A obra A República2 tem por objetivo a construção da cidade justa ideal. Quem
deve governar sobre essa cidade é o rei-filósofo 3. Só o filósofo deve governar, porque é o
único capaz de conhecer a verdade sobre os entes e, por isso, manter a ordem4.
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Mestrando em Filosofia pela UFSM – Universidade Federal de santa Maria – RS.
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O termo grego que nomina os dez livros que compõem o diálogo é “Politéia”, que etimologicamente
significa “constituição” ou “forma de governo”, de uma Pólis ou cidade-estado. Trata, pois de “tudo o que diz
respeito à vida pública de um estado, incluindo os direitos do cidadão que o constituem” (SANTOS, Antonio
Raimundo dos. “Doxa” e “Episteme” na República de Platão. Revista de Filosofia. Curitiba: Educa, V.7
n.8, p. 15 – 22, abr/ 1994, p. 15 – 22).
3
“Não cessarão os males do gênero humano antes de alcançar o poder a raça dos verdadeiros e autênticos
filósofos ou que, em virtude de alguma determinação divina, a filosofia seja realmente praticada por aqueles
que detêm o poder no Estado” (PLATÃO. A República. Trad. Elza Moreira Marcelina. São Paulo: Ática,
1989, p. 19).
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O filósofo “é aquele capaz de atingir aquilo que se mantém do mesmo modo, ou seja, o que se mantém
sempre idêntico e não o múltiplo e variável” (CASAGRANDE, Lino. O Sentido da Alegoria da Caverna
em Platão. Conjectura. Ed. da Universidade de Caxias do Sul, V. 4, n 1/2, p. 108 – 125, jan/dez 1999, Apud.,
Popper, p. 113).
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No livro VI, Platão apresenta os graus do conhecer, que são modos específicos da
realização do conhecimento5. No livro VII, aparece o “mito da caverna 6”, com o intuito de
resolver duas questões do conhecimento: a concepção baseada na tese de Heráclito,
segundo a qual tudo está em constante devir, mudança, e a concepção imobilista de
Parmênides, segundo a qual o que não é não pode vir a ser e o ser não pode vir a não ser. A
solução pode ser antecipada:
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O conhecimento platônico, “não é um apenas sair da doxa, mas também um processo de purificação
(katarsis). Um processo não confinado no tempo breve de uma vida, visto que a alma se reencarna várias
vezes até a última libertação, quando atinge o Sumo Bem” (RIBEIRO, Eugenio. O Mito da Caverna: uma
contribuição a Paidéia grega. Revista da Febe. Brusque: Febe, n.5, 2000, p. 39 - 42). A alma dialética “é
aquela que apreende o logos do ser (ousia) de cada ente” (OLIVEIRA, Nythamar Fernandes de. A
Imortalidade da Alma na República. Revista de Filosofia. Curitiba: Educa, V.7, n.8, p. 41 – 46, abr/ 1994,
p. 41- 46).
6
A caverna “simboliza o próprio corpo humano que envolve a alma” (CASAGRANDE, op. cit., p. 111).
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No que se refere à dificuldade Erística do conhecer, Sócrates, no Mênon, diz: “Vês quão erístico é este
argumento que estas urdindo: que, pelo visto, não é possível ao homem procurar nem o que conhece nem o
que não conhece? Pois nem procuraria aquilo precisamente que conhece – pois conhece, e não de modo
algum preciso para um tal homem a procura - nem o que não conhece – pois nem sequer sabe o que deve
procurar” (PLATÃO. Mênon. Trad. Maura Iglesias. Ed. PUC – Rio. Rio de Janeiro: Loyola, 2001, p. 49).
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O próprio nome de “sofista” que significa “sábio”, desviado do seu sentido original, tornou-se sinônimo de
possuidor de um falso saber, não procurando senão enganar, e fazendo, para isso, um considerável uso do
paralogismo [...], chamará sofista ao que tem da sabedoria a aparência, não a realidade, e o “sofisma” será
sinônimo de falso raciocínio (DHERBEY, Gilbert Romeyer. Os sofistas. Trad. João Amado. Edições 70,
Lisboa: Latgraf, 1999, p. 09). Para um estudo dos sofistas (Cf., p. ex, BRUN, J. Os Pré - Socráticos. Trad.
Armindo Rodrigues. Rio de Janeiro: Edições 70, 1991) e (GUTHRIE, W.K.C. Os Sofistas. Trad. João
Rezende Costa. São Paulo: Paulus, 1995).
