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1 INTRODUÇÃO ............................................................................................ 2
2 A REGIÃO DE CANUDOS: ANÁLISE ESPACIAL DA ÁREA DE
INFLUÊNCIA E DIFUSÃO DE UMA INOVAÇÃO ........................................................ 3
2.1 Análises sobre a formação da Região de Canudos ............................. 5
10 NOMES DE GUERRA............................................................................... 44
10.1 Nem tão heróicos ............................................................................ 46
1
1 INTRODUÇÃO
Prezado aluno!
Bons estudos!
2
2 A REGIÃO DE CANUDOS: ANÁLISE ESPACIAL DA ÁREA DE INFLUÊNCIA E
DIFUSÃO DE UMA INOVAÇÃO
Fonte: ensinarhistoriajoelza.com.br
O Arraial que ocupou uma velha fazenda abandonada foi nomeado de Belo
Monte pelo líder Conselheiro e dados oficiais datam a sua fundação de junho
de 1893.
Este evento tem na história nacional uma relevância significativa não só pelos
números apresentados acima, mas também pelas controvérsias e especulações que
3
até hoje são desenvolvidas em mais de dez mil trabalhos publicados sobre o assunto.
(NOGUEIRA, 2005)
De acordo com NOGUEIRA, 2005, a discussão aqui colocada tem como
objetivo, primordialmente, considerar a estrutura de relações que formou o evento da
Guerra e a espacialização de sua influência através dos ideais do indivíduo Antônio
Conselheiro.
O evento é caracterizado como a interação entre homem – indivíduo e corpo,
meio – espaço físico e de associações multidirecionais, e tempo – seqüências e
tempos definidos. (NOGUEIRA, 2005)
Para NOGUEIRA, 2005,
A Região de Canudos pode ser considerada uma “área cultural”; o estudo das
áreas culturais se encontra na Geografia Histórica. A compreensão destas
áreas depende da análise de suas origens e do processo de formação das
mesmas; daí o estudo do ideal Antônio Conselheiro, sua origem; e a relação
com as manifestações dos conselheiristas; processo de construção em
sequências temporais. (NOGUEIRA, 2005)
5
Seu movimento se deu principalmente nos sertões sergipanos e baianos, até a
escolha do arraial que se tornou Bello Monte (denominação dada a área pelo
Conselheiro) a partir de sua fixação naquela localidade geográfica. (NOGUEIRA, 2005
Para NOGUEIRA, 2005, a partir de então os períodos de tempo a serem
considerados neste estudo estão diretamente relacionados ao movimento de
influências, ou ideais personificados por Conselheiro e não em um deslocamento
físico propriamente dito. A inovação não mais se deslocava. O grupo de atores que
concretiza o processo é formado pelos conselheiristas (representantes do séquito de
Antônio Conselheiro).
Parafraseando NOGUEIRA, 2005, a catalogação documental desta
movimentação da inovação foi feita por Euclides da Cunha, ator desvinculado do
grupo de “seguidores”, mas imerso no contexto devido ao contato com os
conselheiristas. A definição do tempo se deu através deste contato.
A locomoção de Euclides da Cunha até o arraial, acompanhando a quarta
expedição do exército republicano, durou 103 dias e rendeu 25 artigos para o jornal
Folha de São Paulo, do qual era correspondente. (NOGUEIRA, 2005)
Fonte: mundoeducacao.bol.uol.com.br
6
aceitação por parte dos conselheiristas se dá, principalmente, pelo fato da
proximidade do homem como (corpo) sertanejo e do meio - fazem da inovação uma
espécie igual. Os militares não chegam a este ponto do processo, não existe
aceitação, somente a decisão de não aceitação.
Quanto ao processo de decisão, o grupo de séquitos de Antônio Conselheiro
se decide pela difusão em massa das idéias e defesa sem limites ou divisas da
inovação e do reflexo espacial desta. (NOGUEIRA, 2005).
Ainda segundo NOGUEIRA, 2005:
A natureza das mudanças é essencialmente político-social, a partir do
momento em que as propostas inovadoras promovem uma modificação dos
moldes vigentes e consequentemente um recorte espacial necessário à
concretização das mesmas. Parte-se aqui da necessidade basilar do ser
humano em promover organizações espaciais que ditem as diretrizes do
comportamento social do grupo do qual faz parte.
