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O Processo de Formação das Classes(*)


Adam Przeworski

Nenhum problema persistiu com tanta da reprodução capitalista e, daí, simples-


constância no pensamento socialista co- mente a burguesia?
mo o tema da filiação de classe dos traba-
Colaboram neste número:
lhadores assalariados nío-manuais. Desde Este problema nunca foi simples por-
Adam Pl:zeworski, professor do Departamento de Ciência Polítk:a da Universidade de Clricago.É
a década de 1890, quando o conceito de que o aparecimento de todas essas pessoas
COGtor, com Henry· Teune, de Th• Loglc of Comparath>e Sodsl lnq,,,iry, (New York: John Wiley proletariado passou a tornar-se problemá- que gerenciam, administram, supervisio-
and Sons, 1970). . tico, ocasião após ocasião, conjuntura nam, comunicam, planejam ou simples-
após conjuntura, este assunto aparece mente processam informações não foi an-
Candido Mendes é Cientista Político e Pmident.edo Conjunto UniYenitúio Candido Mendes. com uma premência renovada, teórica e tecipado nos escritos teóricos de Marx,
política. Quem sfo todas essas pessoas principalmente conforme foram esque-
Edson de Oliveira Nunes é Mestre ern Ciência Política pelo luperj onde é Coordenador Geral de que o capitalismo gera num ritmo cada matizados após 1891 na doutrina do "so-
Projetos. Como pesquisador dirige estudos sobre Rea:utamento e Socializaçfo de Elites Políticas no vez mais acelerado, que estio separadas cialismo científico" . 1 Esperava-se que o
Brasil, do lupetj. · dos meios de produção, que sío forçadas capitalismo gerasse uma dicotomia de
! a vender a sua força de trabalho por um posições de classe, que ele aguçasseos cri-
Márcia Bandeira de Mello Leite Nunes é Mestra e'm
Antropologia Social pelo~ Museu Nacional da 1

salário e que, no entanto, nío trabalham, térios de classe destruindo todas as posi-
UFRJ, com a tese Anõe.rcontra GigJmte:r: Ó Movimento de Defe111dti Ecolotltl IIOÍlllilro da Gávea,
vivem, pensam e agem exatamente como ções intermediárias "entre" os proletários
Rio de Janeiro.Atualmente trabalha na pe1quiM 10bre HiS'tóriaSocial da Ciência no Bnsil, da Finep.

Maria Valéria Junho Pena é aluna do Curso de DtJutomdo em Sock>logiàda USP, onde desenvolve
projeto de tese sobre condições de trabalho fem.inino doméstico. Como pesquisadora do CNPq,
J os proletários? Serão eles tràbalhadores,
proletários? Ou serão eles "classe mé-
dia"? Ou talvez simplesmente trabalha-
e os capitalistas. O mercado caótico e, no
entanto, auto-regulável, não deveria ser
um lugar que exigisse planejamento, ad-
encontra-se elaborando o Relat6rio Final da pesquisa A Ciinda Biomédica no .BNstl. dores "nío-manuais", como são classifica- ministração, coordenação, uma produção
dos nos resultados das pesquisas? Ou "la. deliberadamente organizada de relações
Ricardo Alberto Bielsehowsky é Professor Assistente de Mactoeconomia da faculdade de Economia nouvelle petite bourgeoise"? Ou agentes sociais.2
e Administração da UFRJ e Coordenador do Grupo do Estllcios sobre o J:lto&ressoTécnico e
Estrutura Industrial, do Centro de Estudos e Pesquisasda Finep.
(*) Este artigo constitui uma versão condensada e revisada de um paper anterior que foi alvo de
Simon Schwartzman é doutor pela Univeni.dade de Berkeley, Callfomia, professor do luperj e nu~erosos comentários. Só posso expressar minha gratidão aqui relacionando nomes: Amy
Bridges, Michael Burawoy, J. David Greenstone, Elizabeth Jelin, Colin Leys, John Kautsky, 1ra
Coordenador da pesquisa História Socialµ Ciêaciano Bmsil, da Finlp. É amord.e São Paulo e o
Katznelson, Robert Melville, Paul Piccone, Philippe Schmitter e Mike Underhill. As modifi-
EstadoNacional,(São Paulo: DIFEL, 1975). cações feitas nas traduções de Karl Kautsky devem-se à generosidade de John Kautsky. Não
preciso dizer que vários entre os comentadores ficaram muito pouco entusiasmados com o
Vera Wrobel é aluna do Programa de Mestrado em Ciência Política do Ivperj, onde se encontra .:onteúdo deste artigo.
desenvolvendo projeto de tese. ..\ trauução para o português é de Fanny Wrobel e a revisãotécnica de Carlos Hasenbalg.

nodos. Rio de Janeiro, n. 16, p. 3 a 31, 1977 3


De posse dessa teoria e enfrentando o Manifesto Comunista Marx e Engels obser- do seu movimento. Este método reapa- Ele rejeitou, finalmente, o próprio funda-
problema, os teóricos socialistas e comu- vavam que o capitalismo "havia con- rece numa análise pouco conhecida, mas mento da análise de Marx, argumentando
nistas, numa forma muito típica, passa- vertido o médico, o advogado, o padre, o muito interessante, feita por Courtheux que as relações de propriedade são defini-
ram a lamentar-se e a aguardar. Kautsky, poeta, o homem de ciência em trabalha- sobre o censo francês de 1962. A influên- das pela autoridade de dispôr dos meios
escrevendo em 1891, no comentário ofi- dores assalariados" (p. 135). Assim sendo, cia crítica é entretanto, de Weber. de produção e do produto. Daí ser a pro-
cial sobre o Congresso de Erfurth, deu o e isto tem sido argumentado desde então, A crítica de Weber ao conceito de clas- priedade apenas um caso especial de auto-
tom apropriado: "Mais um novo estrato têm eles o mesmo interesse que todos se de Marx forneceu os fundamentos teó- ridade, ser a sociedade construída em
de proletários . . . começa a desenvolver- aqueles que vendem a sua força de traba- ricos para a análise da diferenciação social relação à autoridade e não à exploração.
se: os proletários educados ... Muito em lho por um salário. Para citar a mais re- (estratificação) dentro da sociologia bur- etc. '
breve esses proletários distinguir-se-ão dos cente expressão de ta,is opiniões, eles par- guesa. Weber afirmava que a posição ocu- O recente (I 976) artigo de Wright na
outros trabalhadores assalariados apenas tilham "os mesmos interesses fundamen- pada dentro das relações de produção New Left Review retoma a problemática
pelas suas pretensões. A maioria deíes tais de classe da classe trabalhadora" e (propriedade dos meios de produção) não da determinação objetiva das classes. O
ainda imagina que é algo melhor do que esse interesse é "um interesse no socia- é suficiente para determinar a situação de fato é que mesmo a população economi-
um proletário. Fantasiam pertencer à bur- lismo" (Wright, 1976: 41 ). Eles são traba- classe, uma vez que a posição ocupada nas caml'nte ativa dos Tutados~ Unidos não
guesia, da mesma forma que o lacaio se lhadores, quer saibam quer não, quer relações de distribuição (mercado, estilo pode ser facilmente "encaixada" nos
identifica com o seu senhor", (1971: 36, atuem como tal ou não, porque seus inte- de vida e o status conseqüente) e nas rela- compartimentos de trabalhadores e capi-
40; tradução modificada). resses são "paralelos" aos do proletariado, ções de autoridade (poder) não refletem talistas. A partir daí Wright procura acres-
Em 1958, numa discusSiik>internacio- para usar uma ex.Pressão mais antiga. "Já tirucamente as relações de propriedade. centar dimensões adicionais. "Os proces-
nal devotada a este problema, estas opi- examinamos agora", concluiu Kautsky Ademais, o status e o poder não são dico- sos sociais substantivos que incluem as re-
niões foram repetidas exaustivamente. O em sua análise de,1891, "o campo prin- tômicos, o sistema de estratificação dis- l~ções de classes" são imaginados como
American lnstitute of the Problems of cipal de recrutamento para o socialismo. tribui as pessoas ao longo de camadas distribuindo os indivíduos em classes in-
Work concbnu que: "Se alguma vez exi~ Nossos resultados podem ser resumidos contínuas que se expandem no meio ge- dependentemente das "categorias jurí-
tiram condições objetivas que nos permi- como segue: as divisões militantes e poli- rando a "classe média". As conseqüências dicas das relações de classes", sendo intro-
tiam considerar os trabalhadores de 'cola- ticamente autoconscientes do proletaria- resultantes são bem conhecidas: descri- duzida uma gradação para diferenciar o
rinho branco' (white oollar) como repre- do industrial fornecem o poder que está ções empíripas de '~padrões sócio-econô- controle "total", "parcial", "mínimo" ou
sentantes da classe média, atualmente por trás do movimento socialista. Mas, micos" se tomaram independentes de qual- "nenhum" sobre os recursos, meios de
essas condições 'desapareceram. A avalia- quanto maior for a influência do proleta- quer compreensão histórica; a visão das produção, força de trabalho e os graus <le.
ção subjetiva da sua situação só não mu- riado sobre a forma de pensar e sentir em classes como atores históricos foi substi- propriedade legal (I 976: 33). Os resulta-
dou por parte deles mesmos ... " (Prze- voga entre os grupos sociais aliados, tanto tuída pela análise estatística da distribui- dos são "posições contraditórias": toda a
miany, 1958: 88). Os editores de Marxism maior será o número destes, também ção de renda, educação e prestígio; a aná- espécie de lugares onde esses graus não
Today reiteraram: "Em termos de condi- atraídos para o movimento" (I 971: 191). lise da diferenciação socíal separou-se da coincidem exatamente. O capataz reapa-
ções de trabalho e dimensão da renda os Entretanto, a própria necessidade de análise do conflito. A atenção se focali- rece como "a posição contraditória mais
trabalhadores de 'colarinho branco' es- repetir claramente' o "ainda" indica que o zou na "incongruência de status": o capa- próxima da classe trabalhadora". Uma
tão se tornando cada vez mais semFlhan- problema não pôde ser resolvido por de- taz tomando-se uma vítima típica dessa série de pessoas que entram em cada uma
tes aos trabalhadores comuns, embora creto. Fazia-se necessário algum modelo moléstia. dessas categorias são então relacionadas à
eles ainda não o tenham compreendido" da "estrqtura da classe desenvolvida", Dahrendorf (I 959) foi talvez o pri- base de dados colhidos nos Estados Uni-
(Przemiany, 1958: 96). E o resumo sovié- alguma forma de abandonar a ficção de meiro' a examinar sistematicamente as dos em 1969 e a conclusão é que "cerca
tico reflete a discussão: os empregados uma divisão de classe dicotômica das for- conseqüências da orientação weberiana de um quarto a um terço da força de tra-
assalariados são trabalhadores mas eles mações sociais capitalistas, algumarforma para a teoria de classes de Marx, sem to- balho norte-americana recai nessas posi-
ainda não o compreendem, daí resultando de analisar as posições de classe que ultra- davia rejeitá-la tout oourt. O resultado de ções, próximas aos limites do proletaria-
o fato de não se ter conseguido ainda a passe a noção de duas classes associadas a sua análise foi um "pluralismo objetivo". do". Estes dados, acrescidos aos 40 a 50%
unificação da classe trabalhadora (I 958: cada modo de produção, mais a eterna As modernas sociedades capitalistas, argu- da classe trabalhadora não-contraditória,
54). pequena burguesia. O método de Kautsky menta Dahrendorf, consistem numa mul- constituem a grande maioria que "tem
O que é notável nessas análises, e os era pensar em todas as classes, menos o tidão de grupos, porém esses grupos não um interesse real no socialismo" (41). A
exemplos podem ser multiplicados ad proletariado· e a burguesia, como ascen- se formam arbitrariamente. Eles são gera-. esta altura somos informados, ainda, que
infinitum, é a ênfase repetida no "ainda" dendo ou descendendo para estes "pólos" dos por relações objetivas: relações de "as lutas de classe determinarão em que
quanto à situação de consciência e organi- básicos no curso da história do capi- propriedade e relações de autoridade, mu- medida as pessoas constantes dessas posi-
zação dos empregados assalariados. Já no talismo - daí classificá-los pela direção tuamente independentes umas das outras. ções contraditórias unirão forças com a

