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Apresentação
Às vezes, temos dificuldades de compreender o mundo medieval como uma fusão de culturas, já
que em um primeiro momento pode-se acreditar que a chegada dos povos germânicos destruiu
não só a organização imperial romana, mas também sua cultura e identidade. Veremos que não
foi bem assim.
Nesta aula, abordaremos a formação deste mundo por meio do estudo de três pensadores do
período: Boécio, Cassiodoro e Isidoro de Sevilha. Esses autores mostram como a formação da
cultura medieval ocorre com uma fusão entre o conhecimento e a Filosofia antiga e a produção
de uma doutrina cristã no contexto de formação dos reinos germânicos do ocidente medieval.
Objetivos
Examinar o período de formação dos reinos germânicos e a construção de uma cultura
medieval na Alta Idade Média;
Identificar os episódios fundamentais da vida de três pensadores do período - Boécio,
Cassiodoro e Isidoro de Sevilha;
Reconhecer os principais temas abordados pelos três pensadores.
A formação do mundo medieval
Na aula anterior, estudamos a chegada dos povos germânicos na Europa e como se
estabeleceram no interior do Império romano.
Esses povos conviveram algum tempo com a cultura romana no chamado limes, isto é, a
zona de fronteira. Quando deixaram de ser nômades, passaram a praticar a agricultura e,
em certos casos, comercializar com os romanos.
Embora existissem conflitos, a convivência, em alguns casos, foi pacífica e marcada pelas
trocas comerciais e culturais. A participação dos germanos como soldados do exército
romano não foi algo raro.
Os povos germânicos adentraram o Império em virtude da pressão sofrida por eles com a
chegada dos povos Hunos 1. Os Ostrogodos pediram para entrar no Império, assustados
com o poderio dos Hunos, que vinham pressionando com muito vigor em direção ao
ocidente.
Em 410, ocorreu o saque a Roma, por Alarico, que havia servido como soldado do
Império romano sob o reinado de Teodósio I. Após o falecimento deste, o Império se
dividiu entre seus filhos, Arcádio, no Império Romano do Oriente, e Honório, na banda
ocidental.
Diante do exército de Godos, Alarico fez algumas negociações com o Imperador Honório,
estabelecido em Ravena, mas a situação se precipitou e, depois de um cerco, entrou em
Roma em agosto de 410.
Pela primeira vez em séculos a cidade foi invadida por um exército visigodo, que saqueou
a cidade. Após a morte de Alarico, os Visigodos se retiraram da Itália, e se estabeleceram
na Península Ibérica.
Desde 429-39, os Vândalos instalaram-se no norte da África, com o estatuto de povos
federados, conforme vimos na aula passada. Na época, Santo Agostinho vivia na região e
vivenciou a invasão.
A data de 476 é utilizada como um marco, quando o jovem imperador Rômulo Augusto
foi destituído do poder pelo rei Odoacro 3.
Boécio
Anício Mânlio Torquato Severino Boécio nasceu em Roma, em torno do ano 480, em uma
família patrícia , que contava entre seus antepassados um imperador, senadores e,
possivelmente do lado materno, mais de um papa. Era uma família cristã e seu pai foi
nomeado cônsul pouco antes do falecimento.
Boécio estudou Filosofia em Atenas ou Alexandria, talvez nas duas e sabia bem o grego.
Tornou-se cônsul e, mais tarde, magister officium (mestre de ofícios) do imperador
Teodorico, por volta do ano 510. O rei godo tentou levar adiante um projeto de
convivência pacífica entre germanos arianos e latinos de fé católica, que não foi bem-
sucedido.
Apesar de possuir alguma influência na corte, Boécio, em 523, caiu em desgraça e foi
condenado à prisão e execução.
É possível que a condenação tenha sido por causa de sua defesa do senador Albino,
acusado de conspirar junto ao imperador Justino de Bizâncio. Ao defender Albino, Boécio
foi também considerado conspirador junto à corte de Justino, em Constantinopla e, desse
modo, foi enviado para a prisão onde aguardou a execução por ordem do rei.
Na prisão, compôs uma das obras primas da Filosofia e literatura latina, a Consolação da
Filosofia, em cinco livros de prosas e poemas alternados.
