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APOSTILA DE FILOSOFIA – 1º.

Ano(Professor: Armando Filho)

Acredita-se que o problema do mundo e de como tudo surgiu habita a mente dos seres humanos
desde épocas bastante remotas. Entre as primeiras explicações conhecidas encontram-se as
lendas e mitos de culturas muito antigas – egípcia, indiana, chinesa, grega, romana, persa, asteca
etc. – e suas respectivas cosmogonias ou cosmogêneses, isto é, exposições sobre a origem e
formação do universo.
O homem, admirado e perplexo, diante da natureza que o cerca, sem entender o dia, a noite, o
frio, o calor, o sol, a chuva, os relâmpagos, os trovões, a terra fértil ou árida, sem entender a
origem da vida, a morte e o seu destino, a dor e o bem e o mal, recorre aos mitos. Fabrica-os
como uma fonte explicação para o que vê e não consegue compreender. Forças sobrenaturais
são invocadas, deuses se revestem de formas humanas e se materializam nos mitos criados para
desvendar a realidade ainda desconhecida e enigmática.
O que é o mito
O mito é uma narrativa, não-crítica, fantástica ou mágica fundado na imaginação ingênua e na fé
incondicional de quem relata ou narra (caráter dogmático). Tem como propósito, afugentar os
sentimentos de medo, insegurança, impotência e inferioridade diante da imponência e da
assustadora força da natureza. É uma maneira de o homem garantir-lhe segurança e
tranqüilidade. Por conta destes sentimentos, resultantes do medo do desconhecido, o homem
acaba criando seus próprios deuses, demônios, monstros e todo um mundo repleto de seres
sobrenaturais, num esforço de oferecer a ele mesmo uma explicação do mundo a sua volta.
Assim,o mito, principalmente entre as sociedades tribais, é uma forma do ser humano de se situar
no mundo, isto é, de encontrar o seu lugar entre os demais seres da natureza. É um modo
ingênuo, fantasioso, anterior a toda reflexão e não-crítico de estabelecer algumas verdades que
não só explicam parte dos fenômenos naturais, ou mesmo a construção cultural, mas que dão,
também, as diretrizes da ação humana. Portanto, nasce do desejo de entender o mundo para
afugentar o medo e a insegurança. Nesse aspecto, mito é uma narrativa sobre a origem de
alguma realidade transmitida oralmente por alguém que foi escolhido pelas divindades para tal
função. Falam sobre a origem dos astros, da Terra, dos homens, das plantas, dos animais, do
fogo, da água, dos ventos, do bem e do mal, da saúde e da doença, da morte, dos instrumentos
de trabalho, das raças, das guerras, do poder, etc..
A palavra mito deriva de dois verbos: do verbo (contar, narrar, falar alguma coisa para os outros)
e do verbo (conversar, contar, anunciar, nomear, designar). Para os gregos, mito é um discurso
pronunciado ou proferido para ouvintes que recebem como verdadeira a narrativa, porque
confiam naquele que narra; é uma narrativa feita em público, baseada, portanto, na autoridade e
confiabilidade da pessoa do narrador. E essa autoridade vem do fato de que ele ou testemunhou
diretamente o que está narrando ou recebeu a narrativa de quem testemunhou os acontecimentos
narrados.
Quem narra o mito? Na Grécia antiga era o poeta-rapsodo. Quem é ele? Por que tem
autoridade? Acredita-se que o poeta é um escolhido dos deuses, que lhe mostram os
acontecimentos passados e permitem que ele veja a origem de todos os seres e de todas as
coisas para que possa transmiti-la aos ouvintes. Sua palavra - o mito - é sagrada porque vem de
uma revelação divina. O mito é, pois, incontestável e inquestionável.
O ser humano, à mercê das forças sobrenaturais que são assustadoras, passa a emprestar-
lhes qualidades emocionais. As coisas não são matéria morta nem são independentes do sujeito
que as percebe. Ao contrário, estão sempre impregnadas de qualidades que são boas ou más,
amigas ou inimigas, comuns ou sobrenaturais, fascinantes e atraentes ou ameaçadoras e
repelentes.. Por isso o ser humano se move dentro de um mundo animado por forças que ele
precisa agradar para que aja caça abundante, para que a terra seja fértil, para que a tribo ou o
grupo seja protegido, para que as crianças nasçam com saúde e os mortos possam ir em paz.
O pensamento mítico está, então, muito ligado à magia, ao desejo, de querer que as coisas
aconteçam de um determinado modo. É a partir disso que se desenvolvem os rituais como meio
de propiciar os acontecimentos desejados. O rito é o mito tornado ação.
Rito – Do latim ritus, celebração de um culto ou realização de cerimônia feita de acordo com
certas regras baseadas na tradição religiosa ou sociocultural de um povo ou grupo social. Ex.: rito
de iniciação, em que alguém é admitido em uma seita ou ordem; rito de passagem, que marca em
certas sociedades primitivas a entrada do indivíduo na vida adulta. (Japiassu e Marcondes,
1993:215).
O ritual é a repetição dos atos executados pelos deuses no início dos tempos e que devem ser
imitados e repetidos para que as forças do bem e do mal sejam mantidas sob controle. Desse
modo, o ritual “atualiza”, isto é, torna atual o acontecimento sagrado que teve lugar no passado
mítico.
Função dos mitos
1º) Função explicativa. Sua principal função consiste em explicar a origem de todas as coisas
sempre recorrendo à interferência de agentes naturais ou sobrenaturais, isto é: a origem do
mundo, do céu, do mar, dos animais, plantas, a origem do bem e do mal, do belo e do feio, do
justo e do injusto, etc., são explicados a partir da ação de forças ocultas sejam elas provenientes
da Natureza ou do plano divino. Nesse caso, o conhecimento e a verdade acerca do mundo são
sempre revelados pelos deuses ou pela Natureza.
2º)Função organizativa. Os mitos são responsáveis pela regulamentação das relações sociais
através do estabelecimento das leis, fixando um sistema complexo de permissões e proibições.