7
Fonte:mundoeducacao.bol.uol.com.br
NOGUEIRA, 2005, relata que as relações sociais deste indivíduo com o seu
espaço geográfico também denotam uma especificidade localizada. As relações de
classe restringiam-se entre o latifundiário, proprietário de grandes extensões de terras,
e o homem sem-terra, que correspondia a grande maioria da população.
Conforme relata em NOGUEIRA, 2005:
Canudos, apesar da mimese com o espaço geográfico no qual estava
inserida acaba por configurar um recorte representado pelo ideal encarnado
por Antônio Conselheiro. Este ideal, a inovação, ia muito além do simples fato
de não pagar impostos; colocava nos fatos e no espaço a expressão da
dignidade sertaneja.
8
Apesar da pobreza, a população canudense tinha o suficiente para viver
dignamente. O conselheiro não fazia exigências, nem pedia nada a seu séquito, daí a
possibilidade de manutenção de um espaço sem a cobrança de impostos, sem
receitas públicas – o cooperativismo. (NOGUEIRA, 2005)
Segundo estudos de NOGUEIRA, 2005, os cidadãos não sofriam nenhum tipo
de discriminação – nem de raça, nem de classe. As leis e as autoridades eram
consagradas pela comunidade em consonância com os valores emanados da visão
místico-religiosa adotada por Antônio Conselheiro, o líder espiritual. NOGUEIRA,
(2005)
Diante da formação espacial de uma região que redimia o sertanejo de sua
“sina” – destino irrefutável de sofredor e perdedor – cresce o Arraial de Canudos.
Segundo NOGUEIRA, 2005; existem, pelo menos, duas grandes vertentes que
tentaram, e ainda tentam explicar o que foi a Guerra de Canudos.
Fonte: mundoeducacao.bol.uol.com.br
10
no Brasil. Essas teses são mencionadas em algumas bibliografias como
“progressistas” e antagonizam com as teses “euclidianas”.
11
A sua volta transformou-se em uma crença messiânica, em que o rei voltaria e
libertaria os portugueses da difícil situação que estavam passando naquele momento.
Antônio Conselheiro chegou a citar o rei D. Sebastião em seus discursos, mostrando
a força que a crença em seu retorno despertava no imaginário luso-brasileiro,
NOGUEIRA, 2005 explicita seus pressupostos
No final do século XIX, o interior do Brasil era marcado pelo alto grau de
abandono, sobretudo onde a seca atingia populações inteiras. Vale lembrar
que a escravidão foi abolida em 1889, ou seja, não se havia completado cinco
anos quando, em 1893, Antônio Conselheiro e seus seguidores instalaram-
se em uma estéril e abandonada fazenda conhecida como Belo Monte.(
NOGUEIRA, 2005)
Fonte: sistemacpv.com.br
12
3 UM BRASIL DE MUITOS BRASIS NO SÉCULO XIX
13
Na visão de CÂMARA e CÂMARA 2015, o advento da República em 1889
estava inserido no contexto do poder oligárquico, clientelista e coronelista, atendendo
com prontidão aos interesses de elites rurais em detrimento da massa desprovida de
recursos financeiros.
Do ponto de vista de CÂMARA e CÂMARA 2015:
Fonte:algosobre.com.br
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melhoria das condições de vida do povo sertanejo. A economia nordestina estava
fundamentada essencialmente na agricultura e na pecuária.
Esta região, no entanto, perdeu muito de sua importância econômica devido ao
infortúnio de secas devastadoras e consecutivas, em especial a grande seca de 1877
a 1879. Sendo assim, o Nordeste, massacrado pela miséria ocasionada pelos grandes
períodos de estiagem e pela inescrupulosidade de uma minoria que detinha o poder,
acabou se tornando um importante celeiro de manifestações nem sempre pacíficas
CÂMARA e CÂMARA 2015 explicita seus pressupostos.
