Você está na página 1de 15

Universidade Católica de Moçambique

Instituto de Educação à Distância

Eficácia e Fragilidade da Democracia Africana

Nome.:Juma José Jaime – Código: 708190840

Curso: Licenciatura em Ensino de Historia


Disciplina: Historia das Instituições Politica III
Ano de frequência: 3º Ano

Docente: Belito Vasco

Quelimane, Julho de 2021


Índice

1. Introdução...................................................................................................................................3
1.2. Objectivos...............................................................................................................................4
1.2.1. Objectivo Geral...................................................................................................................4
1.2.2. Objectivos específicos........................................................................................................4
1.3. Metodologia............................................................................................................................4
2. FUNDAMETAÇÃO TEORICA.................................................................................................5
2.1. Democracia..................................................................................................................................5
2.1.2. Democracia Liberal............................................................................................................5
2.2. O processo de Democratização a escala Africano...................................................................7
2.3. Transição Democrática em África..........................................................................................8
2.4. Constrangimentos da democracia liberal no contexto sociopolítico dos Estados africanos.....9
2.5. A Transição para a Democracia criou novas Demandas e novas Formas de Competição de
Identidades.......................................................................................................................................10
2.6. Tolerância Política................................................................................................................10
2.7. Transição Democrática em Moçambique..............................................................................11
2.8. Eleições Regulares, Livres e Justas.......................................................................................12
3. Considerações Finais................................................................................................................14
4. Bibliografia...............................................................................................................................15

2
1. Introdução

Muitos países africanos, após as suas independências, debateram-se com a existência de um


partido único como herança das lutas de libertação nacional. Esse cenário, em alguns casos
deu origem a guerras civis, tendo culminado com a formação de partidos da oposição com
grande aceitação popular. Alguns desses partidos, têm demonstrado, sucessivamente,
tendências belicistas, desse modo, o processo de consolidação democrática nos Estados
africanos e sua segurança nacional são postos em causa, pois de entre outras manifestações,
são contestados resultados eleitorais recorrendo-se à força armada.

Olhando para os mais recentes conflitos internos em África, notamos que tem nas suas causas,
questões próprias da democracia liberal. São exemplos dessa realidade, os conflitos pós-
eleitorais na Costa de Marfim e no Senegal, em 2012; os conflitos para a instauração de
liberdades políticas e maior abertura democrática na Tunísia, no Egipto e na Líbia, em 2011.
Os confrontos militares em Moçambique, envolvendo o Governo e a Renamo junta-se a estes
outros que assolam o continente, possivelmente esses conflitos tenham outras grandes razões
e cada um deles com suas especificidades, mas o facto em comum é de serem apresentadas
razões ligadas a processos democráticos, sobretudo processos eleitorais e liberdades
fundamentais.

3
1.2. Objectivos

1.2.1. Objectivo Geral


 Analisar a eficácia e fragilidade da democracia Africana

1.2.2. Objectivos específicos


 Caracterizar os Estados africanos durante o processo de democratização;
 Conhecer as condições em que a democracia pode constituir ameaça à segurança
nacional dos Estados africanos;
 Estabelecer uma relação entre a democracia em Moçambique e a estabilidade politica.
 Compreender a relação entre a democracia liberal e a segurança nacional nos Estados
africanos.

1.3. Metodologia

Tendo em conta os principais objectivos definidos para a investigação, pode-se considerar a


presente pesquisa como sendo a pesquisa bibliográfica foi feita a partir do levantamento de
referências teóricas já analisadas, e publicadas por meios escritos e eletrônicos, como livros,
artigos científicos, páginas de web sites.

Nesta vertente, de acordo com Severino (2007), “a pesquisa bibliográfica é aquela que
abrange toda bibliografia já tornada pública em relação ao tema de estudos” (p.122).

A pesquisa bibliográfica utiliza fontes constituídas por material já elaborado, constituído


basicamente por livros e artigos científicos localizados em bibliotecas. A pesquisa documental
recorre a fontes mais diversificadas e dispersas, sem tratamento analítico, tais como: tabelas
estatísticas, jornais, revistas, relatórios, documentos oficiais, cartas, filmes, fotografias,
pinturas, tapeçarias, relatórios de empresas, vídeos de programas de televisão, etc. (Fonseca,
2002, p. 32).

