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PROJETO: PAISAGENS DO ESPÍRITO

Pré-projeto pós-doc
Fernando Augusto dos Santos neto

RESUMO

O presente projeto, denominado “Paisagens do espírito” tem como objetivo investigar o


pensamento e a prática do desenho da paisagem brasileira na arte contemporânea, tendo
como base os conceitos: o entorno, a escala (grande formato) a materialidade, a
representação fidedigna (o retrato). Serão discutidos os conceitos de desenho de
observação como forma de conhecimento da natureza e do próprio desenho, conforme
se verifica no ensino de arte, os conceitos de invenção da paisagem com base na
linguagem (Anne Ccquelin), do nascimento da paisagem no ocidente (Alain Roger, H.
E. Gombrich), a evolução do olhar, da ciência e consciência da paisagem (Heliana
Angotti Salgueiro, Peter Wohlleben, S. Mancuso), as relações entre natureza e cultura
(V. Flusser) a imagem como representação fidedigna do mundo em contraposição à
expressão emocional do artista (Hugo Fortes), assim como artistas e obras que se
conectam com os objetivos deste projeto: Joachim Patinir, Caspar David Friedrich,
Anselm Kiefer, Francisco Faria, William Kentridge. Ao final destacam-se
procedimentos processuais metodológicos, imagens, formas expositivas e textos
associativos e críticos colados à pesquisa e prática do desenho de paisagem no debate
artístico, político e ecológico contemporâneo.

Introdução

“Paisagens do espírito” busca investigar o desenho da paisagem brasileira, tendo como


base os concneitos: o entorno, a escala (grande formato), a materialidade, a
representação fidedigna da natureza (retrato). Primeiramente ele parte do desafio de
realizar a representação paisagística em grandes dimensões (com módulos), chegando
até a relação 1x1m. O projeto parte da observação direta da natureza e interessa-se pelo
referente tal como ele se apresenta no mundo real, assim como o impacto da imagem
(ou da exponibilidade) no observador. Em seguida coloca a questão da paisagem como
representação fidedigna, aliando seu aspecto descritivo ao expressivo tal como se
verifica no retrato figurativo. O conceito de desenho de observação e seus
procedimentos como forma de conhecimento da natureza e do próprio desenho,
conforme se verifica no ensino de arte, serão discutidos face ao contexto
observação/representação da natureza, compreendendo proposição de viagens a
florestas e matas, visitas a parques, identificação de árvores e plantas, estudos
composicionais e material do desenho, registro fotomecânicos, descritivos e reflexivos
do processo.
Aproximação da natureza

Olhar a natureza para inventar: Observação direta, observação através de registros


fotográficos e videográficos, visitas, caminhadas, visitas a forestas e parques,
materialidade (pictórica, relacional, gráfica), criação de paisagens a partir de lugares e
plantas conhecidas, sem abandonar os conceitos de invenção da paisagem como
linguagem.

Olhar a natureza e desenhá-la muda o nosso olhar? Influencia em nosso


comportamento? As vezes é impossível mensurar essa possibilidade, mas devo dizer
que o projeto de ‘Desenhos Amazônicos’ foi um passo decisivo levar me a interessar
pela natureza e começar a trilhar, um pouco dos inúmeros caminhos que implicam este
olhar. O projeto “Paisagem do Espírito” é um segundo passo que, continua essa
empreitada de ir à natureza, mas desta feita, voltando-me para o entorno, para a
paisagem do Espírito como lugar e referência, solicitando um contato mais próximo
com a natureza, conforme explico mais adiante, apoiado dm textos de autores como
Heliana Angotti Sagueiro, Peter Wohlleben, S. Mancuso, V. Flusser. Mas para abordar
esse novo lugar, onde vivo atualmente, começarei por falar da experiência antecedente:
‘desenhos amazônicos’.

https://issuu.com/fernandosantosneto/docs/amazonia_desenhos
https://www.udesc.br/arquivos/ceart/id_cpmenu/7177/
Artigo_4___LEITURA_DE_PAISAGEM_15591512456404_7177.pdf
https://ybakatu.com/a-paisagem-como-politica-exposicao-individual-de-fernando-augusto/