Primeiro livro
Relata sua condição de imensa tristeza e revolta com o infortúnio que se abateu
sobre sua vida. Neste momento recebe a visita de uma dama, a Filosofia, que, ao
materializar-se diante dele, mostra ao prisioneiro o que ele havia esquecido, a
verdadeira natureza humana e o fim último dos homens “(...) mal dirigi o olhar a
ela, reconheci minha antiga nutriz, que desde a adolescência frequentava a minha
mente: era a Filosofia”.
Segundo livro
Terceiro livro
Quarto livro
Quinto livro
De modo geral, podemos observar que esta tradição neoplatônica identifica o homem
com sua lama e considera o corpo uma vestimenta transitória e desnecessária, um
instrumento a serviço da alma e exterior a ela ou até mesmo uma prisão eu entrava o
livre desenvolvimento do espírito.
É interessante observar que Boécio foi lido durante a Idade Média como uma suma de
ideias originais, já que suas fontes haviam se perdido com os séculos.
Observa-se que, embora seja possível vislumbrar como ele cristianiza elementos da
Filosofia antiga, não chega a citar explicitamente sua adesão ao cristianismo e se refere
ao longo das obras ao Criador genérico e nunca diretamente do Deus cristão.
Possivelmente, Boécio estivesse distinguido a Filosofia da Teologia, precedendo os
grandes pensadores medievais.
Boécio ainda fez uma distinção entre a Fortuna e a Providência. Existiria uma regra
universal que presidiria o desenvolvimento de todos os acontecimentos, denominada
Providência, considerada do ponto de vista divino. Já a Fortuna atuaria sobre as criaturas
submetidas ao tempo, do terreno.
Cassiodoro
Nascido Flávio Magno Aurélio Cassiodoro, era romano de origem Síria, nasceu na
Calabria 4, entre os anos 485 e 490.
É possível que seu pai tenha sido governador da província romana da Sicília, também ao
sul da península. Iniciou sua carreira ao lado do pai e, em virtude de seus estudos
jurídicos, entrou para a corte do rei Teodorico, sendo nomeado posteriormente cônsul ou
mesmo conselheiro do rei.
Mestre
Em 523, assumiu o posto de magister officium (mestre de ofícios) no lugar de Boécio.
Cassiodoro permaneceu no posto até o fim do reinado de Teodorico, chegando a trabalhar
para o sucessor, Alarico. Chegou ao posto de prefeito pretoriano, uma espécie de
primeiro ministro do reino Ostrogodo.
Mudança
Se mudou para Constantinopla, sede do Império romano do Oriente. Viveu ali vários anos
dedicado ao estudo dos temas religiosos, buscando resgatar e manter viva uma cultura
antiga, grega e latina, que com o passar do tempo se via cada dia mais distante.
Retorno
Ao retornar ao ocidente, em 555, Cassiodoro fundou um mosteiro dedicado a São
Martinho, transformado em centro de estudos. A biblioteca seria uma referência para a
preservação de textos antigos.
Preservação da cultura
Em Vivarium, junto com seus colaboradores, se dedicou à atividade de copiar e traduzir
obras gregas e latinas antigas, e a escrever novas obras latinas cristãs.
Cassiodoro representa um homem de seu tempo: buscou preservar a cultura antiga que
foi ficando distante no tempo; produziu na doutrina cristã que criava raízes pela Europa.
O mosteiro fundado por Cassiodoro precedeu a função dos mosteiros, ao longo da Idade
Média, de preservar a cultura e estabelecer as bases para a difusão do Cristianismo.
Primeiro livro
Resumos e anotações sobre os livros de Vivarium, divididos entre aqueles os de
cunho pessoal e os em grego, organizados em um cômodo separado.
Segundo livro
Mais difundido ao longo da Idade Média e contém uma compilação das chamadas
artes liberais.
Isidoro de Sevilha
Isidoro de Sevilha (Fonte: Santos Sanctorum
<http://santossanctorum.blogspot.com.br/2012/04/santo-
isidoro-de-sevilha-bispo-e-doutor.html> ).
É interessante observar que, enquanto os outros dois autores estudados até aqui viveram
no contexto da corte do rei godo Teodorico, na Península Itálica, o terceiro autor viveu e
atuou no reino visigodo na Península Ibérica.
Após o falecimento de seus pais, o irmão mais velho, Leandro de Sevilha – que se tornou
abade e bispo da cidade enquanto Isidoro era ainda um adolescente – se encarregou da
educação do irmão menor.
