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Capı́tulo 1

Conceitos básicos em vibrações

1.1 Introdução

A primeira pergunta a ser respondida antes de iniciar o estudo de vibração é


”Por que estudar vibrações?”.
Vibrações mecânicas estão presentes em muitas de nossas atividades
diárias, e conhecer os fenômenos envolvidos com a vibração de componen-
tes ou estruturas é essencial para se entender o funcionamento de sistemas
mais complexos e, caso necessário, modifica-los de forma proveitosa.
De uma forma geral, vibrações podem ser desejadas ou indesejadas. Um
exemplo de vibração desejada é a vibração do cone de um alto-falante, a qual
é responsável pela geração do som que escutamos. Outro exemplo de vibração
desejada é a vibração do tı́mpano no sistema auditivo e que permite que se
escute o som ambiente. Outros exemplos de engenharia são o uso de vibração
para a limpeza de peças ou a compactação de material.
Os exemplos de vibrações indesejadas também são bastante numerosos e
pode-se citar os seguintes:
• Vibração em um foguete durante seu lançamento, o que pode danificar
algum componente;
• Vibração durante um processo de usinagem, o que pode prejudicar o aca-
bamento superficial de uma peça;
• A vibração de equipamentos de metrologia, o que pode resultar em erros
de medição;
• O ruı́do provocado pela vibração de estruturas;
• Etc.

No caso da geração de ruı́do, a vibração de estruturas ou componentes é a


principal causa do ruı́do presente em instalações industriais. Assim, conhecer
os parâmetros que controlam a vibração dessas estruturas é fundamental para
compreender o processo de geração de ruı́do e identificar as melhores formas
de reduzir o ruı́do gerado.

9
10 1 Conceitos básicos em vibrações

Nesse capı́tulo, o estudo de vibrações será iniciado pela discução dos con-
ceitos básicos relacionados com vibrações.

1.2 Procedimento de análise de vibrações

Uma vez identificado um problema de vibrações, é necessário definir um pro-


cedimento de análise para o problema. Nesse sentido, o primeiro passo é
buscar simplificar o problema de forma a dar destaque às variáveis mais im-
portantes. Assim, um problema de vibrações é normalmente representado de
forma simplificada através de um esquema, como mostrado na Fig. 1.1, onde
o sistema vibratório é mostrado como uma caixa que recebe uma excitação e
retorna uma resposta vibratória (também chamado de relação excitação-
resposta).

Excitação Resposta

f (t) x(t)
Sistema Vibratório

Figura 1.1: Representação esquemática de um problema de vibrações através


de uma relação excitação-resposta.

O principal objetivo aqui é, a partir do conhecimento do comportamento


do sistema, prever a resposta obtida para uma dada excitação. Esta previsão
é normalmente feita através de um modelo matemático do sistema. Uma
vez obtido o modelo matemático, é possı́vel verificar a influência de diferentes
parâmetros do sistema mecânico sobre a resposta obtida.
Um bom modelo matemático pode ser de grande importância na solução
de problemas de vibração, assim como no projeto de estruturas que ainda
não existem. No caso de um problema de vibrações já existente, o modelo
matemático permite testar virtualmente diferentes soluções para o problema
e identificar a melhor delas, reduzindo o tempo de solução e otimizando os
resultados. Já no caso de um novo produto, o modelo matemático permite
verificar se o sistema terá problemas de vibração antes da construção dos pri-
meiros protótipos, reduzindo os custos com a construção de vários protótipos
e com os testes que teriam que ser feitos, além de reduzir o tempo total de
projeto.
Um exemplo desse tipo de abordagem pode ser dado pelo problema de
vibração da fuselagem de um avião devido ao desbalanceamento dos moto-
res. Nesse caso, a excitação é a força de desbalanceamento dos motores e o
sistema mecânico é composto pela fixação dos motores, a asa e a fuselagem.
A resposta do sistema é a vibração da fuselagem do avião. A partir de um
1.2 Procedimento de análise de vibrações 11

modelo matemático do sistema é possı́vel propor mudanças na estrutura do


avião de forma a reduzir a vibração da fuselagem e, consequentemente, re-
duzir o ruı́do interno do avião. Aqui, a principal vantagem de um modelo
matemático é permitir a simulação de diferentes modificações do sistema
sem ser necessária a construção de protótipos e a realização de medições.
Imagine o custo de construir diferentes aviões e realizar ensaios em vôo para
determinar os novos nı́veis de vibração! Desta forma, um modelo matemático
confiável pode representar uma redução significativa de custos e de prazos na
solução de problemas de vibração.
É importante destacar que um modelo matemático é sempre uma apro-
ximação de um sistema fı́sico real. O modelo deve incluir os parâmetros do
sistema que são determinantes para o seu comportamento vibratório, mas
não deve ser demasiadamente complexo a ponto de dificultar a análise do
problema. O número de parâmetros a serem considerados no modelo deve
ser determinado pelo grau de precisão dos resultados que serão obtidos pelo
modelo.
Em geral, modelos matemáticos de sistemas vibratórios podem ser dividi-
dos em dois grandes grupos: sistemas discretos e sistemas contı́nuos. No
caso de sistemas discretos ou de parâmetros concentrados, os parâmetros que
definem o comportamento dinâmico do sistema são discretizados na forma de
elementos de massa, rigidez e amortecimento (os quais são discutidos em mais
detalhes nos próximos itens), e a vibração do sistema pode ser representada
por um número finito de variáveis independentes, chamadas de graus de
liberdade (GL). Já no caso de sistemas contı́nuos ou distribuı́dos, a massa,
rigidez e amortecimento do sistema estão distribuı́dos espacialmente e são
representados através de funções espaciais. Sistemas contı́nuos possuem infi-
nitos GL. Um resumo das caracterı́sticas de modelos matemáticos discretos
e contı́nuos é mostrado na Tabela 1.1.

Tabela 1.1: Caracterı́sticas de modelos discretos e contı́nuos.

Sistemas Discretos Sistemas Continuos

Caracterı́sticas dinâmicas concentra- Caracterı́sticas dinâmicas dis-


das em elementos tribuı́das (funções)
No. finito de GL No. infinito de GL
Equações Diferenciais Ordinárias Equações Diferenciais Parciais

Um exemplo da representação de um sistema fı́sico por um modelo discreto


é apresentado na Fig. 2.1. Aqui a máquina de lavar é tratada como um corpo
rı́gido (não sofre deformação) e a rigidez e o amortecimento do sistema advêm
dos apoios da máquina de lavar.
12 1 Conceitos básicos em vibrações

Figura 1.2: Máquina de lavar (a) e uma opção de modelo discreto (b) [5].

Outro exemplo da representação de um sistema fı́sico através de mode-


los matemáticos é dado na Fig. 1.3. Nesse caso, dois modelos distintos são
apresentados para o comportamento dinâmico de um foguete. No primeiro
modelo, a massa e a rigidez do sistema são concentrados em determinados
elementos, ou seja, um modelo discreto. Já o segundo modelo é baseado na
distribuição espacial da massa e rigidez do sistema através de um modelo de
sistema contı́nuo.

Figura 1.3: Modelos dinâmicos de um foguete: a) Sistema real, b) Modelo


discreto e c) Modelo contı́nuo [5].

Uma vez definido o tipo de modelo matemático que será utilizado (in-
cluindo os graus de liberdade que serão considerados), os próximos passos no
procedimento de análise de um sistema vibratório incluem:
a) Caracterizar os componentes constituintes do sistema com relação ao seu
comportamento dinâmico;
1.3 Componentes de sistemas discretos 13

b) Definir as equações do movimento do sistema;


c) Solucionar as equações do movimento, levando em conta o tipo de ex-
citação;
d) Analisar a resposta do sistema e propor alterações que a aproximem a
resposta do sistema ao comportamento desejado.
Cada uma dessas etapas será discutida em detalhes ao longo desta apostila.