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.;:lassetrabalhadora num movimento SO• forja esses "interesses" também não é sarnento de M!lrxe a doutrina codificada parecia ter sido alcançada. O proletaria-
ciaUsta. . . E a possibilidade de um movi- arbitrária. É isto o que precisamosexami- como socialismo científico baseou-sepre- do já estava o~ganizadocomo classe e o
mento socialista viável nas sociedades ca- nar: por quê os interesses que as pessoas cisamente no pressuposto de que sabemos partido socialista nada mais era que "uma
pitalistas avançadasdepende,'em parte, da têm na sua vida cotidiana são o que são, o quem slo os trabalhadores, de que ostra- parte do proletariado militante" (Kauts-
capacidade das organir.açõesda classetra- que há de peculiar a respeito do capita- balhadores devem "organizar-se numa ky, 1971: 183). Parecia que o processo de
balhadora, de forjar as condições políticas lismo e das lutas de classe sob o capi- classe" e que, u~ vez organizadosnuma proletarização das outras classes conti-
e ideológicas que atrairão essas posições talismo que produz esses interesses e essa tal classe, eles simplesmente marcharão nuaria, vários grupos se aliariam simples-
contraditórias para uma alynça mais es- consciência, o que existe no capitalismo através da história para a vitória final. O mente às fileiras do proletariado tornan-
treita com a classe trabalhadora" (44). que estrutura o processo de formação das conceito de proletariado era evidente por do-se membros da classe trabalhadora, a
Ou, como profetizou Kautsky: "Quanto classes. si mesmo para Marx e para os primeiros qual estava se tornando a "imensa maio-
mais insuportável o sistema de produção É importante que compreendamos o socialistas pelo fato de em meados do ria".
vigente, mais evidente será o seu descré- alcance total das diferenças sociais que século dezenote a conotação teórica do É compreensível que sob essas condi-
dito . . . tanto maior será o número da• constituem as barreiras do movim6'1lto conceito de proletariado, definido em ter• ções históricas a análise da estrutura de
queles que fluem das classes não-proletá- político em prol do socialismo. Daí ser mos de separaçio dos meios de produção, classe fosse realir.ada numa forma parti-
rias para o Partido Socialista e, de mãos importante classificare distinguir. De ou- corresponder exatamente ao conceito in- cular, baseada numa ou outra forma da
dadas com o proletariado em avanço irre- tra forma não poderíamos compreender o tuitivo de proletariado, concebido em ter- distinção, introduzida na Misériada~
sistível, seguirão suabandeira até a vitória conflito entre o Partido Comunista Chi- mos de trabalhadores manu!t.is,principal· sof,a, entre "classe em si" e "classe para
e o triunfo" (1971: 217). leno e o MIR, entre os movimentos de mente industriais. Em 1848 sabia-sesim- si". A "classe em si" era uma categoria
A intenção de Wright examinar a base italianos e o PCI, os dilemas do mo- plesmente quem eram os proletários. definida ao nível da "base" - a base que
base do movimento socialista - é a que vimento feminista, o "racismo" do setor Sabia-se porque todos os critérios conce- é· simultaneamente objetiva e econômica.
todos nós compartilhamos e sua análise monopolista dos trabalhadores norte- bíveis - a relação com os meios de produ- "Classe para si" tomou-se o grupo no
de dados e informações concretas é prati- .americanos, o papel político dos estudan- ção, o caráter manual do trabalho, o em- significado sociológico do termo, i.e.,
camente sem prececfentes.Porém precisa- tes, etc. Os critérios de renda junto com prego produtivo, a pobrer.a, a degradação uma classe caracterizada pela organização
mente este problema o problema das os de riquer.a, realir.ação educacional, - tudo coincidia.3 "Se um trabalhador e pela consciênciada solidariedade. Dadas
relações entre classes objetivamente defi- prestígio das ocupações, caráter do traba- não cheira a sujeira e~ suor a duas milhas essas categorias, o problema - teórico e
nidas e classes como atores históricos - lho, forma de remuneração, local de tra- de distância, ele não é grande coisa" - prático foi formulado em termos de
não poderá ser resolvido por qualquer balho, função na divisão social do traba- esta observação feita por um capitalista transformação do "objetivo", i.e., do eco-
classificação, seja com duas ou muitas lho, poder, autoridade, estilo de vida e norueguês resume a história da melhor nômico, em "subjetivo", i.e., de relações
classes objetivas, com ou sem posições auto-identificação - todos esseseixos do forma (Buli 1955: 67). de classe políticas e ideológicas.4
contraditórias. O problema persiste por• arsenal burguês de diferehciação social O problema dos socialistas era organi- Essa formulação coloca o problema da
que tais classificações,sejam as feitas na constituem diferençasreais. Reais precisa• r.ar politicamente esse proletariado, im• classificáção das classes objetivas como o
central do partido ou no recinto acadê- mente porque englobam o arsenal ideoló• buí-lo de uma consciência, "organizá-lo foco central da análise, uma vez que as
mico, são constantemente testadas pela. gico da individualir.ação.Todavia, as clas- numa classe". Em 1890 parecia que isto classes como atores históricos, as classes
própria vida, mais precisamente, pela prá- ses nio surgem como atores históricos a havia ocorrido, como resultado dos esfor• que lutam e cuja luta é o motor da his-
tica política. As "posições contraditórias" partir do "objetivo" ou a partir dessas ços socialistas • do trabalho· teórico de tória, são pensadascomo determinadasde
de Wright slo contraditórias apenas no posições, nem mesmo a partir de posições Marx. Os traôalhador.eseram militantes, maneira unívoca pelas posições objetivas
sentido de que suas afirmações sobre o "não-contraditórias" do proletariado e da estavam organi7.adosem partidos, sindica- ocupadas. Os interesses objetivos, tanto
"interesse real no socialismo" não emer- burguesia. O problema de classificação tos, cooperativas, clubes, associações.Em os interesses materiais a curto prazo ( em
gem da consciência e organh:açfo daque- ~_eosições objetivas de classe não é que muitos países votavam .em eleições, parti• salários, em excedentes) como os interes-
les que presumivelmente têm esse inte• elas constífüâm .classificações,nem que cipavam de greves,apareciam nas demons- ses·a longo prazo (no socialismo, na pre-
resse.. No papel pode-se colocar as pessoas elas sejam sempre necessariamente arbi- trações públicas. Nesta época parecia es• servação do capitalismo) são imputados
em qualquer compartimento que se de- .tmias, mas que elas são.pensadas parares- tar estabelecida a unidade organizacional aos indivfduos enquanto portadores, (Jer·
seje, mas na prática política encontram-se ponder a um problema incorretamente da classe e do partido. Embora, como soniftcações de lugares objetivos. A
pessoas reais, com outros interesses, com formulado: quais os atores coletivos que argumentou Bernstein (1961: 10S), nem "classe em si" é objetiva precisamente no
uma consciência diferente desses interes- surgirão na luta a partir de bases obje- todo o proletariado estivesse organizado sentido de que é uma classe de indivíduos
ses. Tais interesses, sejam "reais" ou nãQ, tivas? num partido político de massa, a tarefa que têm interesses comuns em virtude, e
não slo arbitrários, sua consciência não é É preciso voltar novamente à história encetada pelo Manifesto Comunúta - a apenas em virtude, das posições que eles
arbitrária e a própria prática política que do pensamento socialista. O próprio pen- organir.ação do proletariado como classe ocupam. Daí ser a classificaçãode tais po-

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sições (alocações, lugares, classes) sufi- cesso de organização espontânea não che- as lutas têm um efeito autônomo sobrea objetivas no que diz respeito às lutas de
ciente para identificar os interesses que ga a assumir uma forma política. Essa for- formaçãodas classes,então os lugaresnas classe, Assim, pelo menos duas espécies
determinam essas classes, que podem tan- ma política só pode ser introduzida por relaçlJesde produção, quaisquerque se- de determinação são distinguidas: a deter-
to emergir espontaneamente, como serem partidos sob condições hlstóricas concre- jam, não podem mais ser vistos como minação, pelas relações de produção, das
organizadas para lutarem umas com as tas de crise.6 objetivos no sentido da problemáticada formas de organização das relações ideo-
óutras. Colocando de modo diferente, Esta formulação da problemática das "classe-em-si':i.e., no sentido de deter- lógicas e políticas e a determinação, pela
uma vez identificadas as posições obje- classes é exatamente o que torna tão es- minar univocamentequais as classesque totalidade dessas relaçõesobjetivas, das
tivas, as "classes para si" em potencial es- pinhoso o aparecimento dos empregados emergirãocomo classes-em-luta. Isto im- relações sociais entre homens e mulheres
tão determinadas de forma unívoca. A não-manuais. A única maneira pela qual plica,portanto, nofato de que asclasssifi- que são seus portadores, inclusive as rela-
delimitação das classes como atores hls- sua presença numa sociedade capitalista caçõesdasposiçõesdevem ser vistascomo ções das lutas de classe. As relações eco-
tóricos sobre as classes como categorias põéleser acomodada dentro dessa proble- imanentesà práticaque (pode) resultarna nômicas, ideológicas e políticas, como
de lugares não é problemática aqui, preci• mática é através de uma redeftnição das formação da classe, i.e.• a própria teoria uma totalidade, impõem uma estrutura
samente porque é dada unicamente pelas relações que determinam as bases obje- das classes deve ser vista como interna em sobre as lutas de classe mas por sua vez
classes objetivas. A "classe", portanto, tivás de formação das classes. Daí ser ne- relação a projetos políticos particulares. essas relações são, dentro de certos limites
denota. uma classe de ocupantes dos luga- cessária uma nova classificação das posi- As posições dentro das relações de pro- transformadas, como efeitos das lutas de
res e o problema a ser analisado, a ques- ções objetivas e, ao mesmo tempo, tal dução, ou no caso, quaisquer outras rela- classe. A. noção de "dupla articulação"
tão central, é de que forma uma coleção classificaçãoparece suficiente para re- ções já não são, portanto, vistas como de Poulantzas (1973) é uma iRovação
de indivíduos-ocupantes-de-lugares se solvero problema. objetivas no sentido de serem anteriores neste contexto, e muito importante. A
toma uma coletividade-em-luta pela reali- Nas partes restantes deste texto argu- às lutas de classe. Elas são objetivasape- forma que a luta de classes assume é de-
zação de seusinteresses objetivos. mentarei que o problema da formação das nas na medida em que validamou invali- terminada pela estrutura da totalidade das
A resposta a esta questão tem sido classes não pode ser resolvido nos termos dam a práticada formaçãode classes,na relações econômicas, ideológicas e polí-
dupla: na versão determinista, as relações dessa problemática. Na verdade, o pro- medida em que tornam os projetos espe- ticas que caracterizam uma situação hls-
objetivas se transformam necessariamente blema de identidade da classe dos empre- cíficos historicamenterealizávtisou não. tórica particular (conjuntura) mas ela é
. em relações subjetivas. Uma vez que as gados não-manuais força-nos a repensar -' E aqui o mecanismoda determinaçãonão determinada apenas até os limites dos
relações objetivas def~em os interesses e toda a problemática de formação das clas- é -un(voco: diversos projetos podem ser possíveis efeitos das lutas de classe sobre
a luta de classes é uma luta pela realização ses. As classes, como atores históricos, p/aus(veis numa conjuntura particular. essas relações. Para simplificar: dada uma
de interesses, torna-se matéria de dedução não são dadas unica,;ientepor quaisquer Assim, as posições dentro das relações so- conjuntura parti~ular, uma série de práti-
que as posições objetivas se tomam "re- posiç/Jesobjetivas,nem mesmo as de tra- ciais constituem limites ao sucesso da prá- cas podeJJl ser desenvolvidas,mas o alcan-
fletidas" nos interesses expressos e nas balhadores e capitalistas. Tentarei mostrar tica política mas, dentro desses limites ce das práticas, efetivas, i.e., das práticas
ações. De uma for~ ou de outra, nfais., que o próprio delineamento entre classes historicamenteconcretos,a formação das que têm o efeito de transformar as rela-
cedo ou mais tarde, as relações de classes como atores hlstóricos, classes-em-luta- classes-em-luta é determinada pelas lutas ções objetivas, é determinado pela estru-
objetivas "encontram expressão" espon- e categorias de lugares dentro das relações que têm a formação da classe como seu tura dessas relações. Esta perspectiva, que
taneamente ao nível da atividade e da de produção deve tornar« problemático. resultado. atribui às relações ideológicas e políticas
consciência. A luta de classes é autônoma As classesnão são dadasunicamentepor As classes são um resultado das lutas o status de um limite objetivo sobre as
das relações objetivas apenas na medida quaisquerposiç/Jesobjetivasporque elas de classe que ocorrem num estágio parti- lutas de classe, rompe com os elementos
em que põâe .'.'acelerar" esse processo es- constituem efeitos de lutas e essas lutas cular do desenvolvimento capitalista e economicistas e hlstoricistas inerentes à
pontâneo. 5 • · · • _, não são determinadasunicamente pelas temos que compreender a ambas em sua formulação da "classe-em-si".
A segunda resposta é basicamente vo- relaç/Jesde produção. A formulação tra- articulação hlstórica concreta como um Poulantzas rejeita a opinião, que ele
luntarista. Nesta perspectiva, as condições dicional não nos permite pensar teorica- processo. classifica de "hlstoricista", de acordo com
objetivas não levam espontaneamente, mente sobre as lutas de classes, uma vez a qual as classes-em-luta surgem espon-
"por si mesrqas", a uma organização de que ela as reduz a um epifenômeno ou taneamente, de uma forma ou de outra, a
classe; ou levam, no mdximo, como na então as liberta de qualquer determinação As Lutas de Classee o Processo partir das relações de produção. Ele enfa-
análise consagrada, à formação de uma objetiva. As lutas de classes nem são epi- de Formaçãodas Classes tiza o papel independente da organização
consciência reformista, sindicalista, bur- fenômenos nem estão livres de determina- ideológica e política no processo de for-
. guesa,do proletariado. As classes se for- ção. Elas são estruturadas pela totalidade A grande contribuição de Gramsci maçio das classes. Todavia, no calor da
mam politicamente apenas como resul- das relações econômicas, políticas e ideo- (1971 ), uma contribuição desenvolvida polêmica contra o hlstoricismo, a hlstória
tado da intervenção organizada de um lógicas e têm um efeito autônomo sobre o por Poulantzas (1973), foi reconhecer parece ter-se chamuscado na mesma
agente externo, a saber, o partido. O pro- processo de formação das classes.Mas,se que as relações ideológicas e políticas são chama. Ela se torna uma hlstória que vai

