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Tribunal de Justiça do Ceará TJ-CE


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ESTADO DO CEARÁ

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

GAB. DA DESA. LÍGIA ANDRADE DE ALENCAR MAGALHÃES

Processo: 0000084-14.2010.8.06.0032 - Apelação

Apelante: Antonio Teixeira Nicolau

Apelado: Ministério Público do Estado do Ceará

EMENTA: APELAÇÃO. PENAL E PROCESSUAL PENAL. ESTUPRO DE

VULNERÁVEL. CONDENAÇÃO. PLEITO PELA DESCONSIDERAÇÃO DA

CONTINUIDADE DELITIVA. IMPOSSIBILIDADE. CIRCUNSTÂNCIA


DEVIDAMENTE COMPROVADA NOS AUTOS. PALAVRA DA VÍTIMA.
RELEVÂNCIA. HARMONIA

COM OS DEMAIS ELEMENTOS DE PROVA. APLICAÇÃO DA CAUSA DE


AUMENTO DO ARTIGO 71 DO CÓDIGO PENAL NO MÍNIMO LEGAL.
POSSIBILIDADE.

INEXISTÊNCIA DE MOTIVAÇÃO PARA MAJORAÇÃO DA PENA QUASE NO

MÁXIMO PERMITIDO. REDIMENSIONAMENTO DA REPRIMENDA.


PEDIDO PARA RECORRER EM LIBERDADE. INVIABILIDADE. APELANTE
QUE JÁ EMPREENDEU FUGA DA CADEIA LOCAL. SEGREGAÇÃO
CAUTELAR NECESSÁRIA PARA
GARANTIA DA APLICAÇÃO DA LEI PENAL. RECURSO CONHECIDO E

PARCIALMENTE PROVIDO.

1. Estando devidamente comprovado nos autos a incidência da


continuidade delitiva no

enredo do crime em tela, eis que, segundo o verossímil relato da vítima,


os abusos por parte

do recorrente aconteceram diversas vezes no decorrer de, pelo menos, 1


(um) ano, razão não

há para desconsiderar a ocorrência de tal circunstância.

2. Em sede de crimes sexuais, via de regra cometidos longe dos olhares


de outras pessoas, a palavra da vítima ganha maior relevância,
principalmente em situações como a do caso em

tela, que se mostrou em completa harmonia com outros elementos de


prova.

3. Tendo em vista que não foi, na sentença condenatória, consignada


qualquer justi cativa

ou fundamentação para majoração da pena do apelante, no que tange à


continuidade delitiva, em 1/2 (um meio), quase o máximo permitido, e
que não restou demonstrado nos autos um

número especí co de vezes que os abusos sexuais ocorreram em


desfavor da vítima, deve a

causa de aumento relativa ao artigo 71 do Código Penal ser reduzida ao


mínimo legal (1/6).

4. Redimensionamento da reprimenda do recorrente. Pena reduzida de


12 (doze) anos de

reclusão, em regime inicial fechado, para 9 (nove) anos e 4 (quatro)


anos de reclusão, em

regime inicial fechado.

5. Levando em conta que o recorrente já fugiu da cadeia pública local,


d i d
ano foragido, considera-se a negativa do direito de recorrer em
liberdade acertada, já que a

soltura do mesmo implicaria num tenebroso risco de inaplicação da lei


penal.

6. Recurso conhecido e parcialmente provido.

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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA

GAB. DA DESA. LÍGIA ANDRADE DE ALENCAR MAGALHÃES

Fortaleza, 30 de maio de 2017.

DESA. LÍGIA ANDRADE DE ALENCAR MAGALHÃES

Relatora

RELATÓRIO

Trata-se de Recurso de Apelação interposto por ANTÔNIO TEIXEIRA


NICOLAU em face da sentença de s. 147/152, que o condenou, pela
prática da conduta tipi cada no artigo 217-A c/c artigo 71, ambos do
Código Penal, à pena de nitiva de 12 (doze) anos de reclusão, a ser
cumprida inicialmente em regime fechado.

Em estreita síntese, narram os autos que o apelante teria praticado o


crime de estupro de vulnerável em desfavor de uma menor de 14
(quatorze) anos de idade, mais precisamente a infante A. P. dos S., que
tinha por volta de 10 (dez) anos à época dos fatos.

Narra a acusação ( s. 2/4) que o recorrente, no dia 09.02.2010, por


volta das 14h00min, praticou ato libidinoso distinto da conjunção
carnal com a vítima, oportunidade na qual teria pegue a mesma na
escola, levado para um matagal e, nesse contexto, praticado relação
sexual anal com a impúbere. Ouvida, a menor aduziu que o acusado já
teria praticado tais atos noutras ocasiões, desde a época em que a
mesma tinha 9 (nove) anos de idade.

Depois de regularmente processado, o acusado, ora apelante, restou


liberdade negado pelo juízo de piso.

Inconformada com a sentença condenatória supracitada, a defesa


apresentou as razões de apelação que dormitam às s. 159/162, meio
pelo qual rogou pela desconsideração da continuidade delitiva (artigo
71 do Código Penal) e, outrossim, pela aplicação da causa de aumento
correlata no mínimo legal. Ademais, pugnou o recorrente pela
concessão do direito

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de recorrer em liberdade.

Em sede de contrarrazões, o Ministério Público de origem requereu o


improvimento total do recurso, para que fosse mantida incólume a
sentença do juiz a quo ( s. 167/169).