4
2. FUNDAMETAÇÃO TEORICA

2.1. Democracia

O conceito da democracia caracterizou-se por discussões infindáveis. O termo democracia


significa governo do povo e etimologicamente, nasce na Grécia Antiga, onde sua prática era
então direito exclusivo dos senhores (cidadãos) excluindo assim, desse direito os escravos e
outras categorias de pessoas, como estrangeiros, mulheres, crianças e idosos (Mendes, 1994,
p.76).

Quando falamos de democracia, conforme a definição acima, referimos a uma ideologia ou


forma de estar num Estado, mas o processo para se chegar a esse nível denominado
democracia, chama-se democratização. Nesse âmbito, segundo Pasquinho (2002) citado por
(Dahl, 1997) a democratização resulta da conjugação da liberalização e inclusão, no que se
considera de regimes poliárquicos, pois nenhum grupo está em condições de exercer qualquer
hegemonia sobre o poder político, uma vez encontrando-se distribuído por toda uma série de
detentores.

De acordo com Sousa (2005, p.61), a democracia é um regime político em que o poder se
encontra limitado, em que a alternância no governo está eleitoralmente assegurada, em que os
governados mantêm todos os seus direitos cívicos perante os governantes e em que a
liberdade e a competitividade políticas estão presentes. Com essa definição, a democracia
assenta em pilares como a liberdade, a participação política, a alternância na detenção do
poder político e, sobretudo, a limitação no exercício de poder dos governantes sobre os
governados.

Neste trabalho consideramos democracia a combinação positiva de todos pilares que levam o
povo a decidir por si quem deve governar, socorrendo-se de princípios de liberdade ao
pluralismo de ideias, bem como a alternância do poder, sem descorar a transparência, primado
da lei, prestação de contas, como forma de garantir o equilíbrio de poder divergência positiva
no xadrez político nacional.

2.1.2. Democracia Liberal


Democracia liberal refere-se ao sistema de democracia com base no parlamento, aliado ao
sistema de mercado livre na área de produção económica, baseando-se ainda num sistema de
eleições regulares e competitivas conduzidas com base no sufrágio universal e igualdade
política. A democracia liberal é uma forma de governo democrático que equilibra o princípio

5
de governo limitado com a ideia de consentimento popular. As suas características liberais
residem num conjunto de mecanismos de verificação internos e externos governo (check and
balances), com vista a garantir a liberdade e a oferecer aos cidadãos protecção contra o
Estado (Sousa, 2005, p.61).

Um Estado é considerado de democracia liberal, quando, pelo menos do ponto de vista legal e
institucional, possui características que permitam que haja liberdade e respeito pelos mais
elementares direitos humanos. Assim, a democracia liberal é um sistema político marcado não
só por eleições livres e justas, mas também pelo estado de direito, separação de poderes e pela
protecção das liberdades básicas de expressão, reunião, religião e propriedade (Zakaria, 1997,
p.24).

Nesse contexto, Sousa (2005, p.61), ao afirmar que “ a democracia é o regime político em que
o poder está limitado, em que a alternância no governo está eleitoralmente assegurada, em que
os governados mantêm todos os seus direitos cívicos perante os governantes e em que a
liberdade e a competitividade políticas estão presentes”, induz-nos à percepção de que os
principais factores internos que possam levar-nos a conflitos armados e ameaças à segurança
nacional podem ser acautelados com o exercício eficaz da democracia liberal.

Olhando para o contexto africano, podemos assumir que a democracia liberal ainda não é
efectivamente implementada, pois notamos que nos últimos anos, em alguns países como a
Nigéria, Zimbabwe, Senegal, Quénia e Costa do Marfim, os processos eleitorais, tornaram-se
fontes de instabilidade e ameaça a valores centrais do Estado como integridade territorial e
unidade nacional. Além desses países, na Libai, no Egipto e na Tunísia, a segurança nacional
foi posta em causa por manifestações violentas com o intuito de promover e garantir mais
liberdades políticas, e mais recentemente, em Moçambique eclodiu um conflito militar entre
as forças da Renamo e as forças governamentais devido, essencialmente a questões ligadas ao
processo eleitoral, inclusão e igualdade.