Esta relação apresenta algumas incertezas, como o fato de não sabermos exatamente se
Isidoro recebeu suas primeiras lições escolares em um ambiente monástico – hipótese
possível de ter acontecido quando Leandro era abade do mosteiro de Sevilha –, ou se sua
formação ocorreu inteiramente na escola episcopal de Sevilha.
Uma habilitação importante promovida pelas escolas episcopais era a dedicação, além da
pauta religiosa, ao ensino científico representado pelo “Trivium” e “Quadrivium”.
O resultado da influência de uma educação tão prestigiosa pode ser sentida na múltipla e
diversificada expressão que a produção literária de Isidoro assumiu, com os temas de
história, teologia, física, medicina, ciências, moral, entre outras.
Isidoro foi especialmente influente na corte de Sisebuto, rei da Hispânia visigótica. Atuou
junto com seu irmão Leandro, e após a morte deste, na conversão e difusão do
Cristianismo.
A comunidade para Isidoro ultrapassava o simples fato de ser um local que propiciava
uma vida de renúncias aos que nele residiam. Possuía o simbolismo de reprodução dos
ares vividos pela comunidade apostólica, e suas características principais seriam
idealizadas para imitação. Sob a influência desse pensamento, o hispalense advertia que
a cidade deveria ficar bem afastada para que os monges não fossem tentados por
situações que lhes pusessem em perigo.
Após a morte de seu irmão Leandro no ano de 600 (algumas fontes defendem o ano de
601) Isidoro o sucedeu como Bispo de Sevilha. Dedicou boa parte de sua vida a combater
a heresia do Arianismo 5 praticada pelos Visigodos.
Isidoro escreveu as Etimologias (ou Origens como também ficou conhecida a obra),
buscando compilar todo o conhecimento existente até aquele momento. Uma obra
imensa com 20 volumes em que compilour ou resenhou manuais e compêndios da
Antiguidade clássica. Foi bastante popular ao longo da Idade Média, considerado por
muitos o resumo de tudo o que seria necessário saber. Essa obra foi responsável por
preservar e transmitir boa parte do conhecimento antigo ao longo dos séculos medievais.
Considerações finais
Viveram e foram partícipes do processo de gestação do mundo medieval e daquilo que foi
considerado conhecimento durante a Idade Média, posto que era preciso constar nos
manuais e compêndios do âmbito cristão para poder entrar no rol do conhecimento
medieval.
Atividade
1. Relacione a formação do reino de Teodorico e a atuação de Boécio e Cassiodoro."
Tribos nômades ou seminômades que se deslocaram para a Europa desde a Ásia central,
possivelmente em virtude de mudanças climáticas que dificultaram sua sobrevivência por lá.
2
Teodorico
Foi um rei Ostrogodo que se estabeleceu na Península Itálica e governou a região a partir de
493. Os Ostrogodos haviam se livrado da dominação dos Hunos e fizeram um acordo com o
Império romano em Constantinopla, onde chegou a viver durante algum tempo. Após longos
conflitos matou Odoacro, rei na Itália. Segundo a lenda, após guerrearem por muito tempo, os
dois reis decidiram fazer um tratado de paz e para celebrar a ocasião fizeram um banquete onde
Teodorico assassinou Odoacro. Esta lenda foi narrada por um cronista anônimo e não dispomos
de outras fontes para confirmar a versão. Seja como for, Teodorico assumiu como rei na
Península Itálica, embora oficialmente estivesse submetido ao Imperador em Constantinopla.
Teve profundo respeito pela cultura romana, exercendo um governo de fusão entre a herança
latina e a cultura germânica.
3
Odoacro
Ao conquistar Roma foi considerado o primeiro rei da península itálica após a desagregação do
Império Romano do Ocidente.
4
Calabria
5
Arianismo
Doutrina cristã fundada por Ário, no Oriente, à qual boa parte dos povos germânicos havia se
convertido antes de se assentar permanentemente no interior do império.
Referências
BASCHET, Jerôme. A civilização feudal: Do ano mil à colonização da América, São Paulo:
Globo, 2006.
BOÉCIO. A Consolação da Filosofia. Trad. do latim por Willian Li. São Paulo: Martins Fontes,
1998.
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