Paisagens Amazônicas

Comecei a me interessar por paisagem a partir de algumas viagens à Amazônia, em


específico, uma realizada em janeiro 2012 quando, embarquei  em um navio hospital da
Marinha Brasileira1  e subi o Rio Madeira, de Manaus até Porto Velho. Nesta viagem
acompanhei o trabalho de atendimento médico que a Marinha presta à população
ribeirinha com o propósito de descobrir, conhecer, vivenciar, fotografar e desenhar a
floresta amazônica. O objetivo era entrar, descobrir a floresta Amazônica e exercitar
uma prática muito presente em nossa cultura: a do artista viajante. 

Artista viajante é aquele que sai para ver, conhecer, desenhar, pintar, registrar o que viu,
criar imagens de uma geografia distante, desconhecida, imaginada e cuja produção, de
cunho documental, comunica deslocamentos no espaço, descobertas de paisagens e
tipos humanos. Ao embarcar eu me perguntava: como desenhar paisagem hoje? Que
sentido tem na contemporaneidade, ir até a natureza, aos lugares mais diversos para
desenhar? Quais os pontos de contato entre esta viagem e a dos artistas viajantes que
passaram por estas terras? Que possibilidades tem o desenho hoje, nesta senda que ele
próprio ajudou a construir, de registrar e criar paisagens, face à fotografia e às novas
tecnologias? Estas perguntas se desdobravam em outras, às quais fui tentando responder
desenhando.

Eu nunca desenhara paisagem e estava ali, descobrindo a Floresta Amazônica. Penetrar


a floresta já era uma resposta aos meus questionamentos em desenho. A viagem de 2012
era a quarta que fazia a Manaus, sendo a primeira, em 2004, quando, além de conhecer a
cidade e seus arredores, viajei de barco, durante três dias, até Santarém. O impacto desta
viagem foi tão grande que prometi voltar com o propósito de entrar mais na floresta,
saber mais sobre ela, estar lá e, “experienciar” aquela primeira sensação; cativante,
perigosa, mas transbordante e admirável, que me lembrava a origem do mundo. A
fotografia foi a companheira de viagem, o meio de registro do olhar; mas uma
companheira infiel, porque por mais que registrasse o que olhava, o resultado imagético
era sempre distante do que via. Daí o desenho, projeto que consegui formalizar em 2012
e, a isso acrescentou-s a escrita. Esses procedimentos (desenho e escrita) se
presentaram com força e foram motivadores definitivos. Eles forçavam-me a olhar mais
tempo árvores, folhas, igarapés, o céu, a chuva, o tempo, levavam-me a ver mais do que
estava olhando e a sentir e pensar cada experiência. Desenhando comecei a criar uma
narrativa que falava de paisagem e do estar ali. Passei a registrar minhas impressões em
diários de bordo, trabalhando com aquarela, grafite, nanquim e textos
descritivos/reflexivos da viagem. O desenho começava a me apontar uma nova maneira
de viajar, de ver a floresta, de reinventá-la e de reinventar-me.
(ilustrações)

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1
São navios de operações e de assistência médica, odontológica e hospitalar da Marinha Brasileira,
baseados na Flotilha do Amazonas. Eles navegam pelos diversos rios do interior da Amazônia e do
Pantanal, prestando ajuda às comunidades que se localizam nas margens dos rios. Realizam palestras
sobre prevenção de doenças, cuidados com higiene pessoal e com o preparo de alimentos e, devido a estes
serviços são conhecidos pelos ribeirinhos como Navios da Esperança.