Subiram os autos.

Instada a se manifestar, a Procuradoria Geral de Justiça, da mesma


forma, opinou pela negativa de provimento da apelação, vide parecer de
s. 210/217.

É o relatório.

VOTO

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do presente


recurso.

Conforme relatado, trata-se de recurso de apelação em que o recorrente


objetiva, inicialmente, o não reconhecimento do crime continuado no
caso em tela, alegando, nessa senda, que tal situação não teria cado
devidamente comprovada nos autos. Outrossim, caso não acatada tal
tese, pugna pela aplicação da causa de aumento no mínimo legal, qual
seja, 1/6 (um sexto).

Ademais, invocando os bons antecedentes do recorrente, a defesa


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de forma mais do que su ciente nos autos, notadamente porque a


vítima narrou, de modo rme e coerente, como se deram os fatos,
ressaltando e especi cando que os abusos ocorriam à determinado
tempo, qual seja, desde janeiro de 2009, época em que a mesma tinha
tão somente 9 (nove) anos de idade.

Nesse contexto, veri co , tal qual o juízo de piso, que o verossímil


relato da vítima , o qual, conforme já expressado na sentença, recebeu
adequado respaldo de outras provas , foi contundente ao demonstrar a
continuidade delitiva do crime de estupro de vulnerável.

Muito embora, é verdade, não tenha sido indicado os dias especí cos
dos atos, algo, inclusive, difícil para uma criança de tão tenra idade, não
se pode negar a veracidade do teor das suas declarações e, por
conseguinte, da ocorrência de mais de um delito de estupro perpetrado
em semelhantes condições de tempo, lugar e modus operandi.

Vejamos, então, como o juízo de 1º grau sintetizou o relato da vítima no


seu decisum ( . 212):

A vítima Ana Paloma narrou em juízo, com riqueza de detalhes, toda a


dinâmica dos fatos, dizendo que estava indo para a escola com a colega
Alana quando o réu apareceu de bicicleta e a levou para um matagal,
onde a estuprou. Acrescentou, ainda, que não foi a primeira vez que isto
aconteceu, que ele a levava para outros lugares, colocava na frente e
atrás e fazia quase todo dia, tendo começado a fazer isso quando ela
ainda tinha nove anos de idade.

Ao prestar declarações na seara policial ( s. 29/30), a vítima foi mais


especí ca quanto aos atos e à época em que se desenvolveram os
abusos sexuais, oportunidade na qual frisou que "sempre que ANTÔNIO
tinha oportunidade passou a abusar sexual da vítima reinquirida –
tanto por sua frente como por seu bum-bum" e que, nas primeiras
vezes dos atos sexuais, a mesma sagrava muito e sentia muitas dores.
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tranquilidade do seu relato conferem uma boa dosagem de veracidade


às suas declarações, tendo em vista que não se pode desconsiderar, para
elucidação das circunstâncias do crime ora debatido, a relevância de
relato tão rme, preciso e coerente, que em nada se assemelha a algo
inventado, quiçá mais por uma criança de tão tenra idade.

Nesse ínterim, levando em conta a já consolidada condenação do


recorrente pela prática do crime de estupro de vulnerável, algo que só
se mostrou possível em virtude da palavra da vítima ter tido sua
relevância adequadamente mensurada, razão não há para, no ponto
especí co da continuidade delitiva, desacreditar no relato da menor.

Ora, se a essência das declarações da vítima, corroborada que foi, é


claro, pelo restante da prova produzida, se mostrou su ciente para
promover a condenação do acusado, por qual motivo a mesma não
serviria para demonstrar a incidência do crime continuado na espécie?

A harmonia do relato da ofendida com os demais elementos de prova


acaba por criar uma situação que permite a rmar, com a segurança que
o caso requer, que a sua palavra, como um todo, é verdadeira e que, por
conseguinte, os estupros foram, de fato, praticados por mais de uma
vez, em continuidade delitiva.

Outrossim, não se mostra razoável acreditar que a vítima, sem qualquer


motivo aparente, iria inventar história tão elaborada, com claras
especi cações de épocas e atitudes, de modo a impor ao recorrente uma
situação processual mais gravosa.

Mostra-se inviável , portanto, falar em fragilidade de provas quando o


enredo probatório , capitaneado pelo relato da vítima, converge de
forma incisiva para a con guração do crime continuado na hipótese
dos autos.

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pessoas, a palavra da vítima ganha maior relevância, principalmente


em situações como a do

caso em tela, em que a mesma se mostrou em completa harmonia com


outros elementos de

prova.

Diante disso, explicito entendimento da jurisprudência pátria, inclusive


do

Superior Tribunal de Justiça, que indica que a palavra da vítima, quando


rme e coerente, é

elemento de convicção de alta importância em crimes do gênero,


máxime quando é balizado

por outros elementos de prova, tal qual o presente caso:

HABEAS CORPUS. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. EXAME DE CORPO


DE DELITO.ART. 158 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
DESNECESSIDADE QUANDO PRESENTES PROVAS OUTRAS NOS AUTOS.
DEPOIMENTO DA VÍTIMA. PRECEDENTES DO STJ E STF. ALEGADA
NULIDADE INEXISTENTE. 1. Se mostra prescindível a perícia - exame
de corpo de delito -para os crimes de estupro ou atentado violento ao
pudor que, por vezes, não deixam vestígios, máxime havendo no...

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