Resumidamente, podemos afirmar que existiam dois “brasis” dentro de nosso
país àquela época: o Brasil litorâneo (avançado em termos de civilidade e cultura,
refinado) e o Brasil sertanejo (atrasado culturalmente, tosco e pobre). Conforme Iser
(2008, p. 15, apud CÂMARA e CÂMARA 2015):
15
4 ANTÔNIO VICENTE MENDES MACIEL - O CONSELHEIRO
Fonte: cparq.ufba.br
16
Ao que Cunha 1984: 109 apud Iser, 2008: 34, CÂMARA e CÂMARA, 2015)
complementa ao afirmar que:
Ali, a sua fisionomia estranha: face morta, rígida como uma máscara, sem
olhar e sem risos; pálpebras descidas dentro de órbitas profundas; e o seu
entrajar singularíssimo; e o seu aspecto repugnante, de desenterrado, dentro
do camisolão comprido, feito uma mortalha preta; e os longos cabelos
corredios e poentos caindo pelos ombros, emaranhando-se nos pelos duros
da barba descuidada, que descia até a cintura – aferroram a curiosidade geral
CUNHA, 1984, p. 112 apud ISER, 2008, p. 40, CÂMARA e CÂMARA, 2015 ).
Ele ali subia e pregava, afirmam testemunhas existentes. (...) uma oratória
bárbara e arrepiadora, feita de excertos truncados das Horas Marianas,
desconexa, abstrusa, agravada, às vezes, pela ousadia extrema das citações
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latinas; transcorrendo em frases sacudidas; misto inextricável e confuso de
conselhos dogmáticos, preceitos vulgares da moral cristã e de profecias
esdrúxulas (...) Ninguém ousava contemplá-lo. A multidão sucumbida
abaixava, por sua vez, as vistas, fascinada, sob o estranho hipnotismo
daquela insânia formidável”. Era traunesco e era pavoroso. Imagine-se um
bufão arrebatado numa visão do Apocalipse.
Segundo CÂMARA e CÂMARA, 2015, em Belo Monte não havia roubo nem
opressão, impostos não eram pagos; todos eram iguais e tinham os mesmos direitos
e deveres. Qualquer um era bem-vindo e bastava uma indicação do Conselheiro para
se erigir uma moradia; o casamento não era obrigatório e as mães solteiras eram
acolhidas sem preconceito.
Para CÂMARA e CÂMARA, 2015, apesar de seu crescimento até certo ponto
caótico e desordenado como comunidade, o que realmente lhes importava era o fato
de que ali se trabalhava e se rezava. As decisões eram tomadas entre todos, à noite,
no retordo da lida.
Havia duas escolas e duas igrejas, o que implicitamente formava um tripé com
o trabalho em si e que representava o crescimento em todos os níveis, como descrito
por CÂMARA e CÂMARA, 2015.
As tarefas laborais na lavoura e na pecuária de caprinos assim como os frutos
delas advindos eram divididos entre todos, numa prática muito próxima ao Socialismo,
como nos lembram (Oliveira et al. 1994, p. 189, apud CÂMARA e CÂMARA, 2015):
"(...) todos trabalhavam e repartiam o fruto desse trabalho igualitariamente. O trabalho
continuava duro, mas agora acalentavam esperança. (...) O misticismo mantinha-os
unidos. Eram irmãos na fé e na enxada".
18
Fonte: sistemacpv.com.br
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Prudente de Morais, o primeiro civil à frente da Presidência da República Federativa
do Brasil, representante dos cafeicultores.
Em CÂMARA e CÂMARA, 2015 vamos encontrar o seguinte esclarecimento: A
conjuntura era de intensa agitação política com a pendência do governo anterior em
debelar a luta entre federalistas e castilhistas no estado do Rio Grande do Sul. Forte
foi a oposição ao novo presidente por parte dos adeptos do “florianismo” radical. No
entanto, o maior obstáculo enfrentado por Prudente de Morais foi, sem sombra de
dúvidas, a Guerra de Canudos, que ocupou considerável parte do final de seu
mandato.
20
Para WANDERLEI, 2011, além do mais, a dualidade referida não significa a
existência de duas essências no catolicismo que se constituiu no Brasil, justifica-se
apenas no sentido de apontar tendências que predominam.
Herdeiro do secular legado do catolicismo tradicional – com certas variações
de sentido também denominado de popular, rústico, místico– o conselheirismo se
encontra situado num momento – finais do século XIX – particularmente intenso do
movimento de transição em direção ao modelo romano, conforme WANDERLEI, 2011.
Movimento este que tem sua força principal na ação sistemática e persistente
dos bispos reformadores que, sobretudo a partir do advento da República, e com o
auxílio de ordens religiosas estrangeiras, buscaram redefinir o lugar do clero frente à
sociedade brasileira em geral e ao Estado em particular, relatado por WANDERLEI,
2011.
