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20/09/2021 22:40 A obra Política :: Sabedoria Política

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A obra Política

por Alexsandro M. Medeiros

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postado em set. 2017

                  A obra mais importante de Aristóteles no campo da política tem como título,


precisamente, Política. O mais importante tratado da antiguidade conhecido sobre a natureza,
funções, divisão do Estado e as várias formas de governo. Aristóteles considera a cidade, a pólis
(vale dizer: a cidade-Estado) um modelo de organização fundamental para a existência humana
que, por natureza, é um animal político. Aristóteles entende que o homem nasce para viver em
sociedade e por isso não pode dela se isentar. “A meta da ‘política’ é descobrir primeiro a maneira
de viver que leva à felicidade humana, e depois a forma de governo e as instituições sociais
capazes de assegurar aquela maneira de viver”, como afirma Mário da Gama Kury (ARISTÓTELES,
1985, p. 7) – tradutor e autor da apresentação da edição da Unb da Política.

                  Considerando que tudo na vida tem uma finalidade e que a finalidade da existência
humana é a busca pela felicidade (sem entrar aqui no mérito do que seja a felicidade), Aristóteles
considera que um dos objetivos da vida em comunidade é possibilitar os meios de realização dessa
finalidade. A ciência política é, portanto, uma ciência prática por excelência e uma ciência do bem-
estar e da felicidade dos homens como um todo.

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            Em sua obra Política, podemos considerar que Aristóteles procura, entre outras coisas,
desenvolver uma “Teoria Geral do Estado”: sua constituição, formação, tipos de governo e qual o
melhor governo, a quem compete a soberania no Estado etc.

            A obra está dividia em oito livros e cada livro aborda várias temáticas. Na versão traduzida
por Kury (ARISTÓTELES, 1985) temos a seguinte divisão:

O Livro I, com 5 capítulos, tratando de temas como: a cidade (a mais elevada forma de comunidade,
composição, objetivos); a escravidão; a propriedade, a riqueza e a moeda; a família.
O Livro II, com 9 capítulos, tratando de temas como: exame da República e das Leis de Platão; diferentes
constituições e legisladores.
O Livro III, com 12 capítulos, tratando de temas como: definição de cidadão e o bom cidadão; boas e más
constituições; formas de governo (democracia, oligarquia e monarquia); conceito de justiça.
O Livro IV, com 13 capítulos, tratando de temas como: a ciência política; novamente as formas e governo
(democracia, oligarquia, tirania); governo constitucional, a melhor constituição; poder executivo e
judiciário.
O Livro V, com 10 capítulos, tratando de temas como: as revoluções e suas causas; revoluções nas
democracias, oligarquias, aristocracias, na tirania, nos governos constitucionais e na República de Platão.
O Livro VI, com 5 capítulos, tratando de temas como: novamente trata dos tipos de governo, com ênfase
na democracia e oligarquia.
O Livro VII, com 15 capítulos, tratando de temas como: a felicidade; a cidade (ideal, localização,
planejamento, sistema educacional); os cidadãos.
O Livro VIII, com 7 capítulos, tratando de temas como: novamente o sistema educacional da cidade ideal:
matérias, finalidades, exercícios físicos, música.

            Como vemos, são muitos os temas abordados na obra de modo que aqui não temos como
abordar senão algumas questões e de modo bastante amplo.

                  Para o filósofo grego, a sociedade (o Estado) é um fato natural e o homem um ser


sociável por natureza. Em algum momento da História os homens começaram a se agrupar em
família, depois em aldeias e por fim, em sociedades.

Uma das primeiras e principais teses da Política afirma que a cidade existe por natureza.
Deve-se atribuir à natureza a causa da existência da família, da aldeia e da cidade, no
sentido em que é a natureza que impulsiona os homens a se associarem em vista de
uma dada finalidade. Assim, explica Aristóteles, no que diz respeito à família, a
finalidade da associação entre fêmea e macho (mulher/homem) é a reprodução da
espécie; a finalidade da associação entre mestre e escravo é a autopreservação. A
aldeia (associação de famílias) visa à divisão do trabalho e à troca de produtos

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necessários à vida, necessidades que não são ou


não poderiam ser satisfeitas isoladamente ou no
interior de comunidades menores (LOPES, 2004, p.
13).