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das relações para os efeitos sem qualquer dadee a consciência,quandoelasnão têm campo da ideologia que as pessoasse tor- tais da luta de classe ideológica.A luta
intervençãohumana (Cardoso, 1973). quaisquer efeitos polfticos. De outro nam conscientes das relações sociais. O de classeideológicaé uma luta sobreclas-
Poulantzaspensa nas classesem termos lado, se as classes são identificadas(1() que leva as pessoas a crer e a agir é o ses antesde seruma luta entre as classes.7
de "efeitos pertinentes" no campo polí- nfvel em que aparecemcomoforçaspolf- resultado de um processo a longo prazo O processo de formação das classes
tico da estrutura das relações sociaisque, ticas organizadas,ou pelo menos como de persuasãoe organizaçãofeito por for- não se limita, entretanto, ao campo da
por sua vez, são determinadas pela totali- "forçaspertinentes•:então o problemaé ças políticas e ideológicas engajadas em ideologia. Se a ideologia não tiver que
dade das formas pelas quais são organiza- como decifrar,como relacionaressasclas- lutas constantes para a consecução de permanecer "nem na forma de uma fria
das as relações econômica, ideológica e ses com os lugaresna organizaçãosocial seus objetivos (Gramsci, 1971: 192). As utopia nem de um aprendizado teorizan-
política numa dada formação sócio-eco- da produção. A distribuição de portado- clivagenssociais, a experiênciada diferen• te", se ela tiver que se tornar ''uma fan-
nômica. A diferenciaçãode "níveis" entre res das relações de produção não se toma ciação social, jamais são dadas ,direta• tasia concreta que atua sobre pessoasdis-
o econômico, o ideológico e o político simplesmente "refletida" ao nível das mente à nossa consciência.As diferenças persas e enfraquecidas para despertar e
leva-o a desenvolverum grande número relações ideológica e política e, no entan- sociais adquirem o status de clivagens organizar a sua vontade coletiva"
de categorias taxonômicas através das to, a emergênciadas classesé não-arbitrá• como resultado das lutas ideológicas e (Gramsci, 1971: 126), ela deve correspon-
quais podem ser identificados os efeitos ria em relação à distribuição dos porta- políticas. . der a algumacoisa real na situação de vida
políticos das classes sem examinar a sua dores dessas relações. Ou, para dizê-lo As classes não são um dado prévio à das pessoas. As lutas ideológicassão inse-
organização. Ele desenvolve,assim, uma mais abruptamente, se se esperaque um prática política e ideológica.Qualquerde- paráveis das lutas políticas, uma vez que
terminologia elaborada para distinguir os trabalhadormanualna indústriase com- finição de pessoas como trabalhadores - os conflitos políticos determinam dentro
lugares das diferentes·classese frações no porte poUticamentecomo, um trabalha· ou indivíduos, católicos, os de lmgua de limites a satisfação dos interesses de
"bloco no poder": dominante, hegemô- dor, então a teoriaé simplesmentefaba,· francesa, sulistas, e assim por diante - é forças sociais particulares e, conseqüen~
nico, governante, de apoio, etc. Entre- se qualquer um que é um 'socialistaem necessariamente imanente à prática das temente, validam ou invalidamas aparên-
tanto, essasclassespermanecemsuspensas potencial é consideradoum trabalhador, forças políticas engajadas em lutas para cias ideológicas.
no ar. Jamais adquirem uma representa- então a· teoria não tem qualquersignifi- manter ou alterar, de maneira diversa, as Quando as relações políticas capitalis-
ção física, nunca passam de "efeitos" cado no sentido positivistada palavra.A relações sociaisvigentes.As classessão or- tas assumema forma de uma democracia
que, por sua vez, afetam outra coisa, uma primeira interpretação do marxismo pre- gànizadas e desorganizadas como resul- parlamentar, o resultado dos conflitos or-
vez que Poulantzasnão indaga de que ma• valece entre muitos estudantes do com- tado de lutas c<,ntíl}uasnuma multiplici- ganizados como lutas eleitorais se torna
neira as classessão formadas. As classes portamento político que descobrem, en- dade de formas. Os partidos que se defi- indeterminado, dentro de certos limites,
surgem, assim, ao nível das "relações so- · tão, um granderesiduumde clivagensque nem a si mesmos como representativos vis-à-visàs posiçõesno campo das relações
ciais", mas não nos é dito de que maneira não são de classe,muitas vei.esmaioresdo dos interesses de várias classese os parti- de produção. A democracia burguesa é
elas surgemnuma forma particular. que as clivagensde classe (Alford, 1965; dos que se propõem representar o inte- uma forma de organizaçãodo conflito de
Essa dificuldade não é nova. Já em Lipset, 1963; Rose e Urwin, 1969). A se- resse geral os sindicatos,jornais, esco- classe no qual, dentro de limites consti-
1909 Sombart sentiu que "o maior empe· gunda interpretação está subordinada à las, burocracias públicas, associaçõescívi- tuídos pelos interesses e pela força física
cilho à clara compreensãodo termo 'clas- espécie de pensamento voluntarista no cas e culturais, fábricas,exércitos e igrejas organizada, se torna possível a satisfação
se social' é que ele é confundido com qual os funcionários públicos eram vistos todos participam do processo de forma- real dos interesses de vários grupos. Uma
'partido político' " (l 909: 3). O mesmo como não pertencendo à classe trabalha- ção das classes no decurso de lutas que vez que as relações de produção capitalis-
ocorreu com Plekhanov(Carr, 1966: 29). dora, quando as perspectivasde sua sindi- concernem, fundamentalmente, à própria ta determinam, por si mesmas,a distribui-
Dahrendorf representa, talvez, uma pers- calizaçãopareciamremotas e, no entanto, visãoda sociedade.É a sociedadecompos- ção do produto entre salários e exceden-
pectiva universalmentepartilhada quando eles constituem, hoje em dia, uma parte ta de classes ou de indivíduos com inte- tes, as instituições parlamentares se tor-
afirma que "a classe envolve uma certa integrante da· ,lclasse trabalhadora em resses harmoniosos? São as classesa fon- nam o foco dos conflitos relativosà redis-
quantidade de consciênciade classee soli- maioria". te fundamental da clivagem social ou tribuição secundária da renda como
dariedade política, se é que o termo deve Será que esse dilema poderá ser resol- devem elas ser colocadas lado a lado a diria Marx, da "renda" mais do que do
fazer qualquer sentido". (1964: 252). vido? O mais importante é que nenhum qualquer outra distinção social? São os "excedente". A luta política passa a ser
O problema geral é o seguinte: Se se passo pode ser dado em direção ao seu

t
interesses de classe antagônicos ou eles estruturada como luta pela distribuição
pensa11113classescomo existindoobjetiva- esclarecimento até que se çompreenda encorajam a cooperação? O que são as da renda.
mente (1() nfvel das relaçõesde produção, que o problema é, simultânea e inextri- classes? Que classe representa interesses Ocorre, porém, que as lutas políticas,
então durante muitos perfodos_históricos cavelmente, teórico e político. A reali- maisgeraisque os seus próprios? Quaisas organizadas de maneira particular, tam-
o conceito de classepode ser irrelevante dade social não é dada diretamente atra- classes que constituem a maioria? Quais bém têm seu efeito na própria forma de
paraa compreensãoda história quando vés de nossos sentidos. Como disse Marx, as que são capazes de conduzir toda a so- organização das lutas de classe. Kautsky
essasclassesnão desenvolvema solidarie- e como Gramsci gostava de repetir, é no ciedade? Estes são os temas fundamen- compreendeu claramente essa ligação."A