Diário de bordo e residência artística

No navio tudo era novo para mim, assim como era para os marinheiros, um artista a
bordo. Volta e meia um deles me perguntava qual o objetivo do meu trabalho: para que
eu desenhava? A resposta era difícil porque não eu trabalhava  para uma revista ou um
jornal, não estava ligado  a nenhuma reportagem ou documentário como eles
esperavam. Eu respondia que desenhava porque gostava de ver as coisas em desenho e
que o meu objetivo era simplesmente desenhar paisagens da Amazônia. Essa resposta
para eles parecia não justificar, ficava alguma coisa no ar. Contudo esta era a explicação
verdadeira, sincera, eu não tinha um fim definido para os desenhos, nem sabia que tipo
de desenho faria ou aconteceria.

Quando retornei da viagem, continuei a desenhar paisagem em meu atelier, levando a


cabo vários esboços e iniciando outros. Finalizei três cadernos de desenhos e aventurei a
fazer desenhos maiores com grafite e também a carvão. Por se tratar de desenho de
observação, ampliei a experiência convidando alguns alunos das minhas aulas de
desenho da UFES a desenharem comigo em meu atelier. Essa colaboração me levou a
realizar desenhos maiores e a pensar a paisagem em grandes formatos e em módulos.
Em 2017 avancei esta experiência de trabalho colaborativo: propus uma residência
artística no Mosteiro Zen Budista de Ibiraçu-ES e convidei a artista paranaense Dulce
Osinski para desenharmos a paisagem do entorno do mosteiro. A escolha dessa artista
para o referido projeto se fez principalmente porque ela realizava desenhos do jardim
dela que muito tinham a ver com os desenhos de paisagem da Amazõncia que eu vinha
trabalhando. Durante dez dias ocupamos a Estação Cultural do Mosteiro zen de Ibiraçu-
ES para realizarmos uma vivência de arte colaborativa e pensar a paisagem e realizar
um desnho mural de 400x600m. o qual denominamos Paisagem Atlântica.
(ilustrações)

Foi preciso ir à natureza para desenhá-la e, adesenhando, desfrutá-la, fruíla com os


olhos do viajante, do cidadão do artista. Assiná-la se aí uma ligação com a tradição: um
conceito de representação, a utilização de técnicas como volumetria, perspectiva
(proporção, quadrícula), e expectativa de resultado formal e artístico esperada. No
entanto tudo era novo: a escala, o entorno, a materialidade, o desenho à quatro mãos, o
trabalhar juntos. Procedimentos novos apontaram descobertas e, a confirmação deste
tema como pesquisa plástica e poética.

PAISAGENS DO ESPÍRITO

Depois de viver em quatro estados brasileiros e não me ver pertencendo a nenhum


deles, a noção de paisagem (paysage/pays-sage, segundo Allan Roger), como terra,
pátria passou a me interessar. Como seria pintar, desenhar o Espírito Santo? Essa
pergunta geral me veio primeiramente lembrando Gauignard, depois de ver e conviver
com suas ‘paisagens mineiras’ e também de ter visto bem de perto os desenhos do
artista paranaense Francisco Farias. Como desenhar paisagem de uma região,
procurando trazer um pouco do espírito do lugar e ao mesmo tempo imprimindo um
temperamento? Uma paisagem onde se possa classificar, reconheçer plantas, árvores e
lugares? Que recorte faria, que lugares olharia/escolheria para desenhar? E como
desenharia?
1 - O entorno
Vivemos em um grande país com diversas paisagens, como elas aparecem na arte
contemporânea? Observando a história da arte no Espírito Santo, enontro alguns do
seus primeiros pintores: Levindo Fanzeres (Cachoeiro de Itapemirim ES 1884 - Rio de
Janeiro RJ 1956; Homero Massena, Barbacena-Mg 1886- Vila Velha,1974; Angela
Gomes , Vila Velha-ES 1953) artistas que retratam a região dentro de um perspectiva
Impressionista ou naif, representando cenas folclóricas, centros históricos e ‘belas
vistas’ da região. Intentam dizer como era aprazível viver aqui, conforme identificamos
nas palavras de Massena "Para viver bem, tem que ser em Paris ou em Vila Velha".
Como desenhar nossas paisagens hoje sem ser turistico? O quê e como desenhar da
nossa paisagem hoje?

