada dentro de um território.


 Estado aparelho: é um conjunto de órgãos que detêm o poder dentro da comunidade.

3.6 Elementos

Os elementos ou condições de existência do Estado são:

 O povo.
 O território.

 O poder político.

a) Povo

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O povo é a comunidade de cidadãos ou nacionais de cada estado. Abrange os
destinatários permanentes da Ordem Jurídica do Estado. O vínculo jurídico que une os
cidadão ao Estado é a cidadania ou nacionalidade. Os critérios que presidem à atribuição
da cidadania ou nacionalidade, por parte das diferentes ordens jurídicas, podem ser
agrupadas em dois critérios:

 Direito do sangue: é atribuída em função dos laços sanguíneos ou de filiação em


relação a nacionais de determinado Estado.

 Direito do solo: é atribuída em função do local de nascimento.

O direito à nacionalidade constitui um direito fundamental dos cidadãos. Conceitos afins


do conceito de povo são:

Nação: conjunto de pessoas que estão ligadas entre si por traços culturais comuns,
por um passado comum e por uma língua própria.

População: conjunto de pessoas que residem, num dado momento, num determinado
território, que integra tanto nacionais como cidadãos de outras comunidades.

b) Território: o território do Estado compreende:

 O território terrestre: é delimitado pelas fronteiras naturais do Estado e engloba todo


o subsolo que lhe corresponde;
 Território aéreo: abrange todo o espaço aéreo compreendido entre as verticais
traçadas a partir das fronteiras e, no caso do Estado ribeirinho (com mar), inclui ainda
o espaço sobre o mar territorial;
 Território marítimo:abrange actualmente uma extensão de doze milhas, contadas a
partir da linha da baixa-mar ao longo da costa. A zona económica exclusiva de cada
país compreende uma extensão de duzentas milhas onde o Estado apenas exerce
certos poderes limitados, sendo eles: o direito à exploração económica dos recursos
marítimos; o controlo da pesca por barcos estrangeiros; preservação e investigação
científica dos recursos naturais; fazem parte do território do estado: os navios,
aeronaves e veículos sob bandeira nacional, ainda que estejam em território de um

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estado estrangeiro, os consulados e embaixadas de um país situados em países
estrangeiros.

c) Poder político: a característica fundamental do poder político é a autoridade que um


povo, fixado num território, exerce por direito próprio, instituindo órgãos governativos.

O poder político pode assumir várias modalidades:

 Soberano: caracteriza-se por ser um poder político supremo e independente.


Supremo porque não está limitado por nenhum outro na ordem interna de um
determinado Estado. Independente porque, na ordem internacional, não tem de
acatar normas que não sejam, voluntariamente, aceites e está ao mesmo nível dos
poderes supremos dos outros Estados.
 Não soberanos: o poder político está condicionado por um poder diferente e
superior.
Conclui-se, assim que o conceito de Estado pode ter vários sentidos:

Num sentido restrito, o Estado pode definir-se como uma sociedade, politicamente organizada,
fixada em determinado território, que lhe é privativo, e tendo como característica a soberania ou
independência.

Num sentido lato põe-se de lado estas características e fala-se de Estados não soberanos.
Podemos assim considerar osEstados Federados, que possuem Constituição própria, governo
próprio, legislam e têm meios para garantir a execução das suas leis dentro do território que lhes
pertence. Não são Estados soberanos porque as suas leis não podem ser contrárias à Constituição
Federal. A soberania reside apenas no Estado Federal.

3.7 Poderes e funções do estado

Os poderes do Estado são: poder legislativo, de fazer leis; poder executivo, de executar as
resoluções públicas, poder judicial, de julgar os crimes e os diferendos entre os indivíduos.

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3.8 Fins do estado

Os fins ou objectivo a atingir pelo Estado são:

 A Segurança:
a) Segurança individual:

O cidadão necessita de ter a certeza de que, através de normas jurídicas executadas


pelos órgãos do Estado lhe são reconhecidos direitos e deveres.

b) Segurança colectiva:

Pressupõe a defesa da colectividade face ao exterior.

 A Justiça
Substitui as relações de violência individual por um conjunto de regras capazes de
satisfazer o instinto natural de justiça.
 O bem-estar económico e social

Promove as condições de vida dos cidadãos, através do acesso a bens e serviços


considerados fundamentais para a colectividade, bens que permitam a satisfação normal
das necessidades materiais de estratos sociais cada vez mais amplos e de serviços
considerados essenciais.

3.9 Funções do estado

O Estado tem a sua razão de ser na realização permanente dos seus fins essenciais, e para atingir
os fins a que se propõe necessita de desenvolver, através dos seus órgãos, um conjunto de
actividades a que chamamos Funções do Estado. Assim, as Funções do Estado são:

3.9.1 Função Política ou Governativa

Pode-se definir como a actividade exercida pelo Governo e pelos demais órgãos do Estado, tendo
em vista a definição e prossecução dos interesses gerais da comunidade, mediante a livre escolha

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das opções e soluções consideradas melhores em cada momento. A Função Governativa consiste
na prática dos actos em que se concretiza a política geral do país. Esta função é exercida pelo
Presidente da República, pela Assembleia da República e pelo Governo.

3.9.2 Função Legislativa

Actividade pela qual o Estado cria o seu Direito Positivo, estabelecendo o quadro legal pelo qual
se irá pautar a actuação dos órgãos de soberania, dos restantes órgãos públicos e dos cidadãos,
disciplinando as relações que se estabelecem entre eles. Esta função está repartida entre a
Assembleia da República e o Governo.

3.9.3 Função Administrativa


Tem por fim a execução das leis e a satisfação das necessidades colectivas que, em virtude das
opções políticas ou legislativas definidas previamente, se entende que incumbem ao Estado,
nomeadamente ao Governo.

3.9.4 Função Jurisdicional

Consiste no conjunto de actividades que são exercidas por órgãos colocados numa posição de
imparcialidade e independência, que são os Tribunais, e cujo objectivo é dirimir os conflitos de
interesses públicos e privados, bem como a punição da violação da Constituição e das leis.

4. Direito e realidades afins e conexas

4.1 A ordem jurídica e outras ordens sociais normativas

A Ordem Normativa da Sociedade é ainda uma ordem complexa.

A continuação da análise demonstra que entram na sua composição quatro ordens diferentes, que
traduzem aspectos também diferentes do dever, inerentes à vida do homem em sociedade. Por
outras palavras; o Direito não está isolado, começa mesmo historicamente por dificilmente se

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diferenciar das outras ordens sociais normativas, ou seja, desses conjuntos de regras, prescrições
ou mandamentos que com ela, se impõe ao homem em sociedade, e que são os alicerces da
ordem social de que falávamos. Vamos examiná-las sucessivamente.

4.2 A Ordem religiosa

Diz respeito às relações do Homem com Deus, com os deuses, ou mais, geralmente, com o
sagrado, por oposição ao imanente, habitual, quotidiano e profano, exclusivamente material.

A sua máxima fundamental poderá ser “amar a Deus acima de todas as coisas”.

O não cumprimento das normas religiosas, pode acarretar primariamente punições extra-
terrenas.

Em todo o caso, o que é socialmente punido é a manifestação exterior de ligação com o divino.

Exemplo: Promessas de prémios ou castigos extra terrenos.

A Ordem religiosa é assim dominada por um sentimento de transcendência.

4.3 A ordem moral


A moral respeita, quer tenha uma referência religiosa ou laica como seu fundamento, aos deveres
de cada um para consigo mesmo e para com a sociedade, numa perspectiva de dignidade e/ou
solidariedade.

A sua máxima típica seria. Por exemplo: “ ama ao próximo como a ti mesmo”, se de base
religiosa, ou “ age sempre como se a tua conduta pudesse ser apresentada como exemplo
universal”, numa visão mais laica.

A ordem moral caracteriza-se por um conjunto de imperativos impostos aos indivíduos pela sua
própria consciência ética, de tal modo que o seu incumprimento, não é necessariamente
sancionado pelos juízes sociais de reprovação, mas pela reprovação dinâmica da sua própria
consciência.

Exemplo: o não cumprimento de normas morais traz, como consequência, para o indivíduo que
as aceite mas desrespeita, o remorso.
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Os critérios fundamentais de separação entre o Direito e a Moral, normalmente apresentados são
dois:

 Critérios de Coercibilidade – as normas jurídicas são físicas e, organicamente,


susceptíveis de aplicação coerciva, enquanto as morais não. Nenhuma coacção exterior
pode fazer com que os homens sejam intrinsecamente melhores.

 Critérios de Exterioridade – o direito parte do lado externo da existência humana,


enquanto a moral parte do lado interno.

4.4 Ordem do trato social, etiqueta ou cortesia


Trata-se de normas de polidez, boa educação, civismo e, por vezes de um cerimonial, mais ou
menos complexo consoante o refinamento da sociedade e do círculo social em causa; e que
contribuem para atenuar as tensões, facilitar as relações, e tipificar os comportamentos,
adequando-os à situação.

A sua máxima poderia ser a do Gentleman inglês: dá sempre para o bolo social um bocadinho
mais do que retirares dele. Assim, também, com a simpatia, nas suas diversas formas, como se
sabe, as normas de trato social variam muito de círculo social para círculo social.

Exemplo: Não usar gravata tanto é, em certos lugares, uma terrível falta de maneiras, como usá-
la, noutros sítios, uma imperdoável falta de gosto e uma intolerável “caretice”, como diriam os
brasileiros.

A violação de tais normas implica uma sanção inorgânica consistindo essencialmente em


sentimentos de reprovação social por parte da comunidade, levando muitas vezes à própria
segregação social do infractor.

Exemplo: O duelo.

22
5. A ordem jurídica e ordenamento jurídico

Esta ordena os aspectos mais importantes da convivência social e exprime-se através de regras
jurídicas. Os valores que visam atingir são a justiça, a segurança e a paz social. Ordem Jurídica
e Ordenamento Jurídico:

Ao Direito compete uma função essencial de ordenação das relações sociais segundo a justiça.

A Ordem Jurídica: é o resultado da ordenação das relações sociais segundo a justiça,


constituindo uma parte, ainda que muito significativa, da Ordem Social Global e reflecte as
crenças, valores e ideologias dominantes na sociedade. A Ordem Jurídica procura defender-se
dos actos ilícitos, recorrendo aos meios de protecção ou tutela jurídica, tanto preventivos como
repressivos, no qual se incluem as sanções jurídicas.

O Ordenamento Jurídico: é o conjunto de normas que rege uma dada comunidade, de um


determinado momento histórico. Deste ordenamento fazem parte também os princípios gerais ou
fundamentais do Direito.

5.1 O direito e a ordem jurídica

A distinção entre Direito e Ordem Jurídica é feita da seguinte forma: o Direito, visto como um
conjuntode normas jurídicas criadas pelo Estado para regulamentar a conduta humana. O Direito
engloba as Normas jurídicas e as situações jurídicas.

A Ordem Jurídica é um conceito mais amplo que o conceito de Direito porque engloba o próprio
Direito e ainda tudo aquilo que cria e aplica o Direito. A Ordem Jurídica engloba as situações
jurídicas, órgãos, fontes do Direito, instituições

5.1.1. As relações entre as diversas ordens normativas

Entre as ordens normativas que acabamos de estudar e o Direito, podem surgir relações de
coincidência, de indiferença e de conflito.

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Há numerosas relações de coincidência entre todas estas ordens, pois não podemos esquecer que
durante largo tempo, existiu entre elas, total identificação e só com progresso civilizacional se foi
tomando consciência do âmbito próprio de cada uma destas ordens.

Por exemplo, as regras, entre “não matar” ou “não furtar” são normas jurídicas, de moral e de
grande parte das religiões.

Analisemos agora, separadamente, as relações que podem surgir entre cada uma das ordens
normativas e o direito.

5.1.1.1 Moral / Direito


Entre esta ordem e o Direito, há largas zonas de concidência, pois deficilmente, se poderia
conceber uma ordem jurídica totalmente contrária aos conceitos morais vigentes numa dada
sociedade.

Assim se verifica pelo menos, o respeito daquelas regras morais que são vitais e cuja observância
é indispensável à convivência entre os membros duma determinada comunidade como, por
exemplo, as regras “não matar” ou “não furtar”.

Relações de indiferença – podemos constatar que muitos dos preconceitos jurídicos são
irrelevantes para a moral, como por exemplo, os meramente organizativos ou técnicos, entre os
quais podemos apontar as regras de trânsito e as que regulam a produção industrial ou as
sociedades comerciais,

Relação de conflito – pode acontecer, algumas vezes, que certas regras de Direito se encontrem
em oposição à regra de moral. Exemplo: (não matar), em alguns países leva a pena de morte.

5.1.1.2 Religião / Direito

Predominam, essencialmente, relações de indiferença, limitando-se o Direito a garantir com as


suas normas, o livre exercício da actividade religiosa, sem assumir ele próprio, o conteúdo das
normas religiosas.

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A Constituição da República de Moçambique, faz referência, no artº 12 -(a laicidade do Estado e
a liberdade religiosa) e de culto.

Relações de coincidência – as disposições , em matéria matrimonial,inseridas na Lei da Família


em vigor (Lei nº.10/2004, de 25 de Agosto, art. 16 e seg..). são válidas eeficazes quando
observado o preconizado na Lei.

Relações de conflito –a despenalização do aborto, em determinadas circunstâncias, opõe a regra


jurídica aos preceitos religiosos.

5.1.1.3 Trato Social/Direito


A maior parte dos usos sociais são completamente indiferentes ao Direito como por exemplo, os
relativos à moda ou cortesia, o que leva ao estabelecimento de reacções de indiferença entre a
ordem jurídica e a do “trato social”.

Por vezes, o Direito torna ilícito certos usos sociais considerados prejudicais ou inconvenientes
para a sociedade, o que será uma relação de conflito entre as duas ordens, É o caso do duelo ou
desafio já anteriormente referido, que subsistiu durante anos, apesar da legislação que o proibia ,
porque a sua não-aceitação, implicava penosa desclassificação social.

Pelo contrário, também sucede, o Direito elevar àcategoria de normas jurídicas usos que se
desenvolveram, na prática.

O artº 3 nº 1 do Código Civil considera, juridicamente atendíveis, os usos sempre que a Lei o
determina.

Enfim, por tudo o que dissemos podemos concluir que entre o Direito e as restantes ordens
normativas que fazem parte da ordem social, ocorre historicamente, uma constante assimilação e
desassimilação de conteúdos.

Já vimos que uma norma pode pertencer a diversas ordens como “não matar’ ou “não furtar’ ou
pode deixar de ser jurídica e continuar como moral ou religiosa como a despenalização do aborto
ou das drogas leves em alguns países ou pelo contrário adquirir carácter jurídico quando antes
era um simples uso social.

25
5.1.1.4 As Instituições e o Direito

As Instituições desempenham funções importantes, nomeadamente contribuindo para a


divulgação de valores da sociedade, fazendo mesmo com que estes sejam interiorizados pelos
seus membros, controlando a conduta humana e estabelecendo padrões de conduta previamente
definidos. O conceito de instituição é entendido em vários sentidos, entre os quais:

Na linguagem corrente: designa ao mesmo tempo a acção e o efeito de instituir, sendo que
instituir significa introduzir, fundar, ordenar, constituir, e estabelecer qualquer coisa de estável e
durável.

Na linguagem jurídica: designa um conjunto de normas que regulamentam um determinado tipo


de relações sociais ou designa a base social que está na base de tais relações.

Tendo em conta as várias áreas da vida social institucionalizadas, podemos agrupar as


instituições em:

Instituição familiar: é aquela que tem por objectivo a regulamentação de relações de procriação e
de sangue entre os indivíduos, bem como a socialização inicial dos novos membros de cada
geração. A sua forma mais difundida é a monogâmica (que tem uma só esposa).

Instituição educativa: é fundamentalmente, o processo de socialização formal dos jovens,


procurando, através de um dispositivo complexo de educação, integrá-los como membros
responsáveis da sociedade.

Instituição económica: regula a produção, distribuição e consumo de bens e serviços na


sociedade.

Instituição política: tem por objectivo, a satisfação de necessidade de administração geral e de


ordem pública das sociedades.

Instituição religiosa: visa satisfazer a necessidade social fundamental do Homem, enquanto ser
relacionado com Deus ou com os Deuses, e expressa-se nas crenças e formas de culto.

Instituição cultural: procura a promoção de condições que facilitem a criação de manifestações


culturais, artísticas, científicas e desportivas.

26
6. A Norma Jurídica

Em regra, o comportamento dos cidadãos é conforme ao Direito; no seu dia a dia eles observam
espontaneamente uma grande variedade de normas de conduta jurídica e outras da realidade
social.

Porém, quando há comportamento que se desviam dos imperativos da ordem jurídica, ou por
outras palavras, quando acontecem violações das suas normas derivadas de actos contrários ao
Direito (actos ilícitos), a ordem jurídica procura defender-se recorrendo aos meios de protecção
ou tutela jurídica tanto preventivas como repressivas.

Repare-se, que em todo este sistema de defesa da ordem jurídica sobressai a <“coercibilidade”

6.1 Conceito de Norma Jurídica

É uma regra de conduta social, geral e abstracta, imposta coactivamente pelo Estado. Quer dizer
que a norma jurídica participa de uma característica de generalidade e abstracção, isso é, a norma
jurídica dirige-se a um número indefinido de pessoas, não individualizadas e, por outro lado,
abarca, na sua “hipótese”, um número não concreto mas abstracto de casos e situações.

6.2 Caracteristicas
Como já sabemos, a Ordem Jurídica exprime-se através de normas que desempenham um papel
essencial como instrumento ordenador ao serviço do Direito.

Essas normas, como se compreende, possuem determinadas características, necessárias à


ordenação da vida social.

Elas constituem o Direito objectivo, isto é, o Direitonosentido normativo: Imperatividade,


Generalidade/Abstracção e Coercibilidade.

27
6.2.1 Imperatividade

Na sua forma fundamental ou protótipa, a norma jurídica contém um comando, porque impõe ou
ordena certo comportamento. No entanto, para muitos autores, certas normas não ordenam nem
proíbem umas condutas, designadamente as normas permissivas. Deste modo, nem toda a regra
jurídica se cifraria num imperativo.

Porém, outros autores entendem que esse imperativo existe sempre mais ou menos expresso ou
encoberto na norma.

6.2.2 Generalidade e Abstraçäo

Significa que a norma se refere a toda uma categoria, mais ou menos ampla de pessoas e não a
destinatários, singularmente determinados.

Uma norma pode ter como destinatário uma determinada pessoa e ser geral. Assim acontece, por
exemplo, com as regras constitucionais que definem as competências e os deveres do Presidente
da Republica e que se destinam a uma categoria de pessoa e não a uma pessoa em concreto.

A generalidade é assim, a abstracção especial dos destinatários.

A abstracção, significa que a norma respeita a um número indeterminado de casos ou uma


categoria, mais ou menos ampla, de situações concretas ou individualizadas.

Exemplo, uma lei ordena aos proprietários de certa região, o abate de determinadas espécies
de animais.

A primeira parte corresponde à generalidade e a segunda à abstracção.

6.2.3 Coercibilidade
Consiste na susceptibilidade de aplicação coactiva de sanções, se a norma forviolada.

A coercibilidade não é característica essencial da norma

Exemplos: Art.484 do Código Civil.

28
Esta regra é:

 Genérica, porque visa uma pluralidade indefinida de pessoas -< Quem ...>.

 Abstracta porque contempla um certo tipo de situações - <afirmar ou difundir um


facto...>.
 Susceptível de imposição coactiva de sanções – porque o lesado pode recorrer aos
tribunais para obter a reparação do dano causado.

6.3 Estrutura
Toda a norma jurídica apresenta, no mínimo, 2 elementos.

Previsão/ Hipótese – tipo legal, a situação hipotética prevista na norma jurídica como sendo a
que é idóneo a que é capaz com que o agente, o sujeito que nela se encontra se possa sujeitar ao
que se encontra previsto na tese, na mesma norma.

Tese/Estatuição – as consequências, os efeitos que vão sujeitar a pessoa que se encontra na


situação prevista na norma em questão.

