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DIREITO PROCESSUAL CIVIL1

Formalismo do processo ordinário de declaração

I. Preliminares

Vimos, no início deste nosso curso, algumas questões introdutórias relacionadas com o processo
civil. Falamos, por exemplo, da classificação das acções, em especial consoante o seu fim e
ainda, abordamos matérias relacionadas com os pressupostos processuais.

No que tange à matéria ligada à classificação das acções quanto ao fim, vimos que conforme o
artigo art. 4 do CPC, elas podem ser declarativas ou executivas. Aquelas desdobram-se em
acções declarativas de simples apreciação, de condenação ou constitutivas, conforme os casos.

Nas acções declarativas o autor procura que o tribunal declare a solução, com fundamento no
direito substantivo, para um determinado caso.

O tribunal proferirá uma decisão em que declara, no caso concreto, a existência ou inexistência
do direito invocado, ou de certo facto.

Francisco considera-se proprietário de um determinado imóvel por este lhe ter sido vendido por
António. Por sua vez, Ana diz-se proprietário do mesmo imóvel, alegando que o comprou ao
mesmo António. Na acção que o Francisco propõe pede que o tribunal declare que é ele o
proprietário do imóvel em questão.

As acções executivas têm por finalidade a realização coerciva das providências destinadas à
efectiva reparação do direito violado.

Nos termos do artigo 817 CC, não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o
direito de executar o património do devedor. Através da penhora dos bens do devedor e da
respectiva venda será realizada a importância com que o credor será pago.

A distinção equivale à diferença entre o simples declarar e executar, entre o dizer e o fazer. No
processo declarativo é declarada a vontade concreta da lei, visando o executivo a atuação dessa
vontade.

***

Falamos também dos pressupostos processuais, onde destacamos a personalidade e capacidade


judiciária (art. 5 e ss do CPC), a legitimidade as partes (art. 26 e ss do CPC) e a competência do
1
A elaboração desta ficha e das outras subsequentes visa simplesmente auxiliar o jurista na compreensão das
matérias descritas. Por serem fichas meramente orientadoras, nelas não se segue o rigor técnico-científico que
normalmente se podia observar. Além disso, a consulta das fichas não afasta, de modo algum, a necessidade de
consulta de bibliografia e legislação relevante.

1
Tribunal (art. 61 e ss do CPC, com ênfase, no que à competência territorial diz respeito, ao artigo
73 e ss do CPC).

No domínio deste pressuposto o processual relativo à competência do Tribunal, aproveitamos


distinguir a competência da alçada, onde esta é o valor dentro do qual o Tribunal julga sem
admissibilidade de recurso ordinário2 enquanto a competência é o poder fraccionado ou repartido
entre os tribunais para conhecer de determinados casos. É na competência em razão do valor
onde há mais confusão com a alçada.

Algumas notas breves respeitantes a esta matéria:

i) Sobre a alçada, confira-se o art. 38 da Lei da Organização Judiciaria (LOJ) 3, aprovada