O Espírito Santo como lugar é espaço vasto. Por isso é necessário delimitar um espaço.
Tenho recorrido à leituras sobre a história, a geografia e a paisagem do estado assim
como realizado viagens e caminhadas ao interior interior e nos arredores de Vitória:
cito alguns lugres: Venda Nova do Imigrante, Santa tereza, região do Caparaó, reservas
florestais (Mata Atlância no Mosteiro zen de Ibiraçu) e visitas a lugares característicos
da cidade como Convento da Pednha, Praças e parques. Sendo a intenção, definir
lugares para vê-los pelo desenho, esta cartografia é uma experiência da cidade e de
algumas regiões do estado, buscando sentir, imprimir no corpo o lugar. Trata-se de estar
nos lugares, de desenhar (em caderno de bordo), seus espaços, suas vegetações, suas
árvores ou vistas paisagística a partir do referido lugar. Mas trata-se também de
usufruir, como cidadão do lugar. O projeto é portanto, estético e político, o desenho um
caminho.

2 - A representação fidedigna da natureza e a expressão pessoal do artista: a


paisagem como retrato

O interesse em conhecer a Floresta Amazônica me levou a desenhar paisagens


amazôncicas (livro de artista ms Galerie dialogue), em seguida paisagens da Mata Atlântica
e, agora tentando construir uma possível ‘paisgem do espírito’ que não é uma
representação das paisagens do Espírito Santo, mas um ponto entre a representação
desta natureza e a expressão emocional do artista. Este é o efeito estético a que se deseja
chegar. Daí podermos falar dessa criação paisagística como retrato, árvores, arbusto,
ervas ou gramas como sujeito, como elemento que se busca observar bem, saber algo da
sua história, do seu comportamento, identifica-la pelo nome, cientítico e popular e assim
desenhá-las no contexto de uma paisagem. Paisagem esta inventada, mas composta de
plantas, aqui e ali possíveis de serem reconhecidas pela sua forma, segundo leitura do
botânico Eduardo Barba, pesquisando os quadros de Joachim Patinir no Museu do
Prado, como explicarei mais adiante ao falar dos artistas. Costume dizer que posso
inventar paisagens, mas para isso preciso ver paisagens reais. Ver, representar,
expressar tendo em mente a noção de retrato, envolve um equilíbrio entre a semelhança
referencial e o temperamento ou ideia do artista. Trata-se de uma tradição com a figura
humana, exercício que pratico há anos retratando artistas, amigos e familiares. Como
será aplicar tal conceito às àrvores? Estabelecer esta relação me coloca a ver cada planta
como sujeito, sujeito que no ato de retratar preciso olhar e estabelecer um compromisso
de captar algumas de sua característica, de falar seu nome, para ao final realizar que
chamamos de retrato, embora este seja uma invenção do artista.

3- O Grande formato
O desenho mural intitulado “Paisagem atlântica” realizado em parceiria com a artista
paranaense Dulce Osinski no Mosteiro Zen de Ibiraçu-Es abriu caminho para olhar a
natureza ao redor, pensar a paisagem em o grande formato e em módulos. Neste projeto
decidimos desenhar uma paisagem em escala real – neste caso um detalhe da Mata
Atlântica em suas verdadeiras dimensões. Como central d a Estação cultural tem um pé
direito de 4,50 metros por 7 metros de largura, a paisagem ‘transportada’ para esta
superfícia teria também esta medida na escala 1x1m. Estamos acostumados a ver
paisagens em escalas reduzidas, de acordo como nossos espaços conviviais e também
nosso corpo. As escalas dos desenhos e das pinturas são diminutas face às àrvores, face
à natureza. Como apresentar essas dimensões reais em um desenho? O que esta escala
pode nos dizer? Difícil chegar a uma conclusão, mas ao colocarmos a questão,
pensamos poder dizer algo da grandeza do mundo, do nosso olhar e também percepção.
A verdade é que, mesmo criando paisagens em grandes dimensões, não damos conta
dela e o estar diante de um desenho de paisagem de 24 metros quadrado que é um
detalhe em tamanho real da natureza é uma sensação admirável, é uma maneira entrar
na natureza.