Há autores que defendem a existência de um terceiro elemento, a sanção. Essa vai ser a nossa
orientação, pelo que:

Sanção – será o prémio positivo ou negativo a que a pessoa se vai sujeitar, beneficiar uma vez
que se encontre na situação prevista pela norma.

Há outros autores que a consideram parte integrante da tese ou da estatuição.

Exemplo: arto. 130, 483, doCódigo Civil; arto. 349,294,353 do Código Penal.

6.4 Classificação

As normas podem ser classifricadas quanto à imperatividade ou à Sancionalidade.

6.4.1 Classificação das normas quanto à imperatividade

a) Normas Perceptivas, Probitivas e Permissivas

 Perceptivas – contém uma ordem, uma obrigação.

29
o Conduzir à esquerda

o Pagar Impostos

o Pagar Direitos Aduaneiros

 Proibitivas – contém uma proibição

o Ex. Pune os que pratiquem furto, homicídio, ofensas corporais.

 Permissivas – autorizam certos comportamentos, de forma positiva:

 Dispositivas – art.802 do Código Civil –·concedem ao credor, em certos termos a


faculdade de resolver o negócio.

 Autorização – art. 1055 do C.Civil – permite ao locatário denunciar o contrato de


arrendamento para o termo do prazo.

 Concessivas – art. 1698 do C.C– que permite as partes fixar, livremente, em


convenção antenupcial, o regime de bens de casamento.

O Direito contém: Ordens – Tu deves

Proibição – Tu não deves

Concessões – Tu podes

b) Normais universais, regionais, locais

Validade territorial

 Universais – que se aplicam em todo o território do Estado;


 Regionais – que se aplicam numa determinada região (Decretos das regiões
antónomas);
 Locais – que se aplicam no território de uma autarquia local posturas e regulamentos
dos Conselhos Municipais).

c) Normas gerais versus normas excepcionais

Normas Gerais: estabelecem o regime regra para o sector das relações que as regulam.

(art.219 do C.C – regime da liberdade da forma.

30
Normas excepcionais: representam um IUS SINGULARE, limitando-se a uma parte
restrita daquele sector de relações ou factos, consagrando neste sector restrito por razões
privativas de um regime oposto aquele regime regra. (Ex. Artigo 11 do C.Civil).

d) Normas de direito comum e normas de direito privado especial.

Ex. Direito Civil – é Direito comum.

Direito do trabalho/Direito Agrário – são direitos privado especiais.

e) Normas supletivas e normas interpretativas

Normas Supletiva: é uma norma de outro tipo (imperatividade ou permitivas) mas que
a cresce de uma nota essencial particular: aplica-se aos negócios juridicos só se as partes
não tiverem excluido a sua aplicação. Ex. art. 878 do C.Civil.

Normas Interpretativa: é aquela que esclarece o sentido do outro trecho com valor
jurídico; Ex. art. 1º do C.Civil.

f) Normas directas e indirectas

Normas Directas – são normas que têm vários destinatários da vida social.

Normas indirectas – por vezes chamadas instrumentais, aquelas cujo destinatário


pretendem aplicar normas juridicas e resolver problemas de Direito.Ex. art. 9º, nº 3 do
Código Civil

g) Normas completas e incompletas

Normas completas – as que podem produzir efeitos só por si e contêm uma relação jurídica,
imperativa ou permitiva. Art. 1323 do C.Civil.

Normas incompletas – definem pela negativa – não produzem efeitos só por si tem que
ligar-se a outras normas. Art.874 do C.Civil.

h) Normas éticas e normas técnicas

A norma ética: é a norma “stritu sensu”: em face de situação X, deves e requer conduta
y. E deve-se porque a ordem jurídica estabelece um comandado que é para o destinatário

31
da norma um dever; o acto contrário é lícitico e acarreta consigo regra geral/ uma
(verdadeira e propria) sanção.

Normas técnicas:actuam de forma diferente:cada uma previsão estabeleceumaconduta


como necessário apenas para determinado fim, que é indiferente para o direito serou não
prosseguido.Ex: artigo875 do C.Civil – compra e venda de bens imóveis só éválido se for
por escritura pública.

i) Normas de estatuição material e normas de estatuição jurídica

Normas de Estatuição Material – são normas que projectam o seu comando sobre a
vida social: a sua estatuição reputa-se a actos dessa vida (não matar, entregar objectos,
art.1323 do C.Civil).

Normas de estatuição jurídica – são normas em sentido lato, cujo conteúdo se esgota no
plano juiridico, reflexamente, claro, vão traduzir em ultimo análise em normas de
estatuição (ou conteúdo) material, mas, tal como se nos apresentam, têm outro sentido.
Art.130 do Código Civil.

j) Normas ordenadoras e normas sancionatórias

Normas ordenadoras: tem previsão, estatuição de uma sanção que vem repostada em
outras normas juridicas.Tem geralmente, como destinatário ao autoridade do Estado. Mas
há uma, excepção – art. 983, do Código Civil, da responsabilidade civil dos particulares,
não depende de nenhum do Estado. Responsabilidade em factos ilícitos.

l) Normas Autônomas e Não Autônomas

Norma não autônoma: é aquela que por si não tem um sentido completo ( falta-lhe toda
ou parte do hipotese toda a parte da estatuição), só o obtendo por remissão para as outras
normas, tais são as normas remissivas, norma de devolução ou normas indirectas.

6.4.2 Normas Quanto à Sancionalidade

As normas quando à sua sancionlidade podem ser:

a) Norma Perfeita– é aquela cuja sanção é a nulidade do acto, mas sem sanção;

32
b) Norma menos perfeita- é aquela cuja sanção é outra que não a nulidade.Exemplo: A
venda ao produto depois da hora regulamenta do encerramento não acarrecta a nulidade
da venda, mas implica uma pena (multa) para o comerciante.

c) Normas mais que perfeita– é aquela que comporta sanções a nulidade e outra ainda
(pena).

Exemplo: o contrato pelo qual os pais negoceiam com outrem os “favore” de uma filha: o
negócio é nulo (art.280 nº 2, do Cod.Civil), e demais disso, é passivel de uma sanção
penal (art. 405, do Código penal lemocidio). Veja-se ainda o art. 284 do C,Civil ( em
suma criminosa).

d) Norma imperfeita e que não tem sanção não importa qualquer espécie de sanção.Tais
normas tem por destinatários certos orgãos superiores do Estado, quando a sua violação
não é susceptivel de sanção jurídica.

Ex. O Presidente da República não responde por acto praticados durante o mandato.

Chegamos ao fim da I Unidade, e por forma a consolidá-la, realize as tarefas que se seguem.

Tarefas

Discuta as seguintes questões

1. Será o Direito a forma exclusiva da ordenação da vida na sociedade?

2. Indique as fronteiras entre o Direito e a Moral.

3. Relevância actual do Direito Natural em confronto com o Direito Natural

4. Refira-se à utilidade Social do Direito enquanto sistema de regras sociais.

33
Auto-avaliação

1. Porque razão o Direito é considerado um fenóneno social e humano;

2. O Homem vive ligado a dois mundos, o natural e o social. Explique se ele é um ser natural
ou um ser social e justifique a sua resposta

3. Discorra à volta da plurivalência do termo “direito” e faça o confronto dos dois sentidos
mais importantes.

4. Diga, fundamentando, se o critério do mínimo ético é um critério fiável para distinguir


OrdemJurídica da Ordem Moral

5. Sobre a norma jurídica:

a) Define-a;

b) Proceda a distinção entre normas perceptivas e proibitivas;

c) Será que a coercibilidade é uma característica essencial de todas as normas jurídicas?

Chave-de-correcção

1. O Direito é um fenómeno social – porque não diz respeito ao homem que vive isolado, mas
ao que vive em sociedade. Entre asociedadee o Direito existe uma extrema ligação, a tal
ponto que se afirma que “Ubi Ius,Ubi Societas”.Onde há Dto há sociedade, onde há
Sociedade há Direito.

O Direito é um fenómeno humano porque diz respeito ao próprio homem. Plantas animais
podem ser objecto do direito; o homem pode estabelecer regras sobre sua protecção e
utilização, mas não pode impôr condutas, porque eles não têm a dimensão espiritual, que só o
homem possui;

2. O homem é um ser eminentemente social, talhado para a vida e convivência na sociedade, na


qual inter-acção com os demais suscita o surgimento de relações sociais, que constituem o
mote para a existência das normas jurídicas.

3. Dos vários sentidos do termo Direito, podemos destacar 08, a saber:

34
1º Sentido Comum, é tomado em termos genéricos, sem se atender ao seu alcance. Qualquer
leigo em Direito, ao menos conhece alguns dos seus direitos, o que lhe é devido e o que deve
aos outros, menciona os juízes, advogados; pensa em tribunais, prisões, mas sem ter a
consciência da realidade abstracta e transcendente que é o Direito.

2º Sentido Fiscal, será o conjunto de normas que regulamentarão a incidência, recolha,


tributação e pagamento de imposto. O Estado, para fazer face às suas inúmeras despesas, no
interesse da colectividade, carece de obter receitas para tal.

3º Sentido Real, teremos os Direitos Reais como direitos absolutos e inerentes a uma coisa e,
funcionalmente, dirigidos à afectação desta aos interesses do sujeito; ou por outras palavras,
é o poder de exigir de todos os outros indivíduos uma atitude de respeito pelo exercício de
determinados poderes sobre uma coisa. De entre os direitos reais existentes, os principais
são: A Propriedade, o Usufruto e a Servidão.

4º Sentido Epistemológico ou Científico que será o estudo das melhores formas de


conseguir, tecnicamente, a atribuição a cada um o que é seu.

5º Sentido Objectivo, como conjunto ou sistema de normas, gerais, abstractas e hipotéticas,


emanadas pelo Estado e dotadas de protecção coactiva. Por outras palavras, é o corpo ou
complexo de regras gerais e abstractas que organizam a vida em Sociedade sob os mais
diversos aspectos e que designadamente definem o estatuto das pessoas e regulam as relações
entre elas.

6º Sentido Subjectivo, é o poder ou faculdade atribuído ao titular de um Direito Objectivo, de


agir ou não de acordo com o conteúdo daquele, ou de exercer ou não um direito,
juridicamente relevante, por outras palavras, é o poder jurídico atribuído pela ordem jurídica
a uma pessoa, de livremente exigir ou pretender de outrem um comportamento positivo
(acção) ou negativo (omissão) ou por um acto de vontade, só de por si ou integrado por um
acto de uma autoridade pública, produzir determinados efeitos jurídicos, que
incontestavelmente, se impõem a outra pessoa - contraparte ou adversário. Só se nos depara
um Direito Subjectivo quando o exercício do poder jurídico respectivo está dependente da
vontade do seu titular.

35
7º Direito Natural, são certas normas de conduta que por serem inerentes à própria natureza
do homem, são anteriores e superiores ao Estado. É uma designação próxima da de «Direitos
do Homem», e com significado afim.

8º Direito Positivo, é constituído pelas leis, com existência efectiva e que se formam na
sociedade com o objectivo de regular a convivência entre os indivíduos. Ele provém da
vontade, mais ou menos arbitrária dos homens, que, normalmente, procuram criá-lo tão
perfeito quanto possível, mas que, pela fraqueza e contingências das suas forças fazem quase
obra precária. É o direito que a sociedade cria, com uma expressão exterior, sensível e
tangível.

Destes sentidos que acabamos de enumerar, os considerados mais relevantes, são o Direito
em sentido objectivo e em sentido subjectivo.

4. O Critério do mínimo ético defende que, todas as normas jurídicas têm uma dose, ainda que
ínfima de moral, contudo o mesmo não constitui a verdade, pelo que para distinguir o Direito
da Moral, recorre-se a dois critérios:

 Critérios de Coercibilidade – as normas jurídicas são físicas e organicamente susceptíveis


de aplicação coerciva, enquanto as morais não. Nenhuma coacção exterior pode fazer
com que os homens sejam intrinsecamente melhores.

 Critérios de Exterioridade – o direito parte do lado externo da existência humana,


enquanto a moral parte do lado interno

5. a) A norma jurídica é uma regra de conduta social, criada e imposta, coactivamente,


pelo Estado, tendo em vista a regulamentação social.

b) As normas perceptivas são as que ordenam um comando, e as normas proibitivas as


que não permitem a prática de certo comportamento;

c) A coercibilidade não é característica essencial de todas as normas jurídicas, na medida


em que existem normas jurídicas desprovidas de sanção. Ex: as normas permissivas;

36
Resumo

O Direito, como um conjunto de normas jurídicas, gerais e abstractas, criadas e impostas


coactivamente pelo Estado, nasceu da necessidade de regulamentar a vida na sociedade, criando-
se deste modo uma relação indissociavel entre Direito, homem e a sociedade, dai a razão da
expressão “UBI IUS UBI SOCIETAS“.

A par do Direito, existem outras ordens normativas que auxiliam o Direito na regulamentação da
vida na sociedade, como a Religão, a Moral e a do Trato Social.

No que tange `a Ordem jurídica, o Estado no âmbito das suas funções legislativa e jurisdicional,
emana normas jurídicas (Direito Positivo), com elementos, estrutura, a sua classificação e meios
de protecção que visam alcançar um dos fins priomordias do Direito, que é de garantir a certeza e
segurança das relações jurídicas.

Bibliografia

Ascensão, J. O. (1997). O Direito – Introdução e Teoria Geral. Almedina

Bigote Ch, M. (1997). Temas Fundamentais de Direito, Almedina

Caetano, M. (1997). Manual de Direito Administrativo. Almedina

João, B. (1997). Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Almedina

Latorre, A. (1978). Introdução ao Direito. Coimbra

Marques, J. D. (1986). introdução ao Estudo do Direito. Editora Danúbio, Lda, Lisboa

Mendes, J. C. M. (1994). Introdução ao Direito. Editora Pedro Ferreira, Lisboa

Pereira, N. (1992). Introdução ao Direito e as Obrigações. Almedina

Telles, I. G. (1991). Introdução ao Estudo do Direito. Biblioteca Universitária, Publicação


Europa-América

37
Unidade Didáctica nº 2:Fontes do Direito, Interpretação e aplicação da Lei

Introdução

Caro estudante, o Direito como toda e qualquer ciência tem as suas fontes, pelo que importa
entender de que forma e de que lugares brotam as normas e princípios que configuram o Direito.

Por outro lado, apesar de existirem vozes que defendem o dito jurídico, “A Lei é clara e não
necessita de interpretação”, vezes sem conta no momento de aplicação de uma lei encontramos
interpretações diversas de um texto legal, o que obriga a que lance mão de uma ferramenta
jurídica importante que é a técnica de interpretação das leis, que adiante iremos estudar.

A lei, enquanto fonte de direito é aplicada em dois contextos, o temporal e o espacial, pelo que
importa analisar e entender os mecanismos e regras que o legislador estabelece para aplicar os
dispositivos legais no tempo e no espaço, aqui particular destaque vai para a problemática da
aplicação ou não aplicação das leis.

Objectivos da Unidade
Ao completar esta unidade, você deve ser capaz de:

 Identificar o conceito de Fonte do Direito;


 Enumerar as fontes de Direito;
 Saber estabelecer a hierarquia das leis;
 Identificar a noção e valor da Lei, Costume e Jurisprudência;
 Delimitar os conceitos de interpretação, integração e lacuna;
 Identificar as espécies de interpretação da lei segundo os critérios de fonte, do valor da
fonte e do valor, da finalidade e do resultado;
38
 Conhecer o processo de integração de lacunas; e
 Aplicar a Lei no tempo e no espaço.

Desenvolvimento do conteúdo

1. Fontes de direito

1.1 Evolução do direito e das fontes de direito

1.1.1 Conceito de fonte

A ordem jurídica é uma realidade histórica cujo conteúdo são as normas jurídicas. Importa agora
saber como e onde nascem essas normas e como se revelam aos particulares.

Este é o problema das fontes de Direito.

A expressão Fontes de Direito não tem sido utilizada pelos diversos autores, no mesmo sentido.

Podemos, no entanto, distinguir 4 dos mais importantes sentidos:

a) Sentido Sociológico – Material: pode designar-se por fonte de Direito o


circunstancialismo social que esteve na origem de determinada norma.

b)Sentido Histórico – Instrumental: nesta perspectiva, fontes de Direito, são os diplomas


ou instrumentos legislativos que contêm normas jurídicas.

c) Sentido Político – Orgânico: neste sentido identificam-se as fontes de Direito com os


órgãos políticos que, em cada sociedade, estão incumbidos de emanar normas jurídicas.
No caso de Moçambique, a Assembleia da República, Presidente da República, Conselho
de Ministros.

d) Sentido Técnico – Jurídico: é este o sentido que, fundamentalmente, interessa ao nosso


estudo e traduz-se nos modos de formação e revelação das normas jurídicas.Investiga-
se, então, a maneira como é criada e se manifesta, socialmente, a norma jurídica

39
Neste sentido são consideradas fontes de Direito:

 A lei;

 O costume;

 A jurisprudência; e

 A doutrina.

Caro estudante é importante ainda distinguir fontes imediatas das fontes mediatas.

As fontes imediatas são que têm força vinculativa própria, sendo, portanto, os verdadeiros
modos de produção do Direito. Ex: A Lei.

As fontes mediatas, não tendo força vinculativa própria, são contudo importantes pelo modo
como influenciam o processo de formação e revelação da norma jurídicas. Ex: O costume,
jurisprudência e doutrina.

Segundo alguns autores só a Lei é considerada verdadeira fonte de Direito, isto é, fonte imediata
de Direito, todas as outras são fontes mediatas.

Constituem fontes imediatas do direito as leis e as normas corporativas, art. 1, nº1 do C. C.

Lei, costume, jurisprudência e doutrina.

a) A lei

Como já dissemos a lei é o processo de formação ou criação do Direito que se traduz


numa declaração solene e directa da norma jurídica, efectuada por uma autoridade
competente. A lei é, assim,uma norma jurídica de criação deliberada

b) O costume

O costume constitui um outro processo de formação do Direito, essencialmente distinto


da lei. Com efeito, no costume, a norma forma-se, espontaneamente, no meio social. É a
própria comunidade que desempenha aquele papel activo que, nas outras fontes de
Direito, pertence a certas autoridades.

A base de todo o costume é uma repetição de práticas sociais reiteradasque podemos


designar por uso.

40
Mas não basta o uso, para que o costume exista, é necessário ainda que essas práticas
sejam acompanhadas da consciência da sua obrigatoriedade, pois só quando as pessoas se
convencerem de que aquela prática não representa algo de arbitrário, mas é antes
vinculativa e essencial à vida da comunidade, é que se pode dizer-se que há um
verdadeiro costume, e que a prática levou à criação duma norma jurídica.

Uma vez verificados estes dois elementos:

 “Corpus” - prática constante

 “Animus” – convicção de obrigatoriedade.

Nada mais é preciso para que se verifique o costume.

O Direito Consuetudinário é, como se vê, um direito não deliberadamente produzido,


sendo considerado, por alguns autores como fonte privilegiada do Direito.

Outros autores, entendem que o Costume só constituirá verdadeira fonte de Direito,


quando o Estado reconhecer que as normas jurídicas podem nascer, directamente, da
vontade popular.

O Costume representou, historicamente, a mais importante fonte de Direito. Porém, a


partir do séc. XVII, os pensadores começaram a desacreditar em tudo o que representasse
espontânea organização da sociedade e, deste modo, o costume passou a ser olhado com
suspeita, restringindo-se o seu âmbito de actuação.

O nosso Código Civil, não apresenta o costume como fonte imediata do Direito e apenas
admite que os “usos” tenham relevância jurídica, quando a lei para eles remeta, ou seja,
como fontes mediatas de Direito.

O art. 3 do Código Civil fala-nos do valor jurídico dos usos, e no nº 1 estabelece que:“Os
usos que não forem contrários aos princípios da boa fé, são juridicamente relevantes,
quando a lei o determine”.

No Direito Internacional Público, o costume (internacional) continua a ser uma


importante fonte de Direito.

Discutem, ainda os autores, as vantagens e desvantagens recíprocas da lei e do costume.


É óbvio que nenhuma das formas é perfeita.

