Você está na página 1de 3

ANDRÉ GUSTAVO DE CAMPOS

PROJETO DE GRADUAÇÃO EM ARTES VISUAIS I

Pequenas reflexões

Imagem I: Rizoma

(....) diferentemente das árvores ou de


suas raízes, o rizoma conecta um
ponto qualquer com outro ponto
qualquer e cada um de seus traços
não remete necessariamente a traços
de mesma natureza; ele põe em jogo
regimes de signos muito diferentes,
inclusive estados de não-signos. O
rizoma não se deixa reconduzir nem
ao Uno nem ao múltiplo. Ele não é o
Uno que se torna dois, nem mesmo
que se tornaria diretamente três,
quatro ou cinco etc.

Pag. 14. Introdução: Rizoma Gilles


Deleuze e Félix Guattari Texto extraído
de Mil Platôs (Capitalismo e Esquizofrenia) Vol. 1 Editora 34, 1ª Ed. (1995)

É difícil dizer com precisão em que momento na minha produção poética surgem
essas estruturas que futuramente fui conhecer como Rizomas. De fato não estava
pensando em nenhum tipo de conceito no início, eram apenas esses desenhos de
fruição do traço, sem nenhuma preocupação com forma ou justificativas. Dado um
certo momento percebi que minha produção se vê tomada por elas, começo a criar
diferentes tipos, com direções e tamanhos variados. Certo dia uma amiga que
também é artista me viu desenhando essas formas e perguntou se eu conhecia o
conceito de Rizoma, discutido por Deleuze e Guattari. A verdade é que nunca tinha
ouvido falar sobre, mas fiquei instigado a entender qual a relação com minha
produção. Passei então a pesquisar sobre o que se tratava e isso abriu uma porta,
ou melhor dizendo, uma represa toda de ideias e conexões que não havia
percebido.
Entender melhor as diferentes formas de aplicação de métodos rizomáticos, nos
inúmeros campos em que se aplicam, me fez enxergar as relações com outros
trabalhos que não necessariamente tratam desse assunto.
Tinha a sensação de distância entre minha produção de desenho e de pintura, como
se existissem paralelamente uma da outra, porém, assim como um determinado
ponto de uma rizoma se interliga com qualquer outro independentemente da
distância , minha produção não se diferenciava disso. Por mais distante visualmente
falando, que possa parecer um trabalho de outro, existem ligações conceituais e
muitas vezes do inconsciente que nem sempre são de cara perceptíveis.
Entender que minha produção poética funciona de forma rizomática foi fundamental
para enxergar que tudo que faço está interligado por um fio condutor indissociável, e
que um trabalho influencia o outro, não linearmente mas de formas fragmentadas e
reorganizadas.
Percebo que tudo que venho produzindo se trata de uma grande Rizoma, seja a
linguagem que for.
Trazendo para o agora, me interessa olhar minha própria produção até aqui mas
com esse olhar voltado para encontrar signos e pontes que se repetem, tentar achar
ligações que tragam a tona reflexões sobre o todo, usar as conexões entre cada
trabalho para entender como funcionam autonomamente e em grupo.

Imagem II: Fragmento do livro de artista


Salto Alto

Este livro é composto por 8 desenhos de


4 modelos diferentes. Produzido em 2019,
tem como ideia principal discutir
convenções e imposições ligadas ao
binarismo de gênero, tendo como veículo
condutor dessas reflexões o próprio salto.

Texto extraído do livro:

“Todos os dias levantamos de nossa cama,


colocamos uma roupa referente ao nosso
gênero e assumimos uma postura. Na fala,
nos gestos, no modo como caminhamos e
até mesmo como sentamos. Em todo
momento precisamos afirmar qual nosso
gênero. agir como tal, estamos em uma
constante performance. Os paradigmas relacionados à gênero vem causando um
desconforto geral nas pessoas. Padrões exigidos para uma afirmação dessa
performance diária incomodam aqueles que não se encaixam nas estruturas do
nosso sistema binário.Quem pode vestir um salto? certamente qualquer um que
tenha pés… Mas a realidade não é bem assim.
A partir de uma tentativa de rompimento com preceitos do feminino e masculino se
calca o livro de artista Salto Alto. Essa quebra busca poetizar algo que para
algumas pessoas pode ser um ínfimo adorno de beleza, mas que para outras se
torna um objeto de luta, de auto afirmação e resistência. Este livro, acima de tudo, é
um Manifesto para quem o lê possa se sentir convidado a se libertar das imposições
relacionadas a vestuário e gênero, Para que as pessoas se sintam livres a vestir o
que bem desejarem, agir como quiser agir e falar como quiser falar, certamente não
estará sozinhe.”
Imagem II: Herói Nacional

Curupira ou Caipora é um espírito da


mata que se materializa na imagem
de um humano com os cabelos
laranjas feito o fogo e os pés virados
as costas, para confundir lenhadores
ou pessoas que atentam contra a
fauna e flora. Ele é conhecido por
proteger as florestas do Brasil usando
diversos truques e artimanhas, em
alguns lugares acredita-se que se
transmuta a forma de qualquer ser
vivo. A feição em seu olhar é de quem
tenta chegar o mais profundo no olhar
do outro. Está em alguma mata
escura, tendo em suas mãos a
cabeça do então presidente Jair
Bolsonaro. A ideia para o Herói
Nacional inicia através de estudos a
respeito da colonização no Brasil. O
olhar sobre o Movimento Pau-Brasil
ocorrido dois anos após a Semana de
Vinte e Dois em 1924 marcou o
processo desse trabalho. As obras de Tarsila, Carnaval em Madureira (1924) e
Abaporu (1928) ajudaram a entender melhor que tipo de discurso estava delineando
naquele momento. Me vi diante de algo tangente ao apelo que ainda não passava
de um processo, acabei sentindo a necessidade de trazer ao mundo essas questões
que me orbitavam. Passei a pesquisar alguns mitos do folclore brasileiro, a exemplo
o Boitatá, a Yara, o boto cor de rosa. Figuras que compõem esse rico cenário. Me
interessava nessa pesquisa a imagem de quando pensamos nessas divindades, a
representação visual convencional. passei a entrevistar pessoas (moradores da
CEU Ufpel) que compunham diversas partes do território brasileiro. Nessa entrevista
questionava sobre a figura de determinados mitos, principalmente o Curupira. A
partir dos relatos, construí então uma representação do protetor das matas
brasileiras. De certa forma, em Herói Nacional o hermetismo presente acaba se
tornando secundário para abrir espaço à reflexões críticas da contemporaneidade.
Nesse campo me debruço sobre artistas e obras que funcionam como veículos
condutores de reflexões. Nesse sentido uma grande lista se abre, Paco Pomet,
Tarsila do Amaral, Lygia Clark, Paulo Pasta, Leda Catunda, Rosane Paulino, Maria
Lídia Magliani, Hélio Oiticica, José Leonilson, etc…

Você também pode gostar