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Sofismas são dificuldades como: “não se pode procurar e conhecer o que não se conhece porque, mesmo
encontrando-o, não poderia reconhecê-lo; por outro lado, não tem sentido procurar o que já se conhece,
justamente por que já é conhecido” (REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. Volume II. São Paulo:
Loyola, 1994, p. 153).
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“A imortalidade da alma deve ser elucidada por um desenrolar textual (dénouement) do diálogo como um
todo” (OLIVEIRA, op. cit., p. 41- 46).
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A Forma “é a causa ou razão de ser da coisa, razão pela qual uma coisa é o que ela é; é o ato ou a atualidade
da coisa mesma, isto é, o começo e o fim de seu devir” (ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia.
Trad. Alfredo Bossi. Mestre Jou: São Paulo, 1970, p. 446).
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Platão referindo-se ao bem enfatiza: “confessa também que as coisas inteligíveis não devem ao bem sua
inteligibilidade, mas devem-lhe ainda o ser e a essência, conquanto o bem não seja de forma nenhuma a
essência, mas esteja muito acima desta em dignidade e em poder” (PLATÃO. A República. Clássicos
Garnier. Trad. J. Guinsburg. 2° ed. São Paulo: Edipe, 1965, p. 96).
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A dialética “é proposta como meio para a formação de conceitos universais que expressem a essência dos
objetos da realidade” (SANTOS, op. cit., p. 15 - 22).
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fim último. A realidade sensível é o mundo da matéria e da pura experiência. Neste mundo,
não é possível o conhecimento verdadeiro, pois as coisas sensíveis estão em constante
movimento, transformação. No plano inteligível, o conhecimento é possível e se dá através
da pura intelecção, pois as Formas são imutáveis e simples.
O conhecimento da realidade sensível é opinião (dóxa) e o da realidade
inteligível, ciência (epistéme). O conhecimento da realidade sensível (dóxa) se subdivide
em imaginação (eikasía) e crença (pístis). A eikasía corresponde ao conhecimento das
sombras, isto é, capta apenas as imagens sensíveis das coisas. Para Platão, as imagens são:
“as sombras, depois os reflexos que avistamos nas águas, ou à superfície dos corpos
opacos, polidos e brilhantes, e todas as representações similares” (PLATÃO, 1965, p. 99).
Noutro sentido, a pístis está em correlação com o conhecimento das coisas e dos
próprios objetos sensíveis. A crença, pois “corresponde aos objetos representados por tais
imagens, quero dizer, os animais que nos circundam as plantas e todas as obras de arte”
(PLATÃO, 1965, p. 99).
Logo, para Platão a imaginação (eikasía) e a crença (pístis) são dois modos ou
graus de captar o mundo sensível e em nenhum momento expressam as verdades supremas
das coisas. A dóxa é, por sua vez, uma realidade intermediária, uma mescla do sensível
entre ser e não ser entre a ciência e a ignorância e, por isso, não se identifica com o
conhecimento verdadeiro. A situação dos homens que se encontram neste mundo, ou seja,
na condição de ignorância, reflete sua condição: a dóxa. Platão expressa essa realidade no
mito da caverna:
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Esta divisão aparece no livro VI do diálogo A República.
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REFERÊNCIAS BIBLIOFRÁFICAS
ABBAGNANO, Nicola. Dicionário de Filosofia. Trad. Alfredo Bossi. Mestre Jou: São
Paulo, 1970.
BRUN, J. Os Pré - Socráticos. Trad. Armindo Rodrigues. Rio de Janeiro: Edições 70,
1991.
DHERBEY, Gilbert Romeyer. Os sofistas. Trad. João Amado. Edições 70, Lisboa: Latgraf,
1999.
GUTHRIE, W.K.C. Os Sofistas. Trad. João Rezende Costa. São Paulo: Paulus, 1995.
PLATÃO. A República. Clássicos Garnier. Trad. J. Guinsburg. 2° ed. São Paulo: Edipe,
1965.
PLATÃO. A República. Trad. Elza Moreira Marcelina. São Paulo: Ática, 1989.
PLATÃO. Mênon. Trad. Maura Iglesias. Ed. PUC – Rio. Rio de Janeiro: Loyola, 2001.
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REALE, Giovanni. História da Filosofia Antiga. Volume II. São Paulo: Loyola, 1994.
REALE, Giovanni; ANTISERI, Dario. História da filosofia. São Paulo: Paulus, 2003.