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Avaliação dos Desvios

Fonéticos e Fonológicos

Fga Ana Teresa Britto


PUC-Minas
Avaliação
• Principal ferramenta
do terapeuta:
diagnóstico apurado,
identificação da
etiologia e das
condições
agravantes e base
para a intervenção
eficiente.
Avaliação

• Mudanças consideráveis nas duas últimas


décadas: modificação da ênfase

• Nível Fonético (mecânica de produção da fala)

 Nível Fonológico (organização dos sistemas de


sons da fala)
Categorias dos Desvios de Fala

Classificação dos Desvios Fonológicos

1. Lowe, 96:
1. Desvios Fonéticos
2. Desvios Fonológicos
2. Wertzner, 2003:
1. Com alteração Fonética
2. Com alteração Fonêmica
Desvios/Desordens/Distúrbios Fonológicos
(Lowe, 96 , Wertzner 2003)

Desvio Fonético Com alteração Fonética

• Erros de articulação, que resultam na produção não-padrão da fala:


Distorções com manutenção da contrastividade;

Dificuldade no processo que envolve a articulação – planejamento e execução de


seqüências regulares de gestos dos órgãos da fala. Desorganização de algum nível
periférico do processo articulatório

Desvio Fonológico Com alteração Fonêmica

• Resultado da neutralização de contraste:

Cr não diferencia plosivos de fricativos (Plosivização /sapo/ - /tapo/)

• E também posterior de anterior (Anteriorização /kalu/ - /talu/)

• Dificuldade na representação mental da regra fonológica.


Classificação dos Desvios Fonológicos
3. Perspectiva Evolutiva (Motta, 2001)
• 3.1 Desenvolvimento Atrasado: criança
desenvolve padrões normais, porém de forma mais
lenta

• 3.2 Desenvolvimento Variável: criança usa padrões


de diferentes estágios de desenvolvimento
fonológico, apropriados, atrasados ou mesmo
adiantados para a idade (desencontro cronológico)

• 3.3 Desenvolvimento Diferente: criança usa


padrões incomuns ou atípicos, que não são
encontrados no desenvolvimento fonológico normal
4.Subtipos de desvio de fala (Dodd, 2005)

• 4.1.Desordem da articulação: desvios fonéticos


• 4.2.Desenvolvimento fonológico atrasado:
processos fonológicos que ocorrem no
desenvolvimento normal, porém cronologicamente
atrasados
• 4.3.Desordens Fonológicas Consistentes:
processos comuns e incomuns
• 4.4.Desordens Inconsistentes: uso variável em
uma mesma palavra (40% de variabilidade)
• 4.5.Outros (como dispraxia)
Desvio Fonético X Desvio Fonológico
• Mantem contraste entre • Neutraliza contraste
sons entre sons
• Produção de sons não- • Produção de sons
padrão da língua padrão da fala
• Exemplos: • Exemplos:
[s] > [‫ ]ׯ‬ou [ُ] [s] > [t]
[z] > [ᾩ] ou [‫]ڳ‬ [Ѐ] > [s]
A produção interdental ou Produção correta de [s],
lateralizada ainda é mas com perda do
contrastiva contraste fonológico
Deficiência Fonológica
(Stöel-Gammon e Dunn, 1985)

• Sistemas estagnados no nível inicial do


desenvolvimento
• Grande variabilidade de produção
• Persistência de processos fonológicos além
das idades de ocorrência esperadas em
crianças com desenvolvimento normal
• Desencontro cronológico
• Ocorrência de regras ou processos
idiossincráticos – redução da inteligibilidade
• Uso restrito de contrastes
Gênero: > meninos

Comorbidade: ↓ vocabulário, ↓compreensão

Epidemiologia

• Desvios Fonéticos = 12,5%


• Desenvolvimento Atrasado = 57%
• Desordens Consistentes = 20,6%
• Desordens Inconsistentes = 9,4 %
• Outros (como dispraxia) = -1%
Avaliação (Grunwell, 1992, p.458)

“Devido ao fato de as crianças que estão sendo


avaliadas apresentarem dificuldades na aprendizagem
da pronúncia, as avaliações lingüísticas e fonológicas
devem ser complementadas por informações sobre os
fatores que poderiam estar incidindo sobre a habilidade
da criança em aprender. Uma abordagem
multidimensional é, portanto, essencial; esta deveria
incluir avaliações anatômicas, fisiológicas e
neurológicas, avaliação das habilidades cognitivas e
consideração dos fatores sócio-ambientais”.
Visão Geral da Avaliação
• A avaliação é mais que uma descrição dos
erros dos sons da fala;

• Engloba vários outros fatores, que refletem o


uso típico que a criança faz dos sons da fala,
nas atividades cotidianas;

• Deve possibilitar observar a variabilidade na


produção assim como possíveis influências do
contexto.
1) Existe um problema?

