GEOCIÊNCIAS
Mapeamento geomorfológico
para usos geotécnicos
Edir E. Arioli
Geólogo
Curitiba
2021
1. Introdução
Duas unidades de análise são apontadas por DINIZ (2012) como mais
adequadas à cartografia geotécnica: bacias hidrográficas e Unidades de Terreno (UT).
As primeiras são adequadas por vários motivos: delimitam naturalmente os processos
de concentração e fluxo das águas superficiais e subterrâneas, constituem UT que
podem ser subdivididas facilmente em sub-bacias e outras formas de relevo,
condicionam associações naturais de solo, água, cobertura vegetal e, muitas vezes, o
uso e ocupação do território. As UT representam, segundo a autora, "uma associação
natural em termos de geologia, geomorfologia e distribuição de solos".
2. Fundamentos teóricos
O método de mapeamento geomorfológico baseia-se na concepção de que o
relevo resulta da interação de forças internas e externas à crosta terrestre, elaborada
por PENCK (1953) e complementada pela classificação das formas de relevo em
morfoestruturas e morfoesculturas, desenvolvida por GUERASIMOV (1946) e
MECERJAKOV (1968). Outras contribuições vêm da escola pedogenética russa, com
DOKUCHAEV (1883) e SOTCHAVA (1962), e da escola francesa, com EHRART
(1956), CAILLEUX (1958) e TRICART (1968, 1979), entre outros.
Existe uma correlação entre escala e idade das formas de relevo: as formas
menores são acumuladas ou esculpidas sobre as maiores, de modo que a idade do
relevo decresce da escala regional para a escala local.
Sexto Formas Lineares e Areolares Recentes: Sem definições para este nível.
feições locais, ou formas de processos
atuais, frequentemente induzidas pela
intervenção antrópica.
Ex: ravinas, voçorocas, cicatrizes de
MGMs, terracetes, bancos de
assoreamento a montante de barragens.
Quadro 1. Hierarquia das unidades de relevo segundo ROSS (1990) e o IBGE (2009).
Figura 1. Relações entre taxons e escalas de observação, segundo ROSS (1990).
Táxon
Formas
J. Ross, 1992 Escalas de análise
Escudos antigos, bacias sedimentares
1. Unidades Morfoestruturais 1:250.000 a 1:1.000.000
extensas.
Planaltos, serras, depressões periféricas,
2. Unidades Morfoesculturais 1:100.000 a 1:250.000
planícies litorâneas.
Planaltos específicos (Goiano, Terceiro
Planalto Paranaense), chapadas
3. Unidades Morfológicas 1:50.000 a 1:100.000
(Diamantina, Guimarães), depressões (do
Araguaia).
Formas de agradação (planícies e terraços
4. Formas de Relevo 1:25.000 a 1:50.000 fluviais ou marinhos) e denudação (colinas,
morros e cristas).
Topo, meia encosta e base de encosta,
5. Setores de vertentes 1:5.000 a 1:25.000
divisor d’água e fundos de vales.
6. Formas antrópicas 1:1.000 a 1:5.000 Voçorocas, ravinas, movimentos de massa.
4. A classificação das UTs deve ser feita com base em atributos que possam ser
facilmente levantados, armazenados e representados em campo, laboratório e
escritório.
• Grau Alto:
• Grau Médio:
- áreas que podem ser afetadas por processos geotécnicos gerados dentro ou
fora da área de estudo, como, por exemplo, as áreas que podem ser atingidas por
movimentos de massa, por inundações, por variações do nível do mar, ou qualquer
outro processo que possa criar situações de perigo ou risco.
- áreas de urbanização favorável (cor azul): locais de baixo perigo frente aos
desastres naturais e onde a ocupação demanda apenas os cuidados usuais com
relação aos estudos para fundação e obras de contenção;
- os locais onde, face ao estudo de risco, não é permitida a edificação (de uso
permanente) - cor vermelha;
11. Produção da carta de UTs, que inclui a avaliação dos terrenos, de acordo
com as necessidades dos usuários e no que se refere a riscos geológicos, aptidão para
os diversos tipos de uso e ocupação e recursos naturais.