Nos casos acima mencionados, para garantir a segurança ao nível do Estado, os governos
devem ter habilidade para conter ataques ou defender-se quando estes surgem contra si
(Glossário de Estudos de Paz e Conflitos, 2004, p.38).

Assim, com base na democracia liberal os Estados podem reduzir as possibilidades de um


Estado ir à guerra contra o outro através da inclusão e participação política, aspectos que
fazem com que o processo de tomada de decisões obedeça uma avaliação minuciosa pelos
6
diferentes actores de nível nacional e não fique apenas a mercê de um governante ou de um
grupo, como acontece em sistemas de governação não democráticos. Porém, a possibilidade
de conflitos internos que podem constituir ameaça à segurança nacional persiste.

Portanto, no contexto africano, onde num mesmo Estado temos vários grupos com posições
divergentes, onde a democracia liberal ainda deve ser adaptada às realidades locais, e onde se
verificam casos de conflitos motivados por aspectos próprios da democracia liberal como
eleições e busca por liberdades políticas.

2.2. O processo de Democratização a escala Africano


A democratização, apesar de ser um assunto que passou a ser abordado com mais destaque
após a guerra-fria, é um processo que vem se alastrando já desde o século XIX. Na
perspectiva de Huntington (1991, p.39), democratização significa a disseminação do regime
democrático representativo pelo mundo, segundo este autor esse processo evoluiu em três
fases, denominadas três ondas de democratização.

Com base nos pressupostos do liberalismo, concluímos que esta é a teoria que melhor explica
o tema deste trabalho porque aborda a interacção a nível doméstico e internacional. Daí que
podemos tirar aspectos valiosos para entender a segurança nacional em Estados africanos.

A primeira onda da democratização abrange o período entre 1828 e 1926, nessa altura, de 64
nações independentes, 24 eram democráticas. Entretanto, entre 1922 e 1942, houve um
retrocesso em termos de Estados independentes democráticos, pois as nações independentes
haviam se reduzido a 61, e apenas 12, preservavam o sistema democrático. Depois desse
período de regressão, surgiu a segunda onda de democratização que transcorreu de 1943 a
1962.

A democratização em África é enquadrada na terceira onda. Por isso, prestamos especial


atenção a esse período. A ideia de Terceira Onda resulta da democratização subsequente a
1974, e foi impulsionada por vários factores, de entre os quais: A erosão da legitimidade dos
governos autoritários, que mostravam-se incapazes de conter levantamentos militares e o
fracasso económico; O melhoramento dos níveis de vida, de educação e a urbanização em
muitos países, ao mesmo tempo em que crescia o sentimento de cidadania, as expectativas e a
capacidade da sua expressão; A mudança de abordagem das instituições religiosas que
passaram a opor-se aos governos autoritários, em vez de defender o status quo; e a tendência

7
de promoção dos direitos humanos, democracia e liberdades fundamentais no geral
(Huntington, 1991:65).

O advento da terceira onda de democratização coincidiu com um período de mudanças na


estrutura do Sistema Internacional, como consequência directa do fim da guerra-fria. Por isso,
a terceira onda de democratização é muitas vezes ligada a transições democráticas após 1989.

Derrube do regime vigente - a democratização ocorre como resultado da revolta popular que
retira o governo e, através de um processo de negociação com as forças de segurança do
governo e novas eleições, introduz-se um novo governo. Por exemplo: o derrube do antigo
presidente Slobodan Milosevic na Sérvia.

Liberalização gradual do regime vigente, mas mantendo o controlo – acontece em situações


em que, muitas vezes após golpes de Estado, os militares anunciam um processo de
democratização e o retorno à ordem civil, mas não propriamente o afastamento do governo,
como aconteceu no Paquistão em 1999.

Democracia emergente de negociações de paz em casos de guerra-civil – o acordo firmado


para o fim da guerra tem conteúdos democráticos, como aconteceu no caso da Bósnia através
dos acordos de Dayton, nos quais estipula-se uma nova Constituição com uma democracia de
partilha de poder. Podem ser mencionados outros exemplos, como o da Namíbia, Afeganistão
e Moçambique.