                A sociedade que se formou da


reunião de várias aldeias constitui a Cidade,
que tem a faculdade de se bastar a si
mesma, sendo organizada não apenas para
conservar a existência, mas também para
buscar o bem-estar. O homem sozinho não
pode bastar-se a si mesmo. O homem não é
auto-suficiente. Aquele que não precisa dos
outros homens, "ou é um deus, ou um
bruto". Assim, a inclinação natural leva os
homens a este gênero de sociedade.

            Da mesma forma como o Estado


decompõe-se em aldeias e famílias, a família também pode ser decomposta: senhor e escravo,
marido e mulher, pai e filhos. Aqui temos, respectivamente, a autoridade do senhor, a autoridade
conjugal e a autoridade paterna. A “administração” da família se assenta em três classes de poder:
do senhor, do esposo e do pai. Vale lembrar que Aristóteles é um filósofo típico de uma sociedade
patriarcal e escravocrata e, desta forma, procurou justificar em sua obra não só o poder masculino
como a própria escravidão (saiba mais em: A Escravidão em Aristóteles).

            Aristóteles não desconhece a teoria segundo a qual todos os homens nasceram livres e a
escravidão só foi introduzida pela lei do mais forte, podendo ser injusta e efeito da violência.
Acontece que para poder cuidar da economia doméstica é preciso “instrumentos” (animados ou
inanimados), sendo o escravo uma “propriedade” do seu senhor. O escravo é um “instrumento”
que deve agir sob as ordens do seu senhor. Aristóteles procurou justificar a ideia da escravidão
com base naquilo que pode ser considerado como a lei do mais forte: a natureza criou seres para
mandar e seres para obedecer e, da mesma forma como é bom para o corpo obedecer a alma, é
bom para o escravo obedecer ao seu senhor. Além disso, o pai de família deve governar sua
mulher e seus filhos como a seres livres, mas cada um de um modo diferente: sua mulher como
cidadã, seus filhos como súditos.

           Aqui vemos como Aristóteles pode ser considerado um filósofo patriarcal, concentrando
quase todo o poder nas mãos do homem: a maneira de comandar não é a mesma do homem livre
ao seu escravo, do marido à mulher, do homem adulto a seu filho. O escravo não deve de modo
algum deliberar; a mulher tem direito a isso, mas pouco, e a criança, menos ainda. O senhor
governa porque é livre, a mulher obedece porque é de uma natureza inferior e sendo a criança
imperfeita e não podendo ainda encontrar em si mesma a regra de suas ações, sua virtude é ser
dócil e submissa ao homem maduro que cuida de seu acompanhamento, além disso, o homem de
mais idade deve mandar no de menos idade.

            Em seguida Aristóteles analisa a propriedade privada e os meios de adquiri-la. Existe um
gênero de riquezas naturais, próprio à economia doméstica e política, mas também existe um
gênero de riquezas artificiais, produto da arte e da experiência. Através da agricultura, do

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pastoreio, da caça e da pesca, o homem obtém o necessário a vida, adquire bens e propriedades.
Além dessa aquisição natural, o comércio é um modo de aquisição que não é natural, pois consiste
em comprar para vender mais caro e está dividido em três partes: navegação, transporte por terra
e venda no próprio local. Porque Aristóteles considera o comércio um meio não natural de adquirir
bens? Ele dá como exemplo a compra ou troca de um sapato: o seu uso próprio é para calçar, e
não para ser trocado, mas tendo uns mais e outros menos, foram levados por este motivo à troca;
a troca se tornou necessária apenas nas grandes sociedades e após a separação das propriedades,
mas ela não era necessária nas sociedades primitivas onde tudo era comum. Trata-se, portanto,
de um gênero de comércio que não está nem fora das intenções da natureza, nem tampouco é
uma das maneiras naturais de aumentar seus pertences, mas sim um modo engenhoso de
satisfazer as respectivas necessidades. É preciso considerar ainda que esse comércio, baseado na
troca, fez surgir a moeda. A moeda foi inventada para as necessidades do comércio, para evitar o
incômodo de transportar grandes mercadorias.

         Vemos aqui não só uma teoria política como também aquilo que poderíamos chamar de um
esboço de uma ciência econômica: a sociedade supõe a existência de relações de poder, relações
comerciais, aquisição de bens e propriedades; a sociedade é formada por aldeias e famílias e as
relações que se estabelecem dentro da sociedade são motivadas pela necessidade de garantir a
sobrevivência e, em alguns casos, pelo uso que se faz dos meios para garanti-la.