1
DIM → Muito grande Grande Média Pequena Muito
(1) (2) (3) (4) pequena (5)
GEV ↓
2 > 1.500 m 1.500 - 700 m 700 - 300 m 300 - 100 m < 100 m
Fraco (2)
21 22 23 24 25
10 - 20 m
Médio (3)
31 32 33 34 35
20 - 40 m
Forte (4)
41 42 43 44 45
40 - 80 m
Muito forte (5)
51 52 53 54 55
> 80 m
1 2
Dimensão interfluvial média. Grau de entalhamento dos vales.
Símbolos Descrição
A forma agradacional
D forma denudacional
Dc interflúvio convexo
Dt interflúvio tabular
Dp interflúvio plano
Dp15 interflúvio plano com GEV muito fraco e DIM muito forte
Vc vertente convexa
Vr vertente retilínea
Tc topo convexo
Tp topo plano
3 - médio Capoeira
Quadro 6. Graus de proteção do terreno conforme uso da terra e do grau de cobertura vegetal.
Intemperismo e
pedogênese atuam com Alta lixiviação em
Estabilidade antiga. o máximo de zonas úmidas,
Litologia influencia cada formação de
Evolução superficial do interferência dos agentes
vez menos morfogênese crostas lateríticas
modelado muito lenta. de transporte. Produtos
Condições ideais para e pedogênese. Produtos em zonas de clima
Formas em equilíbrio de alteração superficial
classificação dos solos, de alteração superficial semiárido ou com
com as condições permanecem in situ ou
que evoluem em regime são espessos e estações muito
bioclimáticas há 100 sofrem ablação lenta.
permanente. A noção de homogêneos, secas. Adubação é
milhares de anos. Alta Nos domínios de
catena é utilizável. influenciando mais do eficaz devido à
influência biótica ou fraca evolução lenta os
que a litologia a estabilidade do
atuação dos agentes produtos de alteração e
A morfogênese. solo.
erosivos. os solos podem ser
Meios estáveis evoluídos, mas pouco
espessos.
Evolução lenta, Manter cobertura
tendendo a situações Estabilidade Associação de solos Solos polifásicos e Importante, se houver vegetal com
de clímax. relativamente recente. formados em períodos truncados ou recobertos, exposição do substrato densidade
diferentes, sob condições que podem ocorrer em rochoso. equivalente à
Pedogênese Mais comum do que original, para evitar
predomina sobre climáticas variadas. um mesmo perfil.
estabilidade antiga Mosaicos de solos Sobre a morfogênese: exposição do solo
morfogênese. devido às oscilações Solos truncados são influência variável, aos agentes
truncados por erosão e Mesmas condições
Fraca atividade climáticas quaternárias. novas pedogêneses. classificados por: dependendo das erosivos.
Início geralmente no condições climáticas, e acima, mas com
geodinâmica interna e Depósitos derivados em - tipo do solo truncado; -
Holoceno há 10.000 filtrada pela cobertura de grande variação
fraca atividade encostas registram nível da truncagem; -
anos. Formas reliquiares solo e produtos de regional, o que
mecânica externa. épocas de estabilidade. tipo da pedogênese
superpõem-se e alteração. impede
Nos baixios, os produtos superimposta. extrapolações.
complicam análise da de instabilização
ecodinâmica. Oscilações Sobre a pedogênese: Exige alto grau de
recobrem solos mais Solos recobertos são somente sobre a
climáticas produzem sofisticação no
antigos, geralmente classificados por: pedogênese inicial,
readaptações mapeamento dos
truncados. Regiões de - tipo do solo recoberto; depois os solos e solos.
sucessivas, com ablação relevo suave, submetidas
nos topos e deposição - espessura da cobertura; produtos de alteração
à alternância de climas - tipo da pedogênese são mais importantes do
nos baixios. Depósitos agressivos e bioestasia, superimposta. que a rocha para os
coluviais remanescentes favorecem esta situação.
a meia encosta registram solos mais recentes.