41
A lei oferece a vantagem da segurança e da certeza, enquanto o costume é de prova
difícil, mas por isso mesmo, a lei tem muita maior dificuldade em acompanhar a evolução
social, enquanto o costume, se vai, espontaneamente, adaptando.

c) Jurisprudência

A palavra jurisprudência é susceptível de mais de um significado. Usa-se frequentemente


para designar a orientação geral, seguida pelos tribunais no julgamento dos diversos
casos concretos da vida social. Outras vezes, é entendida como a justiça dos casos
concretos da vida social. Outras vezes, é entendida como o conjunto de decisões dos
tribunais sobre os litígios que lhe são submetidos.

Uma questão que se coloca é a de saber, se esses modos de decidir têm validade, além do
processo em causa, criando regras para casos futuros.

É o que acontece nos sistemas jurídicos Inglês e Americano, em que a jurisprudência é


fonte de Direitos.

Em princípio, não é assim que se passa entre nós. O juíz tem de julgar, unicamente de
“harmonia com a lei e a sua consciência “ (art. 8 do CC.), sendo perfeitamente irrelevante
que a sua decisão contrarie a que tenha sido tomada por outro tribunal.

Nas situações normais, a jurisprudência não é fonte de direito, no entanto, na medida em


que ao longo dos tempos vai explicitando uma determinada “consciência jurídica geral”
contribuirá para a formação de verdadeiras normas jurídicas.

A este princípio, há que indicar uma importante excepção. Em certos casos, a


jurisprodência dos tribunais superiores (Tribunal Supremo -TS) deve ser considerada
autêntica fonte de Direito refire-se aos ASSENTOS - (art. 2 do CC. Nos casos
declarados na lei, podem os tribunais fixar, por meio de assentos, doutrina com força
obrigatória geral).

Acórdão é a decisão proferida por um tribunal unido em colectivo.

Sentença é a decisão proferida por um tribunal na solução de um julgamento.Sentenças e


acordãos, constituem, juntamente com os assentos, as três categorias de decisões dos
tribunais.

42
d) A doutrina

A doutrina compreende as opiniões ou pareceres dos jurisconsultores, sobre


regulamentação adequada das diversas relações sociais. Consiste, ainda, nos artigos,
monografias, escritos científicos, etc., que se debruçam sobre os problemas jurídicos
referentes à sua aplicação.

A doutrina, entre nós não é considerada fonte de Direito. Quando muito podemos
chamar-lhe fonte mediata, para acentuar a sua relevância prática e a maneira como
contribui quer para a formação quer para a relevância do Direito.

2. A lei

2.1 Conceitos e espécies

A lei ocupa, hoje em dia, um lugar privilegiado na “Teoria das Fontes de Direito”, de tal maneira
que alguns a consideram até a única fonte admissível.

A lei é o processo mais vulgarizado de criação do Direito, nos sistemas Continentais Europeus e,
é assim acolhida pelo nosso legislador. Com efeito, o artigo 1 do CC., prescreve: 1. São fontes
imediatas do direito as leis e as normas corporativas e no nº 2 preceitua que, consideram-se leis
todas as disposições genéricas provindas dos órgãos estaduaiscompetentes, [...]

Como decorre do nº 2 do citado artigo, são Leis, todas as disposições genéricas provindas de
órgãos estaduais competentes.

2.2 Pressupostos

 Uma autoridade competente,

 Observância das formas previstas para essa actividade,

 Conter uma verdadeira regra jurídica.

No entanto, o conceito de lei, só se tornará verdadeiramente compreensível se tivermos em conta


a distinção entre:
43
 Lei em sentido formal e em sentido material
 Lei em sentido amplo e em sentido restrito.

Definições Importantes

Lei em Sentido Formal, é todo o acto normativo emanado de um órgão com competência
legislativa quer contenha ou não uma verdadeira regra jurídica.

Lei em Sentido Material, é todo o acto normativo emanado de um órgão do Estado, mesmo que
não incumbido de função legislativa desde que contenha uma verdadeira regra jurídica-
cumprimento obrigatório.

Exemplos:

 Leis em sentido meramente formal – as que conferem ao governo autorização


legislativa.
 Leis em sentido meramente material – um despacho que aprove o regulamento de
exames.
 Lei em sentido amplo é toda e qualquer norma jurídica.
 Leis em sentido formal e material – a Constituição, leis de revisão constitucional e as
leis ordinárias da Assembleia da República.

2.3 Hierarquia da lei

Há várias categorias de leis, pelo que surgem difíceis problemas quando se trata de aferir o seu
valor relativo. É, pois, necessário, estabelecer entre elas uma determinada ordenação ou
hierarquia.

Da hierarquia das leis resulta que as leis de hierarquia inferior não podem contrariar as leis de
hierarquia superior, antes têm de se conformar com elas, as leis de hierarquia igual ou superior

44
podem contrariar leis de hierarquia igual ou inferior e então, diz-se que a lei mais recente revoga
a lei mais antiga.

A hierarquia das leis depende da hierarquia das fontes em que estão contidas e têm que ser
analisadas em paralelo com a hierarquia dos correspondentes aspectos do poder legislativo.

Para estabelecer esta hierarquia há que distinguir:

 Leis Constitucionais, e
 Leis Ordinárias.

2.3.1 Leis constitucionais


O poder de estabelecer normas constitucionais denomina-se Poder Constituinte e ocupa o lugar
cimeiro do poder legislativo. Pode ser atribuído a certo órgão por forma pré-constitucional, pode
estabelecer a forma da sua revisão.

A Constituição é a lei fundamental de um Estado, a qual fixa os grandes princípios


fundamentais da organização política e da ordem jurídica em geral, pelos quais se rege a vida dos
cidadãos.

2.3.2 Leis ordinárias

Leis ordinárias são todas as restantes leis e podem provir:

 Assembleia da República – leis propriamente ditas,


 Do Governo – Decretos-lei e Decretos.

A Assembleia da República é considerada o órgão legislativo por excelência (art. 169 C.R.M) e
dela provêm as leis e resoluções (art. 182 C. R. M.), porém só a lei se destina a estabelecer
verdadeiras regras jurídicas.

O Conselho de Ministros/Governo no exercício das funções legislativas, emite Decretos-Lei,


Decretos e Resoluções (art. 210 C.R.M.).

45
2.3.3 Sumário da hierarquia das leis
Constituição
Leis Constitucionais
Lei AR
Resolução
Tratados ou Convenções Internacionais

Decreto

Despacho Presidente da República

Decreto-Lei

Decreto Conselho de Ministros

Resoluções

Diploma Ministerial

Despacho Ministerial Ministros

Circulares

Posturas __________ Conselho Municipal

3. Processo de feitura das leis

Estabelecemos os tipos ou categorias de leis existentes no nosso direito. Vejamos agora como as
leis se fazem e como cessa o seu valor vinculativo ou vigência.

Na elaboração das leis – processo legislativo – há a contar com várias fases:

a) Elaboração,

46
b) Aprovação

c) Promulgação

d) Publicação

e) Entrada em vigor.

4. Vícios da lei

Os vícios da lei podem ser de três tipos:

 Ineficácia Jurídica,
 Inexistência Jurídica,
 Invalidade Jurídica.

4.1 Ineficácia jurídica

A Ineficiência jurídica acontece quando o conteúdo de uma nova lei criada, se torne destituída
de força vinculativa geral e sem consequências jurídicas.

Exemplo: A falta de publicação de uma lei, implica a não produção dos efeitos a que o acto se
dirige.

4.2 Inexistência jurídica

É para os casos em que se confronta directamente com a lei e para o Direito não significa nada.
Ela não produz os seus efeitos.

Exemplo: A falta de promulgação (assinatura) do P.R. numa lei aprovada pela A.R.

47
4.3 Invalidade jurídica

Surge quando o acto que deveria ser fonte de Direito fica sem valor e pode ser revistida de duas
formas:

 Nulidade – nulidade absoluta, indisponível às partes.


 Anulabilidade - nulidade relativa, disponível às partes.

A Nulidade visa a defesa de interesses públicos e pode ser arguida a qualquer tempo.

Exemplo: A feitura de leis, por parte de um órgão não competente para tal.

Anulabilidade, visa defender o interesse dos particulares, pode ser arguida dentro de um
determinado tempo, estabelecido por lei.

Exemplo: Uma lei que obriga os cidadãos a tomar certa atitude. Se ela for de todo
manifestamente prejudicial ao interesse legítimo dos particulares, terá que ser cumprida até que
os órgãos competentes a declarem anulada.

5. Modos de cessação da eficácia das leis

A lei ficará, em princípio, ilimitadamente em vigor. O decurso do tempo, por maior que seja, não
é razão suficiente para que a lei cesse a sua vigência.

A cessação ou termo da vigência da lei pode ocorrer por:

 Costume contrário;
 Desuso;
 Caducidade; e
 Revogação.

Para esta matéria, importa analisar os dois últimos modos de cessão da vigência das leis:

 A caducidade verifica-se quando a lei estatui o prazo da sua vigência. Findo esse prazo,
ela caduca e/ou quando ocorre factos que fazem desaparecer os seus pressupostos de
aplicaçao.
 Revogação, esta ocorre sempre que uma nova lei vem substituir a anterior.
 A revogação pode ser expressa, quando resulta do proprio texto da lei revogatória, e,
48
 Revogação tácita, verifica-se quando a lei vigente se mostra incompativel com os
preceitos da nova lei.

Quanto à sua extensão, a revogação pode ser: Total e/Parcial.

 A revogação total ocorre quando todas as disposições de uma lei antiga são atingidas,
também são conhecidas por ab-rogação. Exemplo: uma lei nova estabelece que todo o
dispositivo legal concernente a determinado assunto fica revogado.
 A revogação parcial dá-se quando só algumas disposições da lei antiga são revogadas,
pela lei nova, também conhecida por derrogação. Exemplo: uma lei nova que revoga
apenas arguns artigos da lei antiga.

A caducidade distingue-se pois da revogação, na medida em que esta resulta da nova lei,
contendo expressa ou implicitamente o afastamento da primeira, enquanto a caducidade se dá
independetemente de qualquer nova lei.

Importa ainda salientar que “a lei geral não revoga a lei especial, excepto se outra for a
intenção inequívoca do legislador”.

A lei especial tem em conta situações particulares que não são valoradas pela lei geral,
presumindo o legislador que a mudança desta não afecta esse regime particular.

6. A Aplicação da lei

6.1 A Interpretação da lei

Interpretação, é a determinação ou fixação do sentido e alcance da lei, ou o seu entendimento ou


compreensão. A determinação do exacto e pleno conteúdo de pensamento nele contido. Por
outras palavras, a interpretação é a determinação ou fixação do exacto sentido e alcance de uma
norma.

Por vezes, diz-se que a Lei clara não necessita de interpretação.

É um erro pois, para aplicar a lei, é sempre necessário entendê-la ou compreendê-la–isso é, a


interpretação. Esta pode ser mais ou menos fácil, mas é sempre necessária.

A técnica da interpretação chama-se hermenêutica jurídica.

49
6.2 Formas de interpretação

Pelo critério da sua fonte e valor, a interpretação diz-se autêntica, oficial, judicial e
doutrinária.

6.2.1 Interpretação autêntica

é a realizada pelo próprio órgão com competência legislativa mediante uma lei de valor igual ou
superior à lei interpretada.

A essa lei, que fixa o sentido decisivo da lei interpretada, chama-se lei interpretativa. Esta
forma de interpretação é vinculativa, isto é, tem a força vinculativa da própria lei.

Exemplo: Se uma lei da AR, após publicação, suscitar fortes dúvidas acerca do seu exacto
sentido e alcance, pode o orgão donde emanou (A.R.), fazer a sua interpretação através de uma
lei nova (lei interpretativa).

A interpretação autêntica é realizada, igualmente, pelos Assentos.Note-se uma vez que não são
vinculativos, porque certos autores apenas lhes reconhecem a natureza de lei interpretativas,
desde que atenda a interpretação em sentido amplo, isto é, abragendo a interpretação e integração
de lacunas.

6.2.2 Interpretação Oficial


É a que é realizada por lei de valor hierárquico inferior ao da norma interpretada. Só é
vinculativa em termos de obdiência hierárquica, não vincula os tribunais.

Exemplo: A interpretação que um ministro fizer por circular, a certa norma, só é vinculativa
ao seu ministério por obediência hierárquica, mas não vincula para além disso.

50
6.2.3 Interpretação Judicial,

É a que é realizada pelos tribunais num processo (salvo o caso particular dos assentos), só tem
valor vinculativo ao processo em si. Fora disso, pode persuadir pela forma e exactidão dos
argumentos, nã mais.

Exemplo: Quando, durante o julgamento, o juíz fizer a interpretação de determinado preceito


legal, ele o fará apenas para a solução daquele caso que está sendo julgado.

6.2.4 Interpretação doutrinal ou particular

É a que é efectuada pelos jurisconsultos ou outras pessoas não investidas de autoridade.

Não tem força vinculativa, mas apenas a força ou poder de persuasão que resulta do prestígio do
intérprete ou da utilização de uma metodologia jurídica correcta.

6.3 Finalidades da interpretação


A interpretação também se pode diferenciar consoante a finalidade que se propõe:

6.3.1 Interpretação Subjectiva e Interpretação Objectivista.

a) A Interpretação Subjectivista, propõe-se como finalidade reconstituir o pensamento


concreto do legislador, entendido como a pessoa ou as pessoas que fizeram a lei.

b) A Interpretação objectiva, procura determinar o sentido da lei em si, desligada da


pessoa ou pessoas que a fizeram.

6.3.2 Interpretação Histórica e Interpretação Actualista.

a) A Interpretação Históricatem, por finalidade, reconstituir o sentido que a lei tinha no


momento da sua elaboração e entrada em vigor.
b) Interpretação Actualista, tem por finalidade determinar o sentido que a lei tem no
momento da sua aplicação.

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Entende-se conveniente que a interpretação deve ser actualista. Com efeito, a lei tem valor como
instrumento social, não como peça de tradição.

A interpretação Subjectivista é naturalmente Histórica, a objectivista naturalmente Actualista.

6.4. Elementos da interpretação

Chamam-se Elementos da interpretação aos vários factores ou critérios de que se socorre o


intérprete para determinar o verdadeiro sentido e alcance da lei. E podem ser:

a) Elemento Literal ou Gramatical,


b) Elemento Lógico.

a) elemento literal ou gramatical

elemento literal ou gramatical é constituído pelo texto legislativo “a letra da lei”.

A letra da lei representa o ponto de partida da interpretação, é o seu elemento base, pois
a principal tarefa do intérprete é ler a lei e ver o que aí se diz.

O Elemento Gramatical consiste na utilização das palavras da lei, isoladamente, e no


seu contexto sintáctico, para determinar o seu sentido possível. E para tal recomenda-se
que se faça uso das gramáticas e dicionários.

Contudo, o exame literal do texto não nos resolve todos os problemas da interpretação,
terá que se recorrer a outros elementos devido às dificuldades que o texto legislativo,
frequentemente, comporta e que dificultam a determinação do seu sentido e alcance.

Por tudo isto se compreende que, além da letra é indispensável, considerar o espírito da
lei, pois apreender o sentido das leis não é só conhecer as suas palavras, mas penetrar na
sua foça e poder.

b) elemento lógico ou racional, “espírito da lei”, isto é, o sentido profundo da lei

52
Certos processos de dedução jurídica encontram-se já tipificados. É o caso de duas séries
de regras que dizem respeito às relações entre mais e menos, e às relações entre mais e
menos, e às relações entre meios e fins.

Relações entre mais e menos:

 A lei que permite o mais, permite o menos


 A lei que proibe o menos, proibe o mais.

Os argumentos deste tipo, que repousam ainda numa maior justificabilidade lógica da solução
(permitir, proibir), para outros casos que não o previsto – Chamam-se Argumentos por maioria
de razão. << a fortiori>>.

Mas em sentido técnico-jurídico significa a não presença de uma pessoa, ignorando-se o seu
paradeiro.

Relações entre meios e fins:

 A lei que permite o fim permite os meios necessários à prossecução desse fim.
 A lei que proíbe o fim, proíbe os meios que necessariamente a ele conduzem.
 A lei que permite os meios permite o fim a que eles necessariamente conduziriam.

O elemento lógico pode dividir-se em três elementos:

 Elemento Sistemático;
 Elemento Histórico; e
 Elemento Teológico.

6.5 Elemento sistemático

Quando recorre ao elemento sistemático, o intérprete deve ponderar as relações que a norma a
interpretar tem com outras normas afins ou paralelas, e com a totalidade do ordenamento jurídico
em que está inserida.

Assim, considera-se aquilo a que se chama o contexto da lei e os lugares paralelos.

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Através do contexto da lei, ponderam-se as relações que a norma a interpretar tem com conjunto
de disposições a que ela pertence e que regulam a mesma matéria.

Por sua vez, os lugares paralelos, compreendem as disposições legais que regulam problemas
normativos paralelos ou institutos afins do disciplinado pela norma a interpretar.

Como a norma constitui um elemento de um ordenamento global e unitário, resulta que a sua
interpretação deve ser feita numa perspectiva de globalidade e unidade, dentro do espirito do
sistema.

6.6 Elemento histórico


Este elemento compreende os dados ou acontecimentos históricos que expliquem a lei.

Assim, recorre-se de vários meios:

 Procedentes normativos,
 Trabalhos preparatórios,
 “Occasio legis”.

Os Precedentes Normativos, são constituídos tanto pelas normas que vigoraram em períodos
anteriores que são objecto da história de Direito, como pelas normas do Direito estrangeiro que
tiveram influência na formação da lei.

Os Trabalhos Preparatórios, são os estudos prévios, os anteprojectos e projectos da lei, as


respostas e críticas são feitas aos projectos, as actas das comissões encarregadas da elaboração
do projecto ou da sua discussão, que precedem a lei e documentar o processo da sua elaboração.

Todos estes elementos podem ser úteis para a definição da vontade real do legislador e afastar
interpretações que não estejam em consonância com o que ele pretendia.

Occasio Legis - (oportunidades da lei), é todo o conjunto de circunstâncias (políticas, sociais,


económicas, morais, etc.) que envolveram e influenciaram o aparecimento da lei.

N/B: Este elemento é muito importante especialmente na legislação de emergência.

54
6.7 Elemento teleológico

Consiste na razão de ser da lei “ratio legis”, no fim que o legislador teve em vista ao eleborar a
norma.

O conhecimento deste fim é extremamente importante para determinar o sentido da norma,


sobretudo quando acompanhado do conhecimento das circunstâncias históricas e particulares em
que ela foi eleborada (occasio legis).

7. Os resultados da interpretação

Feita a interpretação da lei, com o auxílio dos elementos referidos anteriormente, o intérprete
chegará a um dos seguintes resultados ou modalidades de interpretação:

 Interpretação Declarativa;
 Interpretaçã Extensiva;
 Interpretaçã Restritiva.

A Interpretação Declarativa ocorre quando o sentido que o intérprete fixou à norma coincide
com o significado literal ou um dos significados literais que o texto comporta, por ser o que
corresponde ao pensamento legislativo.

A interpretação declarativa pode ser lata ou restrita, consoante se considere o sentido mais amplo
ou o mais restrito de alguma ou algumas palavras da lei que têm mais do que um sentido.

Exemplo: - A palavra “homem”. Pode ser interpretada num sentido mais lato – ser humano –
interpretação declarativa lata. Pode ser interpretada num sentido mais restrito – ser humano do
sexo masculino – interpretação declarativa restrita/estrita.

A Interpretação Extensiva é aquela em que o intérprete chega à conclusão que a letra da lei fica
aquém do seu espírito, porque o legislador disse menos do que, no fundo, pretendia.

Nestes casos, torna-se necessário alargar o texto legal dando-lhe um alcance conforme ao
pensamento legislativo, fazendo corresponder a letra da lei ao seu espirito. (Art. 877º nº 1 C.C.)

A Interpretação Restritiva é o contrário da extensiva. Neste caso, a letra da lei vai além do seu
espirito por o legislador disse mais do que aquilo que pretendia.

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O intérprete deve, então, restringir o texto, isto é, encurtar o significado das palavras empregadas
pela lei, de modo à harmonizá-lo com o pensamento legislativo.

8. A lacuna jurídica

8.1. Noção

A Lacuna jurídica (caso omisso) existe quando uma determinada situação, merecedora da tutela
jurídica, não se encontra prevista na lei.

