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TIPO DE PROVA: EXAME ÉPOCA RECURSO DATA: 03.02.

2022

ANO LETIVO: 2021/2022 1º SEMESTRE

1º CICLO DE ESTUDOS EM DIREITO

UNIDADE CURRICULAR: DIREITO DA FAMÍLIA

Duração da prova: 120 minutos

(Nota: Os Estudantes que estejam a realizar o segundo mini teste devem responder
apenas às perguntas III e IV, que terão a cotação de 10 valores cada, e terão 60 minutos
para completar a prova)

Carlos, que estava noivo de Teresinha, rompe o noivado quando conhece


Maria Eduarda e os dois se apaixonam perdidamente.
Teresinha decide ir para um convento, mas antes envia um email a Carlos
exigindo-lhe que este apague todas as fotos que tinham juntos e destrua todas
as mensagens que trocaram e uma indemnização de um milhão de euros por
lhe ter destruído a vida.
Carlos pergunta-lhe o que deve fazer (3 valores)

Trata-se de uma promessa de casamento, cujo regime está nos artigos 1591.º a 1595.º
do CC. No que respeita à indemnização os artigos 1591.º e 1594.º são claros quanto
aos danos indemnizáveis, nos quais não se enquadram os danos morais que Teresinha
reclama. A questão das mensagens e das fotos enquadra-se no artigo 1592.º, n.º 2,
sendo que, no caso, apagar as fotos e destruir as mensagens equivalerá a restituir as
cartas e retratos pessoais.

II

Quanto a Maria Eduarda, Carlos sabe que são irmão consanguíneos - embora
Maria Eduarda acredite que é filha do marido da Mãe – e convence-a a fugir

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com ele para os Açores, onde casam catolicamente, convencionando antes o
regime da comunhão geral de bens.
Levam uma vida sem olhar a gastos, suportada pela fortuna que Carlos
herdara do Pai, mas, como nenhum deles trabalha, o dinheiro começa a acabar
e Carlos decide desfazer-se de alguns desses bens, incluindo de alguns
terrenos, sem nada dizer a Maria Eduarda.
A família de Maria Eduarda, entretanto descobre-os e a Mãe quer anular o
casamento.
Maria Eduarda contacta-@, perguntando-lhe qual a viabilidade da pretensão da
Mãe e se, caso o casamento seja anulado, terá algum direito, resultante do
regime de bens que convencionaram, sobre os bens que Carlos levou para o
casamento. Diz-lhe também que descobriu o negócio da venda dos terrenos e
que gostaria de os reaver, se possível, porque Carlos os vendeu demasiado
baratos, mas que o comprador se opõe.
Aconselhe Maria Eduarda (5 valores)

Maria Eduarda e Carlos são parentes no 2.º grau da linha colateral (1578.º, 1579.º,
1580.º, n.º 2, 1581.º, n.º 2), pelo este casamento foi celebrado, catolicamente, apesar da
existência de um impedimento dirimente relativo previsto na lei civil (1596.º, 1602.º,
c)), o que explica pela presunção de paternidade prevista no artigo 1826.º do CC) ,
pelo que é anulável (1631.º, a). A Mãe de Maria Eduarda tem legitimidade para propor
a ação de anulação (1639.º, n.º 1), durante todo o tempo que o casamento dure e até
seis meses após a respetiva dissolução, por morte ou divórcio (1643.º, n. 1, al c)). A
pretensão da Mãe de Maria Eduarda é, portanto, viável.
Nada impede que convencionem a comunhão geral de bens (1698.º, 1699.º, 1720.º a
contrario).
Se o casamento vier a ser anulado, a anulação produz efeitos retroativos (289.º do CC),
mas, apesar disso, Maria Eduarda, que estava de boa fé, pode opor os efeitos do
casamento até ao trânsito em julgado da sentença ao cônjuge de má fé e a terceiros,
desde que, relativamente a estes, se trate de mero reflexo de relações havidas entre os
cônjuges (1647.º, números 1 e 2). No caso concreto, isso significa que poderá
comungar nos bens levados por Carlos para o casamento e por ele adquiridos a título
gratuito – embora Carlos não beneficie do mesmo. Quanto ao terreno, Carlos, embora
administre os bens comuns que levou para o casamento (1678.º, n.º 2, alínea c)) não