10 li
luta econômica", augumen tou ele, "exige A luta econômica de classes também lutas, lutas que assumemformas parti- relações de produção. Assim, em cada
direitos políticos e estes não cairão do não emerge mecanicamente de lugares nas cularesdada a organizaçãodas relaç6es conjuntura concreta, as lutas para orga-
céu. Para conseguí-los e mantê-los é ne- relações de produção. Dentro do con- econômicas,.ideológicas
e poUticas. nizar, desorganizar ou reorganizar as clas-
cessária a mais vigorosa atuação política" texto da problemática da "classe-em-si" Desta forma, as lutas de classe não po- ses não são limitadas às lutas entre classes.
(186) 8 • As lutas políticas têm muito a ver parece que as relações de produção deter- dem ser reduzidas a lutas entre duas ou Não obstante, é essencial compreender
com a forma do Estado das relações minariam pe/n menos as classes como mais classes. Ou, de modo diferente, as que todos os atores que surgem na luta
políticas capitalistas - uma vez que a atores históricos ao nível das lutas econô- classes-em-lutasão um efeito das lutas são constituídos como efeitos de lutas
forma do Estado, estruturaa forma das micas, classes-em-luta-econômica. Como sobre classes.Mas quem são estes que lu- passadas pela formação de classes,i.e.,
lutas de classes(Poulantzas, 1973). Na sabemos, Lenin durante algum tempo tam se as lutas pelas classes são anteriores que toda a organização das lutas é, em
opinia:o de Marx, o sufrágio universal "de- pensou que tais classes-em-luta-econômica às classes? Em que sentido são ante- qualquer momento, como uma totali-
sencadeia': as lutas de classe permitindo eram determinadas pelas relações de pro- riores? Serão todas as lutas, lutas de clas- dade, um efeito de lutas passadas. Neste
as classes dominadas organizarem-se aber- dução mas são estas que são determinadas se? Como podemos reconhecer as lutas sentido o conceito de lutas de classes,
tamente na procura dos seus interes- por aquelas. Se as lutas econômicas pu- de classe? compreendido em termos de lutas pela
ses e fornecendo os mecanismos sociais dessem, na verdade, ser separadas das Quem luta pela formação das classes, formação das classes, é, lngicamente,an-
através dos quais esses interesses podem lutas ideológicas e políticas, ou se pelo se as lutas sobre classes são anteriores às terior ao conceito de classe. A organiza-
ser perseguidos dentro de certos limites. menos as classes-em-luta fossem formadas classes-em-luta? Precisamos distinguir ção ou desorganização das classes é um
O bonapartismo, por sua vez, é uma for- primeiro ao nível das relações ecqnômicas aqui a relação temporal darelação lógica, resultado dessas lutas. Daí, a fim de com-
ma de Estado que reprime pela força as e só depois se organizassem política e como fez Marx quando diferenciou a or- preender a emergência de quaisquer ato-.
lutas de classe, tanto por parte dos traba- ideologicamente, poder-se-ia pensar que dem da análise da ordem de exposição. res coletivos num momento concreto, é
lhadores como por parte da burguesia. as classes são determinadas objetivamente Em cada conjuntura histórica sucessiva, necessário vê-los como efeitos de lutas
Na maioria das formas de relações po- ao nível de lugares vazios dentro das rela- alguns portadores das relações de produ- pela formação de classes.
líticas capitalistas, os portadores das rela- ções de produção. As lutas econômicas, ção são organizados como tal, alguns não Será que esta opinião implica em que
ções de produção não aparecem como tal porém, sempre surgem, historicamente, são organizados de maneira alguma, e ou- as afirmativas de Marx relativas àslutas de
ao nível das instituições políticas. As rela- em sua articulação concreta dentro da tros aparecem em lutas pela formação de classe como aspecto universal e motor da
ções ideológicas e políticas capitalistas totalidade das lutas, sempre numa forma classes, de modo tal que não correspon- história são tautológicas, uma vez que
individualizam as relações entre os porta- modificada pelas lutas ideológicas e polí- dem um a um aos lugares ocupados no qualquer luta que possa ter levado à for-
dores das relações de produção na forma tica. As lutas políticas e as lutas ideológi- sistema de produção, mesmo concebidos mação de classes é uma luta de classes?
em que estas aparecem a nível político. cas determinam, até .certo ponto, a pró- amplamente. Aparecem como "membros Colocando-o de modo diferente: pode ter
Nas instituições políticas capitalistas, os pria forma de or~ão das lutas eco- da sociedade", "os pobres", católicos, ocorrido um período histórico no qual os
portadores das relações de produção apa- nômicas. Çomo exemplo, elas conduzem bávaros, etc. Talvez seja melhor formular meios de produção fossem apropriados pri-
recem como indivíduos ou "cidadãos" à institucionalização de contratos cole- este ponto de forma inversa: estudantes, vadamente e,noentanto, nenhuma luta de
não como capitalistas, trabalhadores, etc: tivos legalmente obrigatórios a nível de mulheres, protestantes, consumidores não clásses nele ocorreu, ou é verdade, por
(Lukács, 1971: 65-66). É claro que isto uma empresa, um ramo da indústria ou de constituem uma classe e, na medida em definição, que sempre houve lutas de clas-
nfo significa que as classes não podem ser toda a economia. Assim sendo, a organi- que surgem como agentes coletivos nas ses, sejam ou não os participantes, clas-
reconhecidas como tal ao nível político. zação das lutas econômicas não é deter- lutas que ocorrem sob circunstâncias his- 'ses? Pare~-me que se a luta de classes é
Conforme argumenta Schmitter (I 974), minada unicamente pelos lugares dentro tóricas específicas, essas lutas não são compreendida como uma luta entreas clas-
quando os elementos corporativistas se qas relações de produção. lutas entre classes. Os atores concretos ses então estas afirmativas são empíricas e
tornam dominantes, os "setores funcio- E. P. Thompson disse uma vez que: "A que surgem ao nível fenomênico, "em falsas: houve períodos na história de dife-
nais" se institucionalizam politicamente. classe é definida pelos homens à medida luta" numa situação histórica particular, rentes modos de produção nos quais não
O que está implícito nisto é que as relações que vivem a sua própria história e, no não precisam corresponder a lugares de- ocorreram lutas entre as classes. Se a luta
políticas capitalistas estruturam a maneira final, esta é a sua única definição" (1963: terminados nas relações de produção am- de classes é compreendida em term06 de
pela qual as classes se organizam, que a 11). "No final", esta afirmativa é correta, plamente concebidas, precisamente por- lutas que têm como resultado a organiza·
forma de organização das classes e do mas precisamos compreender mais preci- que eles são um efeito das lutas pela for- ção ou desorganização das classes, então
conflito de classe é modelada pela forma samente o que ela significa. Não quer mação de classes. Na verdade, a burguesia estas afirmativas são tautológicas. Esta é a
de organizaçio do Estado. A luta polftica dizer que as classes se organizam espon- tem sucesso nas lutas pela formação de forma como eu penso que elas devem ser
das classes~. mais uma vez, uma luta taneamente, de uma só vez, ou de ma- classes quando as clivagens sociais apare- interpretadas. O que elas afirmam é que
wbre classesantes de ser uma luta entre neira única. O que significa é que as clas- cem ao nível fenomênico sob formas que todos os conflitos que ocorrem em qual-
as classes. ses são efeitos cont(nuosda totalidadede não correspondem às posições dentro das quer momento da história podem ser

12 13
compreendidos em termos históricos se e
relações ideológicas e políticas no que s~ t A ~pna· teoria socialista é não-arbi· As forças socialistas entram no proces-
apenas quàndo vistos como efeitos de e P as.
exercendo, por sua vez, efeito sobre a for-
refere às relações de produção. O ensaio . . y•- · ·
..... vez que constitui uma fiorma so de formayão das c1asses com uma teo-
de Wright (I 976) é característico a esse uana, u .. - . al'dad bis
mação das classes. Estas afirmativas de- part . ular de consciência da re 1 e · ria do desenvolvimento capitalista e da e~-
sempenham o papel de ,um postulado teó-
respeito. O papel autônomo das relações tó . El• contém um te/os,nao es tá' livre
lC -
trutura de classes. Elas mesmas se orgaru-
ideológicas e políticas é visto como for- °:cat. sses mas também interpreta .uma
demere, i.am num terreno de instituições parti•
rico: elas afirmam que, mesmo nas situa-
necendo bases objetivas para as posições sociedade histórica concreta. As previS6es culares. Seu modo de exortar e de orga-
ções nas quais os atores históricos cole-
de c]asse, em aditamento às relações de políticas são sempre relativas a u~ ~o- nizar é determinado tanto pela teoria
tivos não emergem como classes-em-luta,
produção. Daí ocorre que os critérios como pelos objetivos imediatos compa·
somente a análise formulada em termos pó Sl·t O, no entanto elas não são arb1tranas
• • t•
ideológico e político se acrescentam às na antecipayão dos efeitos da prati~ po 1• tíveis com a compreensão teórica da con-
de formação de classe toma inteligível a
relações de produção para aumentar o tica (Graínsci 1971: 171). "Somente~ 1!1e• juntura concreta. No decorrer das ativi-
conexão da história éom as lutas con-
cretas. número de ~tegorias nasquais as pessoas didas que vão ao encontro dessas exigen· dades práticas elas descobre~ que ai~~
podem ser colocadas por um observador. cias"' observou uma vez Kautsky' ~m aspectos da teoria não ~u~on~m politi-
Esta discussão deixa claramente sem
Esses critérios são "objetivos", uma vez nreensão total dessa determma- camente, i.e., que a pratica guiada pela
solução diversos problemas de importân- uma com..- . _
que determinam os lugares dos quais as çfo, .. são capazes de melhorar a ~s1çao teoria não produz efeitos políticos ou
cia capital. Elesnão podem ser soluciona-
dos até que retomemos à análise das clas- classes emergem. É uma característica das dos pequenos produtor~s, na med1~a em ideológicos. São assim for~dos, pela .sua
perspectivas sobre as classes que impor- ue é possível melhora-Ja na sociedade própria prática, a reexaminar a teona a
ses ao nível das relações de produção. En-
tam Weber para o marxismo de que as q_
vigent e. r,,..,
"iudar artesãos e camponeses fim de identificar quais os elementos que
quanto isto, alguns pontos já levantados
relações pollticas e ideológicas são sim- como produtores, enquanto e1es conser- se constituem como barreiras para a prá-
exigem maior ênfase. Primeiro, a forma
plesmente acrescentadas às relações de vam seus ,nétodos atrasados de produçã~, tica efetiva.
de organizaçãodas relaçõesideológicase
produçfo e tratadas como co-determinan- • ~11.ição ao curso do desenvolVJ• Quais são, portanto, os elementos das
pol(tfcas têm um efeito independente do os lugares "objetivos". está em 0 r·-· . • l" (Kauts
sobreo modo pele qualas classesIão for- mento econômico e é tmposs1ve . relações políticas e ideológicas ca~italistas
9 Wright compreende de modo errôneo ky, 19 71 : 214; tradução modificad~). _ que estruturam a prática dos moVlmentos
madas. Segundo, é essencial compreen-
as idéias de Poulantzas (1973, 1974), uma Afirmai essa espécie de deternunaçao socialistas? Em outras palavras, em que
der que as classessãoformadascomoefei-
tos da totalidadedas lutas. to Os socialis- vez que a natureza objetiva das r~Jações não é argumentar, todavia, que as forças sentido as relações políticas e· ideoló_!Ji~
políticas e ideológicas deve ser vista num líticas são sempre compelidas pelas capitalistas são objetivas com relaçao as
~ tãnclas históricas a entenderem
tas não são os únicos agentes organiza-
nível diferente, a saber, pelo modo como lutas de classe? Só posso esboçar alguns
dores dessas pessoas a quem definem
como trabalhadores.- Outros atores ten- estruturam a prática de movimentos enga- ::met1te 05 processos históricos nos desses elementos e limitarei a discussão às
tam organizar as mesmas pessoas, outros jados naslutas que têm como efeito a for- uais patticipam.12 E, no entanto_, a relações políticas da democracia ~p~ta-
mação das classes. .... se adote a visão na qua1. a ciên-
qmenos q...... lista. Fica bastante claro que o mais un-
também os organizam como trabalhado- 13
res, enquanto alguns o fazem como mem- A prática dos movimentos que parti- eia se desenvolve em laborat_ó~os, , portante entre esses elementos estruturais
bros de coletividades definidas em outros cipam nos processos da formação de clas• deve-se c0mpreender que a pratiea.poh- são os impostos pelo curso atua1 do de-
termos, às vezes simplesmente como "a ses não é arbitrária, não é voluntarista, tica é um proces,o de testa:,a teona._Es- senvolvimento capitalista e a decorren!e
sociedade". Finalmente, e talvez o mais precisamente porque a própria organiza- tamos "c0mendo o pudim , como disse evolução da estrutura de lugares no. SIS·
importante, o processo de formaçã'o das ção das relações políticas e ideológicas tema de produção e realização do capital.
capitalistas estrutura essa prática. Os me- ~~usser. nf O
classes é um processo perpétuo. As classes Esse pento merece alguma ê ase. Voltarei, mais adiante, à análise desse pro-
canismos de determinação das classes fato das (.orças polfticas interpretarem e cesso.No momento, é necessário focalizar
são continuamente organizadas, desorga-
nizadas e reorganizadas no decorrer do através das relações políticas e ideológicas moldarem a realidade so~ nã'o deve dois conjuntos diferentes de elementos:
desenvolvimento capitalista e das lutas são, assim, indiretos: essas relações não levar à coJ).clusio de que esse processo é, aqueles devidos à forma particular de or-
. que o acompanham. 11 distribuem as pessoas simplesmente ao portanto, -voluntarista, de que, d~ ~guma ganização das democracias burguesas e
longo de uma dimensão de "autoridade" fi e....i.,tem compuls6es obJet1vas a aqueles que surgem da experiência i~eol~
ou de "propriedade legal", mas elasestrutu- orma, - . b' t d
raramaslutasde classecomo efeitosa par-
nível da realidade social comoO 1e eº. gica dos portadores das relações capitalis-
Sobrea NaturezaObjetivadas conhecimento e, no entanto, não ao mvel tas de produção. . .
RelaçõesPolíticase Ideológicas tir dos quaisos portadoresdasrelaçiiesde do sujeitO" encaixado nessas mesmas rela- Dada a organização capitalista da ~ro:
produçãose tornamorganizados,de,orga- ÇÕes cujo conhecimento ele produz. Se a dução, a extrayão do excedente constitw
Formulado dentro dos termos da pro- nizadose reorganizados em classes. realidade $>Cial tem leis, o mesmo deve uma condição necessáriada acumulação,
1lemática da "classe-em-si", o pluralismo 09 movimentos socialistas são um re- ocorrer cc,m O processo de produção ~- do aumento da produção, do empreg~, ~o
>bjetivo interpreta mal a autonomia das sultado de condições históricas e, como cial do c,0nhecimento sobre essa reah• incremento do consumo, etc. Os capitalis-
tal, estão sujeitos a determinações múlti• jade. tas se apropriam da mais-valia e alo•