1.3 Componentes de sistemas discretos

De forma geral, os componentes de um sistema vibratório podem ser divididos


em três grandes grupos:
a) Componentes que armazenam e liberam energia cinética;
b) Componentes que armazenam e liberam energia potencial;
c) Componentes que dissipam energia.
Nesse sentido, o movimento vibratório de um sistema é caracterizado pela
constante conversão de um tipo de energia na outra, com parte da energia
sendo dissipada.
Outra forma de dividir os componentes está relacionada com a força que o
componente exerce ser proporcional ao deslocamento, velocidade e aceleração.

1.3.1 Elemento de rigidez (ou de mola)

O elemento de rigidez representa um componente do sistema vibratório cuja


massa e amortecimento são desprezı́veis e cujo principal papel é armazenar
energia potencial elástica quando deformado. O exemplo mais comum de
um componente fı́sico que pode muitas vezes ser aproximado através de um
elemento de mola é uma mola helicoidal, como mostrado na Fig. 1.4.

Figura 1.4: Mola helicoidal [5].

A Fig. 1.5 apresenta a representação esquemática normalmente utilizada


para representar um elemento de rigidez em um sistema discreto.
14 1 Conceitos básicos em vibrações

Figura 1.5: Representação de um elemento de mola [5].

Nesta apostila serão considerados apenas elementos de mola linear cuja


força de mola Fs é proporcional à deformação aplicada sobre a mola, sendo
dada por

Fs = kx (1.1)
onde k é a constante de rigidez da mola [N/m] ou simplesmente constante de
mola e x = x2 − x1 é a deformação aplicada à mola.

O elemento de rigidez descrito acima está associado a um movimento de


translação. Entretanto, também pode-se armazenar energia potencial a partir
de um movimento de rotação. Nesse caso, o elemento é chamado de mola
torcional e representado como na Fig. 1.6. A relação entre o momento da
mola Ms e a deformação angular θ é dada por

Ms = k t θ (1.2)
onde kt é a constante de mola torcional [N.m/rad] e θ = θ2 − θ1 [rad].

Figura 1.6: Representação de um elemento de mola torcional [5].

Ambos os elementos de rigidez descritos acima são ditos molas lineares,


para qual a relação entre força e deformação (ou entre momento e deformação
angular) é linear e definida pela constante de mola. De forma geral, ne-
nhum elemento de rigidez real apresenta um comportamento perfeitamente
linear. Entretanto, para pequenos deslocamentos a representação do elemento
através de uma mola linear é geralmente aceitável. Um comportamento tı́pico
da relação força-deformação de um elemento de estrutural é mostrado na
Fig. 1.7, onde pode-se observar que a hipótese de comportamento linear é
válida para uma faixa de valores pequenos de deformação.
1.3 Componentes de sistemas discretos 15

Figura 1.7: Relação força-deformação tı́pica para um elemento estrutural.

Nos casos em que o elemento trabalha em um ponto fora da faixa linear,


é possı́vel ainda aproximar o comportamento elástico do material assumindo
pequenas variações da deformação em torno do ponto. Assim, para um ponto
x0 , a constante de mola pode ser aproximada como

dFs
k≈ . (1.3)
dx x=x0
Durante a definição do modelo matemático de um sistema vibratório é co-
mum a representação de elementos estruturais/distribuı́dos como elementos
discretos. No caso de um elemento que irá sofrer deformação, armazenando
energia potencial elástica e cuja massa pode ser desprezada, podemos repre-
sentá-lo através de uma mola equivalente.

Exemplo 1.1. Seja um sistema vibratório formado por uma viga em ba-
lanço (engastada-livre) que suporta em sua extremidade livre uma máquina
de massa m como mostrado na Fig. 1.8.a.
O interesse aqui está no movimento vertical da máquina. Nesse caso, a
viga é o elemento que sofrerá maior deformado durante o movimento e, as-
sumindo que a massa da máquina é muito maior que a massa da viga, pode-se
inicialmente desprezar a massa da viga e sua dissipação e representa-la como
um elemento de mola. A máquina é admitida como um elemento rı́gido, ou
seja, não sofre deformação e não armazena energia potencial, e cuja massa
está concentrada na extremidade da viga. Desta forma, o sistema pode ser
representado como mostrado na Fig. 1.8.b e o objetivo é então determinar a
constante de mola equivalente que represente a rigidez da viga.
Da Teoria de Flexão de Vigas [1], tem-se que a deformação vertical y(x)
da linha neutra de uma viga engastada-livre em um ponto x devido a um car-
16 1 Conceitos básicos em vibrações

EI x(t)

m
m

kv

L€
a.
b.

Figura 1.8: Sistema vibratório composto por viga em balanço e massa em sua
extremidade livre.

regamento estático devido P aplicado em um ponto a da viga como mostrado


na Fig. 1.9 é dado por
 2
Px
(3a − x), 0 ≤ x ≤ a


6EI

y(x) = 2
(1.4)
 P a
(3x − a), a ≤ x ≤ L


6EI
onde E é o módulo de elasticidade do material da viga e I é o momento de
inércia de área da seção transversal da viga.

Figura 1.9: Viga engastada-livre submetida a um carregamento pontual.

Tem-se então que a deformação estática δst da extremidade da viga devido


a um carregamento também na extremidade, ou seja, x = L e a = L na
equação acima, é dada por

P L3
δst = y(x = L) = (1.5)
3EI
Como a constante de mola independe de a força ser estática ou dinâmica,
pode-se obter a constante de mola da viga kv como
1.3 Componentes de sistemas discretos 17

Fs P 3EI
kv = = = 3 . (1.6)
x δst L
t
u

Energia potencial de um elemento de rigidez

A energia potencial U de um sistema elástico submetido a forças conser-


vativas de resultante Fr e com base em um ponto de referência xref é dada
por (ver [5] para a derivação completa)
Z xref
U= Fr (ξ)dξ. (1.7)
x

No caso de uma mola linear operando em torno do ponto de equilı́brio (xref =


0) a força restauradora (força conservativa) é oposta a força aplicada, ou seja,
Fr (ξ) = −kξ, tal que a Eq. (1.8) fica
0
1 2
Z
U= −kξdξ = kx . (1.8)
x 2
Em muitos casos é necessário empregar um conjunto de molas para re-
presentar elementos de um sistema vibratório. Para facilitar a definição das
equações do movimento do sistema é comum calcular uma mola equivalente
para um dado conjunto de molas e alguns métodos são vistos a seguir.

Associação de molas em paralelo:

Diz-se que duas ou mais molas estão associadas em paralelo quando sofrem
a mesma deformação.
Seja o caso de duas molas em paralelo como mostrado na Fig. 1.10.a.

Figura 1.10: Associação de molas em paralelo [5].

Pode-se notar que ambas as molas são submetidas à mesma deformação


x = x2 − x1 , e que uma constante de mola equivalente é dada pela relação
18 1 Conceitos básicos em vibrações

keq = Fs /x. A partir da Fig. 1.10.b tem-se que a força Fs nada mais é que a
soma de cada uma das forças de mola individuais, ou seja,

Fs = Fs1 + Fs2 = k1 x + k2 x
Fs = (k1 + k2 )x. (1.9)

Conclui-se então que a constante de mola equivalente é dada por

keq = k1 + k2 . (1.10)
É possı́vel mostrar que a Eq. (1.10) pode ser generalizada para um número
n de molas em paralelo, sendo que a constante de mola equivalente é dada
por
Xn
keq = ki . (1.11)
i=1

Associação de molas em série:

Já a associação de molas em série é caracterizada por todas as molas serem


submetidas à mesma força Fs .
A Fig. 1.11 mostra o exemplo de duas molas em série.

Figura 1.11: Associação de molas em série [5].