Neste trabalho desenhamos o cenário lateral da Em frente ao deck da estação cultural.


Esta atitude de olhar atrás do mirante, tem um aspecto duplo: olhar ao redor e também
olhar o que comumente não vemos. A estaçõ cultural do mosteiro fica no alto de uma
montanha com um grande deck que oferece uma vista privilegiada para o vale que se
estende à sua frente e um conjunto de outras montanhas que se estendem em infinitas
ondulações até o horizonte. Este é o cartão postal, nós olhamos para a parte de atrás da
casa, um conjunto de arvores sobre o barranco que, de certa forma ajuda a segurar a
estrada de possíveis deslises terra em tempos chuvosos. Esse olhar para atrás ali um dos
princípios conceituais desse projeto, o de não buscar somente belas vistas paisagísticas,
mas sobretudo o inverso, a paisagem não interessante, os lugares ou árvores comuns.
Esse olhar me leva a ver os arredores de Vitória-Es e seus parques, principalmente um
que frequento muito, o parque da Cebola, como espaços possíveis para desenhar.

04 – Materiais e apresentação
Como lembra Amilcar de Castro, ‘pintura é uma coisa que se faz por dentro, é cor,
desenho se faz por fora, é contorno, é limite.’ Mas lidar com linha, contorno não
significa não lidar com massa, com cor. O projeto Paisagem do Espirito buscar expandir
cirando zonas entre esses opostos ativando tanto os instrumentos, como os suportes e os
modos de apresentação dos trabalhos.

Tendo definido o Espírito Santo como lugar/motivo, o passo seguinte se refere às


implicações técnicas e materiais. A partir da experiência dos desenhos amazônicos e do
grande desenho “Paisagem atlântica” as técnicas do carvão, da tinta nanquim, da
aguada, da colagem e da modulação do desenho partes, díptico, tripotico, políptico se
colocaram como via de trabalho e de linguagem. O preto e branco pareceu o elemento
mais adequado para fala da diferença e semelhança entre o desenho e o objeto. Também
enfatiza sentidos dramáticos, expressionistas e emocionais. O carvão, o pastel seco e
seus rastros de sugidade dão fluidez às linhas, formas, letras, escritas, manchas, gestos e
múltiplas nuances. A isso se acresce a maleabilidade do seu uso, pode ser
trabalhadotanto em bastão ou em pó, seco ou molhado, aliado com atinta ou com a cola
fixativa e retrabalhado muitas vezes durante e depois da fixação. Além ´disso, o carvão
sendo pó ou na forma de bastão, podem ser associados materialmente com galhos de
árvores e folhas e talvez terra, podendo ganhar materialidade mais densa que certamente
enriquecerão o trabalho. Exemplo disso são as paisagens de Anlselm Kiefer e William
Kentridge. Utilizado, desde tempos imemoriais, o carvão, o pó, a nanquim, sempre
estiveram ligados ao ofício do artista, frequentemente utilizados em etapas
preparatórias, estudos, estudos estes que na arte moderna e contemporânea se tornaram
um tipo de efeito estético, o inacabado, efeito este que norteia este projeto.

Até aqui a exponibilidade os desenhos conteceram em paredes verticais e como livros


de artistas, mas seu desdobramento tem suscitado outras possibilidades na forma de
instalação, vídeos e mesmo leitura/performática. Em conexão com os artistas arrolados
neste projeto, principalmente Kentridge e Kiefer podemos pensar, por exemplo,
paisagens objetos, paisagens painéis a serem exposto na horizontalidade do chão, como
chão ou como panorama, de acordo com os espaços e os desenhos em si, podemos
pensar em painéis deslocados para o desenho ser remontado em performance ou/e em
experiênciad educativas.