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podia vender os terrenos sem o consentimento de Maria Eduarda, por força do disposto
no artigo 1682.º-A. No entanto, sendo anulado o casamento, na verdade Carlos e
Eduarda nunca foram casados, pelo que Carlos não precisava de autorização de Maria
Eduarda. Mais uma vez, porém, por força do artigo 1647.º, Maria Eduarda pode opor a
Carlos os efeitos do casamento, ainda que apenas putativo, pelo que tudo se passará
como se, de facto, o casamento não tivesse sido anulado e Carlos precisava do
consentimento de Maria Eduarda. Acontece, porém, que a ação de anulação atingirá o
comprador e o n.º 2 do artigo 1647.º limita os efeitos relativamente a terceiros, quando
só um dos cônjuges está de boa fé quanto à causa de anulabilidade, àqueles que sejam
mero reflexo das relações havidas entre os cônjuges. No caso, Maria Teresa está a
opor a falta de consentimento ao (putativo) cônjuge, o que afeta a validade do negócio
(1687.º) e, reflexamente, o terceiro, sem prejuízo da proteção dos terceiros de boa fé
para efeitos de registo, sendo certo que – que, aliás, não podia estar inteiramente de
boa fé na aquisição, porque conhecia o regime de casamento e sabia, ou devia saber,
que a lei obriga a consentimento do cônjuge (291.º, n.º 1 e n.º 3).

III

Como, entretanto, Maria Eduarda está grávida, todos perdem a coragem de


propor a ação de anulação.
Carlos, que continua a não gostar de trabalhar, tenta tirar alguns rendimentos
das quintas no Douro que o Pai lhe deixara, mas deixa-se convencer pelo
capataz a substituir toda a vinha velha por uva para espumante, com
resultados desastrosos.
Os credores querem que Maria Eduarda também responda pelas dívidas que
daqui resultam, mas, em qualquer caso, querem poder penhorar as quintas.
Carlos, para pagar as dívidas, vende alguns quadros que o Pai lhe deixou, mas
Maria Eduarda não quer ver as paredes da casa vazias e quer reavê-los,
sustentando que Carlos precisava do seu consentimento para os vender.
Quid juris?

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Carlos tem a administração das quintas, bens comuns que ele levou para o casamento
(1678.º, n. 2, alínea c)), pelo que nada o impede de substituir a vinha. Também pode
contrair dívidas sem o consentimento da mulher (1690.º), mas, em princípio,
responderá apenas ele pelas dívidas, a não ser que os credores aleguem – e provem –
que a dívida foi contraída em proveito comum do casal (já que foi contraída pelo
cônjuge administrador, nos limites dos seus poderes de administração – cf. 1691.º, n.º
1, a. c)). Pode eventualmente admitir-se que se aplica a presunção de proveito comum
da alínea d) do mesmo artigo, uma vez que a troca de vinha se destina à
comercialização e vinho, o que, mesmo que Carlos não seja comerciante, será,
objetivamente um ato de comércio. Nesse caso, será Maria Eduarda quem terá de
demonstrar que a dívida não foi contraída em proveito comum do casal. Em qualquer
caso, quer a dívida seja própria de Carlos, quer se comunique a Maria Eduarda, as
quintas podem ser penhoradas em primeira linha, porque ou respondem ao mesmo
tempo que os bens próprios de Carlos (se existirem, atendendo que o regime é o da
comunhão geral), por força do disposto no artigo 1696.º, n.º 2, alínea a), ou respondem
nos termos do artigo 1695.º, n.º 1.
No que respeita aos quadros, são bens dos quais Carlos tem a administração – 1678.º,
2, c) – mas pode, ainda assim, precisar do consentimento de Maria Eduarda para a
alienação por estarem expostos na parede da casa, ou seja, por serem utilizados por
ambos na vida do lar e se enquadrarem na alínea a) do n.º 3 do artigo 1682.º. A ser
assim, o ato é anulável nos termos e prazo do artigo 1687.º

IV

Passados mais alguns anos, com os filhos já maiores, Maria Eduarda já não
consegue lidar com os maus hábitos de Carlos, que, ainda por cima, bebe, mas
não quer divorciar-se por causa dos seus votos.
Quer saber qual é o remédio para a sua situação e quais os procedimentos a
adotar e, ainda, quanto poderá receber em partilha tendo em conta que os
bens de Carlos tinha antes de casar sobra apenas a casa onde vivem, avaliada
em 400.000,00€ e que o casal tem só o dinheiro que Maria Eduarda herdou
dos seus Pais, 1.200.000,00€ valor que, desde a morte dos Pais, já rendeu
200.000,00€ de juros.
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O remédio será a separação de pessoas e bens, sem o consentimento de Carlos, com um


dos fundamentos do artigo 1781.º, designadamente, o fundamento geral da alínea d),

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em ação a propor no Tribunal contra Carlos nos termos dos artigos 1779.º e ss. do CC
e 931.º e 932.º do CPC, tudo ex vi do artigo do 1794.º do CC. No que respeita à
partilha, aplica-se o disposto no artigo 1790.º do CC e nenhum deles poderá receber
mais do que receberia na comunhão de adquiridos. O que significa que o cálculo dos
quinhões se faria da forma seguinte:

Maria Eduarda Carlos

1.200.000 400.000
100.000 100.000
1.300.000 500.000

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