O objetivo é representar todo o conjunto de molas por uma mola equiva-


lente que relaciona o deslocamento sofrido pelos extremos com a força apli-
cada, ou seja,
Fs
keq = . (1.12)
x2 − x1
Como a força é a mesma em ambas as molas, temos que
1.3 Componentes de sistemas discretos 19

Fs = k1 (x0 − x1 ), (1.13)
e
Fs = k2 (x2 − x0 ). (1.14)
Para chegarmos a uma relação como a dada pela Eq. (1.12) é necessário
eliminar a variável x0 das equações. Para tanto, pode-se isolar x0 na Eq. (1.13)
tal que
Fs + k1 x1
x0 = , (1.15)
k1
e substituindo em Eq. (1.14) tem-se
k2
Fs = k2 x2 − (Fs + k1 x1 ). (1.16)
k1
Manipulando a Eq. (1.16) chega-se a
 
k2
Fs = (x2 − x1 ),
1 + k2/k1

e conclui-se então que o coeficiente da mola equivalente é dado por


 −1
k2 1 1 1
keq = = = + . (1.17)
1 + k2/k1 1/k2 + 1/k1 k1 k2
Generalizando para um número n de molas em série, tem-se que

n
!−1
X 1
keq = . (1.18)
k
i=1 i

Exemplo 1.2. Seja o sistema vibratório formado por um tambor de içamento


e um equipamento de massa m sendo erguido como mostrado na Fig. 1.12.a.
Admitindo que a massa do equipamento sendo erguido é muito maior que
a massa do tambor de içamento, da viga e do cabo, podemos representar o
sistema vibratório como mostrado na Fig. 1.12.b, ou seja, duas molas em
série (uma representando a rigidez da viga e outra representando a rigidez
do cabo) e uma massa m (representando o equipamento sendo erguido). Note
que as molas estão em série, pois a força aplicada na extremidade do cabo
é igual a força aplicada na extremidade da viga, pois se despreza a inércia
desses elementos.
A rigidez de uma viga em balaço foi vista no Exemplo 1.1 e é dada por
3Ev I
kv = .
L3v
Já o cabo pode ser considerado como um elemento sofrendo deformação
axial. Seguindo procedimento similar ao utilizado no Exemplo 1.1, tem-se que,
20 1 Conceitos básicos em vibrações

Viga Ev I

kv
Lv
Lc
Cabo
AEc kc

m m

a. b.
Figura 1.12: Sistema vibratório formado por um tambor de içamento e massa
sendo erguida.

da Teria de deformação axial de barras, a relação entre um carregamento


estático P aplicado na extremidade de um elemento de comprimento L e sua
deformação δst é dada por [1]

PL
δst = , (1.19)
AE
onde A é a área de seção transversal do elemento e E o módulo de elasticidade
do material. Logo, a constante de mola equivalente para o cabo fica
Ac Ec
kc = . (1.20)
Lc
A rigidez equivalendo do sistema é então dada por

 −1
1 1
keq = +
kv kc
−1
L3v

Lc
= +
3Ev I AEc
3AIEv Ec
= 3 . (1.21)
Lv AEc + 3Lc Ev I

Método da energia potencial para associação de molas


1.3 Componentes de sistemas discretos 21

Em alguns casos, os elementos de rigidez de um sistema não podem ser


enquadrados como uma associação em série ou em paralelo. Isto é particu-
larmente comum em sistemas onde existe uma relação não unitária entre a
deformação aplicada em cada mola (se a relação fosse unitária as molas esta-
riam em paralelo). Nesses casos, a forma mais fácil de obter uma constante
de mola equivalente é recorrer ao Método da Energia Potencial. O método
estabelece que uma constante de mola equivalente pode ser determinada que
a energia potencial obtida com base em uma dada deformação é igual a soma
da energia potencial de todas as molas do sistema, ou seja,
n
1 X
keq x2 = Ui . (1.22)
2 i=1

Um exemplo será mostrado mais a frente que também inclui um método


similar para a associação de elementos de inércia.

1.3.2 Elemento de inércia (ou de massa)

O elemento de inércia ou de massa é o componente de um sistema vibratório


discreto responsável por armazenar energia cinética. Por sua vez, este ele-
mento não pode ser deformado, e por isso também é chamado de elemento
de corpo-rı́gido, além de não dissipar energia.
O comportamento do elemento de massa é regido pela segunda lei de New-
ton de tal forma que a força Fm associada ao elemento é dada por

Fm = ma = mẍ, (1.23)
onde m é a massa do elemento e a = ẍ a sua aceleração. Note que nesse caso
a força associada ao elemento é proporcional a aceleração, sendo esta outra
caracterı́stica dos elementos de inércia.
A Eq. (1.23) assume um movimento de translação. No caso de movimento
de rotação, o comportamento do elemento de inércia é dado por

M0,m = J0 θ̈, (1.24)


onde M0,m é o momento aplicado ao elemento de inércia em torno do ponto
0, sendo θ̈ a sua aceleração angular e J0 o momento de inércia de massa do
elemento em torno do ponto 0 dado por
Z
J0 = r2 dm, (1.25)
corpo

onde r é o raio em torno do ponto 0 de cada elemento infinitesimal de massa


dm que compõe o corpo rı́gido. No caso de um corpo com densidade constante
22 1 Conceitos básicos em vibrações

a Eq. (1.25) fica Z


J0 = ρ r2 dV, (1.26)
V

onde assumiu-se dm = ρ(r)dV = ρdV e V é o volume do corpo.


A energia cinética de um elemento de massa em movimento de translação
pura é, por definição, dada por
1 1
T = mv 2 = mẋ2 . (1.27)
2 2
A Eq. (1.27) também pode ser entendida como uma definição alternativa
para o elemento de massa. Nesse caso, a massa do sistema é o valor que
multiplicado pelo quadrado da velocidade e dividido por dois fornece a energia
cinética do sistema. A Eq. (1.27) é na verdade uma simplificação de
1 1
Z Z
T = ẋ · ẋdm = ρ|ẋ|2 dV, (1.28)
2 corpo 2 V
onde ẋ é o vetor velocidade associado a cada elemento infinitesimal de massa
dm, (.) é o produto interno de dois vetores. Para chegar em Eq. (1.27),
assumiu-se que todos os elementos infinitesimais apresentam a mesma densi-
dade e velocidade, o que é válido para um corpo-rı́gido de densidade uniforme,
e considerou-se apenas uma direção.
No caso de um corpo-rı́gido em rotação, a energia cinética é dada por
1
T = J0 θ̇2 . (1.29)
2
onde θ̇ é a velocidade angular do corpo.
Para um corpo-rigido em um movimento composto planar (translação e
rotação em um mesmo plano) pode-se mostrar que a energia cinética é a soma
energia cinética de translação associada ao centro de massa Ttr,c e a rotação
em torno do centro de massa Trot,c , ou seja,

T = Ttr,c + Trot,c
1 1
= mx˙c 2 + Jc θ̇2 , (1.30)
2 2
onde x˙c é a velocidade do centro de massa e Jc é o momento de inércia de
massa em torno do centro de massa.

Método da Energia Cinética para associação de massas:

Alguns sistemas vibratório podem apresentar mais de um elemento de


massa. Se os movimentos desses elementos são dependentes, ou seja, pode-se
escrever um em função do outro, é possı́vel calcular um elemento de massa
equivalente que represente esses elementos. Para tanto, pode-se utilizar o
1.3 Componentes de sistemas discretos 23

Método da Energia Cinética que estabelece que a energia cinética associada


a massa equivalente é a soma da energia cinética de todas as massas, ou seja,
n
1 X
meq ẋ2 = Ti . (1.31)
2 i=1

Note que se o movimento dos elementos de massa são independentes, ou


seja, um não pode ser escrito em função dos demais, o sistema apresenta mais
de um GL e não é possı́vel calcular um elemento de massa equivalente.

Exemplo 1.3. Seja o sistema abaixo composto de elementos de rigidez e de


massa. Determine a rigidez e a massa equivalentes do sistema em relação ao
movimento da massa m1 .

Esfera (me e re)

k2

a
kt
Sem
escorregamento Barra rígida de
massa desprezível
b
k1
m1

Figura 1.13: Sistemas de massas e rigidezas acopladas.