Para WANDERLEI, 2011, é precisamente nesta transformação lenta e
conflituosa da religião católica no Brasil, que se torna clara as tensões entre a
religiosidade congregacional e o exercício do sacerdócio.
Cabe identificar, segundo WANDERLEI, 2011, com especial cuidado, a posição
social e religiosa de Antônio Conselheiro no interior do catolicismo brasileiro.
Este esforço se justifica devido à importância fundamental desta personalidade
na reprodução congregacional da religiosidade presente no conselheirismo. A sua
trajetória, em grande medida, se confunde com os caminhos do catolicismo
tradicional, paulatinamente expropriado das populações rurais pela ação intransigente
dos bispos romanizados, quando afirma WANDERLEI, 2011.
Para WANDERLEI, 2011, uma interpretação consistente sobre Antônio
Conselheiro permitirá melhor analisar as múltiplas visões que lhe atribuem identidades
religiosas diversas – operações, muitas vezes, de grande alcance ideológico.
Conforme WANDERLEI, 2011:
Existe nos estudos acadêmicos certa tradição – fundada por Euclides da
Cunha – de conceber Antônio Conselheiro como profeta popular; como figura
central de um movimento messiânico que aparece como resposta política
possível diante de uma crise econômica generalizada e de processos de
secularização e modernização da sociedade sertaneja.
21
de Canudos. Resulta desta visão uma perspectiva na qual se encontram subordinadas
às disputas ligadas ao terreno das idéias religiosas as relações de dominação
produzidas pelo clero contra o conselheirismo – o que parece ser uma inversão de
fatores.
Também durante muito tempo Antônio Conselheiro foi considerado pelo
pensamento letrado – leigo e eclesiástico – um fanático recalcitrante, afirma
WANDERLEI, 2011.
Opinião que se consolida no início do século XX e permeia com variados
matizes a maior parte dos estudos sobre o tema – inclusive os trabalhos de orientação
marxista, na visão de WANDERLEI, 2011.
Conforme WANDERLEI, 2011, esta visão repousa, quando não
deliberadamente produzida com a finalidade de combater o conselheirismo, numa
absoluta incompreensão acerca do caráter de devoção e penitência das tradições do
catolicismo sertanejo.
De acordo estudos de WANDERLEI, 2011;
Ao analisar os escritos de Antônio Conselheiro é possível percebe com
clareza o quanto esta interpretação, a despeito de sua insistência e por sua
imprecisão, embaraça o reconhecimento do significado social e religioso do
conselheirismo.
23
Fonte: sistemacpv.com.br
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funções desenvolviam? A vasta literatura existente sobre Canudos ignora estas
mulheres, conforme BRAGA, 2011.
Para BRAGA, 2011, faz-se necessário voltar a este acontecimento histórico
para estudá-las e conhecer, não apenas as mulheres sobreviventes, mas aquelas que
abriram mão de suas casas, famílias, trabalho ou de nada, e buscaram o Belo Monte
para lá encontrar alento para sua vida.
Fonte: alegriaeabundancia.blogspot.com
27
...Ali estavam, gafadas de pecados velhos, serodiamente penitenciados, as
beatas - êmulas das bruxas das igrejas – revestidas da capona preta
lembrando a holandilha fúnebre da Inquisição; as solteiras, termo que nos
sertões tem o pior dos significados, desenvoltas e desejadas, soltas na
gandaíce sem freios; as moças donzelas ou moças damas recatadas e
tímidas; e honestas mães de famílias; nivelando-se pelas mesmas rezas...
Faces murchas de velhas... rostos austeros de matronas simples; fisionomia
ingênuas de raparigas crédulas...Grenhas maltratadas de crioulas retintas...
(CUNHA, 2000, p.165, BRAGA, 2011)
Ainda segundo estudos realizados por BRAGA, 2011; algumas são as obras
impregnadas de impressões parciais e tendenciosas de seus autores que discordam
quanto à importância de Antônio Conselheiro e Canudos, uns exaltando-os, outros os
denegrindo. Dentre elas, O Rei dos Jagunços (1899), de Manoel Benício, um ex
correspondente do Jornal do Commercio; outra é Cangaceiros e Fanáticos (1963), de
autoria do advogado beberibense Rui Facó.