14
<
cam-na, dentro de certos limites a usos políticos" (1942: 316). "Nenhum par- da espontâneamente pelas relações de olhos. O que é objetivo é a forma pela
alternativos. A acumulação e tudo o que tido", continua Schumpeter, "pode viver produção capitalistas ao nível da reflexão qual as relações capitalistas de produção
ela impJica só pode ocorrer quando a sem um programa que apresente uma pro- sobre a experiência vivida? Deve-se levar produzem o conhecimento imediato da
Ill.lJÍS-valia
é gerada e extraída dos produ- messa de benefíciosimediatosl' (317). Mas muito a sério Marx e Lukács: essa re• sociedade e, daí, a maneira pela qual elas
tores diretos. A exploração agora é uma para QStrabalhadores, a única maneira de flexão imediata, essa experiência "ime- estruturam as lutas ideológicas de classe.
condição necessária para a melhoria das obter benefícios imediatos.é utilizar a opor- diata", '"vivida", essa maneira na qual os Essas características se tornam "reais",
condições de vida dos produtores diretos tunidade que lhes é oferecida pelas institui- trabalhadores imaginam sua relação com elas vão validar ou invalidar a prática da
no futuro (Marx, 1952: 32). Entretanto, ções políticas burguesas, independente• as condições de vida é a que mistifica a formação das classes precisamente por•
não há nada sobre a organização da pro- mente de quão limitada possa ser essa exploração sob a aparência da equivalên- que os movimentos socialistas são força-
dução capitalista, nem sobre a política ca- oportunidade. cia entre trabalho e salário. As relações dos a apelar para essas características em
pitalista, nem sobre a ideologia, que torne Essa necessidade de organização dos capitalistas de produção, como todas as virtude do conhecimento imediato gerado
a extração da mais-valia uma condição trabalhadores no terreno das instituições relações de produção material, consti- pelas relações capitalistas de produção.
suficiente de qualquer coisa, inclusive a eleitorais tem profundas conseqüências tuem ao mesmo tempo relações de pro- Mas essas características nem sempre
melhoria das condições de vida de quem para a prática política dos partidos socia- dução da consciência imediata dessas rela- coincidem - na verdade deixaram de
quer que seja. listas. Eles se tornam os partidos eleito- ções. E a esse nível a relação social apa• coincidir a partir de meados do século
Entretanto, quando as instituições po- rais, "burgueses", dos trabalhadores. E as rece numa forma invertida, como relações XIX - com o denotandum teórico da
líticas se tornam relativamente autôno- conseqüências práticas sâ'o suficientemen- entre as coisas: a distribuição surge como classe trabalhadora. Os que estão separa-
mas vis-à-visaos interresses materiais dos te diretas: as eleições são batalhas de a "remuneração de fatores", os lucros dos dos meios de produção, forçados a
capitalistas, quando elas assumem a forma números, os sucessos ou fracassos eleito- como resultado da operação do mercado. vender sua força de trabalho por um salá•
de instituições democráticas, são conce- rais são medidos em número de votos ou As relações capitalistas de produção misti• rio e explorados no curso da produção
didas aos produtores diretos oportunida- pelo menos cadeiras, a estratégia eleitoral ficam a exploração sob a aparência de capitalista, não precisam ser pobres em
des de se organizarem visando alcançar focaliu a atenção no recrutamento do uma equivalência entre o trabalho dispen· termos de critérios historicamente rela-
objetivos imediatos, materiais. As institui- número máximo possível de adeptos, não dído no ato da produção e os salários pa- tivos. Pobreu, opressão, miséria, t6dio~
ções democráticas fornecem uma opor• importa quem eles sejam. gos à força de·trabalho. A exploraçãonão fadiga, até mesmo alienação, não distin•
tunidade limitada todavia real, para uma Desta forma, a inserção de trabalha- é imediatamentevisfvelpara aquelescujo guem os trabalhadores designados pelo
redistribuição secundária do excedente dores na competição eleitoral deixa uma traballwexcedenteé apropriado. conceito de exploração de toda a espécie
sob a forma de renda. Dada a urgência das marca permanente na teoria socialista. A Mas, se qualquer ideologia quiser ser de pessoas que são pobres, oprimidas ou
necessidades materiais, e dado que as estrutura de classes paga a ser conceitua- efetiva ao instituir uma imagem das rela- despojadas. Além disso, essas caracterís-
oportunidades são reais, os trabalhadores liuda em termos de propensão para a mo- ções sociais, se ela almeja gerar uma iden- ticas secundárias · diferenciam interna•
são forçados a se organizarem como um biliução e o apoio. Os partidos socialistas tificação coletiva, deve corresponder à mente os trabalhadores definidos teo~-
partido eleitoral de massa (Kautsky, são forçados a aderir ao conceito mais maneira pela qual as pessoas sentem a sua mente. Como observou Sombart (1909:
1971 ; Gramsci, 1971 ). A burguesia, ou amplo concebível de proletariado e ir vida cotidiana. Daí a efetividade da ideo- 7-8), alguns trabalhadores vivem melhor
pelo menos alguns dos seus segmentos, mais além desse amplo conceito, enfati- logia socialista com relação aos trabalha- do que um professor-titular na Prússia.
tem um acesso direto ao Estado. Os traba- 1.8.Ildoa situação de vida similar e os "in• dores depender de características da situa- Concluindo, a prática política dos
lhadores devem exercer seu poder através teresses paralelos" de outras classes. Na ção de vida dos trabalhadores, que são movimentos socialistas tem suas deter-
do número, embora obviamente .não so- busca de apoio eleitoral os partidos socia- sec\111dáriasdo ponto de vista da perspec- minantes na estrutura das relações econô•
mente através dele. A estrat6gia ai;uma listas apelam para outras pessoas, enquan• tiva transformacional, a saber, volume da micas, ideológicas e políticas capitalistas.
não-cooperação total é inimaginável. to organi7.am os trabalhadores como renda, estilo de vida, condições de traba- Inseridos numa competição eleitoral, os
Como observou Schumpeter, "uma ati- classe.14 lho, caráter do trabalho, privação relativa, movimentos socialistas vêem a estrutura
tude totalmente negativa, embora bas- Mas, de que forma os socialistas ape- autoridade, etc. - "miséria", "pobreu", de classes em termos de "classe trabalha-
tante satisfatória em princípio, teria sido lam para os trabalhadores, para os porta- "opressão". A ideologia socialista se es- dora", de acordo com as possibilidades de
inteiramente impouível de manter para dores das relações de produção capitalis- trutura em termos de pobreu absoluta identificação coletiva determinada por
qualquer partido, de alguma importância ta? Serão os trabalhadores, mesmo aque- ou relativa ("igualdade"), em termos de interesses. Dadas as regras da competição
política. Isto teria levado, inevitavelmen- les que podem ser identificados como tais condições de trabalho, em termos de con• eleitoral, eles passam a preocupar-se com
te, a um choque com as finalidades reais sem qualquer ambigüidade, dotaqos, sob dições de vida, precisamente em termos números, tentando maximiur o apoio
do trabalho organiudo e, a persistir du- o capitalismo, de alguma consciência es- de todas essas características weberianas. politicamente expressivo. Ao mesmo
rante algum tempo, teria reduzido seus se- pontânea do seu "interesse objetivo no Estas características não são mais "obje• tempo são forçados a acentuar aquelas
guidores a um pequeno grupo de céticos socialismo"? O que é a consciência gera• tivas" que a altura, o peso ou a cor dos características do proletariado, estrita-

17
16
mente definido, que não o distinguemde tanto, ao ressurgimento de outras bases não está em compreendero processopelo vimento das forças produtivas,o elo entre
muitos outros grupos nas sociedadescapi• de identificação coletiva, sejam estas ba• qual as classes sio formadas mas apenas as lutas concretas e a história consiste pre-
talistas. seadas no volumé da renda, no caráter do em entender os lugares objetivos que cisamente no isomorfismo entre os luga-
As relações políticas e ideológicas da trabalho, na religião, na linguagem,na re- constituem a base desseprocesso. res vazios determinados no curso do de-
democracia burguesa levaram à formação gião, no sexo ou na raça. Nessesentido, o Mas, mesmo que rejeitemos essa pers- senvolvimentosocial e os sujeitos históri-
da classe trabalhadora na forma de parti• processode organizaçãodas massasdesor- pectiva, mesmo quando acreditamos que cos coletivos. A classe é o único conceito
dos eleitorais de massa.Como resultado, ganizaos trabalhadores. as classessão organizadas,desorganizadase que é isomórfico em relação às categorias
o processo de organizaçãodos trabalha- reorganizadas como efeito das lutas de de lugares na prática da produção. Se a
dores corw:,classe se funde com o pro- classe, a questão permanece: de que elas análise das lutas concretas deve ser inte-
cesso de rw:,bilizaçãode apoio polftico Relaçõesde Produçãoe são feitas? As classes são formadas de ligível em termos de história e, inver•
popular. Esses partidos ao mesmo tempo Formaçãode Classes maneira não-arbitrária, não apenas por sarnente, se a história deve ser inteligível
organizam os trabalhadores e procuram o causa da natureza objetiva das relações em termos de lutas concretas, então a
apoio eleitoral das "massas". Elesbuscam A'JJclasses são, portanto, feitas, desfei- políticas e ideológicasque estruturam as única ligação deverá ser o levantamento
continuamente o apoio da antiga pequena tas e refeitas no decurso das lutas de clas- lutas pela formação de classescomo tam- (mapping) dos sujeitos históricos sobre
burguesia e, à medida que ocorre e desen- se. Enfatizei deliberadamentea prioridade bém pela natureza objetiva do processo categorias de lugares vazios na prática da
volw.mentocapitalista, focalizamseus es- das lutas de classeestruturadascom refe- de produção capitalista que cria e destrói produção. J!o conceito de classeque for-
forços de organização sobre as várias rência às classesuma vez que somente em lugares-a-serem-preenchidospelos porta- nece esse levantamento.
categorias de pessoas que nio participam termos de uma tal formulação é possível dores das relações de produção. Volta- A classedeve ser pensada, assim,simul-
diretamente no processo capitalista de evitar a tentação de objetificar qualquer mos, assim, ao problema das "bases obje- tâneamente como um ator histórico cole-
produção, principalmente a "nova classe divislo social que surgir num momento tivas", ao problema da determinação das tivo, um ator em lutas concretas e como
média... particular em "posições de classe" a-his- posições de classeao nível das relaçõesde uma relação (levantamento)de um ator
Essa fusão do processode formação da tóricas. Espero ter mostrado que o "plu- produção. Já argumentei que todos esses histórico sobre categorias de posições
classetrabalhadora com a mobilizaçãopo· ralismo com bases objetivas" continua, critérios weberianosque se incorporaram dentro das relações de produção. Para ser
lítica supra-classetem conseqüênciasque nos termos da problemática de transfor- à perspectiva do plurarismo objetivo não mais preciso, as classessão agentes histó-
vlo além de uma procura de 'aliadoselei- mação de classes objetivas em subjetivas, Sãodeterminados ao nível das relaçõesde ricos tais que correspondem de mantira
torais. Tem efeito nio apenas sobre a for- com uma modificação:o número de clas- produção, masao nível das práticas ideo- mívoca a lugares dentro das relações de
ma de organização de classedos assalaria- ses ("posições de classes") é agora tão lógicase políticas dos movimentosengaja- produção. As lutas sobre classessão as lu-
dos nio-manuais mas reage sobre a dinâ- grande como o número de célulasem um dos sob condições capitalistas nas lutas tas pela realizaçio histórica deste isomor-
mica geral da ideologia nas sociedades quadro que combina a posição dentro das para a formação de classes.Não obstante, fismo entre atores históricos e posições
capitalistas e, por sua vez, sobre a forma relações de · produção com as posições como o leitor deve ter observado, essas nas relações de produção.
de organizaçãodos trabalhadores. dentro de outras relações ("autoridade", lutas não poderiam ser descritassem refe- Não obstante, as relações de produção
Na medida em que os movimentos so- "propriedade legal", etc.). Isto continua rência a "trabalhadores" e "capitalistas". não designam as posições a serem ocupa-
cialistas apelam para outras pessoas que dentro/da problemática, uma vez que ela Como poderemos então 'pensar sobre a das por todas as pessoas que vivem e
nio os trabalhadores,ou enquanto diluem presume que as classes emanam de suas determinação ao nível das relações capi• atuam numa sociedadehistórica concreta.
a concepçãosocial do proletariado organi- ,basesobjetivase somente os ocupantes de talistas de produção? Pelo contrário, através da própria lógica
2'.IIJldo-se
à base de interessescompartilha- posições "contraditórias" sio indeter- O tópico é demasiado complexo para do desenvolvimentocapitalista, a força de
dos e características secundárias, eles di- minados em termos de orientação de clas- ser discutido em detalhe. Proponho, por- trabalho é afastada do processo de pro•
sassociamaquele nexo privilegiado,aque- se. As lutas de classe são vistas exclusiva- tanto, apenas os rudimentos de uma res- dução socialmenteorganizado.Precisamos
la relação única entre o proletariado e o mente como relações entre classes-em- posta. As classes aparecem numa relação compreender primeiro, portanto, que ti·
"seu partido... Eles deixam de ser aquela luta. Pensa-se nas contradições do capi• dupla com a história. De um lado, suas pos de trabalho são necessáriospara que a
expressão "orgânica" da missão histórica talismo como objetificadas, num momen- lutas têm o efeito de preservarou trans- produção capitalista continue, uma vez
do proletariado, distinta de e oposta à de to da história, em agentes coletivamente formar as relações sociais, inclusive as que somente essa espécie de trabalho
todos os outros partidos. Masa disassocia- organizados e conscientes que nada mais relações de produção. De outro lado, as constitui lugares-a-serem-preenchidos.
ção do nexo entre trabalhadorese o movi- fazem a nio ser lutar uns com os outros. classes constituem o único vínculo entre Somente então poderemos entrar numa
mento socialista tem o efeito geral de re- Pensa-sena organizaçãoideológica e polí • as relações de produção e os-atores-histó- análile de tais posições. Entretanto, até
forçar a imagemda sociedadesem·classes. tica como ligada a "placas de identifica- ricos-em-luta.Uma vez que a continuida- mesmo esseslugares,posiçõesnas relações
FJ.a diminui a saliênciada classe como ção" usadaspelo menos por aqueles que de da história está ao nível da produção, de produção amplamente concebidas,não
base de identificaçfo coletiva. Leva, por- têm claras posições de classe. A revisão mais precisamente, ao nível do desenvol- podem ser pensados como objetivos no·