Torna-se então necessário, perante estas situações, não previstas na lei, mas carecidas de
regulamentção jurídica, fazer aquilo a que se chama a integração de lacunas, que será
actividade que visa precisamente encontrar uma solução jurídica para os casos omissos.

Para haver integração, há que averiguar, primeiramente, que não há nenhuma regra aplicável,
isto é, que o caso não está especificamente regulado, o que presupõe, obviamente, uma prévia
interpretação.

Visando esta actividade, conforme já estudámos, a fixação do sentido e alcance da lei, só depois
de efectuada se pode concluir que dada situação não está abrangida nem na letra nem no espírito
de nenhum dos preceitos vigentes.

Deste modo, “a integração supõe a interpretação (em sentido técnico) mas não é ela própria a
interpretação”.

Poderá parecer estranho que a ordem jurídica contenha lacunas, mas, por mais competente que
seja o legislador, nunca consegue prever, todas as relações da vida social com relevância
jurídica.

Várias razões estão na origem dos problemas das lacunas, muito resumidamente, a seguir,
indicaremos algumas.

56
8.1.1 Espécies de lacunas

1ª - Certas situações são imprevisíveis no momento da elaboração da lei enquanto outras, embora
previsíveis, escapam à previsão do legislador em face da enorme complexidade de formas da
vida social.

2ª - Por vezes, o próprio legislador, intencionalmente, sobretudo em matérias novas ou


complexas, abstém-se de regulá-la directamente, pelas dificuldades que se sente em o fazer
convenientemente.

Ainda que se verifique uma lacuna, o caso concreto tem de ser resolvido, pois de outro modo
violar-se-ia o disposto no art. 8º, do C.C.

8.1.2 Formas de integraçãode lacunas

Posto isto, e para dar cumprimento ao preceito acima indicado, há que recorrer à interpretação da
lei, actividade que, repetimos, consiste no preenchimento de lacunas da lei e que está regulada,
fundamentalmente, no art. 10 do C.C. - (Integração de lacunas).

Este comando determina que, 1. Os casos que a lei não preveja são regulados segundo a norma
aplicável aos casos análologos e o nº 2, determina que, há analogia, sempre que no caso omisso,
procedam as razões justificativas da regulamentação do caso previsto na lei. Ainda, o nº 3
estabelece que, na falta de caso análogo, a situação é resolvida, segundo a norma que o próprio
intérprete criaria, se houvesse de legislar dentro do espírito do sistema.

Este artigo consagra assim dois métodos para a resolução dos casos omissos:

 A analogia: art. 10.1 do C.C; e


 O método previsto no nº 3 do mesmo artigo.

a) A analogia

Sempre que seja possível, recorre-se à analogia, que consiste em aplicar, ao caso omisso,
a mesma norma reguladora de qualquer caso análogo.

Assim por exemplo: a circulação aérea, quando surgiu, provocou uma lacuna da lei
durante algum tempo, mas as mesmas que existiam sobre a navegação e transporte

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marítimos puderam, em grande parte, aplicar-se por analogia, pelas muitas semelhanças
que havia entre os dois tipos de transporte.

O recurso à analogia como primeiro meio de preenchimento de lacunas, justifica-se por


uma questão de coerência normativa do próprio sistema jurídico. De facto, tal
circunstância, exige que casos semelhantes, devem merecer do Direito o mesmo
tratamento, favorecendo, assim, em larga medida a certeza e a a segurança jurídica.

A aplicação analógica distingue-se da interpretação extensiva porque esta pressupõe que


determinada situação, não estando compreendida na letra da lei, o que está no seu
espirito, enquanto a analogia leva a uma aplicação da lei a situações não abrangidas, nem
na letra da lei, nem no seu espírito.

Proibições do uso da analogia

Apesar das razões apontadas para o uso da analogia, verifica-se, que em certos casos, a
lei a proíbe:

 Nas normas excepcionais, art. 11 do CC.;


 Nas normas incriminadoras, art. 18 do Código Penal - CP;
 Em Direito Fiscal, relativamente às normas de incidência do imposto e às que
definem garantias dos particulares.

b) Método previsto no nº3 do art. 10 do c.c.

Verificando-se uma lacuna da lei, e na falta de caso análogo, o art. 10, nº 3 C.C., manda
que, resolvida segundo a norma, que o próprio intérprete criaria, se houvesse de legislar
dentro do espírito do sistema.

Assim, o intérprete não é remetido para juízo de equidade, isto é, para a justiça do caso
concreto, antes tem de decidir,segundo uma regra que contemple a categoria de casos em
que se enquadre o caso omisso, válida apenas para esse caso.

Isto significa que essa norma não tem carácter vinculativo para futuros casos ou para
outros julgadores.

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9. Aplicação das leis no tempo e no espaço

Como já estudámos, o Direito é na sua essência um ordenamento normativo e coactivo das


relações sociais. Ora, a evolução da vida social vai se reflectir, necessariamente nas relações
sociais que a constituem, e o Direito que na sociedade encontra a sua razão de ser – Ubi societas
ubi ius – não pode ignorar tal evolução.

O facto de surgir uma nova lei, não implica o corte radical na continuidade da vida social, pois
há situações jurídicas que tendo-se constituído no passado, isto é antes da entrada em vigor da
nova lei, se prolongam no futuro, sob a vigência desta, entrando assim em contacto com duas ou
mais leis que sucedem no tempo.

A essas situações, que lei se aplica? A antiga ou a nova lei?

As relações jurídicas não se desenvolvem apenas no quadro nacional, pois também podem entrar
em contacto com mais de um ordenamento jurídico ou porque os sujeitos da relação pertencem a
Estados diferentes ou o próprio objecto a que ela respeita se situa num outro Estado, ou os seus
efeitos se vão produzir noutro, etc.

A essas situações que lei se aplica? A nacional ou a estrangeira?

Surgem-nos assim duas questões de grande importância e complexidade, no domínio da selecção


da norma aplicável, que iremos analisar em seguida e que se referem respectivamente:

 A aplicação da lei no tempo; e


 A aplicação da lei no espaço.

9.1 A aplicação das leis no tempo


Para melhor se compreender esta questão, vamos supor os seguintes casos:

Dois indivíduos celebram um contrato quando a lei não exigia escritura pública para a sua
realização. Entretanto, surge uma nova lei que vem exigir esse formalismo para esse tipo de
contratos. Deverá, por força da lei nova, considerar-se formalmente inválido aquele contrato? O
regime de administração dos bens do casal é alterado por uma nova lei? Deverá esta aplicar-se
aos casamentos anteriores?

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Determinado indivíduo pratica um facto que, na altura, era considerado criminoso e punível com
prisão até 6 meses. Entretanto, antes do julgamento surge uma nova lei que deixa de considerar
tal facto punível. Qual das leis deverá aplicar-se?

Casos como estes e outros muito mais complexos surgem constantemente pois cada vez, são
mais numerosos e frequentes as alterações e inovações legislativas, o que acontece com
particular acuidade na nossa época.

Uma das soluções possíveis para os problemas da sucessão de leis no tempo, motivados pela
entrada em vigor de uma nova lei, são as disposições transitórias fixadas nessa mesma lei e que
se destinam a regular a tradição dum regime legal para o outro. Porém, na maior parte das vezes
e na grande maioria dos casos, o legislador nada diz sobre a lei aplicável a situações em que se
suscita um problema de aplicação de leis no tempo. Daí a necessidade de se recorrer a princípios
doutrinários e gerais que orientem o jurista na resolução destes conflitos.

Neste caso, o principio que se pode invocar e para o qual é remetido o jurista é “o da não
retroactividade da lei”, de harmonia com o precentuado no art. 12 do C.C.

Para o efeito, o art. 12 do CC., Aplicação das leis no tempo - Princípio geral, dispõe que:

1. A lei só dispõe para o futuro, ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se
que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular.
2. Quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer
factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos
novos, mas, quando dispuser directamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas,
abstraindo dos factos que lhe deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias
relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor.

Este princípio não tem carácter absoluto, pois pode haver em determinados domínios a
possibilidade de leis retroactivas, como se prevê no art. 12, nº 1. “...ainda que lhe seja
atribuída eficácia retroactiva”.

Mas a regra é a de que a lei só dispõe para o futuro, isto é, não tem efeitos retroactivos.

De outro modo atentar-se-ia contra a certeza e segurança do Direito, valores fundamentais para a
vida das pessoas e que contribuem para que cada um com base em expectativas firmes estabeleça
os seus planos de vida.

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Como excepção àquela regra temos a lei interpretativa, que tem efeitos retroactivos, porque se
integra na lei interpretada art. 13, nº 1 do C.C

Já que as leis interpretativas são aquelas que fazem a interpretação autêntica de outras leis
anteriores, entende-se que são retroactivas porque actuam sobre o passado.

Então, como a lei interpretativa é retroactiva, há a necessidade de garantir “a estabilidade das


situações já consumadas” pois, de outromodo, poder-se-iam provocar grandes pertubações nas
relações sociais.

9.2 A aplicação das leis no espaço


As leis, assim como são limitadas no tempo são no também no espaço.Como já sabemos, cada
Estado tem a sua própria ordem jurídica interna, o seu Direito, porém, as relações sociais
transcendem o âmbito dos Estados e estabelecem-se quer, entre indivíduos de Estado diferentes,
quer entre os próprios Estados.

Deste modo resulta, que os Estados não aplicam exclusivamente o seu Direito interno no seu
espaçoe tenham, por vezes, que aplicar nos seus tribunais as leis de outros Estados. Entram
assim,em concorrência com leis estrangeiras e com as leis do próprio Estado, dentro do seu
próprio território, quando uma situação jurídica se produz de modo a relacionar-se com mais de
um ordenamento jurídico estadual.

 quer pela nacionalidade ou domínio dos sujeitos,


 quer pelo lugar da prática do facto constitutivo da relação ou do lugar onde os seus
efeitos se vão produzir.
 quer pelo lugar da situação do seu objecto, etc.

Surgem assim, os conflitos das leis no espaço que são decididos mediante as regras de conflito,
que permitem determinar qual de entre as leis em contacto com a situação deve ser declarada
competente para a regular.

Tais regras constituem o objectivo do Direito Internacional Privado e estão contidas nos artigos
15 e seg. do C.C.

61
Tarefas

Discuta as seguintes questões

1. Valor dos usos e costumes da sociedade moçambicana, como fonte eventual de Direito;

2. Vantagens e desvantagens de uma eventual consagração do costume como fonte do Direito


em Moçambique;

3. As razões que ditam a ocorrência de casos de vícios da lei e de declarações de


inconstitucionalidade de leis por parte do Conselho Constitucional, pese embora as fases
existentes do processo de feitura de leis.

4. Encontrar as razões que levam a proibição do uso da analogia no caso das normas
excepcionais, normas incriminadoras e em Direito Fiscal.

Auto-avaliação
1- Sobre a Lei

a) Defina-a e indique os seus pressupostos;

b) Distinga uma lei formal de uma lei material;

c) Em que consiste a “vacatio legis”.

d) Que vícios podem ocorrer ao longo do processo legislativo?

2. Sobre o Costume:

a) Defina-o e caracterize-o

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b) Que implicações teria a sua consagração como fonte imediata do Direito em
Moçambique?

3. José Mabuluko, cidadão moçambicano, pai de uma das muitas “pombo correio”, detida em
conexão com o tráfico de cocaína, vinda da Bananalândia, inconformado com a situação
pretende apresentar na Assembleia da República, uma proposta de lei que atenue as penas
para as “pombo correio” e sanciona com a pena de morte os intermediários e os proprietários
da droga.

Pode a pretensão do Sr. Mabuluko ser atendida?

4. Fazendo uso dos conhecimentos adquiridos disserte acerca da seguinte afirmação: “ A LEI
clara não precisa de interpretação ”.

Chave-de-correcção

1. a) Lei é uma disposição genérica provinda de um órgão estadual competente. Artº 1, n°2 do
C.C. Pressupostos da lei: uma autoridade competente, conter uma verdadeira regra jurídica e
observar as normas previstas para a sua criação.

b) Lei em Sentido Formal, é todo o acto normativo emanado de um órgão com competência
legislativa quer contenha ou não uma verdadeira regra jurídica enquanto Lei em Sentido
Material, é todo o acto normativo emanado de um órgão do Estado, mesmo que não
incumbido de função legislativa desde que contenha uma verdadeira regra jurídica;

c) “Vacatio legis” é o período que vai entre a data da publicação de uma lei e a sua entrada
efectiva em vigor. Destina-se a permitir maior divulgação da nova lei e resolver as situações
pendentes da nova lei.Em Moçambique, o período da vacatio legis é de 15 dias, nos termos
da Lei 6/2003, de 18 de Abril.

2 a) O costume, juridicamente, é definido como norma de conduta nascida da prática social e


considerada obrigatória.Suas características essenciais radicam na sua espontaneidade, surge
do meio social e acompanha o desenvolvimento social.
b) Por força da diversidade do mosaico sociocultural, aliado ao facto de o costume por vezes
não ser de prova fácil prová-lo, pôr-se-ia em causa a convicção de obrigatoriedade, um dos

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elementos do costume, pelo que seria difícil a sua consagração como fonte de Direito em
Moçambique.
3. Não pode proceder a intenção do senhor Mabuluko, na medida em que a iniciativa de Lei
pertence ao PR, ao Governo, aos Deputados, as bancadas parlamentares, as Comissões da Ar,
nos termos do artigo 183 da Constituição da República de Moçambique.
4. Em função do estudo e análise efectuada não constitui verdade que a “ A LEI CLARA NÃO
PRECISA DE INTERPRETAÇÃO ”, éum erro, pois para aplicar a lei, é sempre necessário
entendê-la ou compreendê-la, e isso é a interpretação. Esta pode ser mais ou menos fácil, mas
é sempre necessária.A técnica da interpretação chama-se hermenêutica jurídica.

Resumo
O Direito tem como principal fonte a Lei, que, na sua aplicação prática, pode dar azo a
interpretações diversas, daí que tenha de recorrrer, em muitos casos, a hermenéutica jurídica para
determinar o exacto sentido de uma norma.

Por regra, uma lei entra imediatamente em vigor e não se aplica retroactivamente, com as
devidas excepções para os casos em que ocorre a “vacatio legis“ ou quando tal benefecia o
cidadão, respectivamente.

A lei pode passar por algumas viscissitudes, como por exemplo a ocorrência dos vícios e
existência de vazios legais, dando azo ao surgimento de lacunas, o que obriga a que se lance mão
dos mecanismos para o seu preenchimento.

Na aplicação da lei no espaço, podem surgir conflitos, que são decididos mediante as regras de
conflito, que permitem determinar qual de entre as leis em contacto com a situação deve ser
declarada competente para a regular.

64
Bibliografia

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Bigote Ch, M. (1997). Temas Fundamentais de Direito, Almedina

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João, B. (1997). Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Almedina

Latorre, A. (1978). Introdução ao Direito. Coimbra

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Pereira, N. (1992). Introdução ao Direito e as Obrigações. Almedina

Telles, I. G. (1991). Introdução ao Estudo do Direito. Biblioteca Universitária, Publicação


Europa-América

_______________

Legislação

Código Civil.

Constituição da República de Moçambique de 1975, 2000, 2004.

65
Unidade Didáctica nº 3: Ramos do direito, codificação e sistemas jurídicos

Introdução

Bem-vindo à Unidade didáctica III. Nesta unidade vamos falar sobre os ramos do Direito,
Codificação e sistemas jurídicos.

Como já dissemos nas unidades anteriores, o Direito é uma ciência igual às outras, daí que ele
tenha também as suas divisões, e no caso em apreço, existe uma destrinça, já milenar entre duas
grandes áreas do saber jurídico, o Direito Público e Direito Privado, ao que se seguiu a
autonomização e surgimento de vários sub-ramos que hoje dão corpo aos inúmeros ramos do
Direito de que falaremos mais adiante.

Para a sua correcta, efectiva e fácil aplicação em dado momento da história do Direito, mostra-se
pertinente criar um instrumento para coordenar as regras pertinentes às relações jurídicas de uma
só natureza, criando um corpo de princípios dotados de unidade e deduzidos sistematicamente.
Foi assim que nasceu o movimento da codificação, que será igualmente objecto de estudo na
presente unidade.

Toda a sociedade política possui seu próprio ordenamento jurídico. Nele há um conjunto de
normas ditadas para ter vigência sobre essa determinada sociedade. Neste contexto, iremos
analisar os principais sistemas jurídicos e procuraremos proceder ao enquadramento do nosso
ordenamento jurídico no contexto universal e da região.

Objectivos da Unidade

Ao completar esta unidade, você será capaz de:

 Elimitar a noção de ramo de direito;


 Distinguir o direito público do privado;

66
 Identificar a importância da divisão do direito, em público e privado e a utilidade da
ramificação;
 Identificar as críticas doutrinárias actuais a sua sistematização;
 Caracterizar cada sub-ramo do direito público e privado;
 Identificar os ramos de classificação híbrida e a respectiva justificação;
 Entender a a noção de código;
 Distinguir o código das compilações e das consolidações;
 Identificar os principais códigos existentes em moçambique;
 Identificar as vantagens e desvantagens da codificação;
 Identificar as razões da resistência à codificação em determinados ramos de direito;
 Delimitar o conceito de sistema do ponto de vista jurídico;
 Identificar e conhecer a história da formação dos sistemas jurídicos;
 Identificar e distinguir os sistemas jurídicos através das suas características;
 Situar moçambique no sistema jurídico apropriado; e
 Identificar as influências a que moçambique está sujeito pelo facto de situar-se numa
zona dominada por um sistema jurídico distinto do seu.

Desenvolvimento do conteúdo

1. Ramos do direito e razões da divisão

Caro estudante, a ordem jurídica é uma, mas o seu estudo impõe a demarcação de sectores. A
esses sectores se chama tradicionalmente os ramos do direito.

O conteúdo de cada ramo deve ser estruturado por intermédio de princípios gerais próprios desse
ramo. Isto permite um aprofundamento, coordenado, das matérias nele abrangido.

A primeira e mais tradicional divisão do Direito é a que distingue entre Direito Público e
Direito Privado. Esta divisão foi feita pelos jurisconsultos romanos.

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Esta distinção tem sido polémica, ao longo dos tempos, sendo vários os critérios de distinção
proposto pelos diversos autores. Neste módulo apresentamos.

2. Critérios de distinção

Existem 3 critérios de distinção a saber:

 Critério da natureza dos interesses;


 Critério da qualidade dos sujeitos na relação jurídica; e
 Critério da posição dos sujeitos na relação jurídica.

2.1 Critério da natureza dos interesses


De acordo com este critério, o Direito Público, teria como objectivo a satisfação de interesses
públicos, pelo contrário, o Direito Privado, visaria a satisfação de interesse privados.

As normas que regulam, por exemplo, a fixação dos impostos, que determinam as penas
aplicáveis aos diversos crimes, etc. Por sua vez, as normas que regulam os direitos e deveres dos
compradores e vendedores são incluídos no Direito Privado.Este critério suscita algumas críticas:

Com efeito, é difícil dizer se uma norma regula interesses da colectividade (públicos) ou se tutela
interesses privados.

Na verdade, todas as normas jurídicas, mesmo as de Direito Privado são criadas no interesse
público, porque os interesses protegidos pelo Direito, mesmo os individuais devem ter certa
relevância pública.

Podemos ver um exemplo: as normas que fixam as penas para os diversos crimes, procuram
defender a segurança da colectividade, garantir a paz social e, nessa medida, tutelar interesses
públicos.

Por seu turno, as normas de Direito Público visam regular a conduta dos homens em sociedade e
tutelam também os interesses dos particulares.

68
Podemos ver mais um exemplo: as normas que fixam os diversos impostos, protegem antes de
mais um interesse do Estado, que é a obtenção de receitas públicas; mas os particulares também
são beneficiados com essas receitas se o Estado lhes proporcionar serviços públicos eficientes.

Alguns autores procuram reformular este critério e basear a distinção entre Direito Público e
Direito Privado, tendo em conta a natureza do interesse predominantemente tutelado pela norma.