pela Lei 24/2007, de 20 de Agosto, na redacção dada pela Lei 11/2018, de 3 de Outubro.
ii) Quanto ao salario mínimo nacional (SMN), o art. 118 da LOJ nos remete àquele que
vigora na função pública, que, em 2020, equivale a 4.467.75MT, sendo este o valor
relevante, quer para a determinação do valor da alçada, quer no que tange à competência
do tribunal quanto ao valor.
iii) A alçada do Tribunal Judicial da Província (TJP) é de 50 vezes o SMN, o que,
actualmente, corresponde a 223.387,50MT. Assim, todo o processo que der entrada
actualmente (com aquele SMN ainda em vigor) num TJP, enquanto o valor da causa não
for superior a 223.387,50MT, decidido o processo, não haverá admissibilidade de recurso
ordinário, pois, diz-se que aquele valor da causa está dentro da alçada do TJP.
iv) A alçada do Tribunal Judicial de Distrito (TJD)4, é de 25 vezes o SMN, o que
corresponde, actualmente, a 111.693,75MT. Assim, se um processo der entrada num TJD
com valor da causa inferior àquele valor de 111.693,75MT, uma vez julgado e deicídio o
processo, não haverá admissibilidade de recurso ordinário.
v) No que tange às formas do processo, podemos encontrar o processo comum ou especial,
conforme o art. 460 do CPC. O processo especial aplica-se aso casos expressamente
designados na lei (confira-se vários processos especiais, nos artigos 944 e ss do CPC). O
processo comum é uma categoria residual, isto é, aplica-se a todos os casos a que não
corresponda processo especial. Isto significa que perante qualquer situação factual, o
primeiro passo para a identificação da forma de processo é procurar saber se o assunto
cabe ou não num processo especial, não cabendo, então será aplicável a categoria residual
que é de processo comum.
vi) O processo comum pode ser comum ou ordinário, conforme o artigo 462 do CPC.
vii) A alçada do tribunal também tem relevância nesta matéria, pois, o artigo 462 do CPC diz
que se o valor da causa exceder a alçada do TJP, emprega-se o processo ordinário, se não
a exceder, empregar-se-á o processo sumário. Por outras palavras, se estivermos perante
um processo cujo valor da causa esteja, neste momento, acima de 223.387,50MT (alçada

2
Obviamente que nada obsta, reunidos os respectivos requisitos legais, que se impugne a decisão por meio de um
recurso extraordinário.
3
A LOJ foi revista pelas Leis nrs. 24/2014, de 23 de Setembro e 11/2018, de 3 de Outubro.
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Recordar que já não há distinção entre TJD de 1ª e 2ª classes, conforme as alterações introduzidas à LOJ, pela Lei
nr. 11/2018, de 3 de Outubro.

2
do TJP), deverá empregar-se a forma de processo comum ordinário; enquanto que, se for
abaixo daquele, empregar-se-á a forma de processo sumário.
viii) É, uma vez mais, importante que se preste atenção ao valor da causa (valor
atribuído pelo autor à causa, cujas regras da sua determinação constam dos artigos 305 e
ss do CPC.
ix) Uma vez mais, há que recordar que não se deve confundir a alçada da competência.
x) Os arts. 73 e 78, ambos da LOJ, atento à redacção em vigor, portanto, dada pela Lei nr.
11/2018, de 3 de Outubro (particularmente na eliminação da distinção entre TJD de 1ª e
2ª classes), dispõem sobre a competência do TJP e TJD, respectivamente.
xi) O art. 78 da LOJ, vigente, estabelece que os TJD têm competência para julgar até 100
vezes o SMN, o equivalente a 446.775,00MT. Portanto, actualmente, os TJD tem
competência para julgar acções até aquele valor. Isso não se deve confundir com o valor
da alçada de um TJD que, conforme já o dissemos, corresponde actualmente a
111.693,75MT.
xii) Dito por outras palavras, o TJD tem poder, tem competência para julgar acções cuja
valor da causa não exceda 446.775,00MT, mas, se tal valor da causa for inferior a
111.693,75MT, uma vez decidido o processo, não haverá admissibilidade de recurso
ordinário. Se o valor da causa for superior à alçada, haverá, sim, admissibilidade de
recurso ordinário.
xiii) Relativamente ao TJP, não há muitas dúvidas, pois, em termos práticos, tudo o
que não for da competência do TJP, quanto ao valor, caberá ao TJP.
xiv) É importante ter-se em conta, também, a matéria relacionada à violação das regras
sobre a competência, isto é, o que sucede, por exemplo, se intentar-se, num TJP, uma
acção relacionada com expulsão de fum funcionário público, ou ainda, intentar-se uma
acção no valor de 1.000 000,00MT num TJD. Estes aspectos relacionam-se à
incompetência absoluta e incompetência relativa, cujo regime consta do art. 101 e ss do
CPC. Particular relevância, nesse domínio, assume a questão da legitimidade e
oportunidade para a arguição de cada uma das incompetências.