• Dificuldade na inteligibilidade;
• Reação negativa à fala;
• Afastamento da interação social.

O tratamento deverá abordar e enfatizar


aspectos positivos da fala.
2) Qual a natureza do problema?

• Gravidade
• Análise Fonética
• Análise Fonológica

A medida da gravidade dá respaldo quantitativo


para a terapia e para o monitoramento do
progresso da mesma.
3) Quais as capacidades da pessoa?

• Inventário Fonético
• Estrutura Silábica
• Sistema de Contrastes
• Estimulabilidade
• Alternâncias Fonéticas

As avaliações tendem a enfatizar as


deficiências. O exame das capacidades é
valioso para a intervenção
4) Explicações para o problema?

• Sistema Lingüístico
• Sistema Cognitivo
• Sistema Sensorial
• Sistema Motor
• Adequação estrutural do mecanismo da
fala
• História evolutiva (desenvolvimento)
5) Fatores agravantes

• Meio social
• Palavras – problema
• Fontes de frustração
• Necessidade de fala

Mudanças no ambiente familiar e social podem


ser parte necessária do programa de
intervenção, para que se tenha sucesso na
terapia
Obtenção da amostra de fala

• Repetição
• Fala espontânea (encadeada)
• Nomeação espontânea:
-desenho isolado
-desenho temático
• Gravação
• Transcrição
Repetição
↑ Meio mais simples e mais rápido.
↑ Avaliação do emprego de todos os sons da
língua.

↓ Ao repetir a produção lingüística é


melhorada.
↓ Não reflete a realidade do inventário fonético
e nem do sistema fonológico da criança.
(repetições devem ser identificadas)
Fala Espontânea
↑Amostragem representativa - reflete o uso típico que a
criança faz da fala nas atividades cotidianas
↑ Possibilidade de avaliar a variabilidade na produção
ou a influência do contexto fonético (ambientes de
som, padrão silábico, acento)
↑ Deve ser utilizada em todas as situações de avaliação

↓ Amostras incompletas por acaso ou evitação.


↓ Amostras longas (maior tempo de análise e
transcrição)
Nomeação Espontânea
↑ Evita repetições
↑ Possibilidade de realização de todos os fones
contrastivos, em todas a posições - ISIP,
ISDP, FSDP, FSFP.
↑ Produção de palavras de diferentes classes
gramaticais ( substantivos, verbos, adjetivos)
↑ Economia de tempo na coleta , transcrição e
análise
↓ Restrição quanto ao tamanho da amostragem
Instrumentos da Nomeação Espontânea

1. Desenho isolado: desenho ou objeto


utilizado para estimular a elicitação
2. Desenho Temático: figura temática
que propicia a produção de palavras-
chave, além de comentários, narração,
descrições.
Desenho Isolado
• Amostragem
limitada
• Tendência a
elicitação
unicamente de
palavras isoladas
Desenho Temático
• Amostra pode
conter palavras
isoladas e também
frases
• Mais vantagens na
obtenção de
amostra lingüística
significativa
Coleta de dados de fala

• Gravação: • Transcrição:
Muito importante Deve ser feita junto
para pesquisas e com a gravação,
acompanhamento durante a avaliação,
longitudinal dos para posterior
casos. correlação e análise
Observar qualidade da amostra.
de gravação dos
dados.
Fala Encadeada X Palavras Isoladas
(Healy e Madison, 1987; Andrews e Fey, 1986)

• Fala encadeada revela mais erros do que palavras


isoladas: maior número de omissões, substituições e
distorções em distribuição similar;
• ≈ 15% dos erros de fala encadeada produzidos em
palavra isolada;
• ≈ 20% de todos os erros na fala produzidos de forma
diferente em palavras isoladas;
• Além de mais erros na fala encadeada, os tipos de
erro foram também diferentes.
• Maior ocorrência de processos na fala encadeada.
Fala Conversacional X Teste de
Articulação
(Morrison e Shrieberg, 1992)