O primeiro passo para obter a massa e rigidez equivalentes é determi-


nar a relação entre os movimentos de translação e rotação dos elementos de
corpo-rı́gido, a deformação dos elementos de rigidez e o grau de liberdade que
deseja-se considerar, nesse caso, a translação da massa m1 . Tomando então
x1 como a translação da massa m1 , θ a rotação da barra em torno de seu
ponto pinado, xe a translação da esfera e θe a rotação da esfera em torno de
seu centro, e assumindo pequenos deslocamentos tal que tan θ ≈ θ tem-se as
seguintes relações entre os graus de liberdade:
24 1 Conceitos básicos em vibrações

x1
tan θ = ≈ θ,
b
xe
tan θ = ≈ θ, (1.32)
a
xe
tan θe = ≈ θe .
re
A relação entre θe e re levou em consideração o fato que não há escorre-
gamento entre a esfera e o plano sobre a qual a mesma está posicionada.
Escrevendo cada grau de liberdade em termos de x1 , tem-se então
x1
θ= ,
b
a
xe = x1 , (1.33)
b
a
θe = x1 .
bre
Utilizando o Método da Energia Potencial para determinar a rigidez equi-
valente em relação a x1 tem-se que
3
1 X
keq x21 = Ui
2 i=1
1 1 1 (1.34)
= k1 x21 + k2 x2e + kt θ2
2 2 2
1 2 1  a 2 2 1 1 2
= k1 x1 + k2 x1 + kt 2 x1 ,
2 2 b 2 b
de onde conclui-se que a rigidez equivalente é dada por
 a 2
1
keq = k1 + k2 .+ kt (1.35)
b b2
A massa equivalente pode ser obtida através do Método da Energia Cinética.
Nesse caso, tem-se que
3
1 X
meq ẋ21 = Ti
2 i=1
1 1 1 (1.36)
= m1 ẋ21 + me ẋ2e + Je θ̇e2
2 2 2
 a 2  2
1 1 1 a
= m1 ẋ21 + me ẋ21 + Je ẋ21 ,
2 2 b 2 bre
onde considerou-se tanto o movimento de translação como o movimento de
rotação da esfera e Je é o momento de inércia da esfera. A massa equivalente
é então dada por
 a 2  2
a
meq = m1 + me + Je . (1.37)
b bre
1.3 Componentes de sistemas discretos 25

Exemplo 1.4. Seja novamente o sistema considerado no Exemplo 1.1, onde


inicialmente desprezou-se a massa da viga a qual foi representa exclusiva-
mente como uma mola. Tal aproximação pode levar a erros significativos
dependendo da relação entre a massa da viga e a massa do equipamento.
Entretanto, pode-se empregar o Método da Energia Cinética para obter uma
massa equivalente da viga e com isso melhor representar o sistema.
O primeiro passo é calcular a energia cinética da viga com base no grau
de liberdade de interesse, nesse caso o movimento vertical da extremidade
da viga onde está o equipamento. Entretanto, cada elemento infinitesimal da
viga possui uma velocidade diferente durante sua deformação. Desta forma,
a energia cinética total da viga é dada pela integração da energia cinética de
cada elemento, ou seja,
L
1
Z
T = ρAv 2 (z)dz, (1.38)
2 0
onde z é a direção longitudinal da viga e considerou-se que a massa de cada
elemento infinitesimal é dada por ρAdz, sendo ρ a densidade do material da
viga e A a área da seção transversal. A relação entre a velocidade de cada
ponto da viga e o movimento de sua extremidade pode ser obtida com base
no comportamento da linha elástica y(z) da viga, que no caso de uma viga
engastada-livre com carregamento P na extremidade é dada por

P z2
y(z) = (3L − z). (1.39)
6EI
O deslocamento vertical da extremidade da viga nesse caso é dado por

P L3
yext = y(z = L) = , (1.40)
3EI
e relação entre o deslocamento vertical de cada ponto e o deslocamento da
extremidade (grau de liberdade de interesse) pode ser escrito como

z2
y(z) = yext (3L − z). (1.41)
2L3
Derivando em relação ao tempo, tem-se que a relação entre a velocidade
vertical de cada ponto e a velocidade da extremidade fica

z2
v(z) = ẏ(z) = ẏext (3L − z). (1.42)
2L3
Substituindo na integral tem-se
L 2
z2

1
Z
2
T = ρA (3L − z) ẏext dz. (1.43)
2 0 2L3

Resolvendo a integral acima chega-se a


26 1 Conceitos básicos em vibrações

1 33 2
T = mv ẏext (1.44)
2 140
onde mv = ρAL é a massa da viga, e de onde conclui-se que a massa equi-
valente da viga em relação ao movimento de sua extremidade é
33
meq = mv . (1.45)
140

1.3.3 Elemento de amortecimento

Em todos os sistemas reais parte da energia vibratória é gradualmente con-


vertida em calor ou outro tipo de energia (som por exemplo). Esse fenômeno
é conhecido como amortecimento e pode envolver diferentes mecanismos de
dissipação de energia. Um exemplo é dado pela oscilação de um pêndulo.
Após colocar o pêndulo para oscilar, pode-se notar que a amplitude da os-
cilação diminui ao longo do tempo. Nesse caso, a maior parte da energia é
dissipada na forma de calor provocado pelo atrito entre o pêndulo e ar.
Diferentes modelos de amortecimento estão disponı́veis na literatura e bus-
cam descrever diferentes mecanismos de dissipação. O elemento de amorteci-
mento mais utilizado para sistemas com poucos GL é o amortecedor viscoso
devido a sua simplicidade matemática sendo representado como mostrado na
Fig. 1.14.

Figura 1.14: Representação de um elemento de amortecimento viscoso.

Um amortecedor viscoso é em geral associado a um pistão com furos ou


folgas laterais posicionado dentro de um cilindro com óleo como mostrado
na Fig. 1.15. O movimento do pistão força a passagem do óleo através dos
furos ou das folgas laterais provocando a dissipação de energia vibratória em
decorrência da viscosidade do fluido.
No caso de um amortecedor viscoso, a força de amortecimento Fd associada
ao elemento é proporcional a velocidade imposta ao elemento tal que

Fd = cẋ (1.46)
onde c é a constante de amortecimento viscoso e ẋ = ẋ2 − ẋ1 é a diferença
de velocidade imposta às extremidades do amortecedor (Fig. 1.14).
1.3 Componentes de sistemas discretos 27

Figura 1.15: Exemplo de amortecedor viscoso: pistão em cilindro com óleo.

Outros modelos matemáticos descritos na literatura são (alguns serão vis-


tos mais a frente na disciplina):
• Amortecimento de Coulomb (ou por atrito):
– Dissipação devido ao atrito entre superfı́cies;
– Magnitude da força de amortecimento é constante mas de sinal oposto
à velocidade;
• Amortecimento histerético ou estrutural:
– Amortecimento intrı́nseco ao material quando deformado (dissipação
interna na forma de calor, formação de micro-trincas e deformação
plásticas dos grãs do material);
– Está associado a curva de histerese do material
• Amortecimento proporcional
– Modelo de amortecimento onde a matriz de amortecimento é propor-
cional as matrizes de massa e/ou rigidez (utilizado para sistemas com
mais de um GL);
Associação de amortecedores viscosos em paralelo:
A derivação segue o mesmo procedimento visto para associação de molas
e resulta em
n
X
ceq = ci . (1.47)
i=1

Associação de amortecedores viscosos em série:


Novamente, seguindo o mesmo procedimento aplicado a associação de mo-
las em série mas para amortecedores chega-se a
n
!−1
X 1
ceq = . (1.48)
c
i=1 i

Método da energia dissipada para associação de amortecedores


viscosos:
28 1 Conceitos básicos em vibrações

Pode-se mostrar que a energia dissipada por um amortecedor viscoso é


dada por

Ediss = cẋ2 . (1.49)


Logo, uma constante de amortecimento equivalente para um sistema com
vários amortecedores é dada por
n
X
ceq ẋ2 = Ediss,i . (1.50)
i=1

Observação: Os mecanismos de dissipação de sistemas vibratórios são


geralmente muito complexos e os modelos de amortecimento descritos acima
são sempre aproximações que permitem incluir alguma forma de dissipação no
modelo matemático do sistema. Em geral, os parâmetros de amortecimento
são obtidos através de ensaios experimentais ou com base na experiência
com estruturas/sistemas similares e, mesmo que o modelo de amortecimento
não represente fielmente o mecanismo de dissipação, modelos matemáticos
razoavelmente precisos podem ser obtidos.