ARTISTAS

Joachim Patinir (1475-1520),


Caspar David Friedrich (1774 - 1840)
Joseph Mallord William Turner (1775- 1851)
Anselm Kiefer (1945-)
William Kentridge (1955)
Francisco faria (1956-).
Joachim Patinir
Patinir é amplamente aceito como o primeiro paisagista do ocidente. Sua obra tem
elementos inspiradores até hoje para quem se debruçar sobre ela e, um desses elementos
que vim a conhecer recentemente é impulsionador do projeto “Paisagens do espírito”.
Trata-se da idéia de desenhar paisagens inventadas com plantas identificáveis
cientificamente. Em pesquisa realizada no Museu do Prado, o botânico Eduardo Barba,
verificou que as plantas e rochedos pintados por Patinir são identificáveis em certas
regiões da Bélgica, onde o artista viveu e, de regiões fora. O pesquisador identificou nos
quadros do artista, diversas plantas, arvores, arbustos, ervas e gramas que são
reconhecíveis hoje em dia, como o cipreste, o dente de leão, sauco, gordolobo
(verbascum thapsus), celidonia (chelidoium majus), e outras, assim como os seus grande
rochedos são da sua cidade, Dinant. Junto as isso, verifica-se que um quadro seu conta
várias histórias superpostas, sem uma linearidade de tempo. É como se diferentes
paisagens, estivessem coladas em um só.

A obra de Patinir interessa a este projeto por duas vias, a) uma superposição de imagens
que cria uma narrativa sem interrupção temporal, b) a paisagem imaginária, mas com
espécies vegetais identificáveis botanicamente

https://www.youtube.com/watch?v=nqp0f3BioGM

Caspar David Friedrich e Joseph Mallord William Turner


A obras de C.D. Friederich e Turener passaram e me interessar mais diretamente em
meu trabalho de paisagem, a partir de 2015, quando fiz uma residência no Vermont
Studio Center USA. Lá desenvolvi um procedimento de desenho que me aproximou
desses dois artistas. O interesse por suas obras passa pela atmosfera nebulosa, sombria e
também por uma apreciação da espiritualidade. O sentimento percebido em nas
paisagens montanhosas e nas marinhas de Friederich favorece um pensamento
meditativo e comtemplativo que este projeto busca . Acresce-se o pensamento
expressionista e de tragédia na paisagem, como falou dele o escultor francês David
d'Angers: “um homem que descobriu a tragédia da paisagem". Como Patinir as
paisagens de Friederich e Turner mostram o ser humano como elemento diminuto face a
natureza, e esta assume o protagonismo visual. A natureza é ser vivo e a paisagem é o
registro desta percepção, deste encontro. Ambos artistas trazem um aspecto narrativo
onde as figuras vivem uma história própria, paralela, criando um clima de evocação
emocional e busca do sublime. São configurações que oferecm pistas ou referências no
desejo de desenhar árvores, plantas e lugares como seres humanos.

Anselm Kiefer
Em 1987 Kiefer participou da 19ª. Bienal de São Paulo. Lembro-me como foi
impactante ver suas paisagens cinzas, ocres, carregadas de materiais, medindo cerca de
três por sete metros. Eu era estudante de arte na UFMG e, desde aquela época me
interessei pelo trabalho desse artista, chegando a estudar alemão e ter ganho uma bolsa
cultural do Goethe institut que me possibilitou uma estadia de três meses na Alemanha.
Minha identificação com o novo expressionismo alemão era total (Karl Schmidt
Rottluff, A.R. Penk, Baselitz, Jiri Georg Dokoupil), mas sem contudo me propor a
trabalhar paisagem. Nesse meio tempo viajei pelas cidades históricas mineiras
(participando dos Festivais de Inverno da UFMG) e fui tocado pelas paisagens das
cidades históricas e pelas montanhas de minas. Viajei também pelo nordeste brasileiro
Bahia, (terra dos meus pais), Ceará, Pernanbuco, ficando mais tempo em Recife, onde
cheguei a realizar residência no atelier do artista e amigo Marcelo Silveira. Em Gravatá
e Toritama, interior de Pernambuco vi paisagens secas que remetiam às paisagens de
Kiefer. Na ocasião cheguei a fazer alguns desenhos, esboços tendo suas pinturas como
referências. Hoje a obra deste artista volta a me interessar, evocando de um lado, aquele
sentimento pungente juvenil embevecido por suas perspectivas renascentistas e pela
materialidade intensa de suas telas, de outro, interessado no papel do grande formato
para falar da paisagem brasileira. A questão dos materiais, a ideia de peso, contra
balançando com a leveza, e a utilização possível de textos oferecem referências para o
projeto Paisagens do espírito.