Assim, seriam normas de Direito Público, as que tutelassem fundamentalmenteinteresses da


colectividade e normas do Direito Privado, as que predominantemente visassem a protecção do
interesse individual.

Também esta modalidade levanta as maiores dificuldades, não facultando uma distinção entre as
diversas normas. Com efeito, é, na maioria das vezes, difíceis distinguir qual é o interesse –
privado ou público - que é predominantemente tutelado, passando a distinção a estar dependente
de critérios de valoração.

Assim, se para alguns autores predomina, em determinadas normas, um interesse geral, outros
autores virão neles tutelados predominantemente interesses particulares.

2.2 Critério da qualidade dos sujeitos na relação jurídica

Caro estudante, de acordo com este critério, o Direito Público, é constituído pelas normas que
regulam as relações em que intervenha o Estado ou qualquer ente público em geral; o
DireitoPrivado é constituído pelas normas que regulam as relações entre particulares.

Este critério também é sujeito a críticas, uma vez que o Estado e demais entes públicos podem
actuar e, frequentemente, actuam, nos mesmos termos que qualquer particular.

Podemos ver isso no exemplo a seguir: quando o Estado celebra com outro ente público um
contrato de compra e venda, as normas do contrato não deixam de ser de Direito Privado, para
passarem a ser de Direito Público.

69
2.3 Critério da posição dos sujeitos na relação jurídica

Para alguns autores este parece ser o critério mais adequado. Segundo ele a destrinça entre o
Direito Público e Direito Privado, fundamenta-se na posição relativa dos sujeitos da relação
social regulada pela norma. Assim, o Direito Público disciplina as relações jurídicas que se
estabelecem entre o Estado (ou outros entes públicos) eos particulares, intervindo o Estado numa
posição de supremacia, isto é, como entidade dotada de poder soberano “Ius Imperium” as
normas de Direito Privado, regulam as relações sociais entre particulares ou em que intervenham
o Estado (ou outros entes públicos) desprovidos do seu “imperium”. Nestes termos, os sujeitos
da relação jurídica estão numa relação de igualdade ou paridade.

Vamos ver o exemplo a seguir: quando o Estado celebra um contrato de arrendamento com o
proprietário de um prédio para lá instalar um serviço, ele actua em pé de igualdade com o
proprietário do prédio, não exercendo, nessa relação, nenhuma função soberana. Estamos perante
uma relação de Direito Privado.

Pelo contrário, certas relações tributárias que se estabelecem entre os particulares e o Estado, e
em que este intervém com o seu poder soberano, dizem-se de Direito Público.

É evidente que estes dois ramos de Direito, o Direito Público e o Direito Privado, não constituem
dois compartimentos estanques, separados de forma absoluta. Pelo contrário, existem muitos
pontos de conexão entre eles.

3. Aplicação das normas de direito privado e direito público

No campo da aplicação do Direito, você é chamado a distinguir se a norma é de Direito Público


ou de Direito Privado, para se saber se a pretensão resulta de uma relação de Direito público ou
de Direito privado e se determinar qual o Tribunal que pode julgar. Assim:

Os tribunais judiciais (cíveis, de trabalho, de família), são competentes para resolver os


diferendos que surgem entre particulares, ou entre particulares e o Estado, estando os sujeitos
numa posição de igualdade – relação de Direito Privado.

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Os Tribunais Administrativos, são competentes para resolver os diferendos entre particulares e
entes públicos, ou entre entes públicos diversos, estando estes munidos de poder soberano –
relação deDireito Público.

4. Ramos do direito público

Dentro do Direito Público é vulgar distinguir nomeadamente os seguintes ramos de Direito:


Direito Constitucional, Direito Administrativo, Direito Financeiro, Direito Fiscal, Direito
Criminal e Direito Processual.

Vejamos agora qual é o objecto próprio de cada um destes ramos de Direito:

4.1 Direito constitucional


Direito constitucional é o conjunto de normas que regulam a organização fundamental do estado
e que estabelecem ainda os direitos e obrigações recíprocas do Estado, bem os direitos e deveres
dos cidadãos.

A Constituição pode ser definida como a lei fundamental dum país, que fixa os grandes
princípios da organização política e da ordem jurídica em geral e os direitos e deveres
fundamentais dos cidadãos.

As normas constitucionais ocupam, assim, um lugar cimeiro na hierarquia das leis.

O nosso país tem uma história constitucional muito nova, pois, só apenas com a independência é
que tivemos a nossa primeira constituição. Ela sofreu várias alterações, mas só foi
definitivamente revogada em 1990, tendo vigorado até 20 de Janeiro com alterações resultantes
nomeadamente da aplicação do Acordo Geral de Paz, assinado em Roma em 1992, implantação
das autarquias em 1997 e por força da necessidade e para fazer face aos pleitos eleitorais de 1998
e 1999.

A partir de 21 de Janeiro de 2005, passou a vigora a nossa terceira constituição, aprovada pela
Assembleia da República, a 16 de Novembro de 2004.

71
4.2 Direito administrativo

O Direito Administrativo é constituído pelas normas jurídicas reguladores da organização da


Administração Pública e do seu processo próprio de agir nas relações com os particulares.

O Direito Administrativo moçambicano pode definir-se comoo sistema de normas jurídicas que
regulam a organização e o processo próprio de agir da Administração Pública e disciplinam as
relações pelas quais ela prossegue interesses colectivos podendo usar da iniciativa do Privilégio
de Execução Prévia.

O Privilégio de Execução Prévia consiste na faculdade concedida a certas pessoas ou órgãos de


executarem imediatamente as medidas destinadas à satisfação das necessidades colectivas, em
vez de aguardarem que um órgão jurisdicional decida previamente sobre se é ou não legal a
medida projectada.

Exemplo: o Estado pode executar o património do devedor para realização dos créditos não
voluntariamente satisfeitos, sem necessidade de declaração judicial prévia do seu direito.

A actividade administrativa do Estado, é toda a actividade do executivo com exclusão da


actividade legislativa. É uma actividade que tem por objectivo a satisfação das necessidades
públicas ou colectivas, tais como a manutenção da ordem e paz públicas, a assistência social, os
transportes, extinção de incêndios, fornecimento de energia eléctrica e de água às populações,
etc.

É costume dizer-se que o Direito Administrativo disciplina a actividade do Estado, enquanto o


Direito Constitucional regula a organização do Estado.

O Direito Administrativo é, unanimemente, considerado Direito Público. Com efeito, no


exercício da função administrativo, o Estado intervém munido do seu poder soberano “ius
imperium”.

4.3 Direito Financeiro

É constituído pelo conjunto de normas jurídicas que regulam a actividade financeira do Estado.

O Estado para satisfazer as necessidades colectivas, desenvolve uma actividade financeira, tendo
por objectivo a obtenção de receitas e a realização de despesas.
72
O Direito Financeiro regula assim as formas de recolha, gestão e aplicação dos meios financeiros
do Estado. Esses meios financeiros, são obtidos através de impostos e taxas, receitas patrimoniais
e empréstimos públicos.

4.4 Direito Fiscal

É o conjunto de normas jurídicas reguladoras do nascimento, desenvolvimento e extinção das


relações jurídicas suscitadas pela percepção do imposto.

Tradicionalmente são apresentadas as seguintes fases do imposto:

Incidência – é a definição geral e abstracta, feita pela lei, dos actos ou situações sujeitos a
impostos e das pessoas sobre as quais recai o dever de prestar.

Liquidação – consiste na série de operações, ou seja a aplicação da taxa da matéria


colectável, para a determinação do montante do imposto.

Cobrança - é a fase última do imposto e consiste na operação administrativa que visa a


entrada dos impostos nos cofres do Estado.

4.5 Direito criminal ou penal

É o conjunto de normas jurídicas que procuram qualificar determinados factos como crimes e
fixam os pressupostos da aplicação de sanções criminais correspondentes (penas e medidas de
segurança).

O Direito Criminal indica, não só, os diversos tipos de crimes, mas também as condições em que
existe culpa, bem como as modalidades da culpa (dolo ou negligência), as circunstâncias
agravantes eatenuantes do crime, as condições e os termos em que pode ser decretada uma
medida de segurança, etc.

O crime é o elemento central, deste ramo de Direito Público.

73
4.6 Direito processual

É o conjunto de normas que fixam os termos a observar na propositura e desenvolvimento de


uma acção que os particulares ou o Estado submetem a julgamento.

4.6.1 Direito processual civil

É o conjunto de normas que estabelecem os termos a observar na propositura e no


desenvolvimento das acções cíveis, ou seja, nas acções fundadas no direito civil.

4.6. 2. Direito processual criminal ou penal

É o conjunto de normas que estabelecem os termos a observar na instauração e no


desenvolvimento da acção criminal.

5. Ramos do direito privado

Como se referiu atrás, o critério, mais adequado para alguns autores, é o que define Direito
Privado, como um conjunto de normas que regulam as relações sociais que se estabelecem entre
os particulares ou entre os particulares e o Estado (ou outros entes públicos) desde que estes
intervenham em pé de igualdade com os particulares.

O Ramo mais importante no Direito Privado é o Direito Civil.

5.1. Direito civil

O Direito Civil é o direito privado comum ou direito-regra, cujo campo de acção tende a
abranger todas as relações de Direito Privado. É o núcleo fundamental do Direito privado.

Daí que, em relação aos outros ramos do Direito privado, seja considerado um direito
subsidiário, isto é, sempre que surja um caso a resolver que não esteja previsto nesses ramos,
ter-se-á que recorrer às normas contidas no Direito Civil.
74
O princípio central do direito civil é o da livre autonomia da vontade das partes.

A autonomia, consiste na liberdade de cada um ordenar dentro de certos limites gerais, o leque
de relações que lhe dizer respeito; consiste ainda na liberdade de exercer ou não os poderes de
que é titular.

O diploma fundamental do Direito Civil é o Código Civil. O Código Civil aparece-nos


subdividido em:

5.1.1 ParteGeral

Título I – Das leis, sua interpretação e aplicação.

Título II – Das relações Jurídicas.

O título I, contém uma teoria geral da lei (teoria das fontes de direito, teoria da interpretação e
aplicação da lei, teoria da aplicação da lei no tempo e no espaço).

O título II, contém a teoria geral das relações jurídicas (teoria geral do facto jurídico, a das
pessoas, a das coisas, e a do exercício de direitos e das provas).

5.1.2 Direito das Coisas

Também se designa por Direitos reais, cuja instituição central é a propriedade (mas regula
também o usufruto, uso e habitação, direito de superfície e servidão predial).

5.1.3 Direito das Obrigações

Regula um tipo particular de relação jurídica, a que se chama obrigação, relação jurídica
obrigacional ou relação jurídica de crédito.

A obrigação tanto pode resultar de um contrato como de um acto ilícito. O contrato é no entanto
por excelência a expressão da sua autonomia privado.

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5.1.4 Direito da Família

Regula as instituições típicas do casamento, da adopção e da afinidade.

5.1.5 Direito das Sucessões

Regula as realações jurídicas decorrentes do fenómeno morte- - mortis causa.

5.2 Direito Privado Especial

É assim designado, pelo facto de nos dois ramos que a seguir vamos discriminar o Estado agir
como ente público, na medida em que ele é que aprova o Código Comercial e a Lei do Trabalho
e age como ente privado, em pé de igualdade com os demais sujeitos, por exemplo quando
contrata trabalhadores a luz da Lei do Trabalho e pratica actos do comércio sob égide da lei
Comercial.

5.2.1 Direito Comercial

O Direito Comercial é um direito privado especial, regulador da actividade mercantil.

De acordo com o art. 1 do Código Comercial: A lei comercial regula a actividade dos
empresários comercias, bem como os actos considerados comerciais.

Refere-se assim o Direito Comercial a um sector específico, objectivamente delimitável.

Aparentemente, a determinação do campo da lei comercial seria facilitada pelo confronto com o
conceito de comércio – actividade de mediação entre a produção e o consumo de bens.

No entanto, o conceito jurídico de comércio é muito mais extenso e guia-se pelos princípios da
Celeridade, Reforço do crédito, Boa-fé, e Fim lucrativo da actividade comercial.

76
5.2.2 Direito do trabalho

O Direito do Trabalho estuda as normas jurídicas que regem as relações de trabalho: os direitos e
obrigações dos trabalhadores face à entidade patronal e, de ambos (trabalhadores e entidade
patronal), face ao Estado.

O Direito do Trabalho regula apenas relações da classe subordinada e nunca da classe


empregadora.

6. Codificação

6.1 Génese da codificação

Caro estudante chamamos de codificação a um movimento jurídico aparecido no Ocidente no


século XIX, em função do qual os direitos ocidentais, quanto à forma, se dividem em: direito
continental, ou direito codificado que compreende o grupo francês, tendo, por ponto de partida o
Código de Napoleão (Code Civil des Français), e o grupo alemão; e sistema do Common Law
ou do grupo Anglo-Americano.

O movimento, apesar de não ser muito antigo, pois data de pouco mais de um século, foi
conhecido desde a Antiguidade. A história do Direito Romano processa-se entre duas
codificações: a Lei das XII Tábuas e o Corpus Júris de Justiniano. Na Suméria existiram
codificações famosas. Até há bem pouco tempo, era tido o Código de Hamurabi como a mais
antiga codificação. Entretanto, em 1948, outro código mais antigo foi descoberto, o Código de
Ur-Namu.

Podemos dizer que, na civilização europeia, ressurge, no século XVIII, o movimento


codificador. Não se manifestou, a princípio, em códigos, mas em compilações, isto é, em reunião
de leis esparsas ou de costumes, só em1804 surge o primeiro código moderno: o de Napoleão
(Code Civil des Français ou Code Napoléon).

Que significava este movimento? Podemos dizer que significava a tendência para enfeixar em lei
toda a matéria jurídica, em regra, uma parte do direito, de modo a dar, nessa parte, unidade de
tratamento jurídico às relações jurídicas que dela brotam. Tal lei denomina-se Código. Mas,
codificação, como movimento jurídico, não é a feitura de um código. Muitos países que
77
pertencem ao sistema da Common Law têm alguns códigos. Significa sim a adesão ao direito
escrito, ao direito codificado ou legislado. Nesse caso, em códigos, estão os principais ramos do
direito.

A codificação unifica o direito e apresenta de forma orgânica, sistemática as suas regras de modo
a que as mesmas sejam facilmente observadas. Acaba a codificação com a legislação dispersa.
Apresentando, quase sempre, tratamento jurídico novo.

Partindo da França, atingindo a Alemanha, o movimento codificador ganhou a corrida com o


direito comum (direito romano adaptado às condições europeias pelos juristas europeus desde a
Idade Média) e com o direito consuetudinário. Países como a Inglaterra e os Estados Unidos, que
não aderiram a esse movimento, de certa forma sentiram a necessidade de, oficialmente, unificar
o direito. Na Inglaterra, escreve Gogliolo: “é sabido que os juízes se fundam nos chamados
precedentes escritos, que se encontram em colecções e livros. Esta jurisprudência escrita (case
law) é uma espécie de código sob outra forma”. Nos Estados Unidos, os precedentes judiciais
predominantes, assentados e tradicionais, sobre determinadas matérias jurídicas estão sendo
compilados (restatement).

As grandes codificações, através de actos legislativos ou de acções dos juristas, penetraram em


países para os quais elas não foram ditadas.

O mais conhecido fenómeno de recepção de direito estrangeiro, mais conhecido e mais


importante para nós, ocorreu na Idade Média, na Europa, em que era respeitado o direito de uma
sociedade moribunda, de um império desaparecido, isto é, o Direito Romano. É a recepção do
Direito Romano que sofreu adaptação ao mundo medieval.

O esforço medieval não se limitou simplesmente a aproveitar o evangelho jurídico de Roma, pois
o modificou para o adaptar às “novas condições que passou a reger”. Há, pois, “desviação do
direito romano medieval do histórico direito da Roma antiga”.

Tal movimento iniciou-se na Itália, em fins do século XII e princípios do século XIII, em
Bolonha, com Irnerius, fundador da Escola de Bolonha, auxiliado por “quatro doutores”:
Búlgarus, Martinus, Hugo e Jacobus. Compilaram o Direito Romano de Justiniano,
preocupando-se com a sua interpretação literal. Desse trabalho surgiram as “glosas”: Glosa
Ordinária ou Glosa Magna ao Corpus Júris, compilação de glosas, isto é, explicações (notas)
breves e comentários dos textos, dos romanistas da época, feitos nos rodapés dos manuscritos.
78
Tais glosas influíram no direito, porque os estatutos das cidades italianas foram redigidos
principalmente pelos graduados de Bolonha, que conciliaram as interpretações do direito romano
de seus mestres com os direitos locais. A aceitação desse direito romano foi facilitada pelo
desenvolvimento da actividade comercial que, requeria técnica jurídica refinada que os direitos
locais não podiam fornecer. Tal actividade utilizou-se mais das interpretações dos pós-glosadores
ou comentaristas, iniciada no século XII, com Accursius e ampliada por Bártolo, Cino de Pistóia
e Révigni, fundadores da Escola dos Dialécticos. Os comentaristas adaptaram o direito romano
às necessidades da época, conciliando-o com os direitos locais. No caso de dúvida ou de questão
complexa, era uso medieval solicitar parecer das universidades cujos professores eram
romanistas. Na Alemanha, o Direito Romano era exclusivamente fonte subsidiária, na falta de
leis ou de costume, a ele devia-se recorrer. Mas com o tempo, a perfeição técnica do direito
romano foi se impondo sobre o direito local, consuetudinário e fragmentário, passando a ser esse
direito, até 1900, o direito comum.

Eis aí, a recepção do Direito Romano que exerceu profunda influência na formação e na
evolução do direito privado ocidental e em consequência no Direito Moçambicano, por via do
Direito Português, por força da colonização.

6.2 Conceito de Código


No latim primitivo CAUDEX ou CODEX queria dizer tábua, prancha de madeira. Existe um
texto de Séneca em que se explica que por esse motivo é que se chamava códice às tábuas da lei
porque eram realmente escritas sobre tábuas de madeira.

O termo significava, portanto, o material em que se escrevia a lei, mas depois passou a designar a
própria lei . Independente do material em que estivesse escrita, chamamos código, por exemplo,
à grande laje de pedra em que Hamurabi mandou gravar, há 400 anos, as leis do seu império, e
chamamos igualmente códigos as antigas colecções de leis.

Mas a semelhança é apenas de palavras, sob o ponto de vista cultural, as antigas colecções de leis
e os modernos códigos são realidades completamente diferentes.

A colecção é uma simples reunião de materiais dispersos, agrupados com certa ordem, na
intenção de facilitar a consulta e o uso prático. O código não é isso. Pretende representar um

79
sistema homogéneo, unitário, racional, aspira a ser uma construção lógica completa, erigida sob
o alicerce de princípios que se supõem aplicáveis a toda a realidade que o direito deve
disciplinar.

O código reúne em um só texto, disposições relativas a uma ordem de interesse, podendo


abranger a quase totalidade de um ramo, como o Código Civil, ou alcançar apenas uma parcela
menor da ordem jurídica, como é a situação, por exemplo, os Códigos dos Impostos sobre os
Rendimentos das Pessoas Singulares (IRPS) ou o dos Rendimentos das Pessoas Colectivas
(IRPC).Não é a quantidade de normas que identificam o Código, podendo este apresentar maior
ou menor extensão. Há leis que são extensas e que não constituem códigos. Fundamental é a
organicidade, que não pode deixar de existir. O Código deve ser um todo harmónico, em que as
diferentes partes se entrelaçam, se complementam. As partes que compõem o Código
desenvolvem uma actividade solidária, há uma interpenetração nos diversos segmentos que o
integram, daí a dizer-se que os Códigos possuem organicidade.

Definições Importantes

Caro estudante, de uma forma simples podemos dizer que o Código é a reunião num mesmo
texto, segundo determinado critério sistemático e científico, de um conjunto de normas referentes
a um determinado ramo do Direito.

6.3 Código das Compilações e das Consolidações

Do ponto de vista técnico, podemos distinguir Código de Consolidação e Compilação. Aqui


chamamos de Código, lei nova sobre vasta matéria jurídica; enquanto por Consolidação,

80
uniformização de um direito preexistente, esparso e fragmentário. Já por Compilação, deve-se
entender a redacção, na forma escrita, de costumes e leis, muitas vezes adaptadas à época em que
são compilados. Os “códigos” da antiguidade eram mais compilações do que propriamente
códigos. Para nós, a mais importante compilação é o Corpus Juris Civilis.