II. Formalismo do processo ordinário de declaração


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Todas aquelas questões acima estudadas, e outras que, por economia de tempo não foram
abordadas com profundidade, tais como, aspectos relacionados à introdução e noções de
processo, a importância do processo, a proibição da autodefesa, caracteres, fontes e princípios do
processo civil, interpretação e integração da lei processual, aplicação da lei processual no espaço
e no tempo, se levantam no processo mas devem ser ponderadas e resolvidas antes da propositura
da acção.

É, antes da propositura da acção, por exemplo, que se resolve o problema de quem deve propor a
acção, em que tribunal deverá propor a acção, qual a espécie da acção, qual a forma da acção,
deverá ou não constituir-se advogado, etc.

Vimos, pois, o processo de uma forma estática, mas o que importa agora é a análise dinâmica do
processo, o que está de acordo com a própria etimologia da palavra processo, que é caminhar ou
andar para frente.

A análise do processo no encadeamento cronológico dos actos que se praticam no decurso da


acção, faz-se mediante o estudo do seu andamento, que comummente, se diz marcha do
processo.

O processo inicia-se com a propositura da acção, isto é, com a demanda, que é o acto pelo qual o
autor provoca a intervenção do tribunal para conseguir a tutela do direito que se arroga.

Assim, com a demanda constitui-se a relação jurídica processual ou, como também se diz,
instância. Proposta a acção em tribunal, estabelece-se uma relação entre o autor, sujeito
interessado na demanda e o tribunal, sujeito imparcial. Só com o desenrolar do processo é que o
terceiro sujeito do processo, igualmente interessado, intervém, completando assim a relação
jurídica processual.

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III. Fases do processo ordinário de declaração

Na sua tramitação normal, o processo declarativo ordinário (e também o processo sumário), pode
ser dividido em cinco fases:

a) Fase dos articulados (art. 467 a 507);


b) Fase do saneamento e condensação (art. 508 a 512);
c) Fase da instrução (art. 513 a 645);
d) Fase da audiência final (art. 646 a 657) e ;
e) Fase da sentença (art. 658 a 675).

Estudaremos as fases do processo ordinário por este ser o que constitui referência para as outras
formas de processo, conforme resulta do disposto no art. 463 nr.1 e 464. Conhecida a tramitação
do processo ordinário, com facilidade poderemos conhecer a tramitação dos restantes, bastando
atentar naquilo em que diferem.

1. FASE DOS ARTICULADOS

Na fase dos articulados cada uma das partes apresenta os seus argumentos, quer de facto, quer de
direito, terminando por solicitar a tutela jurisdicional, pedindo que a acção seja julgada
procedente, por parte do autor, e julgada improcedente, por parte do réu.

1.1 – Articulados (art. 151 e 152)

São normalmente dois os articulados: a petição inicial, onde o autor formula a sua pretensão
indicando os seus fundamentos e a contestação, onde o réu defende-se, directa ou indirectamente.
Pode, também, se a acção for de simples apreciação negativa, se o réu tiver deduzido pedido (s)
contra o autor (através do que se designa reconvenção) ou se o réu tiver arguido excepções,
existir resposta à contestação, mas apenas para o autor responder aos factos constitutivos que o
réu tenha alegado e para alegar factos impeditivos ou extintivos do direito invocado pelo réu (art.
502, nr.3) ao pedido reconvencional (art. 504) e às excepções deduzidas pelo réu (art. 502, nr.1).

Além dos articulados normais, que podem ser dois a três, pode haver ainda lugar,
excepcionalmente, aos chamados articulados supervenientes (art. 506).

São as peças escritas em que as partes introduzem a lide, expondo os fundamentos da acção e da
defesa e formulando os pedidos correspondentes (art. 151 nr.1).

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Estas peças tomam a designação de articulados porque, em princípio, é obrigatória a dedução por
artigos dos factos que interessam à fundamentação do pedido ou da defesa – art.151, nr.2.

1.2- Petição inicial

É o articulado com que o autor propõe a acção, formulando um pedido de tutela jurisdicional,
expondo as razões de facto e de direito em que a fundamenta.