Francisco Faria

Faria (1956) é um artista plástico brasileiro que se destaca por seus desenhos
paisagísticos à grafite e também por projetos de criação em arte visual e poesia, com a
participação de poetas brasileiros e estrangeiros. Seus desenhos freque,ntemente em
grandes dimensões, versam sobre estratégias gráficas e pictóricas da paisagem brasileira
e da América Meridional. Para a representação da paisagem, ele considera que a
natureza pode produzir sugestões plásticas que mesclam tempos diversos, história e
memória afetiva e diversidade de espaços.  O artista escolheu a paisagem como um
tropo do pensamento visual e trabalha um estilo que podemos chamar clássico: um
desenho virtuoso que viaja com erudição entre diferentes formas de abordar a Natureza,
retratando, desconstruindo, inventando. Sua opção por desenhar paisagem brasileira de
maneira realista, possibilita identificar plantas e lugares e, carrega uma atitude política.
Quem está mais próximo e pode falar de nossa terra senão nós? Que terras, que plantas
são essas? Retratando-as, deixamos sinais de que estivemos aqui. Faria assume um
ponto de vista contemplativo, parecendo dizer que a atitude contemplativa é bem válida
em nosso tempo e que precisamos dela profundamente, desde o estar nela através da
observação direta ou da observação de obras que falam dela. Escreve o próprio artista:
“É assim que natureza comanda todas as correlações culturais presentes em meu
trabalho, expressas pela observação direta, pela experiência psicogeográfica de deriva
por locais que se deixam descobrir ao longo dos caminhos, e que então me sugerem,
concretamente, a convivência de diversas referências culturais, a possibilidade de uma
civilização mais plástica e de uma cultura do êxtase, da beleza e da inclusão.”

William Kentridge

Conheci a obra William Kentridge pelas suas instalações e animações gráficas em


exposição na Documenta X em Kassel e no Sesc Pompéia, São Paulo. Mas é preciso
falar do seu desenho à carvão, onde a incisão gráfica, linear e pictórica vale tanto quanto
o desmanchar, o sobrepor, recortar e colar. Ele construiu sua obra filmando desenhos,
fazendo rasuras, correções e mudanças no próprio desenho e, continua, meticulosamente
este processo, desenhando, alterando e gravando até o fim da cena ou o começo de
outra. O final é um palimpsesto gráfico, posteriormente mostrado como filmes e peças
de arte. A ação dos seus filmes e as caraceteristicas sócio politica da sua obra, falando
do seu país, deixa quase despercebido as paisagens. Mas se prestamos atenção, elas são
tanto cenários como personagens e, olhar seus desenhos, como os de Francisco Faria, é
uma festa para os olhos. Traços vigorosos e manchas surgem com facilicdade sobre o
papel, determinantes e indeterminados pelo processo, convidando a olhar este processo
gráfico tanto quanto suas narrativas. É por esta via que sua obra interessa ao projeto
“Paisagens do Espírito”. A forma de desenhar a carvão e a nanquim, os gestos incisivos
de linhagem expressionista, a sobreposição de imagens e rasuras nas paisagens, áridas,
descampadas, evanescentes ou as vezes, árvores frondosas feitas com colagens de
jornais ou páginas de livros, palavras e imagens

Considerações finais

O que é paisagem? Como desenhar paisagens hoje e o que desenhar da paisagem?