❖ Dogma (lat. e gr. Dogma: opinião, crença, ponto de vista) É a doutrina ou opinião religiosa
ou filosófica fundada em uma suposta verdade revelada que exige o acatamento e a
aceitação incondicionais por parte dos fiéis, ou seja, é transmitido de modo impositivo sem
contestação, fazendo apelo a uma adesão incondicional.

As leis elaboradas a partir dos mitos irão dar origem aos dogmas e aos tabus, ou seja, às
verdades inquestionáveis reveladas pelos deuses e ao sistema de proibições.
Por conta da idéia de que a ordem do mundo depende de forças sobrenaturais, isso significa que
o homem não é dono de seu destino, mas, ao contrário, encontra-se fatalmente preso à vontade
dos deuses.
Com isso, as narrativas míticas tentam justificar o poder político de certas autoridades; busca
explicar porque determinadas condutas são proibidas e o que é permitido; o que pertence ao bem
e o que faz parte do mal.
3º) Função compensatória. Sob este aspecto, o mito objetiva explicar como o homem pode,
mediante certos rituais, compensar seus erros no passado ou recuperar algo que foi perdido,
como por exemplo: a confiança dos deuses. É bom salientar que estas não são as únicas funções
dos ritos, estes também, serviam como meios de adoração, agradecimento e expurgação de
forças malignas.
Por várias gerações, os mitos se constituíram na única fonte de explicação da existência e
organização de todas as coisas (era uma forma ingênua de situar o homem no mundo) e
contribuiriam para fixar e justificar as desigualdades, a exploração e a autoridade arbitrária de reis,
imperadores, sacerdotes, faraós etc., que se aproveitavam do pretexto de que tudo já estava
previamente determinado e assim tentavam justificar suas autoridades sobre as pessoas, como se
isso fosse a vontade dos deuses.
É importante ressaltar que o mito não é uma produção exclusiva dos povos primitivos no início da
civilização humana, dos gregos na Antiguidade, nem dos nossos índios. A sociedade
contemporânea continua produzindo mitos através dos astros, ídolos, celebridades, seja no
campo da música, cinema e no meio artístico de modo geral, incluindo também, esportistas,
políticos, pensadores etc. Além de tudo isso, o mito consegue se perpetuar mediante certas
comemorações e cerimônias, como as festas de formatura, de Ano-Novo, aniversários,
casamentos, Natal, Páscoa, entre outras, demonstrando um apego aos ritos de iniciação e de
passagem que revelam resíduos de uma consciência primitiva e mítica que reside no íntimo de
cada ser humano.
O mito, longe de ser uma tentativa fracassada de explicação da realidade, deve ser encarado
como ponto de partida para compreensão e inteligibilidade do homem, do mundo e de tudo que
nele habita e vive.
Características do mito
O mito tal como é vivido nas sociedades arcaicas tem as seguintes características:
• É a história dos atos dos seres sobrenaturais.
• Esta história é considerada VERDADEIRA (porque se refere a realidades)
e SAGRADA (porque é obra de seres sobrenaturais).
• Relata uma CRIAÇÃO: conta como algo veio à existência ou como um comportamento, uma
instituição, uma maneira de trabalhar teve origem.
• Permite conhecer a origem das coisas e, portanto, dominá-la e manipulá-la voluntáriamente.
Este conhecimento nao é exterior abastrato acerca das coisas, mas interior e concreto.
• O homem mítico "vive" o mito, sentindo que o poder sagrado, não é uma experiência
cotidiana, é uma experiência de Religar (re-ligação com a divindade) é uma experiência
religiosa.
Diferença entre Mito, Lenda e Fábula
• FÁBULA - é uma narrativa alegórica, em forma de prosa ou verso, cujos personagens são
geralmente animais com características humanas, sustentam um diálogo, cujo desenlace
reflete uma lição de moral
• LENDA – é uma narrativa de cunho popular que é transmitida, principalmente de forma oral,
de geração para geração. As lendas não podem ser comprovadas cientificamente, pois são
frutos da imaginação das pessoas que as criaram. O universo imaginário popular possui
muitas lendas. No folclore brasileiro, as lendas mais conhecidas são: Curupira, Saci-Pererê,
Iara, Mula-sem-cabeça, Boto cor-de-rosa, Boitatá, entre outros. A lenda do lobisomem é
conhecida e reproduzida mundialmente.
• MITO - É uma narrativa fantástica sobre a origem das coisas por meio das forças divinas
(deuses). Exemplos: Zeus (deus dos céu), Atena (deusa da sabedoria), Pandora (origem dos
males e sofrimentos), Prometeu (origem do fogo) ...