1.4 Equações do Movimento do Sistema

- Objetivo: Relacionar a resposta do sistema com a excitação aplicada levando


em consideração os parâmetros do sistema.
- Número de equações deve ser igual ao número de variáveis (GL do sis-
tema) de forma a permitir a solução.
- Sistema massa-mola-amortecedor:
Seja o sistema massa-mola-amortecedor mostrado na Fig. 1.16.a e que será
bastante utilizado ao longo da disciplina.
O primeiro passo na derivação da equação do movimento é determinar o
diagrama de corpo-livre do sistema. Para isso, tira-se o sistema do equilı́brio
e, assumindo, por exemplo, deslocamento e velocidade do sistema positivos
(x > 0 e ẋ > 0), indica-se o sentido e amplitude das forças aplicadas ao corpo-
rı́gido, como mostrado na Fig. 1.16.b. Na sequência, aplicando a Segunda Lei
de Newton, tem-se que

X
Fi = mẍ
i
−kx − cẋ + f = mẍ
mẍ + cẋ + kx = f, (1.51)

a qual é a eq. do movimento do sistema.


1.4 Equações do Movimento do Sistema 29

Posição de
equilíbrio

k kx(t)
f (t) f (t)
m m
c˙x (t)
c

x(t) € x(t)
€ €
€ a.
€ b.

Figura 1.16: Sistema massa-mola-amortecedor e€diagrama de corpo-livre.

- Note que no sistema acima, a posição de equilı́brio coincide com o ponto


onde a mola não está deformada. Entretanto, nem sempre isso ocorre. Seja
por exemplo o caso do mesmo sistema massa-mola-amortecedor anterior, mas
agora na posição vertical como mostrado abaixo. Nesse caso, a presença da
força peso provoca uma deformação inicial da mola. O diagrama de corpo-
livre assumindo um deslocamento positivo a partir do ponto onde a mola não
está deformada (y > 0)

f (t) y(t) f (t)


Posição da mola y(t)
não-deformada x(t)

Posição de m m
equilíbrio δst
mg € mg
k c ky(t) cy(t)
€ €
a. b.
€ €
Figura 1.17: Sistema massa-mola-amortecedor na posição vertical e diagrama
de corpo-livre.

Aplicando a Segunda Lei de Newton, tem-se que


30 1 Conceitos básicos em vibrações
X
Fi = mÿ
i
−ky − cẏ − mg + f = mÿ
mÿ + cẏ + ky + mg = f. (1.52)

Note que a nova equação do movimento inclui um novo termo relacionado


ao peso do sistema. Entretanto, pode-se reescrever as equações com base na
posição de equilı́brio do sistema. Sabe-se que a relação entre as duas posições
é dada por
y(t) = x(t) − δst (1.53)
onde δst é a deformação estática provocada pela força peso. Como o sistema
está em equilı́brio quando x = 0, conclui-se que

kδst = mg. (1.54)

Substituindo as equações acima na equação do movimento anterior tem-se


que

d2 d
m (x − δst ) + c (x − δst ) + k(x − δst ) + mg = f
dt2 dt
mẍ + cẋ + kx − kδst + mg = f
mẍ + cẋ + kx = f (1.55)

ou seja, tem-se a mesma equação do movimento do sistema na posição hori-


zontal.
- De forma geral, se a equação do movimento é obtida a partir do ponto de
equilı́brio, não é necessário considerar a força peso e a equação do movimento
independe da orientação do sistema.

1.5 Sistemas lineares e invariante no tempo

- Definição de sistema linear e invariante no tempo


Diz-se que um sistema dinâmico é linear se obedece o Princı́pio da Su-
perposição, o qual estabelece que se x1 (t) e x2 (t) são as respostas de um
sistema quando submetido separadamente as excitações F1 (t) e F2 (t), res-
pectivamente, tem-se então que a resposta a uma excitação do tipo F (t) =
F1 (t) + F2 (t) é igual a x(t) = x1 (t) + x2 (t), ou seja, a resposta é a soma
das respostas individuais. O Princı́pio da Superposição é representado na
Fig. 1.18
Já um sistema invariante no tempo é definido como aquele que, aplicando-
se um atraso na excitação, tem-se o mesmo atraso na resposta, como mostrado
na Fig. 1.19 para um atraso τ .
1.6 Tipos de excitação 31

f1 (t) x1 (t)
Sistema Linear

f2 (t) x2 (t)
Sistema Linear

c1 f1 (t) + c2 f2 (t) c1 x1 (t) + c2 x2 (t)


Sistema Linear

Figura 1.18: Princı́pio da superposição [5].

f (t + τ ) x(t + τ )
Sistema Invariante

Figura 1.19: Sistema invariante no tempo [5].

1.6 Tipos de excitação

O estudo na área de vibrações esta voltado principalmente para o cálculo


da resposta de um sistema mecânico frente a uma excitação. Entretanto, a
solução das equações envolvidas depende do tipo de excitação aplicada ao
sistema. A seguir, discutiremos as classificações utilizadas para as diferentes
excitações e algumas caracterı́sticas dessas excitações que iremos utilizar mais
a frente na solução de problemas de vibrações.

1.6.1 Vibrações livres vs. Vibrações forçadas

De forma geral, as excitações aplicadas a um sistema mecânico podem ser


divididas em dois grande grupos: vibrações livres e vibrações forçadas.
No caso de vibrações livres (também chamadas de condições iniciais ou
excitações iniciais) aplica-se um deslocamento e/ou velocidade iniciais ao sis-
tema e deixa-se o sistema vibrar livremente. Nesse caso, outras excitações
não são aplicadas ao sistema depois que o movimento é iniciado e, por isso,
o nome vibrações livres é utilizado.
Vibrações forçadas compreende os casos onde uma excitação é aplicada ao
sistema depois do inı́cio do movimento (com algumas exceções). A excitação
pode ser uma força, um momento ou um deslocamento imposto a uma parte
do sistema. De forma geral, os diferentes tipos de excitação e resposta (cha-
mados de forma geral de sinais) podem ser classificados de acordo com o
32 1 Conceitos básicos em vibrações

diagrama apresentado na Fig. 1.20. A definição de cada tipo é apresentado


na sequência

Figura 1.20: Classificação dos tipos de excitação e resposta, também chama-


dos de sinais.

1.6.2 Excitação senoidal ou harmônica

Excitações senoidais ou harmônicas são aquelas que se comportam de forma


harmônica, ou seja na forma de seno ou cosseno. Um exemplo de excitação
harmônica pode ser dado pelo caso da máquina de lavar considerado na
Fig. 1.21. Imagine que a roupa não tenha sido distribuı́da de forma uni-
forme no cesto da máquina de lavar, ou seja, diz-se que o sistema possui uma
massa desbalanceada (ou massa excêntrica). Nesse caso, quando a máquina
começar a girar a massa desbalanceada irá provocar uma força sobre o eixo
da máquina, como mostrado na Fig. 1.21, onde m é a massa desbalanceada e
ω é a frequência angular de giro da máquina. Pode-se mostrar que nesse caso
a excitação provocada pela massa na direção vertical (estamos considerando
apenas o movimento vertical da máquina) é dada por

Fv = meω 2 sen ωt (1.56)


onde e é o raio do movimento feito pela massa desbalanceada.
A análise de sistemas vibratórios com excitação harmônica irá utilizar as
propriedades vistas no Item 1.7.
1.6 Tipos de excitação 33

Figura 1.21: Sistema com excitação harmônica na forma de uma massa des-
balanceada.