Depois de ter viajado à Amazônia e ter realizado vários desenhos de ‘paisagens
amazônicas’ cheguei ao Espírito Santo, desenhando trechos da Mata Atlântica. A partir
daí e, por estar morando em Vitória-ES, passei a me perguntar como seria desenhar
paisagens do Espírito Santo. Essa proposição me coloca a necessidade (e também
vontade) de conhecer um pouco da geografia, da fauna e flora capixaba, e também
revolve sentimentos de deslocamento, de não pertencimento a uma terra, a uma região
que, volta e meia envolvem meu espírito. Será que um projeto assim traria novos
sentimentos em relação a este lugar? Daria um novo contorno à sensação de estrangeiro
dentro do Brasil? Traria uma sensação de pertencimento? Pode ser que não, mas tal
busca, mesmo se não alcançando o resultado desejado, não seria inútil.

Assim nasceu a ideia deste projeto “Paisagens do Espírito. Uma denominação aberta o
suficiente, para ser capaz de apontar tanto uma geografia, como um estado de espírito,
uma sensibilide e a emoção pessoal do artista. Paisagens criadas a partir do visto, da
observação de plantas, árvores, arbustos, parques, praças a serem retratadas de maneira
indicial e icônica. De um lado elas buscam estabelecer uma conexão com o lugar, do
outro, seriam de todos os lugares, abrangendo o pensar e sentir humano.

Como professor de desenho da Universidade Federal do Espírito Santo (disciplinas de


desenho de observação e desenho e paisagem), tenho buscado desencolver com os
estudantes, tanto técnicas e procedimentos de desenho, quanto o olhar para o entorno e a
refletir textual e graficamente sobre este entorno e próprio ato de desenhar.
Na oportunidade de realizar um estudo de pós-doutorado na ECA/USP (2021-2022),
pareceu-me interessante tratar desse tema, envolvendo tanto minha prática de atelier,
arrolando minha história com o desenho, especialmente o de paisagem, quanto a
necessária reflexão sobre os processos, prática, história e teorias e ensino do desenho
em uma universidade.
Assim, trago este projeto esta universidade, contando com possibilidade de orientação
com o prof. Dr. Hugo Fortes com já estudei e participei de congressos e temos interesse
no tema Arte, Natureza, Paisagem.
Concluindo, gostaria de dizer, que de acordo com a orienteção desta universidade,
coloco-me a disposição para realizar palestras, workshop ou ministrar disciplina no
programa dentro dos assuntos que estudo e pesquiso.

BIBLIOGRAFIA

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SANTOS NETO, Fernando Augusto.


https://issuu.com/fernandosantosneto/docs/amazonia_desenhos
https://www.udesc.br/arquivos/ceart/id_cpmenu/7177/
Artigo_4___LEITURA_DE_PAISAGEM_15591512456404_7177.pdf
https://ybakatu.com/a-paisagem-como-politica-exposicao-individual-de-fernando-
augusto/

OBRAS.
Diário de bordo – livro de artista . Viagem à Amazonia, grafite sobre papel, 35x50 aberto, 80 pags. 2012.

Diário de bordo – livro de artista . Viagem à Amazonia grafite sobre papel, 35x50 aberto, 80 pags. 2012.
Paisagem Amazônica, 70x100cm. 2013. Coleção particular

Paisagem Atlântica, 100x200cm.(díptico), 2018. Coleção particular


FA e Dulce Osinski. Paisagem atlântica. Mosteiro zen budista de Ibiraçu-ES, carvão e pastel sobre papel.
2017
FA e Dulce Osinski. Paisagem atlântica. Mosteiro zen budista de Ibiraçu-ES, carvão e
pastel sobre papel. 2017

FA e Dulce Osinski. Paisagem atlântica. Mosteiro zen budista de Ibiraçu-ES, carvão e


pastel sobre papel. 2017

FA e Dulce Osinski. Paisagem atlântica. Mosteiro zen budista de Ibiraçu-ES, carvão e pastel sobre papel.
400x600cm. 2017
Paisagem atlântica, carvão e pastel sobre papel, 160x100cm. 2018

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