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Augusta D. Gaspar
Universidade Católica Portuguesa
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Empatia – o conceito
A empatia cognitiva não é observável antes dos 4-7 anos, idade em que algumas, e
apenas algumas, crianças começam a apresentar sucesso nas tarefas de tomada de
perspetiva (como a clássica tarefa das 3 Montanhas de Piaget). Os estudos do cérebro de
crianças validam este período de emergência, mostrando que a maturação neuronal
necessária para essas tarefas é atingida apenas nessa faixa etária (Decety & Svetlova,
2012).
A empatia na adolescência
Desde os estudos mais antigos até aos mais recentes, todos indicam uma progressão no
desenvolvimento da empatia da infância para a adolescência (e.g. Dymond, Hughes &
Raab, 1952; Eisenberg & Mussen, 1989), e até ao ínicio da vida adulta (Gaspar, 2016;
Gaspar, Emauz & Esteves, 2014; Grühn et al., 2008). No entanto, a análise da empatia
enquanto traço individual nas suas várias dimensões - Preocupação Empática,
Desconforto pessoal, Tomada de Perspetiva e Fantasia – baseada em dados obtidos na
população portuguesa através do Interpersonal Reactivity Index (Davis, 1980), bem
como em medidas de reações empáticas (Esteves, Emauz & Gaspar, 2015; Gaspar,
Emauz & Esteves, 2014) revela que este percurso não é inteiramente linear. Com efeito,
apesar de os adultos apresentarem valores, em média, mais elevados de empatia traço,
os adolescentes atingiam maior pontuação na componente Preocupação empática, que
se considera ser a dimensão que melhor traduz a predisposição para a resposta
vicariante. As medidas de empatia emocional (incluindo as medidas implícitas como a
resposta de condutância e a atividade dos músculos da face) dos adolescentes mais
novos (12-13 anos) aumentavam bastante até cerca dos 15-16 anos, atingindo valores
superiores aos apresentados por adultos. A partir dos 16 anos verificava-se uma descida
na empatia emocional que os aproximava mais dos valores dos adultos, o que sugere
que a resposta empática poderá experimentar o seu pico no final da adolescência.
A empatia ao longo da vida adulta
- Nelson Mandela, que partiu da luta armada do ANC pelo fim do Apartheid, para
a tarefa da conciliação de todos os sul-africanos, a bem da segurança e paz entre todos
os grupos étnicos, protegendo também, enquanto presidente, os antigos opressores, e
pagando o preço da impopularidade e da incompreensão vinda de muitos dos que mais
beneficiaram com a sua ação.
- Dian Fossey, que foi, por curiosidade e gosto de aventura, fazer censos dos
gorillas das Montanhas Virunga, num terreno difícil onde ninguém ficava mais do que
dias. Persistindo duas décadas no local, compreendeu, deu a conhecer, como nunca
ninguém antes, os “gentle giants” e, salvou centenas de gorilas, perdendo finalmente a
vida na luta feroz que travou com interesses políticos e caçadores de troféus.
Longevidade e empatia
A terceira idade tem sido reportada como uma das faixas etárias onde mais
frequentemente ocorrem comportamentos de ajuda: voluntariado nas mais diversas
causas (e.g. May & Aligood, 2000), apoio na criação dos netos (Tsai et al, 2011), o
estabelecimento de objetivos generativos, como a mentoria de colegas mais novos, a
preocupação de deixar marcos com impacto para os outros, diferenciando-se neste
aspeto particular dos adultos mais jovens (Hoppmann, Coats, & BlanchardFields, 2007).
Atendendo a que nas populações mais novas - e que têm sido mais estudadas - a
empatia é o principal preditor dos comportamentos de ajuda, seria expectável que as
medidas de empatia nos grupos etários mais velhos fossem particularmente elevadas.
Paradoxalmente, porém, e na escassa literatura científica existente sobre a empatia nos
idosos, o panorama é outro. Alguns estudos que comparam pessoas em diferentes fases
da vida, assinalam um declínio da empatia a partir dos primeiros anos da vida adulta
(Grühn et al., 2008), declínio esse que se acentua bastante mais em idades mais
avançadas (Eysenck et al., 1985; May & Alligood, 2000).
May & Aligood (2000) estudaram adultos entre 43 e 96 anos, avaliando-os com
dois intrumentos: a Hogan Empathy Scale - HES (escala dicotómica de V/F, que
pretende avaliar a empatia como uma sensibilidade básica e inata à perspetiva do outro
(Hogan, 1969)) e a Adjective Check List Empathy Scale -ALES (escala de 18 adjetivos
relacionados com Empatia, extraída da Adjective Check List, ACL de 300 adjetivos,
que inclui atributos de preocupação empática, comportamento prosocial e reação
empática). Ao comparar as pontuações dos participantes com as de outros estudos
prévios seus, em que haviam usado as mesmas escalas, as autoras verificaram que as
pontuações eram mais baixas nos estudos com idosos do que nos estudos com adultos
mais novos. É de notar porém, que as duas medidas se correlacionaram fracamente entre
si, o que indicia que podem não estar a avaliar os mesmos aspetos da empatia ou que há
dificuldades, acrescidas com a idade, na compreensão dos próprios questionários.