Duas mais recentes, ambas de 1995, provam que o tema Canudos segue igual
de interessante para pesquisadores e estudiosos da área: uma do doutor em História
Social pela USP, Marco Antônio Villa, que se intitula Canudos, o povo da terra e outra
do historiador americano Robert M. Levine, falecido em 2003, O sertão prometido: o
massacre de Canudos. Uma explicação plausível para a divergência de opiniões
acerca deste líder religioso nos é dada por (Silva, 2001, p. 249, apud BRAGA, 2011):
28
Euclides da Cunha que, como correspondente de guerra para o jornal O Estado de
S.Paulo, reuniu material suficiente in loco que cinco anos depois lhe serviria para tecer
sua obra célebre. João Guimarães Rosa caracterizava o sertão como uma área
escassamente habitada; já Euclides via o sertão como a representação do atraso,
habitado por uma “raça mestiça” ou pior, uma “sub-raça”. Segundo Iser (2008, p. 19
20, apud BRAGA, 2011),
Para BRAGA, 2011, na introdução do seu livro, Euclides da Cunha deixa claras
as ideias evolucionistas que lhe orientam a escrita. Referindo-se às sub-raças
encontradas no sertão do Brasil, sentencia: “Retardários hoje, amanhã se extinguirão
de todo”.
Conforme estudos de BRAGA, 2011;
29
Segundo estudos de BRAGA, 2011, o arcabouço teórico empregado por
Euclides da Cunha mistura as teorias raciais surgidas na Europa na segunda metade
do século XIX: o espírito científico da época que unia ao positivismo de Comte o
evolucionismo de Darwin e de Spencer.
Para BRAGA, 2011, Euclides da Cunha acreditava, como era de praxe na
época, na teoria do embranquecimento, que evitaria assim a miscigenação dos
brancos com "raças inferiores", a fim de que se pudesse manter uma certa
"estabilidade" e uma definição melhor sistematizada da "raça brasileira".
A obra Os Sertões se baseia no tripé que Taine estabeleceu, e que hoje se
encontra desacreditado, ao conceber o homem como o fruto de três fatores principais:
a raça, o momento histórico e o meio ambiente.
30
Fonte editoraluzeiro.com.br
No dizer de BRAGA, 2011; este foi um dado essencial para o início do resgate
de sua imagem nas décadas que se seguiriam, onde o tempo e a Ciência provariam
que Nina Rodrigues, suas teorias e a de outros afins foram ademais de injustas,
infundas para com Antônio Conselheiro e seus seguidores.
BRAGA, 2011 alega que independentemente do ponto de vista de Euclides da
Cunha sobre os sertões e os sertanejos em si, podemos afirmar que Os Sertões
perpassa os campos da prosa literária e da prosa científica; pertence, ao mesmo
tempo, ao domínio da História, da Sociologia e da Geografia; é uma obra que instaurou
um antes e um depois quanto ao tema e que deixou um legado respeitável ao mesmo
tempo que opositores ferrenhos.
Fazendo nossas as palavras de (Silva 2001, p. 247-248, apud BRAGA, 2011):
As faces de Conselheiro, em décadas de estudos, caminhou entre a vida de
um santo e a de um revolucionário.
Prática historiográfica comum, pois uma personagem histórica ganha
diferentes faces a cada geração de pesquisadores.
31
Entretanto, o que diferencia Antônio Conselheiro é que sua imagem, descrita
por Euclides, teve um impacto cultural que refletiria durante longo tempo. No caminhar
do século XX, essa postura começa a ser lentamente transformada (BRAGA, 2011).
Para BRAGA, 2011, esse outro, ou bárbaro, que até então surgia como uma
imagem que a elite letrada não queria para si, torna-se gradualmente algo que poderia
ser culturalmente valorizado.
Conforme BRAGA, 2011, em sua obra, curiosamente, essa valorização deu-se
via Europa. Muitos foram e são os autores e obras que trataram e tratam de nossas
raízes culturais nordestinas com a parcialidade necessária para defender nosso valor
frente a uma constante tentativa de massificação da cultura nacional focada no eixo
Rio-São Paulo e que, definitivamente, não nos representa.
Para BRAGA, 2011, dentre estes autores, a título de ilustração, podemos citar
alguns: Raquel de Queiroz, José de Alencar, Franklin Távora, Graciliano Ramos,
Jorge Amado e José Lins do Rego.
Nos estudos de BRAGA, 2011:
O romance regionalista, especialmente característico dos anos 30 do
passado século, teve como meta mostrar os conflitos e as contradições de
um Brasil que se queria moderno e industrializado, mas que devido aos
inúmeros “brasis” que o formavam (e ainda formam), guardava traços
arcaicos de uma sociedade agrária, patriarcal e, até certo ponto primitiva e
decadente.