épocas de estabilização.
Equilíbrio
Pedogênese predomina: pedogênese/morfogênese As práticas
aproxima-se dos meios muito instável. Conceito agronômicas
B Morfogênese e estáveis, mas de catena pode ser usado Instabilidade devem contribuir
Meios transicionais pedogênese se morfogênese contém se for com sentido crescente do solo para estabilizar a
equivalem com dinâmico e não Sobre a morfogênese: exige cuidados no morfodinâmica,
(intergrades) avanço da pedogênese,
interferências recíprocas. meramente topográfico. diferenças de resistência manejo da uma vez que a
impedindo solos muito
Dinâmica controlada Quaisquer alterações Mosaicos de solos ao intemperismo cobertura, porque agricultura favorece
evoluídos.
pelo balanço entre sazonais de clima transicionais controlados mecânico ou químico há tendência à a morfogênese, em
morfogênese e alteram o equilíbrio entre Morfogênese predomina: pela dinâmica do sistema. controlam evolução do degradação nos detrimento da
pedogênese. elas. As propriedades do pode ser superficial, por Solos imaturos são modelado. períodos de clima pedogênese.
solo influenciam a erosão laminar, que não abundantes, com extremo. Onde a Pastagens densas
Predomina Sobre a pedogênese:
morfogênese e vice- altera o perfil do solo, horizontes pouco ou nada morfogênese protegem o solo
pedogênese: tendem influência muito forte,
versa. Trata-se de um exceto removendo desenvolvidos e mesmo predomina, erros contra erosão e
à estabilidade. com solo refletindo
equilíbrio delicado, que camadas de topo; ou misturados. Ablação e de manejo podem movimentos de
composição do substrato
Predomina pode ser rompido por profunda onde aprofundamento do solo deflagrar erosão e massa, por
rochoso.
morfogênese: tendem práticas equivocadas de movimentos de massa, tendem a se compensar, movimentos de aumento da difusão
à instabilidade. agronomia ou manejo. removem perfis inteiros e o que exige noção da massa. hidráulica e
expõem localmente o dinâmica do sistema para dispersão de
substrato. avaliar o que predomina energia.
em cada local.
Fisionomia Capoerinha: um único estrato Capoeirão: um ou dois estratos Floresta: 2 a 4 estratos, até 15
com até 3 m de altura. com até 6 m de altura. m de altura. Vegetação arbórea
Predomina vegetação herbácea Predomina vegetação arbórea predomina, formando um
e arbustiva de porte baixo, com e/ou arbustiva sobre a dossel fechado e uniforme no
cobertura vegetal fechada a herbácea, em estratos porte, eventuais árvores
aberta. diferenciados. Cobertura emergentes, semelhantes à
arbórea aberta a fechada e vegetação primária. Copas
eventuais indivíduos superiores amplas,grande
emergentes. variação de diâmetros.
Espécies lenhosas Baixa variação de DAP. Variação moderada de DAP, Grande variação de DAP.
predominando pequenos
diâmetros.
Epífitas Se existentes: liquens, briófitas Maior número de indivíduos e Com maior número de
e pteridófitas, com baixa espécies em relação ao estágio indivíduos e espécies em
diversidade. inicial, mais abundantes na relação ao estágio inicial, sendo
floresta ombrófila. mais abundantes na floresta
ombrófila.
Sobre o Autor
Edir E. Arioli é geólogo pela UFRGS (1969), doutor em Geologia pela UFPR
(2008), especialista em Gestão Tecnológica (1990) e Engenharia da Qualidade
(1991) pela PUC/PR. Dedica-se à produção de materiais paradidáticos para
uso de professores e estudantes de Ciências da Natureza. Email:
earioli@yahoo.com.br.