O senso comum (o saber de todos nós)


Tão antigo quanto mito ou a religião, o saber comum (conhecimento ingênuo, espontâneo,
vulgar, casual e carente de rigor racional) é uma opinião simplista de interpretação da realidade
baseada em hábitos, experiências sensoriais, desejos, imaginação, crenças, preconceitos e
tradições cristalizadas cujo objetivo central é fornecer um conhecimento que sirva de guia do
homem no enfrentamento dos problemas e das dificuldades que o aflige diariamente.
Em outras palavras, o senso comum, entendido como uma interpretação genuína do
mundo, nos orienta na busca do sentido da existência, ao mesmo tempo em que nos dá
condições de operar sobre ele.
O senso comum, mesmo sendo muitas vezes irracional, pode fazer uso da razão, mas de um
modo não refletido. Por se tratar de um conjunto de concepções fragmentadas, muitas vezes
incoerentes, condiciona a aceitação mecânica e passiva de valores não-questionados e se impõe
sem críticas ao grupo social. Às vezes se torna fonte de preconceitos, quando desconsidera
opiniões divergentes.
Apesar de se caracterizar como um saber não sistematizado, obtido sem qualquer
planejamento rigoroso, no entanto é capaz de guiar o homem na busca de elementos
indispensáveis para sua sobrevivência. Prova disso, é que por meio das observações do senso
comum, o caboclo aprende a plantar e a colher na época apropriada e transmite esses
ensinamentos a seus filhos e netos. O caiçara aprende a conhecer o tempo: sai para pescar com
bom tempo e retorna antes da tempestade, com êxito em sua pescaria. O conhecimento ingênuo
fornece aos indivíduos as noções de que se valem em sua existência cotidiana.
Em nossa convivência diária, o senso comum se faz presente a todo o momento nas mais
variadas situações. Muitas das vezes temos opiniões sobre múltiplos assuntos e quando essas
opiniões aceitas geralmente como verdades, atingem certo consenso de um número considerável
de pessoas, vê-se surgir o senso comum.
Conforme o filósofo Chaim Perelmam (1912-1984), podemos dizer que: O senso comum consiste
em uma série de crenças admitidas por um determinado grupo social e que seus membros
acreditam serem compartilhadas por todos os homens.
Muitas das concepções do senso comum de um povo ou de uma classe social
transformam-se em ditados populares ou crenças que expressam a famigerada sabedoria popular
criando frases conclusivas de caráter geral, como por exemplo:
Quem tudo quer, tudo perde; homem que é homem não chora; a palavra do povo é a palavra de
Deus; filho de peixe, peixinho é; lugar de mulher é na cozinha; onde há fumaça, há fogo; água
mole em pedra dura tanto bate até que fura; dize-me com quem tu andas e te direi quem és; todo
homem é igual; favelado e menino de rua são marginais e delinqüentes; a posição dos astros
determina o destino das pessoas; mulher menstruada não deve tomar banho frio; não se deve
misturar açaí com frutas ácidas...