Deste modo podemos dizer que o objectivo tanto da codificação como da consolidação e da
compilação é o mesmo: unificação do direito. Mas, no processo histórico, a consolidação
antecede a codificação.

6.4 Vantagens e Desvantagens da Codificação


A codificação acarreta consigo, vantagens e desvantagens, vejamos a seguir;

6.4.1 Vantagens da codificação:

 Permite um conhecimento fácil do Direito, tornando-o mais certo e preciso, contribuindo


desse modo para realizar a segurança jurídica;

 Impõe uma regulamentação unitária às matérias a que respeita, pelo que evita
contradições entre as várias leis e faz evidenciar os grandes princípios que regem as
matérias reguladas;

 Permite, pela sistematização científica dos vários preceitos, situar mais facilmente as
normas no seu contexto sistemático e detectar possíveis lacunas de regulamentação.

6.4.2. Desvantagens da codificação:

 Dificulta a evolução do Direito, conduzindo à sua cristalização, pela tendência dos


juristas a se apegarem aos códigos vigentes e resistirem, por vezes, até
inconscientemente, a inovações;

 Formaliza e torna mais rígido o Direito, tirando-lhe a maleabilidade e capacidade de


adaptação à evolução social.

81
7. Principais códigos existentes em moçambique

Caro estudante, os principais códigos existentes em Moçambique são:

 Código Civil;

 Código Penal;

 Código de Processo Civil;

 Código do Processo Penal;

 Código Comercial;

 Código do Registo Civil;

 Código do Notariado;

 Código do Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA);

 Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares;

 Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas; e

 Código de Imposto sobre o Consumo Específico.

8. Sistemas jurídicos

No mundo existem vários sistemas jurídicos, mas aqui vamos deter-nos nos mais conhecidos e
que mostram-se pertinentes para a nossa abordagem que são os sistemas romano-germânico, o
common law e o sistema socialista. Antes de falar destes sistemas, deve-se primeiramente saber
o que é um sistema jurídico.

82
Definições Importantes

Um sistema jurídico é o conjunto de regras, órgãos, doutrinas, ensinamentos leis, normas e


costumes que descrevem, organizam e modificam o ordenamento jurídico.

Cada sistema jurídico tem, como sua base, um tipo de direito. Por exemplo, o sistema romano-
germânico é baseado no direito romano; o common law é baseado no direito inglês; e o sistema
socialista é baseado nas ideias marxistas de que a sociedade ideal é uma sociedade que vive
harmonicamente e em paz sem o Estado e sem o direito.

O sistema romano-germânico e o common law são os sistemas que ocupam a maior parte do
mundo. O sistema socialista foi forte somente até ao fim da URSS que se desfez e se tornou
capitalista. Actualmente, Cuba é o representante mais forte do socialismo e, por isso, sofre
graves problemas económicos.

Além destes três sistemas, que foram os mais disseminados, há também, o direito mulçumano,
hindu, israelita, etc., fortemente ligados à religião, não havendo uma distinção certa do que é
direito e do que é religião.

8.1 Sistema Romano-germânico

8.1.1 Origem e Desenvolvimento


O Direito Romano teve origem quando foi fundada Roma, em meados de 754 A.C., e
permaneceu até à morte do Imperador Justiniano, em 565 D.C. São, portanto, cerca de treze
séculos de evolução. É até hoje o mais estudado porque foi o mais completo e sistemático.Com o
passar do tempo, tornou-se um vasto campo de observação do direitoAntes da Lei das XII
Tábuas, o direito era aplicado apenas aos cidadãos romanos e estava intimamente ligado à
religião, pois possuía características como formalismo, prática ritualística, simbolismo e
conservadorismo.

A Lei das XII Tábuas data de meados do século V A.C. e foi o primeiro texto legal a ser
publicado. Foi proposto no tribunal da plebeque o direito (as leis) fosse escrito para que não
fosse aplicado sem distinção e “abuso” pelos patrícios. Os plebeus lutaram durante oito anos

83
para que os patrícios aceitassem essa ideia e criassem tais tábuas, com leis baseadas nas leis
gregas de Sólon.

Em 476 D.C. as invasões bárbaras causaram a queda do Império Romano do Ocidente, e o


direito romano foi fundido com o direito comum, costumeiro, que era o direito dos bárbaros,
dando origem às leis romano-bárbaras. Entretanto, apesar de não ser estudado e nem muito
conhecido, o direito romano continuou a subsistir no Império Romano do Oriente (Império
Bizantino), a partir do século VI, com a publicação do Corpus Juris Civilis do imperador
Justiniano. Esta publicação não era nada mais que uma síntese do direito romano desde a Lei das
XII Tábuas até a queda do Império Romano.

No século XI, juristas italianos ”descobriram” o “Corpus Juris Civilis” e a partir de então se
passou a fazer um estudo sistemático do direito romano. Surgiram diversas universidades em
várias partes da Europa, sendo a pioneira de Bolonha a que mais exerceu influência no
aparecimento de outras universidades. Esse estudo, entretanto, era puramente histórico, não tinha
força de lei nem aplicação prática e, portanto, não constituía de fato um sistema jurídico. Os
direitos positivos de cada território (direitos locais, com força de lei) começam a ser estudados
nas universidades somente no século XVIII, com grande influência do direito romano.

O surgimento de um sistema romanista, propriamente dito, acontece no século XIII, durante a


época do Renascimento, quando o sistema feudal entra em declínio e se abandona a ideia de que
a ordem só é garantida dentro do ideal cristão. O direito romano foi visto como a única forma de
manter a ordem e a segurança para o desenvolvimento social, e então o sistema romano-
germânico difundiu-se e unificou juridicamente a Europa continental.

Actualmente, o direito romano não é aplicado em nenhuma jurisdição, mas seu estudo é
indispensável aos estudantes de direito de países de base romanista. A razão disto consiste em
que nenhuma outra legislação se equipara ao direito romano como instrumento de educação
jurídica, pois ele é o mais adequado para fazer compreender o fenómeno do direito e para formar
hábitos de raciocínio, necessários ao estudo de qualquer parte da ciência jurídica.

84
8.1.2 Expansão

Através dos descobrimentos e colonização de outros territórios realizadas pelas grandes


navegações do século XVI, principalmente por Portugal e Espanha, o direito romano e o sistema
jurídico de base romanista foi levado para outros continentes, como América do Sul e África.
Quando estes territórios adquiriram sua independência, muitos deles mantiveram como base
jurídica o direito romano, como é o caso do nosso país.

Além disso, alguns países, mesmo não colonizados por outros cujo sistema é romanista,
adoptaram este sistema. Um exemplo disto é o Japão que adoptou, por imitação, o sistema
romano-germânico.

8.1.3 Características

A lei é a fonte mais importante do sistema romano-germânico. Os direitos de tradição romano-


germânica são organizados em códigos; é típico deste sistema o caráter escrito do direito. As
normas jurídicas são gerais e, portanto, aplicadas por juízes em casos concretos. Percebe-se
então, imediatamente, a diferença entre este sistema e o sistema common law (anglo-saxónico),
cujos julgamentos de casos concretos baseiam-se na jurisprudência, isto é, em decisões judiciais
anteriores.

8.1.4 Fontes
São cinco as fontes do sistema romano-germânico actualmente: a lei, o costume, a
jurisprudência, a doutrina e os princípios gerais.

8.2 Sistema Common law

Este sistema jurídico foi formado no século XII, na Inglaterra, pelas decisões jurídicas reais.
Porém, este sistema começou a ser “esboçado” no século XI, em 1066, com a invasão do duque
de Normandia, Guilherme, às terras inglesas.

85
8.2.1 I Origem e Desenvolvimento

A Inglaterra fez parte do Império Romano do século I ao V, mas a romanização não foi
muito extensa e não deixou vestígios nas suas instituições jurídicas posteriores. A partir do
século VI, em consequência das invasões anglo- saxónicas, redigiram-se na Inglaterra as leis
bárbaras, textos de direito consuetudinário, isto é, direito costumeiro. Até o século XII o costume
foi a única fonte de direito na Inglaterra.

Em 1066, Guilherme, duque de Normandia, invadiu e conquistou a Inglaterra, importando então


o sistema feudalista para lá, mas manteve quase íntegros os costumes anglo-saxónicos. Nesta
época, os costumes eram diversos e podiam ser divididos em: costumes locais anglo-saxónicos;
costumes das cidades nascentes; e costumes dos mercadores. Estes costumes eram aplicados
em assembleias de homens livres, para resolver possíveis conflitos entre eles. Entretanto, devido
a grande diversidade de costumes locais, às vezes se fazia necessária a intervenção do rei para a
solução destes conflitos, o que acabou por unificar o direito, tornando-o common Law, isto é, um
direito “comum” a todas as localidades. O common Law se diferenciava do direito costumeiro
pois tinha como base a jurisprudência, processos anteriores, e não o direito comum de cada povo
ou tribo, por estes serem muito particularizados.

Inicialmente, as cortes locais do rei julgavam somente casos excepcionais. O rei, porém,
percebeu que obteria muitas vantagens provenientes de cobrança de taxas e também de
“alargamento” do seu poder se dividisse as cortes locais em tribunais autónomos para julgar
casos específicos e atender a todos os súbditos (toda a população). Os tribunais autónomos foram
divididos em três: tribunal do tesouro (finanças e litígios fiscais); tribunal de queixas comuns
(processos entre particulares em relação à posse de terras); e tribunal do banco do rei (crimes
praticados contra a paz do reino).

Com isto, a corte dos reis (Curia Regis) passou a ser o centro administrativo e jurídico do novo
reino: qualquer pessoa podia requerer pela jurisdição do rei. Tal requerimento era feito a um
chanceler do rei, que o examinava e, se o considerasse importante o suficiente, enviava uma
ordem chamada “writs” a um xerife ou senhor nobre para que ordenasse o réu a dar satisfação
àquele que deu queixa. Entretanto, chegou uma época em que o chanceler emitia um writa

86
qualquer um que pagasse para tal, sem examinar o caso. Isto fez com que os barões e nobres
lutassem contra tal atitude para evitar a expansão do poder do rei, isto é, da jurisdição real.
Assim, conseguiram a criação do estatuto de Westminster, que proibia o chanceler de criar novos
writs, podendo utilizar-se somente dos já existentes, inclusive em casos semelhantes.

O direito da Inglaterra desenvolveu-se até o século XIX baseado na lista de writs, que passaram a
constituir acções judiciais sob a forma de ordens do rei, e em cada caso concreto era necessário
aplicar o writ correspondente. Isto permanece até os dias actuais.

8.2.2 Expansão
Da mesma forma que o sistema romano-germânico, a expansão do common Law deu-se através
da colonização inglesa em diversos países, como: Estados Unidos, Canadá, Irlanda, País de
Gales, Austrália, Nova Zelândia, Jamaica (e outros países da América Central), África Central,
Índia, Birmânia, Malásia, etc. Os resultados, porém, foram diferenciados em cada lugar.

8.2.3 Características

É um direito baseado em precedentes judiciais (jurisprudência – judge-made- law) e a lei escrita


exerce muito pouca influência, bem como os costumes locais, em contradição com o direito
romano. Devido à jurisprudência, os juízes de tribunais inferioresdevem,
obrigatoriamente,adoptar as decisões judiciais superiores em um caso semelhante. Os juízes de
tribunais superiores devem adoptar as decisões judiciais proferidas anteriormente pelos mesmos
tribunais, ou, se não concordarem com as decisões de um tribunal inferior, podem não levá-las
em consideração e criar um novo precedente. Em caso de não haver precedentes para um caso, o
juiz pode criar o seu precedente judicial, baseado nos princípios do direito.

Além disso, a Inglaterra continua a ser um país sem códigos nem constituições escritas. Não
possuem, como outros países, um texto reunindo o conjunto de regras do direito constitucional.
O seu direito constitucional baseia-se nos costumes e nos precedentes. Entretanto, a ideia de
uma codificação generalizada aparece desde o século XVI, mas aconteceu somente a
compilação das leis já existentes e uma espécie de código de vendas.

87
Nos Estados Unidos da América, o common Law é uma forma de unificar o direito no país, pois
cada estado possui sua própria constituição. Não obstante, em contraposição ao sistema na
Inglaterra, nos Estados Unidos dá-se grande importância à constituição escrita (o que não existe
na Inglaterra) e às leis. Somente um Estado nos EUA, Luisiana, segue o sistema romano-
germânico.

O Canadá seguiu um desenvolvimento semelhante ao dos EUA, e somente em Quebec se


manteve o direito de base romanista.

No decorrer dos séculos XIV e XV, o common Law tornou-se mais técnico e incapaz de resolver
novos litígios causados pelo desenvolvimento económico e social, tendo que basear-se somente
aos “writs” já existentes. Os juízes dos tribunais, embora fossem nomeados pelo rei, haviam
adquirido certa independência destes, e o facto de não desejarem recorrer directamente ao rei, e
ao chanceler fez com que surgisse uma nova jurisdição e processo: o chanceler decidia em
equidade sem levar em consideração as regras nem as bases do common Law. Era inspirado pelo
direito canónico e o chanceler julgava segundo critérios do próprio direito romano.

Os reis da Inglaterra, no decorrer do século XVI, deram mais abrangência aos poderes da equity,
pois eram mais favoráveis ao absolutismo e as jurisdições do “Common Law” foram se tornando
cada vez mais arcaicas e obsoletas. No século XVII, passou a subsistir um sistema duplo de
direito: “Common Law “e “equity”, devido aos conflitos entre rei e parlamento.

Em 1873 e 1875 houve a fusão dessas duas jurisdições, e as regras da equity ficaram integradas
às do common Law.

8.2.4 Fontes do Common Law

São três as fontes do sistema common Law: a jurisprudência, o costume e a lei (em ordem de
importância).

88
8.2.5 A Jurisprudência

O common Law segue o princípio do “stare decisis”, isto é, o princípio de seguir regras
estabelecidas por precedentes judiciários; é um direito jurisprudencial e, portanto, a
jurisprudência é a principal fonte do direito.

A jurisprudência segue uma hierarquia como fonte do direito: as decisões tomadas pela Câmera
dos Lordes devem, obrigatoriamente ser seguidas, como precedentes para os tribunais; as
decisões adoptadas pelo Court of Appel, obrigam como precedentes, para as jurisdições
inferiores; e as decisões tomadas pelo High Court of Justice obrigam também as jurisdições
inferiores.

8.2.6 O Costume

O costume vem do período anglo-saxónico e deu origem ao sistema de “common law”. A


jurisprudência tomou o lugar dos costumes, mas, ainda hoje, os costumes anglo-saxónicos
exercem certa influência no direito inglês.

8.2.7 A Lei

A lei tem um papel secundário na formação do direito inglês. A Inglaterra não tem uma
constituição escrita; as leis servem mais para acomodar situações novas, surgidas após a Segunda
Guerra Mundial,para disciplinar o crescimento urbano, a manutenção da previdência social, o
sistema de educação e de saúde.

8.3 O Sistema Socialista


O socialismo é uma forma de governo que vem sendo pensada desde a época dos filósofos
antigos, que procuravam soluções para a desigualdade social. O ponto culminante do socialismo
acontece na Revolução Russa, em 1917. Está intimamente ligado ao comunismo, pois o sistema
socialista é a fase precedente e transitória para o comunismo, quando a sociedade se “prepara”

89
para viver uma forma de vida sem governo e nem estado onde tudo é de todos, não há
propriedade privada.

8.3.1 Origem e Desenvolvimento

A base filosófica do sistema socialista é o marxismo-leninismo. Karl Marx e Engels conceberam


sua teoria no século XIX e foi adaptada por Lenine no início do século XX, época em que a I
Guerra Mundial tornou possível a tomada do poder pelo proletariado na Rússia.

8.3.2 A Doutrina Marxista

A doutrina marxista é baseada no materialismo histórico e distingue dois elementos em toda


a sociedade: a infra-estrutura e a superestrutura. A infra-estrutura são as forças de produção, isto
é, compreende o meio físico, os recursos naturais, a produção económica, etc. A superestrutura
compreende as artes, a moral, a religião, o Estado, ou seja, toda aideologia de uma sociedade;
desta forma, reflecte as relações de produção.

Segundo a concepção marxista do direito, este seria, necessariamente, injusto e deveria


desaparecer de uma sociedade ideal e sem classes, pois o direito permite a classe dominante
manter a posse dos bens e explorar a classe dominada. A única forma de parar a exploração de
uma classe social por outra era abolindo as classes sociais, através do fim da propriedade privada
e da disposição colectiva de todos os meios de produção.

8.3.3 A Doutrina Marxista-leninista

Karl Marx e seus seguidores haviam previsto um período transitório de transformação


revolucionária, entretanto não aprofundaram estudos sobre este período. Além disso,
acreditavam que a revolução aconteceria em um país industrial e que logo se tornaria universal.
Por isso, no início do século XX, Lenin e outros dirigentes russos precisaram adaptar a teoria
marxista a outra realidade, pois a Rússia ainda era um país quase que totalmente agrário repleto
de deficiências e cercado por países capitalistas.
90
Segundo a doutrina marxista-leninista, para passar do capitalismo ao comunismo a classe social
explorada deveria movimentar-se contra a classe de posses, ou seja, deveria haver uma luta de
classes.

8.3.4 Bolcheviques e Mencheviques

Estes movimentos socialistas de luta de classes, desde o princípio, apresentaram divergências e,


após a I Guerra Mundial, dividiram-se em dois: os bolcheviques (Internacional Comunista) e os
mencheviques (Internacional Socialista). Os bolcheviques eram marxistas revolucionários russos
radicais (Revolução do Proletariado), enquanto que os mencheviques eram um grupo social-
democrata alemão mais moderado (socialismo via processo parlamentar).

Os bolcheviques acabaram por triunfar sobre os mencheviques no contexto socialista-comunista.

8.3.5 O Estado Socialista e a Passagem para o Comunismo

A guerra civil e a guerra exterior, entre 1917 e 1921, perturbaram a organização do novo regime
político na Rússia. Os dirigentes comunistas tentaram instaurar o comunismo através de medidas
radicais, como nacionalização das terras e indústrias, supressão do direito de sucessão e também
do antigo direito e dos antigos tribunais, e foi também promulgada uma nova constituição.
Entretanto, não foram medidas muito realistas, pois se aplicavam somente à Rússia, que era a
única neste processo até então.

Em 1921, como ainda restavam muitos problemas na Rússia, foi imposta uma concepção mais
realista com tendência a uma edificação progressiva do socialismo (fase transitória para o
comunismo), ao contrário do carácter repentino que tiveram as medidas iniciais. Criou-se,
provisoriamente, a N.E.P. (Nova Política Económica), que tinha muitos aspectos do capitalismo
e até mesmo adoptou a técnica capitalista.

Sob o ponto de vista económico, a N.E.P. foi um sucesso. As produções agrícolas e industriais
cresceram e o comércio foi dinamizado. Entretanto, gerou vantagens para certos grupos sociais, o
que contrariava o carácter socialista do Estado. Em 1926, abandonou-se a N.E.P. para se

91
proceder a reformas agrárias e industriais profundas no domínio económico, no sentido da
colectivização.

Em 1977 foi aprovada uma nova Constituição, e esta constatava que a ditadura do
proletariado havia desempenhado o seu papel histórico e que o Estado soviético havia se tornado
um Estado de todo o povo, e a sociedade soviética era referida como uma sociedade socialista
desenvolvida, pois era necessário passar por esta etapa para se chegar ao comunismo.

Neste ponto, após a II Guerra Mundial, vários países europeus já haviam aderido ao sistema
socialista russo, e tal união foi nomeada de URSS – União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

8.3.6 Fim da URSS

Em razão da URSS se manter isolada economicamente da maior parte do mundo, a sua indústria
tornou-se atrasada. Antes, era um grande exportador de alimentos; depois, passou a ser
importador. Com o declínio da actividade industrial e agrícola, surgiram inúmeros problemas
sociais, principalmente o aumento do desemprego.