1.6.3 Excitação periódica

Como visto no Item 1.6.1 , as excitações harmônicas pertencem a uma classe


maior de excitações denominadas de excitações periódicas. Um exemplo de
excitação periódica é mostrada na Fig. 1.22. Será visto mais a frente que
a solução de problemas envolvendo excitações periódicas pode ser obtida
utilizando Séries de Fourier para representar a excitação e o conceito de
linearidade do sistema (Princı́pio da Superposição) de forma que o problema
se reduz a solução de vários problemas harmônicos.

Figura 1.22: Excitação periódica.


34 1 Conceitos básicos em vibrações

1.6.4 Outros tipos de excitação

Além de excitações harmônicas e periódicas, sistemas vibratórios também


podem ser submetidos a outros tipos de excitação. Funções que não são
periódicas são chamadas de funções não-periódicas e representam um grande
número de excitações. Um exemplo de uma função não-periódica é mostrado
na Fig. 1.23.

Figura 1.23: Excitação não-periódica.

Dentre as funções não-periódicas destaca-se um sub-grupo chamado de


funções transientes e que são caracterizadas por uma uma excitação não-nula
em apenas uma parte da função. Um exemplo de excitação transiente é a
chamada função pulso retangular mostrada na Fig. 1.24. Note que a excitação
é nula para t < 0 e para t > T .

Figura 1.24: Excitação transiente.

Todas as excitações vistas até aqui pertencem a uma classe de excitações


chamadas determinı́sticas e recebem esse nome visto que podem ser escri-
tas na forma de equações, permitindo a determinação do valor da excitação
em qualquer instante de tempo. Entretanto, existem muitas excitações que
1.7 Movimento Harmônico 35

não podem ser representadas por equações e cujos valores não podem ser
previstos de antemão. Estas excitações são chamadas de excitações aleatórias
ou não-determinı́sticas. Um exemplo de uma função aleatória é mostrada na
Fig. 1.25. A solução de sistemas envolvendo excitações aleatórias requer o uso
de ferramentas estatı́sticas e não serão consideradas neste estudo.

Figura 1.25: Excitação aleatória.

1.7 Movimento Harmônico

O estudo de sistemas submetidos a uma excitação harmônica é uma parte


importante do estudo de vibrações e permite introduzir conceitos que serão
fundamentais no estudo de outros tipos de excitações. Assim, uma breve re-
visão sobre movimento harmônico é apresentada a seguir.

Alguns conceitos de números complexos serão utilizados nessa seção e


recomenda-se ao aluno uma leitura do Anexo A.

De forma geral, uma função com comportamento harmônico no tempo


pode ser escrita utilizando umas das seguintes formas

f (t) = A1 cos(ωt) + A2 sen(ωt) (1.57)


f (t) = A cos(ωt − φ) (1.58)
f (t) = A sen(ωt − θ) (1.59)

onde A, A1 e A2 são amplitudes, ω é a frequência de oscilação (ou frequência


angular) em rad/s e φ e θ são ângulos de fase em radianos.
36 1 Conceitos básicos em vibrações

A relação entre a representação pela soma de senos e cossenos ou por


apenas um seno ou cosseno é dada por (utilizando relações trigonométricas)
q
A = A21 + A22 (1.60)
e
π A2
φ=θ+ = tan−1 ( ), (1.61)
2 A1
ou ainda
A1 = A cos(φ) e A2 = A sen(φ). (1.62)
Note que em todas as formas acima a forma da função é controlada por duas
variáveis, amplitude e fase, nas formas de seno e cosseno, e duas amplitudes,
na forma de soma de seno e cosseno.
A Fig. 3.2 mostra um exemplo de função harmônica.

φ/ω

Figura 1.26: Exemplo de comportamento harmônico [7].

Da figura tem-se que o perı́odo T é dado por



T = . (1.63)
ω

A relação entre frequência angular ω e a frequência f em Hertz (Hz) é


dada por

ω = 2πf. (1.64)

Assumindo que o deslocamento de um sistema dinâmico apresenta compor-


tamento harmônico, pode-se obter a sua velocidade e aceleração simplesmente
derivando o deslocamento, ou seja,
1.7 Movimento Harmônico 37

x(t) = A cos(ωt − φ) (1.65)

dx(t)
v(t) = ẋ(t) = = −ωA sen(ωt − φ)
dt
π π
= −ωA cos(ωt − φ − ) = ωA cos(ωt − φ + ) (1.66)
2 2

d2 x(t)
a(t) = ẍ(t) = = −ω 2 A cos(ωt − φ)
dt2
= ω 2 A cos(ωt − φ + π) (1.67)

As operações acima podem ser visualizadas no cı́rculo trigonométrico mos-


trado na Fig. 1.27.

sen()

x (t)
ωt − φ + π 2
x(t)
ωt − φ + π ωt − φ

 cos()
x(t)

Figura 1.27: Cı́rculo trigonométrico.

Das equações acima tem-se que ẍ(t) = −ω 2 x(t). A relação entre x(t) e ẋ(t)
é mais complicada pois envolve uma mudança de fase de π/2, a qual não pode
ser representada simplesmente por uma mudança de sinal (como no caso de
uma mudança de fase de π). O efeito da diferença de fase entre deslocamento,
velocidade e aceleração no tempo pode ser observado na Fig. 1.28.
Note que as operações de derivação acabam misturando representações em
senos e cossenos, o que dificulta a manipulação algébrica das equações. Por
esse motivo, utiliza-se uma representação complexa do movimento harmônico
como será visto a frente.

Representação exponencial ou complexa


38 1 Conceitos básicos em vibrações

Figura 1.28: Representação no tempo do deslocamento, velocidade e ace-


leração harmônicos.

De forma a facilitar a manipulação das equações envolvidas na solução de


problemas de vibrações, pode-se reescrever uma função harmônica em senos
e/ou cossenos na forma exponencial utiliza-se a Fórmula de Euler dada por

eiα = cos α + i sen α, (1.68)


No caso de uma função na forma de cosseno, tem-se que

f (t) = Fm cos(ωt − φ)
n o
= Re Fm ei(ωt−φ) . (1.69)

onde Re{} indica a parte real do número complexo.


No caso de uma função na forma de seno, tem-se que

f (t) = Fm sen(ωt − θ)
n o
= Im Fm ei(ωt−θ) . (1.70)

onde Im{} indica a parte imaginária do número complexo.


Por sua vez, a Eq. (1.70) pode ser reescrita utilizando o conceito de ampli-
tude complexa. Para o a função na forma de cosseno, define-se a amplitude
complexa como F̃ = Fm e−iφ , ou seja, um número complexo, tal que
n o
f (t) = Re Fm e−iφ eiωt = Re F̃ eiωt .

(1.71)
1.7 Movimento Harmônico 39

Note que a amplitude complexa inclui em um único número a informação de


magnitude e fase da função harmônica.
A representação complexa de uma função harmônica pode ser visualizada
graficamente através do plano complexo mostrado na Fig. 1.29, onde o termo
eiωt é chamado de fasor (vetor que rotaciona com o tempo no plano com-
plexo) e a multiplicação do fasor por F̃ faz com que haja uma alteração de
fase e magnitude do vetor. A função harmônica é representada pela projeção
do vetor no eixo x, ou seja, a parte real (assumindo que a função esteja na
forma de cosseno).

Im ( )

eiωt  iωt = Fm e−iφ eiωt


Fe
1 Fm
ωt
ωt − φ
Re ( )

Figura 1.29: Fasor e representação complexa de uma função harmônica.

Ver animação ”Complex.gif”.

Seja agora o caso onde o deslocamento x(t) de um sistema vibratório é


escrito na forma complexa, ou seja,
n o
x(t) = Re X̃eiωt (1.72)

onde X̃ = Xm eiφ é a amplitude complexa do deslocamento.