Repetidas irrefletidamente no cotidiano, algumas dessas noções escondem idéias falsas,


parciais ou preconceituosas. Outras, por outro lado, podem revelar uma profunda visão da vida,
ao que chamamos “sabedoria popular”. Mas o que caracteriza basicamente as noções
pertencentes ao senso comum não é sua verdade ou falsidade. É uma falta de fundamentação.
Isto é, as pessoas não sabem o porquê dessas noções, elas apenas aceitam, repetem e
defendem determinada idéia, mas não sabem explicá-la. Trata-se, portanto, de um conhecimento
adquirido sem nem uma base crítica, precisa, coerente e sistemática.

A ORIGEM DA FILOSOFIA A PALAVRA FILOSOFIA


A palavra “filosofia”, de origem grega, é composta de duas outras: Philo e Sophia. Philo quer
dizer “aquele ou aquela que tem um sentimento amigável”, deriva de philia que significa
“amizade e amor fraterno”. Sophia quer dizer “sabedoria” e dela vem a palavra sophós, sábio.
Filosofia significa, portanto, “amizade pela sabedoria” ou “amor e respeito pelo
saber”. Filósofo: o que ama ser sábio, que é amigo do sábio ou tem amizade pelo saber, deseja
ser sábio. Assim, filosofia indica a disposição interior de quem estima o saber, ou o estado de
espírito da pessoa que deseja o conhecimento, o procura e o respeita.
Atribui-se ao filósofo grego Pitágoras de Samos a invenção da palavra filosofia. Pitágoras
teria afirmado que a sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens
podem desejá-lo ou amá-la, tornando-se filósofos.
Com isso, Pitágoras queria dizer que o filósofo é movido pelo desejo de observar,
comtemplar, julgar e avaliar as coisas, as ações, as pessoas, os acontecimentos, a vida; em
resumo, é movido pelo desejo de saber. A verdade não pertence a ninguém (para ser comerciada)
nem é um premio conquistado por competição. Ela está diante de todos nós como algo a ser
procurado e é encontrada por todos aqueles que a desejarem, que tiverem olhos para vê-la e
coragem para buscá-la.
A filosofia surgiu quando alguns gregos, admirados e espantados com a realidade,
insatisfeitos com as explicações que a tradição lhes dera, começaram a fazer perguntas e buscar
respostas para elas, demonstrando que o mundo e os seres humanos, os acontecimentos naturais
e as coisas da natureza, os acontecimentos humanos e as ações dos seres humanos podem ser
conhecidos pela razão humana, e que a própria razão é capaz de conhecer-se a si mesma.
Em suma, a filosofia surgiu quando alguns pensadores gregos se deram conta de que a
verdade do mundo e dos humanos não era algo secreto e misterioso que precisasse ser revelado
por divindades a alguns escolhidos, mas que, ao contrário, podia ser conhecida por todos por
meio das operações mentais de raciocínio, que são as mesmas em todos os seres humanos.
Esses pensadores descobriram também que a linguagem respeita as exigências do pensamento e
que, por esse motivo, os conhecimentos verdadeiros podem ser transmitidos e ensinados a todos.