Em 1985, com a entrada de Mikhail Gorbatchev, a União Soviética passou por bruscas mudanças
políticas, económicas e sociais. Ciente dos problemas que o país passava, Gorbatchev propôs
dois planos: a “perestroika” (reestruturação) e a “glasnost” (transparência). A perestroikaera um
conjunto de medidas que propunha modernizar e dinamizar a economia do país. Assim, o plano
autorizava a existência de empresas privadas, a entrada gradual de multinacionais e estimulava a
concorrência entre as empresas. Já a glasnost previa a diminuição da actuação do Estado na vida
do cidadão, ou seja, nas questões civis. Por meio da glasnost, foi dada liberdade de expressão, os
presos políticos foram soltos, etc.

Com essas profundas mudanças, tornou-se claro que a União Soviética estava chegando ao fim.
Temendo o quadro político que estava instalado na Rússia,as outras repúblicas começaram a
exigir autonomia. Em 1991, quase todos os países já eram independentes. O fim definitivo da
URSS foi oficializado em 21 de Dezembro de 1991, com a criação da Comunidade dos Estados
Independentes (CEI), organização supranacional formada por Rússia, Ucrânia, Bielo-Rússia,
Cazaquistão e Uzbequistão.

92
8.3.7 Expansão

Após a II Guerra Mundial, vários países da Europa adoptaram o socialismo (Tchecoslováquia,


Hungria, Polônia, Romênia, etc.), seguidos pela China (1949). A partir de 1950, vários países
dependentes, na sua luta anti-imperialista, instituíram o socialismo por meio de revoluções
populares (Angola, Cuba, Vietname, Camboja etc.).

Actualmente, o único país que se mantém firme sobre as bases socialistas é Cuba, mesmo
sofrendo por privações económicas devido à pressão de países capitalistas.

8.3.8 Características
Num país de sistema socialista, as principais características encontradas são: estatização dos
meios de produção, isto é, não há propriedade privada; desenvolvimento social como objectivo,
pois o mais importante, num Estado socialista, é a igualdade entre os indivíduos, impedindo que
existam classes sociais; economia planificada estatal (centralizada), ou seja, não há espaço para
empresas privadas ou internacionais; redistribuição da renda: o trabalho é pago de acordo
com a quantidade e a qualidade, uma pessoa recebe de acordo com o que pode produzir e suas
necessidades.

Pela caracterização dos três sistemas, atrás descrito facilmente podemos enquadrar Moçambique
no sistema apropriado, identificar as influências a que Moçambique está sujeito pelo facto de
situar-se numa zona dominada por um sistema jurídico distinto do seu, no caso o Common law.

Tarefas

Discuta as seguintes questões

1. Validade do critério da posição dos sujeitos para a divisão do Direito em Ramos;

2. Codificação dos Costumes nos países Africanos e em Moçambique em particular;

93
3. Influência que o ordenamento jurídico Moçambicano poderá ou está já a sofrer pelo facto de
estar rodeado de países guiados pelo Sistema de Common Law e tendo em atenção o
processo de integração regional na SADC ora em curso.

4. Apresente a Cronologia da Codificação em Moçambique, tendo como referência os Códigos


arrolados no texto da nossa Unidade.

Auto-avaliação

1. Sobre os ramos do direito

a) Apresente o conceito de fontes de Direito e proceda a distinção entre fontes imediatas e


mediatas
b) Aponte as razões pelas quais existe um Ramo de Direito Privado Especial;
c) Defina Direito Público. Quais são as suas características?
d) Defina Direito Privado. Quais são as suas características?

2. Sobre a Codificação
a) Defina-a;
b) Apresente as vantagens e desvantagens da mesma;

3. Sobre os sitema jurídico:

a) Defina-o;
b) Pelo facto de Moçambique ter sido a linha socialista durante os primeiros 15 anos de
Independência, podemos afirmar que o nosso ordenamento Jurídico se enquadra no
Sistema Socialista? Fundamente.

94
Chave-de-correcção

1 a) Fontes de Direito, são modos de formação e revelação das normas jurídicas. As fontes
imediatas são que têm força vinculativa própria, sendo portanto os verdadeiros modos de
produção do Direito. Ex: A Lei. As fontes mediatas, não tendo força vinculativa própria,
são contudo importantes pelo modo como influenciam o processo de formação e revelação
da norma jurídicas. Ex: O costume, jurisprudência e doutrina.

b) O ramo do Direito privado especial é assim designado, pelo facto de nos dois ramos que a
seguir se discriminam o Estado agir como ente público, na medida em que ele é que
aprova o Código Comercial e a Lei do Trabalho e age como ente privado, em pé de
igualdade com os demais sujeitos, por exemplo quando contrata trabalhadores a luz da
Lei do Trabalho e pratica actos do comércio sob égide da lei Comercial.

c) Direito Publico, disciplina as relações jurídicas que se estabelecem entre o Estado (ou
outros entes públicos) os particulares, intervindo o Estado numa posição de supremacia,
isto é, como entidade dotada de poder soberano << imperium>>;

d) As normas de Direito Privado, regulam as relações sociais entre particulares ou em que


intervenham o Estado (ou outros entes públicos) desprovidos do seu <<imperium>>.

2 a) Código é a reunião num mesmo texto, segundo determinado critério sistemático e c


ientífico, de um conjunto de normas referentes a um determinado ramo do Direito.

b) As vantagens da codificação são as seguitens: permite um conhecimento fácil do Direito,


tornando-o mais certo e preciso, contribuindo desse modo para realizar a segurança
jurídica, impõe uma regulamentação unitária às matérias a que respeita, pelo que evita
contradições entre as várias leis e faz evidenciar os grandes princípios que regem as
matérias reguladas e permite, pela sistematização científica dos vários preceitos, situar,
mais facilmente, as normas no seu contexto sistemático e detectar possíveis lacunas de
regulamentação.

Em contraposição tem as suas desvantagens a saber:dificulta a evolução do Direito,


conduzindo à sua cristalização, pela tendência dos juristas a se apegarem aos códigos
vigentes e resistirem, por vezes até inconscientemente, a inovações e formaliza e torna

95
mais rígido o Direito, tirando-lhe a maleabilidade e capacidade de adaptação à evolução
social.

3 a) Um sistema jurídico são conjuntos de regras, órgãos, doutrinas, ensinamentos leis,


normas e costumes que descrevem, organizam e modificam nosso ordenamento
jurídico;

b) Não, Moçambique apenas teve influência política, contudo manteve na essência o


carácter romano-germânico do seu ordenamento jurídico.

Resumo
Caro estudante, como vimos ao longo da unidade, odemos dizer que o Direito se divide em dois
grades ramos, o público e o privado, que por sua vez contemplam subdivisões, tudo com o
objectivo de tutelar melhor as relações jurídicas, por via do tratamento específico das situações
específicas.

Ainda mais percebemos que a Codificação, apesar das desvantagens e da resistência de algumas
áreas do Direito, se mostra de extrema importância, pois permite a unificação do Direito, através
da reunião,num mesmo texto, segundo determinado critério sistemático e científico, de um
conjunto de normase referentes a um determinado ramo do Direito

Os sistemas jurídicos entendidos como conjuntos de regras, órgãos, doutrinas, ensinamentos leis,
normas e costumes que descrevem, organizam, e modificamum ordenamento jurídico não se
formaram num só dia, simplesmente, porque se achou necessário. Pelo contrário, todos têm uma
história de origem e desenvolvimento e levaram anos para chegarem ao nível de
desenvolvimento em que estão agora.

Ao longo da unidade, notamos, também que, embora os países colonizadores tenham exportado
as bases dos sistemas de vários outros países colonizados, nem todos permaneceram iguais às
suas origens. Os Estados Unidos, por exemplo, seguem um sistema common law que em muito
difere do que é aplicado na Inglaterra. Ou seja, os sistemas jurídicos desenvolveram-se de acordo

96
com as características e necessidades de sua sociedade e não são imutáveis, pois ainda hoje
diversas mudanças são feitas para que o direito se adapte às novas regras e costumes sociais de
cada geração.

Bibliografia

Ascensão, J. O. (1997). O Direito – Introdução e Teoria Geral. Almedina

Bigote Ch, M. (1997). Temas Fundamentais de Direito, Almedina

Caetano, M. (1997). Manual de Direito Administrativo. Almedina

João, B. (1997). Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Almedina

Latorre, A. (1978). Introdução ao Direito. Coimbra

Marques, J. D. (1986). introdução ao Estudo do Direito. Editora Danúbio, Lda, Lisboa

Mendes, J. C. (1994). Introdução ao Direito. Editora Pedro Ferreira, Lisboa

Pereira, N. (1992). Introdução ao Direito e as Obrigações. Almedina

Telles, I. G. (1991). Introdução ao Estudo do Direito. Biblioteca Universitária, Publicação


Europa-América

_________________

Legislação
Constituições da Repblica de ão da República de Moçambique de 1975, 1990 e 2000, 2004.

Código Civil.

97
Unidade Didáctica nº 4:Relação Jurídica

Introdução

Bem-vindo à Unidade IV, nesta unidade você irá estudar sobre a Relação Jurídica.

Caro estudante, a vida em sociedade realiza-se através de uma multiplicidade de relações sociais
determinadas pela necessidade de vida em comum. Quando o Direito intervém para as regular,
elas transformam-se em relações jurídicas.

Deste modo podemos dizer que, a ordem jurídica se desenvolve numa complexa teia de relações
intersubjectivas, tuteladas pelo Direito, e que vamos analisar ao longo da unidade didáctica.

Para que você acompanhe e consolide melhor esta unidade aconselhamos o uso do Código Civil,
preferencialmente o anotado.

Objectivos da Unidade

Ao completar esta unidade, você deve ser capaz de:

 Delimitar a noção de elementos da relação jurídica e saber identificar cada um dos


elementos num caso concreto;

 Definir os conceitos de sujeito, objecto, facto, garantia, personalidade, capacidade,


prestação, coisa;

 Identificar e caracterizar uma relação jurídica, nas suas diversas variantes;

 Distinguir a relação jurídica da situação jurídica;

 Justificar a preferência actual da doutrina pelo conceito de situação jurídica, no lugar do


de relação jurídica;

98
Desenvolvimento do conteúdo

1. Relação social: noção e espécies

Caro estudante, ao falarmos de relação jurídica, antes, temos que falar das situações sociais, que
se revelam nas relações entre as pessoas, isto é, casos da vida real, e estes, conforme a
importância que têm ou não têm na vida da comunidade, podem ou não ter protecção jurídica.
Deste modo podemos dizer que, as situações jurídicas se dividem em dois grandes grupos
nomeadamente:

a) Situações sociais ajurídicas, as que que não têm protecção legal, não têm relevância
para o Direito;

b) Situações sociais jurídicas, as que têm importância na vida das sociedades tornam-se
dignas de proteção legal e por isso mesmo, estão tuteladas pelo Direito.

2. A relação jurídica

2.1 Noção
Caro estudante, a seguir vamos debruçar-nos sobre a Relação Jurídica pela sua importância para
a Teoria Geral do direito Civil e porque, em certo sentido, redunda uma Teoria Geral do direito
Subjectivo.

A Expressão relação jurídica pode ser tomada em dois sentidos, nomeadamente: Amplo e
Restrito ou técnico.

99
Definições Importantes

Num sentido amplo, chamamos de relação jurídica toda e qualquer relação da vida social
disciplinada pelo direito, isto é, juridicamente relevante.

Caro estudante, esta noção é extremamente ampla e vaga, e apenas não estão incluídas neste
sentido as relações da vida social estranhas ao direito como a amizade, gratidão, etc.

Num sentido restrito ou técnico, chamamos de relação jurídica a relação da vida social
disciplinada pelo direito, mediante a atribuição a um sujeito de um direito subjectivo e a
imposição a outro de um dever jurídico ou de uma sujeição.

Portanto, este último é o que nos interessa para o nosso estudo nesta unidade.

2.2 Elementos da relação juridica


Caro estudante, o conceito de relação jurídica pressupõe um conjunto de elementos cuja
sistematização tradicional é a seguinte:

2.2.1 Sujeitos

Da relação jurídica, são as pessoas entre as quais ela se estabelece. São os titulares do direito
subjectivo e das posições passivas correspondentes – dever jurídico ou sujeição.

a) o objecto é aquilo sobre o que recai os poderes do titular do direito (por exemplo, coisas
ou prestações).
b) o facto jurídico é todo o acontecimento natural ou acção humana produtivo de efeitos ou
consequências jurídicas.

Esse efeito poderá ser o de criar, modificar ou extinguir uma relação jurídica.

100
2.2.2 A Garantia

É a susceptibilidade de protecção coactiva da posição do sujeito activo da relação jurídica pode


recorrer aos meios coercivos que a lei põe à sua disposição para obter a satisfação do seu direito
no caso de violação ou de ameaça de violação do mesmo.

Tendo em conta o que dissemos anteriormente, a seguir apresentamos um exemplo de uma


relação jurídica:

Supunhamos que Alberto vendeu a Bonifácio uma casa. Estabeleceu-se entre ambos uma relação
em que se distinguem os seguintes elementos:

Sujeitos – Alberto e Bonifácio

Objecto – a casa

Facto jurídico – o contrato de compra e venda

Garantia – a faculdade que Alberto e Bonifácio dispõem de recorrer ao tribunal para obrigar o
outro a cumprir a sua obrigação, no caso de recusa.

Com o exemplo acima você foi capaz de perceber e identificar melhor os conceitos, sujeito,
objecto, facto jurídico e garantia.

3. Direitos e deveres jurídicos ou sujeições

Como vimos anteriorimente, toda a relação jurídica existe entre sujeitos. Dentro do nexo ou
vínculo que une os sujeitos, podemos distinguir da seguinte forma:

 O lado activo correspondente ao titular do direito subjectivo (sujeito activo).


 O lado passivo correspondente ao titular do dever jurídico ou sujeição (sujeito passivo).

101
Definições Importantes

O direito subjectivo – é o poder atribuído, pela ordem jurídica, a uma pessoa de livremente
exigir ou pretender de outra certo comportamento positivo (acção) ou negativo (omissão), ou de,
por um acto de uma autoridade pública, produzir determinados efeitos jurídicos inevitáveis na
esfera jurídica alheia.

Deste modo, podemos dizer que só existe um direito subjectivo quando o seu titular é livre de
exercer ou não, o que significa que o exercício do poder conferido por esse direito está
dependente da vontade do respectivo sujeito.

3. 1 Os Sujeitos
Sujeitos de Direito são as entidades susceptíveis de serem titulares de relações jurídicas.

Há que distinguir, como já referimos, o sujeito activo – titular do direito subjectivo – e o sujeito
passivo adstrito à vinculação (dever jurídico ou sujeição). Em qualquer dos lados da relação
jurídica, pode haver unicidade ou pluralidade de sujeitos. Estes podem ser pessoas singulares ou
colectivas consoante se trate de indivíduos ou organizações. Portanto, podemos dizer que o
sujeito de direito é necessariamente pessoa em sentido jurídico.

Como pessoas jurídicas que são, os sujeitos são dotados de personalidade jurídica, que é a
aptidão para ser titular de relações jurídicas, ou seja, de direito e vinculações.

Também, o Direito Objectivo atribui personalidade jurídica a certas organizações que têm um
substrato social e uma individualidade própria tais como uma sociedade comercial, um partido
político ou um sindicato, para que possam ser titulares de relações jurídicas e para uma melhor
consecução dos fins sociais ou colectivos que se propõem.

Caro estudante, estes são exemplos de pessoas colectivas, os quais mencionamos anteriormente.

102
3.2 Pessoas Singulares

Caro estudante, na história do Direito, são conhecidas situações em que a personalidade jurídica
era negada a certos seres humanos – os escravos – que eram tratados no Direito Romano como
coisas, isto é, como objecto de direito e não como sujeito destes.

Idêntica situação recaía sobre determinadas pessoas autoras de crimes graves, a que
correspondiam também certas penas criminais graves, extintivas da personalidade jurídica.

O Direito moderno, dando expressão a uma exigência da natureza e de dignidade do homem,


orienta-se no sentido de reconhecer a personalidade jurídica a todos os homens, condição
indispensável a realização dos seus fins e interesses na vida social.

3.3 Personalidade Jurídica

Se alguém ou alguma entidade é titular de um direito ou sujeito a uma obrigação, é porque o


pode ser. E esta aptidão de ser titular de direitos e obrigações constitui uma figura muito
importante do direito, a qual chamamos de personalidade jurídica.

Por outras palavras chamamos de personalidade jurídica a susceptibilidade de ser titular de


direitos e de obrigações.

Titularidade é a ligação efectiva entre o direito subjectivo e a pessoa em quem está investido.

3.3.1 Começo e termo de personalidade


A personalidade jurídica é inerente a todos os seres humanos, pois radica na sua natureza e
pertence-lhe por direito originário. Vamos ver alguns artigos do Código Civil a seguir.

Artigo 66º do Código Civil

(Começo da personalidade)

1. A personalidade adquire-se no momento do nascimento completo e com vida.

2. Os direitos que a lei reconhece aos nascituros dependem do seu nascimento.


103
Art. 68º do Código Civil

(Termo da personalidade)

1. a personalidade cessa com a morte.

2. …

3. …

3.3.2 Direitos de Personalidade

À personalidade jurídica estão ligados certos direitos fundamentais, os chamados direitos de


personalidade. Nesta designação os poderes jurídicos pertencentes a todas as pessoas por força
do nascimento e que se impõem ao respeito de todas as outras.

São verdadeiros direitos subjectivos que têm por objecto certas manifestações de personalidade
humana física, a sua honra, a sua liberdade física e psicológica, a sua imagem, o seu nome, a
intimidade da sua vida privada, etc.

É este um círculo de direitos necessários; um conteúdo mínimo e imprescindível da esfera


jurídica de cada pessoa. Podemos classificá-los de:

Gerais – porque todos os possuem;

não patrimoniais ou pessoais – porque não são susceptíveis de expressão pecuniária, embora a
violação desses direitos possa implicar uma reparação monetária.

Absolutos – porque lhes corresponde um dever geral de respeito.

Caro estudante para consolidar estes conteúdos leia o artigo 70 e seguintes do Código Civil.

Nos nossos dias, multiplicam-se as iniciativas em torno da defesa dos direitos do homem, tanto a
nível de Estado como de organizações privadas de renome internacional, como é o caso da“
Amnistia Internacional“ criada em 1961, á qual foi atribuído o Prémio Nobel da Paz em 1977.

Em Moçambique, temos a Liga de Defesa dos Direitos Humanos, que visa a defesa da dignidade
da pessoa humana e denunciar as violações que os direitos do homem sofrem ainda em grande
número de Estados contamporâneos.

104
3.4 Capacidade Juridica

A capacidade jurídica ou capacidade de gozo de direitos é inerente à personalidade jurídica,


podemos ver o artigo a seguir.

Artigo 67º do C.C.

As pessoas podem ser sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição legal em
contrário; nisto consiste a sua capacidade jurídica.

Sendo assim, podemos dizer que a capacidade de gozo de direitos é, assim, o conteúdo
necessário da personalidade jurídica, já que esta compete a todas as pessoas e é, como sabemos,
a aptidão para ser sujeito de relações jurídicas.

Enquanto a personalidade jurídica é um conceito puramente qualitativo, pois se refere apenas à


condição jurídica da entidade em causa, a capacidade jurídica tem um sentido qualitativo, pois, a
medida de direitos e vinculações de que cada um pode ser titular é variável.

Mais rigorosamente podemos dizer que a capacidade jurídica é a aptidão para ser titular de um
círculo maior ou menor de relações jurídicas.

Distinta desta noção é a de capacidade de exercício de direitos ou capacidade de agir, que


significa a medida de direitos e vinculações que a pessoa pode exercer ou cumprir por si, pessoal
e livremente.

Nota-se que o que está agora em causa não é já a aptidão para a titularidade, mas sim para o
exercício de direitos.

Enquanto a capacidade jurídica é uma simples condição de gozo, uma posição estática, a
capacidade de agir denota uma actividade dinâmica, o poder de pôr em movimento os direitos,
de produzir transformações mediante actuação jurídica própria

Em princípio todas as pessoas singulares, ao atingirem a maioridade, adquirem capacidade de


exercício que resulta do preceituado nos artigos 130/133 (ambos, do Código Civil).