Introdução da democracia pela comunidade internacional através de administração de


transição - o maior exemplo desta situação é o do Timor-Leste, onde depois do referendo para
a independência, em 1999, e da intervenção militar das forças australianas, as Nações Unidas
foram chamadas a administrar o país enquanto este preparava os procedimentos e construía
capacidade institucional de um Estado, para exercer de facto a sua soberania.

Portanto, de entre as seis situações em que pode emergir a democracia, existem duas que
caracterizam, especificamente, o continente africano nos últimos anos: negociações para o fim
de guerra-civíl e o derrube do regime vigente. Nesse contexto, a democratização tem estado
associada a momentos de conflitos armados, consequentemente a ameaças à segurança
nacional. Por isso, de seguida abordamos a transição democrática em África na perspectiva de
conhecer os seus contornos específicos.

8
2.3. Transição Democrática em África
Para entender a transição democrática em África, é preciso antes de mais, clarificar que no
contexto político, se considera transição a um conjunto de “mudanças fundamentais do que
era antes para um novo contexto, como estado de guerra ou conflito violento para um novo
contrato social de construção da paz; de um governo autocrático e centralizado para um
governo representativo, da subjugação ou dominação política para independência ou
redefinição das relações de poder” (Large & Sisk, 2006, p.51).

Tendo em conta que a construção de muitos Estados africanos se deu dos anos 1960 a 1990, o
processo de democratização em África enquadra-se no período chamado por terceira onda.
Porém, cada Estado teve suas especificidades nesse processo de transição, o que tornou a
transição democrática em África, bastante heterogénea.

Enquanto alguns Estados passaram para um sistema democrático por vias pacíficas, em outros
Estados, a democracia emergiu como consequência de guerras civis, com o objectivo de criar
multiplicidade de ideias políticas, visto que perduravam regimes mono partidários resultantes
dos processos de descolonização.

Além de motivações internas, a democratização em África foi também impulsionada por


mutações políticas ocorridas à escala internacional, mormente a queda do muro de Berlim e o
fim da Guerra Fria, que deu mais visibilidade ao processo de democratização, visto que no
período da guerra-fria muitos Estados africanos não haviam adoptado o regime democrático,
principalmente nos moldes de democracia liberal.

A limitação de pluralismo político, um dos maiores valores da democracia liberal, durante a


guerra-fria nos Estados africanos, gerou um clima de insatisfação generalizada do qual
emergiram grupos contestatários com variados objectivos, mas que em comum procuravam
instaurar ideais liberais democráticos, como sucedeu em Moçambique.  

2.4. Constrangimentos da democracia liberal no contexto sociopolítico dos Estados


africanos
Nesta parte do trabalho olhamos para a aplicação da democracia liberal em Estados africanos,
sobretudo as especificidades que emperram a sua consolidação. De acordo com Kanyinga,
Okello e Akech (2010:5-8), podem ser levantadas várias razões da dificuldade de
consolidação da democracia liberal em Estados africanos, com destaque para as seguintes:

9
Democratização sem um processo simultâneo de mudança nas instituições de governação ou
ainda no Estado em si.

Alguns países adoptaram a política de multipartidarismo no princípio dos anos 1990 sem um
ajustamento extensivo das suas constituições e do quadro institucional no qual é praticada a
politica (Kanyinga, Okello e Akech, 2010, p.5).

Kanyinga, Okello e Akech (2010, p.5), citam como maiores exemplos dessa realidade os
casos do Kenya e do Zimbabwe, onde os conflitos em processo eleitorais ocorreram na
sequência de projectos de revisão constitucional falhados. Pode se acrescentar os conflitos
resultantes de tentativas de revisão constitucional visando aumentar os poderes do Presidente,
estender o tempo dos mandatos ou permitir uma recandidatura.

2.5. A Transição para a Democracia criou novas Demandas e novas Formas de


Competição de Identidades
Em muitos países africanos, há proeminência das identidades na prática da política. Esse
cenário foi muito notável nos processos eleitorais dos anos 1990. Contudo, a consolidação das
identidades em competição nas sociedades democráticas africanas ocorre em detrimento da
cultura cívica. Embora exista, em muitos casos, a cultura de participação política, o seu efeito
na prestação de contas ou responsabilização no Estado é menor. Há maior dinâmica da
consolidação das identidades em relação a consolidação do Estado.