Esta peça consiste no requerimento em que o autor, dirigindo-se ao tribunal competente, indica a
forma do processo que pretende instaurar, identifica as partes, expõe os factos e as razões de
direito que servem de fundamento à acção (causa de pedir), formula o pedido, indica o valor da
causa, e, caso se revele necessário, junta os documentos que sustentam os factos articulados,
apresenta o rol de testemunhas, podendo, igualmente requerer outras provas.

A petição inicial estrutura-se em quatro partes fundamentais: o endereço, o cabeçalho ou intróito,


a narração e a conclusão.

1- Com o endereço – art. 467 nr 1, alínea a) 1ª parte – designa-se o tribunal onde a acção é
proposta. Esta designação pressupõe a prévia determinação do tribunal competente para
apreciar o pleito, o que se faz analisando as regras da competência internacional e da
competência interna em razão da matéria, hierarquia, território e valor.
2- O cabeçalho - art. 467 nr 1, alínea a) 2ª parte e alínea b), abrange a identificação das
partes e a indicação da forma do processo. A identificação das partes faz-se pela
indicação dos nomes, domicilio (pessoa singular) ou sede (pessoa colectiva) e, sendo
possível, a profissão e local de trabalho. Em alguns casos é conveniente indicar o estado
civil das partes, para determinar a capacidade judiciária e a legitimidade, bem como a
idade, naquelas situações em que a parte ou as partes sejam solteiras (por causa da
determinação da capacidade judiciária).
3- A narração -art. 467 nr 1, alínea c) – é a exposição dos factos e das razoes de direito que
servem de fundamento à acção. O autor deve expor de forma clara e concreta os factos
que servem de base à sua pretensão, indicando o modo, o local e o tempo em os factos
arrolados ocorreram.
4- A conclusão - art. 467 nr 1, alínea d)- consiste na formulação do pedido, o qual expressa
a tutela jurisdicional pretendida pelo autor.

Para além daqueles elementos essenciais, existem outros que, embora complementares art. 467
nr 1, alínea e) e nr.2 – tem relevância prática muito importante: o valor da causa e a junção de
provas ou rol de testemunhas.

Se o autor não indicar o valor da causa, pode ser convidado a fazê-lo, sob pena de indeferimento;
se não arrola as testemunhas, não o pode fazer mais tarde (art.512 e 619 nr.2).

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Por último, é necessária a assinatura da petição pelo autor ou pelo seu patrono, o que confere
autenticidade ao documento, sendo que, no caso de assinatura pelo patrono, dever-se-á juntar a
respectiva procuração forense e indicar o número de carteira profissional.

1.3- Propositura da acção

Após a elaboração da petição inicial, a mesma deve ser apresentada em juízo para se dar início à
acção ou instância, a qual, nos termos do nr.1 do art. 267, inicia-se pela proposição da acção,
considerando-se esta proposta, intentada ou pendente logo que seja recebida na secretaria a
respectiva petição inicial.

A petição inicial pode ser recusada pela secretaria (art.213), quando estiver errado o endereço,
quando falte a assinatura, pois, esta garante a sua autenticidade, quando falte a identificação das
partes ou a indicação do valor da causa (art.314, nr.3).

Recebida a petição pela secretaria, após o despacho do juiz para registo e autuação, o processo é
concluso ao juiz para ordenar a sua distribuição. A pedido do autor, se não estiver isento, deve
emitir-se guias referentes ao pagamento de custas judiciais, neste caso, o pagamento do preparo
inicial, nos termos do art.134 do Código de Custas Judiciais (CCJ).

