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relevantes e preocupantes apontados neste novo relatório. A docente tem como principal
área de atuação o papel da circulação oceânica de larga escala no clima. É coordenadora da
Subrede Desastres Naturais da Rede CLIMA e editora associada da revista do grupo Nature
Communications Earth & Environmental.
Rodrigues já foi editora revisora do IPCC-Special Report on Climate Change and Land (SRCCL)
e atualmente está como pesquisadora visitante na Universidade de Oxford, na Inglaterra,
atuando no departamento Atmospheric, Oceanic and Planetary Physics.Você poderia explicar
o que seria o “Climate Change 2021: The Physical Science Basis”?
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17/12/21, 18:11 Principais fatos do último relatório do IPCC - Ciência e Clima
Eu diria que as notícias são ruins. O relatório mostra que a Terra está mais quente do que
esteve nos últimos 125 mil anos. Nós estamos vendo uma aceleração na taxa de aquecimento
global nunca vistos nos últimos 2 mil anos. Isso significa que a velocidade com que o
aquecimento está ocorrendo é maior hoje do que o que já foi registrado ao longo dos dois
milênios anteriores.
Os eventos extremos que estamos vendo agora (ondas de calor, chuvas torrenciais, secas)
estão ficando mais intensos e mais frequentes. Nesse relatório, em particular, a ciência
conseguiu relacionar esses extremos ao aumento das emissões dos gases do efeito estufa. A
previsão é de que a Terra irá aquecer até metade deste século, independentemente do
caminho que escolhermos (de baixa ou alta emissão). Mesmo que a temperatura não
ultrapasse o aumento de 1,5 ºC, que foi estabelecido pelo Acordo de Paris, essas situações
extremas serão mais intensas e constantes. Alguns desses efeitos serão ainda mais
duradouros, como o aumento do nível do mar e o desgelo dos solos congelados da Sibéria. E
se o aquecimento global chegar aos 2 ºC, os extremos de calor serão ainda mais frequentes e
críticos, com consequências drásticas para a agricultura e a saúde, por exemplo.
O relatório mostrou que ainda corremos o risco de enfrentar mudanças abruptas, caso ocorra
o colapso das geleiras na Antártica, o colapso da floresta Amazônica, o colapso do sistema
global de correntes oceânicas.
Espera-se que o aumento da temperatura global atinja 1,5 ºC já no começo dos anos 2030 –
ou seja, daqui a apenas 10 anos. O único caminho que não prevê isso, entre os cinco
apontados no documento, já não é mais viável: zerarmos as emissões agora.
Relatórios anteriores já apontavam para isso. Mas, nos últimos 5 anos, a ciência na área de
atribuição (atribuir as causas das mudanças climáticas às atividades humanas ou processos
naturais do sistema) deu um salto. O que mudou é que, hoje, como aponta o relatório, as
evidências científicas mostram que atividades humanas são inequivocamente responsáveis
por essas mudanças climáticas que estamos vivenciando. Quais seriam essas novas
evidências? Hoje temos novas observações e novas descobertas teóricas do funcionamento
do sistema climático terrestre (sensibilidade climática), temos melhores modelos climáticos e
melhores métodos de inteligência artificial. Essas novas tecnologias têm permitido
elaborarmos modelos computacionais em maior escala e estudarmos períodos passados do
clima do planeta (paleoclima). Tudo isso contribuiu para que tenhamos agora projeções
futuras mais robustas e confiáveis.
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17/12/21, 18:11 Principais fatos do último relatório do IPCC - Ciência e Clima
Em relação aos oceanos, que é sua área de pesquisa, o que a análise dos dados mais
recentes verificou?
Os oceanos também sofrerão uma constância cada vez maior de situações extremas,
principalmente relativas ao aumento na intensidade e frequência de ondas de calor marinhas,
à desoxigenação e acidificação dos oceanos. Todos esses efeitos combinados serão
catastróficos para os ecossistemas marinhos. O aumento do nível do mar também trará
consequências graves para as regiões costeiras.
Pela primeira vez, o relatório do IPCC fornece uma avaliação regional mais detalhada das
mudanças climáticas, destacando informações que poderão ser muito úteis para subsidiar
avaliações de risco regional, adaptações e tomadas de decisão. Esses dados regionais foram
apresentados em um atlas interativo on-line, e também em fichas técnicas e informativas. O
Atlas de Mudanças Climáticas, que integra o relatório, apresenta uma ficha técnica para a
América do Sul. Nas projeções mais pessimistas, a temperatura média pode aumentar 7º C. A
precipitação anual vai diminuir em todo território nacional, exceto no extremo sul do
continente. Por outro lado, as chuvas torrenciais – grandes volumes em curto espaço de
tempo – vão aumentar e os períodos de estiagem vão ficar cada vez mais longos. Esse
cenário é péssimo para a agricultura.
Também teremos aqui um aumento do nível do mar maior do que a média global, o que terá
por consequência grandes inundações em regiões costeiras, retração das linhas litorâneas e
uma frequência maior de ondas de calor marinhas.