De acordo com estudos realizados por BRAGA, 2011, havia nestes escritores
uma preocupação sociológica e documental, que os distinguia dos modernistas com
seu experimentalismo estético e, muitas vezes, vazio de sentido. Norteando esta
plêiade de artistas da palavra que se dedicaram a desnudar o Nordeste literariamente,
destacam-se a figura e a obra de Ariano Suassuna, um dos mais obstinados
defensores das manifestações culturais de nosso povo.
Para BRAGA, 2011, O sertão foi a seara de onde muitas de suas personagens
surgiram, ainda que ele não tivesse especial predileção pelo tema da Guerra de
Canudos.
Ainda segundo BRAGA, 2011, uma de suas obras mais amplamente
conhecidas em âmbitos nacional e internacional, O auto da Compadecida, tem o seu
cenário cravado no sertão pernambucano, onde deslizam personagens caricatas que
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transpiram o bom humor e a leveza do nordestino para lidar com suas agruras
quotidianas, muitas vezes provenientes de seu próprio habitat inóspito.
Fonte: brasildefato.com.br
Seu maior mérito como difusor entusiasta da cultura nordestina foi a tentativa
vitoriosa de trazê-la para o centro do cenário cultural de nosso país (que acabou
extravasando e rendendo-lhe o merecido reconhecimento internacional), revestindo-a
de um trato respeitoso para com suas peculiaridades que a fazem diferente das
culturas sulista, nortista e do centro-oeste e tão importante quanto, segundo BRAGA,
2011.
33
9 CANUDOS 1897: O MASSACRE FAZ CEM ANOS
Fonte: historiailustrada.com.br
De acordo com BRAGA, 2011, ao refletir sobre uma guerra fratricida que
opunha o litoral do país considerado avançado e civilizado ao interior de um Brasil
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que ainda conservava uma parte significativa de seu povo mergulhado no mais
profundo atraso, Euclides da Cunha expôs de forma contundente uma fratura quase
irremediável para o projeto nacional pensado pelos intelectuais que aderiram e
defenderam com afinco a causa republicana.
Conforme estudos de BRAGA, 2011, dividido entre a compaixão e a
reprovação, embora este último aspecto tenha dado o tom de sua análise sobre
Antônio Conselheiro, os sertões foi obra que imortalizou e vulgarizou boa parte das
discussões que permeavam os principais centros da intelectualidade brasileira na
passagem do século XIX para o XX.
Fonte: historiailustrada.com.br
De acordo com estudos de HERMANN, 1996, quando Moreira César foi morto
no sertão baiano, o primeiro governo civil e paulista da república, encabeçado por
Prudente de Morais, já estava no seu terceiro ano. Nesse período, a oposição política
do grupo militar que deixara o poder só fizera crescer e encontrara agora, na morte
de um de seus mais ilustres representantes, um fortíssimo argumento para questionar
a legitimidade dos verdadeiros princípios de um governo que não conseguia proteger
suas instituições contra os defensores da restauração monárquica, forma como
passaram a ser identificados os conselheiristas.
36
Segundo HERMANN, 1996; a partir destas questões, a intenção é analisar
como alguns discursos veiculados por uma parte da imprensa do Rio de Janeiro, então
capital federal, procuraram justificar a necessidade da repressão ao grupo liderado
por Antônio Conselheiro e, enfocando a conjuntura política que produziu e alimentou
esses discursos, discutir a hipótese de que a magnitude e a ferocidade do combate
ao arraial de Canudos resultaram não do efetivo perigo restaurador representado
pelos miseráveis sertanejos, mas de um cenário político específico que fez da
destruição de Canudos a prova necessária e urgente para a confirmação do
compromisso assumido com os princípios de um governo verdadeiramente
republicano.
A questão é ressaltar a importância e a envergadura do debate político que
opôs civis e militares e levou à supervalorização dos conselheiristas como poderosos
inimigos da nação, aspecto que só ganhou contornos grandiosos depois da morte de
Moreira César.