2- Despacho liminar

Conclusos os autos ao juiz, em função do que resultar da petição inicial e dentro doas limites do
que o juiz pode conhecer, o magistrado profere o despacho liminar que pode consistir em:

- indeferimento liminar;

- convite ao aperfeiçoamento;

- ou citação;

2.1- Indeferimento liminar

O juiz deve indeferir liminarmente a petição inicial, ao abrigo do art. 474:

a) Quando se reconheça que a petição é inepta, nos termos do art. 193;

b) Quando ocorram de forma manifesta excepções dilatórias, de que o juiz deva conhecer
oficiosamente, à excepção da alínea e), do art. 494;

c) Quando a acção for proposta fora do tempo (caducidade);

d) Nos termos do nr.2 do art. 152, in fine.

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2.1.1- Atitudes do autor perante o indeferimento liminar

a) Conformar-se com o despacho, não fazendo nada mais;

b) Apresentar nova petição dentro do prazo de cinco (5) dias (art.476) ou apresentar uma nova
acção fora daquele prazo, não se aproveitando, neste caso, do disposto no nr.2 do art.476.

c) Não se conformar com o despacho de indeferimento, interpor o recurso de agravo (este é


sempre admissível independentemente do valor da causa) no prazo de 8 dias (art. 475, 685 nr.1, e
687 nr.1). Interposto o recurso, o juiz que indeferiu a petição pode reparar o agravo, ou seja,
alterar a decisão inicial ou sustentar o agravo, isto é, manter a decisão de indeferimento. Neste
segundo caso, o recurso vai subir para o tribunal superior, onde pode ser julgado procedente,
dando razão ao autor, ou improcedente, dando razão ao juiz. Decidido o recurso, o processo
baixa ao tribunal da primeira instância para, em conformidade com o decidido na segunda
instância, praticarem-se os actos processuais ao caso aplicáveis, como resulta do nr.5 do art. 475.

2.2- Convite ao aperfeiçoamento

O juiz convida o autor a corrigir a sua petição quando não haja razões para indeferir
liminarmente mas que a mesma tenha deficiências ou irregularidades que possam comprometer o
êxito da acção. Os vícios que podem levar o juiz a convidar o autor a corrigir a petição sao:

- a falta de indicação do valor da causa;

- uma incompleta identificação das partes;

- a falta de junção de documentos;

- etc.

O prazo para tal pode ser o supletivo (art.153).

2.2.1- Atitudes do autor perante o convite ao aperfeiçoamento

- interpor recurso de agravo no prazo de 8 dias (arts. 685 nr.1, 687 nr.1 e 742 nr.1 CPC);

-apresentar uma nova petição no prazo indicado pelo juiz corrigindo os vícios de que a mesma
enferma (art.477).

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2.3- Citação

Sempre que não haja lugar a indeferimento liminar ou convite ao aperfeiçoamento, ou ainda
quando este último tenha se verificado e o autor corrigido a sua petição, é ordenada a citação do
réu (art.478).

A citação do réu é feita nos termos do art. 228 a 263. Com a citação, concretiza-se o princípio do
contraditório (art.3), permitindo-se que a pessoa contra quem foi proposta a acção possa vir a
juízo se pronunciar, apresentando a sua defesa.

A citação difere-se da notificação embora ambas tenham em vista ao chamamento de uma


pessoa.

2.3.1- Atitudes do réu perante a citação

- interpor recurso de agravo do despacho de citação no prazo de 8 dias (arts. 479 e 685);

- contestar (art.486);

- não contestar (revelia do réu – art.484).

2.3.2- Efeitos da citação

Podem ser substantivos ou processuais.

Efeitos substantivos da citação são a interrupção da prescrição (art.323 nr.2 CC), a cessação da
boa-fé do possuidor - art.1260, nr.2 do CC e 481, alínea a – e a constituição do devedor em mora
(art.805 do CC), naqueles casos em que se trata de obrigações sem prazo (obrigações puras).

Efeitos processuais são as que tornam estáveis, mas não imutáveis, os elementos essenciais da
causa (art.268), proíbe o réu de propor contra o autor uma acção destinada à apreciação da
mesma questão jurídica, situação que, sendo violada, pode causar a litispendência - art. 481,
alínea c), 497, 498 e 499.

3- Contestação

A defesa do réu, após ter sido regularmente citado, é feita, por regra, através da contestação.
Citado para os termos da acção, o réu pode defender-se, apresentando a sua contestação ou não
se pronunciar.