18 19
sentido de serem eles os únicos a deter- na indústria.Artífices, artesãos, pequenos tivo que Marx esperavaver.:diminuir em .uma classe de trabalhadores improdutivos
minarem a organização das classes-em- lojistas, camponeses e donas de casa não termosrelativosà oferta total de força de para preencher as funções de distribuição,
luta, precisamente porque o efeito das se tornaram trabalhadores manuais produ- trabalho, produzindo assim uma "popula• comercialização,pesquisa, financiamento,
práticas orientadas em direção à formação tivos, na indústria. Eles se transformaram ção excedente" que pode existir "em to- gerência, observação atenta e glorificação
das classes pode produzir padrões alterna- numa variedade de grupos cujo status era dalas formas possíveis". do produto excedente em expansão. Esta
tivos de organização de classe dos porta• teoricamente ambíguo. A questfo passa a ser, então, qual é o classe de trabalhadores improdutivos, tra•
dores das relações de produção. Os luga- Essa ambigüidade torna-se compreen- trabalho necessário à acumulação capita• balhadores de serviços, ou serviçais, em
res nas relações de produção são objetivos sível no contexto da teoria de acumula- lista. O problema não é de definição e resumo, é a classemédia" ( 1967: 46).
apenas no sentido de que eles validamdi· ção capitalista de Marx.1 s Rejeitando o nem tem nada a Per rom quaisquerínte• Não importa aqui que trabalhadores
ferentes projetos políticos. caráter regulador da dinâmica populacio- resm, como parece acreditar O'Connor improdutivos sejam requeridos para
O ponto de partida deve estar na teoria nal de Malthus (Sweezy, 1942: 86ss.J, (1976). O problema é determinar que preencher as funções: o que é importante
da acumulação capitalista, na teoria da Marx argumentou que, independente da tipos de trabalho sio indispensáveispara é que certamente nem toda a população
história do capitalismo. O que precisamos dinâmica de população, o capitalismo re- que continue a acumulação capitalista. excedente relativa é empregada funcional·
compreender é que espécie de lugaressão duziria, no curso do seu desenvolvimento, Dado o capitalismo, num estágio parti• mente dessa forma. Apesar de Marx e
criados e quais são destruídos no decurso o número relativo de pessoasnecessáriasà cular do seu desenvolvimento, quais são Engels enfatizarem freqüentemente o
do desenvolvimento capitalista. Precisa- produção. Contava-se com o decréscimo ~ requisitos da reprodução das relações papel técnico dos capitalistas e seus dele•
mos compreender quais os aspectos desse do número daqueles necessáriosà produ- sociais capitalistas? O estudo minucioso gados como organb:adoresdo processo de
processo que são intrínsecos à lógica da ção relativamente à população, gerando feito por Marx a respeito dos trabalhado- produção, e apesar de Marx··mencionar
acumulação capitalista e, portanto, neces- assim uma "população excedente rela• res em armazéns constitui preclsamente explicitamente os engenheiros e outros
sários e quais os aspectos modificados tiva" (Capital, I: 644). Na verdade, esta uma tentativa de responder a esta ques- como parte do "trabalhador coletivo", to•
pelas lutas quando estas ocorrem sob con· era uma lei fundamental da acumulação tão: todos os trabalhadores dos depósitos das essas pessoas que dirigem, catalogam,
dições definidas. capitalista: a produção da "população slo necessários à acumulaçlo capitalista geren~. mediam e servemsão freqüen-
Vamos reconstituir mais urna vez, al- excedente relativa" que, como disse ou apenasaqueles que armazenam produ- temente tratadas como um artefato supér•
guns passos na história do pensamento so- Marx, "existe em todas as formas possí- tos perecíveis? (Gough, 1972). fluo das relaçõespolftiCOJde classedo ca•
cialista. Parece bastante sintomático que veis. Cada trabalhador pertence a ela du- O fato é que igrwramosque espécies pitalismo, não como um resultado neces-
o próprio conceito de proletariado te- rante o tempo em que está apenas parcial· de trabalhosão necessdriasTJONa produ· sário da acumulação capitalista (Engels,
nha-se tomado problemático apenas 40 mente empregado ou inteiramente desem- çiio de relaç{Jescapitalistt13. Hoje em dia 1959: 103; também Gramsci, 1971: 13;
anos após a publicação do Manifesto Co- pregado" (Capital,I: 640). estamos menos inclinados a crer, como Althusser,1971: 183-184). Alémdisso, os
munista, pois Engelssentiu a necessidade ~ dentro deste contexto que precisa- Marx, que as relações capitalistas, não "!!erviçais"de Marx não eram certamente
de introduzir uma definição do proletaria• mos ver o papel desempenhado pelo con- apenas de produção mas também relações a "classe média" de Nicolaus. mes são
do como nota de pé-de-páginana edição ceito de "trabalho produtivo" dentro das legaise.ideológicas,reproduzam"'3epor "si pessoas que não podem encontrar qual-
inglesade 1888. Até essa ocasião a separa• recentes controvérsias a respeito das clas- mesmas", pela mera repetiçio dos atos de quer emprego produtivo e são deixadosà
ção dos meios de produção parecia ter ses, (Gough, 1972; Yaffe, 1975; Pou- produçio (Capital,III: 694). Tendemos a suaprópriasorte, para suprir uma existên-
coincidido com o tomar-se um trabalha- lantzas, 1974; Terray, 1972; Vaisov, suspeitar, àssim, de que todas essaspes· cia miserável". 16 Se eles devem sobre-
dor manual, industrial. Mas em 1890 o 1971). Se aceitamos o resumo sucinto de soasempregadas nos "aparatos" são real- viver, na verdade ró podem fazê-lo como
problema tornou-se aparente. A '"prole- Mandei, o trabalho produtivo é "todo o mente necessárias para a continuação da "serviçais", o que inclui todos aqueles
tarização" passou a ser um conceito ambi• trabalho que cria, modifica, conserva os acumulação capitalista. Mas di11pomosde que não estão empregados "utilmente":
valente. Em termos de destruição de posi- valores-de-usoou que é tecnicamenteín- poucas respostas específicas, se é que serviçaisdomésticos assim como policiais,
ções na organização pré-capitalistae capi• dispensdvelpara realizá-los... " (Mandei, temos alguma. Na verdade, a tendência advogados e criminosos, criados e polí·
talista inicial da produção isto significava 1971: 191-192). O trabalho produtivo tem sido saltar no abismo do funciona- ticos. F.stassão as pessoas às quais Kau•
separação da propriedade dos meios de torna-se uma categoria relevante no curso lismo: o que quer que aconteça parece ser tsky descreveu como "parasitas" e sobre
produção e a perda da capacidade de so- das discussõessobre classe porque é este o urna"função" que tem o efeito de repro- as quais Marx apenas pôde dizer que:
brevier sem vender a força de trabalho trabalho necessário para produzir tudo o duzir as relações capitalistas,e tudo o que "Desde a prostituta até o papa, há uma
por um salário. Mas,em termosde criação que pode ser produzido, porque é este o acontece é necessário para reproduzir o quantidade de tal entulho" (Grundrisse:
,de novos lugaresdentro da estnltura do trabalho explorado e porque é este o tra- capitalismo. O "trabalhador coletivo" in- 272-273).
capitalismoem desenvolvimento;isto não balho capaz de assumir e organizaro pro- clui todo mundo, todos nós somos tecni- O ponto é o seguinte: o sistema capi·
representavaneces,ariamentea absorção cesso da produção sem os capitalistas camente necessários. "O aumento na pro- talista de produção, a produção rom•
nos lugaresdo trabalhomanualprodutivo (Mandei, 1971: 23). É o trabalho produ- dutividade", para citar Nicolaus, ' 1exige preendida amplamente, incluindo tudo o

