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DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA


SISTEMAS ESPACIAIS DE POSICIONAMENTO E NAVEGAÇÃO
MESTRADO EM ENGENHARIA GEOGRÁFICA
MENOR EM CIÊNCIAS DO ESPAÇO
2o SEMESTRE DO ANO LECTIVO DE 2009/2010

20ª AULA (27/4/2010)


Sumário
Navegação por satélite. O sistema GPS
Descrição do movimento orbital dos satélites.
Sistema de coordenadas de um satélite no seu plano orbital.
Elementos de Kepler.
Relação entre as coordenadas orbitais, celestes e terrestes.
Bibliografia: GPS Satellite Surveying, Alfred Leick, Chapter 2, 1990.
Guide to GPS Positioning, David Wells, 1987

Navegação por satélite. O sistema GPS


Descrição do movimento orbital dos satélites

A constelação GPS compõe-se de 6 planos orbitais,


igualmente espaçados, com 4 satélites cada um.
O período de revolução de cada satélite é de
aproximadamente 12 horas.
Cada plano tem uma inclinação de 55º em relação ao
equador.

Suponhamos que os satélites se movem em órbitas normais. Para tal, supomos o


seguinte:
- Cada satélite move-se num plano orbital fixo no espaço;
- A órbita do satélite no plano orbital é uma elipse;
- Um dos focos da elipse orbital está no centro da Terra.

As condições que conduzem a um tal movimento orbital simples são as seguintes:


1. A Terra é tratada como um ponto de massa M, ou equivalentemente, como
uma esfera de densidade constante. O campo gravitacional de um tal corpo é simétrico,
no qual as linhas de força são rectas que passam pelo centro da Terra.
2. A massa do satélite é desprezável, comparada com a massa da Terra.
3. O movimento do satélite tem lugar no vácuo, ou seja, não há pressão
atmosférica a actuar no satélite nem há radiação solar.
4. Ignora-se a existência do Sol, da Lua, e de qualquer outro corpo a exercer
atracção gravitacional no satélite.
Nestas condições, o satélite fica sujeito à acção de uma única força central, e o seu
movimento fica totalmente determinado pelos seis elementos de Kepler.

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Movimento orbital normal

Os satélites artificiais da Terra estão sujeitos à força de atracção gravitacional da Terra,


que é uma força de atracção newtoniana. Chamamos movimento orbital normal ao
movimento do satélite, suposto sujeito exclusivamente à acção desta força.

Chama-se força de atracção newtoniana a uma força atractiva exercida por um


centro fixo O e cuja grandeza é inversamente proporcional ao quadrado da
distância a esse ponto.
Assim, duas partículas de massas m e M, distando de si r unidades, atraem-se
mutuamente com uma força cuja grandeza é F= k2 Mm/r2, sendo k a constante de
gravitação universal.

Uma partícula sujeita a este campo e sem qualquer velocidade inicial cairia sobre a
Terra, segundo uma recta vertical passando pelo centro da terra e pela partícula. Da
Mecânica Racional sabemos que uma partícula sujeita à acção de uma força newtoniana
descreve uma trajectória que é uma cónica. A cónica descrita depende apenas da
velocidade inicial da partícula, podendo a trajectória ser, conforme o caso, uma elipse,
uma parábola ou uma hipérbole.

A colinearidade entre a aceleração e o vector posicional é característica dos campos


gravitacionais e do movimento central. As órbitas normais (situação optimal, que
aproxima com precisão razoável a realidade do movimento dos satélites) são úteis na
compreensão e visualização do movimento dos satélites, permitindo prever o
movimento para pequenos períodos de tempo, desde que não seja necessária uma
grande precisão.
Na realidade, satélites de grande altitude têm um movimento muito próximo do
movimento central, estando praticamente apenas sujeitos à acção da força de gravidade.
O mesmo não acontece com satélites de baixa altitude, que “sentem” mais as
irregularidades do campo gravítico da Terra.

O movimento normal dos satélites, sendo um movimento apenas sujeito a uma força
central, é completamente determinado pela lei da gravitação de Newton:

F = k2 Mm/r2.

Nesta fórmula, M e m denotam respectivamente as massas da Terra e do satélite, k é a


constante de gravitação universal, r é a distância geocêntrica do satélite, F é a força
gravitacional entre os dois corpos.
Esta força verifica assim a equação F=ma, sendo a a aceleração sofrida pelo satélite.

Sendo o movimento normal do satélite um movimento central, são válidas as três leis
de Kepler:
1. O movimento do satélite descreve uma elipse sendo um dos focos o ponto F, o
centro da terra.
2. o vector geocêntrico r descreve áreas iguais em tempos iguais.
3. o quadrado do período de revolução do satélite é directamente proporcional ao
cubo do semi-eixo maior da sua órbita.

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Descrição do movimento orbital dos satélites.

1. Sistema de coordenadas de um satélite no seu plano orbital

A trajectória do satélite é uma elipse de semi-eixos


a e b e excentricidade e.

A excentricidade de uma elipse


Defina-se distância focal da elipse por 2c.
Então c2 = a2 – b2 (prove).
Defina-se excentricidade da elipse por e = c/a.
Então b2 = a2 (1-e2) (prove).
Note-se que quando
• e = 0, a elipse é uma circunferência, obtendo-se a = b;
• e = 1, a elipse torna-se degenerada, pois obtém-se b=0.

Na figura, a elipse está ainda inscrita numa circunferência de raio a.