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3.1 -Modalidades da contestação

Distingue-se a defesa propriamente dita considerada contestação – defesa, a contestação


reconvenção, a contestação por junção de documentos e a contestação por negação.

3.1.1- Contestação defesa

Nesta modalidade da contestação, o réu limita-se a contrariar a pretensão deduzida pelo autor,
directa ou indirectamente, isto é, opõe – se ao pedido formulado pelo autor. A contestação defesa
pode ser contestação defesa por impugnação e contestação defesa por excepção.

3.1.1.1- Defesa por impugnação

Na defesa por impugnação, o réu ataca frontalmente o pedido, quer contradizendo os factos
articulados pelo autor, quer afirmando que esses factos não podem produzir o efeito jurídico
pretendido pelo autor (art. 487 nr.2, 1ª parte).

A defesa por impugnação é toda a defesa directa, aquela que ataca de frente o pedido, assumindo
duas situações possíveis: contradizendo os factos articulados pelo autor como constitutivos do
direito alegado, isto é, não aceitando os factos articulados pelo autor ou afirmando que os factos
articulados pelo autor não podem produzir o efeito jurídico que ele pretende, ou seja, põe em
causa a qualificação que o réu atribui aos factos articulados.

3.1.1.2- Defesa por excepção. Excepções dilatórias e excepções peremptórias

Na defesa por excepção a defesa é lateral ou de flanco, pois o réu alega factos que impedem o
tribunal de conhecer o mérito da causa, conduzindo à absolvição da instância ou à remessa do
processo para outro tribunal, ou aduzindo factos que impedem, modificam ou extinguem o
direito invocado pelo autor, absolvendo o réu do pedido (art.487, nr2, 2ª parte).

Neste tipo de defesa, o réu traz ao processo factos novos susceptíveis de gerar a absolvição da
instância, a remessa do processo para o tribunal competente ou de impedir, modificar ou
extinguir o direito que o autor pretende valer com a propositura da acção. Quando o réu é
absolvido da instância, o tribunal não chega a apreciar o mérito da causa, pelo que nada obsta a
que venha a propor a mesma acção, nos termos do art.289.

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Tendo em conta os efeitos produzidos, temos:

As excepções dilatórias consistem na arguição de quaisquer irregularidades ou vícios de


natureza processual que impedem, se não forem sanadas nos casos admitidos na lei (art.494,
nr.2), a apreciação do mérito da causa (art.487, nr.2, in fine e art.493, nr.2). Umas excepções
dilatórias dão lugar à absolvição da instância (art.288) e outras (incompetência do tribunal) dão
lugar à remessa do processo para o tribunal competente (arts.105 nr.2 e 111, nr.3).

As excepções peremptórias consistem na alegação de factos impeditivos, modificativos ou


extintivos do efeito jurídico visado pelo autor e tem como consequência a absolvição, total ou
parcial, do pedido (art. 487, nr.2 in fine e o art. 493, nr.3). o CPC enumera algumas das
excepções : o caso julgado e a prescrição. Para além destas, são peremptórias, ainda, o
pagamento (art.762 CC), a novação da obrigação (art.857 CC), o erro (art.247 CC), o dolo
(art.253 CC), a coação (art.255 CC), e, em geral, qualquer vício ou circunstancia que conduza à
ineficácia, à anulação, à nulidade ou à inexistência de um negócio jurídico.

4- Ónus de impugnação especificada

Implica que na contestação o réu deve tomar posição definida perante todos os factos articulados
na petição, sendo que se não tomar posição, considera-se que são admitidos por acordo (art.490,
nr.1, 1ª parte).É a confissão tácita, que conduz a que os factos sejam considerados assentes e
provados.

Mas há excepções: o art.490 indica que não se tem por admitidos os factos que se encontram em
manifesta oposição com a defesa considerada no seu conjunto, os factos sobre os quais não seja
possível confissão (art.354 CC) e, ainda, os factos que só possam ser provados por documento
escrito (art.220 do CC).