1.1 - O NASCIMENTO DA FILOSOFIA


Os historiadores da filosofia dizem que ela possui data e local de nascimento: final do século VII
a.C e inicio do século VI a.C, nas colônias gregas da Ásia menor (particularmente as que
formavam uma região demoninada Jônia), na cidade de Mileto. E o primeiro filósofo foi Tales de
Mileto.
Além de possuir data e local de nascimento e de possuir o seu primeiro autor, a filosofia
também possui um conteúdo preciso ao nascer: é uma cosmologia. Assim, a filosofia nasce
como conhecimento racional da ordem do mundo ou da natureza, donde cosmologia.
Apesar da segurança desses dados, existe um problema que, durante séculos, vem
ocupando os historiadores da filosofia: o de saber se a filosofia (que é um fato especificamente
grego) nasceu por si mesma ou dependeu de contribuiçoes da sabedoria oriental (egipcios,
assirios, persas, caldeus, babilônios) e da sabedoria de civilizaçoes que antecederam à grega,
na região que, antes de ser a Grécia ou a Hélade, abrigara as civilizaçoes de Creta, Minos, Tirento
e Micenas.
Essa ideia de uma filiação oriental da filosofia foi muito defendida oito séculos depois de
seu nascimento (durante os séculos II e III d.C), no período do Império Romano. Quem a
defendia? Pensadores judaicos, como Filo de Alexandria, e pensadores cristãos ou os primeiros
Padres da Igreja, como Eusébio de Cesareia e Clemente de Alexandria.
Por que defendiam a origem oriental da filosfia grega? Pelo seguinte motivo: a filosofia
grega tornara-se, em toda a Antiguidade clássica, e para os poderosos da época, os romanos, a
forma superior ou mais elevada do pensamento e da moral.

1.2 - CONDIÇÕES HISTÓRICAS PARA O SURGIMENTO DA FILOSOFIA

Esclarecida a relação entre filosofia e mito, temos ainda duas questoes a elucidar: o que tornou
possivel o surgimento da filosofia na Grécia no final do século VII e no inicio do século VI
a.C? quais as condições materiais, isto é, economicas, sociais, políticas e históricas que
permitiram o surgimento da filosofia?
Podemos apontar como principais condiçoes históricas para o surgimento da filosofia na Grécia:
1. As viagens marítimas: que permitiram aos gregos descobrir que os locais que os mitos
diziam habitados por deuses, titãs e herois eram, na verdade, habitados por outros seres
humanos; e que as regiões dos mares que os mitos diziam habitados por monstros e seres
fabulosos não possuiam nem monstros nem seres fabulosos. As viagens produziram o
desencantamento ou a desmitificação do mundo, que passou, assim, a exigir uma
explicação sobre a origem, explicação que o mito já não podeia oferecer;
2. O surgimento da vida urbana: Favoreceu o nascimento de uma nova classe de ricos
comerciantes que patrocinaram o desenvolvimento das artes, técnicas e produção de
conhecimento.
3. A invenção e o acesso da escrita alfabética: Possibilitou a ampla difusão e discussão de
idéias
4. A invenção da Política: Com o surgimento da política, o homem passa a elaborar suas
próprias leis e a organizar-se por conta própria sem a interferência de agentes divinos. O
aparecimento da noção de lei servirá de modelo para a filosofia propor a idéia de um mundo
ordenado e regulado racionalmente.
O surgimento de uma espaço político: Agora, com a pólis, isto é, a cidade política, surge a
palavra como direito de cada cidadão de emitir em público sua opinião, discutí-la com os outros,
persuadi-los a tomar uma decisão proposta por ele, de tal modo que surge o discurso político
como palavra humana compartilhada, como diálogo, discussão e deliberação humana, isto é,
como decisão racional e exposição dos motivos ou das razoes para fazer ou nao fazer alguma
coisa. A política, ao valorizar o humano, o pensamento, a discussão, a persuasão e a decisão
racional, valorizou o pensamento racional e criou condições para que surgisse o discurso ou a
palavra filosófica.