Segundo Enra (2009:51), também faz parte das razões da instabilidade política em
democracias africanas, a fragilidade e a quase inexistência da sociedade civil, a inconsistência
da estrutura do Estado e suas instituições e por fim, a ausência da estrutura económica
moderna eficiente.

Segundo Nilson & Abrahamsson (1994, p.327), certos Estados africanos invocam a
democracia como sistema de governo que os rege, mas em muitas ocasiões mostram actos de
negação ao mesmo sistema quando protestam contra os resultados das eleições, a recusa de
entrega do poder em caso de um partido da oposição ganhar as eleições e a violação dos
direitos humanos.

2.6. Tolerância Política


No que se refere à tolerância política, Correa (2004, p.26) defende que ela pode ser vista a
partir de cinco diferentes considerações: como resultado de uma justa e igualitária liberdade
de consciência e de expressão; como o mais adequado método de confronto entre diferentes

10
doutrinas compreensivas de bem numa sociedade pluralista; enquanto recurso político de
defesa das liberdades individuais contra um Estado intolerante ou contra grupos intolerantes
dentro de uma sociedade liberal; como virtude democrática dos cidadãos no uso da razão
pública e na apresentação de argumentos no fórum político e, por fim, enquanto abstenção dos
povos liberais de impor à força os princípios liberais aos povos não liberais.

Geralmente, a ideia de tolerância política está ligada a liberdade de expressão, ao pluralismo


de opiniões e ao respeito pelos direitos humanos. No exercício da democracia liberal, dentro
do espírito de tolerância política, espera-se que mesmo havendo diferenças entre a população
de um Estado, baseadas na raça, religião e cultura, estas sejam superadas abrindo-se espaço
para a discussão, debate e acomodação dos diferentes pontos de vista (Kamp, 2011:6).

Assim, a tolerância politica é um pilar muito importante para os Estados africanos se tivermos
em conta que, na sua maioria, congregam vários e diversificados grupos étnicos como
consequência do processo da construção desses Estados que obedeceu as fronteiras delineadas
arbitrariamente pela administração colonial europeia, e também pela opção da Organização da
Unidade Africana (OUA) em manter essas fronteiras para evitar conflitos. Por outras palavras,
vários grupos étnicos foram divididos em termos de pertença estatal, ocupando alguns deles
territórios de dois ou mais Estados vizinhos.

Por outro lado, “a diferença étnico-regional com os correspondentes movimentos


tendencialmente separatistas baseados numa afirmação de identidade específica de cariz
cultural, histórico ou geográfico”, é apontada por Ferreira (2000, p.174), como um dos
factores relacionados a tolerância política, conducentes a insegurança em África. Portanto,
esse princípio é bastante sensível para os Estados africanos em particular, visto que se não for
respeitado aumentarão as possibilidades de tensões e conflitos, que resultam na insegurança
nacional.

O Malí não é o único caso em que alega-se haver intolerância política. Podemos citar o caso
de Angola, onde para além dos partidos da oposição, agências noticiosas nacionais e
internacionais, assim como ONGs, reportam frequentemente casos de intolerância política e
de repressão dos direitos e liberdades, principalmente da imprensa e organizações da
sociedade civil.

11
2.7. Transição Democrática em Moçambique
A transição democrática em Moçambique não está dissociada do processo de democratização
a nível do continente africano, no âmbito da terceira onda de democratização nos anos 1990.
Olhando para as condições gerais de transição democrática, Moçambique enquadra-se na
democracia emergente de negociações de paz em casos de guerra-civil, visto que viveu 16
anos (1976-1992) de guerra, cujo objectivo era, na narrativa da Renamo, a instauração da
democracia liberal.