A grande vantagem desse formato é que permite calcular de forma rápida
a velocidade e aceleração do sistema. Aplicando a derivada na Eq. (1.72)
tem-se
d h n iωt oi n o
ẋ(t) = Re X̃e = Re iω X̃eiωt , (1.73)
dt
de onde tem-se que a amplitude complexa da velocidade Ṽ = iω X̃. No caso
da aceleração tem-se que
d h n oi n o
ẍ(t) = Re iω X̃eiωt = Re −ω 2 X̃eiωt , (1.74)
dt

e a amplitude complexa da aceleração fica à = −ω 2 X̃.


40 1 Conceitos básicos em vibrações

Da Fórmula de Euler, Eq. (A.27),tem-se que


π π π
ei 2 = cos + i sen = i (1.75)
2 2
e
eiπ = cos π + i sen π = −1. (1.76)
Logo, as equações na forma complexa são condizentes com as equações na
forma de cosseno onde pode-se observar uma diferença de fase de π/2 entre a
velocidade e o deslocamento e de π entre a aceleração e o deslocamento. De
forma similar ao observado no cı́rculo trigonométrico, as mudanças de fase e
de magnitude devido a derivação e/ou integração, podem ser representados
no plano complexo como mostrado na Fig. 1.30.

Im ( )

x (t)
ωt − φ + π 2
x(t)
ωt − φ + π ωt − φ
Re ( )

x(t)

Figura 1.30: Representação no plano complexo do deslocamento, velocidade


e aceleração.

Note que o comportamento no tempo do deslocamento, velocidade e ace-


leração é dado pela projeção no eixo x (parte real) dos vetores complexos
mostrado na Fig. 1.30. Assumindo uma fase φ = π/2, as curvas no tempo
ficam como mostrado na Fig. 1.28.

Ver animação ”phase-nodamp.gif”.

As equações acima mostram que pode-se obter a velocidade e a aceleração


de um sistema com comportamento harmônico diretamente a partir da am-
plitude complexa do deslocamento do sistema. O contrário também é válido
e tendo a velocidade e/ou a aceleração, pode-se obter o deslocamento. Essas
simplificações serão muito úteis a frente.

Observação: Alguns autores omitem o termo Re{ } ou Im{ }, e escrevem


apenas x(t) = X̃eiωt de forma a simplificar a escrita das equações. Nesses
casos, está subentendido que é necessário considerar apenas a parte real (no
1.8 Funções periódicas e Série de Fourier 41

caso de a excitação ser escrita na forma de cosseno) ou a parte imaginária


(no caso de a excitação ser escrita na forma de seno) dos resultados obtidos.
Nos capı́tulos posteriores iremos assumir que a excitação é sempre escrita
na forma de cosseno (caso seja fornecida na forma de seno, basta ajustarmos
a fase) e, caso nada seja dito, uma resposta na forma complexa subentende
que apenas a parte real deve ser utilizada.
Este formato será utilizado mais a frente.

1.8 Funções periódicas e Série de Fourier

1.8.1 Funções periódicas

Uma outra classe de funções muito importante no estudo de vibrações são as


funções periódicas. Uma função x(t) é dita periódica com perı́odo T se

x(t ± nT ) = x(t) (1.77)


onde n é um número inteiro. Em outras palavras, a função repete-se a inter-
valos regulares de tempo T .
Inúmeros casos podem ser observados na práticas que envolvem excitações
periódicas. Alguns exemplos são o movimento de um came do sistema de con-
trole de válvulas de um motor a combustão interna (Fig. 1.31), e a excitação
provocada pelos impactos de um prensa a intervalos regulares.

Figura 1.31: Exemplo de função periódica: função gerada por um came.

Note que as funções harmônicas são também funções periódicas.


42 1 Conceitos básicos em vibrações

Uma propriedade extremamente útil das funções periódicas é que estas


podem ser escritas como uma soma de funções seno e/ou cossenos, no que
é conhecido como Série de Fourier. Esta propriedade é a base da solução
de problemas de vibração que envolvem excitações periódicas como veremos
mais a frente.

1.8.2 Série de Fourier em senos e cossenos

A Série de Fourier permite escrever qualquer função periódica como uma


soma de senos e cossenos. Nesse caso, uma função x(t) com perı́odo T pode
ser escrita como

a0 X
x(t) = + [ap cos pωT t + bp sen pωT t] (1.78)
2 p=1

onde os coeficientes a0 , ap e bp são dados por


T T /2
2 2
Z Z
a0 = x(t)dt = x(t)dt, (1.79)
T 0 T −T /2

T T /2
2 2
Z Z
ap = x(t) cos pωT tdt = x(t) cos pωT tdt, (1.80)
T 0 T −T /2

T T /2
2 2
Z Z
bp = x(t) sen pωT tdt = x(t) sen pωT tdt, (1.81)
T 0 T −T /2

e ωT = 2π/T é a frequência angular fundamental da função periódica. O


termo frequência fundamental é também utilizado para indicar a frequência
em Hz fT = 1/T .
Note que:
• O valor a0 /2 nada mais que é que o valor médio da função no tempo;
• Cada coeficiente ap e bp está associado a um seno ou cosseno com
frequência
2πp
ωp = pωT = , (1.82)
T
ou em [Hz],
pωT p
fp = = . (1.83)
2π T
A Fig. 1.32 mostra a função dente-de-serra (similar ao comportamento do
came, Fig. 1.31) sendo aproximada por uma série de Fourier utilizando um,
dois e três termos na série. Note que a medida que o número de termos cresce,
a soma dos termos vai se aproximando da função propriamente dita.
1.8 Funções periódicas e Série de Fourier 43

Figura 1.32: Aproximação de uma função através de séries de Fourier.

Exemplo 1.5. Seja a função onda quadrada mostrada na Fig. 1.33. Deter-
mine sua representação através de Série de Fourier.

x(t)

−π π 2π 3π t

−1

Figura 1.33: Função onda quadrada.

Note que o perı́odo da função é T = 2π e que para um perı́odo a função é


dada por

1, 0 6 t < π
x(t) =
−1 π 6 t < 2π.
Começando pelo coeficiente a0 , tem-se que
44 1 Conceitos básicos em vibrações
Z 2π
2
a0 = x(t)dt
2π 0
Z π Z 2π 
1
= 1dt + −1dt = 0
π 0 π

ou seja, o valor médio é zero. Lembrando que ωT = 2π/T = 1, os coeficiente


ap e bp são então dados por
T
2
Z
ap = x(t) cos pωT tdt
T 0
Z π 2π 
1
Z
= cos ptdt − cos ptdt
π 0 π
=0
T
2
Z
bp = x(t) sen pωT tdt
T 0
Z π Z 2π 
1
= sen ptdt − sen ptdt
π 0 π
2
= [1 − cos pπ]

4
, p = 1, 3, 5, . . .
= πp
0, p = 2, 4, 6, . . .
A série de Fourier da função onda quadrada é então escrita como

X 4
x(t) = sen [(2p − 1)t]
p=1
(2p − 1)π

A Fig. 1.34 apresenta a representação em Série de Fourier da onda qua-


drada considerando os 8 primeiros termos.

Ver MatLab ”Exemplos Serie Fourier.m”.

Algumas propriedades de funções que podem auxiliar no cálculo dos coe-


ficientes são aquelas relacionadas com funções pares e impares.
• No caso de uma função x(t) par, tem-se que x(−t) = x(t), ou seja, é
simétrica com relação ao eixo y e tem como propriedade que
Z a Z a
x(t)dt = 2 x(t)dt
−a 0

onde a é uma constante qualquer. Exemplos: x(t) = cos t, x(t) = t2 .


• No caso de uma função x(t) impar, tem-se que x(−t) = −x(t), ou seja, é
simétrica com relação a origem e tem como propriedade que
1.8 Funções periódicas e Série de Fourier 45

1.5

0.5
x(t)

−0.5

−1

−1.5
−10 −8 −6 −4 −2 0 2 4 6 8 10
t (s)

Figura 1.34: Função onda quadrada e representação em série com 8 termos.