O objetivo é fornecer elementos para que a reflexão sobre a guerra de
Canudos passe a considerar mais cuidadosamente o contexto político que
transformou famintos sertanejos em inimigos nacionais, processo que
legitimou a construção de uma identidade, de um lado, e a necessidade da
exclusão física do opositor, de outro.( HERMANN, 1996)
Como caracteriza HERMANN, 1996, esta mesma linha de raciocínio pode ser
empregada para os argumentos que embasaram o discurso cientificista que, opondo
civilização e barbárie, pregou a necessidade científica, social e moral da eliminação
de brasileiros considerados híbridos e defeituosos, “naturalmente” avessos à ordem e
ao progresso.
Nessa perspectiva, voltar a discutir o extermínio de Canudos, cem anos depois,
a partir do binômio identidade e exclusão, parece tão contemporâneo quanto falar do
enorme fosso que ainda separa o discurso da prática efetiva do exercício pleno da
cidadania no Brasil neste final de século e de milênio, enfatiza HERMANN, 1996.
37
momento político que antecedeu à decisão político-militar de exterminar os seguidores
de um beato errante que se estabelecera na Fazenda Belo Monte lá pelos idos de
1893.
Do ponto de vista de HERMANN, 1996, os autores que se debruçaram sobre
o tema apenas tangenciaram uma questão crucial, que continua sem resposta.
Afinal, por que só quatro anos depois de instalados numa área extremamente
seca e infértil, no sertão de um estado que perdera gradativamente sua importância
econômica, os conselheiristas se tornaram um problema que punha em risco a
manutenção da ordem republicana? Enfatiza HERMANN, 1996.
Como caracteriza HERMANN, 1996, Euclides da Cunha, por exemplo, contou
a história da campanha de Canudos a partir de suas inquietações sobre a formação
da nação brasileira e dos entraves que impediam a concretização dos pressupostos
positivistas que aliavam ordem e progresso. Canudos era a representação do
paroxismo a que o atraso poderia levar o país, caso o Brasil não assumisse o claro
compromisso de se unir ao mundo civilizado.
MONTEIRO, 2009 relata que, o lugar escolhido era uma fazenda abandonada,
que ficava às margens do rio Vaza-Barris. O nome Canudos, que acabou por se
popularizar, é referência uma planta da região, de haste oca como um Canudo,
utilizada por antigos para fazer canudos de pitos para fumar.
Segundo estudos de MONTEIRO, 2009, os números não são precisos e há
muita controvérsia sobre o número de habitantes de Belo Monte. De modo geral, fala-
se em algo em torno de 10 mil a 35 mil habitantes.
Como descrito por MONTEIRO, 2009, o fato é que famílias inteiras
abandonavam seu trabalho nas fazendas para seguir o Conselheiro. Em três anos de
existência Canudos teria se tornado a segunda cidade da Bahia em número de
38
habitantes o que provoca uma escassez de mão de obra nas fazendas para
descontentamento de muitos coronéis da região.
Fonte: anovademocracia.com.br
A preocupação dos generais era não deixar uma parede em meio, uma viga
intacta. Quiseram que ali se plantasse a solidão e a morte. (, 1997:17, apud
MONTEIRO, 2009)
41
Outros julgam que ele não deveria ter resistido para poupar a população. O
centenário da guerra e posteriormente o centenário da publicação dos Sertões abrem
espaço para uma grande quantidade de novas publicações e debates que procuram
analisar Canudos por vários prismas. Percebe-se uma de ênfase interdisciplinar e o
diálogo entre áreas do conhecimento como a antropologia, a linguística, a psicologia,
a cultura como descrito por MONTEIRO, 2009.
Para MONTEIRO, 2009, na mitologia grega, ao morrer o homem encontrava no
Hades duas fontes: Léthes e Mnemosyne.
42
Para MONTEIRO, 2009, no século XX, a crença no progresso e no bem-estar
que ele traria se perdeu. O ponto nevrálgico, o momento de virada, o fator detonadores
da perda da esperança no futuro e no progresso que marcaram fortemente o final do
século XIX teria sido a experiência do horror do holocausto.
Segundo MONTEIRO, 2009, o extermínio em massa, sem precedentes na
história da humanidade, os campos de concentração abalaram de forma irreversível
a crença otimista no futuro. O futuro já não imprime uma visão primordialmente solar.
Segundo alguns autores, como Andréas Huyssen, se a Belle Époque foi a
época de futuros presentes, a virada do século XX é marcada por passados presentes.
Dentro deste contexto a memória adquire um status de objeto de desejo. O presente
traria o passado com medo de perdê-lo, enfatiza MONTEIRO, 2009.