Tendo a democratização em Moçambique sido precedida por um longo período de guerra,


numa era de mudanças a nível global, para Lala, (2007, p.108), além do nível doméstico, a
democratização em Moçambique enquadra-se no contexto global e regional. No nível global,
o fim da guerra-fria significou a redução das fontes de apoio aos beligerantes e o reforço do
discurso generalizado de liberalização económica acompanhado pela democratização. No
nível regional, o fim do regime do Apartheid na África do Sul, significou o fim do apoio a um
dos beligerantes, a Renamo, e gerou-se um estímulo positivo para o estabelecimento de
sistemas democráticos liberais na região.

Na guerra dos 16 anos, procurava-se por parte da Renamo, reverter o sistema político ora em
vigor, ligado ao marxismo-leninismo adoptado por Moçambique, à semelhança de muitos
outros Estados recém-independentes em África. De facto, “com a independência de
Moçambique em 1975, foi adoptada uma Constituição, a qual definia o papel da Frelimo
como força de liderança do Estado e da sociedade, bem como assegurava a legitimação do
regime de partido único, eliminando, deste modo, qualquer forma de pluralismo social” (Lala
& Ostheimer, 2003, p.8). Por isso, o fim da guerra dos 16 anos foi também, o momento do
inicio da democratização em Moçambique.

Nesse contexto, de acordo com Lala e Ostheimer (2003, p.8), Moçambique empenhou-se na
edificação do seu processo de democratização, através do acordo de paz firmado em 1992.
Talvez seja por essa razão que “o sistema multipartidário implantado em Moçambique
caracterizou-se, desde o início, pelo legado do anterior conflito estrutural e pelo antagonismo
existente entre a Frelimo e a Renamo” (ibid.).

A assinatura dos acordos de paz, em Roma em 1992, entre o Governo moçambicano e a


Renamo, seguida da realização das primeiras eleições gerais (presidenciais e legislativas)
multipartidárias, constituiu o marco central da democracia liberal em Moçambique. Mas o

12
processo de transição para o liberalismo, do ponto de vista económico, e da democracia
liberal do ponto de vista político, teve seus primeiros sinais ainda na década de 1980.

Segundo Lala & Ostheimer (2003, p.8), a Constituição de Novembro de 1990 teve como
principais mudanças a garantia dos direitos básicos individuais, tais como, liberdades de
crenças, opinião e associação; pluralismo partidário; independência dos tribunais; eleições
livres e secretas; e uma eleição directa do Presidente da República. Desta forma, a questão das
liberdades e direitos fundamentais e a questão de eleições periódicas era salvaguardada.

2.8. Eleições Regulares, Livres e Justas


Quando se refere a eleições regulares, está-se a invocar um dos maiores sinais de democracia
liberal, ao mesmo tempo um dos principais indicadores de cultura democrática nos Estados.
Essa assumpção ganha azo com a visão apresentada por Kamp (2011, p.16), de que a
democracia não é um estado absoluto, mas um processo continuo que parte da promoção de
direitos básicos, a realização de eleições através da participação efectiva de toda a população,
de e em todos os níveis sociais, exercendo controlo sobre todos os assuntos que afectam as
suas vidas. Portanto, a realização de eleições operacionaliza o significado etnológico do
conceito de democracia, pois o povo é quem governa, o poder está nas suas mãos.

A relação directa das eleições com a democracia foi fortemente impulsionada pelo liberalismo
político do século XVIII e XIX, visto que “nas sociedades liberais, normalmente, a
democracia é concebida como um sistema político onde as decisões são tomadas mediante
deliberação e votação de agentes racionais, limitados pelos direitos fundamentais, em âmbito
institucional, tendo como base a regra da maioria, ou seja, a regra que prescreve que a decisão
de todos é aquela endossada pela maioria dos cidadãos” (Couto, 2012, p. 63).

A realização de eleições no contexto africano, vem do período das primeiras independências,


tendo conhecido nova dinâmica com a transição democrática dos anos 1990. De 1960 a 1970
foram realizadas apenas 28 eleições nos novos Estados africanos, mas a partir dos anos 1990
(terceira onda da democratização) a realização de eleições aumentou para 65 eleições por
década, sendo que no período entre 2000 a 2005, foram realizadas, em África, 41 eleições
num intervalo de cinco anos (Leon, 2010, p.3).