Os eixos principais da elipse formam um sistema de coordenadas (ξ,η).
O satélite está na posição S. A linha SS’ pertence ao plano orbital e é paralela ao eixo
dos η’s.
O sistema de coordenadas (q1, q2) pertence ao plano orbital, tendo a origem no foco F da
elipse que coincide com o centro da Terra. O terceiro eixo, q3 (não representado na
figura), completa o sistema de coordenadas directo.
A distância geocêntrica do satélite ao centro da Terra é r.
Os dois pontos da órbita respectivamente mais próximo e mais afastado do foco F são o
perigeu e o apogeu.
A anomalia verdadeira é f e a anomalia excêntrica é E (ambas medidas no sentido
directo).

A equação desta elipse no plano orbital e escrita nas coordenadas (ξ,η) é


ξ2/a2 + η2/b2 =1,
onde
ξ = ae + r cos f
η = r sin f
b2 = a2 (1-e2).

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2. O plano orbital do satélite em relação ao sistema de coordenadas celestial

O centro da esfera de direcções está no ponto focal F.


O eixo dos xx aponta para o equinócio vernal (ponto de Aries), o eixo dos zz aponta para o pólo
celeste, o eixo dos yy está sobre o plano do equador, completando o sistema de coordenadas
directo. A intersecção do plano orbital com o equador diz-se linha dos nodos. O ponto sobre
esta linha no qual o satélite sobe acima do equador diz-se nodo ascendente.

A ascensão recta do nodo ascendente denota-se por Ω, que toma valores no intervalo
[0,360º[. A linha dos ápsides liga o foco F com o perigeu. O ângulo entre a linha dos
nodos e a linha dos ápsides chama-se argumento do perigeu ω. O ângulo ω é portanto
medido no plano orbital, do nodo ascendente ao perigeu, no sentido do movimento
orbital. A anomalia verdadeira f e o argumento do perigeu ω medem-se sobre o plano
orbital. O ângulo entre o plano do equador e o plano orbital é a inclinação i, que toma
valores no intervalo [0, 180º[.

Notemos que
O par (Ω, i) determina a posição do plano orbital no sistema celeste.
Os valores (Ω, ω, i) posicionam a elipse no espaço.
Os valores (a, e, f) determinam a posição do satélite dentro do plano orbital.

Os seis elementos de Kepler são {Ω, ω, i, a, e, f}, também chamados parâmetros


orbitais ou elementos orbitais.

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a Semi-eixo-maior Definem o tamanho e


e Excentricidade formato da elipse
f anomalia verdadeira Define a posição no
plano orbital
Ω ascensão recta do nodo ascendente Ângulos de rotação
i inclinação que
ω argumento do perigeu definem o plano orbital

A anomalia verdadeira f é o único elemento de Kepler que é função do tempo, no caso


de órbitas normais. Os restantes 5 elementos de Kepler são constantes.
Na realidade, para os satélites da constelação GPS, que não estão sujeitos às condições
óptimas das órbitas normais, todos os elementos de Kepler são funções do tempo.
São nesse caso chamados elementos de Kepler osculadores.

Quando o movimento é circular, os elementos de Kepler não são adequados para


descrever o movimento, já que a excentricidade e = 0 e os ângulos ω e f não têm
significado.

Por vezes, em vez de descrevermos o movimento do satélite através dos elementos de


Kepler {Ω, ω, i, a, e, f}, utilizam-se o vector posição r = (x, y, z) e o vector velocidade,
descritos no sistema de coordenadas celestiais x, y, z. Para isso, faz-se a mudança de
coordenadas correspondente às rotações sofridas pelo sistema de coordenadas q, até
chegar ao vector posicional r.

Relação entre as coordenadas orbitais, celestes e terrestes

No parágrafo anterior, a descrição da posição do satélite conta com dois sistemas de


referência: o referencial celeste equatorial x,y,z (instantâneo) e o sistema orbital q1,q2,q3
(que acompanha o plano orbital do satélite).
Veremos agora que é possível fazer coincidir o referencial x,y,z com o referencial
q1,q2,q3, através de três rotações sucessivas.

1ª rotação:
Rotação de um ângulo Ω em torno do eixo dos zz, levando a linha dos equinócios (xx) a
coincidir com a linha dos nodos da órbita. A matriz de rotação associada a esta rotação
é:

2ª rotação:
Rotação de um ângulo i em torno da linha dos nodos da órbita (agora coincidente com o
eixo dos xx), levando o plano do equador a coincidir com o plano orbital.
Consequentemente, o eixo dos zz passa a coincidir com o eixo q3. A matriz de rotação
associada a esta rotação é:

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3ª rotação:
Rotação de um ângulo ω em torno do eixo dos zz, levando a linha dos equinócios (ou
linha do ponto de Aries), agora coincidente com a linha dos nodos, a coincidir com a
linha dos ápsides (eixo q1 orbital). A matriz de rotação associada a esta rotação é:

Deste modo, para passar de um referencial a outro, basta fazer:


[q1 q2 q3] T = R(ω) R(i) R(Ω)[x y z] T
Quanto à operação inversa, e tendo em conta que para matrizes de rotação se tem

[R (θ)]-1= [R (θ)]T = R (-θ),

a transformação é:

[x y z] T = R(- Ω) R(-i) R(-ω) [q1 q2 q3] T

Se agora quisermos determinar as coordenadas cartesianas terrestres convencionais do


satélite, temos que considerar a matriz:

R = RMP R(Θ) R(- Ω) R(-i) R(-ω)

onde RMP é a matriz de rotação que traduz o movimento dos pólos, e R(Θ) representa a
rotação correspondente ao tempo sideral de Greenwich, obtendo:

[x1 y1 z1] T = R [q1 q2 q3] T

onde [x1 y1 z1] T são as coordenadas terrestres convencionais.

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