Um caso especial de ónus de impugnação especificada acha-se previsto no art.491, quando se


tem por base um título de obrigação assinado pelo réu.

A lei não permite a contestação por negação, a qual consiste na mera negação dos factos
articulados pelo autor.

5- Contestação-reconvenção

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Em regra, na contestação o réu defende-se dos factos articulados pelo autor, mas nada impede
que se aproveite da acção e deduza pedidos autónomos contra o autor. Há aqui um contra-ataque
do réu, o que significa que há uma nova acção dentro do mesmo processo, ou ainda, um
cruzamento de acções. (art.501).

Os requisitos da reconvenção podem ser:

- processuais ou adjectivos – o tribunal da acção é também competente para as questões


deduzidas na reconvenção (art.98), não importando que a não tenha em razão do valor e do
território, isto é, desde que não haja incompetência absoluta em relação ao novo pedido
formulado pelo réu, então pode deduzir-se pedido reconvencional.

A forma do processo tem que ser a mesma do pedido do autor, mas pode aplicar-se o art.31 nrs.1
e 2.

- substantivos ou adjectivos – a lei exige que entre o pedido principal e o pedido reconvencional
deve verificar-se uma determinada conexão. A lei distingue 4 situações indicadas todas no
art.274 nr.2.

6- Contestação por junção de documentos

Não está especialmente prevista na lei mas enquadra-se no espírito desta. O réu limita-se a juntar
documentos ao processo, sem acompanhar com qualquer alegação fáctica escrita sobre os factos
próprios a que o documento se refere.

7- Organização da contestação

Aplicam-se, com as necessárias adaptações, o disposto em matéria da petição inicial.

8- Revelia do réu (falta de contestação)

Pode ser operante ou inoperante

Revelia operante – implica a confissão dos factos articulados pelo autor (art.484, nr.1) e ocorre
quando o réu, apesar de regularmente citado na sua própria pessoa, pelo menos haja juntado
procuração e mandatário no prazo da contestação.

Revelia inoperante – a cominação resultante da falta de contestação está sujeita a algumas


limitações, pois apesar de o réu não ter contestado e não obstante estarem verificados os

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requisitos impostos para a ocorrência da revelia, nem sempre se consideram confessados os
factos articulados pelo autor (art.485).

Este tipo de revelia não tem os mesmos efeitos na tramitação processual: no caso de pluralidade
de réus – art.485 alínea a), - como um dos réus contesta, o co-réu não contestante aproveita-se da
contestação apresentada pelo contestante, mas a tramitação não irá sofrer qualquer alteração pois
pode haver lugar aos demais articulados e às fases processuais seguintes.

9- Articulados eventuais

Notificado da apresentação da contestação (art.492),o autor pode apresentar resposta à


contestação no prazo de 10 dias.

10- Articulados supervenientes

Os articulados enumerados devem ser apresentados nos termos e dentro dos prazos constantes da
lei. Pode acontecer, porém, que uma das partes tome conhecimento de um facto relevante depois
de decorridos os prazos para apresentar o seu articulado ou mesmo que um facto ocorra depois
da apresentação dos mesmos.

Nestes casos, a lei admite excepcionalmente, a possibilidade de apresentação, mais tarde, dos
designados articulados supervenientes nos termos do art. 506 do CPC.

Bibliografia básica usada e/ou recomendável para o aprofundamento da matéria.

1- Timbane, Tomás. Lições de Processo Civil I. Escolar Editora.Maputo.2010;


2- Amaral, Jorge Augusto Pais. Direito Processual Civil. Almedina. 8ª
Edição.Lisboa.2009;
3- Varela, Antunes, et all. Manual de Processo Civil. 2ª Edição. Coimbra Editora. Lisboa.
1985;
4- Mondlane, Carlos Pedro. Código de Processo Civil. Anotado e Comentado. Escolar
Editora. 1ª Edição. Maputo. 2014;

Maputo, 13 de Janeiro de 2022

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