20 21
mas nem mesmo a exploração, e certa- theux (1965), Wright (1976), ou a minha
que ela implica, não estruturaas formas hemos que dentro da problemática de for mente também não a preservação das rela- própria (Przeworski et ai., 1976), pare-
do trabalhoexcedente.17 A determinação mação das classes eles não são mais vistos ções capitalistas, deve se tornar um inte- cem-me igualmente adequadas precisa-
de lugares é limitada às relações de produ- como objetivos no sentido de determinar resse expresso e compartilhado pelos capi- mente pelo fato de permitirem analisar e
ção amplamente concebidas, i.e., todas univocamente as classes-em-luta assim talistas. É isto o que vimos dizendo o levar em consideração diferentes projetos
aquelasrelaçõesque são necesfldrias para como os interesses que., surgem a nível tempo todo: que os lugares nas relações de formação de classes. Desde que possa-
que continue a oco"er a acumulaçãoca• subjetivo. Creio que esses lugares podem de produção não são objetivos no sentido mos distinguir, digamos, empregados não-
pitalistacontinuada.Além dessas relações ser vistos da seguinte maneira. Devemos de determinar os interesses subjetivos e manuais do aparelho estatal, agricultores
amplamente concebidas de produção, dis- nos limitar somente aos conceitos mais es- daí as classes-em-luta. Deve-seassociar os que não empregam outros, etc., saberemos
tribuição, circulação, educação, legitima- tritos possíveis de trabalhadores e capita- resultados das lutas concretas com suas o bastante, tanto para analisar os efeitos
ção e o quê mais, não há "lugares", i.e., listas. Devemos pensar nos trabalhadores conseqüências históricas no que se refere da acumulação capitalista sobre a estru-
posições estruturadas anteriormente às e capitalistas como lugares designados à preservação ou transformação do capi- tura dos lugares no processo de produção,
lutas de classe, posições a serem preen- pela relaçãode exploração(extraçãoda talismo. Daí fazer sentido dizer, por como analisar as conseqüências históricas
chidas. O trabalho excedente pode awmir mais-valia)com todos os critériosadicio- exemplo, que a divisão dos trabalhadores dos projetos alternativos de formação de
a forma de emprego na administração esta- nais, quando necessários,designadospara em protestantes e católicos, impede . o classes. Esta é a forma pela qual os dados
tal, pode assumir a forma de uma aposenta- distinguiros assalariadosmanuaisnos se- projeto histórico de transformação socta- censitários podem ser tipicamente recons-
doria precoce, pode assumir a fonna de tores produtivos e os que efetivamente lista ou que ela tem o efeito de prese~ truídos: não devemos esquecer que eles
grandes exércitos permanentes, pode assu- dispõemde excedente. As razões para agir as relações capitalistas, mesmo se os capi- são colhidos habitualmente com outros
dessa maneira são duas: primeiro, porque talistas não aparecem como uma classe- propósitos que não a análise de classes. E
mir a forma de nove milhões de estudantes
esta é a única maneirapela qualpodemos em-1uta mas se dividem, eles mesmos, em parece-me que isto é suficiente, se é aqui
universitários, pode assumir a focma de im- estabelecera ligaçãoentre o desenvowi- protestantes e católicos. É inconseqüente que vamos parar. Se acrescentamos ou
pedir as mulheres de terem um emprego mento das forças de produçãoe o pro- se a preservação do capitalismo é impu· não os 20% de pequenos burocratas aos
produtivo, pode assumir a forma de um fün cesso de formação das classes;segundo, tada a um interesse dos capitalistas ou se assalariados manuais nos setores produ-
desemanade três dias,etc. A forma do tra- porque esta é a única maneirapela qual a transformação socialista é imputada a tivos é uma decisão sem conseqüências, a
balho excedente não é determinada pelas podemos analisaras conseqüênciashistó- um interesse dos trabalhadores. Se se de- menos que ela fimdamente uma prática
relações deprodução. Ele é diretamenteum rias de diferentes projetos de formação seja, pode-se fazê-lo claramente (Pou- polftica de formaçãode classe.Espero ter
efeito daslutas de classe. O trabalho oxce- das classes. lantzas, 1973), mas o "interesse objetivo" demonstrado que qualquer classificação
dente não ocupa "posições" que sejam Voltemos agora à discussão das lutas aqui já não é mais objetivo no sentido de de lugares é necessariamente imanente a
"contraditórias" em qualquer sentido. Sim- sobre classe e lutas entre as classes - uma que ele determina a organização da _classe. uma prática política e ideológica, que
discussão que interrompemos. A preser- Pode ser objetivo apenas no sentido de nenhuma classificação, não importa quão
plesmente não há posições "objetivas",
vação das relações sociais capitalistas tomar inteligível os efeitos das lutas con- "objetiva", é neutra em relação à prática.
mesmo que a fonna de organiução !IOcial pode ser atribuída, como um interesseà cretas pela formação de classes, em termos Quero tornar esta tese explícita, mais
de sobrevivência da população excedente burguesia,mas não é, necessariamente, o de suas conseqüências para a história. A uma vez: a ,leterminaçãodos lugaresa
seja, certamente, não-arbitrária. interessede cada capitalistaindividual.O imputação de um tal interesse objetivo nível das relaçõesde produção,inclusive
Nada disto implicaem que as relações capitalismo é um sistema no qual há capi- nada acrescenta, porém, à compreensão os lugaresdos trabalhadorese capitalistas
de produção, tanto num sentido estrito talistas, mas os capitalistas individuais da história, uma vez que a preservação ou estritamente definidos, apenas desem-
como no sentido amplo utilizadoacima, concretos não sobrevivem necessariamen- a transformação do capitalismo e os inte- penha, no processode formação das clas-
não sejam afetadaspe"/aslutas de c"lasse. te como a classe de capitalistas. Na ver- resses objetivos dos capitalistas e trabalha- ses, o papel de um limite sobre a prática
Se acreditamos, por exemplo, que a intro- dade, sob muitas conjunturas, o capita- dores, respectivamente, passam a ser em- dos vários movimentos engajadosnas lu-
dução da linha de montagem teve como lismo só pode ser preservado à custa do pregados apenas como sinônimos. tas das quais a organização,desorganiza-
finalidade específica despojar os produ- fato de alguns capitalistas concretos Embora correndo o risco da heresia, ção e reorganizaçãodas classesé apenas
tores imediatos de qualquer probabilidade deixarem de ser capitalistas. Daí resulta admito que não vejo como particular- um dos efeitos. O problema não é cons•
de compreender o processo de produção que não devemos esperai: que os capitalis- mente importante o problema de classifi- truir classificações objetivas, mas com-
(Bologna, 1972; Marglim,1974) teremos tas individuais sempre ajam como uma car todos os lugares e pessoas a não ser os preender as limitações ideológicas, polí-
uma ilustração do efeito daslutas de clas- classe à base do "seu interesse" em pre- definidos estritamente - trabalhadores e ticas e econômicassobre a prática de vá-
se (movimento dos conselhos) sobte a servarÓ capitalismo. O interesse de um rias forças que continuamente formam, os
capitalistas. Além disso, precisamos ser
organização das relações de produção. capitalista individual é maximizar seus ocupantes desses lugares em classes. Con-
muito cautelosos para não objetificar tais
Como devemos, então, pensar os luga- lucros o que, em termos de relações capi- cluirei tentando demonstrar que apesar
classificações. Várias classificações, Cour-
res dentro das relações de produção? Sa- talistas de produção, significa explorar;

23
das soluções a este problema não serem algo assim como a aliança PCI-Fiat ou o \-OmunistaChileno, o MIRe a ala esquer- povo". As histórias recentes do Chile e da
arbitrárias,elas são múltiplas precisamen- acordo freqüentemente difundido entre o da do Partido Socialista. Itália são verdadeiros laboratórios de tais
te por que mais de um padrão de classes Partido Comunista Chileno e a Democra- Cada uma dessas estratégias de forma- experiências práticas. Sua viabilidade só
tem lugar dentro dos limites da determi- cia Cristã. Note-se que nesta estratégma ção de classes, assim como outras estra• pode ser examinada através da prática
nação pelas relaçõessob as quais as lutas classe trabalhadora é definida estrita- tégias que podem surgir a partir de uma política e apenas em termos de uma con-
de classeocon'em no capitalismocontem- mente. análise mais sistemática, apresenta con- juntura concreta. Nada do que dissemos
pordneo. No entanto, ao mesmo tempo todas as seqüências, não apenas para a forma de acima deve ser tratado como uma ava-
A experiênciaimediata das relações so- categorias além da dos capitalistas e da organização da classe do trabalho exce- liação de tais estratégias.18 Tentei de-
ciais, a experiência baseada na renda, pequena burguesia estio separadas da dente, como também diretamentesobre a monstrar, simplesmente, que a multiplici-
caráter do trabalho, lugar no mercado, posse dos meios de produção e forçadas a maneira de formação da classe trabalha- dade de estratégias que experimentamos
prestígio das ocupações, etc., não se trans- vender sua força de trabalho por um sa- dora. Essasconseqüénciasjá foram discu- recentemente tem bases objetivas nas con-
forma, por si mesma, numa identificação lário, a menos que possam subsistir com o tidas neste artigo. Em particular, defini• dições sob as quais os processos de for-
coletiva, uma vez que essa experiência é chamado "seguro social". Além disso, na ções amplas da classe trabalhadora, estrá- mação de classes se desenvolvemno ca-
mediada pelas práticas ideológicase polí- análise de Marx (Capital, III: 17; também tégias que formam o proletariado estrita- pitalismo avançado e que a sua efetivi-
ticas dos movimentos engajados no pro- Yaffe, 1975), o trabalho dos empregados mente definido em uma classe ao lado de dade não pode ser avaliada de fora. Ao
cesso de formação das classes.Maso mes- no comércio, embora não crie mais-valia, outras categorias de ocupantes de lugares mesmo tempo, tentei demonstrar a natu-
mo também nfo ocorre com a distribui- permite ao comerciante capitalista apro- dentro das relações capitalistas,diminuem reza perpétua e descontínua dos pro-
ção dos portadores em categorias de lu- priar-se da mais-valia sem pagar aos a saliência da classe e criam outras cliva- cessos de formação das classes. A análise
gares nas relações capitalistas de produ- empregados o equivalente total do seu gens comQbases de identificaçãoe organi- concreta é incompatível com a idéia das
ção. Mesmoas relações de exploração nfo trabalho. Neste sentido, ambas as cate- zação coletiv:as.Em conjunturas concre- classes como determinada objetivamente,
determinam, por si mesmas, um padrão gorias a reprodutiva e a de serviços tas, o conceito de "povo" torna-se,então, sujeitos que emergem espontâneamente e
único de formação de classes. Num sen- embora vivendo à custa do excedente definido ainda mais amplamente do que que simplesmente marcham para trans-
tido indireto, o proletariado pode ser produzido pelos trabalhadores, estão sugerimos aqui, incluindo "consumido- formar a história. As classessão formadas
explorado por todas as outras categorias, separadas dos meios de produção, força- res", "pagadores de aluguel", católicos, como efeitos de lutas das classes; à me-
com exceção da pequena burguesia. Os das a vender sua força de trabalho e, neste mulheres,sulistas,etc. dida que as classes lutam, elas transfor-
trabalhadores e a pequena burguesia são sentido particular, exploradas pelo capi- Os limites dessas estratégias são cons- mam as condições sob as quais as classes
os únicos produtores de tudo o que é con- talista. Isto produz uma comunhão de in- tituídos pelos conflitos internos caracte- são formadas.
sumido. O excedente que os trabalhado- teresses defmida em termos de uma série rísticos de cada bloco, o que Mao chamou Cremos nfo ser necessárioenfatizar o
res produzem, ou uma parte dos seus salá- de características secundárias, principal- pitorescamente, ainda que de forma im• caráter apenas experimental destas con-
rios, Sfo direta e indiretamente (através mente de natureza distributiva,e leva à no- precisa, de "contradiçôes no seio do clusões.
do Estado) transferidos como renda para ção da massa trabalhadora, o equivalente (Recebido fNITII publicaç6o em 11brllde 1977)
todas as outras pessoas. Neste sentido, até moderno das "classeslabourieuses".Assim
o mais pobre dos "lumpemproletários" definida,a classetmbalhadoraé suficiente- Notas
vive do produto dos trabalhadores: dadas mente ampla para constituir a "classetm-
as relações capitalistas de produção, há balhadoraem maioria': l. Em meio às discussões contemporâneas sobre o pensameJJto de Marx é preciso nlo esquecer que
bases objetivas para o antagonismo dos Finalmente, a estratégia pode ser am- o Grundrllle e diversos outros eaboços feitos por Marx após 1853 nlo eram conhecidos dos
trabalhadores com a "classe do seguro teóricos marxistas até recentemente. A doutrina do socialismo cientír100, que constituiu o
pliada à formação da classe trabalhadora fundamento teórico da Segunda Internacional, foi baseada basicamente numa mistura do
social" (welfare class). Além disso, é real- definida como "as massas" ou "o povo", M11nife1toO,mun/6111,do O O,pitlll, do Do Socilllilmo Ut6pico 110Cientifico de Engels, e alguns
mente do interesse dos trabalhadores, todos os explorados e oprimidos, pobres e curtos panftetos de Marx.
dada a organizaçãocapitalista das relações miseráveis, etc. Esta estratégia focaliza
sociais, que a maior parte possível do 2. "A contradição entre a produção sodal.izada e a apropriação capitalista", escreveu Enpls, "se
preços, impostos e emprego ao invés de apresenta a,ora como um 1111tcon/lmoentre a oiganizaçio da produção na fábrica individual e
excedente seja retida pelos capitalistas e salários e condições de trabalho e in- a anarquia da produção da 10ciedade em gemi" (1959: 97-98).
alocada à acumulação, uma vez que desta corpora sob o guarda-chuva do povo a
forma é incrementado o produto total pequena burguesia e o "lumpemproleta- 3. Deve-seobservar, também. que na indústria (Incluindo mineração e const:ruçio) - que se
futuro. Daí existirem bases objetivas para supunha representar o futuro da 10ciedade capitalista a estrutura de classe era aproximada-
riado". Entretanto, quando o "lumpem- mente dicotómica. Segundo o ceDIOalemão de 1882, havia cerca de um milhio e meio de
wna aliançapol(tica entre o proletariado proletariado" é relativamentegrande, esta empregadores, cercade três e meio milhões de trabalhadores e somente noventa mil. entre pessoal
industrial estritamente definido, e a fra- estratégia produz os tipos de tensão que deescrit6rioetécnico, nesse setor. AscünuespectiYaSpuaaSuécia. em 1900. foram de 125.000
ção moderna, expansionista da burguesia, se mostraram evidentes entre o Partido empregadores, 442.000 trabalhadores e 22.000 empregados de escritório e técnicos. Na França,
em 1881, ~ ,L.169.000 empregadores, cerca de 3 ~~ões ~ ~abalhadores e 236.000 empre-
,ados de_escntõno. Os dados da Alemanha e da SueCia se ongmam dos respectivos censos. A social é uma expressão da luta política e ideológica que ocorre entre "os homens de idéias" que
infonnaçao francesa baseia-se em Toutain (1963: Quadros 75-77).
interpretam a prática social.
4.
De acordo com Magri, o próprio Marx não estava ciente dos problemas que essa formulação
8. E no entanto observem que a própria distinção,_ o próprio_ pr?blema _das rel~ões entre a luta
gera .. ~as ~alavras de Magri,.essesproblemas são os seguintes: "Conímado à premência das econômica e a poUtica surge t1penll8 quando o s1Stemacapitalista esta orgaruzado tanto como
condiçoes vigentes, o proletariado não pode alcançar uma visão global do sistema social como
democracia parlamentar como sob alguma fonna competitiva de negociações trabalho-capital.
um todo, nem pro'™?ve! sua de!1'11bada.Sua prática como classe só pode desenvolver-se trans-
Estas estruturas das relações capitalistas organizam as formas das lutas de classe e produzem a
cen~ndo essa premencta ~traves da ,mediação de uma consciência revolúcionária. Qual será,
então_o processo, o mecarusmo atraves do qual se produz essa consciência? Ou, para colocar a dupla organização da classe trabalhadora sob a forma de sindicato~ e partidos. "Na ~er~de",
Luxemburgo merece ser citada aqui, "a divisão_e~tre a luta _política e a luta econonuca e a
questão de forma ~s Precisa.pode e~ consciência de classedesenvolver-se espontaneamente
dentro do prole~~•. em ~ de uma necessidade intrínseca, baseada nos elementos já separação entre elas é apenas um produto artifiCJal do ~r1odo i>ar!3-men.~, mes!!lo sen~o
oompreensível historicamente. De um lado, num desenvolVJmento p~c~fico, nonnal . d;& ~Cl~
presentes~~ sua obJetmdade social e que passam, gradualmente, a dominar os outros elemen-
dade burguesa, a luta econômica é fracionada, desagregada numa sene d~_lu~ pare~, h~i-
tos q~! o~ginalme~te ~ ~ndenam a condições de subordinação e fragmentação? Ou será que a tadas a cada empresa, a cada ramo da produção. De outro l~o, a luta pohtica e conduzida nao
conscie_ncia revoluCJO~ deve representar uma transcendência da imediação do proletariado, pelas massas através de uma ação direta mas~ de co~ormidade com a est~tur~ d2 Estad~
produzida po~ um salto d~ético qualitativo • uma interação complexa entre as forças externas e burguês, no modelo representativo, pela pressao exercida sobre o corpo legislativo . (1970.
a ação espontânea da própna classe? Marx não enfrentou este problema" (1970: 101). 111).
S. O caso ~te_desta solução são as opiniões de Rosa Luxemburgo que certamente se prestam a
9. Assim sendo e contrariando as idéias de Maclver (1947) e Lipset (1963), as eleições não são
uma série de mterpretações. Seu "espontaneísmo", re é que ele existiu, se baseava na noção de simplesmente •~ma expressão pacífica das lutas de classe". ~las são uma forma de org~ão
que ~ ~lassessão apenas formadas no decurso das lutas de classes, ao mesmo tempo econômicas das lutas de classe. As classes não se tomam organizadas simplesmente elas se orgaruzam
e politicas. Conforme enfatiza Nettl (1969: 137), a existênciado partido não era suficiente,
numa forma particular.
a~ as co~rontações constantes, principalmente as greves gerais, poderiam conduzir à orga-
~ poUtica_~ classe trabalhadora. No entanto, ao mesmo tempo, a transformação da classe 10. Assim disse Gramsci (1971 : 151): "A história de um partido ... só pode ser a história de um
objetiva em subjetiva era neceadria, na sua opinião; a organização levava à intensidade crescente
dos conflitos de classe,os conflitos de classegeravam a crescente organização e consciência e grupo social particular. Mas esse grupo não está isolado, ele tem amigos, grupos afins, OJJ!?nen-
assim por diante, dialeticamente, a históriamarchava. Parauma discussão das interpretaçõe; tes, inimigos. A história de qualquer partido só pode surgir do quadro complexo da totalidade
alternativas das opiniões de Luxemburgo veja Frolich ( 1970), Magri ( 1970). da sociedade e do Estado ... "