• Pesquisa com 61 crianças com atraso na fala:


- Vogais, ditongos e encontros melhores na fala
convencional;
- 77% com articulação melhor na fala;
- sons estabelecidos foram melhores na fala e sons em
desenvolvimento melhores no teste de articulação;
- Os dados sobre Processos Fonológicos foram mistos:
1. redução de encontro e semivocalização de líquidas
mais freqüentes no teste de articulação
2. plosivização e apagamento final na fala
conversacional
Que amostragem utilizar para a
avaliação?
• Para se avaliar
adequadamente
padrões de fala,
deve-se realizar um
teste convencional e
obter também uma
amostra de fala
espontânea.
Obtenção da Amostra de Fala
Espontânea

• Objetiva levantamento do quadro geral


do sistema de fala da pessoa
• A Fala pode ser modificada dependendo
da intenção, situação, necessidade
comunicativa e dos conteúdos
lingüísticos
Obtenção da Amostra de Fala
Espontânea

• Menyuk (1980) observando cinco crianças


encontra melhora nos padrões de fala quando
elas tentam transmitir uma informação
importante: “...a avaliação do desempenho
fonológico que não leva em consideração o
que as crianças conseguem fazer sob
condições adequadas, proporciona uma visão
restrita de suas capacidades fonológicas”.
Obtenção da Amostra de Fala
Espontânea

1. Entrevista com os pais (intenções


comunicativas da criança)
2. Ambientação de interesse da criança
(brinquedos, objetos ao alcance dela)
3. Estruturação de atividades que abram as
portas da comunicação (interação)
4. Registro de fala com pessoas significativas
(hora de jogo familiar)
Análise da Fala
• A apuração
detalhada das
características
individuais de cada
falante é de
fundamental
importância para o
diagnóstico das
desordens da fala.
Analisando as Desordens da Fala

1. Análise PVM – Ponto, Vozeamento e


Modo de Articulação
2. Análise dos Traços Distintivos
3. Análise Contrastiva
4. Descrição Fonética
5. Análise dos Processos Fonológicos
6. Análise da Fala Espontânea
1. Análise PVM

• Considera a relação entre os desvios


dentro do Sistema Fonológico, baseado
na classificação fonética de
Ponto/Local/Zona de articulação,
Vozeamento e Modo de articulação
Análise PVM (pré, inter, pós-vocálico)

m n ֊ p b t d k g f v s z Ѐ dЋ h tЀ dЋ l r ¥

1
x xx

x x x x x x x xx x x x x x x xxx 3
2. Análise dos Traços Distintivos
• Toma como referência as matrizes de traços
distintivos (Chomsky & Halle, 1968) – unidades
mínimas que se unem para a composição de um
segmento da língua.
• Cada som é o conjunto de propriedades ou traço que
o identifica e o distingue de todos os outros sons.
• Dois fonemas são muito semelhantes ou muito
diferentes dependendo do número de traços que têm
em comum (/l/ e /r/ são muito semelhantes, daí
serem substituídos entre si por muitas pessoas. /t/ e
/l/ apresentam grande distância fonética, o que torna
improvável uma substituição entre eles)
Traços Distintivos
/r/ /l/ /t/ Na terapia o objetivo é
Soante + + - desenvolver um
Consonan. + + + programa que leve a
pessoa a adquirir os
Lateral - + - contrastes de traços,
Nasal - - - que são responsáveis
Sonoro + + - pela diferenciação dos
Contínuo + + - fonemas.
Anterior + + - Ex: [faka] e [vaka] se
diferenciam pelo traço
de sonoridade.
3. Análise Contrastiva

• Analisa a contrastividade entre os


diferentes sons da fala, tomando como
princípio básico a comparação do
sistema da criança com o sistema
padrão-alvo.
• É necessário avaliar tanto o inventário
fonético quanto o sistema fonológico
padrão.
4. Descrição Fonética

• Os erros na produção da fala são vistos


como entidades separadas,
primariamente, como um problema de
produção motora.
• Levantamento do Inventário Fonético
• Quadro fonêmico
Quadro Fonêmico
p t k Legenda
b d g
m n ֊
 Substituição
f s Ѐ
v z Ћ
⊗ Omissão
¥ l h
tЀ dЋ ‫ש‬
y w
• Ver protocolos AFC
• Registro de Fala:
– Inventário de consoantes, vogais e
encontros consonantais
5. Análise dos Processos Fonológicos