A floresta Amazônica é um dos sistemas da Terra que pode sofrer uma mudança abrupta. Se
ela for desmatada além de uma certa porcentagem de sua área total, toda a floresta se
desestabilizará, podendo se tornar uma savana (cerrado). Isso é o que chamamos de tipping
point: quando um sistema se transforma a tal ponto que chega a um estado irreversível.
Ainda não sabemos ao certo qual seria exatamente o tipping point da Amazônia. Mas as
estimativas da ciência apontam que ele esteja localizado em um desmatamento entre 20% e
25% da área total. Já chegamos a 17% e nos últimos anos essa porcentagem tem
aumentando muito rapidamente.
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O que tem ocorrido em Santa Catarina – como o ciclone bomba, períodos de seca e frio
extremos, avanço do mar sobre casas etc. – tem relação com as mudanças climáticas?
Sim, está muito relacionado. O processo é mais ou menos o mesmo que ocorre no
Hemisfério Norte (HN). Embora tenham menos estudos sobre o Hemisfério Sul (HS), a física
envolvida é a mesma. Com o aumento da temperatura global, há um aumento das diferenças
de temperatura entre a região tropical e a região polar, principalmente no HS. Essa diferença
provoca tempestades mais intensas (como o ciclone bomba), ventos mais fortes e ressacas
marítimas mais intensas (ondas mais altas). Frequentemente, esses eventos causam a erosão
das praias e a retração da linha costeira. Esses fatores, aliados ao aumento do nível do mar,
destruirão ainda mais nossa zona costeira.
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Quais os principais riscos para o Brasil como um todo e para Santa Catarina em
particular em relação às mudanças climáticas?
Enfrentaremos eventos extremos, sobretudo longos períodos de seca. As secas vão gerar
vulnerabilidades, reduzindo nossa segurança hídrica, energética e alimentar. Veja o que está
ocorrendo agora: os impactos da falta de chuvas já estão comprometendo o abastecimento
de alimentos para a população, provocando crises na agricultura, na pecuária e na geração
de energia.
Florianópolis e Santa Catarina estão bem na transição da zona tropical para a subtropical.
Essa é uma das regiões mais vulneráveis a esses eventos extremos. Ciclones extratropicais
provocam tempestades cada vez mais fortes e ressacas que, com o aumento do nível do mar,
já estão gerando erosões nas praias no sul da Ilha e retração da costa no norte da Ilha.
Quanto custará aos cofres públicos aumentar a linha de praia? Quem garante que, na
próxima ressaca, essa areia também não vai ser removida?
Não, não respondem. Aqui no Brasil existe uma resistência muito grande a aceitar que as
mudanças climáticas estão acontecendo. A população não exige isso dos governos porque
existe um grau de conhecimento muito baixo sobre o assunto. Ficamos muito vulneráveis aos
lobbies econômicos da indústria de petróleo, que dissemina informações erradas dizendo
que coibir a queima de combustíveis fósseis afetará a economia. Isso é uma grande mentira.
Os custos para sociedade e governos com os desastres e extremos climáticos são muito
maiores. Uma economia verde levaria a um aumento de empregos. Poderíamos estar à
frente, desenvolvendo tecnologias que ajudam a combater essas mudanças. Mas,
infelizmente, enquanto o governo e setores da economia negam as mudanças climáticas,
ficamos para trás. Estamos perdendo uma ótima oportunidade de o Brasil se tornar um
exemplo, um exportador de tecnologia, um líder global. Mas, nesse aspecto, estamos sempre
atrás. Nós nos limitamos a copiar os países desenvolvidos e importar tecnologias caras,
perdendo a chance de gerar muitos empregos aqui.
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17/12/21, 18:11 Principais fatos do último relatório do IPCC - Ciência e Clima
São muito importantes. Não há como coibir as mudanças climáticas com ações individuais.
Precisamos de mudanças estruturais profundas no nosso sistema econômico. Por exemplo:
em Florianópolis, o que poderia proteger nossas praias desses eventos extremos? Manter,
preservar a linha de dunas e as vegetações naturais da praia. Para isso, não podemos mais
seguir construindo nessas áreas. Se a legislação permitir construir e as pessoas continuarem
comprando propriedades nessas áreas, não resolveremos o problema. Os manguezais
também são importantíssimos para proteger a cidade de marés e ondas, mas não existe
atualmente um esforço legítimo para preservá-los.
Sim, mas sem as políticas públicas não conseguiremos avançar na solução desses problemas.
A atitude individual mais importante que podemos ter, portanto, é votar em políticos que
tenham consciência sobre tudo isso e ofereçam propostas concretas para evitar um cenário
trágico.
Fonte: UFSC
Mais informações: Zhongming, Z., Linong, L., Wangqiang, Z. and Wei, L., 2021. AR6 Climate
Change 2021: The Physical Science Basis.
Imagem: adaptado da figura SPM.10, do relatório do IPCC para formuladores de políticas
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