Como descrito por MONTEIRO, 2009, o presente é paradoxal, é quase como
se não existisse, a velocidade das mudanças esvazia o presente e a memória torna-
se uma forma de ancoramento frente a velocidade do momento presente e também
frente ao futuro incerto. Antônio Conselheiro não morreu pelas mãos de nenhum
soldado republicano, mas de morte natural.
Morreu em vinte e dois de setembro, antes do desfecho da guerra. Conselheiro
é um personagem polêmico, desenhado por contrastes, marcado por visões que o
desenham de forma antagônica, conclui MONTEIRO, 2009.
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Dentre aqueles que conheceram e conviveram com o peregrino no arraial de
Belo Monte tem uma visão parecida que exalta as qualidades de seu líder e guia.
Maria Avelina da Silva assim o descreve:
O Bom Jesus foi um santo homem que somente aconselhava para o bem.
Nunca fez mal a ninguém. E Francisca Guilhermina dos Santos, que tinha 15
anos quando o conflito começou reforça as palavras de Francisca:
Conselheiro (...) só dava conselhos bons. Manoel Ciríaco o descreve como
Homem bom e respeitador. Mulher para ele era para se respeitar e muito. E
Maria Guilhermina de Jesus afirma: nasci e me criei dentro de Canudos, onde
fiquei até o fim da luta. (...) lembro-me bem de Antônio Conselheiro, homem
muito bom e não havia ninguém que não gostasse dele. O sobrevivente Velho
Mariano, que tinha 50 anos na época da guerra, conclui: Só podia ser um
santo homem. Não mandava matar, não mandava mentir, não mandava
furtar. Só levava para o bem (TAVARES, 1993:39- 51, apud MONTEIRO,
2009).
10 NOMES DE GUERRA
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Fonte: saopaulo.sp.leg.br
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Nem todos os “patriotas e heroicos soldados” homenageados pela Câmara
eram tão heroicos assim. O próprio Moreira César não ganhara o apelido Corta-
Cabeças por ser um defensor dos direitos humanos. (FILHO,2013)
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Já o Cabo Roque era celebrado como o herói que teria sido morto enquanto
protegia o cadáver de Moreira César dos jagunços de Canudos, parafraseia
FILHO,2013.
O heroísmo durou até o cabo ser descoberto, muito vivo, e confessar que,
durante o conflito, havia simplesmente largado o corpo do comandante no mato e
saído correndo, “vítima da desgraça de não ter morrido, trocando a imortalidade pela
vida”, nas palavras de Euclides da Cunha, segundo estudos de FILHO,2013.
Para FILHO,2013, o personagem teria inspirado o dramaturgo Dias Gomes a
criar o Cabo Jorge, protagonista da peça O Berço do Herói, de 1963, um personagem
que passa a ser considerado herói após ser falsamente dado como morto.
FILHO,2013 destaca que:
Em 1985, Dias Gomes reaproveitaria o mesmo mote na trama da sua
tele no- vela Roque Santeiro. Por outro lado, ninguém até hoje
desmentiu a história do martírio do Capitão José Salomão da Rocha,
que “tombou, retalhado a foiçadas, junto dos ca- nhões que não
abandonara”, também segundo Euclides da Cunha.
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(1889-1894), período em que o recém-proclamado regime republicano, comandado
por militares, esmagou uma série de revoltas contra o governo federal.
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Fonte: saopaulo.sp.leg.br
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11 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CÂMARA, Yzy Maria Rabelo; CÂMARA, Yls Rabelo. Canudos revisitado: uma breve
análise do que foi a utopia de Antônio Conselheiro, ameaça à consolidação do
poder da república no final do século xix. Revista Entrelaces, [S. l.], p. 1-15, 5
maios 2015.
BRAGA, Udineia Braga. Canudos: Uma guerra, muitas mulheres. Anais do XXVI
Simpósio Nacional de História – ANPUH, [S. l.], p. 1-11, 1 jun. 2011.
FILHO , Fausto Salvador. Nomes de guerra. Revista Apartes, [S. l.], p. 32-36, 1 dez.
2013.
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12 BIBLIOGRAFIA
CHIAVENATO, Júlio José. As Meninas de Belo Monte. São Paulo, Página Aberta,
1993.
ALMEIDA, Jane Soares de. Mulher e Educação: a Paixão pelo Possível. Editora
UNESP, 1998.
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