As medidas de empatia cognitiva parecem ser as que apresentam maior redução
nos adultos de idade mais avançada, quando comparadas com as medidas de empatia
emocional e comportamento prosocial neste mesmo grupo. Neste âmbito, por exemplo,
Amorim e colaboradores (2019) compararam crianças (7-11 anos), adolescentes (12-17
anos), jovens adultos (20-30 anos) e adultos mais velhos (58-82 anos), numa tarefa de
identificação das designações de diversas emoções a partir de gravações de voz,
recorrendo a um instrumento de escolha múltipla. Através da análise dos dados obtidos,
foi possível conclui que o nível de desempenho da tarefa aumentava das crianças para
os jovens adultos e sofria um declínuo nos adultos mais velhos. Apesar de as tarefas de
reconhecimento de emoções não serem uma medida direta de empatia cognitiva -
porque a empatia emocional também influencia a empatia cognitiva - esta é
normalmente a componente mais envolvida no reconhecimento, sendo inclusivamente
considerada como independente e frequentemente elevada nos psicopatas (que
apresentam muito baixa empatia emocional).
Medindo separadamente a empatia emocional, a progressão da empatia já parece
ser diferente. Sze & Gyurak (2011) compararam a empatia emocional em 3 grupos
etários: jovens adultos (20-30 anos); adultos de meia idade (40-50 anos) e adultos de
idade avançada (60-80 anos), recorrendo a medidas explícitas (auto-relato) e implícitas
de empatia (resposta elétrica da pele e atividade cardíaca) e a uma medida do
comportamento prosocial (donativos em dinheiro para causas) e verificaram um
aumento destas medidas do grupo etário mais novo para o mais velho. No domínio das
medidas explícitas, foram avaliadas as componentes de preocupação empática e
desconforto pessoal (personal distress) através das respetivas subescalas do
Interpersonal Reactivity Index (Davis, 1980), bem como a autopercepção do grau
experimentado de diferentes emoções, antes e depois da obervação de 2 filmes
selecionados para desencadear respetivamene emoções positivas ou emoções negativas.
Quer em resposta a um quer ao outro filme, os autores verificaram uma relação linear
com a idade tanto nas medidas implícitas de empatia como nas explícitas, e também no
comportamento prosocial, sendo a dimensão de preocupação empática mediadora da
relação da idade com o comportamento prosocial.
É importante por isso compreender o declínio (ou não) da empatia nos adultos, a
partir da meia-idade com medidas mais finas do que escalas unidimensionais da
Empatia, que avaliam o construto como um todo. Trata-se aqui de uma séria limitação
do método, como admitem Grühn e colaboradores (2008). Dois fatores críticos no
desenvolvimento da empatia e na sua avaliação mais detalhada são a experiência
(Hoffman, 2000), por um lado, e o estado de maturação (nos mais novos) e
integridade/funcionalidade (nos mais velhos) de estruturas cerebrais cruciais à
experiência da empatia, bem como, idealmente a conectividade destas estruturas com
outras partes do cérebro. Ao abordar as estruturas e funcionalidade é de relevância
fundamental avaliar as redes neuronais que suportam a empatia-traço, b) as estruturas e
redes que suportam a empatia cognitiva e c) e as redes neurais de que dependem as
reações emocionais empáticas. Ao avaliar discriminadamente estas estruturas e os
efeitos funcionais de cada uma destas dimensões da empatia, poderemos ter um ponto
de partida para a compreensão do declínio da empatia na idades mais avançadas, ou
pelo menos da compreensão dos processos que afetam cada um destes componentes da
empatia.
Quando aqui se refere “experiência” inclui-se todo um conjunto de situações
vividas, em primeira mão ou indiretamente. Vários estudos indicam que a familiaridade
com os alvos de empatia tem um efeito decisivo para um grau mais elevado de empatia
dirigida a esses alvos (e.g. Emauz, Gaspar & Esteves, 2018; Gaspar et al., 2014;
Hoffman, 2000). Também a experiência de sofrimento parece levar os indivíduos a uma
maior sensibilidade ao sofrimento dos outros, ao ponto de o poderem “detectar” quando
ele não existe (Eidelman-Rothman e colaboradores, 2016). A diversidade de emoções e
situações emocionalmente carregadas a que se está exposto ao longo da vida parece ser
um elemento chave da relevância da experiência para a empatia (Hoffman, 2000).
A possibilidade de modificar a resposta empática a partir do contacto com
realidades específicas foi estudada amplamente por Hojat (2007) no contexto médico,
através do recurso a diversas estratégias que resultaram no incremento das medidas de
empatia. Um bom exemplo é a utilização de filmes de pacientes em sofrimento com
jovens profissionais de saúde em fase de treino. Também o recurso à literatura parece
produzir efeitos positivos na empatia de crianças e adolescentes (Kidd & Castano,
2013); o uso de vídeos disseminados pela web sobre o sofrimento dos animais parece
ter um efeito poderoso na mudança de comportamentos de consumo dos jovens adultos
(Gaspar & Guimarães, em prep.). A tendência para a redução de experiências decorrente
de situações de isolamento social, muito comum em pessoas de idade mais avançada,
deve ser tomada em consideração quando se analisam os seus comportamentos
empáticos, que andam a par e passo com o declínio das funções cognitivas e das
manifestações de empatia (e.g. Cozolino, 2008, 2014).
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