1.3 – Atitude Filosófica

É possível definir, de maneira geral, que a atitude filosófica trata-se de um comportamento que
adota posturas críticas pautadas na racionalidade em relação aos acontecimentos. A atitude
filosófica é determinada pela postura crítica que o homem adota frente às determinações e
imposições sociais.
Faz parte da atitude filosófica colocar em dúvida as imposições e regras sociais. A partir disso,
a sociedade fundamenta o comportamento crítico e passa a atuar como questionadora e
problematizadora das imposições, das regras e das padronizações sociais.
A atitude filosófica é determinada pelo posicionamento crítico, pois o ser humano, enquanto ser
racional, passa a entender o mundo e sua realidade de forma distinta. A crítica ao modelo em que
vive, as perplexidades e incômodos cotidianos, permitem que os cidadãos entendam que
precisam adotar uma postura crítica, reativa e afirmativa diante dos problemas e questões que
abalam a vida cotidiana.
O homem racional passa a agir ativamente e deixa de ser levado e dominado pelo
outro. Toda atitude do próprio ser social e dos outros atores que convivem no seu meio passam a
ser racionalmente questionadas.
Apesar de possuir uma definição geral, a atitude filosófica apresenta quatro aspectos que podem
complementar sua definição: o espanto, a dúvida, o rigor e a insatisfação.
O espanto
A filosofia nasce do espanto. A atitude do filósofo é a de encarar como inédito tudo e todas as
coisas. Se posiciona com distanciamento, perde o costume, o hábito. Percebe-se como ignorante,
sendo necessário investigar para conhecer.
O espanto, essa admiração e perplexidade referida por Aristóteles, é o que tira o indivíduo da
inércia e o lança à busca pelo conhecimento.
O espanto é considerado o ponto de partida para uma atitude filosófica. A partir do espanto, o
ser social deixa de ser indiferente à sua realidade, as ações e os acontecimentos geram o
espanto e impulsionam uma atitude crítica, racional, contestadora e problematizadora.
Aristóteles foi um dos primeiros a defender a origem da filosofia a partir do espanto do ser
social, da estranheza e da perplexidade em relação aos acontecimentos da natureza, do universo
e da vida. Para Aristóteles, o espanto é o ponto de partida para a formulação de perguntas críticas
e racionais e, consequentemente, para a busca por respostas e soluções que possam minimizar
ou solucionar definitivamente as questões que geram dúvida, incômodo e desconforto.
A dúvida
A dúvida também é elemento essencial para a construção da filosofia. É preciso que o filósofo
duvide de todos os conceitos, todas as verdades e todas as imposições sociais. O filósofo
não deve naturalizar os conhecimentos, deve problematizar tudo que é posto e apresentado.
Se não houver dúvida, não será possível repensar e discordar do que já está estabelecido. Sem a
dúvida, não se reformula o conhecimento filosófico baseado na racionalidade, já que todas as
respostas e teorias deixam de ser questionadas.
O rigor
A atitude filosófica depende basicamente do rigor para garantir bases sólidas para seus
questionamentos e atitudes. É preciso rigor para evitar ambiguidade, informações e críticas
contraditórias aos fatos que são postos em xeque.
O rigor é o elemento essencial para que o filósofo ou o questionador não use de falsas
informações ou lógica rasa e falaciosa para basear suas críticas e atitudes. O rigor, aliado à
racionalidade, garante as bases para sustentação das críticas ao modelo socialmente imposto,
que é o alvo principal daqueles que adotam a atitude filosófica.
A insatisfação
Não é tarefa da filosofia garantir respostas prontas e satisfatórias às questões e dúvidas pessoais.
O que mais se encontra na filosofia são questionamentos e dúvidas. Não há certezas, as teorias
não estão prontas e acabadas. É preciso sempre que o filósofo duvide do senso comum, duvide
das informações que recebe, duvide de suas próprias conclusões e certezas.
O filósofo deve evitar a satisfação diante das respostas que encontra, pois a insatisfação
garantirá a busca por outras respostas, por outros pontos de vista, outras teorias e outras
visões de mundo diante da sociedade e das práticas que estão sendo questionadas.
A atitude filosófica é, portanto, um posicionamento, um modelo de ação que discorda,
questiona e busca respostas e possíveis ações para o padrão social da sociedade na qual o
filósofo vive.
A Atitude Filosófica é um conceito que significa, acima de tudo, romper com o senso comum e
olhar com espanto o que há de mais trivial em nosso cotidiano. A problematização da realidade é
o ponto central e o motor da filosofia.
Lembrando que a filosofia nasceu na Grécia antiga por volta do final do século VII a.C. como um
questionamento ao conhecimento tradicional baseado nos mitos e na crença.
O senso comum grego assumia uma consciência mítica e tomava como evidentes as explicações
baseadas nas narrativas dos mitos.
O Questionamento
A Atitude Filosófica possui como ponto de partida a negação do comum e o questionamento. Dizer
não aos hábitos e costumes para só depois de passar pelo crivo da razão, afirmar ou concordar
com algo.
Negar as certezas do senso comum é o primeiro momento do método proposto pela filosofia.
Negar é questionar, é prever uma outra possibilidade.
Sócrates, filósofo grego, conhecido como o "pai da filosofia" tinha no questionamento a base para
a busca do conhecimento verdadeiro.
Segundo seus discípulos, dentre eles Platão, o filósofo não fazia afirmações, pois acreditava que
não se pode ensinar nada a ninguém. A própria pessoa deve refletir e encontrar por ela mesma as
respostas para os diferentes problemas.
O Espírito Crítico
O espírito crítico é o fundamento da Atitude Filosófica. A incerteza constante que acompanha
aquele que trilha o caminho do conhecimento, sendo então chamado de filósofo.
Por fim, filósofo é todo aquele que desperta em si a necessidade da mudança. A inquietude e o
amor ao conhecimento levam os indivíduos a filosofar, questionar suas certezas e propor um
conhecimento mais apurado sobre a realidade.