Artigo 130º do Código Civil

Efeitos da maioridade

105
Aquele que perfizer vinte e um anos de idade adquire plena capacidade de exercício de
direitos, ficando habilitado a reger a sua pessoa e a dispor dos seus bens.

Artigo 133º do Código Civil

Efeitos da emancipação

A emancipação atribui ao plena capacidade de exercício de direitos, habilitando-se a reger


a sua pessoa e a dispor livremente dos seus bens como se fosse maior, salvo o disposto nos
artigo 136º e 1649º.

No entanto, a lei reconhece como possível certas situações excepcionais – as incapacidades.

Com efeito, pode suceder uma pessoa ser titular de direitos, isto é, ter capacidade de gozo e não
os poder exercer por lhe faltar a necessária idoneidade para actuar juridicamente, ou seja, a
necessidade capacidade de exercício de direito.

Vejamos o exemplo, os menores e os dementes, embora sejam titulares de direitos, não os podem
exercer pessoal e livremente.

A incapacidade de exercício pode ser genérica ou especifica (consoante se refira aos actos
jurídicos em geral ou a alguns em especial), e pode ser suprida.

Deste modo, não podendo certas pessoas exercer os seus direitos, torna-se necessário recorrer a
certas formas legais de suprimento da incapacidade de exercício e que são.

 Instituto da representação legal,

 Instituto da assistência.

A representação, consiste em ser admitida a agir outra pessoa em nome e no interesse do


incapaz; juridicamente é como se fosse o incapaz a agir. Essa pessoa – representante legal – é
designada pela lei ou em conformidade com ela.

Vejamos o exemplo: os pais quando agem pelos filhos menores; os tutores, na linguagem da
actual Lei de Família Moçambicana, exercem o Poder Parental.

Aassistência, a outra forma de suprimento da incapacidade, tem lugar quando a lei permite agir
oassistente.

A situação oposta à capacidade de gozo de direitos é, como é óbvio, a incapacidade de gozo.

106
Em regra, qualquer pessoa pode ser titular de quaisquer direitos ou adstrita a quaisquer
vinculações, tal vimos no artigo 67º do Código Civil, nisso consiste a sua capacidade jurídica
(capacidade de gozo).

No entanto, esse mesmo preceito revela que podem existir excepções: “As pessoas podem ser
sujeitos de quaisquer relações jurídicas, salvo disposição…“

O menor, tendo como todas as pessoa singulares capacidade geral de gozo, sofre de certas
incapacidades concretas de gozo, artigo 123, do Código Civil, que lhes retira respectivamente a
possibilidade de poderem ser tutores ou testar. Na mesma situação se encontram os interditos

A incapacidade de gozo é insuprível, isto é, o incapaz não pode ser substituído na prática dos
actos jurídicos a que ela se refere, nem os pode praticar com autorização de outra entidade sob
pena de nulidade dos mesmos.

3.4.1 As incapacidades de exercicio

Caro estudante, as principais incapacidades de exercicio estabelecidas pelo Código Civil são:

 Menoridade

 Interdição

 Inabilitação

O interesse visado com o estabelecimento das incapacidades é determinado pela defesa dos
interesses do próprio incapaz

Analisaremos agora separadamente cada uma das incapacidades citadas

a) Incapacidade por menoridade

Artigo 122º do Código Civil

Menores

São menores as pessoas de um e outro sexo enquanto não perfizerem vinte e um anos de
idade.

Artigo 123º do Código Civil

107
Incapacidade dos menores

Salvo disposição em contrário, os menores carecem de capacidade para o exercicio de


direitos.

Apesar da incapacidade geral de exercicio de que sofrem, têm, porém, os menores


algumas capacidades concretas de exercicio, em conformidade com a ressalva inserta
neste artigo.

Artigo 127º do Código Civil

Excepções à incapacidade dos menores

1. São, excepcionalmente válidos, além de outros previstos na lei:

a) Os actos de administração ou disposição dos bens que o menor haja adquirido por
seu trabalho ou industria, vivendo sobre si com premissao dos pais, ou pelas
armas, letras ou profissão liberal, vivendo ou não em companhia dos pais;

b) Os negócios jurídicos, próprios da vida corrente do menor que, estando ao alcance


da sua capacidade natural, só impliquem despesas, ou disposição de bens, de
pequena importância;

c) Os negócios jurídicos relativos à profissão, arte ou ofício que o menor tenha sido
autorizado a exercer ou os praticados no exercício dessa profissão, arte ou ofício.

2. Pelos actos relativos à profissão, arte ou ofício do menor e pelos actos praticados no
exercício dessa profissão, arte ou ofício do menor e pelos actos praticados no
exercício dessa profissão, arte ou ofício só respondem os bens de que o menor tiver
livre disposição.

A forma de suprimento comum da incapacidade de exercício dos menores é a


representação. (artigo 124º do Código Civil)

Os meios de suprimento desta incapacidade através do instituto de representação, são


o o poder parental e a tutela.

Os negócios jurídicos praticados pelo menor ferido de incapacidade de exercício são


anuláveis (artigo 125º do Código Civil).

108
Assim, se um menor for proprietário de um prédio urbano e vende esse mesmo
prédio, tal contrato é anulável.

b) Incapacidade por interdição

Esta incapacidade, a mais grave, resulta de determinadas deficiências psíquicas ou físicas


possuídas por certas pessoas que lhes afecta a vontade e o normal discernimento para
poderem reger-se, tomar resoluções, dispor dos seus bens, enfim, actuar juridicamente.

Artigo 138 do Código Civil

Pessoas sujeitos a interdição

1. Podem ser interditos do exercício dos seus direitos todos aqueles que por anomalia
psíquica, surdez-mudez ou cegueira se mostrem incapazes de governar suas pessoas e
bens.

2. As interdições são aplicáveis a maiores, mas podem ser requeridas e decretadas


dentro do ano anterior à maioridade, para produzirem os seus efeitos a partir do dia
em que o menor se torne maior.

Para alguém ser considerado interdito é necessário que a sua incapacidade seja
declarada por sentença judicial, no termo do processo especial que se abriu para esse
fim. A partir daí é que existirá a interdição e a consequente incapacidade de exercício
de direito.

O interdito tem um regime jurídico semelhante ao menor, quer quanto ao valor dos
actos praticados, quer quanto aos meios de suprir a sua incapacidade.

A incapacidade por interdição só cessará se desaparecer o motivo natural que a


originou. Todavia, para que esse efeito se verifique, é necessário que se requeira no
Tribunal ”o levantamento da interdição”pelo interdito ou qualquer das pessoas com
legitimidade para o fazer, consoante o preceituado no artigo 151 do CC.

c) Incapacidade por inabilitação


Os motivos que determinam a inabilitação são os mesmos da interdição mas revestidos de menor
gravidade, a que se juntam ainda certos modos habituais de comportamento, como a
prodigalidade o abuso de bebidas alcoólicas ou de estupefacientes.
Artigo 152 do Código Civil
109
Pessoas sujeitas a inabilitação

Podem ser inabilitados os indivíduos cuja anomalia psíquica, surdez-mudez ou cegueira,


embora de carácter permanente, não seja de tal modo grave que justifique a sua
interdição, assim como aqueles que pela sua habitual prodigalidade ou pelo abuso de
bebidas alcoólicas ou de estupefacientes se mostrem incapazes de reger
convenientemente o seu património.

A inabilitação resulta também de uma sentença jurídica proferida no termo de uma acção
interposta para esse fim.

Esta incapacidade é suprida pelo instituto da assistência, sendo designado por curador a
pessoa encarregada de a exercer.

3. 5. Pessoas Colectivas

3.5.1 Personalidade Jurídica

Acabámos de nos debruçar sobre a capacidade das pessoas singulars, mas, também, existem as
pessoas colectivas que, como já referimos, são as organizações destinadas à realização de
interesses comuns ou colectivos, à ordem jurídica atribui personalidade jurídica, sendo, pois,
susceptíveis de serem titulares de direitos e vinculações.

A esta categoria de pessoas pertencem o Estado, as recreativas, os partidos políticos, etc.

As pessoas colectivas adquirem a sua personalidade juridica no momento do seu reconhecimento


legal, e ela extingue-se quando a pessoa pratica actos contrarios aos estabelecidos nos seus
estatutos ou quando prosseguem fins contrarios á lei.

3.5.2 Capacidade Jurídica

Ao contrário do que acontece com as pessoas singulares, a capacidade de gozo está limitada aos
direitos e vinculações adequados à prossecução dos seus interesses, conforme o preceituado no
Código Civil.

110
Artigo 160º

Capacidade

1. A capacidade das pessoas colectivas abrange todos os direitos e obrigações necessários ou


convenientes á prossecução dos seus fins.

Exceptuam-se os direitos e obrigações vedadas, por lei, ou que sejam inseparáveis da


personalidade singular.

Assim, relativamente à capacidade de gozo das pessoas colectivas impera o chamado principio
da especialidade, devido às limitações mencionadas.

Quanto à corrente de opinião que parece mais adequada juridicamente, considera aplicável às
pessoas colectivas o principio da capacidade genérica de exercício, pois a lei dota-as de órgãos,
através dos quais elas actuam juridicamente, tal como as pessoas singular o fazem.

4. O objecto
O objecto da Relação Jurídica é tudo aquilo sobre que incidem os poderes do titular activo da
relação. É corrente identificar-se o objecto da Relação Jurídica com o objecto do Direito
Subjectivo, que constitui o lado activo da mesma relação.

O Direito Subjectivo existe, tendo em vista a satisfação de interesses. Para isso, a Ordem Jurídica
põe à disposição da pessoa um certo bem. Esse bem é que constitui o objecto de direito
subjectivo em geral.

4.1 Modalidades de objecto da relação jurídica

É usual distinguir entre:

Objecto imediato: Quando os poderes do titular activo incidem, directamente, sobre o bem, sem
que se interponha qualquer mediador.

Vejamos o exemplo: Quando afirmo que tenho direito aos meus livros, enuncio um poder, um
direito. Os livros são assim, o objecto imediato da relação de propriedade de que eu sou titular
activo.
111
Objecto mediato: quando os poderes do titular activo incidem indirectamente sobre o bem.

Vejamos o exemplo a seguir: Quando digo que tenho direito à entrega de um livro que me é
devido, este constitui o objecto mediato do meu direito.

No exemplo anterior, o objectivo imediato seria a entrega do bem (livro). Deste modo se o
devedor alienar o respectivo livro, eu fico sem o direito sobre ele, embora possa exigir ao
devedor a correspondente indemnização.

Esta distinção entre objecto imediato e mediato, nem sempre se verifica, pois nos direitos reais
não há intermediário entre o titular de um direito e o bem. O proprietário está em contacto
directo com o objecto do seu direito, como vimos no 1º exemplo.

Porém, a distinção verifica-se nas obrigações (direitos de crédito) de prestação de coisa certa e
determinada. Nelas, o objecto imediato do direito do credor é a prestação do devedor – o acto da
entrega da coisa devida – e o objecto mediato é a própria coisa.

Assim, entre o credor (ou o seu direito) e a coisa, intromete-se a pessoa do devedor, como vimos
no 2º exemplo.

4. 2. Possíveis objectos da relação jurídica

4.2.1 Pessoas
No Direito moderno, as pessoas só podem ser objecto da Relação Jurídica nos denominados
poderes-deveres ou poderes funcionais, que não são verdadeiros direitos subjectivos.

Vejamos o exemplo: O poder parental e o poder tutelar.

Os direitos inseridos no poder paternal ou no poder tutelar, não conferem qualquer domínio
sobre a pessoa do filho ou do pupilo, no interesse dos pais ou do tutor. São meramente direitos,
que conferem poderes destinados a habilitarem os pais e os tutores no cumprimento dos deveres
que lhes são impostos por lei.

112
4.2.2 Prestações
Chamamos prestação à conduta a que o devedor está obrigado. Por exemplo, nos direitos de
crédito, o objecto não é, rigorosamente, uma coisa, mas sim o comportamento do devedor.

4.2.3 Coisas
Nos termos do artigo seguinte:

Artigo 202 do Código Civil

Noção

1. Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas.

5. O Facto Jurídico

Facto Jurídico é todo o facto da vida social que produz efeitos jurídicos, constituindo,
modificando ou extinguindo, relações jurídicas

Vejamos o exemplo: O contrato cria uma relação jurídica.

O casamento modifica o <<status personae>>.(estatuto da pessoa)

A morte extingue a personalidade jurídica.

5.1. Classificação dos factos jurídicos

Uma das possíveis classificações dos factos jurídicos assenta na distinção entre factos jurídicos
voluntários ou actos jurídicos e factos jurídicos involuntários ou naturais.

5.1.1 Factos jurídicos voluntários ou actos jurídicos


São manifestações de vontade de quem o represente com relevância jurídica.

Os Factos jurídicos voluntários ou actos jurídicos podem ser:

113
 Actos jurídicos lícitos: aqueles que estão em conformidade com a Ordem Jurídica.

Vejamos os exemplos: casamento, a doação, o mútuo.

 Actos jurídicos ilícitos: são os que contrariam a ordem jurídica e implicam uma sanção
para o seu autor.

Vejamos os exemplos: o homicídio, o furto.

Os factos jurídicos voluntários ou actos jurídicos lícitos podem ainda classificar-se em:

 Negócios jurídicos: são os factos jurídicos voluntários, constituídos por uma ou mais
manifestações de vontade, destinadas a produzir intencionalmente efeitos jurídicos.

Vejamos o exemplo: casamento, locação, compra e venda, etc.

 Simples actos jurídicos: são factos jurídicos voluntários, cujos efeitos jurídicos, embora
eventualmente concordantes com a vontade dos seus autores, não são todavia,
determinados pelo conteúdo desta vontade, mas directa e imperativamente pela lei.

Vejamos o exemplo: Com a criação de uma obra de arte adquirem-se direito de autor,
mesmo que não tenha sido essa a intenção do artista.

Os actos jurídicos ilícitos podem ser:

 Dolosos: quando existe por parte do indivíduo o propósito de fazer mal, ou de prejudicar.

Vejamos o exemplo: o furto, injúrias, difamação.

 Meramente culposos: quando o indivíduo não prevê o resultado – não há dolo – mas
houve imprudência ou negligência, que lhe conferem culpa (43)

Vejamos o exemplo: Acidente de viação provocado por condutor que não respeita o sinal
vermelho devido a distracção.

5.1.2 Factos jurídicos involuntários

São estranhos e independentes à vontade (factos naturais). São puramente obra da natureza,
embora possam verificar-se no próprio homem.

Vejamos o Exemplo: O nascimento, a morte, à chuva torrencial, etc.


114
A terminar referir que para os direitos das partes na relação jurídica são salvaguardados e
protegidos pela Garantia, que é igualmente um dos elementos da Relação Jurídica.

Tarefas

Tarefas : Discuta os seguintes casos

Caso I

Simão, 17 anos, toxicodependente, empregado de balcão, comprou umas sapatilhas no valor de


35.000, 00 MT e arrendou um apartamento.

Quid iuris?

Caso II

O avô do Manelinho, de 16 anos, deixou-lhe em herança duas casas e um Jaguar; sabendo disso,
o Manelinho foi festejar com os amigos, pagando as “shorts ” a todos, tendo ficado a saber
apenas no dia seguinte que o seu Pai repudiou a herança.

Quid iuris?

Caso III
Cipriano 17 anos, alcoólico, aprendiz de carpinteiro, doou um computador no valor de 1.500
euros, e, durante uma “bebedeira” emprestou, sem contrapartidas, a sua motorizada. Dias mais
tarde, fez um testamento

Quid iuris?

Caso IV

115
Isaías, 16 anos, empregado de armazém, casou sem autorização dos pais e sem o respectivo
suprimento judicial, assinou um contrato de empreitada para obras numa casa de que era
proprietário, doou um terreno e comprou uma mobília de quarto. O seu Pai, que soube de
imediato destes factos, quer anular agora aquela doação, pois daqui a 5 meses Isaías faz 18 anos.

Quid iuris?

Caso v

Pepito, pelo seu habitual abuso de bebidas alcoólicas foi inabilitado judicialmente.

Antes da acção, comprou por uma autêntica “pechincha” uma quinta em Marracuene, que
acabou, após o registo da sentença, por vender. Fez, ainda, um testamento a deixar os demais
bens imóveis.

Auto-avaliação
1. O que é uma relação jurídica e como ela é disciplinada?

2. Dos elementos da relação jurídica o menos essencial é o facto jurídico.Comente.

3. No direito moderno, seres vivos diversos do homem e seres inanimados podem ser sujeitos
de uma relação jurídica. Comente.

4. Em que circunstâncias as pessoas singulares podem ser objecto de uma relação jurídica?

5. Em que consiste a garantia das relações jurídicas?

116
Chave-de-correcção

1. A relação jurídica é a relação da vida social disciplinada pelo direito, mediante a atribuição a
um sujeito de um direito subjectivo e a imposição a outro de um dever juridico ou de uma
sujeição e a mesma é disciplina pelo Direito, que a protege.
2. É de se discordar com a afirmação, na medida em que o facto jurídico é um elemento
essencial da norma jurídica, na medida em que é todo o acontecimento natural ou acção
humana produtivo de efeitos ou consequências jurídicas.Esse efeito poderá ser o de criar,
modificar ou extinguir uma relação jurídica.
3. Apenas os homens é que podem ser sujeitos das relações jurídicas, os outros seres vivos(
plantas e animais) e inanimados, apenas podem ser objecto das relações jurídica.
4. No Direito moderno as pessoas só podem ser objecto da Relação Jurídica nos denominados
poderes-deveres ou poderes funcionais, que não são verdadeiros direito subjectivos.Exemplo:
O poder parental e o poder tutelar.
5. A GARANTIA é a susceptibilidade de protecção coactiva da posição do sujeito activo da
relação jurídica pode recorrer aos meios coercitivos que a lei põe à sua disposição para obter
a satisfação do seu direito no caso de violação ou de ameaça de violação do mesmo.

Resumo

Caro estudante, conforme o que dissemos ao logo da unidade, podemos dizer oconjunto de
norma jurídicas gerais, abstractas, criadas e impostas coactivamente pelo Estado, e que tem em
vista regulamentar a convivência social, numa sociedade em os seus actores se relacionam e
interagem, ocupando a figura de sujeito activo, quer a de sujeito passivo.

Por outro lado, os sujeitos, querem ver garantias para a materialização dos seus direitos e das
obrigações da sua contraparte, com intuito de assegurar o objecto da relação jurídica, que é o
objecto da relação.

Observamos que nem sempre os sujeitos tem a necessária capacidade jurídica, mas que
entretanto, a lei se encarregoude salvaguardar os direitos dessas pessoas, não só através das
117
formas de suprimento das incapacidades, mas também criou instrumentos que visam proteger os
cidadãos daquelas relações jurídicas nas quais se terão envolvido com incapazes ou inabilitados,
tudo em nome da segurança jurídica do cidadão e do desenvolvimento normal e são das relações
jurídicas.

Com esta Unidade finalizamos o estudo do nosso módulo, e julgamos ter fornecido subsídios
julgados pertinentes e importantes para a compreensão do Direito e que irão servir de subsídio
para a compreensão das disciplinas subsequentes do Curso.

Bibliografia
Ascensão, J. O. (1997). O Direito – Introdução e Teoria Geral. Almedina

Bigote Ch, M. (1997). Temas Fundamentais de Direito, Almedina

Caetano, M. (1997). Manual de Direito Administrativo. Almedina

João, B. (1997). Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador. Almedina

Latorre, A. (1978). Introdução ao Direito. Coimbra

Marques, J. D. (1986). introdução ao Estudo do Direito. Editora Danúbio, Lda, Lisboa

Mendes, J. C. (1994). Introdução ao Direito. Editora Pedro Ferreira, Lisboa

Pereira, N. (1992). Introdução ao Direito e as Obrigações. Almedina

Telles, I. G. (1991). Introdução ao Estudo do Direito. Biblioteca Universitária, Publicação


Europa-América

__________

Legislação

Constituições da República de Moçambique de 1975, 1990 e 2004

Pires de Lima, Fernando Andrade e outros, Código Civil (Anotado) de 1966 - 4 Vols.

Código Civil.

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