          Um outro conceito do filósofo grego e que pode trazer contribuições importantes para a
nossa época atual (com uma certa ressalva) é a ideia de que um cidadão, para ser considerado
como tal, deveria participar diretamente da coisa pública. Não bastava morar na cidade, ou ser
descendente de cidadãos. Para ser cidadão impõe-se “tomar parte na administração da justiça e
fazer parte na assembleia que legisla e governa a cidade” (REALE, 2007, p. 130). Todavia,

nem o colono nem o membro de uma cidade conquistada podiam ser “cidadãos”. E nem
mesmo os operários, embora livres (ou seja, mesmo não sendo cativos ou estrangeiros),
poderiam ser cidadãos, porque falta-lhes o “tempo livre” necessário para participar da
administração da coisa pública (REALE; ANTISERI, 2003, p. 222).

            Não nos cabe aqui discorrer sobre o sentido histórico que o conceito de cidadania possa
ter tomado ao longo dos séculos, mas compreendê-lo como ponto fundamental para pensar o
filósofo (ou o indivíduo de uma forma geral) dentro do contexto mais amplo da sociedade. Vale
ressaltar, contudo, que, condicionado pelo momento histórico, o pensamento aristotélico exclui do
conceito de cidadão boa parte dos indivíduos de uma sociedade e ainda é levado a teorização em
defesa da escravidão. O escravo não apenas está excluído da condição de cidadão, como são
inferiores e assim o são “por natureza”. “É o velho preconceito racial dos gregos que Aristóteles
reafirma, pagando também neste caso pesado tributo a sua própria época e sem perceber que ia
contra os princípios da própria filosofia, que se prestavam a desdobramentos em direção oposta”
(REALE; ANTISERI, 2003, p. 222).

                  O que podemos aproveitar, portanto, da concepção de cidadão do filósofo grego?


Aristóteles  estabelece uma estreita relação entre o Estado e a virtude de seus cidadãos e
governantes. Para Aristóteles, se podemos conhecer as causas de dissolução das constituições,
também é possível saber os meios para conservá-la, partindo-se do princípio de que uma vez
conhecida as causas de dissolução, basta saber quais são suas contrárias, que teremos as causas
de conservação. Dentre as causas de dissolução temos a violação das leis, por isso, uma boa

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constituição deve zelar pela vigilância de suas leis. Também a educação é um bem que deve
merecer atenção de seus legisladores, pois uma má educação é motivo de ruína para o Estado, ao
passo que uma educação apropriada favorece sua estabilidade, isto porque para o filósofo, o
Estado virtuoso não é obra do acaso, mas de ciência e vontade deliberada. Compete ao Estado
regular a educação e, por meio dela, tornar os homens bons e virtuosos, completando o que falta
à sua natureza, pois é necessário preparar a formação dos homens e o cultivo de seus hábitos
(apud MONDOLFO, 1967, p. 69-70).

Referências Bibliográficas

ARISTOTELES. Política. Trad. por Mário da Gama Kury. Brasília: UnB, 1985.

LOPES, Marisa. Ação ética e virtude cívica em Aristóteles. Tese (Doutorado em Filosofia).
Departamento de Filosofia. Universidade de São Paulo. São Paulo, 2004.

MONDOLFO, Rodolfo. O pensamento antigo: historia da filosofia greco-romana. Tradução de


Lycurgo Gomes da Mota. 2.ed. São Paulo: Mestre Jou, 1967. vol. II.

REALE, G.; ANTISERI, D. História da Filosofia. Filosofia pagã antiga, v. 1. São Paulo: Paulus,
2003.

Filosofia Política → Filosofia Política na Antiguidade → Aristóteles → A obra "Política"

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1. A Ética em Aristóteles

2. A Amizade em Aristóteles

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A Amizade em Arist…
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Em nota, Mário da Gama Kury, tradutor e apresentador da edição da Unb da Política


(ARISTÓTELES, 1985, p. 12) ressalta que a obra Política é o resultado de aulas ou de exposições
de Aristóteles anotadas por seus alunos.

Veja Também:
 

1. A Escravidão em Aristóteles

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