6. A coni:epção de ½'nin, j~ é sobejamente conhecida para exigir um resumo. No contexto


11. Esta formulação elementar do problema de formação das classes tem implicações diretas nos
desta discussão, porem, e interessante observar que ela primeiro se apresentou em Que faer" argumentos em tomo do tema da "desradic~?" ~ c!~.~abalbadora no curso ~o desen-
(1964: 38), através do comentário de Kautsky sobre o programa do Parfido.Sociàl-Democmta volvimento capitalista. O debate sobre desradicalização e dmgido a um problema incorreta-
Austríaco de 1901, palavras que Lenin descreveu como "profundamente verdadeiras e impor- mente formulado. O que ele pressupõe,como observou corretam~~te Bottomore ( 1966}, é que
tantes": "Muitos dos nossos críticos revisionistas acreditam", disseKautsky, "ter Marx aÍJF• houve um passado glorioso no qual a classe trabalhadora er~ ~ihtante. A ~las~e t~abalhadora
mado qu! o de~volvimento econômico e a luta de classes criam nio apenas as condições para simplesmente não estava organizada como classe ~ essa ausenc~ de orgaruzaçao, Juntamente
! produ~ socialista mas também, e diretamente, a colUdlnclt, da suanecessidade •.. Isto nfo com uma postura repressiva por parte da burguesia, gerou ocasiões em que os tr_ab~hador~s
e_verdadeuo, em ~b3?luto. Certamente o socialismo, como doutrina, tem suas raízes nos reta-- foram forçados a apelar para atos de heroísmo em defesa deses~rada da _s'"! propna subsis-
ct0nament~s ~onucos modernos, da mesma forma que a luta de classesdo proletariado que, tência. Ao longo da história a classe trabalhadora se _tornou orga~ada, princ1~~ente sob a
c~o o pnmeuo, .et'!'er&eda luta contra a pobreza e a miséria das massascriadas pelo capi- forma de sindicatos e partidos. As barganhas coletivas e as _eleiçoes_compe~tívas t~m~
talismo. Maso socialismo e a luta de classesSIJ.rlemlado a lado e não como decorrência umada desnecessários tais atos de sacrifício. Os trabalhadores organizados nao precisam mais erigir
outra :- cada um deles surge sob condições diferentes. A consciência socialista moderna só pode barricadas cada vez que o capitalismo sofre uma crise econômica, mas esse fato tem pouca
~ a base de um conhecimento científico profundo ••. O veículo da ciência não é o prole- iniplicação na sua "militância". A história da classe trabalhadora nas sociedades ~api_!alls1:_:t5
or~
~~asa lntelligennla bWflUe,a:o socialismo moderno originou-se na mente de membros desenvolvidas é a história da organizaçãono único terreno no qual tal orgaruzaçao nao foi
!'1dividuaisdessa camada e foram eles que o comunicaram aos proletários mais desenvolvidos totalmente reprimida e, em que ela é: ao mesmo ~mpo, e!etiva.~e ~a_fo".!1~. o terreno
intelectualmente, os quais, por sua vez, introduziram-no na luta da classeproletária como algo e
das instituições burguesas. uma historia de orgaruzação, nao de desradicalizaçao .
de fora e não algo que tenha surgido de dentro, espontaneamente".
12. Esta parece ser a implicação da opinião de Lukács (1971), na qual o partido se toma a medição
7 organizacional entre a consciência "potencial" e "atual", onde a primeira constitui a aproxi-
• O caráter ideológico da ciência social decorre não da inabilidade de cientistas .,.,.; ;º in·di ·d ·
em disti-.,. ,., ,.. d "·· ~- 6
vt uais mação mais estreita da verdade "universal" objetiva que é possível num _dad_?momento do
. ... ...... os La~s os ..alores", de formar proposições "isentas de valor" sobre a desenvolvimento histórico. Veja também Colletti (1971: 91) e a caractenzaçao adequada de
realidade social. A propria formulação do problema da objetividade do conhecimento em Picoone do marxismo hegeliano no qual "a validade his~rica da perspectiva, proletáf!a _é
termos da capacidade indivi~~ de ~tinguir os fato$ dos valores, é ela mesma ideológi~: é romente um resultadodo ,eu prop61ito objetivo de universahdade genuína, atraves da abohçao
raa
u~ _formulação inlanente a ~ologia bwguesa, individualista e a-histórica, que percebe a

id n~
co~o um produto de SUJ«:_1~co~ntados com uma realidade que é um datum, é dada.
uma ~ .compe'!nCJa técnica para separar valores e fatos. A ciência social é
total das classes e, conseqüuentemente, da realização de uma sociedade de sujeitos". (1975:
156).
eol 1;1ca po~ue e 1manente as relações sociais que examina: o processo de produção do 13. Como diz Kuhn (1970) em seu influente livro. A popularidade desta opinião parece devida, até
co~~nto e co~tantemente moldado pelo próprio objeto do conhecimento. As rdações certo ponto ao fato de estar a meio caminho entre Schlick e Lenin: a ciência é um processo
so~ que ~o o obJeto da cognição constituem ao mesmo tempo as relações sociais sob as social, mas :'social"significa fechado numa academia, onde o discurso é formulado em termos
qllalS a cognição ocorre. Os cientistas sociais são participantes das lutas ideológicas. A ciência de verdades lógicas.

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Dahrendorf, Ralf. Clasi and Citai Con/ltct ln IndustrialSociety. Stanford, Stanford University Press,
14. Na Introdução de 1895 às AI Lut111de Cla#e 1111França, Engels destaca os sucessos eleitora.is do
PSD alemio predizendo a vitória da classe trabalhadora através dos meios eleitorais. Sua predi- 1959.
ção, todavia, estava condicionada à "conquista da maior parte da camada média da sociedade, Dahrendorf, Ralf. "Recent Chan&,8sin the Class Structure of European Societies". DotJdolus,n. 93,
da pequena bwguesia e dos pequenos camponeses" (1960: 23). Já em 1886 Engels escrevia a
um amigo norte-americano que "um ou dois milhões de votos ... a favor de um partido dos 1964, pp. 244-252.
trabalhadores atuando de boa fé, são na verdade infinitamente mais valiosos do que cem mil
votos obtidos por uma plataforma que represente uma doutrina perfeita" (Engels a Vwme- Engels, Frederick. "Sociallsm: Utopian and Sclentific". ln L. S. Feuer, (ed.), Marx and Ellgels.
vetsky, 28 de dezembro de 1886). Garden City, Ooubleday, 1959.

15. Todos nós sabemos que Ricardo "esqueceu de salientar .... o crescimento constante das classes Engels, Frederick. Letter to Vâhnevenky, 2 December, 1886.
médias, que estão no meio entre os trabalhadores de um lado e os capitalistas e os proprietários
de terra de outro e que sio sustentadas, na sua maior parte, pela renda, representando um carga Frolich, Paul. Advertencia a Rota Lwtemburg, Huelga de MalaS, Partido y Sindicato,. Cordoba,
para a camada trabalhadora mas aumentando a segurança social e o poder dos dez mil que estão Pasado y Presente, 1970.
acima" (Marx,em Teorial da Mail-Valia; citado por Nicolaus - 1967: 45; Urry, 1973: 176;
Gough, 1972: 70). Mas a elevação dessa única citação à •iei da classe do excedente'' como Gough, lan. "Marx's Theory of Productive und Unproductive Labour". New Left Review. n. 76,
Nicolaus intitula esta tese, não tem base na teoria do capitalismo de Marx. Na verdade esta 1972, pp. 47-72.
aflnnação é logicamente inconsistente com a teoria proposta em O Capital. '
Gramsci, Antonio. Prllon Notebook1. New York, lnternational Publishers, 1971.
16. Kautsky (1971: 85). viu uma horda sempre crescente de "parasitas sociais os quais, vendo
fechados diante de SI todos os caminhos do trabalho produtivo, tentam conservar a sua exis- K.autsky, Karl. TheClas1Sm,ggle. New York, W. W.Norton, 1971.
tfncia miserával através de uma grande variedade de ocupaçaes, a 1'lllioria dai quail , inteira-
mente tupérflua e algumas até prejudiciais à sociedade - tais como revendedores, proprietários Kuhn, Thomas. The SITUcture of Scientiflc Revolutions. Chicago, University of Chicago Press, 2nd
de bares, aJl8ntes, intermediários". edition, 1970.

17. Esta é uma das razões por que temos tais problemas ao pensar sobre a posiçio de classe das Lenin;
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donas de casa, estudantes e outras pessoasque não são economicamente ativas.
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