• Descreve e explica os desvios de fala relacionando-os


com os componentes lingüísticos da fala, sua
distribuição e função no Sistema Fonológico.
• Baseado na Teoria da Fonologia Natural (STAMPE,
1973): “ é uma operação mental que se aplica à fala
para substituir, em lugar de uma classe de sons ou
seqüência de sons que apresentam uma dificuldade
específica comum para a capacidade de fala do
indivíduo, uma classe alternativa idêntica em todos
os outros sentidos, porém desprovida da propriedade
difícil”.
Processos Fonológicos
• Mais de 40 processos podem ser identificados
na fala, porém alguns ocorrem com maior
freqüência (exemplo do ”mineirês”- ASA).
• Processos Naturais ocorrem no decurso do
desenvolvimento em crianças. Ao se
manterem, são usados para identificar as
alterações de fala.
• Processos Incomuns ou idiossincráticos
ocorrem raramente
Classificação dos Processos

• Processos de Estrutura Silábica (apagamento)

• Processos de Substituição

• Processos de Assimilação

• Processos de Vozeamento
Processos de Estrutura Silábica

• Descrevem mudanças que afetam a estrutura


silábica. Observados em crianças menores
(Prater & Swift, 1982)

1. Redução de Encontro Consonantal [pratω]


1.1 RTE - redução total [at ω]
1.2 RPE - redução parcial [pat ω]
1.3 SE - substituição de um elemento [plat ω]
Processos de Estrutura Silábica
2. Apagamento de Sílaba Átona (APA)
Ex: telefone > [te’fõny]
3. Reduplicação (Red)
Ex: sapato > [pa’patω]
4.Apagamento Líquida Intervocálica (ALIn)
Ex: jacaré > [Ћaka’lϯ]
5. Apagamento Fricativa Final (AFF)
Ex: pasta > [‘patA]
6. Metátese: reordenação de sons dentro da palavra
Ex: [‘manikA] [dagrãw] [asurkA]
Processos de Substituição
1. Plosivização (PLO): fricativas > plosivas
Ex: sapo >[tapω]
2. Anteriorização (Ant): posterior > anterior
Ex: casa > [tazA]
3. Posteriorização: oposto da posteriorização
4. Substituição de Líquidas: “Cebolinha”
5. Semivocalização de Líquidas: líquida > semivogal
Ex: bola > [‘bѐlϪ]
6. Deafricação: africada > fricativa
Ex: tia > [Ѐ i A]
Processos de Assimilação

• Um som torna-se semelhante ou é


influenciado por outro

1. Velar: taco > [‘kakω]

2. Labial: girafa > [virafA]

3. Nasal: sabonete > [samonetЀι]


Processos de Vozeamento
1. Desvozeamento
1.1 Desv. Total: obstruintes vozeadas > não vozeadas
Ex: zebra > [sebrA]
1.2 Desv Parcial: obstruintes vozeadas > desvozeadas
no início ou final
Ex: zebra > [z ebrA]
2.Sonorização Intervocálica
Ex: abacate >[abagatЀι]
Critérios de Seleção para Identificação de
Processos Fonológicos

• Para ser considerado um processo, uma


mudança de som deveria ter uma ocorrência
de 20% ou mais (McReynolds e Elbert, 1981)

• Um processo deve ter uma ocorrência de


40% ou mais para se qualificar a intervenção
(Hodsen e Paden, 1983/91)
6.Análise da Fala Espontânea

Após a coleta da fala espontânea (já discutida


anteriormente), avalia-se o índice de
severidade, para monitoração do progresso
na terapia.

A aplicação periódica durante o tratamento


fornece ao terapeuta um valor geral para a
avaliação da eficácia do tratamento.
Tamanho da amostra

• Amostra devem conter pelo menos 100


(cem) palavras

• É recomendável registrar a maior


amostra possível na oportunidade
Índice de severidade na fala

PCC - Percentagem de Consoantes


Corretas
(Shrieberg e Kwiatkowski, 1982)

PCC= __consoantes corretas X 100


consoantes corretas + incorretas
PCC - escores

desvio médio DM ⇒ 85 < PCC < 100 %

desvio médio-moderado DMM ⇒ 65 < PCC < 85 %

desvio moderado-severo DMS ⇒ 50 < PCC < 65 %

desvio severo DS ⇒ PCC < 50 %

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