Z a
x(t)dt = 0
−a

Exemplos: x(t) = sen t, x(t) = t3 .


• Tem-se ainda as seguintes propriedades para a multiplicação de funções
pares e impares:
– função par × função par = função par
– função impar × função impar = função par
– função par × função impar = função impar
• Levando em conta as propriedades acima, note então que:
– Função par =⇒ bp = 0.
– Função impar =⇒ a0 = ap = 0.
46 1 Conceitos básicos em vibrações

1.8.3 Série de Fourier na forma complexa

A Fórmula de Euler pode ser utilizada para reescrever a série de Fourier em


sua forma complexa. Nesse caso, tem-se que seno e cosseno podem ser escritos
como
1 iθ 1 iθ
e + e−iθ e sen θ = e − e−iθ
 
cos θ = (1.84)
2 2i
Substituindo as equações acima na Série de Fourier tem-se que

∞  
a0 X ap ipωT t  bp ipωT t
+ e−ipωT t + − e−ipωT t

x(t) = + e e
2 p=1
2 2i
∞   ∞  
a0 X 1 bp X 1 bp
= + ap + eipωT t + ap − e−ipωT t (1.85)
2 p=1
2 i p=1
2 i
∞  ∞ 
ap − ibp
 
a0 X X ap + ibp
= + e ipωT t
+ e−ipωT t
2 p=1
2 p=1
2

Definindo então as constantes


ap − ibp ap + ibp
c0 = a0 /2, c˜p = e c˜p ∗ = (1.86)
2 2
tem-se que

X ∞
X
x(t) = c0 + c˜p eipωT t + c˜p ∗ e−ipωT t (1.87)
p=1 p=1

Finalmente, reconhecendo que c˜p ∗ = c̃−p tem-se que uma função x(t)
periódica pode ser escrita como

X
x(t) = c˜p eipωT t (1.88)
p=−∞

onde
T
ap − ibp 1
Z
c˜p = = x(t)e−ipωT t dt. (1.89)
2 T 0

Por ser um número complexo, pode-se calcular o módulo e a fase (ou


argumento) dos coeficientes c˜p através de
1q 2
|cp | = ap + b2p , (1.90)
2
−bp
 
φp = arg (c˜p ) = arctan . (1.91)
ap
1.8 Funções periódicas e Série de Fourier 47

Nesse caso, uma forma alternativa de representar uma função periódica é


através de um gráfico na frequência do módulo e da fase dos coeficientes cp ,
como mostrado na Fig. 1.35 e Fig. 1.36.

Figura 1.35: Espectro na frequência do módulo da função [6].

Figura 1.36: Espectro na frequência da fase da função [6].

Note que:
• Cada coeficiente c˜p está associado a um seno e cosseno com frequência fp =
p/T representados juntos no termo eipωT t (e no seu complexo conjugado
e−ipωT t ). O módulo de c˜p representa uma medida da ”importância”daquela
frequência na função periódica. Essa informação é de grande utilidade
no estudo de vibrações pois permite identificar as frequências com maior
vibração, no caso de o sinal em análise ser a resposta do sistema. Já no
caso onde o sinal em análise é a excitação do sistema, permite identificar
as frequências onde tem-se uma excitação elevada e onde há uma grande
probabilidade de o sistema também apresentar uma resposta elevada.
• Como o somatório vai de −∞ até ∞, tem-se em teoria frequências ne-
gativas. Mas faz sentido dizer que um seno ou cosseno possui frequência
negativa??
De fato, não faz sentido dizer isso e as frequência negativas aparecem
apenas devido ao artifı́cio matemático utilizado para escrever os senos e
cossenos na forma exponencial e obter a Eq. (1.88).
• A informação de fase é de extrema importância na representação de
uma função periódica através da Série de Fourier. De fato, duas funções
48 1 Conceitos básicos em vibrações

periódicas podem apresentar o mesmo espectro de amplitude mas serem


completamente diferentes no tempo devido a diferenças no espectro de
fase.

Exemplo 1.6. Seja o exemplo anterior da onda quadrada. Pode-se calcu-


lar os coeficientes c˜p da Série de Fourier na forma complexa utilizando a
Eq. (1.89). Nesse caso, tem-se que
T
1
Z
c˜p = x(t)e−ipωT t dt.
T 0
Z π 2π 
1
Z
−ipωT t −ipωT t
= e dt − e dt
2π 0 π

Como o perı́odo da onda quadrada analisada é T = 2π, tem-se que ωT = 1 e


lembrando que
e−ipπ = cos pπ − i sen pπ = (−1)p
e
e−ip2π = cos 2pπ − i sen 2pπ = 1,
para p um número inteiro, chega-se a
" π 2π #
1 e−ipt e−ipt
c˜p = −
2π −ip 0 −ip π
i −ipπ
= [e − 1 − e−ip2π + e−ipπ ]
2πp
i
= [2(−1)p − 2]
2πp
 2i
, p = 1, 3, 5, . . .
= πp
0, p = 2, 4, 6, . . .

Note que o resultado está de acordo com os resultados obtidos anterior-


mente se considerarmos a definição de c̃p dada pela Eq. (1.86).

O espectro da magnitude e da fase de c̃p é dado na Fig. 1.37.

Ver exemplos MatLab.

A análise harmônica é uma ferramenta largamente utilizada em acústica e


vibrações pois permite identificar os principais componentes na frequência de
um determinado sinal e compara-los. Além disso, a representação de funções
periódicas em senos e cossenos facilita a análise de sistemas submetidos a este
tipo de excitação como será visto a frente.
1.9 Outras caracterı́sticas de sinais vibratórios - Valor RMS e decibels 49

Figura 1.37: Espectro de magnitude e fase da onda quadrada vista no exem-


plo.

1.9 Outras caracterı́sticas de sinais vibratórios - Valor


RMS e decibels

• Sinais harmônicos são completamente caracterizados através das seguintes


grandezas:
– Amplitude X
– Fase φ
– Frequência ω ou f
ou seja,

x(t) = X cos(ωt − φ) (1.92)


• Sinais periódicos são completamente caracterizados através das seguintes
grandezas:
– Espectro de magnitude |cn |
– Espectro de fase φn

Uma outra grandeza comumente utilizada para caracterizar um sinal vi-


bratório é seu valor RMS (root mean square - raiz quadrada do valor quadrado
médio) definido como
s
Z ∆t
1
xrms = x2 (t)dt (1.93)
∆t 0
onde ∆t é um intervalo de tempo escolhido.
O valor RMS está em geral associado a energia do sinal (conceito que vem
da engenharia elétrica).
50 1 Conceitos básicos em vibrações

No caso de um sinal harmônico, o valor RMS está diretamente relacionado


a amplitude através de
X
xrms = √ . (1.94)
2
No caso de um sinal periódico, o valor RMS fica
v
u ∞ |c̃p |2
u X
xrms = t . (1.95)
p=−∞
2

Uma forma muito utilizada para apresentar as grandezas associadas a si-


nais vibratórios é através do chamado nı́vel de vibração em decibels, dado
por
x
N V [dB] = 20 log (1.96)
xref
onde xref é um valor de referência escolhido e que indica o ponto na escala
para 0 dB. Note que:
• A escala em dB permite analisar em um mesmo gráfico valores com grande
diferença de amplitude. Um exemplo é mostrado na ,onde a mesma curva
na frequência é mostrada em escala linear e em dB e pode-se notar que o
terceiro pico só pode ser visto na escala em dB por ser muito menor que
os outros dois picos.

−3
x 10
7 −40

6 −50
|H (f)| [dB ref. 1 m/N]

5 −60
|H(f)| [m/N]

4 −70

3 −80

2 −90

1 −100

0 −110
0 5 10 15 20 25 30 0 5 10 15 20 25 30
Frequencia [Hz] Frequencia [Hz]

Figura 1.38: Exemplo de um gráfico em escala linear e em decibels.

• A escala em dB pode ser utilizada para qualquer grandeza;


• Em geral, o valor x da Eq. (1.96) é o valor RMS do sinal.

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