Para que serve a Filosofia?


Pergunta de difícil resposta. Podemos dizer, em primeira mão, que a Filosofia não tem utilidade.
Parece estranha essa afirmação? A princípio, sim. Se levarmos em conta que o termo utilidade,
em nosso vocabulário contemporâneo, diz respeito a algo que modifica o meio, que cria algo
concreto e que, em primeiro lugar, tem um valor monetário, então, sim, a Filosofia não tem
utilidade. Ainda sobre essa perspectiva, muitos acusam a Filosofia de não ter utilidade alguma,
pois ela não apresenta nada de concreto e útil em suas teses. Em partes, é verdade. A Filosofia
não atua de maneira prática e concreta, modificando visivelmente o mundo. De tanto essa
pergunta se repetir, com intenções irônicas, os estudantes de Filosofia também se habituaram a
soltar uma resposta não menos irônica: “a filosofia é uma ciência com a qual e sem a qual o
mundo permanece tal e qual”. Assim, partindo do ponto de vista pragmático da sociedade
capitalista que afirma que algo somente tem o direito de existir se for imediatamente útil e, em
todos os casos, lucrativo, então a Filosofia não tem utilidade. A Filosofia não serve para essa
modificação concreta do mundo porque ela não serve a ninguém. A Filosofia, ao menos uma
Filosofia autêntica, é autônoma e crítica, emancipada das amarras de qualquer norma que
determine o que deve ou não ser feito, o que pode ou não ser dito.
A Filosofia, segundo Chaui, não apresenta resultados concretos, visíveis e capazes de alterar o
mundo de imediato. Por isso, a pergunta “para que serve a Filosofia?” é constante, já que sua
utilidade é percebida aos poucos e por meio de um exercício complexo de abstração.
Em certo sentido, ou seja, partindo do ponto de vista pragmático de utilidade, que afirma ser útil
aquilo que modifica o meio com uma intervenção concreta, a Filosofia não serve para nada.
Também podemos afirmar que a Filosofia não serve a nada, não serve a ninguém, porque a
Filosofia, desde a sua origem, busca problematizar e questionar. Nesse sentido, lenta e
laboriosamente, a Filosofia vai mostrando a sua utilidade: colocar o pensamento em
movimento, questionar e, por que não, incomodar.
Segundo Deleuze, a filosofia não serve nem ao Estado, nem à Igreja, que têm outras
preocupações. Não serve a nenhum poder estabelecido. A filosofia serve para entristecer. Uma
filosofia que não entristece a ninguém e não contraria ninguém, não é uma filosofia. A filosofia
serve para prejudicar a tolice, faz da tolice algo vergonhoso. Não tem outra serventia a não ser a
seguinte: denunciar a baixeza do pensamento sob todas as suas formas.

A Filosofia serve a si mesma, como artífice e constante movedora do pensamento. Serve para
questionar, problematizar e incomodar. Serve para conceituar. A Filosofia denuncia a tolice por
ser, ela mesma, uma amante da sabedoria que jamais aceitará a vulgar ignorância como algo
normalmente suportável. Portanto, a Filosofia é aquela capaz de criar subterfúgios e caminhos
para que o pensamento continue avançando, que a humanidade continue questionando-se e
tentando entender o mundo e o seu próprio pensamento de maneira crítica e racional.

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