Podemos com base na variação do número de eleições realizadas nos países africanos nas
últimas décadas, dizer que as eleições já são prática em Estados africanos e essa cultura foi
adoptada como a fórmula adequada para o acesso ao poder político, repudiando-se assim,

13
todas as outras formas. No contexto actual, os Estados africanos “reafirmam o seu
compromisso em realizar regularmente eleições transparentes, livres e justas, em
conformidade com a Declaração da União relativo aos Princípios que regem as Eleições
democráticas em África” (Carta Africana sobre Democracia, Capítulo VII, artigo 17).

Segundo Kamp (2011, p.19), em democracias liberais as eleições devem ser competitivas,
periódicas e inclusivas. Isto é, os partidos da oposição e candidatos devem usufruir da
liberdade de discurso, reunião e movimento, necessários para manifestar abertamente, as suas
críticas ao governo em vigor e apresentar políticas e candidatos alternativos para os eleitores.
Os eleitos devem prestar contas aos cidadãos, a sua eleição não é vitalícia, mas periódica,
tanto que os cidadãos devem retornar periodicamente (na maior parte dos países africanos,
num intervalo de 5 anos) para reelege-los ou optar por outras alternativas.

3. Considerações Finais
Vimos ao longo deste trabalho que o liberalismo seria teoria que melhor se enquadraria para
responder a necessidade de enquadramento teórico, dada a sua relação com democracia bem
como nos estudos sejam eles abrangentes ou restritos de segurança.

Percebemos ainda que a democratização em África é enquadrada na terceira onda, na qual o


seu principal marco foi o fim da guerra-fria. Isso teve reflexos notáveis em Estados africanos
pois, muitos estavam alinhados ao marxismo-leninismo, no contexto da luta contra o
imperialismo, dai que com a derrocada da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
(URSS) tiveram de adoptar a democracia.

As razoes de fracasso desta em alguns pontos de África estão intrinsecamente ligadas a não
observância, ou não respeito, das estruturas, sociais, étnicas e valores culturais que estes
povos tinhas antes do processo de democratização, a que salientar que ao ignorar estes
factores endógenos, já tira de per si o valor deste modelo em termos de aceitação e
identificação dos africanos com esta abordagem.

As dificuldades de aplicação dos pressupostos básicos da democracia liberal nos Estados


africanos, pode ser encontrada a partir da própria configuração ou do processo de construção
do próprio Estado africano, visto que, na maior parte provem de um processo de
descolonização e a sua delimitação territorial não foi feita seguindo as estruturas da
etnicidade.

14
Sendo assim, o primeiro desafio torna-se o da implantação da própria nação, as divisões
existentes nos estados africanos põem em causa a legitimidade dos líderes eleitos, dai que se
verificaram grandes percentagens de abstenção nas primeiras eleições multipartidárias em
vários Estados africanos.

Neste trabalho foi possível tirar conclusões sobre a aplicação de princípios democrático-
liberais em Estados africanos. Uma das conclusões a que chegamos é que, os pilares da
democracia liberal, não ignorando os seus valores, tornam-se nocivos à segurança nacional se
não forem observados tendo em conta o contexto sócio-politico dos Estados africanos.

4. Bibliografia

Abrahamsson, A. N. (1994 ). Moçambique em transição: um estudo da história de


desenvolvimento durante o período de 1974-1992. Maputo: CEEI-ISRI.

Alves Mazzotti, A. J., & Geandsznajder, F. (1999). O método em ciências naturais e sociais:
Pesquisas quantitativas e qualificativa. São Paulo: Thoson.

Aranha, M. L. (1993). Filosofando: introdução à Filosofia. 2. ed. São Paulo: Virtual,


Moderna.

Beetham, D. (1998). Democracy: key principles, institutions and problems, In: Democracy:
its Principles and achievement. Geneva: Inter-Parliamentary Union.

Bobbio, N. (1991). Três ensaios sobre a democracia. Trad. Sérgio Bath. São Paulo: Cardim
& Alario.

Bobbio, N. M. (1999). Dicionário de Política. 12a. Ed. Brasília: Editora UnB.

Diogo, F. (1998). História das ideias políticas. Lisboa: Plural.

15

Você também pode gostar